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seu milagre, no poder da oração, na fé. Oremos: glorioso Deus, glorioso Pai,<br />
nossos milhares e milhares de telespectadores aguardam a cura para seus<br />
horrendos sofrimentos, em nome de Jesus ordeno que saiam dos seus corpos as<br />
doenças malignas, pelo poder da misericórdia e da compaixão, ó Jesus, pai<br />
bendito, libertai este povo que tanto tem ajudado o Pronto Socorro Divino.<br />
Imagens de Jesus, do Curandeiro, música celestial, o rosto feliz dos sofredores.<br />
Havia em Eunice alguma coisa que me afligia. Ela estava sempre tensa e infeliz;<br />
era frio o suor do seu corpo nu, apenas no momento do orgasmo eu sentia que ela<br />
superava a sua aflição, mas logo em seguida seu rosto se crispava e ela<br />
começava a chorar. A iniciativa não havia sido minha; depois que eu lhe dera os<br />
autógrafos ela permanecera em pé, no meio da sala, desajeitada e eu dissera,<br />
fique à vontade e ela perguntara onde era o quarto. Eu sentia pena dela, mas<br />
também ficava enfadado com o dramalhão de alcova que ela invariavelmente<br />
encenava nas poucas vezes em que estivemos juntos, talvez porque eu não<br />
costume sofrer desses instantâneos e fugazes sentimentos de culpa. Ir para cama<br />
com Eunice, como com todas as outras, fora algo parecido com uma viagem a<br />
uma cidade desconhecida: no princípio a gente percebe tudo, alerta, ligado, mas<br />
depois de algum tempo atravessamos a rua sem nada ver, e se vemos não<br />
sentimos, como um carteiro fazendo a entrega da correspondência. Ah, o pior de<br />
todos os venenos! Tenho vontade de voltar a fita atrás e ouvir esta gravação, mas<br />
sei que se o fizer não continuarei registrando estes acontecimentos. De qualquer<br />
forma quando terminar de ditar jogarei a fita no lixo. Eu nunca seria capaz de<br />
escrever sobre acontecimentos reais da minha vida, não só porque ela, como<br />
aliás a de quase todos os escritores, nada tem de extraordinário ou interessante,<br />
mas também porque eu me sinto mal só de pensar que alguém possa conhecer a<br />
minha intimidade. É claro que eu poderia camuflar os fatos com uma aparência<br />
de ficção, passando da primeira para a terceira pessoa, acrescentando um pouco<br />
de drama e comédia inventados etc. É isso o que muitos escritores fazem e talvez<br />
seja a razão pela qual a literatura deles é tão fastidiosa. Vejamos a minha vida,<br />
nos últimos três meses. Tento escrever uma novela sobre briga de galos, ou outras<br />
duas sobre as quais falarei em seguida, e procuro comer todas as mulheres que<br />
passam perto de mim. Evidentemente isso não basta para compor uma boa peça<br />
de ficção. O papel especial em que sempre escrevo, comprado na Casa Mattos,<br />
está em cima da mesa, e a trama já está armada dentro da minha cabeça. O<br />
protagonista é um chefe poderoso do baixo mundo (jogo do bicho, narcóticos,<br />
contrabando e prostituição) e o seu galo invencível (pedigree de cem anos), no<br />
qual ele aposta verdadeiras fortunas, dando vantagens de até dez por um. O<br />
antagonista é um pobre criador de galos da Baixada e o seu galo desconhecido,<br />
mas que ele, com sua longa experiência, considera imbatível. O velho consegue<br />
convencer parentes e amigos a se associarem numa grande aposta contra o<br />
poderoso chefão. Será uma briga mortal pois os galos usarão esporões de prata, a