Revista Contato VIP - Novembro de 2020 - Passo Fundo e Marau/RS
Confira na íntegra a edição de novembro da Revista Contato VIP, capa de circulação das cidades de Passo Fundo e Marau/RS
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VIP | Direito
Violência doméstica
Estamos em 2020, período de pandemia, e ainda precisamos falar (muito) a respeito
desse tema. A advogada Maiaja Franken de Freitas é quem nos ajuda nessa tarefa
A
caracterização do que se
enquadra como violência
doméstica é obtida a partir
da Leitura da Lei número
11.340, de 07 de agosto de 2006, conhecida
popularmente como “Lei Maria da
Penha”. O caso da farmacêutica Maria da
Penha Maia Fernandes, ficou conhecido
internacionalmente, em 1998, quando foi
denunciado para a Comissão Interamericana
de Direitos Humanos da Organização
dos Estados Americanos (CIDH/
OEA). Porém, o Estado Brasileiro permaneceu
omisso, não tendo se pronunciado
em nenhum momento durante o processo.
Em 2001, o Estado Brasileiro foi responsabilizado
por negligência, omissão e
tolerância em relação à violência praticada
contra as mulheres brasileiras. A história
de Maria da Penha foi muito mais que
um “caso isolado”: ela demonstrou o que
acontecia sistematicamente no Brasil, sem
que os agressores fossem punidos.
Diante disso, a Comissão Interamericana
de Direitos Humanos, entre outras
recomendações ao Estado Brasileiro, que
o caso de Maria da Penha fosse tratado
como de violência contra a mulher em
razão de seu gênero, ou seja, o fato de
ser do gênero feminino reforça não só o
padrão recorrente desse tipo de violência
como, também, acentua a impunidade dos
agressores. E, diante da falta de medidas
legais e ações efetivas, como acesso à
justiça, proteção e garantia de direitos
humanos a essas vítimas, formou-se, em
2002, um Consórcio de ONGS Feministas,
para a elaboração de uma lei de combate
à violência doméstica e familiar contra a
mulher. Após debates com o Legislativo,
o Executivo e a sociedade, o Projeto de
Lei número 4.559/2004 da Câmara dos
Deputados chegou ao Senado (Projeto
de Lei de Câmara número 37/2006) e foi
aprovado por unanimidade em ambas as
casas. Em 07 de agosto de 2006, o então
Presidente Luiz Inácio Lula da Silva
sancionou a Lei número 11.340, conhecida
como Lei Maria da Penha. Esse breve
histórico é importante, porque embora se
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veja os números, gritantes, da violência
doméstica, ainda existem pessoas que
fazem a pergunta: “Mas por que uma lei
específica para proteger pessoas do gênero
feminino?” A explicação, suscintamente,
está aí em cima: porque essas pessoas
morrem, pelo simples fato de serem do
gênero feminino.
Dito isso, segundo a Lei Maria da Penha,
em seu artigo 5º, violência doméstica e
familiar contra a pessoa a mulher se caracteriza
como “qualquer ação ou omissão
baseada no gênero que lhe cause morte,
lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico
e dano moral ou matrimonial”. O
conceito de violência doméstica e familiar,
portanto, é de suma importância, na medida
em que: a) se verifica a aplicação para
pessoas do gênero feminino (abrangendo,
assim, também a proteção às mulheres
trans), b) a proteção quanto a outras formas
de violência, que não “apenas” (sem
aqui minimizar o impacto desta espécie) a
violência física.
É fundamental, portanto, que toda a sociedade
entenda, que a exemplo de pautas
como o racismo, a questão da violência
doméstica é um problema de todos e todas,
e que uma ação conjunta, de políticas
públicas e de mudanças básicas, desde a
educação, são fundamentais para modificarmos
os números atuais da violência.
Quais são os diferentes tipos de
violência doméstica praticados?
Novamente, a Lei Maria da Penha, em seu
artigo 7º, prevê que são formas de violência
doméstica e familiar contra a mulher,
entre outras, a violência física, a violência
psicológica, a violência sexual, a violência
patrimonial e a violência moral. A
legislação, no caso, se mostra inovadora e
protetiva, uma vez que traz um rol exemplificativo
do que se caracteriza como
violência doméstica e familiar contra a
mulher. Veja-se, por exemplo, que com as
novas tecnologias, algumas não existentes
à época da promulgação da lei, é possível a
utilização do caput do artigo 7º para fazer
cessar determinada forma de violência,
como a chamada “Porn Revenge”, em que
o agressor tem fotos ou vídeos íntimos
da vítima e os divulga na rede mundial
de computadores, como uma forma de
se “vingar” pelo fim do relacionamento,
embora possa-se entender que essa
conduta também poderia se enquadrar na
chamada violência moral. Mas o exemplo
é utilizado, aqui, para que se verifique que
o artigo 7º, que trata das formas de violência
doméstica e familiar contra a mulher é,
meramente, exemplificativo.
De que forma a pandemia
contribuiu para o aumento dos
casos de violência doméstica?
Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança
Pública (FBSP) , os casos de
feminicídio cresceram 22,2%, entre
março e abril/2020, em 12 Estados do
País, comparativamente a 2019. Entre os
fatores que explicam o aumento dos casos
de violência doméstica e familiar durante
o período da pandemia vivenciada pela
COVID-19 estão a convivência mais
próxima dos agressores, que no novo
contexto, podem mais facilmente impedir
as vítimas de se dirigir a uma delegacia ou
a outros locais que prestem socorro, como
centros de referência especializados, ou,
mesmo, canais alternativos de denúncia,
como telefone ou aplicativos. Por estes
motivos, especialistas consideram que
as estatísticas se distanciam da realidade
vivenciada pela população feminina
quando o assunto é violência doméstica,
pois em condições normais, já há a marca
da subnotificação (ou seja: ocorrência
das situações de violência sem o respectivo
registro da ocorrência, perante
a Autoridade Policial). Atenta a isso, a
Polícia Civil do Estado do Rio Grande
do Sul, por exemplo, viabilizou no início
da pandemia, a possibilidade de registro
de ocorrências por violência doméstica
on-line (https://www.delegaciaonline.
rs.gov.br/dol/#!/index/main) quando não
houver agressões físicas.