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Imagens da Maré: narrações fotográficas da favela

Por mais forte e interessante que seja um registro fotográfico, o que conta mesmo é o pedaço de vida que vai ali representado. Este livro trata exatamente disso: fotos fortes, momentos densos e verdadeiros dados a conhecer por quem participa deles, quem saiu da condição de objeto para se tornar sujeito. Sabemos que a produção de sua própria imagem é uma condição essencial para a construção das identidades sociais e, consequentemente, para o exercício pleno da cidadania. A questão da autorrepresentação vem ganhando força há pelo menos vinte anos, com a implantação de projetos de capacitação em fotografia voltados para setores sociais e minorias identitárias sempre representados de forma distorcida ou abertamente preconceituosa pela grande imprensa, constituindo um movimento conhecido como inclusão visual. Uma das ações mais bem sucedidas é a Escola dos Fotógrafos Populares e a agência Imagens do Povo. Com a autoridade de quem participou desde os primeiros momentos dessas ações, Francisco Valdean generosamente compartilha conosco o caminho percorrido por esse grupo muito especial de cidadãos formados fotógrafos. Começa descrevendo o contexto social e urbano onde se situam as ações, apresenta os projetos e seus protagonistas, com seus olhares traduzidos em fotos, e estudos de caso sobre a vida cotidiana da comunidade com leitura meticulosa das imagens. Por fim, esboça um Inventário fotográfico da Maré, exemplar como proposta de construção de memória e de identidade, que é a base sobre a qual se constrói o protagonismo cidadão. Imagens da Maré: narrações fotográficas da favela é um livro instigante, pioneiro e imprescindível para quem vê na fotografia um instrumento de transformação e de busca por justiça social. Milton Guran

Por mais forte e interessante que seja um registro fotográfico, o que conta mesmo é o pedaço de vida que vai ali representado. Este livro trata exatamente disso: fotos fortes, momentos densos e verdadeiros dados a conhecer por quem participa deles, quem saiu da condição de objeto para se tornar sujeito. Sabemos que a produção de sua própria imagem é uma condição essencial para a construção das identidades sociais e, consequentemente, para o exercício pleno da cidadania.

A questão da autorrepresentação vem ganhando força há pelo menos vinte anos, com a implantação de projetos de capacitação em fotografia voltados para setores sociais e minorias identitárias sempre representados de forma distorcida ou abertamente preconceituosa pela grande imprensa, constituindo um movimento conhecido como inclusão visual.

Uma das ações mais bem sucedidas é a Escola dos Fotógrafos Populares e a agência Imagens do Povo. Com a autoridade de quem participou desde os primeiros momentos dessas ações, Francisco Valdean generosamente compartilha conosco o caminho percorrido por esse grupo muito especial de cidadãos formados fotógrafos. Começa descrevendo o contexto social e urbano onde se situam as ações, apresenta os projetos e seus protagonistas, com seus olhares traduzidos em fotos, e estudos de caso sobre a vida cotidiana da comunidade com leitura meticulosa das imagens.

Por fim, esboça um Inventário fotográfico da Maré, exemplar como proposta de construção de memória e de identidade, que é a base sobre a qual se constrói o protagonismo cidadão.

Imagens da Maré: narrações fotográficas da favela é um livro instigante, pioneiro e imprescindível para quem vê na fotografia um instrumento de transformação e de busca por justiça social.

Milton Guran

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o surgimento dos fotógrafos da Maré, um dos mais originais e

criativos núcleos habitacionais cariocas, em um processo deflagrado

a partir de 2004 pela Escola de Fotógrafos Populares, ligada

ao Observatório de Favelas, que redundou no projeto Imagens do

Povo, revelador de dezenas de talentos locais — graças, sobretudo,

ao generoso empenho dos professores João Roberto Ripper, Dante

Gastaldoni e Ricardo Funari. Um projeto educativo que pode ser

comparado a uma espécie de alforria visual dos moradores da Maré,

que passaram a oferecer uma imagem mais autêntica e correta da

vida comunitária, em oposição ao tradicional enfoque jornalístico

preconceituoso e negativo — ou, na melhor das hipóteses, paternalista.

Quem trabalhou em jornal sabe que, de modo geral, a imprensa

só se deslocava para as favelas para documentar os processos de

remoção, crimes e tiroteios provocados pelo tráfico de drogas e as

catástrofes naturais e humanas, como enchentes, desabamentos

ou incêndios. É como se a favela, toda e qualquer favela, fosse um

território amaldiçoado e esquecido pelas autoridades, salvo nas

épocas de campanhas eleitorais. Quando, na verdade, as favelas

cariocas constituem um dos mais importantes fenômenos urbanísticos,

arquitetônicos, culturais e existenciais do país, congregando

em seu conjunto mais de dois milhões de habitantes, o que faria

delas a sétima maior cidade brasileira, com uma população equivalente

à de Lisboa, capital de nossa matriz colonizadora.

“Imagens da Maré” registra, portanto, um exemplar processo

de inserção social mediado pela fotografia, demonstrando como

essa disciplina permitiu aos seus moradores a conquista da cidadania

plena e a afirmação da importância do indivíduo no quadro

social — tanto local, mareense, quanto global, nacional ou internacional.

Um trabalho que ganha ainda mais relevo quando se lembra

que estudos historicizando movimentos fotográficos brasileiros

no novo milênio são ainda pouco numerosos, de modo que o livro

de Francisco Valdean já surge fadado a se tornar uma valiosa fonte

de referência para os futuros historiadores da fotografia nacional.

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