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“É verdade, mas não era a isso que eu me referia. Estava falando<br />
de sua outra casa.”<br />
Fiquei em silêncio por um momento. “Você quer dizer a Planície<br />
dos Mortos.”<br />
“Claro. Ele não vai estar esperando por essa.”<br />
“Por que você não vai?”<br />
“Porque não posso. A Planície é para almas humanas, um lugar de<br />
transição que é uma sombra do mundo real, porque o choque da morte é grande<br />
demais para algumas pessoas.”<br />
A Planície dos Mortos. Desde o momento em que ouvi sobre isso,<br />
de Fan, sentia-me atraída pelo lugar. Seria porque meu espírito estava a se<br />
aproximando da morte? Eu tinha pouquíssimas opções, de todo modo. “Eu vou.<br />
Se isso puder ajudar em minha situação. Mas você poderia me dar algum apoio?<br />
Algum dinheiro espiritual ou um cavalo?”<br />
“Esses são bens humanos aos quais não tenho acesso. Mas posso<br />
dar a você algo ainda melhor.”<br />
Pegou algo de dentro da túnica e me mostrou um disco fino e<br />
brilhante que se afinava em uma das pontas como a pétala de uma flor.<br />
Segurando o objeto em minhas mãos, fiquei espantada ao perceber que aquilo<br />
era uma escama, ainda que fosse tão larga que eu não conseguia pensar a que<br />
tipo de criatura pertenceria. Era do tamanho da palma da minha mão,<br />
suavemente marcada por sulcos em uma direção e terminando em uma borda<br />
afiada, na outra ponta. Ao luar, ela brilhava como uma madrepérola, tão lustrosa<br />
que parecia estar molhada. Passando meu dedo por ela, no entanto, era evidente<br />
que estava perfeitamente seca.<br />
“É um meio de me chamar. Muito melhor que dinheiro fantasma,<br />
não acha?” Ele estava tão satisfeito consigo mesmo que eu precisei me segurar<br />
para não fazer uma careta de desgosto.<br />
“Mas você não pode ir à Planície dos Mortos.”<br />
“Bem, é verdade, mas há outros lugares onde eu posso ser de<br />
alguma utilidade. Estou certo de que uma garota esperta como você vai<br />
encontrar um jeito de chegar à Planície.” Seu tom irônico me fez pensar se por<br />
acaso ele não sabia de Fan e de sua proposta a mim. “Você tem que segurar isso<br />
alto e soprar a beirada ondulada. Então, chame meu nome. Se eu puder, virei<br />
até você.”<br />
Para minha surpresa, estávamos nos aproximando rapidamente<br />
da periferia da cidade. Er Lang me levara por um caminho reto, andando como<br />
se voássemos. Quando olhei para trás, entretanto, não pude enxergar o caminho<br />
que fizéramos. Tudo que restava eram a escura massa farfalhante das árvores e<br />
os altos galhos das lalang. Tive dúvidas se não estava em um sonho, já que podia<br />
lembrar claramente do solo de areia cintilando em nosso caminho, mas a<br />
estrada às nossas costas parecia intransponível.<br />
“Agora”, ele disse, parando próximo ao mar de telhados à nossa<br />
frente. Lamparinas iluminavam algumas janelas, e com minha visão aguçada eu<br />
podia ver o brilho pálido, azul e verde, de espíritos de luz nas ruas escuras.<br />
“Consegue ir sozinha, a partir daqui?”