ESPECIALO CÉREBROemmovimentopor Karine zanardi dos santosJORNALISTAAo contrário do que sepensava até pouco tempo,a capacidade cerebraldo ser humano pode serestimulada ao longo detoda a vida, resultandoem novas experiênciase aprendizados. Aindadesconhecida paragrande parte das pessoas,a neuroplasticidaderevolucionou o mundoda ciência e chega parafortalecer, ainda mais,as possibilidades dedesenvolvimento docérebro48 AFRODITE
Até pouco tempo costumava-se pensar que o ser humanonascia com todas as células cerebrais necessárias para sedesenvolver ao longo da vida e que, quando essas célulasmorriam não havia nada que podia ser feito para recuperá-las.Essa teoria já caiu por terra e cada vez mais a ciência descobre oquanto não sabemos sobre nosso principal órgão. Em 2019, umestudo da Universidade de Madri (Espanha), apontou que o cérebrocontinua produzindo novos neurônios com o passar do tempo. E,diga-se de passagem, não é por pouco tempo: os pesquisadoresdestacaram que esse processo ocorre, pelo menos, até os 97 anosde idade. Publicado na revista Nature Medicine, o estudo tambémdemonstrou que o número de novas células cerebrais diminui,sim, com o passar do tempo, mas que apesar disso nada impede ageração de novos neurônios na idade adulta. Além disso, mesmoque não o façam com frequência, os neurônios também têm certacapacidade de regeneração.Tudo isso não quer dizer que o cérebro e, consequentemente, ocorpo não sintam a perda de uma dessas células, afinal, o impactoda morte de um neurônio se espalha por toda a rede de conexões.Parece confuso? A neuropsicopedagoga Kalígina Machado, especialistaem Análise Comportamental Aplicada (ABA, em inglês),explica que cada neurônio está ligado, quimicamente, a milhares deoutros. E é por meio dessa teia que os impulsos nervosos são transmitidosentre as células. “Acreditava-se que o cérebro era um órgãofísico e imutável, sendo incapaz de gerar novas conexões. Hoje, dependendodos estímulos e da necessidade de cada pessoa, novascélulas neurais vão surgindo, e a gente começa a construir uma teiade conexões que mexe com o sistema nervoso e o faz se alterar, deacordo com a demanda. Assim, as sinapses vão se movimentando,ligando-se uma à outra e gerando uma série de novas sinapses.”A NEUROPLASTICIDADEO corpo humano realiza milhões de sinapses diariamente, e apartir dessa proliferação de estímulos é que chegamos ao fenômenoda neuroplasticidade e à alta capacidade do cérebro de se modificar.A neuroplasticidade, também chamada de plasticidade neural,refere-se à habilidade que o sistema nervoso tem de se adaptar,se reorganizar e se modificar quando é exposto a novas experiências.De acordo com a psicóloga e terapeuta comportamental JoyStedile, esse processo ocorre paralelamente às interações que océrebro recebe dos ambientes interno e externo, variando de umapessoa para outra.“A neuroplasticidade não é uma habilidade específica do cérebro.É uma característica, uma condição do sistema nervoso. Elanão é igual para todos porque não há um cérebro igual ao outro.Cada cérebro humano é modificado por estratégias cognitivas deacordo com os desafios próprios do seu ambiente.” Ou seja, essesuperpoder permite que o cérebro crie “novos caminhos” e conexõespara superar as redes que foram danificadas lá atrás, tornando-oaltamente maleável. É o que acontece, por exemplo, quando umapessoa sofre alguma lesão cerebral e reaprende habilidades que seperderam. “Quando alguém tem perda de visão, ela tende a aguçar aaudição, não é mesmo? Há a sinapse que foi morta, mas automaticamenteoutras sinapses começam a nascer para dar vida e desenvolvimentoaos demais sentidos”, explica a neuropsicopedagoga.APRENDIZAGEM CONSTANTEA neuroplasticidade começa ainda nos primeiros dias de vida deuma criança. Chamada de plasticidade axônica, representa o períodocrítico mais importante no desenvolvimento do cérebro, ocorrendoentre zero e dois anos de idade, fase na qual acontece o primeirocontato com o mundo e as descobertas sobre a vida, o ambiente e opróprio corpo. “O bebê é quem mais pratica neuroplasticidade, porqueestá em constante desenvolvimento. Ele precisa aprender a andar,a falar, a comer. Tudo o que é desenvolvido de uma maneira quedemanda funções do cérebro, a fim de concretizar uma construçãofuncional, é uma forma de neuroplasticidade”, afirma Kalígina.A aprendizagem se estende para as demais fases da vida, e océrebro precisa ser exercitado constantemente. “Imagine o cérebrocomo uma floresta bem densa, com muitos, muitos caminhos.Essa rede de incontáveis caminhos é como uma circuitaria cerebral.Quanto mais forte, mais robusta é, mais protegido e resistente é onosso cérebro”, ensina Joy. As profissionais explicam que criançasque exercitam o cérebro podem obter mais concentração na escola,jovens conseguem aprovação em concursos, enquanto os adultosmelhoram o desempenho profissional. Já os idosos, têm a oportunidadede ampliar a reserva cognitiva e afastar problemas de memória.Nesse processo, surge a tecnologia e os desafios de como utilizá-laa favor do próprio corpo. As telas podem ser grandes aliadas docomportamento humano, mas também comprometem o desempenhoquando o assunto é a força cerebral. “O cérebro precisa de novidade,variedade e grau de desafio crescente. Por isso, ficar apenasno celular, ainda mais considerando os algoritmos que vão mostrartudo o que nós queremos ver, não é desafiador e não exercita o cérebropara que ele reforce seus circuitos”, orienta a psicóloga.NOS NEGÓCIOS, COMO APLICAR?Estimular a criatividade, o senso crítico, aprender sobre determinadaárea, se especializar e se manter em movimento na buscapelo sucesso profissional. A plasticidade cerebral também pode serutilizada a favor dos negócios, principalmente entre os empreendedores,sejam eles de pequeno ou grande porte. “Para o cérebro humano,esse movimento de constante aprendizado, resiliência e obstinaçãofunciona como um excelente exercício que, com certeza, vaisomar na reserva cognitiva”, afirma Joy.AFRODITE 49