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Peticao.Inicial.RP.Bolsonaro

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL

SUPERIOR ELEITORAL.

PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA – PDT, pessoa jurídica de direito

privado, inscrita no CNPJ sob o nº 00.719.575/0001-69, com sede na SAFS - Quadra 02 -

Lote 03 (atrás do anexo do Itamaraty), Plano Piloto - Brasília/DF, CEP: 70042-900, neste

ato representado por seu presidente nacional, CARLOS ROBERTO LUPI, brasileiro,

solteiro, administrador, portador da cédula de identidade nº: 036289023, expedida pelo

IFP/RJ, inscrito no CPF/MF sob nº 434.259.097-20, com endereço eletrônico:

clupi@uol.com.br, e por CIRO FERREIRA GOMES, vêm, respeitosamente, por seus

advogados in fine assinados, constituídos mediante instrumento procuratório que segue

em anexo (doc. 01), perante Vossa Excelência, com fundamento legal no art. 96 da Lei nº

9.504/1997, propor a presente

REPRESENTAÇÃO ELEITORAL COM PEDIDO DE MEDIDA LIMINAR DE

URGÊNCIA

em face de JAIR MESSIAS BOLSONARO, brasileiro, casado, inscrito no CPF sob o nº

453.178.287-91, com endereço no Palácio da Alvorada, SPP Zona Cívico- Administrativa,

Brasília, Distrito Federal, CEP 70.150-000, do PARTIDO LIBERAL, pessoa jurídica de

direito privado inscrita no CNPJ sob o nº 08.517.423/0001-95, com endereço na Qd. SHS

Qd. 6 Cj. A BI, sala 903, Asa Sul, Brasília (DF); e do FACEBOOK SERVIÇOS ONLINE

DO BRASIL LTDA, pessoa jurídica inscrita no CNPJ sob no 13.347.016/0001-17, com

endereço na Rua Leopoldo Couto Magalhães Júnior, nº 700, 5º andar, CEP 04542-000, São

Paulo/SP, endereço eletrônico: eleicoes_facebook@tozzinifreire.com.br, o que faz com

espeque nos pontos de fato e de Direito doravante articulados:


I. DOS FATOS

Constitui fato público e notório que o Senhor Jair Messias Bolsonaro se reuniu no

dia 18 (dezoito) de julho de 2022 com embaixadores de países estrangeiros residentes no

Brasil para falar sobre as eleições deste ano, sobre o Supremo Tribunal Federal e o

Tribunal Superior Eleitoral. A tônica do encontro foi a de soerguer protótipos

profanadores da integridade do processo eleitoral e das instituições da República,

especificamente o TSE e seus Ministros. Durante o evento, o Senhor Jair Messias

Bolsonaro criou uma ambiência propícia para a propagação de toda sorte de desordem

informacional ao asseverar, por diversas vezes, que o sistema eletrônico de votação é

receptivo a fraudes e invasões que, sob a ótica do delírio presidencial, podem

comprometer a fidedignidade do resultado dos pleitos.

Na ocasião, o Presidente da República acentuou, em resumo, o seguinte: i) que as

urnas completaram automaticamente o voto no PT nas eleições 2018; ii) que as urnas

brasileiras não possuem sistemas que permitem auditoria; iii) que não é possível

acompanhar a apuração dos votos; iv) que o inquérito que investiga uma invasão ao

sistema do TSE, em 2018, não estava sob sigilo; v) que a apuração dos votos é realizada

por uma empresa terceirizada; vi) que o TSE não aceitou sugestões das Forças Armadas

para melhorar a segurança do processo eleitoral; vii) que o TSE divulgou que os

resultados de 2018 podem ter sido alterados; viii) que as urnas eletrônicas sem impressão

do voto são usadas apenas em dois países além do Brasil; ix) que os observadores

internacionais não têm o que fazer no Brasil porque a contagem de votos não é pública;

x) que um hacker teve acesso a tudo dentro do TSE, inclusive a milhares de códigos-fontes

e a uma senha de um ministro do TSE; e xi) que a Polícia Federal pediu os registros

cronológicos de acesso ao sistema computacional do TSE, mas sete meses depois a Corte

asseverou que eles foram apagados.


Outrossim, o Senhor Jair Messias Bolsonaro aproveitou a oportunidade para

promover ataques aos Ministros deste Egrégio Tribunal, como por exemplo, quando

asseverou que o Excelentíssimo Senhor Ministro Alexandre de Moraes “advogou para

grupos que, se eu fosse advogado, não advogaria”; e quando verbalizou que o Excelentíssimo

Senhor Ministro Luiz Edson Fachin “sempre foi advogado do MST, grupo terrorista que até

pouco tempo atrás era bastante ativo no Brasil”. O discurso, que durou cerca de 46 minutos e

2 segundos, pode ser lido, na íntegra, no seguinte link: <

https://www.poder360.com.br/eleicoes/leia-a-integra-do-que-disse-bolsonaro-aembaixadores/

> .

A reunião foi transmitida pela Emissora Brasil de Comunicação e o vídeo do

encontro foi veiculado, na íntegra, através das redes sociais do Senhor Jair Messias

Bolsonaro, especialmente no Instagram (@jairmessiasbolsonaro) e no Facebook. Importa

realçar que, no Facebook, até o momento da elaboração desta petição inicial, a mídia

alcançou cerca de 72.000 (setenta e duas mil) curtidas, 52.000 (cinquenta e dois mil)

comentários e 25.0000 (vinte e cinco mil) compartilhamentos. Já no Instagram, a postagem

atingiu cerca de 379.000 (trezentas e setenta e nove mil) visualizações e 8.962 (oito mil

novecentos e sessenta e dois) comentários. Confira-se:


Link de acesso: <

https://www.facebook.com/jairmessias.bolsonaro/videos/615113366527954 > .

Link de acesso: < https://www.instagram.com/p/CgKoLgNo5um/ > .

Em reação à conduta do Senhor Jair Messias Bolsonaro, o Excelentíssimo Senhor

Ministro Luiz Edson Fachin, Presidente deste Egrégio Tribunal, rebateu as afirmações


falsas contra o sistema eletrônico de voto. 1 Acerca do suposto ataque hacker sofrido pelo

TSE, em 2018, o Ministro Fachin afirmou que “se trata de uma mentira. O ataque, que ainda

é investigado, não representou qualquer risco à integridade das eleições presidenciais daquele ano.

Até porque o código-fonte dos programas utilizados naquela e em todas as eleições passa por

sucessivas verificações e testes”. Acrescentou-se, na oportunidade, que há dezenas de chaves

criptográficas que protegem o sistema eletrônico de votação e que as urnas eletrônicas

não se conectam a qualquer rede. Segundo o Ministro, esses elementos já afastam

qualquer possibilidade de fraude e de manipulação dos votos.

O Ministro também relembrou que a proposta de retomada do voto impresso foi

rejeitada pelo Congresso Nacional no ano passado e que o Brasil não é o único país do

mundo que não adota o voto em cédula do papel. Já quanto à criação da Comissão de

Transparência das Eleições (CTE), o Ministro Fachin lembrou que as Forças Armadas

desde sempre são convidadas a colaborar na organização as eleições, principalmente na

área de transporte e logística, no que também afirmou que “não é de agora que realizam,

junto com outras entidades, o papel de observação fiscalizadora das eleições”.

O Ministro Presidente também citou as iniciativas adotadas pelo TSE no processo

eleitoral de 2022 destinadas a aumentar, ainda mais, a transparência do pleito. Entre

outras, mencionou o prazo dobrado (de um ano ao invés de seis meses antes das eleições)

para a investigação dos códigos-fonte do sistema eletrônico de votação e o número seis

vezes maior de urnas que passarão pelo Teste de Integridade nos dias de votação.

Em complemento, agências de checagem e veículos de comunicação desmentiram

todas as fake news propagadas pelo Senhor Jair Messias Bolsonaro, como por exemplo, o

1

Disponível em: < https://www.tse.jus.br/comunicacao/noticias/2022/Julho/em-evento-fachin-rebateafirmacoes-falsas-contra-o-sistema-eletronico-de-voto

> . Acesso em 19 de julho de 2022.


site “Aos Fatos” 2 e o Jornal Estadão. 3 Sublinhe-se que todo esse arsenal de inverdades

difundido pelo Senhor Jair Messias Bolsonaro já tem sido desmentido pela Justiça

Eleitoral e pelas agências de checagens desde 2018, no que não se faz necessário

empreender esforços desmedidos para desmistificar cada uma das afirmações

irresponsáveis proferida pelo Presidente da República. Este Egrégio Tribunal Superior

Eleitoral, que conduz os pleitos com maestria, tem ciência e consciência de que tudo não

passa de uma maledicência patológica direcionada à arrefecer a confiança que a sociedade

brasileira tem depositado na Justiça Eleitoral ao longo dos anos, sobretudo após a

implantação do sistema eletrônico de votação, que foi aperfeiçoado com a biometria.

Deveras, é inegável que o Senhor Jair Messias Bolsonaro, notório pré-candidato à

reeleição pelo PL, aproveitou-se do evento para difundir a gravação do discurso com

finalidade eleitoral, indissociável ao pleito vindouro. Isso porque o ataque à Justiça

Eleitoral e ao sistema eletrônico de votação faz parte da sua estratégia de campanha

eleitoral, de modo que há nítida veiculação de propaganda antecipada negativa em

desfavor da integridade do sistema eleitoral, através de fake news, o que consubstancia-se

em um fato de extrema gravidade.

Urge acentuar, no ponto, que a publicação, de inegável teor eleitoral, ultrapassa as

lindes da liberdade de expressão, porquanto intenta atacar a Justiça Eleitoral e o regime

democrático. Em verdade, ao difundir a mídia nas redes sociais, o Senhor Jair Messias

Bolsonaro agiu com a finalidade de criar estados mentais e passionais negativos na

população, tudo em detrimento da Justiça Eleitoral. É que a publicação assume contornos

extremados, na medida em que, em um contexto nitidamente bélico, o Senhor Jair Messias

2

Disponível em: < https://www.aosfatos.org/noticias/bolsonaro-usa-encontro-com-embaixadores-para-

repetir-informacoes-falsas-sobre-eleicao/?utm_campaign=later-linkinbio-aosfatos&utm_content=later-

28341914&utm_medium=social&utm_source=linkin.bio > . Acesso em 19 de julho de 2022.

3

Disponível em: < https://politica.estadao.com.br/blogs/estadao-verifica/bolsonaro-falseiainformacoes-sobre-processo-eleitoral-em-reuniao-com-embaixadores-estrangeiros/

> . Acesso em 19 de

julho de 2022.


Bolsonaro direciona sua conduta para desacreditar as instituições perante todo o

eleitorado.

Não se pode permitir que, sob as vestes da liberdade de manifestação, se

promovam acintes à integridade do processo eleitoral e ao sistema eletrônico de voto,

com a veiculação de fatos sabidamente inverídicos e que tenham potencial lesivo para

abalar a normalidade do pleito eleitoral que se avizinha, razão pela qual vale-se desta

Representação Eleitoral para que este Tribunal Superior Eleitoral resguarde a

legitimidade e a normalidade do pleito vindouro.

II.

DO DIREITO

II.I DA PROPAGANDA ELEITORAL IRREGULAR (VEICULAÇÃO DE FATOS

SABIDAMENTE INVERÍDICOS E GRAVEMENTE DESCONTEXTUALIZADOS).

DA PROPAGANDA ANTECIPADA NEGATIVA.

De saída, é importante acentuar que não se desconhece o teor do §2º do art. 27 da

Resolução TSE nº 23.610/2019, que estabelece que as manifestações de apoio ou crítica a

partido político ou a candidata ou candidato ocorridas antes do dia 16 de agosto do ano

da eleição, são regidas pela liberdade de manifestação. No entanto, assim como outros

direitos fundamentais, a liberdade de manifestação de pensamento não constitui direito

de caráter absoluto, pois encontra limites na própria Constituição Federal. 4 Até mesmo

4 “A liberdade de manifestação do pensamento não constitui direito de caráter absoluto no ordenamento

jurídico pátrio, pois encontra limites na própria Constituição Federal, que assegura a inviolabilidade da

intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas (art. 5º, X, da CF/88). Outrossim, o Código

Eleitoral, no art. 243, IX, dispõe que "não será tolerada propaganda que caluniar, difamar ou injuriar

quaisquer pessoas, bem como órgãos ou entidades que exerçam autoridade pública".5. As críticas

extrapolaram os limites constitucionais da liberdade de expressão, em ofensa à honra e à dignidade, em

contexto indissociável de disputa a pleito vindouro, o que se amolda ao disposto na referida norma.

Precedentes. (Recurso Especial Eleitoral nº 060010088, Acórdão, Relator(a) Min. Jorge Mussi, Publicação:

DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 164, Data 26/08/2019)


porque, conforme ensina Konrad Hesse, a limitação de direitos fundamentais deve ser

adequada para produzir a proteção do bem jurídico, por cujo motivo ela é afetada. 5

A abertura dialógica que urge no período de pré-campanha (art. 36-A da Lei nº

9.504/1997) não é compatível com discursos de ódio, veiculação de desinformação e

difusão de conteúdo de teor calunioso e difamador em detrimento da honra e da imagem

de terceiros, por exemplo. Isso porque a propagação de fake news em redes sociais

representa uma ferramenta poderosíssima para garantir a adesão de cidadãos, podendo

mesmo fazer com quem acontecimentos falsos assumam a vestes de verdadeiros. 6

Não por outra razão, o art. 9º- A da Resolução TSE nº 23.610/2019 estabelece ser

vedada a divulgação ou compartilhamento de fatos sabidamente inverídicos ou

gravemente descontextualizados que atinjam a integridade do processo eleitoral,

inclusive os processos de votação, apuração e totalização de votos, devendo o juízo

eleitoral determinar a cessação do ilícito, sem prejuízo da apuração de responsabilidade

penal, abuso de poder e uso indevido dos meios de comunicação.

Com efeito, tem-se que a responsabilidade pela difusão de conteúdo sabidamente

inverídico não recai apenas sobre o pré-candidato. É que, de acordo com o art. 9º da

Resolução TSE nº 23.610/2019, “a utilização, na propaganda eleitoral, de qualquer

modalidade de conteúdo, inclusive veiculado por terceiros, pressupõe que a candidata, o

candidato, o partido, a federação ou a coligação tenha verificado a presença de elementos

que permitam concluir, com razoável segurança, pela fidedignidade da informação”.

A inclusão do dispositivo suso mencionado na Resolução TSE nº 23.610/2019, pela

Resolução TSE nº 23.671/2021, exsurgiu da preocupação da Justiça Eleitoral com a

proliferação de fake news, que estonteiam sobremodo a higidez e a normalidade dos

5 HESSE, Konrad. Elementos de Direito Constitucional da República Federativa da Alemanha. Porto

Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1998. p. 256.

6 AGRA, Walber de Moura; VELLOSO, Carlos Mário. Elementos de Direito Eleitoral. 7. Ed. São Paulo:

Saraiva, 2020. P. 257.


pleitos, sobretudo após a disseminação dessas práticas odiosas no contexto das Eleições

2018. Saliente-se, por relevante, que a popularização das redes sociais deve servir para

propiciar o estabelecimento de uma nova ágora, com a ressignificação do regime

democrático, e não para engendrar coros que amplifiquem discursos de ódio e difusão de

fatos sabidamente inverídicos que atentem contra a imagem dos players e a integridade

do processo eleitoral. Se, de um lado, deve-se resguardar o mercado livre de ideias e

garantir a diversidade de opiniões, do outro, há se propiciar o direito de acesso à boa e

saudável informação, capaz de tornar os cidadãos cientes sobre as propostas e ideias dos

pré-candidatos no período de pré-campanha, tal qual estabelece a teleologia do art. 36-A

da Lei das Eleições.

Com efeito, é de bom alvitre sublinhar que, não se pode invocar o direito à

liberdade de manifestação para confortar o cometimento de condutas ilícitas, pois à

maneira do que arrematou a Ministra Cármen Lúcia (MS 38169 MC/DF), “os direitos e

garantias fundamentais, a todos assegurados e que têm de ser respeitados nos termos

constitucionalmente estabelecidos, não são biombos impeditivos da atuação legítima e

necessária do poder estatal, no desempenho de suas atividades legítimas, necessárias e

exercidas nos limites juridicamente definidos”. É do Excelentíssimo Senhor Ministro

Alexandre de Moraes a assertiva de que “liberdade de expressão não é liberdade de

destruição da Democracia, das instituições e da dignidade e honra alheias. Liberdade de

expressão não é liberdade de propagação de discursos mentirosos, agressivos, de ódio e

preconceituosos”. 7

Ainda, de acordo com o §1º do art. 27 da Resolução TSE nº 23.610/2019, a livre

manifestação de pensamento pode ser passível de limitação quando ofender a honra ou

a imagem de candidatas, candidatos, partidos, federações ou coligações, ou divulgar fatos

sabidamente inverídicos. É diante disso que esta Corte Egrégia soergueu entendimento

7

Decisão proferida no plantão judiciário nos autos da Representação Eleitoral nº 0600543-76.2022.6.00.0000.


no sentido de que “as limitações impostas à propaganda eleitoral não afetam os direitos

constitucionais de livre manifestação do pensamento e de liberdade de informação”. 8

É inegável que o Senhor Jair Messias Bolsonaro compartilhou fatos sabidamente

inverídicos e gravemente descontextualizados com o escopo de atingir a integridade do

processo eleitoral, inclusive os processos de votação, apuração e totalização de votos, em

uma violação direta aos disposto no art. 9º-A da Resolução TSE nº 23.610/2019. In casu, o

conteúdo desinformativo foi veiculado de forma dolosa, com manipulação de fatos, em

nítida hipótese que não desafia o limite da liberdade de expressão.

Saliente-se, por relevante, que, por figurar como Chefe de Estado, as falas do

Senhor Jair Messias Bolsonaro têm capacidade de ocasionar uma espécie de efervescência

nos seus apoiadores e na população em geral, ainda mais quando o conteúdo é difundido

através de redes sociais, que possuem um alto alcance entre os usuários. Apesar dos

veículos de informação e das agências de checagem desmentirem os fatos que são sempre

veiculados pelo Senhor Jair Messias Bolsonaro, acerca da integridade do processo

eleitoral, Anna Paula Oliveira Mendes clarifica que “há o problema do descrédito que

certa parte da população pode ter em relação às agências de checagem de fatos, bem como

ao fato de que, muitas vezes, a notícia verificada não tem o mesmo alcance da notícia

mentirosa, que é fabricada especificamente para captar a atenção do público”. 9

Esse quadro caótico causa efeitos danosos ao processo eleitoral, especificamente

no que toca à sua integridade, razão pela qual esta Justiça Eleitoral tem atuado de forma

hercúlea para afastar todos esses impropérios e demonstrar à população que o sistema

eletrônico de votação é íntegro e confiável. Cite-se, por exemplo, que este Egrégio TSE já

se posicionou contra esse tipo de expediente em diversas ocasiões, a saber: a) No RO-EL

8 (Recurso Especial Eleitoral nº 060337225, Acórdão, Relator(a) Min. Luis Felipe Salomão, Publicação: DJE

- Diário de justiça eletrônico, Tomo 56, Data 23/03/2020)

9

MENDES, Anna Paula Oliveira. O abuso do poder no direito eleitoral: uma necessária revisitação ao

instituto. Belo Horizonte: Fórum, 2022. P. 217.


2247-73 e 1251-75, sob a relatoria do Ministro Alexandre de Moraes, acentuou-se que “as

competências constitucionais dessa CORTE ELEITORAL, inclusive no tocante à

fiscalização, são instrumentos necessários para garantir a obrigação constitucional de se

resguardar eleições livres e legítimas; b) No RO-EL 0603975-98, sob a relatoria do

Ministro Luís Felipe Salomão, asseverou-se que “a liberdade de expressão não permite

a propagação de discursos de ódio e ideias contrárias à ordem constitucional e ao

Estado de Direito, inclusive pelos pré-candidatos, candidatos e seus apoiadores, antes

e durante o período de propaganda eleitoral, uma vez que a liberdade do eleitor

depende da tranquilidade e da confiança nas instituições democráticas e no processo

eleitoral”.

Esta Corte já assentou, inclusive, constituir “ato abusivo, a atrair as sanções

eleitorais cabíveis, a promoção de ataques infundados ao sistema eletrônico de votação

e à própria democracia, incutindo-se no eleitorado a falsa ideia de fraude em um

contexto no qual determinado candidato sobrevenha como beneficiário dessa prática”

(RO-EL 0603975-98, sob a relatoria do Ministro Luís Felipe Salomão). Rememora-se, por

relevante, que há amplo arcabouço normativo que prevê ampla publicidade quanto ao

desenvolvimento e à fiscalização do voto eletrônico, com participação dos partidos

políticos e dos demais atores do processo eleitoral, a exemplo do art. 66 da Lei nº

9.504/1997 e da Resolução nº 23.673/2021, que dispõe sobre os procedimentos de

fiscalização e auditoria do sistema eletrônico de votação.

O vídeo difundido, que é objeto desta Representação Eleitoral, trata-se de

veiculação de propaganda antecipada negativa, especificamente por ter sido difundida

antes do dia 16 (dezesseis) de agosto de 2022 (art. 57-A, da Lei nº 9.504/1997). De acordo

com o magistério jurisprudencial do Egrégio Tribunal Superior Eleitoral, “a configuração

de propaganda eleitoral extemporânea negativa pressupõe pedido explícito de não


voto ou, ainda, ato que macule a honra ou a imagem de pré–candidato ou divulgue fato

sabidamente inverídico em seu desfavor”. 10

No caso vertente, a divulgação de fato sabidamente inverídico atinge a integridade

do processo eleitoral, os processos de votação, apuração e totalização de votos, de modo

que a conduta amolda-se perfeitamente à fattispecie de propaganda eleitoral antecipada

na modalidade negativa. Inclusive, cabe mencionar, nesse ponto, que, se o art. 9º-A da

Resolução TSE nº 23.610 veda, no período eleitoral, a divulgação de fato sabidamente

inverídico ou gravemente contextualizado que atinja a integridade do processo eleitoral,

a vedação também incide no período de pré-campanha, eis que a jurisprudência deste

Egrégio TSE “não legitima, no período de pré–campanha, a veiculação de propaganda

por meios que são proscritos durante o período eleitoral, ainda que não haja pedido

explícito de voto”. 11 Ou seja, se a propaganda é ilícita no período permitido, assim

também o é no período de pré-campanha.

À derradeira, destaque-se a lição do Ministro Alexandre de Moraes quando

acentua que “o sensacionalismo e a insensata disseminação de conteúdo inverídico com

tamanha magnitude pode vir a comprometer a lisura do processo eleitoral, ferindo

valores, princípios e garantias constitucionalmente asseguradas, notadamente a

liberdade do voto e o exercício da cidadania”. 12 Deste modo, uma vez constatadas

violações às regras eleitorais e ofensas a integridade do processo eleitoral através da

veiculação de conteúdo sabidamente inverídico, deve esta Justiça Eleitoral promover a

imediata remoção do conteúdo objeto desta Representação, nos termos dos arts. 9º-A e

38, §1º, da Resolução TSE nº 23.610/2019.

10 (RECURSO ESPECIAL ELEITORAL nº 060001836, Acórdão, Relator(a) Min. Benedito Gonçalves,

Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 95, Data 25/05/2022).

11

(0600046-63.2020.6.17.0128 - ARESPE - Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial- Eleitoral nº

060004663 - IBIMIRIM – PE - Acórdão de 11/02/2021 - Relator(a) Min. Mauro Campbell Maques.

Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônico, Tomo 47, Data 16/03/2021, Página 0).

12

Decisão proferida no plantão judiciário nos autos da Representação Eleitoral nº 0600543-76.2022.6.00.0000.


III.

DA MEDIDA LIMINAR DE URGÊNCIA

Já não é novidade que o interstício temporal consubstanciado entre a instauração

do processo e o proferimento de provimento definitivo apresenta demasiados percalços,

em ordem a inviabilizar a efetiva realização de direitos. Para Fernando Horta Tavares, “o

tempo teria um fluir vagaroso, que é incompatível com o virtuoso acesso à ordem jurídica

justa”. 13 Existem situações em que o tempo utilizado para obtenção da certeza processual

com a tutela final é tão grande que o próprio titular do direito terá sucumbido. Em outros

casos, o jurisdicionado que buscou amparo no Poder Judiciário apenas observa inerte o

perecimento do direito que buscou tutelar. Partindo dessas premissas, Marcelo Abelha

assevera que o tempo é amigo da estabilidade da situação lamentada, no que quanto mais

o processo demora para efetivar o resultado pretendido, tanto mais tempo permanecerá

de pé a situação injusta, causando danos ao longo do seu curso. 14

No caso vertente, a probabilidade do direito ressoa inconteste, especialmente

diante da demonstração de violação à Lei nº 9.504/1997, à Resolução TSE nº 23.610/2019

e à jurisprudência deste Egrégio Tribunal Superior Eleitoral. Já o perigo de dano

perfectibiliza-se pelo potencial da conduta perpetrada pelo Representado continuar a

estorvar e macular a integridade do processo eleitoral, máxime em razão do meio de

veiculação do ilícito, a saber, rede social que conta com amplo número de seguidores e

engajamento impossível de se mensurar. Vale dizer, não se pode permitir que a postagem

continue a ser albergada e difundida através da internet, o que inevitavelmente ocasionará

acintes à normalidade e à legitimidade do pleito vindouro.

13 TAVARES, Fernando Horta. Tempo e processo. In: TAVARES, Fernando Horta (Coord.). Urgências de

Tutela: processo cautelar e tutela antecipada. Curitiba: Juruá, 2007. P. 111.

14 ABELHA, Marcelo. Manual de direito processual civil. 6. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016. P. 382.


IV.

DOS PEDIDOS

Pelo fio do exposto, requer a Vossa Excelência o seguinte:

a) A concessão de medida liminar inaudita alter pars, para determinar que os

Representados e a empresa provedora e controladora do Instagram e do Facebook,

promovam a imediata retirada da postagem objeto desta Representação, que se

encontra albergada nos seguintes links: <

https://web.facebook.com/jairmessias.bolsonaro/videos/615113366527954> e <

https://www.instagram.com/p/CgKoLgNo5um/> ; tudo nos termos dos arts. 9º-

A e 38 §1º, da Resolução TSE nº 23.610/2019, sob pena de imputação em crime de

desobediência e multa a ser arbitrada por Vossa Excelência, dobrando-se a cada

reincidência;

b) A notificação dos Representados para, querendo, apresentarem defesa (art. 18

da Resolução TSE nº 23.608/2019);

c) O envio dos autos ao Ministério Público Eleitoral;

d) No mérito, seja confirmada a medida liminar, caso deferida, com a remoção

definitiva do conteúdo ora atacado, que se encontra albergado nos seguintes links:

< https://web.facebook.com/jairmessias.bolsonaro/videos/615113366527954> e

< https://www.instagram.com/p/CgKoLgNo5um/>; e o julgamento pela

procedência dos pedidos deduzidos nesta petição inicial, para condenar os

Representados ao pagamento da multa prevista no art. 36, §3º da Lei nº 9.504/1997,

em patamar máximo, devido à veiculação de propaganda antecipada negativa.

Protesta provar o alegado por todos os meios de prova em direito admitida,

notadamente pelas que instruem a presente Representação.

Nestes termos, pede deferimento.

Brasília (DF), 19 de julho de 2022.


WALBER DE MOURA AGRA

ALISSON LUCENA

OAB/PE 757-B OAB/PE 37.719

IAN RODRIGUES DIAS

OAB/DF 10.074 OAB/RJ 62.818

MARCOS RIBEIRO DE RIBEIRO

MARA HOFANS

ANA CAROLINE LEITÃO

OAB/RJ 68.152 OAB/PE 49.456

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