Revista literalivre - 7ª edição
7ª Edição da Revista LiteraLivre, uma revista virtual e ecológica, criada para unir autores que escrevem em Língua Portuguesa em todo o mundo. 7nd Edition of LiteraLivre Magazine, a virtual and ecological magazine, created to bring together authors who write in Portuguese throughout the world. Http://cultissimo.wixsite.com/revistaliteralivre/comoparticipar
7ª Edição da Revista LiteraLivre, uma revista virtual e ecológica, criada para unir autores que escrevem em Língua Portuguesa em todo o mundo. 7nd Edition of LiteraLivre Magazine, a virtual and ecological magazine, created to bring together authors who write in Portuguese throughout the world. Http://cultissimo.wixsite.com/revistaliteralivre/comoparticipar
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LiteraLivre nº 7 – janeiro de 2018<br />
Enquanto folheava o livro de histórias fantásticas, que lia para resgatá-lo<br />
do ócio em que a vida prosaica de aposentado o mergulhara, o pai se perdia<br />
nesse espaço misterioso da imaginação que amalgamava as situações do conto,<br />
suas fantasias e devaneios, seu estado de consciência alterado e - quem sabe ? -<br />
reminiscências de vidas passadas.<br />
-Li em algum lugar que os animais têm alma e reencarnam.<br />
A esposa, que fora muito bonita e atraente, além de sociável e perspicaz,<br />
rebateu-lhe o comentário, afirmando:<br />
-Segundo a teoria da evolução,os cães descendem dos lobos. Estes<br />
prosseguiram como animais selvagens, aqueles, resultado de mutações, puderam<br />
ser domesticados pois formaram uma linhagem que conseguia se aproximar e<br />
conviver com os hominídeos.<br />
-Interessante. O lobo morria e sua alma encarnava dentro de um cachorro<br />
– tentando aplicar as 2 ideias numa possível síntese.<br />
-Seu filho também poderia dormir lobo e acordar cãozinho-completou a<br />
senhora, lamentando o inesperado destino do adolescente.<br />
Esse comentário da esposa, tão fora de propósito, parecia incriminá-lo pelo<br />
fim a que chegou tão desditosa criatura. “Meu filho ? Sua desgraçada, foi você<br />
que não soube educá-lo” - tentando se exonerar de suas responsabilidades.<br />
-Tão falando mal de mim, seus coroas desocupados ? -retrucava<br />
grosseiramente o filho, enquanto escarafunchava as panelas sobre o fogão,em<br />
busca de lenitivo para sua fome exacerbada pelo uso da droga, depois de ter<br />
esgotado o copo de aguardente que o genitor deixara sobre a mesa da cozinha.<br />
-Não se preocupe. Ele se transforma em lobisomem nas noites de lua cheia<br />
mas depois volta ao normal – respondeu-lhe rindo com sarcasmo. Na verdade,<br />
desejava que a mordida canina redundasse numa infecção letal, como a raiva,<br />
talvez. Afinal há anos deixaram de vacinar o animal contra essa doença.<br />
“Preferia um menino-lobo, tipo Mogli”-imaginou a mãe, saudosa dos contos<br />
lidos ao pé da cama do garoto antes de fazê-lo adormecer.<br />
O cão, rebaixado à reles condição de animal de estimação, ouvia indignado<br />
as imprecações do antigo amigo de brincadeiras e sentia entre os cônjuges a<br />
aproximação das sombrias influências espirituais - o “espírito da perversidade”.<br />
O velho, aborrecido por uma ideia que se lhe fixava no cérebro e<br />
contrariado com o comportamento hostil dos familiares – indício de sua<br />
ingratidão - tendo os sentidos relaxados pelo processo digestivo e induzido ao<br />
sono pela leitura de tão grotesca história – como se os obsessores do<br />
personagem estivessem atuando sobre o próprio leitor - afundou o corpo na<br />
poltrona e pôs-se a cochilar.<br />
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