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Revista Nossos Passos Março/Abril 2020

Revista Nossos Passos edição Março/Abril 2020

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Editorial

Nos tempos de conturbação, o homem volve os olhos

para o céu em busca de resposta. Não é a questão do seu lugar

na ordem do cosmos, mas o apelo angustiado por socorro.

Essencialmente, a Quaresma é o deserto – e eis que nesse

tempo ele veio impor-se a nós. Ruas e praças do mundo sem

vozes; nações paradas sob o medo de um mal não visto. Toda

a terra presa em casa, confinada sem previsão de termo. Com

maior ou menor atenção, sentimos os estranhos rumos a que

temos caminhado, e é no deserto que convém sobre eles meditar,

pois os momentos de conforto não acendem o desejo de viver.

À sombra das maiorias e governos silenciosos, no eco

da vagueza insuportável dos discursos, reiteradas concessões

da nossa parte têm cedido aos caprichos compulsivos de alguns

bandos que, com crescente estridência, exigem de nós uma série

de renúncias, sob o lema de suposta liberdade. Quanto mais se

põem suspensas as balizas da consciência, quanto mais se nega

a essência das coisas, mais intensificam-se as farras e os festins.

Vãs querelas vêm trincando as nossas mesas, onde vêm

se insinuar com discussões obrigatórias, às quais todos são

chamados a prestar contas de convicções, dos seus valores, daquilo

a que mais amam. E, em respeito às lembranças mais

amadas, tende-se a esconder a autêntica medida de valor em

detrimento de um convívio tolerante, que julgamos salutar.

Que estrada é essa, esse tão decorado declive, que nos

vai distraindo com brilhos e galhofa, enquanto a bulha barulhenta

transforma absurdos em refrães irrefletidos? Onde

estão a nascente e a foz desse fluxo elaborado de preocupações,

que surge do nada para assumir o centro da vida nesses

tempos? De que modo alguns assuntos vêm ter paradeiro

em nossos dias, adentrando nossos lares sem convite?

De cima dos cadafalsos, alguma coisa sopra a dúvida no

tímpano dos homens.

A pretexto de noticiar os fatos, sofistas e tagarelas

empenham-se em moldar a convicção das multidões até onde

chegam suas palavras: formulações sem autor e sem sentido,

que avançam sob o plácido sono do juízo. É o ocaso

do discernimento, o desarme de toda reação ante a ameaça.

Ao mesmo tempo, não há como contestar haver entre nós

algo que destoa de tudo o que nos trouxe até aqui e nos ergueu.

Algo que sitia, infiltra-se e divide os fiéis no mundo inteiro; algo

que vagueia e escurece com ocas expressões os desígnios sagrados.

Vimos o abandono, a apostasia, da Fé cristiana.

Vimos a evasão de muitos batizados; o desolador descaso

pela Eucaristia – trocada por exibições de eficácia emotiva.

Há quem diga que ali se é mais feliz. Como se pudesse a oratória

superar o Mistério.

De dentro da Fé, o homem católico percebe que há gentes

na Igreja que não são Igreja. Do lado de fora, vai tendo

o peito acabrunhado pelos ditos sarcásticos de um mundo

insolente, mascarado de equilíbrio e isenção, enquanto

temos caminhado na senda maldita da repulsa pelo Nome

divino. Um espectro assumiu as nossas instituições: é ele que

tem aberto as alas para o retorno de um mundo neopagão.

Procurai, irmãos, saber o que passou: os inimigos que

acossaram os fiéis ao longo da sua história, sem escolha a não

ser dar-lhes batalha. Aqueles que os infiltraram e até lideraram,

desviando a sua missão. Procurai saber também o que se

passa agora; pois um fiel desinformado é uma carcaça à deriva.

Quem nos terá dito das capelas e catedrais que vêm sendo

transformadas em lugares noturnos? Algum de nós imaginou que

os seus altares e vitrais agora servem de ornamento a bebedeiras,

a danças e ao pecado? Houve igrejas transformadas em bordéis

– e acaso isto virou notícia? Alguém empreendeu-lhes obstáculo?

Os alarmes vêm soando, no meio dos tumultos: o dia já declinou.

E as algazarras dessa noite escondem grandes perigos. Nos

momentos de lúcido receio – no interior profundo desse círculo de

ferro onde Deus não é bem-vindo –, as massas vão-se entregando,

entusiasmadas, ao culto de forças proibidas. É a busca esperançada

de um propósito, o paladar fingido de um veneno adocicado.

Mas quem é como Deus?

Quem se atreverá a comparar-se com Aquele que

lançou as leis da terra e também do firmamento – Aquele

a cuja voz dão escuta as tempestades? Qual criatura quererá

medir-se com o Homem – autêntico e definitivo – do qual

somos imagem e semelhança? Falo Daquele que dá ordens à

manhã e diz à aurora onde clarear; que quebra o braço do

rebelde e purifica as águas para dar-nos de beber; Aquele

a quem os raios obedecem, quando os cântaros do céu

se entornam e vêm regar a terra, de onde vem o nosso pão.

Há muitas gerações, Sua voz trovejou aos mensageiros:

mandou-lhes escrever as Suas normas. Isso é o Seu Testamento;

e a quem se destina um registro senão àqueles que estão por vir?

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