Vida e morte da dança - Fonoteca Municipal de Lisboa
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Sexta-feira<br />
21 Agosto 2009<br />
www.ipsilon.pt<br />
<strong>Vi<strong>da</strong></strong> e <strong>morte</strong> <strong>da</strong> <strong>da</strong>nça<br />
Manuel MozosCharlie KaufmanLee FieldsSizoGol<strong>de</strong>n Silvers<br />
CHARLES E. ROTKIN/CORBIS ESTE SUPLEMENTO FAZ PARTE INTEGRANTE DA EDIÇÃO Nº 7066 DO PÚBLICO, E NÃO PODE SER VENDIDO SEPARADAMENTE
Flash<br />
Sumário<br />
Dança 4<br />
Questões <strong>de</strong> herança e<br />
transmissão, no “<strong>da</strong>y-after”<br />
<strong>da</strong>s <strong>morte</strong>s <strong>de</strong> Pina Bausch e<br />
Merce Cunningham<br />
Manuel Mozos 11<br />
Filma uma família que o<br />
amor liga, mesmo quando<br />
separa, em “Quatro Copas”<br />
Charlie Kaufman 14<br />
Dentro <strong>da</strong> cabeça mais<br />
peculiar <strong>de</strong> Hollywood,<br />
a propósito do novo<br />
“Sinédoque, Nova Iorque”<br />
Lee Fields 16<br />
Como é que este homem<br />
não tem <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> discos<br />
gravados?<br />
Sizo 18<br />
Ao terceiro EP, já são um caso<br />
sério do ano português<br />
Gol<strong>de</strong>n Silvers 20<br />
Fizeram o single <strong>de</strong>ste Verão,<br />
e mais?<br />
Ficha Técnica<br />
Director José Manuel Fernan<strong>de</strong>s<br />
Editor Vasco Câmara, Inês Na<strong>da</strong>is<br />
(adjunta)<br />
Conselho editorial Isabel<br />
Coutinho, Óscar Faria, Cristina<br />
Fernan<strong>de</strong>s, Vítor Belanciano<br />
Design Mark Porter, Simon<br />
Esterson, Kuchar Swara<br />
Directora <strong>de</strong> arte Sónia Matos<br />
Designers Ana Carvalho, Carla<br />
Noronha, Mariana Soares<br />
Editor <strong>de</strong> fotografia Miguel<br />
Ma<strong>de</strong>ira<br />
E-mail: ipsilon@publico.pt<br />
2 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon<br />
John Landis vem<br />
dormir ao MOTELx<br />
É a mais recente novi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong><br />
programação do MOTELx – a<br />
terceira edição do Festival<br />
Internacional <strong>de</strong> Cinema <strong>de</strong><br />
Terror <strong>de</strong> <strong>Lisboa</strong> traz a <strong>Lisboa</strong><br />
John Landis, o autor <strong>de</strong> “Um<br />
Lobisomem Americano em<br />
Londres” e “Não Há Pescoço<br />
que Aguente” (mas também <strong>de</strong><br />
“Os Ricos e os Pobres”, “A<br />
República dos Cucos” ou “Pela<br />
Noite Dentro”). Um dos<br />
cineastas-chave do cinema<br />
americano <strong>da</strong> déca<strong>da</strong> <strong>de</strong> 1980,<br />
“especialista” na conjugação do<br />
humor e do horror, Landis tem<br />
passado a última déca<strong>da</strong> activo<br />
maioritariamente na televisão,<br />
para a qual realizou episódios<br />
<strong>da</strong>s séries “Masters of Horror” e<br />
“Fear Itself” e dois<br />
documentários aclamadíssimos<br />
(“Slasher”, sobre os ven<strong>de</strong>dores<br />
<strong>de</strong> automóveis, e “Mr.<br />
Warmth”, sobre o comediante<br />
Don Rickles). Aproveitando a<br />
presença do realizador, o<br />
MOTELx, que <strong>de</strong>corre entre 2 e<br />
6 <strong>de</strong> Setembro no cinema São<br />
Jorge, homenageia-o com a<br />
projecção do seminal “Um<br />
Lobisomem Americano em<br />
Londres”. O festival, que traz<br />
igualmente a <strong>Lisboa</strong> outro<br />
veterano do cinema <strong>de</strong> género,<br />
Stuart Gordon, fechou<br />
entretanto a programação <strong>da</strong><br />
sua secção principal, com a<br />
entra<strong>da</strong> <strong>de</strong> um dos mais<br />
recentes filmes do imparável<br />
nipónico Takashi Miike,<br />
“Detective Story”.<br />
Mais informações<br />
em www.<br />
motelx.org.<br />
John Landis é o coelho<br />
na cartola do festival<br />
Os diários <strong>de</strong> Byrne<br />
em bicicleta<br />
O músico e realizador David<br />
Byrne, um dos fun<strong>da</strong>dores dos<br />
Talking Heads (e também artista<br />
plástico: faz fotografia e<br />
instalações), acaba <strong>de</strong> publicar<br />
no Reino Unido o seu sexto<br />
livro, “Bicycle Diaries”. Des<strong>de</strong><br />
os anos 80 que o meio <strong>de</strong><br />
transporte preferido <strong>de</strong> David<br />
Byrne (57 anos) em Nova Iorque<br />
é a bicicleta. “Quando fiz a<br />
Bergman<br />
e as<br />
mulheres<br />
<strong>de</strong>ram<br />
um livro<br />
Que o cinema <strong>de</strong> Ingmar<br />
Bergman é uma fonte<br />
inesgotável <strong>de</strong> fascínio e<br />
admiração não é novi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
nenhuma, e que a relação<br />
entre a sua arte e a sua<br />
conturba<strong>da</strong> vi<strong>da</strong> priva<strong>da</strong><br />
era bem maior do que<br />
pareceria à primeira vista<br />
ain<strong>da</strong> menos. Mas o crítico<br />
britânico Geoffrey Macnab,<br />
colaborador regular do<br />
jornal “The Guardian” e <strong>da</strong><br />
revista “Sight & Sound”,<br />
mergulha até ao fundo<br />
<strong>de</strong>ssas “ligações perigosas”<br />
no novo estudo biográfico<br />
“The Life and Films of the<br />
Last Great European<br />
Director” (acabado <strong>de</strong><br />
publicar em Inglaterra pela<br />
I. B. Tauris). Nele, Macnab<br />
cruza as vi<strong>da</strong>s pessoal e<br />
profissional do realizador<br />
para <strong>de</strong>sven<strong>da</strong>r exactamente<br />
quanto <strong>de</strong> pessoal<br />
era visível nos seus filmes, e<br />
<strong>de</strong>dica especial atenção às<br />
suas complexas relações<br />
emocionais e profissionais<br />
com as actrizes que dirigiu,<br />
muitas <strong>da</strong>s quais cita<strong>da</strong>s no<br />
livro através <strong>de</strong> entrevistas<br />
inéditas – e com três <strong>da</strong>s<br />
quais teve casos mais ou<br />
menos longos (Harriet<br />
An<strong>de</strong>rsson, Bibi An<strong>de</strong>rsson<br />
e Liv Ullmann)<br />
O crítico pinta um retrato<br />
<strong>de</strong> Bergman como um<br />
cineasta intenso, obcecado,<br />
quase tirânico (mais com os<br />
técnicos, mas também com<br />
os actores), que, nas<br />
palavras <strong>da</strong> sua assistente<br />
Katinka Farago, “<strong>da</strong>va tudo<br />
<strong>de</strong> si em ca<strong>da</strong> cena <strong>de</strong> ca<strong>da</strong><br />
filme e queria que todos à<br />
sua volta fizessem o mesmo”.<br />
Bibi An<strong>de</strong>rsson queixou-se,<br />
uma vez, que Bergman<br />
não gostava que as<br />
suas actrizes entrassem no<br />
Intenso, obcecado, quase tirânico:<br />
o novo retrato a corpo inteiro <strong>de</strong> Bergman<br />
“plateau” sem i<strong>de</strong>ias próprias<br />
sobre as personagens,<br />
mas que era capaz <strong>de</strong> discussões<br />
terríveis quando essas<br />
i<strong>de</strong>ias não coincidiam com as<br />
suas. E Harriet An<strong>de</strong>rsson<br />
aponta que o realizador<br />
parecia atribuir-lhe papéis<br />
consoante se estivessem a<br />
<strong>da</strong>r melhor ou pior na altura.<br />
Mas, apesar <strong>de</strong> tudo, to<strong>da</strong>s<br />
elas não trocariam por na<strong>da</strong><br />
a experiência <strong>de</strong> serem<br />
dirigi<strong>da</strong>s por Bergman -<br />
mesmo a faleci<strong>da</strong> Ingrid<br />
Bergman, que o esbofeteou<br />
nas ro<strong>da</strong>gens <strong>de</strong> “Sonata <strong>de</strong><br />
Outono”, ou Lena Olin, que<br />
incorreu no <strong>de</strong>sagrado do<br />
realizador por ter engravi<strong>da</strong>do<br />
durante os ensaios <strong>de</strong><br />
uma peça <strong>de</strong> Strindberg.<br />
Macnab aponta que nenhum<br />
outro realizador europeu<br />
seu contemporâneo terá<br />
Com Liv Ullmann,<br />
<strong>de</strong> quem teve uma filha
estado tão atento e sido tão<br />
compre-ensivo com a vi<strong>da</strong><br />
emocio-nal do sexo<br />
feminino e, a propósito, Liv<br />
Ullmann, mãe <strong>de</strong> Linn, a<br />
mais jovem <strong>da</strong>s nove filhas<br />
e filhos <strong>de</strong> Bergman, fez<br />
esta confis-são: “Pela<br />
primeira vez en-contrei um<br />
realizador que me <strong>de</strong>ixou<br />
expressar emo-ções e i<strong>de</strong>ias<br />
que mais nin-guém tinha<br />
visto em mim.”<br />
Jorge Mourinha<br />
David Byrne<br />
não larga a bicicleta<br />
AFP<br />
minha primeira tentativa, sentime<br />
liberto e com imensa<br />
energia. Foi estimulante circular<br />
pelas ruas sujas. No final dos<br />
anos 80 <strong>de</strong>scobri as bicicletas<br />
<strong>de</strong>smontáveis, e quando ou o<br />
meu trabalho ou a minha<br />
curiosi<strong>da</strong><strong>de</strong> me levam para<br />
outras partes do mundo<br />
costumo levar uma bicicleta<br />
comigo”, escreve ele.<br />
No novo livro, Byrne conta<br />
como foram as suas viagens em<br />
bicicleta em oito ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s:<br />
Londres, Berlim, Istambul,<br />
Buenos Aires, Manila, Sydney,<br />
São Francisco e Nova Iorque. E<br />
também por outros sítios <strong>da</strong><br />
América. O jornal britânico<br />
“The Guardian”, que já leu o<br />
livro, acredita que este tem<br />
muito em comum com “What I<br />
Talk About When I Talk About<br />
Running”, do romancista<br />
japonês Haruki Murakami (que<br />
vai ser publicado em Portugal<br />
pela Casa <strong>da</strong>s Letras). Ambos os<br />
livros reflectem o que os autores<br />
vão meditando e pensando<br />
enquanto atravessam as ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
(um <strong>de</strong> bicicleta e outro a pé).<br />
Escreve também o crítico do<br />
“The Guardian” que este não é<br />
um livro on<strong>de</strong> se apren<strong>de</strong> a<br />
mu<strong>da</strong>r um pneu ou a tapar um<br />
furo. Não é um guia <strong>da</strong>queles<br />
em que nos dizem que tipo <strong>de</strong><br />
bicicleta comprar, apesar <strong>de</strong> no<br />
final do livro existir um capítulo<br />
com algumas dicas. A<br />
<strong>de</strong>termina<strong>da</strong> altura David Byrne<br />
está a falar dos ciclistas novaiorquinos<br />
e escreve: “Talvez<br />
seja irrealista mas acho que se<br />
os ciclistas querem ser mais<br />
bem tratados pelos motoristas e<br />
pelos peões têm que obe<strong>de</strong>cer<br />
às regras <strong>de</strong> trânsito tal como<br />
eles esperam que os carros o<br />
façam.” Um aviso sensato.<br />
Novas edições<br />
no centenário<br />
<strong>da</strong> <strong>morte</strong> <strong>de</strong> Eucli<strong>de</strong>s<br />
<strong>da</strong> Cunha<br />
O centenário <strong>da</strong> <strong>morte</strong> <strong>de</strong><br />
Eucli<strong>de</strong>s <strong>da</strong> Cunha, autor <strong>de</strong> “Os<br />
Sertões” (obra <strong>de</strong> ciência e<br />
literatura), está a ser assinalado<br />
no Brasil <strong>de</strong> várias maneiras.<br />
Jornalista, escritor, poeta,<br />
historiador, engenheiro,<br />
Eucli<strong>de</strong>s <strong>da</strong> Cunha morreu no<br />
dia 15 <strong>de</strong> Agosto <strong>de</strong> 1909 numa<br />
troca <strong>de</strong> tiros no subúrbio<br />
carioca <strong>de</strong> Pie<strong>da</strong><strong>de</strong>. Tinha 43<br />
anos e foi morto por<br />
Dilermando <strong>de</strong> Assis, em quem<br />
tinha atirado primeiro, quando<br />
confirmou que este era amante<br />
<strong>da</strong> sua mulher, Ana Ribeiro.<br />
Além <strong>da</strong>s exposições “Eucli<strong>de</strong>s<br />
<strong>da</strong> Cunha, uma poética do<br />
espaço brasileiro” na Biblioteca<br />
Nacional e “Eucli<strong>de</strong>s, um<br />
Eucli<strong>de</strong>s <strong>da</strong> Cunha<br />
está a ser re<strong>de</strong>scoberto<br />
brasileiro” na Aca<strong>de</strong>mia<br />
Brasileira <strong>de</strong> Letras, vão ser<br />
publicados vários livros. Em<br />
Setembro, divulgou o<br />
suplemento “Prosa & Verso” do<br />
jornal “O Globo” <strong>de</strong>sta semana,<br />
vai ser edita<strong>da</strong> na editora Ateliê<br />
Editorial a biografia<br />
“Eucli<strong>de</strong>s <strong>da</strong> Cunha: Uma<br />
Odisseia nos Trópicos”,<br />
escrita pelo professor <strong>de</strong><br />
literatura norte-americano<br />
Fre<strong>de</strong>ric Amory, que morreu<br />
em Fevereiro. Também nos<br />
próximos meses vai para as<br />
livrarias brasileiras “Eucli<strong>de</strong>s<br />
<strong>da</strong> Cunha: Poesia Reuni<strong>da</strong>”,<br />
uma antologia organiza<strong>da</strong> pelos<br />
professores Francisco Foot<br />
Hardman e Leopoldo M.<br />
Bernucci e edita<strong>da</strong> pela Unesp.<br />
É uma edição comenta<strong>da</strong> que<br />
junta num só volume a<br />
produção poética <strong>de</strong> Eucli<strong>de</strong>s,<br />
que estava dispersa, bem como<br />
algum material inédito. São 133<br />
poemas (inéditos, dispersos e<br />
variantes <strong>de</strong> alguns poemas).<br />
Estes professores universitários<br />
<strong>de</strong>moraram <strong>de</strong>z anos a concluir<br />
este projecto: ao “Prosa &<br />
Verso”, Foot Hardman explicou<br />
que “a letra <strong>de</strong>le é dificílima, o<br />
estado do material não é<br />
excelente, o trabalho <strong>de</strong><br />
transcrição dos manuscritos<br />
não foi fácil.” Por fim, a editora<br />
brasileira Nova Aguilar vai<br />
reeditar a “Obra Completa”,<br />
com organização do professor<br />
Paulo Roberto Pereira.<br />
Mike Nichols<br />
leva mais um<br />
romance<br />
<strong>de</strong> Highsmith<br />
ao cinema<br />
“Águas Profun<strong>da</strong>s”,<br />
o romance que<br />
Patricia Highsmith<br />
publicou em 1957,<br />
vai ser a<strong>da</strong>ptado ao<br />
cinema por Mike<br />
Nichols numa<br />
produção <strong>da</strong> Fox<br />
2000. Quem o diz é a<br />
revista “Variety”, que<br />
sabe ain<strong>da</strong> que a a<strong>da</strong>ptação<br />
do romance caberá ao<br />
argumentista Joe Penhall, que<br />
recentemente também escreveu<br />
o argumento que a<strong>da</strong>pta ao<br />
cinema “A Estra<strong>da</strong>”, <strong>de</strong> Cormac<br />
McCarthy. O romance escrito<br />
pela autora <strong>de</strong> “O Talentoso Mr.<br />
Ripley” (também já a<strong>da</strong>ptado ao<br />
cinema) conta a história <strong>de</strong> um<br />
casal norte-americano, Victor<br />
Van Allen e Melin<strong>da</strong>, que<br />
parecia ter um casamento<br />
perfeito. Mas Melin<strong>da</strong> tem<br />
amantes e tudo se complica<br />
quando estes começam a<br />
morrer.<br />
“Bleach” inclui um segundo<br />
CD com um registo inédito <strong>de</strong> 1990<br />
Depois do labirinto<br />
<strong>de</strong> “Closer”, o labirinto<br />
<strong>de</strong> “Águas Profun<strong>da</strong>s”<br />
Primeiro álbum<br />
dos Nirvana em<br />
reedição <strong>de</strong> luxo<br />
Há mais um álbum mítico a fazer 20<br />
anos em 2009 (há umas semanas<br />
estávamos aqui a falar <strong>de</strong><br />
“Doolittle”, dos Pixies) e a ter direito<br />
a uma reedição <strong>de</strong> luxo. “Bleach”, a<br />
primeira coisa que os Nirvana<br />
fizeram juntos, vai voltar a sair no<br />
Outono (a <strong>da</strong>ta certa é 3 <strong>de</strong> Novembro),<br />
agora em versão revista e<br />
aumenta<strong>da</strong>, com o selo <strong>da</strong> Sub Pop,<br />
a editora original <strong>da</strong> ban<strong>da</strong> <strong>de</strong> Kurt<br />
Cobain. O novo “Bleach” vai ser um<br />
CD duplo que inclui, além <strong>da</strong>s 13<br />
canções do disco, o registo inédito<br />
<strong>de</strong> uma actuação dos Nirvana no<br />
Pine Street Theatre <strong>de</strong> Portland, a 9<br />
<strong>de</strong> Fevereiro <strong>de</strong> 1990 (“featuring”,<br />
por exemplo, “About a girl” e uma<br />
“cover” <strong>de</strong> “Molly’s Lips”, dos<br />
Vaselines) e um livrinho <strong>de</strong> 16<br />
páginas com fotografias que nunca<br />
foram mostra<strong>da</strong>s. Tal como o álbum<br />
original, o duplo LP também vai<br />
estar disponível em vinil branco.<br />
Jack Endino, que em 1989 gravou<br />
“Bleach” em apenas 30 horas, foi o<br />
produtor chamado para remasterizar<br />
a reedição. Já não tem gran<strong>de</strong>s<br />
memórias <strong>da</strong>s sessões <strong>de</strong> gravação<br />
mas tem memória <strong>de</strong> ter passado a<br />
ser reconhecido por isso, disse à<br />
“Rolling Stone”: “Quando conheci o<br />
Iggy Pop, ele disse-me: ‘Ah sim, tu<br />
fizeste aquele gran<strong>de</strong> álbum dos<br />
Nirvana’. Estava efusivo, completamente<br />
pasmado, e não parava <strong>de</strong><br />
dizer que adorava aquilo”.<br />
Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 3<br />
MARK SELIGER/CORBIS OUTLINE
TIMOTHY A. CLARY/ AFP<br />
E para on<strong>de</strong> vai a<br />
<strong>da</strong>nça quando não<br />
estamos a olhar?<br />
É imaginar pinturas a serem retira<strong>da</strong>s <strong>da</strong>s pare<strong>de</strong>s dos museus ou livros<br />
a sair <strong>da</strong>s lojas e bibliotecas no dia <strong>da</strong> <strong>morte</strong> dos seus autores. É imaginar<br />
um poema a não voltar a ser dito. Na <strong>da</strong>nça, é assim – com a <strong>morte</strong>,<br />
as luzes <strong>de</strong> cena começam lentamente a apagar-se. Nos últimos meses<br />
per<strong>de</strong>mos Pina Bausch e Merce Cunningham, dois gigantes. Alguém sabe<br />
o que vai acontecer às obras com que mu<strong>da</strong>ram o mundo? Vanessa Rato<br />
4 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon
“É preciso amar a <strong>da</strong>nça para continuar<br />
a <strong>da</strong>nçar. Não nos <strong>de</strong>volve na<strong>da</strong>,<br />
nenhuns manuscritos para guar<strong>da</strong>r,<br />
nenhumas pinturas para pendurar nos<br />
museus, nenhuns poemas para serem<br />
impressos e vendidos, na<strong>da</strong> a não ser<br />
aquele momento fugaz em que nos sentimos<br />
vivos. Não é para almas instáveis.”<br />
Merce Cunningham<br />
Primeiro foi a surpresa, o choque,<br />
<strong>de</strong>pois veio o pânico, com a mesma<br />
pergunta a passar pela cabeça <strong>de</strong> to<strong>da</strong><br />
a gente: e agora?<br />
Afinal, a quem pertence e como se<br />
preserva um tipo <strong>de</strong> legado que, por<br />
<strong>de</strong>finição, é imaterial, um património<br />
como a <strong>da</strong>nça, que existe apenas no<br />
momento em que o corpo <strong>de</strong> alguém<br />
a recebe? A <strong>da</strong>nça é uma questão <strong>de</strong><br />
apropriação e, por isso mesmo, <strong>de</strong><br />
constante contaminação e transformação.<br />
Uma dinâmica <strong>de</strong> vi<strong>da</strong>. O contrário<br />
<strong>de</strong> <strong>morte</strong>. E, contudo...<br />
26 <strong>de</strong> Julho <strong>de</strong> 2009: Merce Cunningham,<br />
um dos génios maiores <strong>da</strong><br />
transformação <strong>da</strong> <strong>da</strong>nça numa forma<br />
<strong>de</strong> arte mo<strong>de</strong>rna, morre em casa, em<br />
Nova Iorque, aos 90 anos.<br />
30 <strong>de</strong> Junho <strong>de</strong> 2009: Pina Bausch,<br />
a voz mais transformadora e influente<br />
<strong>da</strong> <strong>da</strong>nça europeia <strong>da</strong>s últimas três<br />
déca<strong>da</strong>s, morre inespera<strong>da</strong>mente em<br />
Wuppertal, na Alemanha, aos 68 anos,<br />
apenas cinco dias <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> se saber<br />
doente com um cancro.<br />
21 <strong>de</strong> Novembro <strong>de</strong> 2007: Maurice<br />
Béjart, o último gran<strong>de</strong> coreógrafo<br />
dos revolucionários Ballets Russes e<br />
ele próprio um dos mais influentes<br />
autores <strong>da</strong> Europa <strong>da</strong>s déca<strong>da</strong>s <strong>de</strong><br />
1960 e 1970, morre em Lausanne, na<br />
Suíça, aos 80 anos, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> um mês<br />
<strong>de</strong> tratamentos cardíacos e renais intensivos.<br />
Capa<br />
Todos eles. E antes <strong>de</strong>les tantos outros.<br />
Martha Graham, José Limón, Alvin<br />
Ailey, Kurt Joos, Dominique Bagouet...<br />
É a nossa memória a <strong>de</strong>saparecer<br />
aos poucos, e tentar travar esse<br />
processo tem sido como tentar segurar<br />
um punhado <strong>de</strong> areia <strong>de</strong>masiado<br />
volumoso para a nossa mão. Tudo a<br />
escapar-se-nos por entre os <strong>de</strong>dos.<br />
“A tragédia <strong>da</strong> <strong>da</strong>nça é que 99 por<br />
cento <strong>da</strong>s peças produzi<strong>da</strong>s <strong>de</strong>saparecem<br />
passados cinco anos”, dizia-nos<br />
a historiadora <strong>de</strong> <strong>da</strong>nça norte-americana<br />
Lynn Garafola há apenas três<br />
meses, por altura do centenário do<br />
nascimento do Ballets Russes, a companhia-revolução<br />
cria<strong>da</strong> por Sergei<br />
Diaghilev na Paris <strong>de</strong> 1909. “Quantas<br />
peças sobrevivem a uma tempora<strong>da</strong>?<br />
Como se passam reportórios quando<br />
as instituições estão permanentemente<br />
a colapsar?”, perguntava-se. Foi<br />
<strong>de</strong>pois que começaram as <strong>morte</strong>s.<br />
Merce foi previ<strong>de</strong>nte e taxativo.<br />
Com ca<strong>da</strong> vez menos energia, confinado<br />
a uma ca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> ro<strong>da</strong>s <strong>de</strong>vido<br />
à artrite que tinha há déca<strong>da</strong>s e longe<br />
<strong>da</strong> figura alta e esguia <strong>de</strong> longo pescoço<br />
cuja invulgar graciosi<strong>da</strong><strong>de</strong> foi<br />
em tempos compara<strong>da</strong> à <strong>de</strong> Nijinsky,<br />
sabia que o fim estava próximo. Organizou<br />
tudo.<br />
Dois meses antes <strong>da</strong> sua <strong>morte</strong><br />
anunciou uma estratégia <strong>de</strong> preservação<br />
patrimonial sem prece<strong>de</strong>ntes. Um<br />
Living Legacy Plan segundo o qual<br />
<strong>de</strong>verão ser angariados junto <strong>de</strong> mecenas<br />
oito milhões <strong>de</strong> dólares a aplicar<br />
em acções metodicamente <strong>de</strong>linea<strong>da</strong>s:<br />
a elaboração <strong>de</strong> um centro <strong>de</strong><br />
documentação do seu percurso dos<br />
anos 1940 à actuali<strong>da</strong><strong>de</strong>; a remontagem<br />
<strong>de</strong> trabalhos seminais; uma última<br />
digressão mundial <strong>da</strong> Merce Cunningham<br />
Dance Company ao longo<br />
dos próximos dois anos; o encerramento<br />
<strong>da</strong> companhia no regresso a<br />
casa, com um plano <strong>de</strong> reconversão<br />
<strong>de</strong> carreiras; e, por fim, a transferência<br />
<strong>de</strong> todos os bens para o Merce Cunningham<br />
Trust, que fica com a gestão<br />
do legado do coreógrafo.<br />
“O Living Legacy Plan é abrangente,<br />
multifacetado e – como o próprio Merce<br />
– pioneiro. Oferece um novo mo<strong>de</strong>lo<br />
para companhias <strong>de</strong> <strong>da</strong>nça e outras<br />
organizações dirigi<strong>da</strong>s por artistas<br />
em trânsito para uma existência pósfun<strong>da</strong>dor”,<br />
dizia em Abril Trevor Carlson,<br />
director executivo <strong>da</strong> Cunningham<br />
Dance Foun<strong>da</strong>tion.<br />
Agora, sem Merce, há quem diga<br />
que vai ser difícil conseguir fundos<br />
para um projecto a três anos. Mas,<br />
com 3,5 milhões <strong>de</strong> dólares reunidos,<br />
os directamente envolvidos mostramse<br />
optimistas. “A companhia já tem<br />
perspectivas e está confiante <strong>de</strong> que<br />
vai conseguir os fundos necessários”,<br />
dizia-nos há três semanas Leah San<strong>da</strong>ls,<br />
assessora <strong>de</strong> imprensa <strong>da</strong> fun<strong>da</strong>ção.<br />
Segundo Leah, os 14 bailarinos neste<br />
momento no activo estu<strong>da</strong>ram<br />
com Merce e estão preparados para<br />
continuar a ensinar a sua técnica,<br />
<strong>da</strong>ndo continui<strong>da</strong><strong>de</strong> a uma linguagem<br />
<strong>de</strong> excelência extrema, enraiza<strong>da</strong> numa<br />
i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> movimento puro, seco<br />
<strong>de</strong> qualquer teatrali<strong>da</strong><strong>de</strong> ou pesquisa<br />
psicológica. É a estes bailarinos que<br />
caberá também assegurar a digressão<br />
já em curso e que em Novembro chega<br />
à Europa, incluindo a apresentação<br />
<strong>de</strong> peças como “Suite for Five”<br />
(1956-1958), a mais antiga do reportório<br />
<strong>da</strong> companhia e com figurinos<br />
<strong>de</strong> Robert Rauschenberg (Mónaco,<br />
dias 14 e 15 <strong>de</strong> Abril) e “Squaregame”,<br />
(1976), uma obra muito raramente<br />
vista, estando por remontar quase<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> a <strong>da</strong>ta <strong>da</strong> sua criação (Charleroi,<br />
Bélgica, 12 a 14 <strong>de</strong> Novembro).<br />
Foi o plano <strong>de</strong> Merce, o visionário<br />
que <strong>de</strong>ixou tudo o que pô<strong>de</strong> – textos,<br />
registos vi<strong>de</strong>ográficos <strong>de</strong> espectáculos,<br />
aulas, ensaios e até uma série<br />
documental a ser difundi<strong>da</strong> via Internet<br />
em que as suas motivações e técnicas<br />
são explica<strong>da</strong>s quer em testemunho<br />
directo quer pela voz <strong>de</strong> especialistas.<br />
Palavras <strong>de</strong>le: “É <strong>de</strong> facto um problema<br />
preservar os elementos <strong>de</strong><br />
uma forma <strong>de</strong> arte que é realmente<br />
evanescente, que é realmente como<br />
a água.”<br />
Como a água, pois: perante as sucessivas<br />
<strong>morte</strong>s, a conheci<strong>da</strong> crítica<br />
<strong>de</strong> <strong>da</strong>nça Judith Mackrell encontrou<br />
palavras particularmente clarivi<strong>de</strong>ntes<br />
para expressar essa espécie <strong>de</strong><br />
evaporação sistemática <strong>da</strong> <strong>da</strong>nça: “É<br />
imaginar a situação em que as pinturas<br />
<strong>de</strong> Rauschenberg ou Bacon fossem<br />
<strong>de</strong>sci<strong>da</strong>s <strong>da</strong>s pare<strong>de</strong>s no momento<br />
“A tragédia <strong>da</strong> <strong>da</strong>nça<br />
é que 99 por cento<br />
<strong>da</strong>s peças produzi<strong>da</strong>s<br />
<strong>de</strong>saparecem<br />
passados cinco anos.<br />
Quantas peças<br />
sobrevivem a uma<br />
tempora<strong>da</strong>?”<br />
Lynn Garafola<br />
Martha<br />
Graham, um<br />
dos casos<br />
mais<br />
controversos<br />
<strong>de</strong><br />
transmissão<br />
do reportório<br />
Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 5
6 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon<br />
Martha Graham<br />
Um prece<strong>de</strong>nte<br />
jurídico<br />
Com uma influência artística<br />
comparável à <strong>de</strong> Picasso,<br />
Stravinsky ou James Joyce,<br />
Martha Graham foi a gran<strong>de</strong><br />
pioneira <strong>da</strong> <strong>da</strong>nça mo<strong>de</strong>rna<br />
nos Estado Unidos, autora<br />
<strong>da</strong> primeira alternativa ao<br />
vocabulário clássico a tornarse<br />
numa técnica usa<strong>da</strong> por<br />
companhias <strong>de</strong> todo o mundo.<br />
Tinha 96 anos quando morreu<br />
em sua casa, em Manhattan,<br />
a 1 <strong>de</strong> Abril <strong>de</strong> 1991, com uma<br />
paragem cardíaca, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong><br />
meses <strong>de</strong> tratamento hospitalar<br />
a uma pneumonia contraí<strong>da</strong><br />
durante uma digressão recente<br />
com a sua companhia pela<br />
Europa <strong>de</strong> Leste. Professora<br />
<strong>de</strong> futuros bailarinos <strong>de</strong><br />
coreógrafos <strong>de</strong> renome como<br />
Alvin Ailey, Twyla Tharp, Paul<br />
Taylor, Merce Cunningham e<br />
Mark Morris – mas também <strong>de</strong><br />
actores como Gregory Peck e<br />
Bette Davis... –, Graham escolheu<br />
em testamento um her<strong>de</strong>iro<br />
universal: Ron Protas, seu<br />
companheiro há 30 anos.<br />
Graham e Protas conheceramse<br />
em 1967. Ele era um estu<strong>da</strong>nte<br />
<strong>de</strong> direito e fotógrafo amador<br />
<strong>de</strong> cerca <strong>de</strong> 20 anos. Ela tinha<br />
70 e problemas <strong>de</strong> <strong>de</strong>pressão e<br />
alcoolismo ligados à retira<strong>da</strong><br />
dos palcos.<br />
Segundo alguns relatos,<br />
apesar <strong>de</strong> não ser uma figura<br />
estima<strong>da</strong> pelos restantes<br />
colaboradores <strong>de</strong> Graham,<br />
Protas terá sido o responsável<br />
pela recuperação <strong>da</strong> coreógrafa<br />
e, com a sua <strong>morte</strong>, acabaria<br />
por se tornar director-geral do<br />
Centro <strong>de</strong> Dança Contemporânea<br />
Martha Graham, lugar que<br />
<strong>de</strong>ixaria em ruptura em 2000,<br />
quando se lançou numa batalha<br />
legal multimilionária pelos<br />
direitos <strong>da</strong>s peças assina<strong>da</strong>s<br />
pela sua companheira.<br />
Um primeiro tribunal, um<br />
tribunal <strong>de</strong> recurso e o Supremo:<br />
todos chegaram à conclusão <strong>de</strong><br />
que Graham não podia <strong>de</strong>ixar<br />
a Protas o que não era <strong>de</strong>la,<br />
todos chegaram à conclusão<br />
<strong>de</strong> que, como assalaria<strong>da</strong>,<br />
Graham trabalhava para a<br />
sua companhia, sendo esta<br />
a legítima proprietária <strong>de</strong><br />
quaisquer direitos <strong>de</strong> autor.<br />
Para os responsáveis do centro<br />
e <strong>da</strong> companhia foi um alívio: a<br />
<strong>de</strong>cisão permitiu-lhes continuar<br />
a levar à cena os espectáculos<br />
<strong>de</strong> sempre. Já Protas, que<br />
recebeu os direitos <strong>de</strong> apenas<br />
duas <strong>da</strong>s cerca <strong>de</strong> 180 peças<br />
assina<strong>da</strong>s por Graham e acabou<br />
responsabilizado pelos prejuízos<br />
causados ao centro pela acção<br />
legal, viu o caso como um<br />
aviso aos artistas: “Espero que<br />
percebam que estão em risco. Ela<br />
acreditava que os seus ‘ballets’<br />
lhe pertenciam”, explicou na<br />
altura. Sublinhando: “Estou<br />
zangado com o que está a ser<br />
feito supostamente em nome <strong>de</strong><br />
Martha e dos seus <strong>de</strong>sejos. Com<br />
to<strong>da</strong> a humil<strong>da</strong><strong>de</strong>, eu fui a pessoa<br />
mais próxima <strong>de</strong>la nos últimos<br />
30 anos <strong>da</strong> sua vi<strong>da</strong>. É absurdo<br />
pensar que ela tenha morrido a<br />
consi<strong>de</strong>rar-se uma assalaria<strong>da</strong>.”<br />
Janet Eilbert, actual directora<br />
artística <strong>da</strong> companhia,<br />
reconhece que, para além do<br />
Graham <strong>de</strong>ixou<br />
todos os direitos<br />
<strong>da</strong>s suas peças<br />
a Ron Protas, o seu<br />
companheiro; os<br />
tribunais anularam<br />
a <strong>de</strong>cisão<br />
testamento, Graham não <strong>de</strong>ixou<br />
qualquer <strong>de</strong>claração expressa<br />
sobre o que pretendia que<br />
acontecesse ao seu legado, mas<br />
fala <strong>de</strong> “<strong>de</strong>clarações implícitas”:<br />
“Martha Graham criou o<br />
centro precisamente para que<br />
este protegesse o seu legado.<br />
Era assalaria<strong>da</strong> do centro e<br />
<strong>de</strong>monstrou ao longo dos anos<br />
que queria ver o seu legado<br />
vivo, renovado: documentava<br />
o seu trabalho em filme,<br />
ensinava a sua técnica – as suas<br />
acções <strong>de</strong>monstravam as suas<br />
intenções para o futuro.”<br />
A Protas foram atribuídos<br />
direitos sobre “Seraphic<br />
Dialogue”, uma obra <strong>de</strong> 1955<br />
basea<strong>da</strong> na história <strong>de</strong> Joana<br />
D’Arc, e “Acrobats of God”, <strong>da</strong>ta<strong>da</strong><br />
<strong>de</strong> 1960 (“acrobatas <strong>de</strong> Deus”<br />
era o que Graham chamava aos<br />
bailarinos) – os direitos sobre as<br />
coreografias, porque os direitos<br />
sobre os cenários e figurinos<br />
<strong>da</strong>s mesmas peças ficaram com<br />
o centro. Quando perguntamos<br />
a Janet se imagina ce<strong>de</strong>r esses<br />
materiais a Protas para que<br />
pelo menos as peças possam<br />
continuar a ser feitas, ain<strong>da</strong><br />
que por outras companhias, ela<br />
respon<strong>de</strong>: “Não imagino <strong>de</strong>ixá-lo<br />
ficar com eles. Esperamos que<br />
um dia ele nos <strong>de</strong>ixe a nós <strong>da</strong>nçar<br />
essas peças.” V.R.<br />
Vaslav<br />
Nijinsky<br />
<strong>da</strong> <strong>morte</strong> <strong>de</strong>sses artistas; é imaginar<br />
a situação em que os romances<br />
<strong>de</strong> Saul Bellow fossem retirados <strong>da</strong>s<br />
estantes ou a música <strong>de</strong> Stravinsky<br />
fosse silencia<strong>da</strong>. Nenhuma outra forma<br />
<strong>de</strong> arte aceitaria por um segundo<br />
que a <strong>morte</strong> [<strong>de</strong> um autor] implicasse<br />
a possível <strong>morte</strong> <strong>da</strong> sua obra.”<br />
Da criação ao reportório<br />
Po<strong>de</strong>rá parecer um exagero falar em<br />
silêncio perante um plano como o<br />
<strong>de</strong>ixado por Merce, mas parece bem<br />
menos um exagero perante a incerteza<br />
que paira sobre o Tanztheater Wuppertal<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> a <strong>morte</strong> <strong>de</strong> Pina. “A<br />
única coisa que sabemos é que vamos<br />
manter as <strong>da</strong>tas agen<strong>da</strong><strong>da</strong>s”, dizia-nos<br />
há dias Ursula Popp, porta-voz <strong>da</strong><br />
companhia, explicando que “na<strong>da</strong> do<br />
resto está <strong>de</strong>cidido”.<br />
Depois <strong>de</strong> semanas em que a companhia<br />
teve a sua página na Internet<br />
suspensa, nesta vê-se agora um plano<br />
<strong>de</strong> espectáculos até Julho <strong>de</strong> 2010. Segundo<br />
Popp, Pina não <strong>de</strong>ixou qualquer<br />
testamento ou vonta<strong>de</strong> escrita<br />
no que toca ao seu legado: “É difícil<br />
dizer. Ela sempre quis que [a companhia]<br />
continuasse, mas não havia qualquer<br />
indicação específica.”<br />
Entre os bailarinos, o francês Dominique<br />
Mercy e a espanhola Nazareth<br />
Pana<strong>de</strong>ro são os mais velhos,<br />
estando em Wuppertal praticamente<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> a fun<strong>da</strong>ção <strong>da</strong> companhia, em<br />
1973; conhecedores profundos <strong>da</strong>s<br />
metodologias e motivações <strong>da</strong> coreógrafa,<br />
seriam sucessores possíveis.<br />
Mas à frente <strong>de</strong> quê? De uma companhia<br />
<strong>de</strong> autor feita <strong>de</strong> reportório?<br />
Para esse cenário, há o exemplo do<br />
Béjart Ballet Lausanne on<strong>de</strong> nos últimos<br />
dois anos tem assumido as ré<strong>de</strong>as<br />
o bailarino francês Gil Roman,<br />
que esteve ao lado do seu mestre <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />
os anos 1960 até ao fim.<br />
“As novas peças serão assina<strong>da</strong>s por<br />
ele, como já aconteceu em Dezembro<br />
<strong>de</strong> 2008, e o reportório será uma mistura<br />
entre herança e novas produções”,<br />
diz-nos uma porta-voz <strong>da</strong> companhia.<br />
No site, contudo, há <strong>da</strong>tas<br />
marca<strong>da</strong>s apenas até Outubro <strong>de</strong>ste<br />
ano – o que resta <strong>da</strong> companhia <strong>de</strong> um<br />
autor que nos últimos tempos era visto<br />
como pouco mais do que “kitsch”<br />
mas que assinou obras <strong>de</strong> referência<br />
como “Sinfonia para um Homem Só”<br />
(1955), o primeiro “ballet” <strong>de</strong> sempre<br />
a utilizar música concreta.<br />
José Sasportes, historiador <strong>de</strong> <strong>da</strong>nça<br />
próximo <strong>de</strong> Wuppertal, traça um<br />
quadro igualmente negro para a companhia<br />
<strong>de</strong> Pina: consi<strong>de</strong>ra “bastante<br />
provável” que não resista à falta <strong>de</strong><br />
novas produções, base primeira <strong>da</strong><br />
sua subsistência. “Durante um ano,<br />
dois, é natural que o interesse do público<br />
se mantenha, até como homenagem;<br />
<strong>de</strong>pois, quando não houver<br />
‘tournées’ [com novas produções], a<br />
companhia acaba.”<br />
Optimismo zero: na opinião <strong>de</strong> Sasportes,<br />
encerra<strong>da</strong> a companhia, <strong>da</strong>s<br />
cerca <strong>de</strong> 40 obras assina<strong>da</strong>s por Bausch<br />
ao longo dos últimos 36 anos o<br />
mais expectável é que apenas três<br />
subsistam – “Orfeu e Eurídice” e “A<br />
Sagração <strong>da</strong> Primavera”, ambas <strong>de</strong><br />
1975 e ambas ofereci<strong>da</strong>s à Ópera <strong>de</strong><br />
Paris, cuja companhia Pina instruiu<br />
pessoalmente e que em qualquer altura<br />
as po<strong>de</strong>rá ter em cena, e “Kontakthof”,<br />
uma peça <strong>de</strong> 1978 que a<br />
coreógrafa foi montando com diferentes<br />
grupos <strong>de</strong> intérpretes.<br />
Quase quatro <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> peças<br />
vota<strong>da</strong>s ao <strong>de</strong>saparecimento, incluindo<br />
ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros marcos <strong>da</strong> contem-
“Durante um ano,<br />
dois, é natural que<br />
o interesse do público<br />
se mantenha, até<br />
como homenagem;<br />
<strong>de</strong>pois, quando<br />
não houver novas<br />
produções,<br />
a companhia acaba”<br />
José Sasportes<br />
poranei<strong>da</strong><strong>de</strong> como “Café Müller”, <strong>de</strong><br />
1978 e a única peça em que vimos<br />
Pina <strong>da</strong>nçar, ou “Palermo, Palermo”,<br />
<strong>de</strong> 1989, a primeira <strong>da</strong> longa série <strong>de</strong><br />
peças sobre ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s que acabaria por<br />
incluir <strong>Lisboa</strong>, com “Mazurca Fogo”,<br />
em 1998. Chocante? É o que tem vindo<br />
a acontecer <strong>de</strong>s<strong>de</strong> sempre. Afinal,<br />
quantas peças <strong>de</strong> Marius Petipa chegaram<br />
até nós?<br />
À frente do Teatro Mariinsky, o “ballet”<br />
imperial <strong>de</strong> São Petersburgo, entre<br />
1871 e 1903, on<strong>de</strong> ensinou e dirigiu bailarinos<br />
míticos como Nijinsky e Anna<br />
Pavlova, Petipa assinou mais <strong>de</strong> 50<br />
produções, trabalhos financiados com<br />
milhões <strong>de</strong> rublos pela corte russa, à<br />
época a mais rica <strong>da</strong> Europa. Se o “ballet”<br />
é hoje entendido como uma forma<br />
<strong>de</strong> arte russa é, precisamente, <strong>de</strong>vido<br />
a Petipa, que resgatou <strong>da</strong> <strong>de</strong>cadência<br />
a tradição francesa e italiana, elevando-a<br />
ao nível <strong>de</strong> excelência e <strong>de</strong> fausto<br />
que hoje i<strong>de</strong>ntificamos como o apogeu<br />
do clássico. E, contudo, para além <strong>de</strong><br />
versões <strong>de</strong> “Giselle”, “Coppélia” e “O<br />
Lago dos Cisnes”, remontagens <strong>de</strong><br />
obras pré-existentes, dos trabalhos <strong>de</strong><br />
Petipa o público <strong>de</strong> hoje i<strong>de</strong>ntificará<br />
pouco mais do que “A Bela Adormeci<strong>da</strong>”,<br />
<strong>de</strong> 1890, “O Quebra-Nozes”, <strong>de</strong><br />
1892, e “Raimun<strong>da</strong>”, <strong>de</strong> 1898.<br />
Mais: apenas uma excepção entre<br />
autores do século XIX – a constituí<strong>da</strong><br />
por August Bournonville, à frente do<br />
Royal Danish Ballet entre 1828 e 1879<br />
on<strong>de</strong> coreografou cerca <strong>de</strong> 50 peças,<br />
<strong>da</strong>s quais à volta <strong>de</strong> 12 continuam hoje<br />
a ser interpreta<strong>da</strong>s pela companhia,<br />
uma <strong>da</strong>s mais antigas do mundo.<br />
É ain<strong>da</strong> José Sasportes quem alerta:<br />
“A história <strong>da</strong> <strong>da</strong>nça sempre se<br />
construiu sobre o efémero, sempre<br />
se <strong>de</strong>itou fora o que se fazia. Até ao<br />
fim do século XIX o que interessava<br />
era o novo. Mas os coreógrafos tinham<br />
discípulos, mantinha-se o modo<br />
<strong>de</strong> fazer.”<br />
Começar do zero<br />
Discípulos, uma tradição passa<strong>da</strong> <strong>de</strong><br />
geração em geração: era a lógica anterior<br />
à hoje omnipresente estratégia<br />
<strong>da</strong>s companhias centra<strong>da</strong>s num autor<br />
e seus produtores que, para conter<br />
custos, contratam intérpretes apenas<br />
no momento <strong>da</strong>s novas criações; é a<br />
lógica que começou a morrer com as<br />
gran<strong>de</strong>s companhias <strong>de</strong> reportório,<br />
uma figura hoje em extinção perante<br />
a carência <strong>de</strong> apoios. O tipo <strong>de</strong> carência<br />
que levou, entre outras, à dissolução<br />
do Frankfurt Ballet, fun<strong>da</strong>do em<br />
1984 por William Forsythe, talvez o<br />
mais brilhante dos coreógrafos que<br />
continuam a trabalhar e reinventar o<br />
vocabulário clássico.<br />
Depois <strong>de</strong> 20 anos à frente do<br />
Frankfurt Ballet, Forsythe enten<strong>de</strong>u<br />
que os cortes <strong>de</strong> financiamentos estatais<br />
com que se confrontava com-<br />
PAULO PIMENTA<br />
Pina Bausch<br />
em “Café<br />
Muller”<br />
(1978), a única<br />
peça em que a<br />
vimos <strong>da</strong>nçar<br />
e que ain<strong>da</strong><br />
em 2008 repôs<br />
em <strong>Lisboa</strong><br />
prometiam irremediavelmente a quali<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
do seu projecto artístico. Optou<br />
por abandonar a companhia,<br />
criando outra, a Forsythe Company,<br />
com apenas 18 bailarinos, contra os<br />
42 com que o Ballet <strong>de</strong> Frankfurt começou<br />
e os 34 a que estava reduzido<br />
na altura <strong>da</strong> dissolução.<br />
“O que lamento é a falta <strong>de</strong> continui<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
numa estrutura que estava<br />
tão bem organiza<strong>da</strong>”, disse à época<br />
o coreógrafo. Explicando: “Ao longo<br />
dos últimos 20 anos, passaram pela<br />
companhia 130 bailarinos. O conhecimento<br />
foi passado. A quebra disso<br />
é <strong>de</strong>vastadora.”<br />
Vera Mantero, uma <strong>da</strong>s mais consi<strong>de</strong>ra<strong>da</strong>s<br />
autoras <strong>da</strong> chama<strong>da</strong> Nova<br />
Dança Portuguesa, menciona uma<br />
<strong>da</strong>s consequências mais <strong>de</strong>sconcertantes<br />
<strong>da</strong> falta <strong>de</strong> passagem <strong>de</strong> conhecimento<br />
na sua área: a permanente<br />
sensação <strong>de</strong> se estar a começar do<br />
zero (perspectiva dos criadores); isso<br />
ou o sentimento cíclico <strong>de</strong> estar a viver<br />
um “déjà vu” ten<strong>de</strong>ncialmente<br />
mais pobre do que a experiência original,<br />
acrescentaríamos nós (perspectiva<br />
do público).<br />
Uma simples biblioteca: “Quando<br />
fui para Nova Iorque [nos anos 1980],<br />
no fim, quando já nem estava a fazer<br />
aulas <strong>de</strong> <strong>da</strong>nça, passava a vi<strong>da</strong> na biblioteca<br />
<strong>de</strong> artes performativas do<br />
Lincoln Center, a ver to<strong>da</strong>s aquelas<br />
peças fantásticas dos arquivos <strong>de</strong> ví<strong>de</strong>o.<br />
Não há transmissão <strong>de</strong> conhecimento,<br />
não há ensino sem este tipo<br />
<strong>de</strong> ferramenta. Desaparece tudo o que<br />
foi feito sem que as coisas novas fiquem<br />
também regista<strong>da</strong>s.”<br />
Em Nova Iorque há o Licoln Center<br />
e a Public Library, em Paris o arquivo<br />
do Centre National <strong>de</strong> La Danse, com<br />
fundos que vão do espólio <strong>de</strong> Lisa<br />
MUSEU DO ORIENTE<br />
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Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 7
“Comer o<br />
Coração”, <strong>de</strong><br />
Vera Mantero<br />
e Rui Chafes<br />
Ullman, colaboradora <strong>de</strong> Kurt Jooss<br />
e Rudolf Laban, a material <strong>de</strong> coreógrafos<br />
<strong>de</strong> hoje como Jérôme Bel, o<br />
Fundo Rodolf Noureyev e o Arquivo<br />
Isabelle Ginot, sobre Dominique Bagouet.<br />
Em Portugal, o Fórum Dança<br />
tem tentado manter um pequeno arquivo<br />
vi<strong>de</strong>ográfico <strong>de</strong> novas produções,<br />
mas que nem sempre consegue<br />
actualizar, sobretudo em termos internacionais.<br />
De resto, o registo <strong>de</strong><br />
algumas obras importantes <strong>da</strong> história<br />
<strong>da</strong> <strong>da</strong>nça contemporânea portuguesa<br />
po<strong>de</strong> estar <strong>de</strong>finitivamente<br />
perdido. Como acontece com “Gust”,<br />
<strong>de</strong> Francisco Camacho.<br />
Estrea<strong>da</strong> em 1997 e consi<strong>de</strong>ra<strong>da</strong><br />
uma <strong>da</strong>s melhores produções <strong>de</strong> sempre<br />
<strong>da</strong> <strong>da</strong>nça portuguesa in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte,<br />
“Gust” acabou por ficar regista<strong>da</strong><br />
apenas num plano geral <strong>de</strong> quali<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
fraca, imagem <strong>de</strong> “régie” sem pormenores<br />
individuais e a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> uma<br />
reposição, ain<strong>da</strong> que apenas para filmagens,<br />
é complexa. Para além dos<br />
custos, há que ter em conta os 12 anos<br />
entretanto <strong>de</strong>corridos: com a <strong>morte</strong><br />
<strong>da</strong> bailarina Paula Castro, há dois anos<br />
e meio, dos restantes 13 intérpretes<br />
originais – os que mais facilmente retomariam<br />
o espírito <strong>da</strong> produção –,<br />
dois, os mais velhos, estão retirados,<br />
e, <strong>da</strong>s duas bailarinas mais jovens,<br />
uma não <strong>de</strong>u continui<strong>da</strong><strong>de</strong> à carreira<br />
que estava então a começar.<br />
Um problema <strong>de</strong> memória<br />
“Quando fazemos as coisas nunca<br />
pensamos que elas vão se vão tornar<br />
história”, diz João Fia<strong>de</strong>iro. A Re.Al,<br />
produtora <strong>de</strong>ste coreógrafo, revela<br />
algumas <strong>da</strong>s marcas <strong>da</strong> história <strong>de</strong><br />
precarie<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> <strong>da</strong>nça, em geral, e<br />
<strong>da</strong> <strong>da</strong>nça portuguesa, em particular.<br />
Em caixas fecha<strong>da</strong>s há anos, Fia<strong>de</strong>iro<br />
8 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon<br />
“Para<strong>de</strong>s and Changes”<br />
Como fazer do presente futuro<br />
Anna Halprin ficou<br />
surpreendi<strong>da</strong> quando a<br />
coreógrafa Anne Collod a<br />
contactou recentemente<br />
pedindo autorização para<br />
remontar “Para<strong>de</strong>s and<br />
Changes”, um dos seus<br />
trabalhos <strong>de</strong> 1965 (esteve em<br />
Janeiro na Culturgest e na<br />
Fun<strong>da</strong>ção <strong>de</strong> Serralves). Parece<br />
ridículo à luz do século XXI e<br />
<strong>da</strong> quanti<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> corpos nus<br />
que vemos <strong>de</strong>sfilar pelos palcos<br />
<strong>de</strong> todo o mundo, mas foi a<br />
peça que levou a que, em plena<br />
época do amor livre, Halprin,<br />
hoje com 89 anos, recebesse<br />
voz <strong>de</strong> prisão. Por isso mesmo:<br />
a nu<strong>de</strong>z dos intérpretes. Mais<br />
<strong>de</strong> 40 anos volvidos e diluí<strong>da</strong>s<br />
“Mantenho to<strong>da</strong>s<br />
as cassetes <strong>de</strong> ensaios.<br />
É impensável apagar,<br />
gravar por cima”<br />
Vera Mantero<br />
tem cerca <strong>de</strong> duas mil cassetes – sobretudo<br />
VHS e Hi8 – <strong>de</strong> ensaios,<br />
“workshops”, conferências-<strong>de</strong>monstração<br />
e peças, só que muito <strong>de</strong>sse<br />
material, correspon<strong>de</strong>nte a cinco ou<br />
seis anos <strong>de</strong> activi<strong>da</strong><strong>de</strong> até 1998, po<strong>de</strong><br />
estar (talvez irremediavelmente) corrompido:<br />
ficou submerso quando o<br />
Tejo inundou o Espaço Ginjal, on<strong>de</strong><br />
a companhia teve se<strong>de</strong>, e continua<br />
guar<strong>da</strong>do <strong>de</strong>s<strong>de</strong> então. Da mesma<br />
forma, ao longo do tempo “<strong>de</strong>sapareceu<br />
quase tudo” no que toca a figurinos<br />
e cenários, nomea<strong>da</strong>mente com<br />
o encerramento do Espaço A Capital,<br />
no Bairro Alto, on<strong>de</strong> a 29 <strong>de</strong> Agosto<br />
<strong>de</strong> 2002 a polícia entrou e <strong>de</strong>u or<strong>de</strong>m<br />
<strong>de</strong> encerramento imediato alegando<br />
falta <strong>de</strong> condições <strong>de</strong> segurança do<br />
velho edifício on<strong>de</strong> uma série <strong>de</strong> estruturas<br />
tentaram criar um centro<br />
DANIEL ROCHA<br />
A remontagem <strong>de</strong> Anne Collod<br />
evitou uma reconstituição<br />
arqueológica<br />
Em 1965 , a nu<strong>de</strong>z<br />
<strong>de</strong> “Para<strong>de</strong>s and<br />
Changes” resultou<br />
na prisão <strong>de</strong> Anne<br />
Halprin; a coreógrafa<br />
quis que esse fosse<br />
um dos aspectos<br />
“revistos” na<br />
remontagem actual<br />
artístico multidisciplinar. Nesse dia,<br />
os responsáveis pelo colectivo teatral<br />
Artistas Unidos abriram a bagageira<br />
<strong>de</strong> um Hon<strong>da</strong> Civic e enfiaram lá <strong>de</strong>ntro<br />
o essencial – dossiers, computadores<br />
e impressoras. No fim entraram<br />
eles e arrancaram. A Eira, a Re.Al e<br />
os outros fizeram o mesmo.<br />
“Se não preservarmos as coisas<br />
agora, <strong>de</strong> facto, tudo se per<strong>de</strong>. É o<br />
problema <strong>da</strong> não inscrição <strong>da</strong> história,<br />
um problema <strong>de</strong> memória. Eu<br />
acho que as minhas peças têm uma<br />
autoria, são do João Fia<strong>de</strong>iro, mas<br />
pertencem também à comuni<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
É um património colectivo. Não pensei<br />
muito no que acontece ao meu<br />
trabalho quando eu morrer; mais do<br />
que o que lhe vai acontecer quando<br />
morrer, interessa-me o que lhe acontece<br />
enquanto estou vivo. Porque<br />
mesmo que eu não morra, esqueçome.<br />
É um património que acho que<br />
compete também às escolas, à universi<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />
manter, preservar. De preferência<br />
enquanto estamos vivos.”<br />
Em Maio, Francisco Camacho <strong>de</strong>u<br />
um passo nesse sentido, quando teve<br />
oportuni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> dirigir uma reposição<br />
<strong>de</strong> uma <strong>da</strong>s suas peças iniciais<br />
com alunos do Fórum Dança – “O Rei<br />
no Exílio”, feito para a Europália, em<br />
1992. Tal como com outras peças, havia<br />
elementos <strong>de</strong> cenário e figurinos<br />
já perdidos. “Eu próprio tive que a<br />
apren<strong>de</strong>r a peça <strong>de</strong> novo, porque já<br />
não me lembrava”, explica o coreógrafo,<br />
dizendo ser um trabalho quenão<br />
faz sentido retomar como intérprete:<br />
“Já não tenho i<strong>da</strong><strong>de</strong>, não tenho<br />
a energia nem o perfil.”<br />
É outro problema que se levanta: a<br />
relação umbilical entre a linguagem<br />
dos coreógrafos e bailarinos contemporâneos<br />
e o seu próprio corpo ou a<br />
as normas contras as quais à<br />
época trabalhava, foi um dos<br />
vários aspectos que Halprin<br />
quis ver revistos na sua peça,<br />
interdita durante 20 anos nos<br />
Estados Unidos e um marco <strong>da</strong><br />
contemporanei<strong>da</strong><strong>de</strong>. Assim,<br />
em vez <strong>de</strong> uma reconstituição<br />
“arqueológica”, Halprin,<br />
Collod e os intérpretes, entre<br />
os quais a portuguesa Vera<br />
Mantero, <strong>de</strong>dicaram-se a<br />
recuperar os trilhos originais,<br />
para os percorrer à luz <strong>de</strong> hoje.<br />
Porventura, precisamente o<br />
que fará mais sentido numa<br />
peça construí<strong>da</strong> a partir <strong>de</strong><br />
uma partitura <strong>de</strong> tarefas (vestir,<br />
<strong>de</strong>spir, caminhar até à boca <strong>de</strong><br />
cena…) ou em qualquer trabalho<br />
em que a improvisação tenha<br />
cumprido um papel importante.<br />
“Não há uma maneira específica<br />
<strong>de</strong> cumprir a partitura”,<br />
diz Vera Mantero, “trata-se<br />
<strong>de</strong> experimentar, inventar<br />
maneiras. Vimos filmes, lemos<br />
livros, textos que se escreveram<br />
sobre a peça, mas a i<strong>de</strong>ia não<br />
foi imitar. O que ela nos disse<br />
foi: ‘É preciso ver o que fazia<br />
sentido na altura e já não faz<br />
hoje.’” A nova versão acabou<br />
por <strong>de</strong>sembocar, contudo,<br />
essencialmente no mesmo lugar<br />
que a original. “Se calhar não<br />
estamos a cumprir os <strong>de</strong>sígnios<br />
<strong>da</strong> peça ao fazê-la tal e qual, mas<br />
cumprimos as partituras…”. V.R.<br />
fisicali<strong>da</strong><strong>de</strong> e bagagem referencial dos<br />
seus cúmplices. Ao contrário do que<br />
acontece com o clássico, com vocábulos<br />
específicos que po<strong>de</strong>m ser treinados<br />
todos os dias, passados 100<br />
anos sobre o nascimento <strong>da</strong> <strong>da</strong>nça<br />
mo<strong>de</strong>rna a maioria dos autores <strong>de</strong><br />
hoje usa nas suas criações um cruzamento<br />
multifacetado e idiossincrático<br />
<strong>de</strong> linguagens, um universo que acaba<br />
por ter mais a ver com uma posição<br />
na arte e no mundo do que com<br />
uma tradição propriamente dita.<br />
Martha Graham, Cunningham e<br />
Limón <strong>de</strong>senvolveram técnicas <strong>de</strong><br />
movimento. Já não é o caso <strong>de</strong> Pina,<br />
a quem <strong>de</strong>vemos esse extraordinário<br />
facto <strong>de</strong> os bailarinos terem ganho<br />
voz. Não é também o caso <strong>da</strong> maioria<br />
dos autores portugueses. José Sasportes<br />
compara, aliás, Vera Mantero<br />
a Isadora Duncan, <strong>de</strong> tal forma a sua<br />
linguagem é pessoal: “A Vera é ela,<br />
aqui. É um caso <strong>de</strong> <strong>de</strong>struição natural.”<br />
É também, contudo, um caso raro<br />
<strong>de</strong> preservação <strong>de</strong> material: “Mantenho<br />
to<strong>da</strong>s as cassetes <strong>de</strong> ensaios, dos<br />
processos <strong>de</strong> trabalho. É impensável<br />
apagar, gravar por cima. Tenho a noção<br />
<strong>de</strong> que vai ser preciso perceber<br />
como se chegou ali. Ca<strong>de</strong>rnos, notas...<br />
Guardo tu do. Até diários <strong>de</strong><br />
adolescência: têm coisas que são já<br />
a formação <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias para o que queria<br />
fazer.”<br />
Tudo ali. E, contudo, será material<br />
morto se ninguém o retomar. Martha<br />
Graham costumava dizer: “Nenhum<br />
artista está à frente do seu tempo.<br />
Ele é o seu tempo; são os outros que<br />
estão atrasados.” No caso <strong>da</strong> <strong>da</strong>nça<br />
é fun<strong>da</strong>mental que não nos <strong>de</strong>ixemos<br />
atrasar <strong>de</strong>mais. Ela não fica à espera.<br />
Foi.<br />
João Fia<strong>de</strong>iro tem cerca <strong>de</strong><br />
duas mil cassetes <strong>de</strong> ensaios,<br />
“workshops” e peças; muito <strong>de</strong>sse<br />
material po<strong>de</strong> ter-se perdido<br />
nas inun<strong>da</strong>ções do Espaço Ginjal
SARA MATOS<br />
“O Pássaro <strong>de</strong><br />
Fogo” na<br />
montagem<br />
mítica <strong>de</strong><br />
Maurice<br />
Béjart<br />
Millicent Hodson<br />
Como manter o<br />
passado presente<br />
Hodson e o marido reconstruiram o reportório <strong>de</strong> Vaslav Nijinsky,<br />
incluindo esta “Sagração <strong>da</strong> Primavera”<br />
É uma <strong>da</strong>s obras mais<br />
importantes do século XX: em<br />
1913, “Sagração <strong>da</strong> Primavera”<br />
foi a segun<strong>da</strong> coreografia<br />
do bailarino russo Vaslav<br />
Nijinsky para os Ballets<br />
Russes, porventura a mais<br />
célebre <strong>da</strong>s peças célebres <strong>da</strong><br />
primeira gran<strong>de</strong> companhia<br />
<strong>de</strong> bailado in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte do<br />
mundo. Depois <strong>da</strong> polémica<br />
provoca<strong>da</strong> no ano anterior<br />
com “Prelúdio à Tar<strong>de</strong> <strong>de</strong> um<br />
Fauno”, um trabalho em que<br />
Des<strong>de</strong><br />
os anos<br />
1970,<br />
Millicent<br />
Hodson<br />
e o marido<br />
recolheram<br />
<strong>de</strong>zenas <strong>de</strong><br />
testemunhos<br />
directos<br />
<strong>de</strong> forma<br />
a conseguir<br />
aproximar-se<br />
do que terão sido<br />
as produções<br />
originais dos<br />
Ballets Russes<br />
Nijinsky – o fauno – simulava<br />
masturbar-se com um lenço (um<br />
choque para o público médio<br />
<strong>da</strong> época, com a peça a acabar<br />
acusa<strong>da</strong> <strong>de</strong> obsceni<strong>da</strong><strong>de</strong>),<br />
“Sagração <strong>da</strong> Primavera”<br />
redobraria a provocação sexual<br />
dos ambientes primitivistas<br />
– redobraria também, claro, o<br />
escân<strong>da</strong>lo, acabando com um<br />
motim em que a polícia teve que<br />
intervir.<br />
Inspira<strong>da</strong> em antigos<br />
rituais <strong>de</strong> fertili<strong>da</strong><strong>de</strong> e com<br />
movimentos tão inesperados e<br />
crus quanto a partitura musical<br />
<strong>de</strong> Igor Stravinsky, cheia <strong>de</strong><br />
dissonâncias e assimetrias,<br />
nenhuma <strong>da</strong> flui<strong>de</strong>z comum à<br />
época, “Sagração <strong>da</strong> Primavera”<br />
acabaria por passar déca<strong>da</strong>s<br />
perdi<strong>da</strong> <strong>de</strong>pois do fim dos<br />
Ballets Russes em 1929,<br />
recupera<strong>da</strong> apenas em 1987 pela<br />
companhia norte-americana <strong>de</strong><br />
Robert Joffrey em colaboração<br />
com a coreógrafa e historiadora<br />
Millicent Hodson e o marido<br />
<strong>de</strong>sta, o também historiador<br />
Kenneth Archer. Juntos, Hodson<br />
e Archer têm vindo a investigar<br />
o período dos Ballets Russes,<br />
reconstruindo o seu reportório<br />
para gran<strong>de</strong>s companhias<br />
internacionais. Des<strong>de</strong> os anos<br />
1970 recolheram <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong><br />
testemunhos directos <strong>de</strong> forma a<br />
conseguir aproximar-se o mais<br />
possível do que terão sido as<br />
produções iniciais. Numa breve<br />
entrevista por telefone, Hodson<br />
conta o caso emblemático <strong>da</strong><br />
entrevista feita a uma antiga<br />
bailarina que, enquanto criança,<br />
entrara num dos espectáculos<br />
<strong>da</strong> companhia e se lembrava <strong>de</strong>,<br />
antes <strong>de</strong> entrar em cena, estar<br />
apoia<strong>da</strong> numa trave <strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira,<br />
à espera – a trave <strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira<br />
era o <strong>da</strong>do que faltava a Hodson<br />
e Archer para perceber como<br />
montar o cenário. A maior parte<br />
dos figurinos originais, feitos<br />
<strong>de</strong> lã e com pesados apliques<br />
<strong>de</strong> metal e osso, estão hoje no<br />
Victoria and Albert Museum, em<br />
Londres. V.R.<br />
Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 9
Sacanas Sem Lei<br />
“E <strong>de</strong> repente, bum!,<br />
um filme sobre a II Guerra<br />
Mundial transforma-se numa<br />
carta <strong>de</strong> amor ao cinema”<br />
Quentin Tarantino<br />
www.ipsilon.pt<br />
Em Londres com Quentin Tarantino<br />
e os actores Diane Kruger e Christoph Waltz<br />
(prémio <strong>de</strong> interpretação em Cannes)<br />
Não perca a edição <strong>de</strong> 28/08/09
Cinema<br />
“4 Copas” é a quarta longa-metragem<br />
<strong>de</strong> ficção <strong>de</strong> Manuel Mozos (n. 1959),<br />
história <strong>de</strong> um trio <strong>de</strong> personagens<br />
que <strong>de</strong>pois passa a quarteto unido e<br />
<strong>de</strong>sunido pelas circunstâncias afectivas,<br />
numa <strong>Lisboa</strong> sempre reconhecível<br />
mesmo quando não é i<strong>de</strong>ntificável.<br />
É um momento feliz na obra <strong>de</strong> Mozos,<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> sempre assola<strong>da</strong> por percalços<br />
variados: “4 Copas” estreia-se<br />
comercialmente, “Ruínas” (ain<strong>da</strong> não<br />
estreado) tem ganho alguns prémios<br />
importantes. Em conversa com o Ípsilon,<br />
Manuel Mozos falou <strong>de</strong> “4 Copas”<br />
e dos caminhos difíceis percorridos<br />
pelos jovens cineastas portugueses<br />
que se iniciaram nos anos 80.<br />
Mozos foi um <strong>de</strong>les, e apren<strong>de</strong>u que<br />
“nunca se ganha e nunca se per<strong>de</strong>”.<br />
A sua carreira vive em 2009 um<br />
momento particularmente feliz.<br />
“Ruínas” tem <strong>da</strong>do nas vistas<br />
[foi premiado no Indie<strong>Lisboa</strong><br />
e no FID-Marselha], “4 Copas”<br />
estreia-se comercialmente... E<br />
apresentou ain<strong>da</strong> “Aldina Duarte<br />
- Princesa Prometi<strong>da</strong>”. Numa<br />
obra que tem sofrido com tantas<br />
irregulari<strong>da</strong><strong>de</strong>s, tem alguma<br />
explicação para esta conjuntura<br />
afortuna<strong>da</strong>?<br />
É uma coincidência, que até é <strong>de</strong>vi<strong>da</strong><br />
a essas irregulari<strong>da</strong><strong>de</strong>s. A ro<strong>da</strong>gem<br />
do “4 Copas” foi em 2005, está pronto<br />
praticamente <strong>de</strong>s<strong>de</strong> há dois anos,<br />
e há um ano e meio que estava à espera<br />
<strong>da</strong> estreia. O “Ruínas” também<br />
foi um processo prolongado, ficou<br />
pronto agora. Assim como o <strong>da</strong> Aldina.<br />
É uma coincidência, mas acho que<br />
há uma coerência [risos] na relação<br />
com as irregulari<strong>da</strong><strong>de</strong>s. O caso extremo<br />
é o “Xavier”, que ficou muitos<br />
anos à espera <strong>de</strong> ser estreado, mas há<br />
uma aura <strong>de</strong> invisibili<strong>da</strong><strong>de</strong> em torno<br />
<strong>de</strong> tantas coisas que fiz...<br />
P- “4 Copas” é a sua quarta<br />
ficção. Como é que a relaciona<br />
com as outras três [“Um Passo,<br />
Outro Passo, e Depois”, 1989,<br />
“Xavier”, 1992, e “...Quando<br />
Troveja”, 1999]?<br />
Por um lado, ambientam-se todos em<br />
<strong>Lisboa</strong>, e, por outro, [há] uma proximi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
nos traços <strong>da</strong>s personagens.<br />
Personagens em que<strong>da</strong>, que acabam<br />
por ter uma espécie <strong>de</strong> re<strong>de</strong>nção, e<br />
se movem no quotidiano. No “4 Copas”<br />
isso sente-se <strong>de</strong> maneira diferente,<br />
porque seguimos quatro personagens<br />
e não uma, mas isso para mim<br />
até é um pouco uma súmula, permiteme<br />
apanhar quatro personagens <strong>de</strong><br />
gerações diferentes.<br />
A <strong>Lisboa</strong> <strong>de</strong> “4 Copas” é um<br />
pouco mais tortuosa. Gira<br />
entre o corriqueiro do centro<br />
comercial e a clan<strong>de</strong>stini<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong><br />
casa <strong>de</strong> jogo. É uma <strong>Lisboa</strong> <strong>da</strong><strong>da</strong><br />
mais por ambientes do que pela<br />
rua.<br />
Concordo. Não é o aspecto realista <strong>da</strong><br />
ci<strong>da</strong><strong>de</strong> que me interessa. Antes usar<br />
a geografia como “décor”, procurar<br />
o que nela há <strong>de</strong> “papelão”, usá-la<br />
como uma paleta. Neste filme há mais<br />
interiores, <strong>de</strong> facto. A i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> ter personagens<br />
a moverem-se numa aparência<br />
<strong>de</strong> subterrâneo já me tinha<br />
interessado no “...Quando Troveja”,<br />
mesmo se aí acabei por não a explorar<br />
como queria. Em todo o caso não<br />
Margari<strong>da</strong><br />
Marinho em<br />
“4 Copas”<br />
Nunca se ganha<br />
e nunca se per<strong>de</strong><br />
A quarta longa-metragem <strong>de</strong> ficção <strong>de</strong> Manuel Mozos, “4 Copas”, é um momento feliz numa obra<br />
assola<strong>da</strong> por percalços que continua, como diz o próprio, parcialmente “invisível” - mas que<br />
correspon<strong>de</strong> a um dos percursos mais originais do cinema português. Luís Miguel Oliveira<br />
Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 11<br />
NUNO FERREIRA SANTOS
é o realismo estrito que me motiva.<br />
O casino clan<strong>de</strong>stino, por exemplo,<br />
tem um lado postiço, é sobretudo<br />
uma i<strong>de</strong>ia, um ambiente...<br />
Se há uma coisa que <strong>de</strong>fine<br />
os seus filmes é a maneira<br />
<strong>de</strong> trabalhar as personagens<br />
e <strong>de</strong> se relacionar com elas.<br />
É única e inconfundível no<br />
cinema português. Em termos<br />
<strong>de</strong> construção, diria que é a<br />
narrativa que as <strong>de</strong>ci<strong>de</strong>, ou<br />
que são elas que <strong>de</strong>ci<strong>de</strong>m a<br />
narrativa? É que fica a sensação<br />
<strong>de</strong> que, a partir <strong>de</strong> certa altura, o<br />
seu amor pelas personagens, por<br />
to<strong>da</strong>s elas, se sobrepõe a tudo.<br />
Este filme tem uma nuance. Ao contrário<br />
<strong>da</strong>s minhas outras ficções, que<br />
partiam <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias minhas ain<strong>da</strong> que<br />
<strong>de</strong>pois as <strong>de</strong>senvolvesse com outras<br />
pessoas, o argumento do “4 Copas”<br />
nasceu <strong>de</strong> um trabalho conjunto com<br />
a Cláudia Sampaio e o Octávio Rosado.<br />
Julgo que para eles o mais interessante<br />
até era o trabalho sobre a história.<br />
Mas eu envolvi-me especialmente no<br />
<strong>de</strong>senvolvimento <strong>da</strong>s personagens, <strong>de</strong><br />
maneira a que nalgumas partes se po<strong>de</strong>ria<br />
até dizer que a história ficou fragiliza<strong>da</strong>.<br />
Na montagem ain<strong>da</strong> reforcei<br />
mais isso. Tentei tirar partido do que<br />
havia <strong>de</strong> mais forte no trabalho dos<br />
actores. Digo “fragiliza<strong>da</strong>” no sentido<br />
em que a certa altura me preocupei<br />
menos com a “coerência” <strong>da</strong> história<br />
do que com o que fazia com que se<br />
pu<strong>de</strong>sse acreditar nas personagens.<br />
Uma história alternativa<br />
do cinema português<br />
Tendo formação e experiência<br />
<strong>de</strong> montador, com inúmeros<br />
trabalhos para outros<br />
realizadores, consegue criar<br />
uma distância face ao material<br />
filmado por si?<br />
É complicado. Nos meus filmes trabalho<br />
sempre com outros montadores.<br />
E gosto <strong>de</strong> lhes <strong>de</strong>ixar algum espaço<br />
para eles fazerem a sua leitura. A sua<br />
leitura e a sua escrita. Mas por força<br />
<strong>da</strong>s circunstâncias acabei, neste filme<br />
assim como no “Xavier”, por estar<br />
muito directamente ligado à montagem.<br />
Houve uma primeira versão,<br />
monta<strong>da</strong> pelo Pedro Marques, com a<br />
qual estávamos bastante satisfeitos,<br />
mas era uma versão <strong>de</strong>cidi<strong>da</strong> na relação<br />
com uma série <strong>de</strong> trechos musicais<br />
<strong>de</strong> que não pu<strong>de</strong>mos comprar os<br />
direitos, que eram uma exorbitância.<br />
Como ele <strong>de</strong>pois não estava disponí-<br />
“[Há] uma<br />
proximi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
nas personagens<br />
[dos meus filmes].<br />
Personagens em<br />
que<strong>da</strong>, que acabam<br />
por ter uma (...)<br />
re<strong>de</strong>nção, e se movem<br />
no quotidiano”<br />
12 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon<br />
“Ruínas” foi<br />
premiado na<br />
última edição<br />
do<br />
Indie<strong>Lisboa</strong><br />
e no FID-<br />
Marselha<br />
NUNO FERREIRA SANTOS
“Xavier” (1992), um filme que ficou anos à espera <strong>de</strong> ser mostrado<br />
vel, fiquei eu, um bocado a contragosto,<br />
a trabalhar na remontagem.<br />
Percalços e interrupções... A<br />
sua carreira parece atraí-los: o<br />
“Xavier” foi o que foi, o “Passo”<br />
é um dos poucos “missing films”<br />
dos anos 90...<br />
Há mais, há mais... [risos]<br />
A pergunta é: num meio<br />
já <strong>de</strong> si tão complicado e<br />
frequentemente adverso como<br />
é o do cinema português, como<br />
é que se li<strong>da</strong> com to<strong>da</strong> esta<br />
adversi<strong>da</strong><strong>de</strong> adicional?<br />
Já me angustiei mais com isso. Hoje<br />
acho que não vale a pena per<strong>de</strong>r muito<br />
tempo a pensar nessas contrarie<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />
Prefiro estar contente com a<br />
vi<strong>da</strong> do que viver amargurado por<br />
causa <strong>de</strong> alguns azares. Também já<br />
não tenho as pretensões e as ambições<br />
que tinha há vinte ou mesmo há<br />
<strong>de</strong>z anos. Há uma certa resignação,<br />
se calhar um pouco estúpi<strong>da</strong>. O caso<br />
do “Passo” ain<strong>da</strong> me faz sofrer um<br />
bocadinho, embora tenha esperança<br />
que algum dia venha a ser encontrado<br />
[o filme só é visível actualmente em<br />
transcrições ví<strong>de</strong>o]. Mas em Portugal<br />
há tanta coisa que se per<strong>de</strong>, que fica<br />
para trás... Também não me angustio<br />
com o futuro. Se fizer outro filme, farei.<br />
Já não tenho muita paciência para<br />
as minhas próprias angústias. Fiz<br />
um número razoável <strong>de</strong> filmes, mesmo<br />
que não sejam vistos. Mas eu sei<br />
que os fiz. Para mim isto já é uma satisfação.<br />
É claro que me posso perguntar<br />
se as coisas como me estão a<br />
correr hoje...<br />
...tivessem corrido assim <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o<br />
princípio...<br />
...mas nem vale a pena. Tenho-me<br />
divertido...<br />
Deve ser <strong>da</strong>s pessoas com um<br />
interesse mais intenso, e quase<br />
enciclopédico, no cinema<br />
português e nos seus recantos<br />
mais obscuros. É capaz <strong>de</strong> falar<br />
com profun<strong>da</strong> estima <strong>de</strong> um<br />
filme falhadíssimo dos anos 50,<br />
ou <strong>de</strong> uma produção amadora<br />
feita sabe-se lá on<strong>de</strong>... Para dizer<br />
que são maus, mas sem que isso<br />
impeça uma espécie <strong>de</strong> apreço.<br />
De on<strong>de</strong> é que isto vem? O que<br />
é que o interessa tanto nesta<br />
história alternativa do cinema<br />
português como falhanço?<br />
Não é só no cinema...<br />
Eu sei, mas circunscrevendo...<br />
Por um lado, e genericamente, tenho<br />
tendência a comover-me com a “décalage”<br />
entre uma intenção e o resultado<br />
<strong>de</strong>la. Por outro, no cinema português<br />
há, ou havia, algumas pessoas<br />
que mesmo sem talento ou condições<br />
se entregavam ao que estavam a fazer<br />
com total convicção. O resultado podia<br />
ser péssimo mas era a vi<strong>da</strong> <strong>da</strong>quelas<br />
pessoas. Para além disso, e por<br />
maus que sejam, po<strong>de</strong>m-se sempre<br />
encontrar coisas interessantes nesses<br />
filmes. Pormenores <strong>de</strong> arquitectura,<br />
a maneira como as pessoas se vestiam.<br />
O esforço inglório <strong>de</strong> alguns actores,<br />
a <strong>da</strong>rem o melhor <strong>de</strong> si e <strong>de</strong>pois o filme<br />
não presta para na<strong>da</strong>... Às vezes<br />
“Não me angustio<br />
com o futuro. Se fizer<br />
outro filme, farei.<br />
Já não tenho muita<br />
paciência para as<br />
minhas angústias. Fiz<br />
um número razoável<br />
<strong>de</strong> filmes, mesmo que<br />
não sejam vistos.<br />
Mas eu sei que os fiz”<br />
há momentos fantásticos. Claro que<br />
é um bocadinho enfadonho estar a<br />
ver uma hora e meia para aproveitar<br />
trinta segundos. Mas pronto.<br />
Matar o pai<br />
A sua geração, por discutível<br />
que seja o conceito <strong>de</strong> “geração”<br />
mas aceitemo-lo para <strong>de</strong>finir o<br />
conjunto <strong>de</strong> pessoas que chegou<br />
ao cinema nos anos 80, teve<br />
imensas baixas e <strong>de</strong>saparecidos<br />
em combate. Quase se lhe po<strong>de</strong><br />
chamar, a si, um “sobrevivente”.<br />
O que é que esta geração<br />
encontrou <strong>de</strong> tão especialmente<br />
difícil? Tem alguma explicação?<br />
Havia um problema geral, que sempre<br />
houve: falta <strong>de</strong> espaço. As próprias<br />
condições <strong>de</strong> produção o ditam.<br />
Nunca houve um investimento sério<br />
para criar, não uma gran<strong>de</strong> indústria,<br />
que seria impossível, mas algum tipo<br />
<strong>de</strong> abertura. Da geração dos anos 80<br />
muitos ficaram pelo caminho, <strong>de</strong> fac-<br />
to. Começava logo nos concursos do<br />
Instituto [Português <strong>de</strong> Cinema, então],<br />
on<strong>de</strong> só havia lugar para uma<br />
ou duas primeiras-obras. Havia aquelas<br />
pessoas ain<strong>da</strong> muita próximas,<br />
etariamente, <strong>da</strong> geração do Cinema<br />
Novo - o João Botelho, o Luis Filipe<br />
Rocha, o José Alvaro Morais, o Jorge<br />
Silva Melo -, e a vi<strong>da</strong> também não foi<br />
fácil para eles. Mas dos que vieram a<br />
seguir, durante os anos 80, muitos<br />
ficaram bloqueados, praticamente só<br />
o Pedro Costa, o Joaquim Leitão e a<br />
Teresa Villaver<strong>de</strong> é que conseguiram<br />
singrar. Pessoas como o Vitor Gonçalves,<br />
ou o Daniel Del Negro, fizeram<br />
filmes que como era habitual na época<br />
tiveram dificul<strong>da</strong><strong>de</strong>s em estrear<br />
mas foram muito projectados num<br />
círculo restrito, e isto também po<strong>de</strong><br />
ser um bocado intimi<strong>da</strong>tório por causa<br />
<strong>da</strong>s expectativas que se criam. E<br />
muitos tiveram infortúnios <strong>de</strong> todo o<br />
tipo. Se quisesse ir por uma teoria <strong>da</strong><br />
conspiração diria que esta conjuntura<br />
até podia ter sido geri<strong>da</strong> por pessoas<br />
liga<strong>da</strong>s às <strong>de</strong>cisões sobre o cinema<br />
português, que optaram por estrangular<br />
em vez <strong>de</strong> abrir. E então<br />
pronto, tinha que haver vítimas e<br />
quem se aguentasse aguentava. Muitos<br />
dos filmes, mesmo cheios <strong>de</strong> fragili<strong>da</strong><strong>de</strong>s,<br />
não mereciam ter levado a<br />
panca<strong>da</strong> que levaram. Os primeiros<br />
filmes do João Canijo, por exemplo,<br />
aquilo foi complicado. Depois há o<br />
“Nós apanhámos<br />
a geração do Cinema<br />
Novo ain<strong>da</strong> liga<strong>da</strong><br />
a todos os lugares<br />
importantes (...)<br />
e [isso] criou (...)<br />
constrangimento.<br />
É um sentimento <strong>de</strong><br />
dívi<strong>da</strong> que os tipos<br />
<strong>de</strong> agora, que já não<br />
os apanharam nos<br />
lugares <strong>de</strong>cisivos,<br />
não têm. Não lhes<br />
<strong>de</strong>vem na<strong>da</strong>”<br />
caso do [Edgar] Pêra, que é um caso<br />
<strong>de</strong> resistência. Em resumo, não consigo<br />
dizer: foi por isto ou foi por aquilo.<br />
Houve um conjunto <strong>de</strong> factores<br />
que atirou muita gente para fora <strong>da</strong><br />
pista. E quando finalmente podiam<br />
estar em condições <strong>de</strong> recuperar o<br />
tempo perdido aparece uma nova<br />
geração. Voltar 15 ou 20 anos <strong>de</strong>pois<br />
é sempre muito complicado.<br />
Pensando nalguns casos <strong>de</strong>ssa<br />
nova geração, o Joaquim<br />
Sapinho, o João Pedro<br />
Rodrigues, mesmo o Miguel<br />
Gomes, dá a impressão <strong>de</strong> que<br />
encontraram uma conjuntura<br />
menos agreste. Por outro lado, a<br />
vossa geração era uma geração<br />
<strong>de</strong> “filhos”, e estes já não são<br />
bem “filhos”. Até que ponto isto<br />
po<strong>de</strong> ser importante?<br />
Acho que isso é realmente importante.<br />
Quer dizer, eu não sei se o Pedro<br />
Costa ou a Teresa Villaver<strong>de</strong>...<br />
...se consi<strong>de</strong>ram “filhos”...<br />
...pois, mas isto é um facto: nós ain<strong>da</strong><br />
conhecemos os “pais”. Até pelos filmes<br />
isso se nota. Havia algumas referências<br />
em comum, até numa linha<br />
<strong>de</strong> continui<strong>da</strong><strong>de</strong> com o cinema português.<br />
Querendo ou não, ain<strong>da</strong> estávamos<br />
muito ligados ao Paulo Rocha,<br />
ao António Reis, ao Fernando<br />
Lopes, ao João Bénard <strong>da</strong> Costa, ao<br />
Seixas Santos ou ao César Monteiro.<br />
Até mesmo, <strong>de</strong> maneira diferente, ao<br />
João Mário Grilo. Havia uma herança<br />
que era veicula<strong>da</strong> pela Escola <strong>de</strong> Cinema.<br />
Julgo que nestes, no Sapinho,<br />
no João Pedro, no Sandro Aguilar, no<br />
Miguel Gomes, há um <strong>de</strong>spojamento<br />
maior. Outra abertura ao mundo.<br />
Ao mesmo tempo, e não<br />
querendo transformar isto em<br />
psicanálise barata, nos vossos<br />
filmes sente-se a noção, ain<strong>da</strong><br />
que inconsciente, <strong>de</strong> estarem a<br />
filmar <strong>de</strong>ntro <strong>da</strong> “família”, sob o<br />
olhar do “pai”.<br />
Nós apanhámos a geração do Cinema<br />
Novo ain<strong>da</strong> liga<strong>da</strong> a todos os lugares<br />
importantes, no IPC, na RTP... Eu por<br />
exemplo <strong>de</strong>vo o meu primeiro filme<br />
ao Fernando Lopes, foi ele quem me<br />
convidou para os “Corações Periféricos”<br />
[a série on<strong>de</strong> se integrava “Um<br />
Passo, Outro Passo e Depois”]. E acho<br />
que este tipo <strong>de</strong> relacionamento criou<br />
uma espécie <strong>de</strong> constrangimento nos<br />
mais novos, que aliás era incentivado<br />
pelos mais velhos. Estou a dizer isto<br />
mas não implica que não tenha admiração,<br />
respeito e amiza<strong>de</strong> por muitos<br />
<strong>de</strong>sses cineastas. Mas é um sentimento<br />
<strong>de</strong> dívi<strong>da</strong> que os tipos <strong>de</strong> agora, que<br />
já não os apanharam nos lugares <strong>de</strong>cisivos,<br />
não têm. Não lhes <strong>de</strong>vem na<strong>da</strong>.<br />
Quando “Xavier” teve uma<br />
sessão <strong>de</strong> antestreia na<br />
Cinemateca, incluiu na folha<br />
<strong>de</strong> sala um poema <strong>de</strong> Jaime<br />
Gil <strong>de</strong> Biedma [“Príncipe <strong>da</strong><br />
Aquitania, En su Torre Aboli<strong>da</strong>”]<br />
que começa assim: “Una clara<br />
consciência <strong>de</strong> lo que ha perdido<br />
/ es lo que le consuela”. É tão<br />
fácil adivinhar que se i<strong>de</strong>ntifica<br />
com este verso...<br />
Ah, sim, sim. Isto po<strong>de</strong> fazer confusão<br />
a algumas pessoas, mas serve-me para<br />
avançar. OK, perdi certas coisas<br />
mas... é como na canção do [John]<br />
Cale, “never win and never lose”<br />
[“nunca se ganha e nunca se per<strong>de</strong>”]...<br />
...ou na do Dylan, “there’s<br />
no success like failure but<br />
failure’s no success at all” [“não<br />
há triunfo como o falhanço,<br />
mas o falhanço não é triunfo<br />
nenhum”]...<br />
As coisas equilibram-se. Mesmo quando<br />
per<strong>de</strong>mos muito ganhamos alguma<br />
coisa. E isto é importante.<br />
Ver crítica <strong>de</strong> filmes na pág. 33 e segs.
Queres ser<br />
Charlie Kaufman?<br />
Dez anos <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> Spike Jonze ter ro<strong>da</strong>do “Queres Ser John<br />
Malkovich?”, Charlie Kaufman estreia-se na realização com “Sinédo<br />
que, Nova Iorque”, filme que é síntese e <strong>de</strong>sconstrução <strong>da</strong> voz<br />
autoral <strong>de</strong> um dos mais peculiares argumentistas dos<br />
últimos anos. Jorge Mourinha<br />
Há um velho adágio que diz que<br />
Hollywood paga bem aos seus argumentistas<br />
mas <strong>de</strong>pois compensa tratando-os<br />
abaixo <strong>de</strong> cão.<br />
Charlie Kaufman é a excepção que<br />
confirma a regra. Sobretudo porque<br />
o guião que fez o seu nome andou<br />
anos aos tombos por Hollywood, com<br />
to<strong>da</strong> a gente a dizer-lhe que era espantoso<br />
mas infilmável. Um Oscar (e duas<br />
nomeações) <strong>de</strong>pois, Kaufman é um<br />
dos guionistas mais intocáveis, mais<br />
influentes e mais raros do cinema<br />
americano. Intocável porque ninguém<br />
consegue escrever como ele,<br />
influente porque ninguém <strong>de</strong>siste <strong>de</strong><br />
o tentar, raro porque em <strong>de</strong>z anos<br />
apenas produziu seis guiões.<br />
Seis guiões que cristalizaram uma<br />
voz autoral com uma i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong> narrativa<br />
tão forte que nem mesmo uma<br />
mu<strong>da</strong>nça <strong>de</strong> realizador (quatro, até<br />
agora) a consegue apagar ou diluir.<br />
Seis pontos <strong>de</strong> vista diferentes que<br />
concentram em si a essência do seu<br />
tema central: a i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong>. Ou a vi<strong>da</strong>.<br />
Ou a <strong>morte</strong>. Ou a per<strong>da</strong>. Ou, apenas,<br />
a mente <strong>de</strong> Charlie Kaufman.<br />
Num filme-Kaufman, o ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro<br />
autor (coisa rara no cinema contemporâneo,<br />
venha ela dos EUA ou <strong>de</strong><br />
outros sítios) é o argumentista, e o<br />
que varia <strong>de</strong> filme para filme é o modo<br />
como ca<strong>da</strong> realizador se entrosa,<br />
ou não, com o seu peculiar modo <strong>de</strong><br />
olhar o mundo, com uma <strong>da</strong>s escritas<br />
mais originais que o cinema americano<br />
revelou em muito tempo.<br />
Tão original que não percebemos<br />
exactamente <strong>de</strong> on<strong>de</strong> ela vem, como<br />
é que chegou aqui e como é que a formatação<br />
<strong>de</strong> Hollywood ain<strong>da</strong> não <strong>de</strong>u<br />
cabo <strong>de</strong>la.<br />
Questões <strong>de</strong> i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
Em “Confissões <strong>de</strong> uma Mente Perigosa”<br />
(2002), George Clooney, no papel<br />
<strong>de</strong> um agente <strong>da</strong> CIA, diz à ve<strong>de</strong>ta<br />
televisiva interpreta<strong>da</strong> por Sam Rockwell:<br />
“Jesus Cristo morreu e ressuscitou<br />
aos 33 anos. Você tem 32 e ain<strong>da</strong><br />
não fez na<strong>da</strong> que se visse. É melhor<br />
<strong>de</strong>spachar-se”.<br />
Charlie Kaufman estudou cinema<br />
em Nova Iorque, mas chegou aos trintas<br />
a trabalhar no <strong>de</strong>partamento <strong>de</strong><br />
14 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon<br />
assinaturas <strong>de</strong> um jornal <strong>de</strong> Minneapolis<br />
com a sensação <strong>de</strong> que a vi<strong>da</strong><br />
lhe estava a passar ao lado. Foi para<br />
Los Angeles trabalhar como argumentista,<br />
passou anos em séries televisivas<br />
que nunca foram a lado nenhum,<br />
e expressou a sua frustração no tal<br />
guião espantoso mas infilmável, “Queres<br />
Ser John Malkovich?”, história <strong>de</strong><br />
um marionetista frustrado que, forçado<br />
a trabalhar para ganhar a vi<strong>da</strong>,<br />
<strong>de</strong>scobre um portal que permite passar<br />
quinze minutos <strong>de</strong>ntro <strong>da</strong> cabeça<br />
do actor John Malkovich — e o preço<br />
<strong>de</strong> se querer ser quem não se é.<br />
Filmado em 1999 por Spike Jonze,<br />
“Queres Ser John Malkovich?” transformou-se<br />
num fenómeno, integrando<br />
Kaufman numa nova geração <strong>de</strong><br />
criativos capitanea<strong>da</strong> por Jonze e pela<br />
(sua então esposa) Sofia Coppola<br />
que parecia prestes a re<strong>de</strong>finir o cinema<br />
americano.<br />
No espaço <strong>de</strong> dois anos, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong><br />
ter passado anos a batalhar em vão,<br />
Kaufman viu três guiões colocados em<br />
produção — o melhor dos três, ironicamente,<br />
a “encomen<strong>da</strong>” feita por um<br />
estúdio (a Columbia). “Ina<strong>da</strong>ptado”<br />
(2002), <strong>de</strong> novo dirigido por Jonze,<br />
distorcia o ca<strong>de</strong>rno <strong>de</strong> encargos (a<br />
a<strong>da</strong>ptação do “best-seller” não-ficcional<br />
<strong>de</strong> Susan Orlean) para se tornar<br />
num fervilhante laboratório formal<br />
meta-narrativo, encenando, em vez<br />
<strong>da</strong> narrativa do livro, o processo <strong>da</strong><br />
sua própria a<strong>da</strong>ptação ao cinema: um<br />
filme sobre a criação do próprio filme,<br />
com Nicolas Cage a <strong>da</strong>r corpo a uma<br />
personagem chama<strong>da</strong> “Charlie Kauf-<br />
Charlie Kaufman<br />
é uma voz autoral<br />
com uma i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
tão forte que nem<br />
mesmo uma mu<strong>da</strong>nça<br />
<strong>de</strong> realizador (quatro,<br />
até agora) a consegue<br />
apagar ou diluir<br />
Cinema<br />
“Queres Ser John Malkovich?” 1999<br />
“Confissões <strong>de</strong> uma Mente Perigosa” 2002<br />
“Human Nature” 2001<br />
“Ina<strong>da</strong>ptado” 2002
RUNE HELLESTAD/CORBIS<br />
“O Despertar <strong>da</strong> Mente” 2004<br />
A escrita <strong>de</strong><br />
Kaufman<br />
é tão original<br />
que não<br />
percebemos<br />
<strong>de</strong> on<strong>de</strong> ela<br />
vem, como<br />
é que chegou<br />
aqui e como<br />
é que a<br />
formatação<br />
<strong>de</strong> Hollywood<br />
ain<strong>da</strong> não<br />
<strong>de</strong>u cabo <strong>de</strong>la<br />
“Sinédoque, Nova Iorque” 2009<br />
man” e ao seu irmão gémeo “Donald”,<br />
aliás creditado como co-autor do argumento.<br />
E se a tentação <strong>de</strong> ver autobiografia<br />
nisto é gran<strong>de</strong> (como é,<br />
aliás, em todos os seus filmes, tal é a<br />
componente emocional que Kaufman<br />
consegue injectar no que à parti<strong>da</strong><br />
são conceitos <strong>de</strong>masiado secos e teóricos),<br />
consi<strong>de</strong>rem o seguinte: Donald<br />
Kaufman não existe.<br />
“Ina<strong>da</strong>ptado”, filme sobre um artista<br />
que procura compreen<strong>de</strong>r o seu<br />
lugar no mundo, ressoa directamente<br />
em “Sinédoque, Nova Iorque” (2008),<br />
a sua estreia na realização, ontem chega<strong>da</strong><br />
às salas portuguesas <strong>de</strong>pois <strong>de</strong><br />
ter estado a concurso em Cannes<br />
2008, também sobre um artista à procura<br />
do seu lugar (embora <strong>de</strong> modo<br />
muito mais elíptico). Mas encontramos<br />
também ecos seus em “Human<br />
Nature” (2001), espécie <strong>de</strong> “negativo”<br />
do “Menino Selvagem” <strong>de</strong> Truffaut,<br />
e no vaivém entre a ver<strong>da</strong><strong>de</strong> e a<br />
mentira <strong>de</strong> “Confissões <strong>de</strong> uma<br />
Mente Perigosa” (2002), a<strong>da</strong>ptação<br />
<strong>da</strong> “autobiografia” do<br />
apresentador televisivo Chuck<br />
Barris, que se apregoava<br />
uma suposta vi<strong>da</strong> secreta<br />
como assassino contratado<br />
<strong>da</strong> CIA.<br />
Com a questão <strong>da</strong> i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
— quem somos; como<br />
chegámos a sê-lo; po<strong>de</strong><br />
alguem ser quem não é?<br />
— como chave <strong>de</strong> leitura comum,<br />
“Ina<strong>da</strong>ptado” <strong>de</strong>stacava-se<br />
pela sintonia entre<br />
realizador e argumentista:<br />
nem Michel Gondry nem George<br />
Clooney, ambos em tempo <strong>de</strong><br />
estreia na realização, souberam fazer<br />
inteira justiça às explosões criativas<br />
<strong>de</strong> Kaufman, tombando em armadilhas<br />
clássicas <strong>de</strong> primeiro filme.<br />
A lição <strong>de</strong> “Human Nature” foi<br />
aprendi<strong>da</strong> por Gondry, que partilhava<br />
com Jonze um passado <strong>de</strong> inovador<br />
no campo do teledisco e que <strong>de</strong>u carta<br />
branca a Kaufman para trabalhar<br />
uma i<strong>de</strong>ia que <strong>de</strong>senvolvera com um<br />
amigo. A colaboração entre ambos,<br />
cristalizando a meditação do argumentista<br />
sobre a i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong> através<br />
<strong>de</strong> um artesanal <strong>de</strong>svio Gondryano<br />
pelos mecanismos <strong>da</strong> memória, <strong>de</strong>u<br />
origem a um dos mais notáveis filmes<br />
<strong>da</strong> déca<strong>da</strong>, o sublime “O Despertar<br />
<strong>da</strong> Mente” (2004), valendo a Kaufman<br />
o Oscar do argumento (<strong>de</strong>pois <strong>de</strong> duas<br />
nomeações não concretiza<strong>da</strong>s por<br />
“Malkovich” e “Ina<strong>da</strong>ptado”).<br />
Esta história <strong>de</strong> amor que literalmente<br />
se recusa a ser esqueci<strong>da</strong> (porque<br />
esquecer implicaria apagar a ver<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
<strong>da</strong>s emoções e <strong>da</strong> i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />
per<strong>de</strong>r a humani<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> quem somos)<br />
é ao mesmo tempo a sequela<br />
perfeita aos filmes anteriores e a introdução<br />
i<strong>de</strong>al a “Sinédoque, Nova<br />
Iorque”, <strong>de</strong>senvolvido inicialmente<br />
como (pasme-se) um filme <strong>de</strong> terror<br />
para Spike Jonze dirigir.<br />
Universos paralelos<br />
Concebido como um filme <strong>de</strong> género,<br />
“Sinédoque, Nova Iorque” transformou-se<br />
numa meditação claustrofóbica<br />
sobre a i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong>, a arte e a vi<strong>da</strong><br />
que a Columbia não quis financiar,<br />
que Jonze (retido na produção conturba<strong>da</strong><br />
<strong>de</strong> “O Sítio <strong>da</strong>s Coisas Selvagens”)<br />
não pô<strong>de</strong> realizar, e que Kaufman<br />
acabou por dirigir sozinho na sua<br />
Não há ninguém que<br />
consiga aproximar-se<br />
<strong>de</strong> Kaufman na<br />
construção <strong>de</strong><br />
universos paralelos.<br />
“Sinédoque” é um<br />
labirinto em<br />
constante mutação,<br />
on<strong>de</strong> é tão fácil per<strong>de</strong>r<br />
o pé que o próprio<br />
autor se terá perdido<br />
pelo meio<br />
estreia atrás <strong>da</strong> câmara. Confirmando<br />
ao mesmo tempo duas coisas.<br />
Primeira: Kaufman é mais argumentista<br />
(teórico <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias) do que<br />
realizador (praticante <strong>de</strong> imagens), e<br />
a sua inexperiência confirma que é<br />
preciso uma invulgar conjugação <strong>de</strong><br />
talentos para levar a bom porto um<br />
filme seu — “Sinédoque” é muito mais<br />
filme <strong>de</strong> argumentista do que primeira<br />
obra <strong>de</strong> realizador estreante.<br />
Segun<strong>da</strong>: não há ninguém que consiga<br />
sequer aproximar-se <strong>de</strong> Kaufman<br />
no que diz respeito à construção <strong>de</strong><br />
universos paralelos. “Sinédoque” é<br />
um labirinto em constante mutação,<br />
on<strong>de</strong> é tão fácil per<strong>de</strong>r o pé entre os<br />
vários níveis <strong>de</strong> referenciali<strong>da</strong><strong>de</strong> que,<br />
alega<strong>da</strong>mente, o próprio autor se terá<br />
perdido pelo meio.<br />
A história <strong>de</strong> um encenador <strong>de</strong> teatro<br />
preso numa espiral obsessiva<br />
afina, refina e pormenoriza a invenção<br />
<strong>de</strong> uma reali<strong>da</strong><strong>de</strong> paralela que<br />
reencontramos em todos os filmes<br />
escritos por Kaufman, a meta-narrativa<br />
que navega entre a arte a vi<strong>da</strong>, a<br />
incapaci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> esquecer o passado<br />
que fez <strong>de</strong> nós quem somos, a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> tentar fazer sentido do<br />
mundo que nos ro<strong>de</strong>ia (mesmo que<br />
esse mundo seja um casulo puramente<br />
interno...). É uma espécie <strong>de</strong> “Kaufman<br />
redux”, só que sem a escapatória<br />
<strong>de</strong> um final mais ou menos feliz<br />
ou <strong>de</strong> um regresso à reali<strong>da</strong><strong>de</strong>: “Sinédoque”<br />
é uma toca <strong>de</strong> coelho que se<br />
esboroa atrás <strong>de</strong> nós em direcção a<br />
um final abrupto mas inescapável.<br />
“Só existe um único final para qualquer<br />
história. A vi<strong>da</strong> humana acaba<br />
com a <strong>morte</strong>. Até lá chegarmos, a vi<strong>da</strong><br />
vai an<strong>da</strong>ndo, vai ficando mais complica<strong>da</strong>.<br />
Tudo implica per<strong>da</strong>.”<br />
As palavras são do próprio Kaufman,<br />
à revista “Wired”, aquando <strong>da</strong><br />
estreia americana <strong>de</strong> “Sinédoque”. E<br />
se elas sugerem que a estreia na realização<br />
do argumentista é um filme<br />
<strong>de</strong>primido/<strong>de</strong>pressivo, pensemos<br />
apenas no seguinte: para quem imaginou<br />
a reencarnação no corpo <strong>de</strong><br />
John Malkovich, o sacrifício <strong>de</strong> um<br />
irmão gémeo que nunca existiu ou<br />
uma memória que se recusa a ser apaga<strong>da</strong>,<br />
admitir que <strong>da</strong>qui ninguém sai<br />
vivo é um triunfo <strong>de</strong> pragmatismo.<br />
A não ser, claro, que tudo isto apenas<br />
exista na cabeça <strong>de</strong> Charlie Kaufman.<br />
Ver crítica <strong>de</strong> filmes na pág. 33 e segs.<br />
Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 15
ANDREW ZAEH<br />
Música<br />
Lee Fields po<strong>de</strong> não ser uma estrela<br />
e po<strong>de</strong> nunca vir a ser uma estrela,<br />
mas está há tempo <strong>de</strong> mais no circuito<br />
para não se divertir com o que lhe<br />
está a acontecer.<br />
Ao fim e ao cabo, este é o tipo que<br />
esteve mais <strong>de</strong> <strong>de</strong>z anos à espera até<br />
gravar o primeiro disco e 13 até ao<br />
segundo, que se <strong>de</strong>u com as gentes<br />
<strong>da</strong> Stax mas nunca capitalizou no sucesso<br />
<strong>da</strong> editora, que foi consi<strong>de</strong>rado<br />
um émulo <strong>de</strong> James Brown, que <strong>de</strong>u<br />
dicas em discos <strong>de</strong> hip-hop, que sobreviveu<br />
fazendo segun<strong>da</strong>s vozes,<br />
sem que por um segundo o nome <strong>de</strong>le<br />
fosse conhecido para lá <strong>de</strong> um circuito<br />
mínimo <strong>de</strong> entendidos.<br />
Não é a primeira vez que isto acontece:<br />
Bettye LaVette e Sharon Jones<br />
são exemplos <strong>de</strong> divas que an<strong>da</strong>ram<br />
séculos perdi<strong>da</strong>s antes <strong>de</strong> serem re<strong>de</strong>scobertas<br />
por miúdos com i<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
para serem filhos <strong>de</strong>las, e que as fizeram<br />
gravar discos com as canções e<br />
condições necessárias.<br />
E agora é a vez <strong>de</strong> Fields ser entronado<br />
neste revivalismo <strong>da</strong> soul. Fields<br />
há-<strong>de</strong> ter tremen<strong>da</strong>s histórias para<br />
contar. Mas há coisas que ele não conta<br />
– e diverte-se com isso.<br />
A <strong>da</strong><strong>da</strong> altura, em conversa telefónica<br />
para sua casa, fazemos-lhe uma<br />
pergunta, uma simples pergunta. A<br />
resposta, que não estávamos <strong>de</strong> todo<br />
à espera, vem num tom roufenho,<br />
entre o divertido e o muito sério.<br />
“Má pergunta”, diz, e não sabemos<br />
se o homem está zangado ou não.<br />
“Essa é uma má pergunta”, repete<br />
e aqui começa a rir-se, indicando que<br />
não há zanga <strong>da</strong> sua parte.<br />
Que assunto será esse que o senhor<br />
Fields quer guar<strong>da</strong>r a sete chaves?<br />
Um passado <strong>de</strong> arrombador <strong>de</strong> cofres?<br />
Os anos passados como “drag queen”<br />
num botequim no Harlem?<br />
Um fetiche zoófilo?<br />
Não, na<strong>da</strong> disso. A resposta é: a<br />
i<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
No que toca à i<strong>da</strong><strong>de</strong> Lee Fields é<br />
pior do que algumas senhoras e alguns<br />
futebolistas que retiram anos ao<br />
BI. Ele nem sequer diz em que ano<br />
nasceu.<br />
Mas porquê? Porque raio há-<strong>de</strong> um<br />
homem que passou quase to<strong>da</strong> a sua<br />
vi<strong>da</strong> na semi-obscuri<strong>da</strong><strong>de</strong> escon<strong>de</strong>r<br />
16 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon<br />
a sua <strong>da</strong>ta <strong>de</strong> nascimento logo agora<br />
que começam a olhar para ele?<br />
Muito simples: “Neste momento<br />
há muita curiosi<strong>da</strong><strong>de</strong> a meu respeito<br />
e não me apetece que a curiosi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
acabe. Deixa-os continuar a perguntar.”<br />
E <strong>de</strong>pois, para que não restem<br />
dúvi<strong>da</strong>s <strong>de</strong> que há humor <strong>da</strong> sua parte,<br />
acrescenta a rir: “Desculpe, mas<br />
é assim que as coisas são”.<br />
É assim que as coisas são, mas não<br />
foi sempre assim que as coisas foram.<br />
O sucesso, por exemplo, é uma coisa<br />
que (parece que) Fields nunca teve. E<br />
agora (parece que) está a ter. Tudo por<br />
causa <strong>de</strong> um disco acabado <strong>de</strong> editar,<br />
feito <strong>de</strong> linhas <strong>de</strong> baixo dirigi<strong>da</strong>s à espinha,<br />
guitarras que fazem cócegas<br />
nos pés, órgãos saídos <strong>de</strong> uma igreja<br />
sulista, cor<strong>da</strong>s com arrependimento<br />
e metais cheios <strong>de</strong> pecado.<br />
Chama-se “My Life”, é soul à antiga<br />
e parece que é apenas o sétimo disco<br />
em nome próprio que Fields gravou.<br />
Dizemos “parece” porque o próprio<br />
Fields não está muito certo <strong>da</strong> sua<br />
discografia.<br />
“Sabe quantas canções gravei em<br />
meu nome? Umas sessenta, não mais<br />
que isso”.<br />
“My Life” é um disco <strong>de</strong> outro mundo,<br />
refina<strong>da</strong>mente arranjado, soberbamente<br />
interpretado. Fields espalha<br />
classe em ca<strong>da</strong> canção. Tem o seu<br />
número James Brown, o seu número<br />
Marvin Gaye, o seu número Smokey<br />
Robinson, o seu número Eddie<br />
Floyd.<br />
Ouve-se o disco e pensa-se: como<br />
é que este homem não tem <strong>de</strong>zenas<br />
<strong>de</strong> discos gravados?<br />
“Deixei-me explicar-lhe uma coisa,<br />
jovem: não gravei mais porque eu não<br />
queria gravar o que a indústria me<br />
man<strong>da</strong>va gravar. Eu queria gravar o<br />
que eu quisesse gravar. Não estou a<br />
dizer que o que fiz era o que tinha<br />
mesmo <strong>de</strong> ser feito, eu só fiz o que eu<br />
queria fazer. E foi por isso que gravei<br />
poucos discos”.<br />
A soul nunca foi negra<br />
Fields fala como se estivesse cheio <strong>de</strong><br />
vi<strong>da</strong> na boca: começa por respon<strong>de</strong>r<br />
a uma pergunta e <strong>de</strong>pois, à maneira<br />
dos pregadores <strong>de</strong> igreja, não para.<br />
Um assunto leva a outro, por tudo e<br />
por na<strong>da</strong> diz que está cheio <strong>de</strong> amor<br />
Lee Fields pôs<br />
“tudo o que<br />
tinha” em “My<br />
World”<br />
por to<strong>da</strong> a gente, ri-se, volta atrás, faz<br />
confissões, jura amor pela mulher,<br />
oferece <strong>de</strong>finições para a soul, diz<br />
que a “black music” há-<strong>de</strong> ser<br />
“everybody’s music”, diz que a soul<br />
acabou com a segregação porque “é<br />
música soul, não é música <strong>da</strong> soul dos<br />
pretos”. É tão conversador que a <strong>da</strong><strong>da</strong><br />
altura resolve explicar a génese <strong>da</strong><br />
música soul. “Primeiro chamaramlhe<br />
blues. E o blues era sobre os altos<br />
e baixos <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> <strong>da</strong>s pessoas normais.<br />
Quando chegou a soul o canto aproximou-se<br />
do gospel. Cantava-se como<br />
se se estivesse na igreja. É r’n’b na<br />
forma <strong>de</strong> igreja. E o r’n’b <strong>de</strong> hoje reflecte<br />
o mesmo, é uma canção sobre<br />
os altos e baixos do homem comum”,<br />
diz, embora seja uma tese difícil <strong>de</strong><br />
aceitar.<br />
Fields não é bem um teórico, é antes<br />
um génio do improviso, sacando<br />
teorias do bolso à medi<strong>da</strong> que lhe<br />
aparecem. Uma <strong>da</strong>s suas melhores<br />
teorias é que a soul nunca foi negra.<br />
“Havia brancos na Stax. Havia<br />
brancos na audiência. Havia brancos<br />
entre os músicos. Eu sei o que estou<br />
a dizer: eu estava lá”.<br />
E porque é que a soul nunca foi tão<br />
“mainstream” quanto po<strong>de</strong>ria ter sido,<br />
se havia tantos brancos a apreciála?<br />
Simples: “O ‘mainstream’ é o que<br />
a gran<strong>de</strong> indústria quiser que seja. É<br />
o que está na agen<strong>da</strong> <strong>de</strong>les. Po<strong>de</strong>-se<br />
pôr um porco na TV e se o <strong>de</strong>ixarmos<br />
tempo suficiente as pessoas acham<br />
que é bom.”<br />
Com to<strong>da</strong> a sua proficui<strong>da</strong><strong>de</strong> verbal,<br />
com todo o seu humor, Fields está,<br />
niti<strong>da</strong>mente, a divertir-se com o seu<br />
“suposto” sucesso. E diz suposto porque,<br />
apesar <strong>de</strong> “My World” an<strong>da</strong>r a<br />
ser citado por todo o lado, ele não faz<br />
i<strong>de</strong>ia “do que os mais novos acham<br />
<strong>de</strong>ste disco” mas sabe que “fazia mais<br />
dinheiro a ser músico <strong>de</strong> sessão”.<br />
Para Lee Fields, haja ou não sucesso,<br />
seja ou não “My World” um disco<br />
<strong>de</strong> retro-soul, as coisas são simples:<br />
“Isto é apenas soul, isto é a mesma<br />
coisa que sempre fiz”.<br />
Então raios partam a indústria que<br />
<strong>de</strong>ixa passar incógnito um talento<br />
<strong>de</strong>stes.<br />
“Little James Brown”<br />
O que é que sabemos ao certo <strong>de</strong> Lee<br />
“Não gravei mais<br />
porque não queria<br />
gravar o que a<br />
indústria me<br />
man<strong>da</strong>va gravar.<br />
Queria gravar o que<br />
eu quisesse gravar”<br />
Lee Fields<br />
Fields? Nasceu em Wilson, uma pequena<br />
terra <strong>da</strong> Carolina do Norte,<br />
informação que ele confirma, bem<br />
como a <strong>de</strong> que tem mais três irmãos.<br />
Não conta como aconteceu, mas “já<br />
fazia discos em 1969”.<br />
Tendo em conta que a sua alcunha<br />
era “Little JB”, por causa <strong>da</strong>s semelhanças<br />
faciais com James Brown, é<br />
possível que tenha começado cedo.<br />
Ele <strong>de</strong>fine essa época como “a altura<br />
em que a soul tal como a conhecíamos<br />
estava a morrer”. O rock e o funk<br />
psicadélico, “como o Sly Stone”, diz,<br />
“estavam a pegar”. “Mas eu nunca<br />
fui cool”, acrescenta, e o seu amor<br />
era só um: a soul.<br />
Fields, apesar <strong>de</strong> imensamente conversador<br />
(note-se: nunca ouvimos<br />
ninguém falar tanto) não é muito prolixo<br />
em relação às suas activi<strong>da</strong><strong>de</strong>s no<br />
circuito. Diz que gravou umas canções,<br />
o que quer dizer, em termos antigos,<br />
singles. É curioso que ele ain<strong>da</strong><br />
fala nesses termos, como se nunca<br />
tivesse havido LP, CD, EP, mp3.<br />
Era, admiti<strong>da</strong>mente, um James<br />
Brown em ponto pequeno. “Eu adoro<br />
o James Brown, meu. Ele era um<br />
Deus no meu coração e continuo a<br />
respeitá-lo. Um dos gran<strong>de</strong>s ‘entertainers’<br />
que viveram até hoje, ele e o<br />
Michael Jackson”.<br />
As comparações com o homem<br />
mais trabalhador do negócio mantiveram-se<br />
o tempo suficiente para a<br />
<strong>da</strong><strong>da</strong> altura ele ter sentido que estava<br />
na hora “<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> ser o pequeno<br />
JB”. “Lá pelos meus vintes comecei<br />
a achar que não era apreciado pelo<br />
que era. E ain<strong>da</strong> por cima era parecido<br />
com ele. Sempre <strong>de</strong>sviei a conversa<br />
quando se falava disso. Dizia ‘Ouve<br />
Lee Fields<br />
finalmente<br />
é a hora <strong>de</strong>le<br />
Não se sabe que i<strong>da</strong><strong>de</strong> tem Lee Fields mas an<strong>da</strong> nisto há muito.<br />
Com “My World” já ganhou o ano. Como é que este homem<br />
não tem <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> discos gravados? João Bonifácio
o meu disco’. Mas não me importava<br />
porque estava a divertir-me”.<br />
É difícil dizer o que Fields andou a<br />
fazer <strong>de</strong>s<strong>de</strong> então. “Estive sempre a<br />
trabalhar”, diz, <strong>de</strong> forma incisiva. Fez<br />
“muitos coros, muitas segun<strong>da</strong>s vozes”,<br />
incluindo para os Kool and The<br />
Gang; cantou “linhas em discos do<br />
Jay-Z”. Resumindo: “Sempre estive<br />
no circuito”.<br />
Há um momento muito engraçado,<br />
em que, referindo-se a questões monetárias,<br />
Fields diz: “Não preciso <strong>de</strong><br />
champanhe caro, não é o meu chá”.<br />
Tendo em conta o peso que o champanhe<br />
tem no imaginário e na vi<strong>da</strong><br />
<strong>de</strong> Jay-Z, parece haver aqui um certo<br />
gozo ao rei do hip-hop.<br />
Um disco imprevisto<br />
O dinheiro, note-se, é uma questão<br />
importante para Fields. Ele faz questão<br />
que fique bem claro que apesar <strong>de</strong><br />
“nunca ter tido um êxito” também<br />
nunca teve problemas. “Nunca fui rico,<br />
mas sempre tive dinheiro para viver<br />
bem”, afirma enfaticamente. “Se vier<br />
a minha casa verá que não vivo como<br />
um rei mas vivo muito bem. Sempre<br />
vivi. Sempre viajei para on<strong>de</strong> quis e os<br />
carros que quis ter pu<strong>de</strong> tê-los”.<br />
Claro que um discurso <strong>de</strong>stes tem<br />
sempre pequenas falhas e contradições.<br />
A certo momento Fields afirma:<br />
“Já não tenho um período em baixo<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> os anos 80”. Nessa altura fazia<br />
faixas disco para sobreviver. “Não<br />
estou a lutar contra na<strong>da</strong>, também<br />
tenho <strong>de</strong> pôr pão na mesa”, faz questão<br />
<strong>de</strong> dizer.<br />
Mas a sorte do pequeno JB <strong>de</strong>u-se<br />
quando Jeff Silverman and Leon Michels<br />
montaram a Truth & Soul records<br />
em 2004 e <strong>de</strong>finiram como<br />
priori<strong>da</strong><strong>de</strong> fazer um gran<strong>de</strong> disco para<br />
Lee. Montaram um ban<strong>da</strong>, os Expressions,<br />
com malta dos Dap Kings,<br />
dos Antibalas, mas esqueceram-se <strong>de</strong><br />
lhe dizer que estavam a fazer um disco<br />
para ele.<br />
Para nossa surpresa, Lee diz a <strong>da</strong><strong>da</strong><br />
altura: “Não sabia que estava a gravar<br />
‘My World’. Não sabia”. Compreen<strong>de</strong>se:<br />
o disco foi gravado ao longo <strong>de</strong><br />
quatro anos. “Chamavam-me para<br />
gravar uma canção e eu ia, mas entre<br />
ca<strong>da</strong> telefonema passava tanto tempo<br />
que nunca me ocorreu que estivéssemos<br />
a fazer um disco. Pensei que<br />
estivéssemos a gravar uma canção ou<br />
outra para um disco dos Expressions,<br />
não o meu disco. Talvez eles me tenham<br />
dito, mas eu falo com <strong>de</strong>z pessoas<br />
por dia e estou sempre a viajar<br />
<strong>de</strong> um lado para o outro, por isso não<br />
<strong>de</strong>coro tudo o que dizem”.<br />
Apesar <strong>de</strong> estar a gravar sem saber<br />
o quê, Fields pôs “tudo o que tinha<br />
naquele disco”. Que, para ele, “é um<br />
regresso à ‘sweet soul music’ e é lindo”.<br />
Penúltimas famosas palavras <strong>de</strong><br />
Lee Fields, homem <strong>de</strong> i<strong>da</strong><strong>de</strong> incerta<br />
e que tornou a soul doce outra vez:<br />
“Não tenho arrependimentos. O que<br />
me interessava era divertir-me – e diverti-me<br />
o mais que pu<strong>de</strong>. Não mu<strong>da</strong>ria<br />
a minha vi<strong>da</strong>.”<br />
E como bom homem soul acaba a<br />
dizer “Diga aí em Portugal que o Lee<br />
Fields ama to<strong>da</strong> a gente”.<br />
Ver crítica <strong>de</strong> discos na pág. 22 e segs.<br />
Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 17
Música<br />
Poucas coisas nos Sizo são como costumam<br />
ser as coisas no rock’n’roll.<br />
Afirmam-se como um “power trio”<br />
com quatro membros, dislate que tem<br />
a sua correspondência na prática; fazem<br />
“singles” memoráveis que man<strong>da</strong>m<br />
para as urtigas as sacrossantas<br />
regras <strong>da</strong> canção pop; não têm o objectivo<br />
supremo <strong>de</strong> lançar um álbum.<br />
Editaram recentemente “Got To Love<br />
People Who Set Themselves Up for<br />
Disaster”, o seu terceiro registo (os<br />
20 minutos que tem encaixam-no oficialmente<br />
na categoria EP, mas a ban<strong>da</strong><br />
prefere não pensar nisso) e um dos<br />
mais promissores discos do ano português.<br />
Em 2005, André Cruz e João Gue<strong>de</strong>s<br />
an<strong>da</strong>vam na Escola Superior <strong>de</strong><br />
Arte e Design, em Matosinhos. “Tínhamos<br />
interesses musicais em comum<br />
- ain<strong>da</strong> temos - e outros. Começámos<br />
a falar. Eu já tinha tido ban<strong>da</strong>s,<br />
se é que lhes posso chamar ban<strong>da</strong>s.<br />
Fizemos umas experiências em salas<br />
<strong>de</strong> ensaios com uns amigos”, recor<strong>da</strong><br />
André, em conversa com o Ípsilon<br />
numa confeitaria no centro do Porto,<br />
num calmo final <strong>de</strong> tar<strong>de</strong> <strong>de</strong> Agosto.<br />
Nessa altura, a ban<strong>da</strong> do Porto era<br />
“uma formação clássica <strong>de</strong><br />
rock’n’roll”: baixo, guitarra, bateria<br />
e voz, a que se juntou, mais tar<strong>de</strong>,<br />
Eurico Amorim no sintetizador e nos<br />
teclados. Até que o baixista rumou a<br />
Barcelona e, em vez <strong>de</strong> procurarem<br />
um substituto, <strong>de</strong>ram a Eurico um<br />
papel <strong>de</strong> maior <strong>de</strong>staque. “Com uma<br />
restrição acabámos por encontrar um<br />
som. Quando tens um problema acabas<br />
por encontrar uma solução. Resolver<br />
um problema através <strong>de</strong> outro<br />
problema tem bastante a ver connosco”,<br />
diz João Gue<strong>de</strong>s.<br />
O que resultou <strong>da</strong> estratégia foi uma<br />
ban<strong>da</strong> que suga a energia <strong>de</strong> várias<br />
formas <strong>de</strong> rock (<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o garage ao<br />
pós-punk) e a aplica em canções simples,<br />
concisas, sem ornamentos. E<br />
com espaço para surpresas. “She nods”,<br />
por exemplo, sintomaticamente<br />
o “single”, tem algo que se parece<br />
com um refrão mas… não o repete.<br />
18 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon<br />
Na cabeça hiper<br />
A ban<strong>da</strong> do Porto tem um novo EP, formato que assenta b<br />
“Got To Love People Who Set Themselves Up for Disaster” mostra como r<br />
Uma ban<strong>da</strong> <strong>de</strong> pop-rock (sim, os Sizo<br />
cabem nessa imensa gaveta) <strong>de</strong>sconstrutivista?<br />
Eles dizem que não. “A ‘She<br />
nods’ apareceu estava eu sentado na<br />
bateria – e não sei tocar bateria -, o<br />
baterista no teclado - o Eurico tinha<br />
talvez ido à casa <strong>de</strong> banho Foi assim<br />
que apareceu a base. É a isso que acho<br />
pia<strong>da</strong>: <strong>de</strong> repente temos um ‘single’,<br />
mas só porque apareceu”, revela André.<br />
E, apesar <strong>de</strong> tudo, “a estrutura<br />
pop está lá”.<br />
Trata-se, afinal, <strong>de</strong> reduzir tudo “ao<br />
essencial”, prossegue Eurico. “Nunca<br />
fazemos coisas arrisca<strong>da</strong>s a nível <strong>de</strong><br />
produção. Procuramos não disfarçar<br />
na<strong>da</strong>, queremos que o disco soe como<br />
um ensaio ou um concerto. As músicas<br />
são reduzi<strong>da</strong>s às partes mais simples,<br />
são quase to<strong>da</strong>s muito pequeninas,<br />
com poucas partes. Nasceram<br />
assim”. Agora percebe-se o que queriam<br />
dizer com a misteriosa afirma-<br />
“Nos anos 70 houve<br />
um revisitar do rock<br />
pelos Suici<strong>de</strong>, que têm<br />
muito <strong>de</strong> garage rock,<br />
apesar <strong>de</strong> não terem<br />
guitarras. Isso<br />
reflecte um pouco<br />
o que são os Sizo: tens<br />
a história do rock,<br />
com um lado<br />
electrónico mais<br />
contemporâneo<br />
e a guitarra e bateria<br />
clássicas do<br />
rock’n’roll...”<br />
André Cruz<br />
O abismo é um lugar bonito<br />
Há uma famosa “gaffe” atribuí<strong>da</strong> a um jogador <strong>de</strong> futebol que reza assim: “Estivemos à beira do abismo,<br />
mas soubemos <strong>da</strong>r um passo em frente”. Os Sizo gostam <strong>de</strong> pessoas que a levam à letra. Enquanto<br />
preparavam “Got To Love People Who Set Themselves Up for Disaster”, fizeram uma extensa lista com<br />
esses nomes. Eis algumas <strong>de</strong>ssas pessoas que “têm uma atitu<strong>de</strong> rock’n’roll para com a vi<strong>da</strong>”.<br />
Charles Bukowski<br />
Escritor (1920-1994)<br />
Atrai-lhes a “<strong>de</strong>smistificação<br />
dos ídolos”. “A maior parte<br />
<strong>da</strong>s pessoas tem esse lado<br />
dos mitos, <strong>de</strong> olhar para<br />
uma estrela <strong>de</strong> rock ou um<br />
jogador <strong>de</strong> futebol como um<br />
mito e, se calhar, são uns idiotas<br />
<strong>de</strong> todo o tamanho”, diz André.<br />
Bukowski “era genuíno, um gajo<br />
puro que curtia beber uns copos<br />
e escrever umas histórias. Era<br />
criativo muito por isso, por ser<br />
genuíno. Sentia aquela urgência<br />
<strong>de</strong> escrever e também escrevia<br />
sobre pessoas como ele”.<br />
Hunter S. Thompson<br />
Jornalista e escritor (1937-2005)<br />
Há um lado melómano na
activa dos Sizo<br />
bem à imediatez que se transformou na sua imagem <strong>de</strong> marca.<br />
reduzir as coisas ao essencial é, muitas vezes, o melhor remédio. Pedro Rios<br />
admiração por Thompson, o<br />
pai do “Gonzo Journalism”,<br />
que punha o repórter como<br />
parte integrante <strong>da</strong><br />
história, rejeitando o<br />
mito <strong>da</strong> objectivi<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
“Escreveu para a ‘Rolling<br />
Stone’ artigos importantes<br />
<strong>da</strong> história <strong>da</strong> música”,<br />
diz João. Mas há mais<br />
em Thompson <strong>de</strong><br />
que os Sizo gostam:<br />
“refugiou-se num<br />
rancho” e tem um “lado<br />
<strong>de</strong> perigo, rock, drogas, <strong>de</strong><br />
‘faço aquilo que quero e quem<br />
quiser gosta, quem não quiser<br />
não gosta’”.<br />
PAULO RICCA<br />
André Cruz,<br />
André<br />
Holan<strong>da</strong>, João<br />
Gue<strong>de</strong>s (atrás)<br />
e Eurico<br />
Amorim (à<br />
frente): os Sizo<br />
vão no<br />
terceiro EP e<br />
não pensam<br />
no álbum. Por<br />
eles faziam<br />
um EP <strong>de</strong> meio<br />
em meio ano e<br />
<strong>de</strong>ixavam as<br />
coisas assim,<br />
à Radiohead<br />
Bill Hicks<br />
Comediante (1961-1994)<br />
“Ele fala bastante do<br />
Jimi Hendrix. Dizia que a música<br />
<strong>da</strong> altura <strong>de</strong>le – isto no fim dos<br />
anos 80 – não o entusiasmava,<br />
que faltava<br />
rock cá <strong>de</strong> <strong>de</strong>ntro, atitu<strong>de</strong> [os<br />
alvos eram, por exemplo,<br />
os New Kids On The Block].<br />
O gajo, querendo ser um<br />
músico, coisa que nunca foi,<br />
dizia as coisas com humor.<br />
Há uma frase <strong>de</strong>le que é ‘Play<br />
from your fucking heart”.<br />
Ele sempre batalhou por ser<br />
genuíno, por fazer o que queria”,<br />
refere João.<br />
VALERY HACHE/ AFP<br />
ção que puseram num comunicado<br />
<strong>de</strong> imprensa: “’power trio’ mas com<br />
quatro elementos”.<br />
O espírito do rock’n’roll<br />
A haver canção que <strong>de</strong>fine o que os<br />
Sizo querem ela é “Strychnine”, a versão<br />
dos Sonics, um dos nomes fun<strong>da</strong>mentais<br />
do garage rock dos anos 60.<br />
Como num “mashup”, os Sizo colocaram<br />
a linha <strong>de</strong> sintetizador <strong>de</strong><br />
“Ghost ri<strong>de</strong>r”, dos Suici<strong>de</strong> (duo que<br />
no seu disco <strong>de</strong> 1977 foi pioneiro <strong>de</strong><br />
mil aventuras electrónicas que se seguiriam).<br />
“Foi um bocado premeditado.<br />
É uma reflexão sobre a história<br />
do rock <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1965, que é a <strong>da</strong>ta <strong>da</strong><br />
‘Strychnine’. Depois, nos anos 70,<br />
houve um revisitar do rock pelos Suici<strong>de</strong>,<br />
que têm muito <strong>de</strong> garage rock,<br />
apesar <strong>de</strong> não terem guitarras. Isso<br />
reflecte um pouco o que são os Sizo:<br />
tens a história do rock, com um lado<br />
electrónico mais contemporâneo e a<br />
guitarra e bateria clássicas do<br />
rock’n’roll... Daí uma vonta<strong>de</strong> quase<br />
intuitiva <strong>de</strong> misturar os Suici<strong>de</strong> e os<br />
Sonics como um elogio ao<br />
rock’n’roll”.<br />
A conversa adquire contornos <strong>de</strong><br />
melomania exacerba<strong>da</strong>. André elogia<br />
os Sonics e outras “ban<strong>da</strong>s <strong>de</strong> garage<br />
dos Estados Unidos”, “os primeiros<br />
punks”, que “furavam os amplificadores<br />
com picadores <strong>de</strong> gelo para terem<br />
distorção, porque não havia pe<strong>da</strong>is,<br />
e com um microfone gravavam<br />
um disco inteiro com a ban<strong>da</strong> to<strong>da</strong> a<br />
tocar”. “É isso que nos interessa”, explica.<br />
A atitu<strong>de</strong> punk “está presente nos<br />
Sizo <strong>de</strong> uma forma bastante evi<strong>de</strong>nte”,<br />
continua o guitarrista, que aos<br />
nove anos ficou “fascinado” com os<br />
Toy Dolls, ban<strong>da</strong> punk inglesa: “No<br />
lado imediato <strong>de</strong> fazer as músicas, <strong>de</strong><br />
não pensar muito como é que vai soar,<br />
o que é que as pessoas vão achar.<br />
A forma como gravamos também tem<br />
um lado punk”. As canções <strong>de</strong> “Got<br />
To Love People Who Set Themselves<br />
Up for Disaster” não foram grava<strong>da</strong>s<br />
com a ban<strong>da</strong> to<strong>da</strong> a tocar ao mesmo<br />
Maradona<br />
Futebolista (1960- )<br />
“Para nós não foi só um jogador<br />
<strong>de</strong> futebol”, diz André. “Na<br />
altura em que jogou, o que<br />
representava para os a<strong>de</strong>ptos<br />
do Nápoles ou <strong>da</strong> Argentina<br />
não era apenas o melhor<br />
jogador do mundo: era<br />
tempo (o anterior, “Nice To Miss You”,<br />
disco bónus do novo trabalho, foi resultado<br />
<strong>de</strong> uma sessão ininterrupta<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>z horas <strong>de</strong> gravação), mas a imediatez<br />
mantém-se.<br />
Não estranha, por isso, que a ban<strong>da</strong><br />
tenha, até ao momento, três EP e nem<br />
acalente o tradicional sonho do álbum.<br />
“Não passam <strong>de</strong> três registos<br />
“A ‘She nods’ apareceu<br />
estava eu sentado<br />
na bateria – e não sei<br />
tocar bateria -, o<br />
baterista no teclado.<br />
É a isso que acho<br />
pia<strong>da</strong>: <strong>de</strong> repente<br />
temos um ‘single’, mas<br />
só porque apareceu”<br />
André Cruz<br />
que fizemos em condições técnicas e<br />
logísticas distintas, em alturas distintas<br />
e com músicas distintas”, resume<br />
André. Eurico acrescenta: “Estamos<br />
sempre em produção. Por nós, até<br />
fazíamos um EP <strong>de</strong> meio em meio<br />
ano”.<br />
Apontamos o exemplo dos Radiohead,<br />
que recentemente anunciaram<br />
que vão apostar em edições mais curtas<br />
em vez <strong>de</strong> álbuns, e eles riem-se.<br />
“Eles seguem-nos muito”, diz André,<br />
com ironia e ares <strong>de</strong> quem conta uma<br />
pia<strong>da</strong> priva<strong>da</strong> <strong>da</strong> ban<strong>da</strong> – uma suposta<br />
conspiração em que os Radiohead<br />
espiam os Sizo. “Lançámos o primeiro<br />
EP na Net antes dos Radiohead e<br />
passado uns meses também fizeram<br />
isso [com o álbum ‘In Rainbows’].<br />
Agora temos esta lógica e os Radiohead<br />
também têm. Não vou dizer mais<br />
na<strong>da</strong> [risos]”.<br />
Ver crítica <strong>de</strong> discos na pág. 22 e segs.<br />
o símbolo <strong>de</strong> uma libertação<br />
política, pessoal e social que<br />
nos interessa e que nos cativa”.<br />
“Era um rock’n’roller, um Jimi<br />
Hendrix do futebol: saía à noite,<br />
não dormia e ia jogar<br />
futebol como ninguém.<br />
A droga na altura <strong>de</strong>via<br />
ser melhor”. P.R.<br />
Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 19
Um sonho pop<br />
chamado Gol<strong>de</strong>n Silvers<br />
“True Romance” é a canção-fetiche <strong>de</strong>ste Verão. Definiram-na como<br />
“Prince li<strong>de</strong>rando os Span<strong>da</strong>u Ballet” (nós preferimos o Prince <strong>da</strong> equação).<br />
Os Gol<strong>de</strong>n Silvers não são tão bons quanto o tema título do álbum<br />
<strong>de</strong> estreia, mas po<strong>de</strong>m vir a sê-lo. Mário Lopes<br />
20 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon<br />
Neste preciso momento, os Gol<strong>de</strong>n<br />
Silvers, trio com inegável apreço por<br />
metais preciosos e o exuberante púrpura<br />
psicadélico, são inescapáveis. A<br />
culpa, como quase sempre nestas coisas<br />
<strong>da</strong> pop, é <strong>de</strong> um single. Já o viram<br />
certamente – se não o viram, corram<br />
ao MySpace ou ao You Tube e procurem<br />
por “True Romance”. Um cenário<br />
<strong>de</strong> programa alemão dos anos 1980,<br />
(mal) armado em Top Of The Pops, e<br />
muitas raparigas <strong>da</strong>nçando pelo cenário,<br />
com um feiticeiro <strong>de</strong> barrete<br />
bizarro e um B-boy pouco gracioso a<br />
<strong>de</strong>stoarem e uma “go-go <strong>da</strong>ncer” doura<strong>da</strong><br />
a compor o enquadramento. E<br />
<strong>de</strong>pois eles os três, o baterista <strong>de</strong> afro<br />
imponente, Alexis Martinez, o baixista<br />
<strong>de</strong> bigo<strong>de</strong> e patilha bem <strong>de</strong>finidos,<br />
Ben Moorhouse, homem do groove<br />
funk e <strong>da</strong>s segun<strong>da</strong>s vozes, e Gwilym<br />
Gold, o vocalista e teclista com pose<br />
<strong>de</strong> aristocrata pop que consi<strong>de</strong>ra ves-
O baterista<br />
<strong>de</strong> afro<br />
imponente,<br />
o baixista<br />
<strong>de</strong> bigo<strong>de</strong> e<br />
patilha bem<br />
<strong>de</strong>finidos e o<br />
vocalista e<br />
teclista com<br />
pose <strong>de</strong><br />
aristocrata<br />
pop<br />
tir-se <strong>de</strong> forma elegante uma <strong>de</strong>monstração<br />
<strong>de</strong> respeito – camisa púrpura,<br />
claro, fio <strong>de</strong> prata a cair sobre ela e os<br />
braços movendo-se <strong>de</strong>scoor<strong>de</strong>nados<br />
quando não se atiram ao pequeno teclado<br />
que têm à frente.<br />
“True Romance” é a canção-fetiche<br />
<strong>de</strong>ste Verão. Já a <strong>de</strong>finiram como<br />
“Prince, produzido por Niles Rogers,<br />
li<strong>de</strong>rando os Span<strong>da</strong>u Ballet”, e não<br />
está na<strong>da</strong> mal – mas nós preferimos<br />
trocar os Span<strong>da</strong>u Ballet pelos Duran<br />
Duran; ou melhor, o que preferimos<br />
mesmo é o Prince <strong>da</strong> equação, aquele<br />
quase rap <strong>de</strong> Gwilym nos versos e o<br />
ataque <strong>da</strong>s teclas num refrão que <strong>de</strong>monstra<br />
a superiori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> uma ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira<br />
pose cool neste mundo <strong>da</strong><br />
pop.<br />
Os Gol<strong>de</strong>n Silvers não são tão bons<br />
quanto “True Romance”, a canção<br />
que dá título ao seu álbum <strong>de</strong> estreia.<br />
Mas, ouvindo esse primeiro longa duração,<br />
fica a sensação que po<strong>de</strong>m vir<br />
a sê-lo. A sua música, iminentemente<br />
britânica, vagueia entre uma tradição<br />
<strong>de</strong> contadores <strong>de</strong> histórias ao piano<br />
(curtas fantasias <strong>de</strong> subtexto invariavelmente<br />
romântico e trágico), e um<br />
jogo pop que ora <strong>de</strong>ixa que as harmonias<br />
vocais se imponham, ora investe<br />
pela <strong>da</strong>nça com o funk no horizonte<br />
“Quando há tanta<br />
ilusória criação <strong>de</strong><br />
fenómenos por parte<br />
dos media, o melhor<br />
mesmo é construir a<br />
nossa própria cena,<br />
ou irão fazê-lo por<br />
nós. Hoje em dia é<br />
muito fácil as ban<strong>da</strong>s<br />
reunirem-se nos<br />
termos por elas<br />
<strong>de</strong>finidos, ocuparem<br />
um espaço e<br />
crescerem sem se<br />
sentirem intimi<strong>da</strong><strong>da</strong>s<br />
pela indústria”<br />
Gwylim Gold<br />
(a inevitável “True romance”) ou <strong>de</strong><br />
caipirinha na mão em “resort” imaginário<br />
(a <strong>de</strong>liciosa chungaria “high<br />
class” <strong>de</strong> “Arrows of eros”). Para além<br />
disso, os Gol<strong>de</strong>n Silvers, os contraditórios<br />
Gol<strong>de</strong>n Silvers (já lá vamos), são<br />
tipos ambiciosos e a contra-corrente<br />
do que é, actualmente, a norma na<br />
pop britânica.<br />
A pop como fantasia<br />
Gwilym Gold, que o Ípsilon entrevistou<br />
a meio <strong>da</strong> maratona <strong>de</strong> festivais<br />
que o trio cumpre actualmente, queixa-se<br />
<strong>de</strong> haver <strong>de</strong>masia<strong>da</strong> gente a<br />
anunciar a sua música como “incrivelmente<br />
nova e refrescante” quando<br />
“é <strong>de</strong>masiado óbvio que não o é”. Cavalheiro<br />
ou politicamente correcto,<br />
recusa-se a concretizar: “Não quero<br />
<strong>de</strong>itar abaixo o trabalho dos outros”,<br />
<strong>de</strong>clara. Fala então <strong>da</strong> sua própria<br />
ban<strong>da</strong>. Presenteia-nos com um par <strong>de</strong><br />
banali<strong>da</strong><strong>de</strong>s, as habituais - quer “escancarar<br />
as portas a algo “fresco e<br />
exuberante”, “que sobreviva ao teste<br />
do tempo” – antes <strong>de</strong> chegar a algo<br />
mais interessante.<br />
Nas entrevistas que <strong>de</strong>les lemos, há<br />
uma linha que Gwilym raramente atravessa,<br />
aquela que separa a vi<strong>da</strong> pública,<br />
a do músico em palco, <strong>da</strong> priva<strong>da</strong>.<br />
Num contexto mediático que, no universo<br />
<strong>da</strong> pop, vive obcecado com os<br />
bastidores, isto, não sendo inédito, é<br />
<strong>de</strong>certo pouco comum. É-o ain<strong>da</strong> mais<br />
quando percebemos que essa “protecção”<br />
não surge por reacção a uma<br />
cultura tablói<strong>de</strong>: é, antes, essencial à<br />
forma como o vocalista quer projectar<br />
a música dos Gol<strong>de</strong>n Silvers.<br />
Gwilym queixa-se do excesso <strong>de</strong><br />
“mun<strong>da</strong>ni<strong>da</strong><strong>de</strong>” nas letras que ouve<br />
– prefere as figuras com algo <strong>de</strong> negro,<br />
com o sentido trágico do velho blues,<br />
“poéticas sem se esforçarem por sêlo”.<br />
Exactamente o contrário do que<br />
vê hoje, quando “todos querem exibir<br />
as suas vi<strong>da</strong>s perante todos os outros<br />
no Facebook”. Os Gol<strong>de</strong>n Silvers recusam-se<br />
a fazê-lo: “Existimos na ban<strong>da</strong>.<br />
O resto <strong>da</strong>s nossas vi<strong>da</strong>s é supérfluo”.<br />
Fica assim enquadra<strong>da</strong> a forma<br />
que escolhe para elogiar David Bowie,<br />
uma <strong>da</strong>s suas maiores referências, a<br />
par dos Beach Boys ou <strong>de</strong> Sly & The<br />
Family Stone. Aprecia-o pela “capaci<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> <strong>da</strong>r um passo em frente” e <strong>de</strong><br />
“transformar-se realmente, convictamente,<br />
naquilo que i<strong>de</strong>alizou”. Aprecia<br />
David Bowie, enten<strong>da</strong>-se, pela<br />
forma como inventou corpo e música<br />
para Ziggy ou Thin White Duke. Ou<br />
seja, Gwilym, ele que se <strong>de</strong>fine, antes<br />
<strong>de</strong> tudo o resto, como um “compositor<br />
<strong>de</strong> canções”, acredita na força <strong>de</strong><br />
Música<br />
uma i<strong>de</strong>ia pop e no imaginário <strong>de</strong> fantasia<br />
para on<strong>de</strong> ela nos transporta –<br />
uma fantasia, enten<strong>da</strong>-se, sem dragões<br />
ou bolas <strong>de</strong> sabão, antes construí<strong>da</strong><br />
sobre aquelas que a fértil história <strong>da</strong><br />
pop foi construindo ao longo dos tempos.<br />
É precisamente neste ponto que<br />
cai sobre a mesa a contradição a que<br />
nos referimos acima. Porque, se ouvimos<br />
hoje falar dos Gol<strong>de</strong>n Silvers,<br />
se em pouco menos <strong>de</strong> um ano passaram<br />
<strong>de</strong> obscura ban<strong>da</strong> londrina a<br />
estrelas em ascensão, isso <strong>de</strong>ve-se a<br />
algo que, na escala pop, correspon<strong>de</strong><br />
ao grau zero <strong>de</strong> “coolness”.<br />
Em 2008, estiveram em Glastonbury,<br />
actuaram em Glastonbury. No<br />
palco principal? No secundário? Num<br />
camião estacionado à entra<strong>da</strong>? Na<strong>da</strong><br />
disso, subiram a palco para, perante<br />
um painel <strong>de</strong> júris, actuar no concurso<br />
“novos talentos” do festival. Ain<strong>da</strong><br />
por cima ganharam-no, o que po<strong>de</strong><br />
ser a macha<strong>da</strong><strong>da</strong> final na credibili<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> uma ban<strong>da</strong> – a magia <strong>da</strong> pop não<br />
se dá bem com concursos e ninguém<br />
respeita o vencedor <strong>de</strong> um <strong>de</strong>les.<br />
Gwylim, que tem perfeita consciência<br />
disso mesmo, <strong>de</strong>svaloriza o “inci<strong>de</strong>nte”.<br />
Explica que o manager os inscreveu<br />
sem avisar e confessa que sim, “foi<br />
estranho actuar perante júris”. Isto<br />
para concluir que, “apesar <strong>de</strong> tudo ter<br />
acontecido muito rápido a partir do<br />
concurso”, viram-no apenas como<br />
mais um concerto. Os Gol<strong>de</strong>n Silvers<br />
já existiam há algum tempo e to<strong>da</strong><br />
aquela trupe colori<strong>da</strong> que vemos no<br />
ví<strong>de</strong>o <strong>de</strong> “True romance” já os seguia.<br />
O concurso, dizem-nos, foi um pormenor<br />
<strong>de</strong> percurso.<br />
Quando a ban<strong>da</strong> nasceu, começou<br />
por fazer o circuito habitual londrino,<br />
trabalhando com os promotores habituais<br />
nas salas habituais. Fartaramse<br />
rapi<strong>da</strong>mente: “Os concertos não<br />
eram propriamente inspiradores, a<br />
promoção era medíocre, na<strong>da</strong> acon-<br />
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tecia”. A solução? “Fazer tudo por nós<br />
próprios”. Garantiram uma residência<br />
no MacBeth, um clube <strong>de</strong> Hoxton, no<br />
Noroeste <strong>de</strong> Londres, e começaram a<br />
organizar o Bronze Club. Tocavam<br />
eles, tocavam ban<strong>da</strong>s <strong>de</strong> que gostavam,<br />
promoviam os seus próprios DJ<br />
sets e convi<strong>da</strong>vam DJs para os fazerem.<br />
O primeiro concerto <strong>de</strong> Micachu<br />
com os Shapes, por exemplo, teve ali<br />
lugar. Gwylim, cuja música é tão obviamente<br />
diferente <strong>da</strong> <strong>da</strong> autora <strong>de</strong><br />
“Jewellery”, faz questão <strong>de</strong> acentuar<br />
que aquilo que os une é “uma vonta<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> reinvenção” – entretanto ela assinou<br />
uma remistura para os Gol<strong>de</strong>n<br />
Silvers e ele foi co-autor <strong>de</strong> uma canção<br />
<strong>de</strong> Micachu, “Train for a brain”.<br />
Gwylim Gold: “Quando há tanta ilusória<br />
criação <strong>de</strong> fenómenos por parte<br />
dos media, o melhor mesmo é construir<br />
a nossa própria cena, ou irão<br />
fazê-lo por nós. Hoje em dia é muito<br />
fácil fazê-lo, é fácil as ban<strong>da</strong>s reunirem-se<br />
nos termos por elas <strong>de</strong>finidos,<br />
ocuparem um espaço e crescerem<br />
sem se sentirem intimi<strong>da</strong><strong>da</strong>s por to<strong>da</strong><br />
a mer<strong>da</strong> <strong>da</strong> indústria”.<br />
Resumindo, os Gol<strong>de</strong>n Silvers utilizam<br />
as possibili<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> hoje para<br />
regressar a um mundo <strong>de</strong> fantasias<br />
pop que, <strong>de</strong>sgraça<strong>da</strong>mente, acreditam<br />
ter <strong>de</strong>saparecido. Cantam sobre<br />
miú<strong>da</strong>s que querem ser estrelas, mas<br />
nunca chegarão a sê-lo, cantam um<br />
par que ambiciona morrer <strong>de</strong> um coração<br />
<strong>de</strong>stroçado. Depois, saltam para<br />
a pista <strong>de</strong> <strong>da</strong>nça e oferecem-nos<br />
híbridos funk e psica<strong>de</strong>lismos transviados.<br />
Não serão consensuais e imaginamos<br />
que haverá quem os veja como<br />
“um Mika que resultou bem” – uma<br />
dica para os <strong>de</strong>tractores. Seja. Nós<br />
achamos que o seu romantismo e fantasia<br />
são bem-vindos a 2009 - e elegemos<br />
“True romance” canção do<br />
ano.<br />
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Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 21<br />
<br />
<br />
silva!<strong>de</strong>signers
Discos<br />
22 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon<br />
Pop<br />
Um “soul<br />
man” <strong>de</strong><br />
encantar<br />
“My World”, um dos raros<br />
álbuns do raro Lee Fields,<br />
tem uma produção cheia <strong>de</strong><br />
cetim, mas acima <strong>de</strong> tudo<br />
tem canções extraordinárias,<br />
arranjos imaculados e uma<br />
voz tremen<strong>da</strong>.<br />
João Bonifácio<br />
Lee Fields<br />
My World<br />
Truth & Soul; distri. Flur<br />
mmmmn<br />
Por mais que<br />
queiram, não é<br />
ver<strong>da</strong><strong>de</strong> que “My<br />
World” seja um<br />
disco<br />
exclusivamente<br />
retro, com<br />
aquele som sujo e repleto <strong>de</strong><br />
suor <strong>da</strong> soul muito<br />
antiga. “My World” é<br />
quase, quase,<br />
quase um disco<br />
retro, mas<br />
limado com<br />
uma<br />
precisão<br />
cirúrgica <strong>de</strong> modo a encantar não<br />
apenas duas <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> velhinhos<br />
melómanos rabugentos (como nós)<br />
mas também as jovenzinhas que<br />
apreciam Duffy. (Não por acaso,<br />
Fields é fã <strong>de</strong> Duffy.). Mais que<br />
aproximar-se do funk que o senhor<br />
Fields tanto preza, “My World” é um<br />
exemplo <strong>de</strong> melodia e arranjo, <strong>de</strong><br />
“sweet soul music”. (Curiosi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
soul: o gran<strong>de</strong> Arthur Conley tem<br />
um tema chamado “Sweet soul<br />
music”. A sua melhor canção, no<br />
entanto, é “A night is all I need”, um<br />
dos melhores temas soul <strong>de</strong> sempre.<br />
Está na hora do revivalismo <strong>de</strong><br />
Conley.) Tem os metais cheios <strong>de</strong><br />
mel, os coros <strong>de</strong>votos, os órgãos<br />
cool, as cor<strong>da</strong>s <strong>de</strong>lica<strong>da</strong>s que<br />
povoaram os discos <strong>da</strong> Stax e <strong>de</strong><br />
milhentas subsidiárias e editoras<br />
minúsculas dos anos 60, mas nunca<br />
se explo<strong>de</strong>: antes se pega no ouvinte<br />
pela mãozinha e, quando ele repara,<br />
está viciado nos órgãos, na<br />
bati<strong>da</strong>zinha ligeira, nos metais <strong>de</strong><br />
sopro <strong>de</strong> Verão. E na voz, a voz <strong>de</strong><br />
“soul man” <strong>de</strong> Lee Fields. “My<br />
World” tem uma produção cheia <strong>de</strong><br />
cetim (Al Green ia adorar cantar<br />
num disco assim), mas acima <strong>de</strong><br />
tudo tem canções. Logo à cabeça o<br />
tema-título, cujos órgãos e cor<strong>da</strong>s<br />
recor<strong>da</strong>m o<br />
Marvin<br />
Gaye<br />
aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />
<strong>de</strong> “What’s Going On”, é um<br />
supremo single, recheado <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>talhes: os metais em contra-ponto<br />
a um pizzicato <strong>de</strong> (parece ser)<br />
xilofone, a linha <strong>de</strong> guitarra, etc. As<br />
cor<strong>da</strong>s <strong>de</strong> “Ladies” vêm com unhas<br />
pinta<strong>da</strong>s, a guitarra wah-wah rebola<br />
as ancas, aqueles metais são uma<br />
homenagem aos <strong>de</strong>cotes<br />
pronunciados. E <strong>de</strong>via inventar-se<br />
um prémio para os coros <strong>de</strong> “My<br />
world is empty without you”: a linha<br />
melódica é <strong>de</strong>fini<strong>da</strong> por sinos,<br />
cor<strong>da</strong>s volteiam torno <strong>da</strong> guitarra, a<br />
voz é plena <strong>de</strong> um qualquer<br />
sofrimento que só vale a pena em<br />
canção. Do princípio ao fim é assim:<br />
canções extraordinárias, arranjos<br />
imaculados, uma voz tremen<strong>da</strong>. Isto<br />
não é retro. Isto é gran<strong>de</strong> música.<br />
Sizo<br />
Got To Love People Who Set<br />
Themselves Up for Disaster<br />
Wash, distri. Locomotive<br />
mmmnn<br />
O terceiro EP dos<br />
Sizo começa com<br />
uma bateria<br />
locomotiva, a que<br />
se juntam, poucos<br />
segundos <strong>de</strong>pois,<br />
guitarras à Sonic<br />
Youth, uma voz áspera. É uma<br />
espécie <strong>de</strong> la<strong>da</strong>inha eléctrica,<br />
simples, sem manhas, nem<br />
rodriguinhos e que <strong>de</strong>fine ao que<br />
vem a ban<strong>da</strong> do Porto.<br />
Esta é, coisa rara, uma ban<strong>da</strong> rock<br />
com “singles” radiofónicos mas sem<br />
medo <strong>de</strong> berrar e <strong>de</strong> armar uma<br />
chinfrineira. Têm a dose certa <strong>de</strong><br />
perigosi<strong>da</strong><strong>de</strong>, que aplicam com<br />
sapiência em canções memoráveis,<br />
curtas e eficazes. Ouça-se “She<br />
nods”: abre com uma linha<br />
fantasmagórica <strong>de</strong> sintetizador,<br />
entram <strong>de</strong>pois guitarras <strong>de</strong>vedoras<br />
do pós-punk e João Gue<strong>de</strong>s, o<br />
Com “My World”,<br />
Lee Fields <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong><br />
ser um segredo<br />
Sizo, uma ban<strong>da</strong> rock<br />
com singles radiofónicos<br />
mas sem medo <strong>de</strong> armar<br />
uma chinfrineira<br />
vocalista, em registo quase “spoken<br />
word”, e ouvimos algo que teria<br />
tudo para ser um refrão, mas que o<br />
grupo <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> não repetir, num<br />
saudável <strong>de</strong>srespeito pelas regras<br />
<strong>da</strong>s rádios.<br />
“Obsession/Reaction” faz-se em<br />
torno <strong>de</strong> um “riff” <strong>de</strong> guitarra<br />
circular, os teclados a fazer as vezes<br />
<strong>de</strong> baixo e gritos escondidos por<br />
uma nuvem <strong>de</strong> “reverb”.<br />
“Strychnine”, o melhor momento do<br />
EP, acelera o original dos Sonics,<br />
casa a métrica <strong>da</strong> guitarra com a<br />
dolente linha clássica <strong>de</strong> sintetizador<br />
<strong>de</strong> “Ghost ri<strong>de</strong>r” dos Suici<strong>de</strong>, e a<br />
fusão tem tanto <strong>de</strong> interessante<br />
como <strong>de</strong> simbólico, colocando os<br />
Sizo algures entre duas formas <strong>de</strong><br />
ver o rock, afinal tão próximas.<br />
“Tour <strong>de</strong> force” é outro atestado <strong>de</strong><br />
força percussiva, com um solo <strong>de</strong><br />
guitarra que lembra “East Bay ray”<br />
dos Dead Kennedys.<br />
“Got To Love People Who Set<br />
Themselves Up for Disaster” vem<br />
acompanhado do EP “Nice to Miss<br />
You” e é notória a evolução <strong>da</strong><br />
ban<strong>da</strong>: no EP anterior havia boas<br />
i<strong>de</strong>ias (como o “single” “Big three”),<br />
cuja força era conti<strong>da</strong> pela gravação<br />
mais roufenha. Postos lado a lado,<br />
percebe-se que os Sizo têm uma<br />
ampla margem <strong>de</strong> progressão. Para<br />
já, os sinais são muito animadores.<br />
Pedro Rios<br />
Gol<strong>de</strong>n Silvers<br />
True Romance<br />
XL Recordings; distri. Popstock<br />
mmmnn<br />
Existe esta música<br />
e esta música<br />
apenas: “True<br />
romance”, três<br />
minutos e meio <strong>de</strong><br />
inexcedível<br />
perfeição pop. Um<br />
homem, que canta como vocalista<br />
cool a arriscar o rap dos beatnicks e<br />
dos MCs, a alinhar frases como “be a<br />
fabulous weekend won<strong>de</strong>r, and a<br />
miracle worker in the week / you are
a genius every<strong>da</strong>y, but don’t lose your<br />
common touch / Join a gang, learn<br />
rhyming slang, learn greek, learn<br />
double dutch”. Já estamos<br />
entusiasmados e ain<strong>da</strong> nem<br />
chegámos ao “cowbell” unido à linha<br />
<strong>de</strong> baixo, àquele “true romance” que<br />
o coro entoa em tom vaporoso e ao<br />
teclado que nos põe a <strong>da</strong>nçar como<br />
se Prince tivesse <strong>de</strong>scido <strong>de</strong> novo à<br />
Terra e fosse três tipo ingleses a tocar<br />
PAULO RICCA<br />
o funk retro-futurista mais funky <strong>de</strong><br />
2009.<br />
A estreia dos Gol<strong>de</strong>n Silvers tem o<br />
seu tema título e só ele vale o disco<br />
todo. O resto? O resto é um conjunto<br />
<strong>de</strong> canções pop repletas <strong>de</strong> um<br />
romantismo que ilu<strong>de</strong> a ingenui<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
com <strong>de</strong>sencanto – sonhadores que<br />
antevêem a que<strong>da</strong> antes do sonho<br />
concretizado -, canções on<strong>de</strong> as<br />
guitarras estão ausentes – tudo<br />
secção rítmica, pianos e<br />
sintetizadores – e po<strong>de</strong>m ser doo-wop<br />
marado em canção <strong>de</strong> Randy<br />
Newman (“Please Venus”), a visão <strong>de</strong><br />
Morrissey com os Duran Duran no<br />
Tropicana Club (“Arrows of Eros”)<br />
ou, nos antípo<strong>da</strong>s <strong>de</strong> tamanha<br />
efervescência, o negrume romântico<br />
<strong>da</strong> alma folk que atravessa as<br />
tragédias <strong>de</strong> “Magic touch”.<br />
Álbum <strong>de</strong>sequilibrado, tem coisas<br />
entusiasmantes, como o<br />
psica<strong>de</strong>lismo neurótico <strong>de</strong> “Shakes”<br />
(perturbados, <strong>da</strong>ncemos!), lado a<br />
lado com a sensaboria para piano e<br />
harmonias vocais à Queen <strong>de</strong> “Queen<br />
of the 21st century”.<br />
É apenas o primeiro disco e os<br />
Gol<strong>de</strong>n Silvers lá saberão por on<strong>de</strong><br />
quererão ir no futuro. Por agora,<br />
como nos ofereceram “True<br />
romance”, perdoamos-lhes<br />
tudo. Mário Lopes<br />
Gol<strong>de</strong>n Silvers: tudo por “True romance”, a canção do ano<br />
Espaço<br />
Público<br />
Jazz<br />
A canção<br />
<strong>da</strong> Broadway<br />
Uma improvável parceria<br />
entre dois músicos dá<br />
origem a uma <strong>da</strong>s obras mais<br />
fascinantes <strong>da</strong> história do<br />
jazz vocal masculino.<br />
Rodrigo Amado<br />
Tony Bennett / Bill Evans<br />
The Complete Recordings<br />
Fantasy, distri. Universal<br />
mmmmn<br />
Da Madragoa ao Bairro<br />
Alto, por Alfama ao<br />
Castelo, paramos na<br />
Mouraria, porque “na<br />
Mouraria só falam do<br />
namorico, que a Bia<br />
namora o Chico”. Curiosos,<br />
caminhamos pelo ventre<br />
<strong>da</strong>s vielas, travessas e<br />
pátios, on<strong>de</strong> choram as<br />
guitarras carpi<strong>de</strong>iras<br />
e Carminho recua no<br />
Tony Bennett foi,<br />
juntamente com<br />
Frank Sinatra, um<br />
dos cantores cuja<br />
música cresceu<br />
comigo, mais<br />
concretamente<br />
através do seu primeiro registo em<br />
duo com o pianista Bill Evans, o<br />
qual ouvia em casa dos meus pais,<br />
ain<strong>da</strong> miúdo. Por diversas vezes<br />
procurei a música <strong>de</strong> Bennett<br />
noutros contextos, longe <strong>da</strong><br />
colaboração com o pianista, mas<br />
fiquei sistematicamente<br />
<strong>de</strong>sapontado, <strong>de</strong>scobrindo que a<br />
sua música perdia a<br />
intemporali<strong>da</strong><strong>de</strong> que ali se sentia.<br />
Esse é, para mim, o gran<strong>de</strong> mistério<br />
<strong>de</strong>stas gravações – como po<strong>de</strong> um<br />
músico como Bennett, que noutros<br />
contextos soa banal e até mesmo<br />
brejeiro, realizar uma música <strong>de</strong><br />
tamanha perfeição, simplici<strong>da</strong><strong>de</strong> e<br />
magnetismo. Este último adjectivo é<br />
talvez o mais indicado para<br />
<strong>de</strong>screver a sensação provoca<strong>da</strong><br />
pela familiari<strong>da</strong><strong>de</strong> com a música<br />
incluí<strong>da</strong> nesta edição, algo que<br />
acontece pela forma como Bennett<br />
articula as palavras, com uma<br />
intenção e uma força raras num<br />
vocalista cuja frontali<strong>da</strong><strong>de</strong> crua é<br />
torna<strong>da</strong> poesia pelas notas do piano<br />
<strong>de</strong> Evans. Grava<strong>da</strong>s em 1975 e<br />
1976 sob o signo <strong>da</strong> Broadway<br />
e do Great American<br />
Songbook,<br />
A dupla Bill Evans e Tony Bennett<br />
marca<strong>da</strong>s por uma forte nostalgia,<br />
estas canções surgiram<br />
originalmente em dois diferentes<br />
registos, “The Tony Bennett / Bill<br />
Evans Album” e “Together Again”,<br />
estando o segundo uns furos abaixo<br />
do primeiro. A canções clássicas<br />
como “Young and foolish”, “The<br />
touch of your lips”, “My foolish<br />
heart” ou “You don’t know what<br />
love is”, junta-se nesta edição um<br />
punhado <strong>de</strong> “takes” alternativos<br />
que pouco acrescentam ao<br />
resultado final. Introvertido e<br />
vulnerável, Evans constituía a figura<br />
oposta à <strong>de</strong> Bennett, confiante e<br />
espirituoso, formando ambos uma<br />
improvável parceria musical.<br />
Funky!<br />
cantar, às histórias do<br />
fatum lusitano, <strong>de</strong> olhos<br />
fechados por tanto as<br />
saber entoar. Carminho<br />
não faz parte do “povo<br />
que lava no rio”, sofrido<br />
e amargurado. A sua voz<br />
veste um vestido colorido<br />
<strong>de</strong> “chita às pintinhas”,<br />
uma “nova roupagem”,<br />
pelo que o seu cantar não<br />
é um sufoco mas um alívio<br />
Infame por diversas razões,<br />
a fusão do jazz com os<br />
ritmos do funk e do rock <strong>de</strong>u<br />
origem a algumas obras que<br />
nos intrigam e fascinam.<br />
Rodrigo Amado<br />
Nathan Davis<br />
“If”<br />
Universal Sound,<br />
distri. Multidisc<br />
mmmmn<br />
Alphonse<br />
Mouzon<br />
“Virtue”<br />
MPS, distri.<br />
Compact Records<br />
mmmmn<br />
Jan Hammer<br />
Trio<br />
“Maliny, Maliny”<br />
MPS, distri.<br />
Compact Records<br />
mmmmn<br />
Editado originalmente na sua<br />
própria editora com uma prensagem<br />
<strong>de</strong> apenas mil exemplares, “If”,<br />
do saxofonista Nathan<br />
Davis, conquistou ao<br />
longo dos anos um<br />
estatuto lendário<br />
no meio do jazz <strong>de</strong><br />
fusão, estatuto<br />
reforçado pela sua<br />
longa indisponibili<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
no mercado. Agora<br />
reeditado pela Universal<br />
Sound – após uma<br />
anterior<br />
reedição<br />
japonesa –,<br />
“If”<br />
do coração, <strong>de</strong> um amor<br />
que o vento teima em<br />
lembrar: “porque quando<br />
se agita, agita-se o meu<br />
tormento, quero esquecerte,<br />
acredita, mas ca<strong>da</strong> vez<br />
há mais vento”. A sua voz<br />
resulta <strong>de</strong> uma mistura <strong>de</strong><br />
um tempo que foi, mas não<br />
esquecido!<br />
Ana Gil, estu<strong>da</strong>nte <strong>de</strong><br />
arquitectura, 22 anos<br />
Alphonse Mouzon<br />
mostra ter resistido particularmente<br />
bem à passagem do tempo, soando<br />
nos seus melhores momentos como<br />
uma <strong>de</strong>rivação <strong>da</strong>s correntes<br />
eléctricas trabalha<strong>da</strong>s nos anos 70<br />
por Miles Davis ou Herbie Hancock.<br />
Nathan Davis, que toca aqui<br />
saxofones tenor, alto, soprano e<br />
flauta, chegou a ir em “tournée”<br />
com os grupos <strong>de</strong> Art Blakey e Ray<br />
Charles, tendo-se posteriormente<br />
<strong>de</strong>dicado ao ensino. Gravado em 76,<br />
“If” é o mais funky dos seus álbuns,<br />
bem distante dos registos bop<br />
editados na MPS ou do excelente<br />
projecto Roots, partilhado com<br />
Arthur Blythe, Sam Rivers e Chico<br />
Freeman.<br />
De todos os músicos <strong>de</strong> fusão,<br />
Alphonse Mouzon é dos mais<br />
infames. Amado por muitos,<br />
repudiado por muitos outros,<br />
pratica uma mistura explosiva <strong>de</strong><br />
ritmos funk, rock abrasador,<br />
ambiente disco, muitos<br />
sintetizadores e produção excessiva.<br />
Tendo tido os seus melhores<br />
momentos ao lado dos Weather<br />
Report, Albert Mangelsdorf ou<br />
McCoy Tyner, neste “Virtue”<br />
Mouzon evoca alguns <strong>de</strong>sses<br />
momentos ro<strong>de</strong>ando-se <strong>de</strong> um<br />
super-grupo <strong>de</strong> músicos: o<br />
saxofonista Gary Bartz (em gran<strong>de</strong><br />
forma), o baixista Welton Gite e Stu<br />
Goldberg, o reputado teclista <strong>da</strong><br />
Mahavishnu Orchestra. Gravado<br />
para a germânica MPS, “Virtue”<br />
permanece como um dos melhores<br />
exemplos <strong>da</strong> sua música.<br />
Jan Hammer é outro dos músicos<br />
<strong>de</strong> fusão que não parece ter muitos<br />
amigos. Criticado essencialmente<br />
pelo trabalho horripilante que<br />
realizou para a série Miami Vice,<br />
Hammer tem no entanto uma legião<br />
<strong>de</strong> seguidores <strong>de</strong>vido à música que<br />
gravou para diversas editoras, ain<strong>da</strong><br />
na Checoslováquia, seu país <strong>de</strong><br />
origem, ou posteriormente com a<br />
Mahavishnu Orchestra. Gravado ao<br />
vivo em 1968, este é o mais<br />
“acústico” <strong>de</strong>stes três registos,<br />
afastando-se um pouco do<br />
conceito puro e duro <strong>de</strong> fusão.<br />
Tavez por isso, é também o que<br />
melhor resistiu à passagem do<br />
tempo. Hammer toca orgão e<br />
piano, subtilmente acompanhado<br />
por George Mraz, no contrabaixo e<br />
baixo eléctrico, e Cees See na<br />
bateria.<br />
Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 23
Discos<br />
Clássica<br />
A luz que<br />
emerge<br />
<strong>da</strong>s trevas<br />
Magnífica interpretação<br />
<strong>da</strong>s “Leçons <strong>de</strong> Ténèbres”<br />
<strong>de</strong> Couperin pelas<br />
Demoiselles <strong>de</strong> Saint-Cyr, um<br />
agrupamento que reaparece<br />
em gran<strong>de</strong> forma após <strong>de</strong>z<br />
anos <strong>de</strong> silêncio.<br />
Cristina Fernan<strong>de</strong>s<br />
François Couperin<br />
“Ténèbres du Premier Jour”<br />
Les Demoiselles <strong>de</strong> Saint-Cyr<br />
Emmanuel Mandrin (órgão e<br />
direcção)<br />
Ambronay<br />
mmmmm<br />
Espaço<br />
Público<br />
Fun<strong>da</strong>do em 1991<br />
pelo organista<br />
Emmanuel<br />
Mandrin, o<br />
agrupamento Les<br />
Demoiselles <strong>de</strong><br />
Saint-Cyr,<br />
especializado em música barroca<br />
para vozes femininas, esteve uma<br />
<strong>de</strong>zena <strong>de</strong> anos sem gravar. O seu<br />
reaparecimento no Festival <strong>de</strong><br />
Ambronay <strong>de</strong> 2008 com um<br />
magnífico programa consagrado às<br />
“Leçons <strong>de</strong> Ténèbres” <strong>de</strong> Couperin,<br />
complementado por dois Responsórios<br />
<strong>de</strong> Charpentier e um “Miserere”<br />
inédito <strong>de</strong> Michel Lambert, foi<br />
triunfal como se po<strong>de</strong> constatar<br />
24 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon<br />
O melhor <strong>da</strong> britpop vem<br />
<strong>da</strong> escócia e chama-se<br />
Camera Obscura. “My<br />
Maudlin Career”, o<br />
novo álbum, é mais um<br />
excelente passo na sua<br />
invejável carreira. Feito<br />
tanto mais assinalável se<br />
pensarmos que se trata<br />
do seu quarto álbum<br />
<strong>de</strong> originais e que se<br />
movimentam nesta área<br />
através <strong>de</strong>sta belíssima gravação,<br />
edita<strong>da</strong> pelo próprio festival.<br />
As Demoiselles e o seu director<br />
musical encontram-se em óptima<br />
forma e oferecem-nos uma<br />
interpretação mágica, plena <strong>de</strong><br />
espirituali<strong>da</strong><strong>de</strong>, mas também <strong>de</strong><br />
sensuali<strong>da</strong><strong>de</strong>. As vozes solistas <strong>de</strong><br />
Dorothée Leclair, Eugénie Warnier e<br />
Juliette Perret espraiam-se com<br />
convicção e brilho nos sinuosos<br />
melismas <strong>da</strong>s letras hebraicas que<br />
pontuam o texto <strong>da</strong>s Lamentações <strong>de</strong><br />
Jeremias e mostram-nos uma imensa<br />
paleta <strong>de</strong> cores, gran<strong>de</strong> flexibili<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
vocal e uma expressivi<strong>da</strong><strong>de</strong> pungente<br />
na <strong>de</strong>clamação do restante texto. O<br />
grupo funciona igualmente bem em<br />
conjunto, mostrando uma<br />
sonori<strong>da</strong><strong>de</strong> esplendorosa nos<br />
Responsórios <strong>de</strong> Charpentier (“In<br />
Monte Oliveti” e “Tristis est anima<br />
mea”) e uma sobrie<strong>da</strong><strong>de</strong> mais<br />
contemplativa no “Miserere”, <strong>de</strong><br />
Lambert.<br />
O alinhamento procura<br />
reconstituir o quadro litúrgico do<br />
Ofício <strong>de</strong> Trevas durante as Matinas<br />
<strong>da</strong> Semana Santa (cerimónia <strong>de</strong> forte<br />
carga simbólica celebra<strong>da</strong> <strong>de</strong>pois do<br />
pôr-do-sol, on<strong>de</strong> as 15 velas <strong>de</strong> um<br />
can<strong>de</strong>labro triangular eram<br />
apaga<strong>da</strong>s uma a uma), incluindo<br />
como introdução a antífona “Zelus<br />
domus tuae”, o Salmo 68 e o<br />
versículo “Avertantur retrorsum”<br />
executados em cantochão ou em<br />
“fauxbourdon” [sobreposição <strong>de</strong><br />
vozes paralelas à melodia principal à<br />
distância <strong>de</strong> um intervalo <strong>de</strong> quarta<br />
e outro <strong>de</strong> sexta]. O som imponente<br />
do gran<strong>de</strong> órgão <strong>de</strong> Saint-Antoine<br />
l’Abbaye (<strong>de</strong> 1748) apoia as vozes<br />
etéreas <strong>da</strong>s intérpretes que cantam a<br />
partir <strong>da</strong> tribuna. A sensação <strong>de</strong><br />
espaço e a reberveração <strong>da</strong> igreja é<br />
transmiti<strong>da</strong> pelo registo fonográfico<br />
que transporta assim o ouvinte para<br />
o contexto <strong>da</strong> execução.<br />
tão movediça e efémera do<br />
universo pop. Seguindo<br />
as premissas estéticas<br />
dos antecessores, o<br />
novo álbum apresenta,<br />
ain<strong>da</strong> assim, novos<br />
motivos <strong>de</strong> gáudio. O<br />
mais significativo serão<br />
os arranjos <strong>de</strong> cor<strong>da</strong>s,<br />
aqui mais expressivos e<br />
elaborados do que nunca.<br />
Exemplo incontornável<br />
A reverberação <strong>da</strong> igreja transparece no registo fonográfico <strong>da</strong>s Demoiselles <strong>de</strong> Saint-Cyr<br />
Diz-me com<br />
quem tocas<br />
Uma surpresa agradável na<br />
escolha improvável <strong>de</strong> dois<br />
solistas tão diferentes numa<br />
mesma obra. Rui Pereira<br />
Brahms<br />
Concerto para violino e Duplo<br />
concerto<br />
Vadim Repin (violino), Truls Mork<br />
(violoncelo), Ricardo Chailly<br />
(direcção)<br />
Gewandhausorchester<br />
DG 477 7470<br />
mmmmn<br />
Se<br />
dissessem<br />
que<br />
Vadim<br />
Repin<br />
tinha<br />
gravado<br />
o Duplo Concerto para<br />
violino e violoncelo <strong>de</strong> Brahms<br />
na companhia <strong>de</strong> Truls Mork não<br />
acreditávamos. É que o violinista é<br />
um <strong>da</strong>queles músicos com o coração<br />
à flor <strong>da</strong> pele e Mork é um<br />
violoncelista extremamente sóbrio<br />
nas suas interpretações. No entanto,<br />
isso aconteceu e o resultado é<br />
soberbo, mantendo intacta a distinta<br />
personali<strong>da</strong><strong>de</strong> dos dois músicos que<br />
dialogam numa dramaturgia<br />
cativante que Riccardo Chailly dirige<br />
fluentemente.<br />
Ao nível do virtuosismo, ambos<br />
ultrapassam todos os <strong>de</strong>safios<br />
técnicos com igual facili<strong>da</strong><strong>de</strong>. Se o<br />
violino po<strong>de</strong> manifestar uma outra<br />
exuberância, até pelo seu próprio<br />
timbre mais penetrante, os dois<br />
aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />
será o tema “Careless<br />
love”, provavelmente, o<br />
melhor <strong>de</strong> um trabalho<br />
recheado <strong>de</strong> pérolas.<br />
Poucos nos têm habituado<br />
tão mal como estes<br />
escoceses. Imperdível.<br />
António Freitas,<br />
Radialista, 37 anos<br />
solistas estão em perfeita sintonia.<br />
Mas o cartão <strong>de</strong> visita do disco é a<br />
gravação <strong>de</strong> Repin do Concerto para<br />
violino e orquestra <strong>de</strong> Brahms, a<br />
primeira que o violinista russo lança<br />
no mercado. As longas introduções<br />
orquestrais do primeiro e do<br />
segundo an<strong>da</strong>mento são feitas com<br />
gran<strong>de</strong> dramatismo e criam a<br />
atmosfera a<strong>de</strong>qua<strong>da</strong> para o tipo <strong>de</strong><br />
interpretação apaixona<strong>da</strong> e<br />
impetuosa <strong>de</strong> Repin, que atinge os<br />
seus momentos mais belos nos<br />
comoventes timbres do registo<br />
agudo. Este é mesmo um “som <strong>de</strong><br />
marca” do aclamado violinista que<br />
encontra poucos<br />
rivais na<br />
actuali<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
Vadim Repin,<br />
um violinista<br />
com o coração<br />
na boca
O exercício<br />
<strong>da</strong> Fantasia<br />
Henry Purcell<br />
The Complete Fantasias<br />
Fretwork; distri. Harmonia Mundi<br />
mmmmn<br />
Her<strong>de</strong>iras <strong>da</strong> rica<br />
tradição inglesa<br />
dos século XVI e<br />
XVII no domínio<br />
<strong>da</strong> música para<br />
“consort” <strong>de</strong><br />
violas <strong>da</strong> gamba, as Fantasias <strong>de</strong><br />
Purcell são obras-primas <strong>de</strong> mestria<br />
contrapontística, reveladoras <strong>de</strong><br />
uma gran<strong>de</strong> profundi<strong>da</strong><strong>de</strong> musical.<br />
Reuni<strong>da</strong>s num volume autógrafo<br />
pertencente ao British Museum,<br />
permaneceram na forma manuscrita<br />
até ao século XX, época em que<br />
voltaram a ser <strong>de</strong>vi<strong>da</strong>mente<br />
valoriza<strong>da</strong>s. Purcell <strong>de</strong>monstra um<br />
perfeito domínio <strong>da</strong>s antigas<br />
técnicas contrapontísticas como a<br />
imitação, a aumentação, a<br />
diminuição ou a inversão, ao mesmo<br />
tempo que recorre a alguns<br />
engenhosos efeitos harmónicos do<br />
estilo “mo<strong>de</strong>rno”. A colecção inclui<br />
três Fantasias a três partes, nove a<br />
quatro partes (compostas entre<br />
Julho e Agosto <strong>de</strong> 1680), uma<br />
Fantasia a cinco partes “sobre uma<br />
nota” (um curioso <strong>de</strong>safio <strong>de</strong><br />
composição on<strong>de</strong> as várias vozes<br />
tecem uma elabora<strong>da</strong> teia<br />
contrapontística, enquanto a quinta<br />
voz se mantém do princípio ao fim<br />
Os Fretwork propõem uma releitura<br />
sedutora <strong>da</strong>s Fantasias <strong>de</strong> Purcell<br />
na nota Dó) e dois “In Nomine” a<br />
seis e sete partes. O “In nomine” é<br />
uma forma <strong>de</strong> fantasia instrumental<br />
inglesa construí<strong>da</strong> sobre excertos<br />
melódicos correspon<strong>de</strong>ntes às<br />
palavras “in nomini Domini” do<br />
Benedictus <strong>da</strong> Missa “gloria tibi<br />
trinitas” <strong>de</strong> John Taverner.<br />
O agrupamento Fretwork, que já<br />
tinha gravado estas obras em 1995 na<br />
etiqueta Virgin, propõe agora uma<br />
nova leitura muito sedutora, que se<br />
distingue por uma exemplar sintonia<br />
entre os vários instrumentistas, pela<br />
clareza <strong>da</strong> polifonia, pela atenção às<br />
nuances expressivas (várias <strong>de</strong>las<br />
anota<strong>da</strong>s pelo próprio Purcell) e pela<br />
tentativa <strong>de</strong> mostrar o carácter<br />
distintivo <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> peça. Um<br />
repertório que facilmente po<strong>de</strong> soar<br />
<strong>de</strong>masiado uniforme numa audição<br />
superficial ganha assim relevo e<br />
diversi<strong>da</strong><strong>de</strong>. C.F.<br />
Lamentos barrocos<br />
“Il Pianto di Maria<br />
– The Virgin’s Lament”<br />
Bernar<strong>da</strong> Fink (meio-soprano)<br />
Il Giardino Armonico<br />
Giovanni Antonini (direcção)<br />
Decca – L’Oiseau-Lyre<br />
mmmnn<br />
Durante muito<br />
tempo pensou-se<br />
que a cantata “Il<br />
Pianto di Maria”,<br />
<strong>de</strong> Giovanni<br />
Ferrandini (c.<br />
1710-1791), compositor italiano activo<br />
em Munique, era <strong>da</strong> autoria <strong>de</strong><br />
Han<strong>de</strong>l, mas o equívoco foi <strong>de</strong>sfeito<br />
por um conjunto <strong>de</strong> musicólogos em<br />
1993. Devolvi<strong>da</strong> ao seu autor<br />
original, esta extensa peça marca<strong>da</strong><br />
por uma expressivi<strong>da</strong><strong>de</strong> dolorosa e<br />
<strong>de</strong>stina<strong>da</strong> a ser interpreta<strong>da</strong> perante<br />
o Santo Sepulcro na Semana Santa,<br />
serve <strong>de</strong> núcleo central ao programa<br />
proposto por Bernar<strong>da</strong> Fink e por Il<br />
Giardino Armonico. Os temas <strong>da</strong><br />
Paixão <strong>de</strong> Cristo, do martírio e <strong>da</strong><br />
dor <strong>da</strong> Virgem Maria são evocados<br />
através <strong>de</strong> obras vocais como “Il<br />
pianto <strong>de</strong>lla Madonna” <strong>de</strong><br />
Monteverdi (“contrafactum” sacro<br />
do famoso “Lamento d’ Arianna”) e<br />
a primeira gravação mundial <strong>de</strong> uma<br />
ária <strong>de</strong> “Il Martirio di San Lorenzo”,<br />
<strong>de</strong> Francesco Conti (1881/82-1732), e<br />
complementados por páginas<br />
instrumentais <strong>de</strong> Vivaldi (Sonata RV<br />
130 e Sinfonia RV 169 “Al Sancto<br />
Sepolcro” e Concerto<br />
“Madrigalesco”), Biaggio Marini<br />
(“Passacaglia”) e Johann Pisen<strong>de</strong>l<br />
(Sonata para dois oboés, cor<strong>da</strong>s e<br />
A interpretação <strong>de</strong> Bernar<strong>da</strong> Fink carece <strong>de</strong> suficiente “pathos”<br />
baixo contínuo). Este reportório <strong>de</strong><br />
tom sombrio é objecto <strong>de</strong> uma<br />
interpretação cui<strong>da</strong><strong>da</strong> ao nível <strong>da</strong><br />
técnica e do estilo, mas carece por<br />
vezes <strong>de</strong> suficiente “pathos”. Em<br />
recitativos como “Ah! Me infelice!” e<br />
“Si disse la gran Madre”, <strong>da</strong> cantata<br />
<strong>de</strong> Ferrandini, a meio-soprano<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
acentua a carga dramática <strong>de</strong> forma<br />
veemente, mas o tom geral é o <strong>da</strong><br />
introspecção contemplativa. Esta<br />
dimensão casa bem com a<br />
personali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> cantora, mas<br />
parece reprimir a exuberância<br />
natural dos instrumentistas <strong>de</strong> Il<br />
Giardino Armonico. C.F.<br />
<br />
<br />
<br />
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<br />
Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 25
Concertos<br />
26 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon<br />
Além dos Etran Finatawa, o programa <strong>de</strong> música africana do CCB<br />
traz também a <strong>Lisboa</strong> os portugueses Terrakota e o nigeriano Seun Kuti, filho <strong>de</strong> Fela<br />
Pop<br />
Os encantadores<br />
do Níger<br />
Os Etran Finatawa trazem<br />
a sua música xamânica,<br />
parente do “blues do<br />
<strong>de</strong>serto” dos Tinariwen, ao<br />
Centro Cultural <strong>de</strong> Belém.<br />
Mário Lopes<br />
Etran Finatawa<br />
<strong>Lisboa</strong>. Centro Cultural <strong>de</strong> Belém. Praça do Império.<br />
Amanhã, dia 22, às 22h. Tel.: 213612400. Entra<strong>da</strong><br />
gratuita.<br />
CCB Fora <strong>de</strong> Si.<br />
São do Níger e são formados por três<br />
tuaregues e três Wo<strong>da</strong>abe, dois dos<br />
povos que habitam esse país que é<br />
ponte entre a África árabe e a África<br />
negra. Chamam-se Etran Finatawa<br />
(“as estrelas <strong>da</strong> tradição”) e são, eles<br />
próprios, uma ponte – neste caso,<br />
cultural e musical. Nascidos em<br />
2004, reúnem a música dos<br />
Wo<strong>da</strong>abe, essencialmente vocal e<br />
rítmica, à dos tuaregues, feita <strong>de</strong><br />
percussões e guitarras hipnóticas<br />
que criam o “blues do <strong>de</strong>serto” que<br />
tão bem conhecemos dos Tinariwen.<br />
Ao Centro Cultural <strong>de</strong> Belém,<br />
on<strong>de</strong> actuam este sábado,<br />
integrados no programa <strong>de</strong>dicado à<br />
música africana que <strong>de</strong>corre<br />
actualmente (domingo há Terrakota;<br />
dia 29 <strong>de</strong> Agosto chega Seun Kuti,<br />
filho <strong>de</strong> Fela), trazem “Desert<br />
Crossroads”, o seu último álbum,<br />
editado em 2008. Mais importante<br />
do que isso, e como saberão aqueles<br />
que os viram há dois anos no<br />
Músicas do Mundo <strong>de</strong> Sines, trazem<br />
esta música <strong>de</strong> cantos guturais<br />
“xamanísticos” e falsetes<br />
encantatórios, estas canções em que<br />
as guitarras eléctricas serpenteiam<br />
entre as polirritmias dos<br />
percussionistas, qual rock’n’roll que<br />
já se tinha <strong>de</strong>scoberto enquanto tal<br />
muito antes <strong>de</strong> um DJ americano,<br />
nos anos 1950, se lembrar <strong>de</strong><br />
arranjar nome para aquela música<br />
“infernal”.<br />
Os Etran Finatawa são música<br />
mo<strong>de</strong>rna, pela electrificação <strong>da</strong>s<br />
canções Wo<strong>da</strong>abe, pelo cruzamento<br />
<strong>de</strong>stas com os sons tuaregues – a<br />
ban<strong>da</strong> chamou-lhe “blues nóma<strong>da</strong>” -<br />
, mas música que se mantém<br />
aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />
umbilicalmente liga<strong>da</strong> à terra e aos<br />
povos on<strong>de</strong> primeiro se fez ouvir.<br />
Para nós que a recebemos vin<strong>da</strong> <strong>de</strong><br />
longe, será contudo uma outra coisa.<br />
Muito resumi<strong>da</strong>mente: uma forma<br />
<strong>de</strong> encantamento.<br />
Wraygunn e Sean<br />
Riley a rockar<br />
Guimarães<br />
Barco Rock Fest’09<br />
Barco (Guimarães). Praia Fluvial <strong>de</strong> Barco. Hoje e<br />
amanhã, às 22h00. Tel.: Informações: 936412637 e<br />
916687449. 10€ (dia) a 16€ (passe).<br />
Dia 21: Sean Riley & The Slowri<strong>de</strong>rs<br />
+ Born a Lion + d3ö + If Lucy Fell<br />
+ Cratera + Insert Coin<br />
+ PharmaciaPainKiller<br />
Dia 22: Wraygunn + Abandon Mute<br />
+ Smix Smox Smux + doismileoito<br />
+ Let The Jam Roll + Les Dirty Two<br />
O Barco Rock Fest, na Praia Fluvial<br />
<strong>de</strong> Barco, em Guimarães, já dura há<br />
dois dias, com projecções <strong>de</strong> filmes e<br />
DJ “sets” para o povo <strong>da</strong>nçar, mas é<br />
esta noite que a festa começa a sério<br />
– e o rock do título assenta-lhe bem.<br />
Entre hoje e amanhã, um festim com<br />
algumas <strong>da</strong>s mais recomendáveis<br />
ban<strong>da</strong>s portuguesas <strong>da</strong> actuali<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
Lá estarão os sempre<br />
incendiários Wraygunn <strong>de</strong> Paulo<br />
Furtado, provocadores com o<br />
diabo e a soul no corpo, a berrar<br />
“gotta love that woman” para nosso<br />
prazer (cabe-lhes, amanhã, encerrar<br />
o festival). Com eles, estarão os<br />
eclécticos doismileoito, pessoal <strong>de</strong><br />
pop bem encena<strong>da</strong> e <strong>de</strong>scargas<br />
sónicas catárticas, os Smix Smox<br />
Smux que põem ironia corrosiva em<br />
canções que <strong>de</strong>nunciam audições<br />
atentas <strong>de</strong> Pavement, os angloportugueses<br />
Abandon Mute,<br />
se<strong>de</strong>ados em Londres, e as “jams”<br />
<strong>de</strong> uns vimaranenses que não<br />
escon<strong>de</strong>m ao que vêm (chamam-se,<br />
precisamente, Let The Jam Roll).<br />
Isso, contudo, está reservado para<br />
sábado.<br />
Hoje, <strong>de</strong>pois dos Cratera (gente <strong>da</strong><br />
terra, ban<strong>da</strong> afilha<strong>da</strong> do grunge),<br />
chegam os histriónicos If Lucy Fell,<br />
<strong>de</strong> punk dilacerante e frenesim nonstop,<br />
li<strong>de</strong>rados por um vocalista<br />
incontrolável, Makoto. Seguem-se os<br />
conimbricenses d3ö, igualmente<br />
incontroláveis, trio <strong>de</strong> rock’n’roll<br />
garageiro que é uma <strong>da</strong>s melhores<br />
ban<strong>da</strong>s portuguesas ao vivo e que<br />
acaba <strong>de</strong> editar o recomen<strong>da</strong>díssimo<br />
“Exposed”. A noite encerrará com<br />
os Born A Lion, que em “Bluezebu”,<br />
o seu último álbum, encarceram<br />
Johnny Cash num pentagrama dos<br />
Black Sabbath – o espírito <strong>de</strong> Cash,<br />
aparentemente, não se queixou -, e<br />
com Sean Riley & The Slowri<strong>de</strong>rs,<br />
cultores <strong>da</strong>s planícies <strong>da</strong> canção<br />
americana que se revelaram<br />
<strong>de</strong>finitivamente em “Only time will<br />
tell”. Recentemente, abriram o<br />
Festival <strong>de</strong> Pare<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Coura com<br />
um concerto magnífico e, em<br />
Guimarães, não se espera na<strong>da</strong><br />
menos do que a repetição <strong>de</strong>sse<br />
momento. M.L.<br />
Jazz<br />
Matéria<br />
Prima<br />
no Porto<br />
No encerramento <strong>da</strong>s noites<br />
Porto Blue Jazz, Carlos Bica<br />
regressa à ci<strong>da</strong><strong>de</strong> com um<br />
dos seus projectos mais<br />
<strong>de</strong>safiantes.<br />
Rodrigo Amado<br />
Carlos Bica Matéria Prima<br />
Com Matthias Schriefl, João Paulo,<br />
Mário Delgado e João Lobo<br />
Porto. Jardins do Palácio <strong>de</strong> Cristal. Rua D. Manuel<br />
II. Amanhã, dia 22, às 22h. Tel.: 226057080.<br />
Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
Porto BlueJazz 09<br />
A encerrar um ciclo <strong>de</strong> concertos<br />
que apresentou projectos como o<br />
duo Chick Corea e Gary Burton, o
Bernardo<br />
Sassetti Trio,<br />
ou o espectáculo<br />
“Cumplici<strong>da</strong><strong>de</strong>s” <strong>de</strong> Vânia<br />
Fernan<strong>de</strong>s e Júlio Resen<strong>de</strong>,<br />
apresentam-se os Matéria Prima,<br />
quinteto que representa uma <strong>da</strong>s<br />
facetas mais exploratórias e<br />
<strong>de</strong>safiantes do trabalho <strong>de</strong> Carlos<br />
Bica. Contrabaixista consagrado no<br />
meio jazzístico nacional, há muito<br />
com residência partilha<strong>da</strong> entre<br />
<strong>Lisboa</strong> e Berlim, Bica recrutou três<br />
dos mais versáteis músicos nacionais<br />
– o pianista João Paulo, o guitarrista<br />
Mário Delgado e o baterista João<br />
Lobo – aos quais juntou um jovem<br />
talento alemão, o trompetista<br />
Matthias Shriefl. Projecto que<br />
procura explorar as características<br />
intrínsecas do jazz feito por músicos<br />
portugueses, os Matéria Prima<br />
apostam forte na componente <strong>da</strong><br />
improvisação, tornando ca<strong>da</strong><br />
espectáculo um evento único, não<br />
repetível. Numa fase <strong>de</strong> gran<strong>de</strong><br />
activi<strong>da</strong><strong>de</strong>, Bica assume-se ca<strong>da</strong> vez<br />
mais como dinamizador <strong>da</strong> cena jazz<br />
nacional, compositor e improvisador<br />
<strong>de</strong> excepção, aguar<strong>da</strong>ndo-se com<br />
alguma expectativa o sucessor do<br />
excelente “Believer”, o mais recente<br />
registo com o seu projecto Azul.<br />
Carlos Bica encerra amanhã<br />
no Palácio <strong>de</strong> Cristal as noites<br />
Porto BlueJazz<br />
Agen<strong>da</strong><br />
Sexta 21<br />
Mão Morta<br />
Os Wraygunn em mais um festival <strong>de</strong> Verão<br />
Camané<br />
Esposen<strong>de</strong>. Largo dos Bombeiros, às 22h.<br />
Tel.: 253960100. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
Sons <strong>de</strong> Verão 09.<br />
Rui Veloso<br />
Bragança. Parque do Eixo Atlântico. Av. Aba<strong>de</strong><br />
Baçal / Av. Professor António Gonçalves Rodrigues,<br />
às 22h. Tel.: 253203150. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
Festas <strong>da</strong> Ci<strong>da</strong><strong>de</strong> 09.<br />
Ana van Zeller e Carlos Gomes<br />
Com Ana van Zeller (flauta<br />
transversal), Carlos Gomes (piano).<br />
<strong>Lisboa</strong>. Miradouro <strong>de</strong> São Pedro <strong>de</strong> Alcântara.<br />
Jardim São Pedro <strong>de</strong> Alcântara, às 19h. Tel.:<br />
213236200. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
Clássicos na Rua. Obras <strong>de</strong><br />
Febonio, Bach, Danzi, Villa-Lobos.<br />
Nancy Vieira<br />
Barreiro. Palco <strong>da</strong>s Marés. R. Bento <strong>de</strong> Jesus<br />
Caraça, às 22h. Tel.: 212068203. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
Festas do Barreiro.<br />
Afonso Pais Trio<br />
Sines. Centro <strong>de</strong> Artes <strong>de</strong> Sines - Auditório.<br />
R. Cândido dos Reis, às 22h. Tel.: 269860080.<br />
5€ (dois concertos).<br />
Sines em Jazz.<br />
Acácio Salero<br />
Sines. Centro <strong>de</strong> Artes <strong>de</strong> Sines - Auditório.<br />
R. Cândido dos Reis, às 23h15. Tel.: 269860080.<br />
5€ (dois concertos).<br />
Sines em Jazz.<br />
Raquel Peters + Afonso Dias<br />
Lagos. Centro Cultural <strong>de</strong> Lagos. R. Lançarote <strong>de</strong><br />
Freitas, 7, às 22h00. Tel.: 282770450. 10€.<br />
Yuri Daniel Quartet<br />
Com Yuri Daniel, João Paulo Esteves<br />
<strong>da</strong> Silva, José Salgueiro, Johannes<br />
Kriger.<br />
Figueira <strong>da</strong> Foz. Centro <strong>de</strong> Artes e Espectáculos -<br />
Auditório Exterior. R. Aba<strong>de</strong> Pedro, às 22h00.<br />
Tel.: 233407200. 7,5€.<br />
Rocio Marquez<br />
Barcarena. Fábrica <strong>da</strong> Pólvora <strong>de</strong> Barcarena.<br />
Estra<strong>da</strong> <strong>da</strong>s Fontaínhas, às 22h. Tel.: 214387460.<br />
Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
Festival Sete Sóis Sete Luas 2009<br />
Mão Morta + Os Pontos Negros<br />
+ Fato Feto<br />
Vale <strong>de</strong> Milhaços. Quinta <strong>da</strong> Marialva. Corroios,<br />
às 22h00. Tel.: 212535814. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
Festas Populares <strong>de</strong> Corroios.<br />
Da Weasel + La Resinance<br />
+ Stone Slaves + Nokin<br />
Alcácer do Sal. Margem Sul do Sado, a partir<br />
<strong>da</strong>s 22h. Tel.: 265610040. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
Festival <strong>de</strong> Verão à Beira Sado.<br />
DJ Patife<br />
Aveiro. Centro Cultural e <strong>de</strong> Congressos <strong>de</strong> Aveiro.<br />
R. Cais <strong>da</strong> Fonte Nova - Apartado 1520, às 22h00.<br />
Tel.: 234406481. 10€.<br />
Mercado Negro + Souls of Fire<br />
+ Original Electro Groove<br />
+ Jula Jah Soundsystem<br />
Quarteira. Calçadão <strong>de</strong> Quarteira, às 21h00. Tel.:<br />
289400660. 10€.<br />
Festival Surfóreggae<br />
Raquel Tavares<br />
Com Eurico Machado (guitarra<br />
portuguesa), Marco Oliveira<br />
(viola), Nando<br />
Araújo<br />
(baixo).<br />
<strong>Lisboa</strong>. Parque<br />
Mayer.<br />
Os Pontos Negros<br />
ENRIC VIVES-RUBIO<br />
Travessa do Salitre - Parque Mayer, às 21h30.<br />
Tel.: 966917499. 5€.<br />
<strong>Lisboa</strong> ao Parque.<br />
The Portugals<br />
Lousã. Parque Carlos Reis - Anfiteatro, às 22h00.<br />
Tel.: 239990370. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
Sábado 22<br />
Da Weasel<br />
Barreiro. Palco <strong>da</strong>s Marés. R. Bento <strong>de</strong> Jesus Caraça,<br />
às 22h00. Tel.: 212068203. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
Festas do Barreiro.<br />
Sidv Sissokho + Dubravko<br />
Lapaine + Wild Marmela<strong>de</strong><br />
Ameixial. Loulé, às 20h30. Tel.: 967252145.<br />
5€ (dia) a 15€ (passe).<br />
VIII Festival <strong>de</strong> Didgeridoo.<br />
Setsax Quarteto<br />
Com Pedro Rego (saxofone soprano),<br />
Ricardo Branco (saxofone alto),<br />
Daniel Costa (saxofone tenor), André<br />
Cabica (saxofone barítono).<br />
<strong>Lisboa</strong>. Miradouro <strong>de</strong> São Pedro <strong>de</strong> Alcântara. Jardim<br />
São Pedro <strong>de</strong> Alcântara, às 19h00. Tel.: 213236200.<br />
Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
Clássicos na Rua. Obras <strong>de</strong> Piazzolla,<br />
Pierné, Gershwin e Florenzo.<br />
Jacinta Canta Songs Of Freedom<br />
Com Jacinta (voz), Paulo Gravato<br />
(saxofone), Pedro Costa (piano), João<br />
Gustavo (arranjos).<br />
Estoril. Centro <strong>de</strong> Congressos do Estoril. Av. Amaral,<br />
às 21h30. Tel.: 214647575. 15€.<br />
Estoril Summer Fun’09.<br />
Nasko Hristov<br />
Com Nasko Hristov (acor<strong>de</strong>ão), Ivo<br />
Hristov (clarinete), Krastayo Metodiev<br />
(percussão).<br />
Monte <strong>de</strong> Caparica. Convento dos Capuchos.<br />
Rç Lourenço Pires <strong>de</strong> Távora, 42, às 21h30.<br />
Tel.: 212919342. 5€.<br />
Ciclo 3 Culturas<br />
Xutos & Pontapés<br />
Esposen<strong>de</strong>. Largo dos Bombeiros, às 22h.<br />
Tel.: 253960100. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
Sons <strong>de</strong> Verão 09.<br />
Concerto <strong>de</strong> Encerramento<br />
Com Carmelo Corrado Caruso<br />
(barítono), Marco Alves dos Santos<br />
(tenor), Bárbara Barra<strong>da</strong>s (soprano),<br />
Maria Luísa <strong>de</strong> Freitas (mezzo).<br />
Direcção musical <strong>de</strong> Osvaldo Ferreira.<br />
Óbidos. Castelo, às 21h30.<br />
Tel.: 262959231. 25€.<br />
Obras <strong>de</strong> Rossini, Verdi, Bizet,<br />
Mascagni, Gounod e Strauss.<br />
António Pinho Vargas<br />
Vila Nova <strong>de</strong> Cerveira. Auditório <strong>Municipal</strong> <strong>de</strong> Vila<br />
Nova <strong>de</strong> Cerveira. Praça do Município, às 22h00.<br />
Tel.: 251708020. 5€.<br />
Cerveira ao Piano.<br />
V3SKA<br />
Vila Real. Teatro <strong>de</strong> Vila Real - Auditório Exterior.<br />
Alame<strong>da</strong> <strong>de</strong> Grasse, às 22h30. Tel.: 259320000.<br />
Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
Festival <strong>de</strong> Músicas do Mundo.<br />
David Fonseca<br />
Cascais. Baía <strong>de</strong> Cascais, às 22h00.<br />
Tel.: 214815810. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
Festas do Mar.<br />
Blasted<br />
Mechanism<br />
NELSON GARRIDO<br />
Blasted Mechanism nas<br />
festas <strong>de</strong> Pinhel e <strong>de</strong> Corroios<br />
Pinhel. Largo dos Combatentes, às 23h30.<br />
Tel.: 271410000. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
Festas <strong>da</strong> Ci<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
Jori Hulkkonen + Junior Boys<br />
+ Un<strong>de</strong>rworld + Mike Mind<br />
+ Thomas von Party + Jesper<br />
Dahlbäck + Zombie Nation<br />
+ Riton + Proxy + Tiga + Seth<br />
Troxler<br />
Vilamoura. Hipódromo <strong>de</strong> Vilamoura, às 21h.<br />
213933770. 25€.<br />
Creamfields 09.<br />
El Fad<br />
Com José Peixoto (guitarra),<br />
Carlos Zíngaro (violino), Yuri Daniel<br />
(contrabaixo), José Salgueiro<br />
(percussão).<br />
Sines. Centro <strong>de</strong> Artes <strong>de</strong> Sines - Auditório.<br />
R. Cândido dos Reis, às 22h00. Tel.: 269860080.<br />
5€ (dois concertos).<br />
Sines em Jazz.<br />
Low Budget Research Kitchen<br />
Sines. Centro <strong>de</strong> Artes <strong>de</strong> Sines - Auditório. R.<br />
Cândido dos Reis, às 23h15. Tel.: 269860080.<br />
5€ (dois concertos).<br />
Sines em Jazz.<br />
Lin<strong>da</strong> Martini + Blasfemea<br />
+ Socie<strong>da</strong><strong>de</strong> Filarmónica<br />
Progresso Matos Galamba<br />
+ Sequela Brothers<br />
Alcácer do Sal. Margem Sul do Sado, a partir<br />
<strong>da</strong>s 22h. Tel.: 265610040. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
Festival <strong>de</strong> Verão à Beira Sado.<br />
Rita Guerra<br />
<strong>Lisboa</strong>. Parque Mayer. Travessa do Salitre,<br />
às 21h30. Tel.: 966917499. 5€.<br />
<strong>Lisboa</strong> ao Parque.<br />
Domingo 23<br />
Junior Boys<br />
no Creamfields, em<br />
Vilamoura<br />
Pedro Abrunhosa<br />
Barreiro. Palco <strong>da</strong>s Marés. R. Bento <strong>de</strong> Jesus Caraça,<br />
às 22h00. Tel.: 212068203. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
Festas do Barreiro.<br />
Orquestra do Norte<br />
Direcção Musical <strong>de</strong> Manuel Teixeira.<br />
Agrelos. Igreja <strong>de</strong> São Miguel <strong>de</strong> Gân<strong>da</strong>ra, paroquial<br />
<strong>de</strong> Cabeça Santa. Estra<strong>da</strong> Nacional 106, às 16h30.<br />
Tel.: 255410470. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
Obras <strong>de</strong> Haydn e Verdi.<br />
Terrakota<br />
<strong>Lisboa</strong>. Centro Cultural <strong>de</strong> Belém - Praça do Museu.<br />
Praça do Império, às 22h00. Tel.: 213612400.<br />
Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
CCB Fora <strong>de</strong> Si.<br />
Ana Moura<br />
Vale <strong>de</strong> Milhaços. Quinta <strong>da</strong> Marialva. Corroios,<br />
às 22h00. Tel.: 212535814. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
Festas Populares <strong>de</strong> Corroios.<br />
Paula Oliveira<br />
Com Paula Oliveira (voz),<br />
Lo Tardin (piano).<br />
Sines. Centro <strong>de</strong> Artes <strong>de</strong> Sines - Auditório.<br />
R. Cândido dos Reis, às 22h00. Tel.: 269860080.<br />
5€ (dois concertos).<br />
Sines em Jazz.<br />
Quarteto <strong>de</strong> Vasco Agostinho<br />
Com Vasco Agostinho (guitarra),<br />
Jeff Davis (vibrafone), Filipe teixeira<br />
(contrabaixo), Bruno Pedroso<br />
(bateria).<br />
Sines. Centro <strong>de</strong> Artes <strong>de</strong> Sines - Auditório.<br />
R. Cândido dos Reis, às 23h15. Tel.: 269860080.<br />
5€ (dois concertos).<br />
Sines em Jazz.<br />
Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
Feira Internacional do Fundão.<br />
Xutos & Pontapés<br />
Fundão. Pavilhão<br />
Multiusos, às 22h00.<br />
Tel.: 275771829.<br />
Xutos & Pontapés no Norte<br />
(Esposen<strong>de</strong>) e no Centro (Fundão)<br />
Alcácer do Sal e Barreiro<br />
na agen<strong>da</strong> dos Da Weasel<br />
Reviver Mozart<br />
<strong>Lisboa</strong>. Parque Mayer. Travessa do Salitre<br />
- Parque Mayer, às 21h00. Tel.: 966917499. 5€.<br />
<strong>Lisboa</strong> ao Parque.<br />
Terça 25<br />
O’queStra<strong>da</strong><br />
Com Marta Miran<strong>da</strong> (voz), João Lima<br />
(guitarra portuguesa), Zeto (guitarra<br />
e voz), Pablo (contrabaixo),<br />
Donatello (acor<strong>de</strong>ão).<br />
Pinhel. Largo dos Combatentes, às 23h30.<br />
Tel.: 271410000. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
Festas <strong>da</strong> Ci<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
Quarta 26<br />
Mafal<strong>da</strong> Veiga<br />
Vila Praia <strong>de</strong> Âncora. Praça <strong>da</strong> República,<br />
às 22h00. Tel.: 218508060. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
WOK - Ritmo Avassalador<br />
Grândola. Parque <strong>de</strong> Feiras e Exposições,<br />
às 22h00. Tel.: 269750260. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
Joana Amendoeira<br />
Cascais. Baía <strong>de</strong> Cascais, às 22h00.<br />
Tel.: 214815810. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
Festas do Mar.<br />
Ana Moura<br />
Óbidos. Castelo, às 22h00. Tel.: 262959231. 15€<br />
Quinta 27<br />
Susana Félix + Classificados<br />
Grândola. Parque <strong>de</strong> Feiras e Exposições,<br />
às 22h00. Tel.: 269750260. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
Mafal<strong>da</strong> Veiga<br />
Viseu. Expovis - Feira <strong>de</strong> São Mateus. Campo<br />
<strong>de</strong> Viriato, às 22h00. Tel.: 232422018. Entra<strong>da</strong><br />
gratuita.<br />
Kussondulola<br />
Sesimbra. Cine-Teatro <strong>Municipal</strong> João Mota.<br />
Av. Liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, 46, às 22h. Tel.: 212288715. 3€.<br />
Blasted Mechanism<br />
Vale <strong>de</strong> Milhaços. Quinta <strong>da</strong> Marialva. Corroios,<br />
às 22h00. Tel.: 212535814. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
Festas Populares <strong>de</strong> Corroios.<br />
Rita Redshoes<br />
Cascais. Baía <strong>de</strong> Cascais, às 22h00. Tel.: 214815810.<br />
Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
Festas do Mar.<br />
Gonçalo Prazeres Quarteto<br />
Com Gonçalo Prazeres (saxofone<br />
alto), Nuno Costa (guitarra),<br />
Bernardo Moreira (contrabaixo),<br />
Luís Can<strong>de</strong>ias (bateria).<br />
<strong>Lisboa</strong>. Centro Cultural <strong>de</strong> Belém - Cafetaria<br />
Quadrante. Praça do Império, às 22h00.<br />
Tel.: 213612400. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
Jazz às 5.ªs. CCB Fora <strong>de</strong> Si.<br />
Raquel Tavares<br />
Com Eurico Machado<br />
(guitarra<br />
portuguesa), Marco<br />
Oliveira (viola),<br />
Nando Araújo<br />
(baixo).<br />
Mogadouro. Praça<br />
Central, às 22h30.<br />
Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
Ana Moura<br />
no Castelo<br />
<strong>de</strong> Óbidos<br />
Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 27<br />
AUGUSTO BRAZIO
- PARA SEMPRE
Livros<br />
Ficção<br />
A música<br />
mais triste<br />
do mundo<br />
Kazuo Ishiguro é um escritor<br />
peculiar que, como já tem<br />
<strong>de</strong>monstrado no total <strong>da</strong><br />
sua obra, se obstina em<br />
<strong>de</strong>smontar estruturas<br />
literárias tradicionais.<br />
Helena Vasconcelos<br />
Nocturnos<br />
Kazuo Ishiguro<br />
(Tradução <strong>de</strong> Rui Pires Cabral)<br />
Gradiva<br />
mmmmm<br />
Em “Crooner”,<br />
numa Veneza<br />
invadi<strong>da</strong> por<br />
turistas, um<br />
jovem polaco que<br />
ganha a vi<strong>da</strong> a<br />
tocar nos cafés <strong>da</strong><br />
piazza é <strong>de</strong>safiado<br />
por um famoso e<br />
<strong>de</strong>ca<strong>de</strong>nte cantor<br />
romântico a acompanhá-lo numa<br />
serenata à sua jovem mulher. Mas o<br />
que começa como uma manifestação<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>dicação e amor conhece uma<br />
reviravolta surpreen<strong>de</strong>nte, tal como<br />
acontece em “Faça Chuva ou Faça<br />
Sol”. Neste segundo conto um<br />
<strong>de</strong>senraizado professor <strong>de</strong> Inglês no<br />
estrangeiro que regressa a Londres é<br />
convi<strong>da</strong>do a ficar em casa <strong>de</strong> antigos<br />
amigos <strong>da</strong> facul<strong>da</strong><strong>de</strong>. Numa<br />
tentativa para recuperar o<br />
ambiente <strong>da</strong> juventu<strong>de</strong>, quando<br />
todos viviam uma existência <strong>de</strong><br />
hippies <strong>de</strong>spreocupados, o<br />
professor vê-se envolvido nos<br />
psicodramas do casal, a braços com<br />
mal-entendidos e falsos passos, o<br />
que dá origem a situações bizarras e<br />
trágico-cómicas.<br />
Em “Malvern Hills”, um<br />
compositor e tocador <strong>de</strong> viola<br />
acústica <strong>de</strong>ixa para trás Londres e<br />
uma série <strong>de</strong> insucessos para visitar<br />
a irmã e o cunhado, donos <strong>de</strong> um<br />
café no campo. Aí, conhece um casal<br />
<strong>de</strong> suíços que o obrigam a<br />
questionar a sua vi<strong>da</strong> e ambições.<br />
Em “Nocturno”, um saxofonista a<br />
recuperar <strong>de</strong> um operação plástica<br />
que, supostamente, lhe irá corrigir a<br />
feal<strong>da</strong><strong>de</strong>, melhorando, <strong>de</strong>sse modo,<br />
a sua carreira, é arrastado para<br />
<strong>de</strong>lirantes aventuras pela sua vizinha<br />
<strong>de</strong> quarto, uma rica americana que<br />
não é senão a ex-mulher do<br />
“crooner” <strong>da</strong> primeira história.<br />
Em “Os Violoncelistas”, o cenário<br />
volta a ser Veneza e o autor recupera<br />
as personagens do primeiro conto,<br />
focando a atenção, <strong>de</strong>sta vez, no<br />
violoncelista húngaro Tibor. Este,<br />
seduzido por uma suposta diva que<br />
lhe exacerba a vai<strong>da</strong><strong>de</strong>, é levado a<br />
acreditar que é bem mais genial do<br />
que supõe.<br />
Neste volume <strong>de</strong> contos cujo título<br />
completo é “Nocturnos: Cinco<br />
Histórias sobre Música e o Cair <strong>da</strong><br />
Noite” Kazuo Ishiguro reflecte a<br />
intenção <strong>de</strong> explorar a natureza do<br />
acto criativo, compondo algo<br />
semelhante a uma partitura com<br />
ênfase na <strong>de</strong>cadência e na<br />
melancolia, uma vez que o<br />
entar<strong>de</strong>cer não é só referente ao<br />
ciclo dos dias mas também ao<br />
ocaso <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>. Uma leitura mais<br />
atenta po<strong>de</strong> revelar a ligação<br />
entre ca<strong>da</strong> conto a um tipo<br />
particular <strong>de</strong> música, uma vez<br />
que as menções casuais a<br />
compositores e intérpretes<br />
famosos estabelecem vínculos<br />
com figuras como os românticos<br />
e crepusculares Chopin e Gabriel<br />
Fauré, Janácek e a sua obra,<br />
influencia<strong>da</strong> pela música “folk“ do<br />
seu país, Elgar e a sua ligação à<br />
Natureza (satiricamente tratado em<br />
“Malvern Hills) ou, ain<strong>da</strong>, as<br />
canções íntimas e<br />
simultaneamente<br />
cínicas <strong>de</strong><br />
Cole<br />
Porter, o<br />
ritmo <strong>de</strong><br />
Irving<br />
Berlin<br />
ou a<br />
Antes <strong>de</strong> se tornar escritor, Ishiguro quis ser músico<br />
<strong>de</strong> rock e essa vocação perdi<strong>da</strong> atravessa a sua obra<br />
aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />
sensuali<strong>da</strong><strong>de</strong> evocativa <strong>de</strong> Sarah<br />
Vaughan.<br />
Sabe-se que Ishiguro, antes <strong>de</strong> se<br />
<strong>de</strong>cidir pela escrita, <strong>de</strong>sejou ser<br />
músico (<strong>de</strong> rock) e essa vocação temse<br />
revelado em to<strong>da</strong> a sua obra. Ao<br />
longo <strong>de</strong>stes contos é possível<br />
<strong>de</strong>tectar traços <strong>de</strong> anteriores<br />
romances, como é o caso <strong>de</strong> “ Os<br />
Inconsolados” -<br />
on<strong>de</strong> um<br />
pianista<br />
famoso<br />
é<br />
MIKE SEGAR/ REUTERS<br />
assombrado por um mundo<br />
estranho e cheio <strong>de</strong> sinais que ele<br />
não consegue apreen<strong>de</strong>r -, <strong>de</strong><br />
“Nunca Me Deixes”, em que a<br />
melodia toca<strong>da</strong> numa cassete é<br />
repeti<strong>da</strong>mente <strong>da</strong>nça<strong>da</strong> por Kathy, e<br />
mesmo <strong>de</strong> uma peça que Ishiguro<br />
escreveu para o teatro, “The Sad<strong>de</strong>st<br />
Music in the World”, uma comédia<br />
negra on<strong>de</strong> uma mulher patrocina<br />
um concurso para encontrar a “<br />
música mais triste do mundo”.<br />
Ishiguro é um escritor peculiar<br />
que, como já tem <strong>de</strong>monstrado no<br />
total <strong>da</strong> sua obra, se obstina em<br />
<strong>de</strong>smontar estruturas literárias<br />
tradicionais, mantendo, no entanto,<br />
um tom <strong>de</strong> aparente e perversa<br />
“normali<strong>da</strong><strong>de</strong>”, num universo em<br />
que indivíduos mais ou menos<br />
disfuncionais são influenciados por<br />
sinais que os arrastam para situações<br />
bizarras, dramáticas e, como é o<br />
caso em pelo menos duas histórias<br />
<strong>de</strong>ste volume, cómicas e com um<br />
toque <strong>de</strong> “slapstick”. A tristeza, a<br />
impaciência e o <strong>de</strong>speito<br />
atormentam as personagens,<br />
pessoas <strong>de</strong>senraiza<strong>da</strong>s, vivendo<br />
longe <strong>da</strong>s suas pátrias, em<br />
situações precárias e, por<br />
vezes humilhantes, mas<br />
que <strong>de</strong>senvolvem<br />
estranhos afectos e<br />
cumplici<strong>da</strong><strong>de</strong>s fortuitas.<br />
Não é por acaso que o<br />
autor coloca em<br />
confronto jovens<br />
artistas com mentores<br />
muito mais velhos,<br />
enfatizando <strong>de</strong>ssa forma<br />
o contraste entre a<br />
esperança e o<br />
conformismo, entre a<br />
expectativa e o cinismo.<br />
Apesar <strong>da</strong> óbvia referência<br />
ao romantismo, Ishiguro está<br />
muito mais próximo <strong>de</strong> Swift e<br />
<strong>de</strong> Austen, no que diz respeito à<br />
<strong>de</strong>sa<strong>de</strong>quação <strong>da</strong>s personagens<br />
à reali<strong>da</strong><strong>de</strong> e à sua preocupação<br />
em seguir certas regras<br />
impostas por uma socie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
que dita comportamentos<br />
absurdos. Mas o mais<br />
interessante é a forma como<br />
Ishiguro questiona a<br />
essência <strong>da</strong> arte e reflecte<br />
sobre o narcisismo dos<br />
criadores e o dilema entre<br />
a “pureza” <strong>da</strong> criação e a<br />
atracção pela fama e pelo<br />
sucesso. Este autor<br />
inglês que nasceu em<br />
Nagasáqui, no rescaldo<br />
<strong>da</strong> bomba atómica,<br />
carrega consigo e<br />
transmite nos seus<br />
livros o sentimento<br />
<strong>de</strong> que somos<br />
todos órfãos,<br />
arrastados pelas<br />
correntes <strong>da</strong><br />
história e do<br />
acaso, vítimas <strong>da</strong><br />
incomunicabili<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
e <strong>da</strong><br />
incerteza.<br />
Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 29
Livros<br />
Isabel<br />
Coutinho<br />
Chico Buarque gostou<br />
muito do livro. Aquele,<br />
disse, só podia ser um<br />
livro escrito por um<br />
autor <strong>de</strong> “quadrinhos”<br />
Lourenço Mutarelli<br />
http://www.<br />
mutarelli.com.<br />
br/mutarelli/<br />
O filme<br />
http://www.<br />
ocheirodoralo.<br />
com.br/<br />
Diário em BD na<br />
revista Piauí<br />
http://www.<br />
revistapiaui.com.<br />
br/edicao_35/artigo_1104/Rotina_em_nanquim.<br />
aspx<br />
Ciberescritas<br />
30 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon<br />
Ai que bom é<br />
“O Cheiro do Ralo”<br />
Finalmente li “O Cheiro do Ralo” do brasileiro<br />
Lourenço Mutarelli. E, como já esperava, valeu<br />
bem a pena. Quem primeiro me falou <strong>de</strong>ste<br />
escritor, autor <strong>de</strong> ban<strong>da</strong>-<strong>de</strong>senha<strong>da</strong> e actor foi<br />
Marçal Aquino quando esteve em Matosinhos a<br />
participar no 4º Encontro Internacional Literatura em<br />
Viagem. O autor <strong>de</strong> “Cabeça a Prémio” é também<br />
argumentista e foi graças a ele que esta obra foi a<strong>da</strong>pta<strong>da</strong><br />
ao cinema no Brasil.<br />
Em 2002, Lourenço Mutarelli (São Paulo, 1964) <strong>de</strong>pois<br />
<strong>de</strong> ter publicado nove livros <strong>de</strong> ban<strong>da</strong>-<strong>de</strong>senha<strong>da</strong> e <strong>de</strong><br />
ser um dos autores <strong>de</strong> BD mais premiados no Brasil,<br />
publicou o seu primeiro romance. Escreveu-o <strong>de</strong><br />
raja<strong>da</strong>, durante cinco dias, num Carnaval em que estava<br />
sozinho.<br />
Chico Buarque, durante a conversa que teve com<br />
Milton Hatoum e Samuel Titan Jr. na Festa Literária <strong>de</strong><br />
Paraty, em Julho, disse que “a literatura hoje em dia<br />
não precisa <strong>de</strong> se alimentar somente <strong>de</strong> literatura”.<br />
Contou que há uns cinco, seis anos, tinha lido “O Cheiro<br />
do Ralo” <strong>de</strong> Mutarelli e que o romance “era muito<br />
bom”. Gostou muito do livro e percebeu que era “muito<br />
novo” porque Lourenço Mutarelli é um autor <strong>de</strong> BD.<br />
Aquele só podia ser um livro escrito por um autor <strong>de</strong><br />
“quadrinhos”. “[No romance] Há um sujeito atrás <strong>de</strong> um<br />
balcão naquela loja maluca e aparece um tipo, aparece<br />
um outro, e é muito bom que<br />
ele tenha trazido isso para a<br />
literatura. Isso é bom para a<br />
literatura”, afirmou.<br />
“O Cheiro do Ralo” tem 140<br />
páginas que se lêem tal como<br />
foi escrito, num repente.<br />
Risos, surpresa, indignação,<br />
excitação, pena, todos estes<br />
sentimentos surgem durante<br />
a leitura. Estamos a ler um<br />
romance e parece que estamos a ler poesia. O narrador<br />
do livro nunca é i<strong>de</strong>ntificado. Passa parte <strong>da</strong> sua vi<strong>da</strong><br />
atrás do balcão numa loja <strong>de</strong> penhores e, quando os<br />
clientes atravessam a porta, já ele está a pensar como os<br />
vai tramar. Na sua loja há um problema, um cheiro surge<br />
<strong>da</strong> fossa <strong>da</strong> casa <strong>de</strong> banho, do ralo entupido. Um cheiro<br />
tão insuportável que atravessa os diálogos do livro do<br />
princípio ao fim. O narrador tem também uma obsessão<br />
por uma <strong>de</strong>termina<strong>da</strong> “bun<strong>da</strong>”, o rabinho perfeito <strong>de</strong><br />
uma emprega<strong>da</strong> <strong>de</strong> um restaurante on<strong>de</strong> ele costuma ir<br />
almoçar só para espreitar “a dona bun<strong>da</strong>”.<br />
“‘O Cheiro do Ralo’, em síntese, é a história <strong>da</strong> busca.<br />
Fazendo justiça ao título, os caminhos trilhados pelo<br />
protagonista só serão percorridos se o leitor tiver a<br />
capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> suportar o odor”, lê-se no site oficial <strong>de</strong><br />
Lourenço Mutarelli, on<strong>de</strong> po<strong>de</strong>m ser visualiza<strong>da</strong>s quatro<br />
páginas do livro em PDF.<br />
Enquanto se espera que algum editor português<br />
resolva editar por cá esta obra <strong>de</strong> Mutarelli, po<strong>de</strong>mos<br />
ver no site <strong>da</strong> revista brasileira “Piauí” o diário ilustrado<br />
que o escritor fez durante um mês a pedido dos editores<br />
<strong>da</strong> revista: “Acor<strong>de</strong>i irritado. Os gatos parecem cinco<br />
macacos. Tenho que ir ao banco pagar uma dúzia <strong>de</strong><br />
contas.” São coisas assim.<br />
E quem quiser saber mais sobre o trabalho <strong>de</strong><br />
Mutarelli po<strong>de</strong> ir assistir a “Corpo Estranho” no projecto<br />
na Internet <strong>de</strong> Renata Jesion a partir do texto original do<br />
autor. A actriz faz peças <strong>de</strong> teatro na sua sala <strong>de</strong> estar,<br />
que são filma<strong>da</strong>s e transmiti<strong>da</strong>s na Internet.<br />
Corpo Estranho<br />
http://www.teatroparaalguem.<br />
com.br/ isabel.coutinho@publico.pt<br />
(Ciberescritas já é um blogue http://blogs.publico.pt/ciberescritas)<br />
Era uma vez<br />
na Noruega<br />
Karin Fossum faz um<br />
admirável retrato <strong>de</strong> uma<br />
al<strong>de</strong>ia adormeci<strong>da</strong> em que<br />
todos os habitantes parecem<br />
ter algo a escon<strong>de</strong>r.<br />
José Riço Direitinho<br />
A Noiva Indiana<br />
Karin Fossum<br />
(Tradução <strong>de</strong> José Mendonça<br />
<strong>da</strong> Cruz)<br />
Oceanos<br />
mmmmn<br />
A norueguesa<br />
Karin Fossum (n.<br />
1954) é uma <strong>da</strong>s<br />
autoras mais<br />
reconheci<strong>da</strong>s<br />
<strong>de</strong>ste recente<br />
“boom” <strong>de</strong><br />
policiais nórdicos<br />
que há já alguns<br />
anos se instalou<br />
nos catálogos <strong>da</strong>s editoras europeias<br />
(mais recentemente também no <strong>da</strong>s<br />
norte-americanas), e que um pouco a<br />
medo parece estar agora a chegar a<br />
Portugal – se não ain<strong>da</strong> em termos <strong>de</strong><br />
sucesso junto dos leitores, pelo<br />
menos em número <strong>de</strong> autores<br />
traduzidos. Karin Fossum, que<br />
curiosamente começou a sua carreira<br />
literária publicando poesia (tendo<br />
sido bastante elogia<strong>da</strong> pela crítica),<br />
só a meio <strong>da</strong> déca<strong>da</strong> <strong>de</strong> 90 é que se<br />
converteu à escrita <strong>de</strong> romances<br />
policiais, tendo iniciado então a<br />
“série do Inspector Konrad Sejer”, <strong>da</strong><br />
qual foram publicados até agora, na<br />
Noruega, nove volumes. “A<br />
Noiva Indiana” (o quinto<br />
<strong>da</strong> série) – distinguido<br />
em 2007 com o “Best<br />
European Crime<br />
Novel”, e<br />
consi<strong>de</strong>rado, em<br />
2008, pelo “Los<br />
Angeles Times”<br />
como o melhor<br />
romance policial<br />
publicado nos EUA – é<br />
o terceiro livro <strong>de</strong> Karin<br />
Fossum por cá<br />
traduzido: a Presença<br />
publicara antes “A Ilusão<br />
<strong>de</strong> Eva” (2002) e “O<br />
Olhar <strong>de</strong> um<br />
Desconhecido”<br />
(2005).<br />
Um<br />
pouco na<br />
linha <strong>de</strong><br />
outras<br />
norueguesa Anne Holt ou a sueca<br />
Liza Marklund – para referir apenas<br />
escritoras traduzi<strong>da</strong>s para português<br />
– Karin Fossum parece querer<br />
remeter a resolução do puzzle do<br />
crime para um segundo plano,<br />
preferindo centrar-se nas causas e<br />
nos efeitos do acto violento no tecido<br />
social. Para isso, criou personagens<br />
bastante vívi<strong>da</strong>s, convincentes, e<br />
aprofundou-as emocionalmente<br />
realçando as suas inseguranças.<br />
Gun<strong>de</strong>r Jomann é um recatado<br />
ven<strong>de</strong>dor <strong>de</strong> maquinaria agrícola,<br />
sem problemas monetários, 51 anos<br />
<strong>de</strong> i<strong>da</strong><strong>de</strong>, e que ain<strong>da</strong> não per<strong>de</strong>u a<br />
esperança <strong>de</strong> um dia se casar. Vive<br />
em Elvestad, uma al<strong>de</strong>ia com 2347<br />
habitantes. Um dia, ao folhear um<br />
livro que lhe fora oferecido pela<br />
irmã, Povos <strong>de</strong> To<strong>da</strong>s as Nações,<br />
apaixona-se pela beleza <strong>da</strong>s<br />
mulheres indianas. Daí até viajar<br />
para a Índia, para Mumbai (a antiga<br />
Bombaim), com a intenção <strong>de</strong> por lá<br />
encontrar uma companheira,<br />
<strong>de</strong>corre pouco tempo. “Havia outras<br />
opções. Mas ele não tinha coragem<br />
para embarcar com outros, com<br />
estranhos, num autocarro com<br />
<strong>de</strong>stino à Polónia. E não queria<br />
saltar para um avião rumo à<br />
Tailândia. Havia tantos boatos sobre<br />
o que por lá se passava…”<br />
Para espanto <strong>da</strong> irmã, quando<br />
Gun<strong>de</strong>r regressa à Noruega, passa<strong>da</strong>s<br />
as duas semanas <strong>de</strong> férias, é já um<br />
homem casado. A sua mulher, Poona<br />
Bai, não o po<strong>de</strong> acompanhar mas em<br />
breve se lhe virá juntar. Mas no dia<br />
aprazado para Gun<strong>de</strong>r a ir esperar ao<br />
aeroporto, Marie, a irmã, tem um<br />
violento aci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> viação e é<br />
interna<strong>da</strong> no hospital com<br />
traumatismos graves e em estado <strong>de</strong><br />
coma. Ele pe<strong>de</strong> então ao único taxista<br />
<strong>da</strong> al<strong>de</strong>ia que vá ao aeroporto buscar<br />
Poona Bai. Mas este regressa<br />
sozinho. No dia seguinte, o<br />
corpo <strong>de</strong> uma mulher é<br />
encontrado na<br />
bor<strong>da</strong> <strong>de</strong> um<br />
prado, junto a um<br />
bosque. É uma<br />
mulher<br />
pequena, <strong>de</strong><br />
pele escura e<br />
vesti<strong>da</strong> com<br />
roupas exóticas.<br />
Tem o rosto<br />
irreconhecível,<br />
esmagado. É então<br />
que é chamado<br />
o calmo<br />
autoras<br />
Karin Fossum é uma <strong>da</strong>s mais reconheci<strong>da</strong>s<br />
nórdicas,<br />
representantes do policial nórdico<br />
como a<br />
islan<strong>de</strong>sa Yrsa<br />
Sigur<strong>da</strong>rdóttir,<br />
a também<br />
aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />
Inspector Konrad Sejer – um dos mais<br />
civilizados <strong>da</strong> constelação do<br />
romance policial – que frente ao<br />
corpo nota que se tratou <strong>de</strong> “um<br />
ataque <strong>de</strong> uma violência muito rara<br />
na história criminal <strong>da</strong> Noruega.”<br />
Ninguém na adormeci<strong>da</strong> al<strong>de</strong>ia <strong>de</strong><br />
Elvestad consegue acreditar que um<br />
dos seus cometeu aquele horrendo e<br />
brutal crime. Mas para Konrad Sejer e<br />
para o seu assistente Jacob Skane<br />
todos são suspeitos. E alguns<br />
parecem ter algo a escon<strong>de</strong>r, quando<br />
não sobre o crime, pelo menos sobre<br />
as suas vi<strong>da</strong>s. “Há uma via <strong>de</strong> acesso<br />
a todo o ser humano. É isso que<br />
procuro, pensou Sejer.”<br />
Neste romance lento e pungente,<br />
Fossum faz um retrato talentoso <strong>da</strong><br />
vi<strong>da</strong> numa al<strong>de</strong>ia quase isola<strong>da</strong>.<br />
Des<strong>de</strong> o ostracismo a que é remeti<strong>da</strong><br />
uma testemunha casual, até às<br />
conversas <strong>de</strong> café em que vários se<br />
vão acusando em jeito <strong>de</strong><br />
“brinca<strong>de</strong>ira”, passando pela<br />
enunciação dos pecadilhos venais <strong>de</strong><br />
ca<strong>da</strong> um, que to<strong>da</strong> a gente conhece<br />
mas que finge não saber. Como<br />
convém num romance que se<br />
preten<strong>de</strong> subtil, a ambigui<strong>da</strong><strong>de</strong> final<br />
dá-lhe um certo toque <strong>de</strong> <strong>de</strong>lica<strong>de</strong>za.<br />
Ensaio<br />
E Alice<br />
com isso?<br />
Carroll é uma fasquia muito<br />
alta para a prosa amanuense<br />
<strong>de</strong>ste argentino “déraciné.”<br />
Eduardo Pitta<br />
No Bosque do Espelho<br />
Alberto Manguel<br />
(Tradução <strong>de</strong> Margari<strong>da</strong> Santiago)<br />
Dom Quixote<br />
mmmnn<br />
Foi em 1996, com<br />
“Uma História <strong>da</strong><br />
Leitura”, que<br />
Alberto Manguel<br />
(n. 1948) chamou<br />
a atenção <strong>de</strong> to<strong>da</strong><br />
a gente. Nessa<br />
época já ele era<br />
um autor<br />
canadiano. Na<br />
vasta bibliografia, só o livro<br />
inaugural foi escrito na língua<br />
materna: “Dicionário <strong>de</strong> Lugares<br />
Imaginários” (1980), obra <strong>de</strong> que é<br />
co-autor com Gianni Gua<strong>da</strong>lupi. A<br />
partir <strong>da</strong>í escreveu sempre em<br />
inglês. Manguel nasceu em Buenos<br />
Aires, mas passou a infância e parte<br />
<strong>da</strong> adolescência em Israel, on<strong>de</strong> o<br />
pai era embaixador. Voltou à<br />
Argentina para completar o ensino<br />
secundário, tornou-se íntimo <strong>de</strong><br />
Jorge Luís Borges, viajou por todo o<br />
mundo antes <strong>de</strong> fixar-se no Canadá<br />
nos anos 1980, mas, não obstante a
ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia canadiana, vive<br />
actualmente em França. Manguel<br />
goza <strong>de</strong> uma fama notoriamente<br />
excessiva (a lista <strong>de</strong> prémios<br />
internacionais é impressionante).<br />
Embora tenha escrito romances e<br />
contos, alguns <strong>de</strong> natureza gay, e<br />
organizado antologias <strong>de</strong> diversa<br />
índole, é como ensaísta que se<br />
<strong>de</strong>staca. Os anos em que lia para<br />
Borges, já então cego, foram um<br />
bom tirocínio.<br />
“No Bosque do Espelho” toma<br />
como ponto <strong>de</strong> parti<strong>da</strong> a obra-prima<br />
<strong>de</strong> Lewis Carroll, adoptando como<br />
divisa o “mot” <strong>de</strong> Heraclito: “Nunca<br />
mergulhas no mesmo livro duas<br />
vezes”. Trata-se <strong>de</strong> uma colectânea<br />
<strong>de</strong> ensaios <strong>de</strong> muito diversa<br />
proveniência: artigos<br />
encomen<strong>da</strong>dos, textos para cursos<br />
<strong>de</strong> jornalismo <strong>da</strong>s artes,<br />
conferências, recensões críticas,<br />
antologias gay, introduções e<br />
posfácios. Manguel estabece um fio<br />
condutor entre textos <strong>de</strong> Borges,<br />
Cortázar, Chesterton, Melville,<br />
Cynthia Ozick, Santo Agostinho e<br />
outros. Do ponto <strong>de</strong> vista <strong>da</strong><br />
erudição e do “ofício”, tem a<br />
perfeição do amanuense culto. Mas<br />
raramente nos surpreen<strong>de</strong> com um<br />
golpe <strong>de</strong> asa.<br />
Uma <strong>da</strong>s excepções é a sanha com<br />
que “<strong>de</strong>smonta” Bret Easton Ellis a<br />
Espaço<br />
Público<br />
Este espaço vai ser seu.<br />
Que filme, peça <strong>de</strong> teatro,<br />
livro, exposição, disco,<br />
álbum, canção, concerto,<br />
DVD viu e gostou tanto<br />
que lhe apeteceu escrever<br />
sobre ele, concor<strong>da</strong>ndo ou<br />
Alberto Manguel: Lewis Carroll é uma fasquia<br />
<strong>de</strong>masiado gran<strong>de</strong> para este argentino<br />
partir <strong>de</strong> “Psicopata Americano”<br />
(1991). A parte do anedotário é<br />
conheci<strong>da</strong>: <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> ter pago um<br />
adiantamento avultado a Ellis, e ter<br />
o livro impresso, a Simon & Schuster<br />
<strong>de</strong>sistiu <strong>de</strong> o pôr à ven<strong>da</strong> por causa<br />
<strong>da</strong> violência do conteúdo; saiu,<br />
como é sabido, sob chancela <strong>da</strong><br />
“Vintage Contemporaries” <strong>da</strong><br />
Random House. Mas Manguel<br />
aproveita para aliviar o fígado: “A<br />
primeira linha do livro é o lema <strong>de</strong><br />
Dante para as portas do Inferno [...].<br />
De facto, tudo está montado <strong>de</strong><br />
modo a levar o leitor a crer que a<br />
história que se segue é, <strong>de</strong> facto, <strong>de</strong><br />
natureza literária: contemporâneo e<br />
irónico [...], mo<strong>de</strong>rno [...], sério e<br />
filosófico. As 128 páginas que se<br />
seguem (a primeira cena brutal<br />
começa na página 129) são<br />
agonizantes para qualquer pessoa<br />
que não esteja habitua<strong>da</strong> a ler<br />
publici<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> mo<strong>da</strong>. [...] Não é<br />
escrita; é um <strong>de</strong>sfile <strong>de</strong> palavras com<br />
o propósito <strong>de</strong> fazer um catálogo.” E<br />
não poupa nos adjectivos: os relatos<br />
são “grotescos”, a prosa<br />
“<strong>de</strong>sajeita<strong>da</strong>”, o estilo “débil” e o<br />
vocabulário “magro”. Tudo por<br />
contraponto com Ovídio, Dante,<br />
Novalis, Sa<strong>de</strong>, Kafka e Dostoievsky.<br />
Convenhamos na <strong>de</strong>sproporção.<br />
O ensaio <strong>de</strong>dicado a Cynthia Ozick<br />
é dos mais estimulantes. A partir <strong>da</strong>s<br />
PHILIPPE MATSAS/ OPALE<br />
leituras que Ozick fez <strong>de</strong> Primo Levi,<br />
Manguel reflecte sobre a condição<br />
ju<strong>da</strong>ica, ameaça<strong>da</strong> pela “galáxia<br />
canibal <strong>da</strong> cultura cristã”. Faz isso<br />
com argúcia e <strong>de</strong>senvoltura,<br />
sobretudo quando contrapõe os<br />
conceitos <strong>de</strong> raiva e misericórdia<br />
que, na perspectiva <strong>de</strong> Ozick, Levi<br />
relacionava com auto<strong>de</strong>struição.<br />
A afirmação <strong>de</strong> que, “até à déca<strong>da</strong><br />
<strong>de</strong> 1960, o Canadá mal reconhecia a<br />
existência <strong>da</strong> literatura canadiana” é<br />
completamente inespera<strong>da</strong>.<br />
Creditando esse reconhecimento à<br />
teimosia e perseverança <strong>de</strong> alguns<br />
editores, bem como à projecção <strong>da</strong><br />
obra <strong>de</strong> Margaret Atwood — que<br />
classifica com paternalismo —,<br />
Manguel reserva os elogios para<br />
Richard Outram (1930-2005), “um<br />
dos melhores poetas em língua<br />
inglesa”.<br />
Tudo visto, parece-me fútil, para<br />
não lhe chamar pe<strong>da</strong>nte, ter<br />
alinhado os textos sob o enigmático<br />
patrocíno <strong>de</strong> “Alice no País <strong>da</strong>s<br />
Maravilhas”. Mesmo nos ensaios<br />
sobre Borges, porventura aqueles<br />
em que está mais à-vonta<strong>de</strong>, Carroll<br />
é uma fasquia muito alta para este<br />
argentino “déraciné”.<br />
Uma<br />
metamorfose<br />
exaspera<strong>da</strong><br />
Um atento estudo <strong>de</strong><br />
literatura compara<strong>da</strong>:<br />
o poema em prosa em<br />
Bau<strong>de</strong>laire e Herberto.<br />
Pedro Mexia<br />
O Espaço sem Volta<br />
Marco Alexandre Rebelo<br />
Ven<strong>da</strong>val<br />
mmmnn<br />
não concor<strong>da</strong>ndo com o<br />
que escrevemos? Envienos<br />
uma nota até 500<br />
caracteres para ipsilon@<br />
publico.pt. E nós <strong>de</strong>pois<br />
publicamos.<br />
Cem anos<br />
me<strong>de</strong>iam o<br />
aparecimento, em<br />
1862, dos<br />
primeiros textos<br />
que constituiriam<br />
“O Spleen <strong>de</strong><br />
Paris” e a<br />
publicação <strong>de</strong> “Os<br />
Passos em Volta”,<br />
em 1963. No breve ensaio “O Espaço<br />
sem Volta”, Marco Alexandre Rebelo<br />
tenta perceber o percurso do poema<br />
em prosa ao longo <strong>de</strong>sse século,<br />
tomando como ponto <strong>de</strong> parti<strong>da</strong> as<br />
colectâneas <strong>de</strong> Bau<strong>de</strong>laire e<br />
Herberto Hel<strong>de</strong>r. E “poema em<br />
prosa” surge aqui quase como<br />
sinónimo <strong>de</strong> “mo<strong>de</strong>rni<strong>da</strong><strong>de</strong>”.<br />
Quando Bau<strong>de</strong>laire começou a<br />
escrever os seus “petits poèmes en<br />
prose”, tomou como mo<strong>de</strong>lo o<br />
“Gaspard <strong>de</strong> la Nuit” (1842), <strong>de</strong><br />
Aloysius Bertrand, a<strong>da</strong>ptando-o à<br />
“<strong>de</strong>scrição <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> mo<strong>de</strong>rna”. O<br />
novo poema em prosa era<br />
“pequeno” e não épico, e usava uma<br />
prosa musical e maleável que<br />
marcava o ritmo <strong>de</strong> um tempo novo.<br />
Esse tempo novo tinha também um<br />
novo espaço: Paris, centro do<br />
mundo civilizado, ci<strong>da</strong><strong>de</strong> já com dois<br />
milhões <strong>de</strong> habitantes e que, com o<br />
plano do Barão Haussmann,<br />
duplicou o número <strong>de</strong> bairros e<br />
ergueu uma infini<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> ruas,<br />
praças, aveni<strong>da</strong>s. A gran<strong>de</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
tinha nascido <strong>da</strong> <strong>de</strong>molição <strong>da</strong><br />
ci<strong>da</strong><strong>de</strong> antiga, e por isso era um<br />
espaço <strong>de</strong> multidões, anonimato e<br />
tédio: “No mundo estreito <strong>de</strong>sta<br />
Paris mo<strong>de</strong>rna e industrial, a<br />
linguagem e a forma empregues<br />
pelos clássicos ao cantar o<br />
quotidiano <strong>de</strong>ixam <strong>de</strong> fazer sentido.<br />
O ritmo <strong>de</strong> vi<strong>da</strong> mudou, a<br />
linguagem, on<strong>de</strong> o ritmo poético é<br />
criado, <strong>de</strong>ve a<strong>da</strong>ptar-se a essa<br />
mu<strong>da</strong>nça, não com o fim <strong>de</strong><br />
reproduzir o real, mas sim para o<br />
transformar” (pág. 15).<br />
A ci<strong>da</strong><strong>de</strong> inumana gera uma nova<br />
subjectivi<strong>da</strong><strong>de</strong>, uma subjectivi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
que vive entre o i<strong>de</strong>alismo e a<br />
triviali<strong>da</strong><strong>de</strong>: “O pequeno poema em<br />
prosa a<strong>da</strong>pta-se ao ritmo quotidiano<br />
do poeta do poeta flâneur e <strong>da</strong>ndy,<br />
um ritmo que oscila entre o viver <strong>de</strong><br />
um acontecimento pitoresco, o<br />
pensar-sonhar-viajar <strong>de</strong> um outro<br />
mundo, os sobressaltos críticos <strong>da</strong><br />
consciência e o simples sentir do<br />
spleen” (pág. 16). É uma<br />
poesia <strong>de</strong> instantâneos,<br />
uma “musa citadina”<br />
feita <strong>de</strong> acasos,<br />
melancolias, do<br />
elogio do feio e do<br />
artificial. O novo<br />
paradigma<br />
civilizacional cria um<br />
novo paradigma<br />
poético, uma poesia<br />
com a linguagem e a<br />
liber<strong>da</strong><strong>de</strong> formal <strong>da</strong><br />
prosa mas com<br />
mecanismos transpostos<br />
<strong>da</strong> versificação, como a<br />
aliteração ou a assonância.<br />
O poema em prosa não foi<br />
inventado por Bau<strong>de</strong>laire, mas<br />
ele reinventou-o como<br />
linguagem <strong>de</strong> um novo<br />
espaço e <strong>de</strong> um novo<br />
tempo.<br />
Passados cem<br />
anos (e <strong>de</strong>pois<br />
<strong>da</strong>s teses<br />
revolucionárias <strong>de</strong> Einstein), espaço<br />
e tempo estavam ain<strong>da</strong> mais<br />
associados, ao ponto <strong>de</strong> serem<br />
indistinguíveis. Mas agora o mundo<br />
já não tinha centro, o spleen tinha<br />
sido substituído pela veloci<strong>da</strong><strong>de</strong>, e a<br />
viagem era uma experiência banal.<br />
“Os Passos em Volta” é um<br />
acontecimento fulgurante na<br />
literatura portuguesa, em parte,<br />
escreve Rebelo, porque actualiza<br />
essa questão do espaço e do tempo<br />
para 1963.<br />
Embora a primeira edição do livro<br />
trouxesse a indicação “contos”<br />
(abandona<strong>da</strong> nas reedições), é à<br />
tradição do poema em prosa que<br />
Herberto vai beber. Aqueles textos<br />
são ficções, mas também narrativas<br />
<strong>de</strong> viagem e monólogos dramáticos,<br />
com ecos autobiográficos e uma<br />
gran<strong>de</strong> inventivi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> escrita. O<br />
sujeito não está preso a uma ci<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
mas <strong>de</strong>ambula por várias ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />
europeias, num espaço em expansão<br />
que gera também um tempo<br />
expansivo. E esse tempo exige uma<br />
escrita circular, “em volta”, uma<br />
escrita que implica uma ruptura<br />
com a linguagem comum. É uma<br />
espécie <strong>de</strong> poesia primitiva, uma<br />
poesia dionisíaca e alucina<strong>da</strong> que<br />
tem também outro mestre:<br />
Lautréamont e a sua “metamorfose<br />
exaspera<strong>da</strong>”.<br />
Publicado numa pequena e<br />
exigente editora <strong>de</strong> teoria e<br />
crítica, “O Espaço<br />
sem Volta” é um<br />
atento estudo<br />
<strong>de</strong> literatura<br />
compara<strong>da</strong>.<br />
Bau<strong>de</strong>laire reinventou o poema em prosa como linguagem<br />
<strong>de</strong> um novo espaço, a gran<strong>de</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong> haussmaniana<br />
Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 31
Teatro/Dança<br />
32 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon<br />
Espaço<br />
Público<br />
Bem vindos<br />
à Euráfrica<br />
No programa que o CCB<br />
<strong>de</strong>dica a África, a francesa<br />
Julie Dossavi apresenta-se<br />
como um ser compósito <strong>de</strong><br />
referências tanto ancestrais<br />
como contemporâneas,<br />
tanto europeias quanto<br />
africanas. Vanessa Rato<br />
P.I. (Pays)<br />
De e com Julie Dossavi.<br />
<strong>Lisboa</strong>. Centro Cultural <strong>de</strong> Belém - Praça do Museu.<br />
Praça do Império. Dia 21/08. 6ª às 22h. Tel.:<br />
213612400. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
CCB Fora <strong>de</strong> Si.<br />
Walid Raad, o artista plástico por<br />
<strong>de</strong>trás do conhecido projecto The<br />
Atlas Group, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> uma teoria<br />
interessante: segundo ele, que<br />
nasceu no Líbano e viu o seu país ser<br />
literalmente arrasado, um evento<br />
traumático como a guerra <strong>de</strong>strói<br />
qualquer possibili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> retomar o<br />
fio <strong>de</strong> certas tradições artísticas;<br />
qualquer autor que o tente, diz ele,<br />
acabará mergulhado no submundo<br />
<strong>da</strong> “falsa cultura”, criador <strong>de</strong> na<strong>da</strong><br />
mais do que duplos, cópias.<br />
É o reverso <strong>da</strong> me<strong>da</strong>lha <strong>da</strong>s teorias<br />
pós-colonialistas. Mas, claro, Walid é<br />
um artista plástico e Julie Dossavi<br />
uma bailarina. Aqui, o corpo é a<br />
questão. Porque o corpo tem uma<br />
memória própria.<br />
Nasci<strong>da</strong> em Toulon em 1968,<br />
Dossavi, hoje com 41 anos, cresceu<br />
em Brest, na Bretanha, e mudou-se<br />
para Paris apenas no final do liceu.<br />
Foi primeiro atleta, <strong>de</strong>pois<br />
patinadora e só <strong>de</strong>pois bailarina,<br />
Agen<strong>da</strong><br />
Teatro<br />
Estreiam<br />
Este espaço vai ser<br />
seu. Que filme, peça <strong>de</strong><br />
teatro, livro, exposição,<br />
disco, álbum, canção,<br />
concerto, DVD viu e<br />
gostou tanto que lhe<br />
apeteceu escrever<br />
A I<strong>da</strong><strong>de</strong> do Ouro<br />
Encenação <strong>de</strong> Filipe Crawford. Com<br />
Ana Peres, Carla Men<strong>de</strong>s, Fernando<br />
Cunha, Hugo Gama, Luís<br />
Nascimento, Mariana Schou, Marta<br />
Pacheco, Rui Ferreira, Vasco Lavado,<br />
Pedro Luzindro.<br />
<strong>Lisboa</strong>. Castelo <strong>de</strong> São Jorge. De 27/08 a 29/08. 5ª a<br />
Sáb. às 21h30. Tel.: 218800620. 5€ a 10€.<br />
Drákula<br />
Encenação <strong>de</strong> John Mowat. Pela<br />
Companhia <strong>de</strong> Teatro do Chapitô.<br />
Com Jorge Cruz, José Carlos Garcia,<br />
Tiago Viegas.<br />
Fundão. Espaço Gardunha Viva. Dia 21/08. 6ª às<br />
22h. 3€ a 10€.<br />
Festival TeatroAgosto.<br />
Tulius Claunus<br />
De Nuno Pino Custódio e Sérgio<br />
Fernan<strong>de</strong>s. Encenação <strong>de</strong> Nuno Pino<br />
Custódio. Pela Este. Com Sérgio<br />
Fernan<strong>de</strong>s e Pedro Rufino.<br />
sobre ele, concor<strong>da</strong>ndo<br />
ou não concor<strong>da</strong>ndo<br />
com o que escrevemos?<br />
Envie-nos uma nota até<br />
500 caracteres para<br />
ipsilon@publico.pt. E<br />
nós <strong>de</strong>pois publicamos.<br />
Julie Dossavi, uma franco-africana à procura <strong>da</strong>s origens<br />
Fundão. Espaço Gardunha Viva. Dia 22/08. Sáb. às<br />
22h. 3€ a 10€.<br />
Festival TeatroAgosto.<br />
Hed<strong>da</strong> Gabler<br />
De Henrik<br />
Ibsen.<br />
Encenação<br />
<strong>de</strong> Celso Cleto.<br />
Com Sofia<br />
Alves, Ana<br />
Rocha, Elisa<br />
<strong>Lisboa</strong>,<br />
Guilherme<br />
Filipe,<br />
Maria Dulce,<br />
Paulo Rocha, Vítor <strong>de</strong> Sousa.<br />
Cal<strong>da</strong>s <strong>da</strong> Rainha. Centro Cultural e Congressos <strong>da</strong>s<br />
Cal<strong>da</strong>s <strong>da</strong> Rainha. Rua Doutor Leonel Sotto Mayor.<br />
De 21/08 a 22/08. 5ª e 6ª às 21h30. Tel.: 262889650.<br />
7,5€ a 15€.<br />
Presos por uma Corrente <strong>de</strong> Ar<br />
De Helen Ainsworth e Graeme<br />
Pulleyn. Encenação <strong>de</strong> Graeme<br />
Pulleyn. Pelo Teatro Regional <strong>da</strong> Serra<br />
<strong>de</strong> Montemuro.<br />
Arouca. Espaço <strong>da</strong> Feira. Dia 22/08. Sáb. às 21h30.<br />
Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />
aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />
Continuam<br />
TINK<br />
A partir <strong>de</strong> Herman Melville.<br />
Pela Cão Solteiro. Com Paula Sá<br />
Nogueira, Paulo Lages, Miguel<br />
Manso, Mariana Sá Nogueira, entre<br />
outros.<br />
<strong>Lisboa</strong>. Cão Solteiro. R. Poço dos Negros, 120. Até<br />
30/08. 3ª a Dom. às 22h00. 5€ a 10€.<br />
Piaf<br />
Encenação <strong>de</strong> Filipe La Féria. Com<br />
Sónia <strong>Lisboa</strong> e Wan<strong>da</strong> Stuart, entre<br />
outros.<br />
<strong>Lisboa</strong>. Teatro Politeama. R. Portas <strong>de</strong><br />
Santo Antão, 109. Até 31/12. 3ª a 6ª às 21h30.<br />
Sáb. às 17h00 e 21h30. Dom. às 17h00. Tel.:<br />
213245500.<br />
A Gaiola <strong>da</strong>s Loucas<br />
De Jean Poirte. Encenação: Filipe La<br />
Féria. Com José Raposo, Carlos<br />
Quintas, Rita Ribeiro, Joel Branco,<br />
Hugo Ren<strong>da</strong>s.<br />
Porto. Rivoli Teatro <strong>Municipal</strong> - Gran<strong>de</strong> Auditório.<br />
Pç. D. João I. Até 31/12. 3ª, 4ª, 5ª e 6ª às 21h30. Sáb.<br />
às 17h00 e 21h30. Dom. e Feriados às 17h00. Tel.:<br />
223392200.<br />
trabalhando com nomes conhecidos<br />
<strong>da</strong> cena francesa como Philippe<br />
Decouflé e Joseph Nadj. Mas África<br />
foi uma presença constante na sua<br />
família originária do Benim: “É o<br />
que tenho em mim <strong>de</strong>s<strong>de</strong> sempre e<br />
eu acho que as pessoas não po<strong>de</strong>m<br />
esquecer as suas raízes, <strong>de</strong> on<strong>de</strong><br />
vêm”, diz-nos numa breve conversa<br />
telefónica a partir <strong>de</strong> Paris. O<br />
pretexto: “P.I. (Pays)”, aquele que<br />
ela própria <strong>de</strong>screve como “o mais<br />
africano, o mais colorido” dos cinco<br />
espectáculos que tem em reportório.<br />
Data<strong>da</strong> <strong>de</strong> 2003, “P.I. (Pays)”<br />
evolui ao longo <strong>de</strong> um dia e <strong>da</strong><br />
viagem ritual <strong>de</strong> uma mulher (“uma<br />
mulher do mundo”, como diz<br />
Dossavi) que atravessa diferentes<br />
paisagens íntimas tingi<strong>da</strong>s com a<br />
influência <strong>da</strong> música e <strong>da</strong> <strong>da</strong>nça do<br />
Benim, do Mali, do Burkina Faso e,<br />
claro, <strong>de</strong> França.<br />
Rituais ancestrais, sim, mas<br />
também contemporâneos, ligados às<br />
gran<strong>de</strong>s zonas urbanas, como na<br />
música “tecno” e o “hip hop”: está<br />
tudo lá, a emergir estiliza<strong>da</strong>mente<br />
através <strong>de</strong> Dossavi numa série <strong>de</strong><br />
solos e duetos em que<br />
percussionistas africanos e<br />
sobretudo um cantor maliano<br />
surgem como alter-egos <strong>da</strong><br />
coreógrafa e bailarina.<br />
Não vale a pena tentar ir muito<br />
mais longe do que isto: “Realmente<br />
eu não faço parte <strong>da</strong> <strong>da</strong>nça chama<strong>da</strong><br />
conceptual. Eu estou na <strong>da</strong>nça pura,<br />
na troca, na transmissão do<br />
sentimento. Gosto quando as<br />
pessoas vêem o meu trabalho e<br />
sentem. Porque para mim a <strong>da</strong>nça é<br />
realmente um estado: vivo a <strong>da</strong>nça<br />
<strong>da</strong> cabeça aos pés.”<br />
É um clássico <strong>de</strong> quem vai à<br />
procura <strong>da</strong>s suas origens: “Acho que<br />
me sinto mais africana do que os<br />
africanos. Às vezes não po<strong>de</strong>mos<br />
explicar tudo.”<br />
O Teatro <strong>de</strong> Montemuro<br />
em Arouca
Cinema<br />
As estrelas do público<br />
Estreiam<br />
Gostar <strong>de</strong><br />
personagens<br />
O filme <strong>de</strong> Miguel Mozos<br />
tem a capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> se<br />
confundir, a ca<strong>da</strong> momento,<br />
com um infinito amor<br />
pelo seu conjunto <strong>de</strong><br />
personagens, que é <strong>de</strong> resto<br />
a principal razão <strong>da</strong> sua<br />
existência.<br />
Luís Miguel Oliveira<br />
4 Copas<br />
De Manuel Mozos,<br />
com Nuno Bernardo, Diana Costa e<br />
Silva, Margari<strong>da</strong> Marinho, João<br />
Lagarto. M/12<br />
MMMnn<br />
<strong>Lisboa</strong>: CinemaCity Campo Pequeno Praça <strong>de</strong><br />
Touros: Sala 8: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 14h20, 16h40, 19h,<br />
21h50, 00h10 Sábado Domingo 12h, 14h20, 16h40,<br />
19h, 21h50, 00h10; UCI Cinemas - El Corte Inglés:<br />
Sala 3: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 14h15, 16h50,<br />
19h25, 21h50, 00h25 Domingo 11h30, 14h15, 16h50,<br />
19h25, 21h50, 00h25; ZON Lusomundo<br />
CascaiShopping: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />
13h10, 15h50, 18h10, 21h05, 23h30; ZON Lusomundo<br />
Colombo: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50,<br />
15h20, 18h10, 21h15, 23h50; ZON Lusomundo<br />
Alma<strong>da</strong> Fórum: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />
13h15, 15h50, 18h20, 21h05, 23h40<br />
Jorge<br />
Mourinha<br />
Porto: Arrábi<strong>da</strong> 20: Sala 17: 5ª 6ª Sábado<br />
Domingo 2ª 14h05, 16h40, 19h15, 21h45, 00h20 3ª<br />
4ª 16h40, 19h15, 21h45, 00h20; ZON Lusomundo<br />
Dolce Vita Porto: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />
14h, 16h30, 19h, 21h30, 24h; ZON Lusomundo<br />
Parque Nascente: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª<br />
4ª 13h, 15h50, 19h, 21h50, 00h35<br />
Nem todos os filmes, e na ver<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
não é assim uma coisa tão comum,<br />
estão interessados em gostar <strong>da</strong>s suas<br />
personagens. E muito poucos<br />
querem, e sabem, mostrar a ca<strong>da</strong><br />
plano o amor que têm pelas suas<br />
personagens. A reduzirem-se - tarefa<br />
ingrata - as virtu<strong>de</strong>s <strong>de</strong> “4 Copas” a<br />
uma só, essencial, fique-se com essa:<br />
a capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> que o filme tem para se<br />
confundir, a ca<strong>da</strong> momento, com um<br />
infinito amor pelo seu conjunto <strong>de</strong><br />
personagens, como se fosse ele a<br />
guiá-lo, e <strong>de</strong>clará-lo a principal razão<br />
<strong>da</strong> sua existência. Doce mesmo<br />
quando é implacável (o plano em que<br />
João Lagarto adormece antes <strong>de</strong> a<br />
mulher, Margari<strong>da</strong> Marinho, se<br />
<strong>de</strong>itar, e assim com um pacífico<br />
ressonar se mostra um casamento em<br />
falência técnica), terno mesmo<br />
quando é severo (a bofeta<strong>da</strong> <strong>de</strong><br />
Lagarto na filha, Rita Martins), “4<br />
Copas” é um filme que parece feito<br />
para ele próprio, o filme, ficar a ver<br />
as suas personagens, ver o que elas<br />
fazem e como elas sentem, às vezes<br />
envergonhado com as suas falhas <strong>de</strong><br />
carácter (os planos com Marinho,<br />
vicia<strong>da</strong> no jogo, a rebaixar-se para<br />
conseguir algum dinheiro<br />
emprestado), outras orgulhoso <strong>da</strong>s<br />
Luís M.<br />
Oliveira<br />
Mário<br />
J. Torres<br />
Vasco<br />
Câmara<br />
4 Copas nnnnn mmmnn nnnnn mmmnn<br />
Blood: O Último Vampiro a nnnnn nnnnn nnnnn<br />
Duplo Amor mmmnn mmmmn nnnnn mmnnn<br />
G.I. Joe: O Ataque dos Cobra mnnnn nnnnn nnnnn nnnnn<br />
Inimigos Públicos mmmnn mmmmn nnnnn mmmmn<br />
Os Limites do Controlo mmmmn mmmmn mmnnn mnnnn<br />
Nunca é Tar<strong>de</strong> Demais nnnnn mnnnn nnnnn nnnnn<br />
As Praias <strong>de</strong> Agnès mmmnn mmmmn mmmmn mmmnn<br />
Sinédoque, Nova Iorque mmmnn nnnnn nnnnn mnnnn<br />
Up-Altamente mmmmn mmmnn nnnnn mmmnn<br />
Os actores certos nas personagens certas, em “4 Copas”<br />
suas virtu<strong>de</strong>s (a cabeça ergui<strong>da</strong>, o<br />
peito cheio <strong>de</strong> ar, <strong>de</strong> João Lagarto na<br />
cena a seguir ao divórcio), mas<br />
sempre <strong>de</strong>votado. A ver<strong>da</strong><strong>de</strong> é que,<br />
como ensinou um velho cineasta<br />
francês, todos têm as suas razões, e é<br />
isso que torna a escolha difícil. Ou<br />
impossível: mesmo quando as<br />
personagens estão já to<strong>da</strong>s zanga<strong>da</strong>s<br />
umas com as outras (as três cita<strong>da</strong>s<br />
mais a <strong>de</strong> Filipe Duarte), e não há um<br />
plano que possa conter duas <strong>de</strong>las ao<br />
mesmo tempo, o filme - e é talvez a<br />
sequência mais bonita - entra num<br />
vai e vem a saltar <strong>de</strong> umas para as<br />
outras, planos curtos sobre planos<br />
curtos, quase sem “avançar” coisa<br />
nenhuma, como se fosse só para<br />
conseguir estar com to<strong>da</strong>s em<br />
simultâneo (e também para se<br />
<strong>de</strong>scansar, e confirmar que elas são<br />
fortes, e se aguentaram durante o<br />
tempo em que a câmara as<br />
abandonou).<br />
Isto é uma questão <strong>de</strong> olhar, na<br />
ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira acepção <strong>da</strong> palavra, e<br />
juntamente com este tipo <strong>de</strong><br />
dramaturgia sussurra<strong>da</strong>, num tom<br />
menor (como todo o tom menor,<br />
uma questão <strong>de</strong> estilo, e <strong>de</strong> estilo<br />
clássico) que reflecte o esbatimento<br />
<strong>de</strong> uma inquietação numa resignação<br />
(re<strong>de</strong>ntora ou não), a marca distintiva<br />
do cinema <strong>de</strong> ficção <strong>de</strong> Manuel<br />
Mozos (embora fosse interessante<br />
<strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r que também se encontram<br />
estas exactas características num<br />
filme como “Ruínas”). “4 Copas”<br />
conta uma história “comum” como<br />
em “Xavier” ou no malfa<strong>da</strong>do “Um<br />
Passo, Outro Passo e Depois...”.<br />
Talvez não fosse tão “comum” a <strong>de</strong><br />
“...Quando Troveja” mesmo se “4<br />
Copas” conserva <strong>de</strong>le alguns ecos<br />
muito directos - Diana (Rita Martins),<br />
a miú<strong>da</strong> com nome <strong>de</strong> <strong>de</strong>usa <strong>da</strong> caça<br />
que para remen<strong>da</strong>r o casamento do<br />
pai se põe a seduzir o homem que lhe<br />
seduziu a mulher, é um pouco como<br />
os “duen<strong>de</strong>s” que nesse filme<br />
cui<strong>da</strong>vam <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> amorosa <strong>de</strong> Miguel<br />
Guilherme. Tornando-se a força<br />
motriz <strong>da</strong> história (espécie <strong>de</strong><br />
pequena “metteuse en scène”), é<br />
também a personagem mais<br />
enigmática - nela coexistem a<br />
candura e a perversi<strong>da</strong><strong>de</strong>, mas as<br />
doses <strong>de</strong> uma e <strong>de</strong> outra coisa são<br />
cui<strong>da</strong>dosamente camufla<strong>da</strong>s.<br />
Gostar <strong>da</strong>s personagens também<br />
implica respeitar-lhes o mistério. E,<br />
inevitavelmente, gostar dos actores.<br />
Dos secundários (a florista <strong>de</strong><br />
Cristina Alfaiate, o “espanhol” <strong>de</strong><br />
Vítor Correia) ao quarteto <strong>de</strong><br />
“copas”: a adolescente <strong>de</strong> Rita<br />
Martins é impecável, Filipe Duarte<br />
dá ao seu segurança <strong>de</strong> centro<br />
comercial o tom <strong>de</strong>vi<strong>da</strong>mente<br />
“sacudido” (ora por uma mulher ora<br />
por outra), João Lagarto empresta à<br />
sua personagem uma irrepreensível<br />
digni<strong>da</strong><strong>de</strong> apar<strong>da</strong>la<strong>da</strong>, e Margari<strong>da</strong><br />
Marinho tem os modos cansados e<br />
vagamente assustados <strong>da</strong> Eleonora<br />
Rossi Drago dos filmes <strong>de</strong> Zurlini.<br />
Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 33
Cinema<br />
Ca<strong>de</strong>n Cotard, um papel à medi<strong>da</strong><br />
do enorme Philip Seymour Hoffman<br />
Os limites<br />
do controlo<br />
A estreia <strong>da</strong> realização<br />
do argumentista <strong>de</strong> “O<br />
Despertar <strong>da</strong> Mente” e<br />
“Queres Ser John Malkovich”<br />
é um filme <strong>de</strong>sequilibrado<br />
mas perturbante sobre o<br />
terror do quotidiano.<br />
Jorge Mourinha<br />
Sinédoque, Nova Iorque<br />
Synecdoche, New York<br />
De Charlie Kaufman,<br />
com Philip Seymour Hoffman,<br />
Catherine Keener, Sadie Goldstein.<br />
M/12<br />
MMMnn<br />
<strong>Lisboa</strong>: Me<strong>de</strong>ia Monumental: Sala 1: 5ª 6ª Sábado<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 14h30, 17h, 19h30, 22h, 00h30;<br />
UCI Cinemas - El Corte Inglés: Sala 12: 5ª 6ª<br />
Sábado 2ª 3ª 4ª 14h05, 16h40, 19h15, 21h50,<br />
00h25 Domingo 11h30, 14h05, 16h40, 19h15, 21h50,<br />
00h25<br />
A história do cinema está cheia <strong>de</strong><br />
argumentistas que se <strong>de</strong>cidiram a<br />
passar à realização, com resultados<br />
bastante variáveis. Charlie Kaufman,<br />
um dos mais inventivos e originais<br />
argumentistas americanos<br />
contemporâneos, não é excepção a<br />
essa regra, embora no seu caso a<br />
coisa tenha sido um pouco mais<br />
aci<strong>de</strong>ntal: “Sinédoque, Nova Iorque”<br />
começou vi<strong>da</strong> como um projecto <strong>de</strong><br />
filme <strong>de</strong> terror para a Columbia que<br />
<strong>de</strong>veria ser realizado por Spike<br />
Jonze, o realizador-alma gémea que<br />
filmara “Queres Ser John<br />
Malkovich?” e “Ina<strong>da</strong>ptado.” Mas o<br />
34 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon<br />
Espaço<br />
Público<br />
Disse, à mesa do jantar,<br />
com uma “coragem”<br />
inusita<strong>da</strong><br />
- Sabem que filme fui<br />
ver?... “Brüno”...<br />
- Ah!...<br />
- É quase como “Os<br />
Malucos do Riso”, tem<br />
pia<strong>da</strong>s bem consegui<strong>da</strong>s,<br />
outras menos bem<br />
consegui<strong>da</strong>s. Não me ri <strong>de</strong><br />
tudo...<br />
Aliás (isto não disse), no<br />
lugar do riso até tive medo<br />
porque a consciência<br />
atirava-me, <strong>de</strong> vez em<br />
que era suposto ser um filme <strong>de</strong><br />
género transformou-se durante a<br />
escrita noutra coisa, muito mais<br />
“kaufmaniana” mas também muito<br />
mais inclassificável. E Jonze, retido<br />
na produção conturba<strong>da</strong> <strong>de</strong> “O Sítio<br />
<strong>da</strong>s Coisas Selvagens”, sugeriu ao<br />
amigo que fosse ele próprio a<br />
realizar o que, sem ser um filme <strong>de</strong><br />
terror, é um filme sobre o terror -<br />
sobre o terror <strong>de</strong> morrer, sobre o<br />
terror <strong>de</strong> passar pela vi<strong>da</strong> sem <strong>de</strong>ixar<br />
marca, sobre o terror <strong>da</strong> irrelevância<br />
e do fracasso e <strong>da</strong> sensação <strong>de</strong><br />
termos <strong>de</strong>sperdiçado o nosso tempo<br />
neste mundo.<br />
É esse terror que persegue<br />
quotidianamente o encenador<br />
teatral Ca<strong>de</strong>n Cotard (papel à<br />
medi<strong>da</strong> do enorme Philip Seymour<br />
Hoffman), neurótico, inseguro,<br />
hipocondríaco, aprisionado num<br />
corpo em lenta <strong>de</strong>composição mas<br />
também num casamento que se<br />
<strong>de</strong>sintegra em lume brando, que<br />
recebe do na<strong>da</strong> uma bolsa <strong>de</strong><br />
mecenato cultural e <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> investi-la<br />
na criação <strong>da</strong> peça teatral para<br />
acabar com to<strong>da</strong>s as peças teatrais.<br />
Um simulacro que se <strong>de</strong>senrole em<br />
tempo real, tal como a vi<strong>da</strong>, num<br />
enorme armazém abandonado que<br />
se transforma numa ci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong>ntro<br />
<strong>da</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong> à medi<strong>da</strong> que a obra<br />
monumental <strong>de</strong> Ca<strong>de</strong>n vai ganhando<br />
corpo e estrutura - mas que, ao fim<br />
<strong>de</strong> 17 anos, continua em ensaios e<br />
ain<strong>da</strong> não foi mostra<strong>da</strong> ao público, e<br />
que se transforma progressivamente<br />
num espelho <strong>da</strong> própria vi<strong>da</strong><br />
amargura<strong>da</strong> do encenador que tanto<br />
quis ser alguém que se resumiu<br />
progressivamente ao anonimato.<br />
Des<strong>de</strong> a compactação <strong>de</strong> 25 anos<br />
<strong>de</strong> narrativa numa espécie <strong>de</strong> único<br />
longo dia on<strong>de</strong> Ca<strong>de</strong>n vai<br />
envelhecendo e rejuvenescendo<br />
consoante as necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong><br />
história até ao vertiginoso e<br />
infindável jogo <strong>de</strong> espelhos entre a<br />
vi<strong>da</strong> e a arte, passando pela casa que<br />
está permanentemente em fogo ou<br />
pela capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> tornar o surreal<br />
estranhamente credível, percebe-se<br />
rapi<strong>da</strong>mente que nenhum outro<br />
autor contemporâneo po<strong>de</strong>ria<br />
ter escrito “Sinédoque,<br />
Nova Iorque”. Mas ser um<br />
argumentista <strong>de</strong><br />
excepção não implica ser<br />
um gran<strong>de</strong> realizador, e<br />
o que sobra em talento<br />
<strong>de</strong> escrita a Kaufman<br />
falta-lhe em capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
visualização. Kaufman não<br />
tem o talento <strong>de</strong> Spike Jonze<br />
e Michel Gondry para construir<br />
um universo visual em imagens e<br />
limita-se a ilustrar aplica<strong>da</strong> e<br />
fielmente as palavras que<br />
escreveu, <strong>de</strong>ixando<br />
“Sinédoque, Nova Iorque”<br />
tombar numa espiral<br />
claustrofóbica que<br />
nenhum rasgo visual vem<br />
aligeirar. Esse lado <strong>de</strong><br />
“teatro filmado” não <strong>de</strong>ixa<br />
<strong>de</strong> ser a<strong>de</strong>quado a um<br />
filme que vai muito<br />
lentamente<br />
contaminando uma<br />
reali<strong>da</strong><strong>de</strong> reconhecível<br />
com uma série <strong>de</strong><br />
“non-sequiturs”<br />
tão absurdos<br />
quanto<br />
arrepiantes,<br />
mas não<br />
impe<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
sentirmos<br />
que faz<br />
aqui<br />
falta<br />
uma<br />
quando, <strong>da</strong> sala do<br />
cinema lá para fora... e os<br />
preconceitos mantêm-se.<br />
Voltando ao jantar (ou<br />
seja, à reali<strong>da</strong><strong>de</strong>), disse:<br />
- O que o filme preten<strong>de</strong> é<br />
<strong>de</strong>smontar o estereótipo<br />
do “gay” <strong>de</strong> tanto o<br />
montar/mostrar... O filme<br />
quer mostrar que nem<br />
todos os gays são assim...<br />
Mas fui interrompido pelo<br />
A.:<br />
- Mas são.<br />
Este “mas são” foi forte,<br />
foi taxativo, fez-me dizer<br />
espécie <strong>de</strong> válvula <strong>de</strong> escape - como<br />
se Kaufman tivesse, ele próprio,<br />
<strong>de</strong>ixado contagiar-se pela espiral<br />
neurótica <strong>de</strong> Ca<strong>de</strong>n e se mostrasse<br />
incapaz <strong>de</strong> lhe escapar, como se a<br />
sua necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> controlar ca<strong>da</strong><br />
um dos elementos <strong>de</strong>sta metanarrativa<br />
<strong>de</strong>sdobra<strong>da</strong> esbarrasse na<br />
sua impossibili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> o fazer<br />
constantemente. Querer ser<br />
<strong>de</strong>miurgo tem <strong>de</strong>stas coisas.<br />
Blood: O Último Vampiro<br />
Blood: The Last Vampire<br />
De Chris Nahon,<br />
com Allison Miller, Liam<br />
Cunningham, Jun Gianna. M/12<br />
a<br />
“alguns”... e voltar ao<br />
silêncio ... às vezes não me<br />
apetece armar discussões<br />
(ao contrário <strong>de</strong> Pasolini,<br />
que odiava a pacificação,<br />
ou <strong>de</strong> Brüno que também a<br />
o<strong>de</strong>ia), sobretudo quando<br />
o jantar está a correr<br />
bem...<br />
- Mas são. Mas são.<br />
A ignorância é sempre<br />
taxativa, é atrevi<strong>da</strong>. E o<br />
filme tornou-se real... O<br />
que havemos <strong>de</strong> fazer?...<br />
Nelson Ban<strong>de</strong>ira,<br />
<strong>de</strong>sempregado, Porto<br />
<strong>Lisboa</strong>: CinemaCity Alegro Alfragi<strong>de</strong>: Sala 5: 5ª 6ª<br />
2ª 3ª 4ª 13h40, 15h35, 17h45, 19h40, 21h45, 23h55<br />
Sábado Domingo 11h50, 13h40, 15h35, 17h45,<br />
19h40, 21h45, 23h55; UCI Dolce Vita Tejo: Sala 1: 5ª<br />
6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h55, 15h55, 17h55,<br />
19h55, 21h55, 00h05; ZON Lusomundo Alvaláxia:<br />
5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h40, 16h,<br />
18h30, 21h50, 24h; ZON Lusomundo Alma<strong>da</strong><br />
Fórum: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50,<br />
15h10, 17h30, 21h40, 00h05<br />
Porto: Arrábi<strong>da</strong> 20: Sala 18: 5ª 6ª Sábado<br />
Domingo 2ª 13h45, 15h55, 18h05, 20h15, 22h25,<br />
00h35 3ª 4ª 15h55, 18h05, 20h15, 22h25, 00h35<br />
Nominalmente, “Blood: O Último<br />
Vampiro” é um “remake” <strong>de</strong> imagem<br />
real <strong>da</strong> animação <strong>de</strong> culto que<br />
Hiroyuki Kitakubo<br />
dirigiu em<br />
2000 a<br />
partir<br />
O “remake” <strong>da</strong> animação <strong>de</strong> culto<br />
<strong>de</strong> Hiroyuki Kitakubo é in<strong>de</strong>scritivelmente mau<br />
<strong>de</strong> um conceito <strong>de</strong> Mamoru “Ghost<br />
in the Shell” Oshii, sobre uma<br />
samurai teenager imortal caçadora<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>mónios por conta <strong>de</strong> uma<br />
agência super-secreta. Não foi, à<br />
altura, outro “Akira”, mas bastou<br />
para que, quase <strong>de</strong>z anos <strong>de</strong>pois, o<br />
francês Chris Nahon (“O Beijo Mortal<br />
do Dragão”) se abalance a esta<br />
a<strong>da</strong>ptação malfa<strong>da</strong><strong>da</strong> a meio<br />
caminho entre o filme <strong>de</strong> terror e a<br />
aventura <strong>de</strong> artes marciais. E<br />
malfa<strong>da</strong><strong>da</strong> porque vale tudo ? <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />
alguns bons combates <strong>de</strong> kung-fu<br />
coreografados por Cory Yuen a<br />
alguns dos piores efeitos especiais<br />
que já vimos, passando por um<br />
inspiradíssimo <strong>de</strong>sign visual (parte<br />
“Bla<strong>de</strong> Runner”-retro-”trash”, parte<br />
exotismo <strong>de</strong> pechisbeque BD), por<br />
alguns dos mais inexplicavelmente<br />
frenéticos movimentos <strong>de</strong> câmara<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> as gruas loucas <strong>de</strong> “Amália” e<br />
pela completa ausência <strong>de</strong> lógica<br />
narrativa ou mesmo <strong>de</strong> simples<br />
história. “Blood” é<br />
in<strong>de</strong>scritivelmente mau ? e não<br />
<strong>de</strong>ntro <strong>da</strong> estética tão-mau-que-ébom.<br />
J.M.<br />
Continuam<br />
Up - Altamente<br />
+ Parcialmente Nublado<br />
Up<br />
De Pete Docter,<br />
com Edward Asner (Voz),<br />
Christopher Plummer (Voz),<br />
Jor<strong>da</strong>n Nagai (Voz). M/4<br />
MMMMn<br />
<strong>Lisboa</strong>: Castello Lopes - Cascais Villa: Sala 5: 5ª<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 13h, 15h10, 17h20, 19h30,<br />
21h40 (V.Port.) 6ª Sábado 13h, 15h10, 17h20,<br />
19h30, 21h40, 23h50 (V.Port.); Castello Lopes -<br />
Londres: Sala 1: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 14h,<br />
16h30, 19h, 21h45 (V.Port.) 6ª Sábado 14h,<br />
16h30, 19h, 21h45, 24h (V.Port.); Castello<br />
Lopes - Loures Shopping: Sala 5: 5ª 6ª<br />
Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h45, 14h50,<br />
17h, 19h10, 21h20, 23h30 (V.Port./3D);<br />
CinemaCity Alegro Alfragi<strong>de</strong>: Sala 2: 5ª 6ª<br />
Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 11h30, 13h45,<br />
16h, 18h15, 21h30, 23h45 (V.Port.); CinemaCity<br />
Beloura Shopping: Sala 2: 5ª 6ª Sábado<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 11h35, 13h55, 16h10, 18h35,<br />
21h35, 23h50 (V.Port./3D); CinemaCity Campo<br />
Pequeno Praça <strong>de</strong> Touros: Sala 3: 5ª 6ª Sábado<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 11h30, 13h50, 16h15, 18h40,<br />
21h35, 23h55 (V.Port./3D); Me<strong>de</strong>ia Fonte Nova:<br />
Sala 3: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />
14h10, 16h30, 19h, 21h30 (V.Port.); Me<strong>de</strong>ia<br />
Sal<strong>da</strong>nha Resi<strong>de</strong>nce: Sala 5: 5ª 6ª Sábado<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 13h, 15h05, 17h10, 19h15,<br />
21h20, 23h30 (V.Port./3D); Me<strong>de</strong>ia Sal<strong>da</strong>nha<br />
Resi<strong>de</strong>nce: Sala 6: 5ª 6ª Sábado<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 13h45, 15h45,<br />
17h50, 19h55, 22h, 24h; UCI<br />
Cinemas - El Corte<br />
Inglés:<br />
Sala 5: 5ª<br />
6ª Sábado 2ª<br />
3ª 4ª 14h10, 16h45,<br />
19h05, 22h, 00h15 Domingo<br />
11h30, 14h10, 16h45, 19h05, 22h,<br />
00h15; UCI Cinemas - El Corte<br />
Inglés: Sala 6: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª<br />
4ª 14h15, 16h30, 18h50, 21h15, 23h30 (V.<br />
Port./3D) Domingo 11h30, 14h15, 16h30, 18h50,<br />
21h15, 23h30 (V.Port./3D); UCI Dolce Vita Tejo:<br />
Sala 3: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 14h, 16h20,<br />
18h55, 21h35, 23h55 (V.Port.) Domingo 11h30,<br />
14h, 16h20, 18h55, 21h35, 23h55 (V.Port.); ZON<br />
Lusomundo Alvaláxia: 5ª 6ª Sábado Domingo<br />
2ª 3ª 4ª 14h10, 16h30, 18h45, 21h20, 23h40;<br />
ZON Lusomundo Alvaláxia: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª<br />
13h25, 15h45, 18h10, 21h, 23h15 (V.Port./3D)
“Up - Altamente”, um dos gran<strong>de</strong>s filmes do ano<br />
Sábado Domingo 11h, 13h25, 15h45, 18h10, 21h,<br />
23h15 (V.Port./3D); ZON Lusomundo Amoreiras: 5ª<br />
6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h, 15h30, 18h20, 21h20,<br />
23h40 (V.Port./3D) Domingo 11h, 13h, 15h30, 18h20,<br />
21h20, 23h40 (V.Port./3D); ZON Lusomundo<br />
CascaiShopping: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h20,<br />
16h, 18h30, 21h30, 23h50 (V.Port.) Domingo 11h,<br />
13h20, 16h, 18h30, 21h30, 23h50 (V.Port.); ZON<br />
Lusomundo Colombo: 5ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h05,<br />
15h30, 17h55, 21h45, 00h10 (V.Port./3D) 6ª 13h05,<br />
15h30, 00h10 (V.Port./3D) Domingo 11h, 13h05,<br />
15h30, 17h55, 21h45, 00h10 (V.Port./3D); ZON<br />
Lusomundo Colombo: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª<br />
3ª 4ª 13h15, 15h40, 18h15, 21h20, 23h45 (V.Port.);<br />
ZON Lusomundo Dolce Vita Miraflores: 5ª 6ª<br />
Sábado 2ª 3ª 4ª 15h10, 17h30, 19h40, 21h50, 24h<br />
(V.Port.) Domingo 11h, 15h10, 17h30, 19h40, 21h50,<br />
24h (V.Port.); ZON Lusomundo Odivelas Parque:<br />
5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h10, 15h20, 17h50,<br />
21h10, 23h30 (V.Port.) Domingo 11h, 13h10,<br />
15h20, 17h50, 21h10, 23h30 (V.Port.);<br />
ZON Lusomundo Oeiras Parque:<br />
5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h,<br />
15h20, 18h, 21h, 23h40<br />
(V.Port.) Domingo<br />
10h40, 13h, 15h20, 18h,<br />
21h, 23h40 (V.Port.); ZON<br />
Lusomundo Torres<br />
Vedras: 5ª 6ª Sábado<br />
2ª 3ª 4ª 13h30, 15h50,<br />
18h20, 21h15, 23h40 (V.<br />
Port./3D) Domingo 11h, 13h30,<br />
15h50, 18h20, 21h15, 23h40 (V.Port./3D);<br />
ZON Lusomundo Vasco <strong>da</strong> Gama: 5ª 6ª<br />
Sábado 2ª 3ª 4ª 13h05, 15h15, 17h30, 19h40,<br />
21h50, 23h55 (V.Port./3D) Domingo 11h, 13h05,<br />
15h15, 17h30, 19h40, 21h50, 23h55 (V.Port./3D);<br />
Auditório Charlot: Sala 1: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 21h30 (V.<br />
Port.) Sábado Domingo 16h, 21h30 (V.Port.);<br />
Castello Lopes - C. C. Jumbo: Sala 1: 5ª 2ª 3ª 4ª<br />
15h10, 17h20, 19h30, 21h40 6ª 15h10, 17h20, 19h30,<br />
21h40, 23h50 Sábado 13h, 15h10, 17h20, 19h30,<br />
21h40, 23h50 Domingo 13h, 15h10, 17h20, 19h30,<br />
21h40; Castello Lopes - Fórum Barreiro: Sala 1: 5ª<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50, 15h10, 17h10, 19h30,<br />
21h40 (V.Port./3D) 6ª Sábado 12h50, 15h10, 17h10,<br />
19h30, 21h40, 23h50 (V.Port./3D); Castello Lopes -<br />
Rio Sul Shopping: Sala 4: 5ª 6ª Sábado Domingo<br />
2ª 3ª 4ª 12h50, 15h10, 17h15, 19h20, 21h25, 23h40<br />
(V.Port./3D); UCI Freeport: Sala 1: 5ª 2ª 3ª 4ª<br />
15h45, 18h30, 21h10 (V.Port.) 6ª 15h45, 18h30, 21h10,<br />
23h30 (V.Port.) Sábado 13h30, 15h45, 18h30, 21h10,<br />
23h30 (V.Port.) Domingo 13h30, 15h45, 18h30, 21h10<br />
(V.Port.); ZON Lusomundo Alma<strong>da</strong> Fórum: 5ª 6ª<br />
Sábado 2ª 3ª 4ª 13h10, 15h35, 18h, 21h30, 23h55 (V.<br />
Port./3D) Domingo 10h50, 13h10, 15h35, 18h, 21h30,<br />
23h55 (V.Port./3D); ZON Lusomundo Alma<strong>da</strong><br />
Fórum: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h20, 16h, 18h25,<br />
21h, 23h30 (V.Port.) Domingo 11h, 13h20, 16h, 18h25,<br />
21h, 23h30 (V.Port.); ZON Lusomundo Fórum<br />
Montijo: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h35, 16h15,<br />
18h45, 21h15, 23h50 (V.Port./3D) Domingo 11h,<br />
13h35, 16h15, 18h45, 21h15, 23h50 (V.Port./3D)<br />
Porto: Arrábi<strong>da</strong> 20: Sala 1: 5ª Sábado Domingo 2ª<br />
13h35, 15h45, 17h55, 20h05, 22h15, 00h30 (V.<br />
Port./3D) 6ª 13h35, 15h45, 17h55, 20h05, 00h30 (V.<br />
Port./3D) 3ª 4ª 15h45, 17h55, 20h05, 22h15, 00h30<br />
(V.Port./3D); Arrábi<strong>da</strong> 20: Sala 12: 5ª 6ª Sábado<br />
Domingo 2ª 14h10, 16h35, 19h, 21h30, 00h05 3ª 4ª<br />
16h35, 19h, 21h30, 00h05; Cinemax - Cinema <strong>da</strong><br />
Praça : Sala 1: 5ª 2ª 3ª 4ª 15h30, 21h45 (V.Port.)<br />
6ª 15h30, 21h45, 23h55 (V.Port.) Sábado 15h, 17h30,<br />
21h45, 23h55 (V.Port.) Domingo 15h, 17h30, 21h45<br />
(V.Port.); Cinemax - Penafiel: Sala 2: 5ª 2ª 3ª 4ª<br />
15h30, 21h50 (V.Port.) 6ª 15h30, 21h50, 23h55 (V.<br />
Port.) Sábado 15h, 17h30, 21h50, 23h55 (V.Port.)<br />
Domingo 15h, 17h30, 21h50 (V.Port.); Me<strong>de</strong>ia Ci<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
do Porto: Sala 2: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />
13h40, 15h40, 17h40, 19h45, 21h50 (V.Port.); ZON<br />
Lusomundo Dolce Vita Porto: 5ª 6ª Sábado<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50, 15h10, 17h45, 20h10,<br />
22h35 (V.Port.); ZON Lusomundo Dolce Vita Porto:<br />
5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h40, 16h, 18h40, 21h20,<br />
23h50 (V.Port./3D) Domingo 11h, 13h40, 16h, 18h40,<br />
21h20, 23h50 (V.Port./3D); ZON Lusomundo Ferrara<br />
Plaza: 5ª 2ª 3ª 4ª 15h, 17h15, 19h30, 21h40 (V.<br />
Port./3D) 6ª Sábado 15h, 17h15, 19h30, 21h40, 24h<br />
(V.Port./3D) Domingo 11h10, 15h, 17h15, 19h30,<br />
21h40 (V.Port./3D); ZON Lusomundo GaiaShopping:<br />
5ª 2ª 3ª 4ª 13h, 15h20, 18h, 21h30 (V.Port./3D) 6ª<br />
13h, 15h20, 18h, 21h30, 23h50 (V.Port./3D) Sábado<br />
10h50, 13h, 15h20, 18h, 21h30, 23h50 (V.Port./3D)<br />
Domingo 10h50, 13h, 15h20, 18h, 21h30 (V.Port./3D);<br />
ZON Lusomundo MaiaShopping: 5ª 2ª 3ª 4ª<br />
13h15, 16h, 18h45, 21h20 (V.Port./3D) 6ª Sábado<br />
13h15, 16h, 18h45, 21h20, 23h30 (V.Port./3D)<br />
Domingo 10h50, 13h15, 16h, 18h45, 21h20 (V.<br />
Port./3D); ZON Lusomundo Marshopping: 5ª 6ª<br />
Sábado 2ª 3ª 4ª 13h20, 15h40, 18h, 21h20, 23h50<br />
(V.Port./3D) Domingo 10h50, 13h20, 15h40, 18h,<br />
21h20, 23h50 (V.Port./3D); ZON Lusomundo<br />
NorteShopping: 5ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />
12h40, 15h, 17h20, 19h40, 22h10, 00h40 (V.<br />
Port./3D) 6ª 13h30, 16h10, 19h40, 23h (V.Port./3D);<br />
ZON Lusomundo NorteShopping: 5ª 2ª 3ª 4ª<br />
13h40, 16h10, 18h40, 21h10, 23h50 (V.Port.) 6ª<br />
12h50, 15h20, 18h, 21h10, 23h50 (V.Port.) Sábado<br />
Domingo 11h, 13h40, 16h10, 18h40, 21h10, 23h50<br />
(V.Port.); ZON Lusomundo Parque Nascente: 5ª 6ª<br />
Sábado 2ª 3ª 4ª 13h10, 15h40, 18h10, 20h40,<br />
23h10 (V.Port.) Domingo 10h50, 13h10, 15h40,<br />
18h10, 20h40, 23h10 (V.Port.); ZON Lusomundo<br />
Parque Nascente: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 13h35, 16h10,<br />
18h50, 21h35, 00h10 (V.Port.) Sábado Domingo 11h,<br />
13h35, 16h10, 18h50, 21h35, 00h10 (V.Port.); Castello<br />
Lopes - 8ª Aveni<strong>da</strong>: Sala 2: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 15h10,<br />
17h20, 19h30, 21h40, 23h50 (V.Port./3D) Sábado<br />
Domingo 13h, 15h10, 17h20, 19h30, 21h40, 23h50<br />
(V.Port./3D); ZON Lusomundo Fórum Aveiro: 5ª 6ª<br />
Sábado 2ª 3ª 4ª 13h20, 16h05, 18h50, 21h35,<br />
00h25 (V.Port.) Domingo 10h40, 13h20, 16h05,<br />
18h50, 21h35, 00h25 (V.Port.); ZON Lusomundo<br />
Glicínias: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h40, 16h25,<br />
19h10, 21h55, 00h40 (V.Port./3D) Domingo 10h50,<br />
13h40, 16h25, 19h10, 21h55, 00h40 (V.Port./3D);<br />
Comecemos por eliminar a variável<br />
3-D, porque reduzir a décima longa<br />
<strong>da</strong> Pixar ao “truque” visual é passar<br />
ao lado <strong>da</strong> essência <strong>da</strong> produção do<br />
estúdio <strong>de</strong> John Lasseter: a sua<br />
atenção quase maníaca à narrativa<br />
e à emoção. É isso que explica<br />
porque é que “Altamente” confirma<br />
o “<strong>de</strong>svio” encetado em 2006 por<br />
“Carros”, em direcção a um<br />
horizonte on<strong>de</strong> estamos a falar <strong>de</strong><br />
cinema, em abstracto e absoluto, e<br />
não <strong>de</strong> animação: o “herói” <strong>de</strong><br />
“Altamente” é um viúvo rezingão e<br />
misantropo que se vê empurrado<br />
pelo <strong>de</strong>stino a entrar na aventura <strong>da</strong><br />
sua vi<strong>da</strong>. Só que, para lá chegar,<br />
Pete Docter (parte do quadro<br />
fun<strong>da</strong>dor do estúdio e realizador <strong>de</strong><br />
“Monstros & Cª”) segue um dos<br />
caminhos mais enviesados que<br />
vimos nos últimos anos, arrancando<br />
como melodrama clássico sobre um<br />
homem que já na<strong>da</strong> espera <strong>da</strong> vi<strong>da</strong><br />
para alternar em segui<strong>da</strong> uma<br />
aventura exótica saí<strong>da</strong> dos “serials”<br />
e <strong>da</strong>s séries B dos anos 30 com um<br />
lado <strong>de</strong> humor absurdo e alienígena<br />
muito próximo <strong>da</strong> estética dos<br />
Looney Tunes. As amplitu<strong>de</strong>s<br />
térmicas são <strong>de</strong>masiado<br />
abrangentes para conseguirem ser<br />
negocia<strong>da</strong>s sem o tropeção<br />
ocasional, mas não impe<strong>de</strong>m que<br />
“Altamente” seja um dos gran<strong>de</strong>s<br />
filmes do ano. J.M.<br />
aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />
Inimigos Públicos<br />
Public Enemies<br />
De Michael Mann,<br />
com Johnny Depp, Billy Crudup,<br />
Marion Cotillard, Christian Bale.<br />
M/16<br />
MMMnn<br />
<strong>Lisboa</strong>: Castello Lopes - Cascais Villa: Sala 3: 5ª<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50, 15h45, 18h40, 21h30 6ª<br />
Sábado 12h50, 15h45, 18h40, 21h30, 00h20; Castello<br />
Lopes - Londres: Sala 2: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª<br />
13h15, 16h, 18h45, 21h30 6ª Sábado 13h15, 16h,<br />
18h45, 21h30, 00h15; Castello Lopes - Loures<br />
Shopping: Sala 2: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª<br />
4ª 12h40, 15h20, 18h40, 21h30, 00h10; CinemaCity<br />
Alegro Alfragi<strong>de</strong>: Sala 3: 5ª 6ª Sábado Domingo<br />
2ª 3ª 4ª 18h45, 21h35, 00h25; CinemaCity Beloura<br />
Shopping: Sala 4: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª<br />
4ª 13h30, 16h35, 21h30, 00h20; CinemaCity<br />
Campo Pequeno Praça <strong>de</strong> Touros: Sala 2: 5ª 6ª<br />
Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h40, 16h30, 21h30,<br />
00h20; CinemaCity Classic Alvala<strong>de</strong>: Sala 4: 5ª<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 13h45, 16h35, 21h30 6ª Sábado<br />
13h45, 16h35, 21h30, 00h20; Me<strong>de</strong>ia Fonte<br />
Nova: Sala 1: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª<br />
3ª 4ª 14h30, 18h15, 22h; Me<strong>de</strong>ia<br />
Monumental: Sala 4 - Cine Teatro: 5ª 6ª Sábado<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 13h50, 16h30, 19h10, 21h50,<br />
00h20; UCI Cinemas - El Corte Inglés: Sala 13: 5ª 6ª<br />
Sábado 2ª 3ª 4ª 15h, 18h10, 21h30, 00h20<br />
Domingo 11h30, 15h, 18h10, 21h30, 00h20; UCI<br />
Dolce Vita Tejo: Sala 10: 5ª 6ª Sábado Domingo<br />
2ª 3ª 4ª 14h55, 18h, 21h35, 00h25; ZON<br />
Lusomundo Alvaláxia: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª<br />
3ª 4ª 13h35, 16h40, 21h15, 00h15; ZON<br />
Lusomundo Amoreiras: 5ª 6ª Sábado<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 13h50, 17h, 21h,<br />
24h; ZON Lusomundo<br />
CascaiShopping: 5ª 6ª Sábado<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 13h40, 17h, 21h,<br />
24h; ZON Lusomundo Colombo: 5ª<br />
6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />
13h30, 16h50, 21h10, 00h20; ZON<br />
Lusomundo Odivelas Parque: 5ª<br />
6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />
13h, 16h30, 21h, 24h; ZON<br />
Lusomundo Oeiras Parque:<br />
5ª 6ª Sábado Domingo 2ª<br />
3ª 4ª 12h35, 15h30, 18h25,<br />
21h20, 00h15; ZON<br />
Lusomundo Torres<br />
Vedras: 5ª 6ª<br />
Sábado Domingo<br />
2ª 3ª 4ª 13h50,<br />
17h40, 21h, 00h05; ZON Lusomundo Vasco <strong>da</strong><br />
Gama: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h15,<br />
16h15, 21h10, 00h05; Castello Lopes - Rio Sul<br />
Shopping: Sala 3: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª<br />
4ª 12h45, 15h40, 18h35, 21h20, 00h15; UCI Freeport:<br />
Sala 3: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 15h15, 18h10, 21h15 6ª<br />
Sábado 15h15, 18h10, 21h15, 00h10; ZON Lusomundo<br />
Alma<strong>da</strong> Fórum: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />
15h, 18h05, 21h10, 00h20; ZON Lusomundo Fórum<br />
Montijo: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h20,<br />
17h, 21h10, 00h05<br />
Porto: Me<strong>de</strong>ia Ci<strong>da</strong><strong>de</strong> do Porto: Sala 1: 5ª 6ª<br />
Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h45, 16h40, 19h20,<br />
22h; ZON Lusomundo Dolce Vita Porto: 5ª 6ª<br />
Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h10, 16h20, 21h10,<br />
00h15; ZON Lusomundo GaiaShopping: 5ª<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 14h30, 18h10, 21h10 6ª Sábado<br />
14h30, 18h10, 21h10, 00h25; ZON Lusomundo<br />
MaiaShopping: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 13h50,<br />
17h10, 21h10 6ª Sábado 13h50, 17h10, 21h10, 00h30;<br />
ZON Lusomundo Marshopping: 5ª 6ª Sábado<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 14h10, 17h40, 21h10, 00h20;<br />
ZON Lusomundo NorteShopping: 5ª 6ª Sábado<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 14h30, 17h50, 21h20, 00h30;<br />
ZON Lusomundo Parque Nascente: 5ª 6ª Sábado<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 13h50, 17h10, 21h10, 00h20;<br />
Castello Lopes - 8ª Aveni<strong>da</strong>: Sala 3: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª<br />
15h30, 18h20, 21h10, 24h Sábado Domingo 12h40,<br />
15h30, 18h20, 21h10, 24h; ZON Lusomundo Fórum<br />
Aveiro: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 14h30, 17h50, 21h05<br />
6ª Sábado 14h30, 17h50, 21h05, 00h35; ZON<br />
Lusomundo Glicínias: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª<br />
3ª 4ª 14h30, 17h50, 21h10, 00h25<br />
Michael Mann, mestre do noir<br />
contemporâneo, poeta do<br />
existencialismo <strong>de</strong> género como só<br />
Melville soube ser no seu tempo,<br />
reinci<strong>de</strong> nos seus épicos miniaturais<br />
<strong>de</strong> polícias e ladrões com este olhar<br />
realista sobre a Chicago dos anos<br />
1930, período áureo do cinema <strong>de</strong><br />
“gangsters”, e sobre o breve reinado<br />
<strong>de</strong> John Dillinger. aqui retratado por<br />
um Johnny Depp que raramente<br />
teremos visto tão sóbrio. “Inimigos<br />
Públicos” é um filme<br />
inteligentíssimo (nem outra coisa<br />
seria <strong>de</strong> esperar), que propõe uma<br />
leitura intrigante do criminoso como<br />
anti-herói e explica que a obsessão<br />
mediática com a celebri<strong>da</strong><strong>de</strong>, afinal,<br />
já vem <strong>de</strong> trás. O mais notável,<br />
contudo, é mesmo o modo como<br />
“Inimigos Públicos” é uma espécie<br />
<strong>de</strong> “meta- narrativa” que faz<br />
um filme <strong>de</strong> acção<br />
sobre uma vi<strong>da</strong><br />
real que se<br />
imaginava<br />
como uma<br />
vi<strong>da</strong><br />
<strong>de</strong><br />
cinema.<br />
J.M.<br />
Raramente teremos visto Johnny Depp<br />
tão sóbrio como em “Inimigos Públicos”<br />
Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 35
“Up - Altamente”, um dos gran<strong>de</strong>s filmes do ano<br />
Sábado Domingo 11h, 13h25, 15h45, 18h10, 21h,<br />
23h15 (V.Port./3D); ZON Lusomundo Amoreiras: 5ª<br />
6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h, 15h30, 18h20, 21h20,<br />
23h40 (V.Port./3D) Domingo 11h, 13h, 15h30, 18h20,<br />
21h20, 23h40 (V.Port./3D); ZON Lusomundo<br />
CascaiShopping: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h20,<br />
16h, 18h30, 21h30, 23h50 (V.Port.) Domingo 11h,<br />
13h20, 16h, 18h30, 21h30, 23h50 (V.Port.); ZON<br />
Lusomundo Colombo: 5ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h05,<br />
15h30, 17h55, 21h45, 00h10 (V.Port./3D) 6ª 13h05,<br />
15h30, 00h10 (V.Port./3D) Domingo 11h, 13h05,<br />
15h30, 17h55, 21h45, 00h10 (V.Port./3D); ZON<br />
Lusomundo Colombo: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª<br />
3ª 4ª 13h15, 15h40, 18h15, 21h20, 23h45 (V.Port.);<br />
ZON Lusomundo Dolce Vita Miraflores: 5ª 6ª<br />
Sábado 2ª 3ª 4ª 15h10, 17h30, 19h40, 21h50, 24h<br />
(V.Port.) Domingo 11h, 15h10, 17h30, 19h40, 21h50,<br />
24h (V.Port.); ZON Lusomundo Odivelas Parque:<br />
5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h10, 15h20, 17h50,<br />
21h10, 23h30 (V.Port.) Domingo 11h, 13h10,<br />
15h20, 17h50, 21h10, 23h30 (V.Port.);<br />
ZON Lusomundo Oeiras Parque:<br />
5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h,<br />
15h20, 18h, 21h, 23h40<br />
(V.Port.) Domingo<br />
10h40, 13h, 15h20, 18h,<br />
21h, 23h40 (V.Port.); ZON<br />
Lusomundo Torres<br />
Vedras: 5ª 6ª Sábado<br />
2ª 3ª 4ª 13h30, 15h50,<br />
18h20, 21h15, 23h40 (V.<br />
Port./3D) Domingo 11h, 13h30,<br />
15h50, 18h20, 21h15, 23h40 (V.Port./3D);<br />
ZON Lusomundo Vasco <strong>da</strong> Gama: 5ª 6ª<br />
Sábado 2ª 3ª 4ª 13h05, 15h15, 17h30, 19h40,<br />
21h50, 23h55 (V.Port./3D) Domingo 11h, 13h05,<br />
15h15, 17h30, 19h40, 21h50, 23h55 (V.Port./3D);<br />
Auditório Charlot: Sala 1: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 21h30 (V.<br />
Port.) Sábado Domingo 16h, 21h30 (V.Port.);<br />
Castello Lopes - C. C. Jumbo: Sala 1: 5ª 2ª 3ª 4ª<br />
15h10, 17h20, 19h30, 21h40 6ª 15h10, 17h20, 19h30,<br />
21h40, 23h50 Sábado 13h, 15h10, 17h20, 19h30,<br />
21h40, 23h50 Domingo 13h, 15h10, 17h20, 19h30,<br />
21h40; Castello Lopes - Fórum Barreiro: Sala 1: 5ª<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50, 15h10, 17h10, 19h30,<br />
21h40 (V.Port./3D) 6ª Sábado 12h50, 15h10, 17h10,<br />
19h30, 21h40, 23h50 (V.Port./3D); Castello Lopes -<br />
Rio Sul Shopping: Sala 4: 5ª 6ª Sábado Domingo<br />
2ª 3ª 4ª 12h50, 15h10, 17h15, 19h20, 21h25, 23h40<br />
(V.Port./3D); UCI Freeport: Sala 1: 5ª 2ª 3ª 4ª<br />
15h45, 18h30, 21h10 (V.Port.) 6ª 15h45, 18h30, 21h10,<br />
23h30 (V.Port.) Sábado 13h30, 15h45, 18h30, 21h10,<br />
23h30 (V.Port.) Domingo 13h30, 15h45, 18h30, 21h10<br />
(V.Port.); ZON Lusomundo Alma<strong>da</strong> Fórum: 5ª 6ª<br />
Sábado 2ª 3ª 4ª 13h10, 15h35, 18h, 21h30, 23h55 (V.<br />
Port./3D) Domingo 10h50, 13h10, 15h35, 18h, 21h30,<br />
23h55 (V.Port./3D); ZON Lusomundo Alma<strong>da</strong><br />
Fórum: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h20, 16h, 18h25,<br />
21h, 23h30 (V.Port.) Domingo 11h, 13h20, 16h, 18h25,<br />
21h, 23h30 (V.Port.); ZON Lusomundo Fórum<br />
Montijo: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h35, 16h15,<br />
18h45, 21h15, 23h50 (V.Port./3D) Domingo 11h,<br />
13h35, 16h15, 18h45, 21h15, 23h50 (V.Port./3D)<br />
Porto: Arrábi<strong>da</strong> 20: Sala 1: 5ª Sábado Domingo 2ª<br />
13h35, 15h45, 17h55, 20h05, 22h15, 00h30 (V.<br />
Port./3D) 6ª 13h35, 15h45, 17h55, 20h05, 00h30 (V.<br />
Port./3D) 3ª 4ª 15h45, 17h55, 20h05, 22h15, 00h30<br />
(V.Port./3D); Arrábi<strong>da</strong> 20: Sala 12: 5ª 6ª Sábado<br />
Domingo 2ª 14h10, 16h35, 19h, 21h30, 00h05 3ª 4ª<br />
16h35, 19h, 21h30, 00h05; Cinemax - Cinema <strong>da</strong><br />
Praça : Sala 1: 5ª 2ª 3ª 4ª 15h30, 21h45 (V.Port.)<br />
6ª 15h30, 21h45, 23h55 (V.Port.) Sábado 15h, 17h30,<br />
21h45, 23h55 (V.Port.) Domingo 15h, 17h30, 21h45<br />
(V.Port.); Cinemax - Penafiel: Sala 2: 5ª 2ª 3ª 4ª<br />
15h30, 21h50 (V.Port.) 6ª 15h30, 21h50, 23h55 (V.<br />
Port.) Sábado 15h, 17h30, 21h50, 23h55 (V.Port.)<br />
Domingo 15h, 17h30, 21h50 (V.Port.); Me<strong>de</strong>ia Ci<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
do Porto: Sala 2: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />
13h40, 15h40, 17h40, 19h45, 21h50 (V.Port.); ZON<br />
Lusomundo Dolce Vita Porto: 5ª 6ª Sábado<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50, 15h10, 17h45, 20h10,<br />
22h35 (V.Port.); ZON Lusomundo Dolce Vita Porto:<br />
5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h40, 16h, 18h40, 21h20,<br />
23h50 (V.Port./3D) Domingo 11h, 13h40, 16h, 18h40,<br />
21h20, 23h50 (V.Port./3D); ZON Lusomundo Ferrara<br />
Plaza: 5ª 2ª 3ª 4ª 15h, 17h15, 19h30, 21h40 (V.<br />
Port./3D) 6ª Sábado 15h, 17h15, 19h30, 21h40, 24h<br />
(V.Port./3D) Domingo 11h10, 15h, 17h15, 19h30,<br />
21h40 (V.Port./3D); ZON Lusomundo GaiaShopping:<br />
5ª 2ª 3ª 4ª 13h, 15h20, 18h, 21h30 (V.Port./3D) 6ª<br />
13h, 15h20, 18h, 21h30, 23h50 (V.Port./3D) Sábado<br />
10h50, 13h, 15h20, 18h, 21h30, 23h50 (V.Port./3D)<br />
Domingo 10h50, 13h, 15h20, 18h, 21h30 (V.Port./3D);<br />
ZON Lusomundo MaiaShopping: 5ª 2ª 3ª 4ª<br />
13h15, 16h, 18h45, 21h20 (V.Port./3D) 6ª Sábado<br />
13h15, 16h, 18h45, 21h20, 23h30 (V.Port./3D)<br />
Domingo 10h50, 13h15, 16h, 18h45, 21h20 (V.<br />
Port./3D); ZON Lusomundo Marshopping: 5ª 6ª<br />
Sábado 2ª 3ª 4ª 13h20, 15h40, 18h, 21h20, 23h50<br />
(V.Port./3D) Domingo 10h50, 13h20, 15h40, 18h,<br />
21h20, 23h50 (V.Port./3D); ZON Lusomundo<br />
NorteShopping: 5ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />
12h40, 15h, 17h20, 19h40, 22h10, 00h40 (V.<br />
Port./3D) 6ª 13h30, 16h10, 19h40, 23h (V.Port./3D);<br />
ZON Lusomundo NorteShopping: 5ª 2ª 3ª 4ª<br />
13h40, 16h10, 18h40, 21h10, 23h50 (V.Port.) 6ª<br />
12h50, 15h20, 18h, 21h10, 23h50 (V.Port.) Sábado<br />
Domingo 11h, 13h40, 16h10, 18h40, 21h10, 23h50<br />
(V.Port.); ZON Lusomundo Parque Nascente: 5ª 6ª<br />
Sábado 2ª 3ª 4ª 13h10, 15h40, 18h10, 20h40,<br />
23h10 (V.Port.) Domingo 10h50, 13h10, 15h40,<br />
18h10, 20h40, 23h10 (V.Port.); ZON Lusomundo<br />
Parque Nascente: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 13h35, 16h10,<br />
18h50, 21h35, 00h10 (V.Port.) Sábado Domingo 11h,<br />
13h35, 16h10, 18h50, 21h35, 00h10 (V.Port.); Castello<br />
Lopes - 8ª Aveni<strong>da</strong>: Sala 2: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 15h10,<br />
17h20, 19h30, 21h40, 23h50 (V.Port./3D) Sábado<br />
Domingo 13h, 15h10, 17h20, 19h30, 21h40, 23h50<br />
(V.Port./3D); ZON Lusomundo Fórum Aveiro: 5ª 6ª<br />
Sábado 2ª 3ª 4ª 13h20, 16h05, 18h50, 21h35,<br />
00h25 (V.Port.) Domingo 10h40, 13h20, 16h05,<br />
18h50, 21h35, 00h25 (V.Port.); ZON Lusomundo<br />
Glicínias: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h40, 16h25,<br />
19h10, 21h55, 00h40 (V.Port./3D) Domingo 10h50,<br />
13h40, 16h25, 19h10, 21h55, 00h40 (V.Port./3D);<br />
Comecemos por eliminar a variável<br />
3-D, porque reduzir a décima longa<br />
<strong>da</strong> Pixar ao “truque” visual é passar<br />
ao lado <strong>da</strong> essência <strong>da</strong> produção do<br />
estúdio <strong>de</strong> John Lasseter: a sua<br />
atenção quase maníaca à narrativa<br />
e à emoção. É isso que explica<br />
porque é que “Altamente” confirma<br />
o “<strong>de</strong>svio” encetado em 2006 por<br />
“Carros”, em direcção a um<br />
horizonte on<strong>de</strong> estamos a falar <strong>de</strong><br />
cinema, em abstracto e absoluto, e<br />
não <strong>de</strong> animação: o “herói” <strong>de</strong><br />
“Altamente” é um viúvo rezingão e<br />
misantropo que se vê empurrado<br />
pelo <strong>de</strong>stino a entrar na aventura <strong>da</strong><br />
sua vi<strong>da</strong>. Só que, para lá chegar,<br />
Pete Docter (parte do quadro<br />
fun<strong>da</strong>dor do estúdio e realizador <strong>de</strong><br />
“Monstros & Cª”) segue um dos<br />
caminhos mais enviesados que<br />
vimos nos últimos anos, arrancando<br />
como melodrama clássico sobre um<br />
homem que já na<strong>da</strong> espera <strong>da</strong> vi<strong>da</strong><br />
para alternar em segui<strong>da</strong> uma<br />
aventura exótica saí<strong>da</strong> dos “serials”<br />
e <strong>da</strong>s séries B dos anos 30 com um<br />
lado <strong>de</strong> humor absurdo e alienígena<br />
muito próximo <strong>da</strong> estética dos<br />
Looney Tunes. As amplitu<strong>de</strong>s<br />
térmicas são <strong>de</strong>masiado<br />
abrangentes para conseguirem ser<br />
negocia<strong>da</strong>s sem o tropeção<br />
ocasional, mas não impe<strong>de</strong>m que<br />
“Altamente” seja um dos gran<strong>de</strong>s<br />
filmes do ano. J.M.<br />
aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />
Inimigos Públicos<br />
Public Enemies<br />
De Michael Mann,<br />
com Johnny Depp, Billy Crudup,<br />
Marion Cotillard, Christian Bale.<br />
M/16<br />
MMMnn<br />
<strong>Lisboa</strong>: Castello Lopes - Cascais Villa: Sala 3: 5ª<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50, 15h45, 18h40, 21h30 6ª<br />
Sábado 12h50, 15h45, 18h40, 21h30, 00h20; Castello<br />
Lopes - Londres: Sala 2: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª<br />
13h15, 16h, 18h45, 21h30 6ª Sábado 13h15, 16h,<br />
18h45, 21h30, 00h15; Castello Lopes - Loures<br />
Shopping: Sala 2: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª<br />
4ª 12h40, 15h20, 18h40, 21h30, 00h10; CinemaCity<br />
Alegro Alfragi<strong>de</strong>: Sala 3: 5ª 6ª Sábado Domingo<br />
2ª 3ª 4ª 18h45, 21h35, 00h25; CinemaCity Beloura<br />
Shopping: Sala 4: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª<br />
4ª 13h30, 16h35, 21h30, 00h20; CinemaCity<br />
Campo Pequeno Praça <strong>de</strong> Touros: Sala 2: 5ª 6ª<br />
Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h40, 16h30, 21h30,<br />
00h20; CinemaCity Classic Alvala<strong>de</strong>: Sala 4: 5ª<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 13h45, 16h35, 21h30 6ª Sábado<br />
13h45, 16h35, 21h30, 00h20; Me<strong>de</strong>ia Fonte<br />
Nova: Sala 1: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª<br />
3ª 4ª 14h30, 18h15, 22h; Me<strong>de</strong>ia<br />
Monumental: Sala 4 - Cine Teatro: 5ª 6ª Sábado<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 13h50, 16h30, 19h10, 21h50,<br />
00h20; UCI Cinemas - El Corte Inglés: Sala 13: 5ª 6ª<br />
Sábado 2ª 3ª 4ª 15h, 18h10, 21h30, 00h20<br />
Domingo 11h30, 15h, 18h10, 21h30, 00h20; UCI<br />
Dolce Vita Tejo: Sala 10: 5ª 6ª Sábado Domingo<br />
2ª 3ª 4ª 14h55, 18h, 21h35, 00h25; ZON<br />
Lusomundo Alvaláxia: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª<br />
3ª 4ª 13h35, 16h40, 21h15, 00h15; ZON<br />
Lusomundo Amoreiras: 5ª 6ª Sábado<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 13h50, 17h, 21h,<br />
24h; ZON Lusomundo<br />
CascaiShopping: 5ª 6ª Sábado<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 13h40, 17h, 21h,<br />
24h; ZON Lusomundo Colombo: 5ª<br />
6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />
13h30, 16h50, 21h10, 00h20; ZON<br />
Lusomundo Odivelas Parque: 5ª<br />
6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />
13h, 16h30, 21h, 24h; ZON<br />
Lusomundo Oeiras Parque:<br />
5ª 6ª Sábado Domingo 2ª<br />
3ª 4ª 12h35, 15h30, 18h25,<br />
21h20, 00h15; ZON<br />
Lusomundo Torres<br />
Vedras: 5ª 6ª<br />
Sábado Domingo<br />
2ª 3ª 4ª 13h50,<br />
17h40, 21h, 00h05; ZON Lusomundo Vasco <strong>da</strong><br />
Gama: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h15,<br />
16h15, 21h10, 00h05; Castello Lopes - Rio Sul<br />
Shopping: Sala 3: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª<br />
4ª 12h45, 15h40, 18h35, 21h20, 00h15; UCI Freeport:<br />
Sala 3: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 15h15, 18h10, 21h15 6ª<br />
Sábado 15h15, 18h10, 21h15, 00h10; ZON Lusomundo<br />
Alma<strong>da</strong> Fórum: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />
15h, 18h05, 21h10, 00h20; ZON Lusomundo Fórum<br />
Montijo: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h20,<br />
17h, 21h10, 00h05<br />
Porto: Me<strong>de</strong>ia Ci<strong>da</strong><strong>de</strong> do Porto: Sala 1: 5ª 6ª<br />
Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h45, 16h40, 19h20,<br />
22h; ZON Lusomundo Dolce Vita Porto: 5ª 6ª<br />
Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h10, 16h20, 21h10,<br />
00h15; ZON Lusomundo GaiaShopping: 5ª<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 14h30, 18h10, 21h10 6ª Sábado<br />
14h30, 18h10, 21h10, 00h25; ZON Lusomundo<br />
MaiaShopping: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 13h50,<br />
17h10, 21h10 6ª Sábado 13h50, 17h10, 21h10, 00h30;<br />
ZON Lusomundo Marshopping: 5ª 6ª Sábado<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 14h10, 17h40, 21h10, 00h20;<br />
ZON Lusomundo NorteShopping: 5ª 6ª Sábado<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 14h30, 17h50, 21h20, 00h30;<br />
ZON Lusomundo Parque Nascente: 5ª 6ª Sábado<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 13h50, 17h10, 21h10, 00h20;<br />
Castello Lopes - 8ª Aveni<strong>da</strong>: Sala 3: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª<br />
15h30, 18h20, 21h10, 24h Sábado Domingo 12h40,<br />
15h30, 18h20, 21h10, 24h; ZON Lusomundo Fórum<br />
Aveiro: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 14h30, 17h50, 21h05<br />
6ª Sábado 14h30, 17h50, 21h05, 00h35; ZON<br />
Lusomundo Glicínias: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª<br />
3ª 4ª 14h30, 17h50, 21h10, 00h25<br />
Michael Mann, mestre do noir<br />
contemporâneo, poeta do<br />
existencialismo <strong>de</strong> género como só<br />
Melville soube ser no seu tempo,<br />
reinci<strong>de</strong> nos seus épicos miniaturais<br />
<strong>de</strong> polícias e ladrões com este olhar<br />
realista sobre a Chicago dos anos<br />
1930, período áureo do cinema <strong>de</strong><br />
“gangsters”, e sobre o breve reinado<br />
<strong>de</strong> John Dillinger. aqui retratado por<br />
um Johnny Depp que raramente<br />
teremos visto tão sóbrio. “Inimigos<br />
Públicos” é um filme<br />
inteligentíssimo (nem outra coisa<br />
seria <strong>de</strong> esperar), que propõe uma<br />
leitura intrigante do criminoso como<br />
anti-herói e explica que a obsessão<br />
mediática com a celebri<strong>da</strong><strong>de</strong>, afinal,<br />
já vem <strong>de</strong> trás. O mais notável,<br />
contudo, é mesmo o modo como<br />
“Inimigos Públicos” é uma espécie<br />
<strong>de</strong> “meta- narrativa” que faz<br />
um filme <strong>de</strong> acção<br />
sobre uma vi<strong>da</strong><br />
real que se<br />
imaginava<br />
como uma<br />
vi<strong>da</strong><br />
<strong>de</strong><br />
cinema.<br />
J.M.<br />
Raramente teremos visto Johnny Depp<br />
tão sóbrio como em “Inimigos Públicos”<br />
Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 35
DVD<br />
Espaço<br />
Público<br />
Cinema<br />
O filme<br />
é melhor<br />
que a música<br />
A ban<strong>da</strong> sonora dos British<br />
Sea Power parece querer<br />
impor-se às imagens<br />
admiráveis do documentário<br />
<strong>de</strong> Robert Flaherty, e isso<br />
acaba por enfraquecê-la.<br />
Mário Lopes<br />
Man Of Aran<br />
De Robert Flaherty<br />
BSO British Sea Power<br />
Rough Tra<strong>de</strong>; distri. Popstock<br />
mmmnn<br />
Este espaço vai ser<br />
seu. Que filme, peça <strong>de</strong><br />
teatro, livro, exposição,<br />
disco, álbum, canção,<br />
concerto, DVD viu e<br />
gostou tanto que lhe<br />
apeteceu escrever<br />
“O Homem <strong>de</strong><br />
Aran”, <strong>de</strong> Robert<br />
Flaherty, pai do<br />
documentário<br />
cinematográfico,<br />
é um filme<br />
imponente. O<br />
tema é o <strong>de</strong> sempre: a nobre<br />
sobrevivência do homem isolado<br />
perante a natureza, luta constante<br />
com tanto <strong>de</strong> inevitável quanto <strong>de</strong><br />
arduamente heróico. Filmado nas<br />
inóspitas ilhas <strong>de</strong> Aran, na zona mais<br />
oci<strong>de</strong>ntal <strong>da</strong> costa irlan<strong>de</strong>sa, foca o<br />
olhar numa família (o Homem <strong>de</strong><br />
Aran, a sua mulher, Maggie, e o filho<br />
Michael), para contar o mesmo que<br />
“Nanook”, o primeiro e mais<br />
emblemático filme <strong>de</strong> Flaherty.<br />
Em Aran, o gelo é substituído por<br />
um mar inclemente e incontrolável –<br />
são admiráveis as on<strong>da</strong>s gigantescas<br />
sobre ele, concor<strong>da</strong>ndo<br />
ou não concor<strong>da</strong>ndo<br />
com o que escrevemos?<br />
Envie-nos uma nota até<br />
500 caracteres para<br />
ipsilon@publico.pt. E<br />
nós <strong>de</strong>pois publicamos.<br />
fustigando a costa -, a caça pela<br />
pesca, em barcos minúsculos, <strong>de</strong><br />
tubarões gigantescos, e as roupas <strong>de</strong><br />
peles e os iglus dos esquimós pelas<br />
longas e pretas saias católicas <strong>de</strong><br />
Maggie e pelas boinas e camisas <strong>de</strong><br />
pescador dos homens. Filme <strong>de</strong> um<br />
romântico dramatismo – como<br />
habitual em Robert Flaherty, é,<br />
precisamente, um documentário<br />
dramatizado -, encena a nobreza<br />
<strong>de</strong>sencanta<strong>da</strong> <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> em Aran com<br />
momentos <strong>de</strong> extraordinária beleza<br />
(o pequeno Michael caminhando<br />
campo fora e o céu surgindo vivo<br />
como em pintura <strong>de</strong> William<br />
Turner), com sequências <strong>de</strong> uma<br />
épica intensi<strong>da</strong><strong>de</strong>, como a longa<br />
caça<strong>da</strong> ao tubarão fra<strong>de</strong>. Tudo isso<br />
está lá, nas imagens. E tudo isso,<br />
naturalmente, po<strong>de</strong> ser potenciado<br />
com a ban<strong>da</strong> sonora a<strong>de</strong>qua<strong>da</strong>. Foi<br />
isso que tentaram os British Sea<br />
Power, ban<strong>da</strong> britânica filia<strong>da</strong> no<br />
negrume pós-punk, autora <strong>de</strong> álbuns<br />
como “Open Season”, repletos <strong>de</strong><br />
referências literatas e boas i<strong>de</strong>ias a<br />
um passo <strong>de</strong> se transformarem em<br />
algo realmente interessante. Na<br />
ban<strong>da</strong> sonora elabora<strong>da</strong> para “O<br />
Homem <strong>de</strong> Aran”, agora edita<strong>da</strong> em<br />
CD e DVD, assim se mantiveram.<br />
A<strong>da</strong>ptando temas do cancioneiro<br />
folk irlandês e criando instrumentais,<br />
ora tétricos <strong>de</strong> guitarras uivando, ora<br />
drones insistentes, ora ca<strong>de</strong>nciados<br />
em rock a meio caminho entre os<br />
Velvet Un<strong>de</strong>rground e as explosões<br />
sónicas do pós-rock, os British Sea<br />
Power incorrem num erro que se<br />
revela fatal para a longevi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong>sta<br />
união à obra <strong>de</strong> Flaherty. Muitas<br />
vezes, a música parece querer imporse<br />
às imagens, mais do que<br />
complementá-las, e isso acaba por<br />
enfraquecê-la – digamos que,<br />
basicamente, o filme é melhor que a<br />
música e <strong>de</strong>veria falar mais alto. A<br />
cadência mecânica e eléctrica <strong>da</strong><br />
aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />
Os instrumentais dos British Sea Power<br />
não chegam a transformar-se em algo realmente interessante<br />
música, ruidosamente mo<strong>de</strong>rna,<br />
contraposta à i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> ancestrali<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
que atravessa o filme, até resulta em<br />
exercício interessante. No final,<br />
contudo, concor<strong>da</strong>mos que “O<br />
Homem <strong>de</strong> Aran” é um filme<br />
magnífico e que a ban<strong>da</strong> sonora que<br />
os British Sea Power lhe fizeram, caso<br />
houvesse voz nestas canções, po<strong>de</strong>ria<br />
ser o seu melhor álbum (mas seria,<br />
ain<strong>da</strong> assim, pior que o filme).<br />
O factor<br />
humano<br />
Emmanuelle Cuau equilibra<br />
a leveza do seu nonsense<br />
kafkiano com a serie<strong>da</strong><strong>de</strong> do<br />
olhar sobre uma socie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
menos atenta às pessoas,<br />
mas trai a loucura do<br />
argumento com um final<br />
certinho. Jorge Mourinha<br />
Muito Bem, Obrigado<br />
Très bien, merci<br />
De Emmanuelle Cuau<br />
Edição Atalanta Filmes<br />
mmnnn<br />
Sem extras<br />
Passou pelas salas<br />
portuguesas há<br />
dois anos sem<br />
gran<strong>de</strong><br />
repercussão,<br />
ressurge agora<br />
num DVD básico<br />
sem extras,<br />
con<strong>de</strong>nado à<br />
mesma indiferença que o recebeu na<br />
altura. Não se po<strong>de</strong> dizer, é certo,<br />
que a segun<strong>da</strong> longa <strong>da</strong> francesa<br />
Emmanuelle Cuau seja um gran<strong>de</strong><br />
filme — não é, falta a “Muito Bem,<br />
Obrigado” um pouco mais <strong>de</strong><br />
tarimba e personali<strong>da</strong><strong>de</strong> para se<br />
elevar acima <strong>da</strong> imensa produção <strong>de</strong><br />
“classe média” gaulesa a meio<br />
caminho entre o filme <strong>de</strong> autor e o<br />
filme comercial. Mas Cuau (que<br />
trabalhou como argumentista com<br />
Jacques Rivette, por exemplo) acerta<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o princípio no tom i<strong>de</strong>al para<br />
a sua comédia kafkiana sobre um<br />
contabilista insatisfeito que dá por si<br />
prisioneiro do labirinto burocrático<br />
dos serviços públicos franceses.<br />
Apanhado a fumar no átrio <strong>de</strong> saí<strong>da</strong><br />
<strong>de</strong> uma estação <strong>de</strong> metro, Alex<br />
<strong>de</strong>ci<strong>de</strong>-se a fazer valer os seus<br />
direitos <strong>de</strong> ci<strong>da</strong>dão e o seu pequeno<br />
ataque <strong>de</strong> civismo <strong>de</strong>spoleta um<br />
“efeito borboleta” que leva o pobre<br />
contabilista ao hospital psiquiátrico,<br />
sem que a sua esposa consiga<br />
<strong>de</strong>sfazer os absurdos resultantes <strong>da</strong><br />
aplicação estrita e cega <strong>da</strong>s leis.<br />
Cuau sublinha o absurdo <strong>da</strong>s<br />
situações através <strong>da</strong> serie<strong>da</strong><strong>de</strong> mais<br />
seca e sisu<strong>da</strong>, resultando num filme<br />
que joga constantemente com esse<br />
distanciamento quase em câmara<br />
lenta para criar o humor — que é,<br />
obviamente, seco e absurdo mas<br />
também <strong>de</strong> um peculiar burlesco<br />
<strong>de</strong>sconstruído, quase atomizado. É<br />
uma opção tanto mais difícil quanto<br />
seria muito fácil cair ora na farsa<br />
histérica ora na angústia <strong>de</strong>pressiva<br />
— e Cuau, muito aju<strong>da</strong><strong>da</strong> pelos<br />
actores (Gilbert Melki e Sandrine<br />
Kiberlain excelentes no papel do<br />
casal), consegue a proeza <strong>de</strong><br />
caminhar elegantemente na cor<strong>da</strong><br />
bamba, equilibrando a leveza do seu<br />
nonsense kafkiano com a serie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
certeira do olhar <strong>de</strong>sencantado para<br />
uma socie<strong>da</strong><strong>de</strong> progressivamente<br />
menos atenta ao factor humano. O<br />
que falha, <strong>de</strong>pois, é a resolução do<br />
argumento, cujo final “certinho” trai<br />
<strong>de</strong> alguma maneira a loucura que o<br />
antece<strong>de</strong>u e parece ter sido uma<br />
solução <strong>de</strong> recurso para se livrar do<br />
beco sem saí<strong>da</strong> para on<strong>de</strong> a história<br />
se dirige. E não conseguimos evitar a<br />
sensação <strong>de</strong> que Cuau não tem<br />
“unhas” <strong>de</strong> cineasta para fazer<br />
inteira justiça à “guitarra” que<br />
<strong>de</strong>cidiu tocar — é um filme<br />
visualmente anónimo e com alguns<br />
problemas <strong>de</strong> ritmo. Mas isso não<br />
invali<strong>da</strong> que “Muito Bem, Obrigado”<br />
seja fita suficientemente interessante<br />
para merecer uma visão<br />
<strong>de</strong>scomplexa<strong>da</strong>.<br />
Sandrine Kiberlain<br />
e Gilbert Melki<br />
Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 37
Expos<br />
As superfícies<br />
com padrões<br />
são um<br />
elemento-chave<br />
na pintura <strong>de</strong> Daan<br />
van Gol<strong>de</strong>n<br />
38 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon<br />
Devolver<br />
o real<br />
Um exercício <strong>de</strong> meditação:<br />
Daan van Gol<strong>de</strong>n na<br />
Culturgest. Óscar Faria<br />
Vermelho ou Azul/Red or Blue<br />
De Daan van Gol<strong>de</strong>n.<br />
<strong>Lisboa</strong>. Culturgest. Rua Arco do Cego - Edifício <strong>da</strong><br />
CGD. Tel.: 217905155. Até 06/09. 2ª, 4ª, 5ª e 6ª <strong>da</strong>s<br />
11h às 19h (última admissão às 18h30). Sáb., Dom. e<br />
Feriados <strong>da</strong>s 14h às 20h (última admissão às 19h30).<br />
Pintura, Fotografia.<br />
mmmmn<br />
Em Quioto, no Japão, encontra-se o<br />
templo <strong>de</strong> Ryoanji, que faz parte <strong>de</strong><br />
um complexo <strong>de</strong> edifícios mantido<br />
pela escola Myoshinji, a mais<br />
importante <strong>de</strong> um dos ramos do<br />
budismo zen, o rinzai. Aquela<br />
arquitectura religiosa é sobretudo<br />
conheci<strong>da</strong> pelo “karesansui” –<br />
paisagem seca –, um jardim <strong>de</strong> pedras<br />
construído no final do século XV, que<br />
tem vindo a inspirar uma série <strong>de</strong><br />
artistas, como é o caso <strong>de</strong> John Cage.<br />
Nesse espaço <strong>de</strong> meditação os<br />
estu<strong>da</strong>ntes procuram reflectir não só<br />
no “koan” que lhes foi <strong>de</strong>stinado por<br />
um mestre, mas também nas relações<br />
entre a gravilha, o musgo e os quinze<br />
pedregulhos ali colocados, dos quais,<br />
<strong>de</strong> qualquer ângulo, apenas se<br />
conseguem observar<br />
simultaneamente 14 – só <strong>de</strong>pois <strong>de</strong><br />
alguém ter atingido a “iluminação”,<br />
nota a tradição, é que consegue<br />
visualizar a totali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s pedras.<br />
Uma <strong>da</strong>s histórias favoritas <strong>de</strong><br />
Daan van Gol<strong>de</strong>n (1936, Roterdão)<br />
está relaciona<strong>da</strong> com uma<br />
encomen<strong>da</strong> <strong>de</strong> um mural feita por<br />
um imperador a dois grupos <strong>de</strong><br />
artistas, um chinês e outro grego.<br />
Durante a realização dos trabalhos,<br />
uma barreira separava as obras, <strong>de</strong><br />
modo a que ninguém pu<strong>de</strong>sse ver<br />
aquilo que se passava do outro lado.<br />
Os chineses foram os primeiros a<br />
acabar, tendo revelado o resultado ao<br />
imperador. Umas semanas <strong>de</strong>pois, foi<br />
a vez <strong>de</strong> os gregos terminarem o seu<br />
mural: tinham polido tanto a pare<strong>de</strong><br />
que esta reflectia a pintura dos seus<br />
concorrentes.<br />
Não é por acaso que o artista<br />
holandês mudou radicalmente a sua<br />
obra – antes os seus trabalhos<br />
<strong>de</strong>notavam a influência do<br />
expressionismo abstracto – no Japão,<br />
on<strong>de</strong> viveu entre 1963 e 1965. Nesse<br />
período, van Gol<strong>de</strong>n começa a<br />
aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />
transmutar em pintura uma série <strong>de</strong><br />
padrões apropriados <strong>de</strong> papéis <strong>de</strong><br />
embrulho ou <strong>de</strong> pare<strong>de</strong>, <strong>de</strong> lenços <strong>de</strong><br />
assoar ou <strong>de</strong> toalhas <strong>de</strong> mesa,<br />
espelhando assim a beleza que<br />
encontrava no quotidiano, sobretudo<br />
nos mais banais dos objectos. Essa<br />
colagem ao real, uma estratégia<br />
assumi<strong>da</strong>mente pop, esvaziava-se,<br />
porém, dos sentidos críticos<br />
vislumbrados em algumas variantes<br />
do movimento, sobretudo o realismo<br />
capitalista alemão, protragonizado<br />
por Sigmar Polke, Konrad Lueg e<br />
Gerhard Richter. É igualmente na fase<br />
japonesa que van Gol<strong>de</strong>n toma<br />
contacto, através <strong>de</strong> uma discussão<br />
num jornal local <strong>de</strong> língua inglesa,<br />
com o conceito “ma”, po<strong>de</strong>ndo este<br />
ser traduzido como “intervalo” – <strong>de</strong><br />
notar a sua proximi<strong>da</strong><strong>de</strong> com “mu”,<br />
uma noção fun<strong>da</strong>mental do budismo<br />
zen, que inspira a instalação <strong>de</strong> Pedro<br />
Morais patente na sala <strong>de</strong> exposições<br />
temporárias do CAM <strong>da</strong> Fun<strong>da</strong>ção<br />
Gulbenkian.<br />
Em ensaio publicado no catálogo<br />
<strong>da</strong> exposição agora visível na<br />
Culturgest – “O virgem e o<br />
modificado: a apropriação vazia <strong>de</strong><br />
Daan van Gol<strong>de</strong>n” –, Luke Smythe<br />
nota que o interesse do pintor pelas<br />
imagens por si reproduzi<strong>da</strong>s é mais<br />
<strong>de</strong> natureza visual ou afectiva do que<br />
<strong>de</strong> or<strong>de</strong>m conceptual ou crítica,<br />
acrescentando ain<strong>da</strong> o facto <strong>de</strong> o<br />
artista procurar emprestar aos seus<br />
trabalhos a capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
produzirem “uma atmosfera <strong>de</strong><br />
calma introspecção, induzi<strong>da</strong> pela<br />
simplici<strong>da</strong><strong>de</strong> sedutora <strong>da</strong>s suas<br />
superfícies com padrões.” O ensaísta<br />
nota ain<strong>da</strong> que a influência dos<br />
conceitos <strong>de</strong> “ma” e <strong>de</strong> vazio em van<br />
Gol<strong>de</strong>n permite compreen<strong>de</strong>r<br />
melhor o facto <strong>de</strong> ter baseado as<br />
suas pinturas realiza<strong>da</strong>s no Japão a<br />
partir <strong>de</strong> motivos encontrados em<br />
embalagens e em têxteis: “Não só os<br />
seus <strong>de</strong>senhos simples e repetitivos<br />
po<strong>de</strong>m ser reproduzidos <strong>de</strong> maneira<br />
<strong>de</strong>scontraí<strong>da</strong> porém concentra<strong>da</strong>, e<br />
portanto meditativa, mas também o<br />
seu estatuto <strong>de</strong> objectos <strong>de</strong>corativos<br />
sem importância permite solicitar ao<br />
espectador uma recepção <strong>da</strong> mesma<br />
natureza.”<br />
É este tipo <strong>de</strong> relações – entre o<br />
cheio e o vazio, entre o intervalo e a<br />
acção, muitas vezes na fronteira<br />
entre o reconhecível e o camuflado –<br />
, que van Gol<strong>de</strong>n irá trabalhar<br />
lentamente ao longo dos últimos<br />
trinta anos, encarando a sua<br />
activi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> pintor como um<br />
exercício <strong>de</strong> meditação. Nesse<br />
trajecto, on<strong>de</strong> também surgem<br />
imagens fotográficas – a série “Youth<br />
is an art”, cerca <strong>de</strong> 100 fotografias <strong>da</strong><br />
sua filha Diana, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o nascimento<br />
até aos 18 anos – e uma instalação<br />
num jardim – em 1987, cobre os<br />
caminhos do Hortus Botanicus, em<br />
Amesterdão, com gravilha azul –,<br />
irão surgir as obras compostas por<br />
silhuetas motiva<strong>da</strong>s por trabalhos <strong>de</strong><br />
outros artistas, como Giacometti,<br />
Matisse e Pollock. É contudo Klein o<br />
nome mais próximo <strong>da</strong>s intenções<br />
<strong>de</strong> van Gol<strong>de</strong>n, uma aproximação<br />
passível <strong>de</strong> se realizar tendo como<br />
pontos <strong>de</strong> parti<strong>da</strong> quer a mostra do<br />
francês na galeria Iris Clert, em 1958,<br />
conheci<strong>da</strong> como “a exposição do<br />
vazio” – o título correcto é “La<br />
spécialisation <strong>de</strong> la sensibilité à l’état<br />
matière première en sensibilité<br />
picturale stabilisée, Le Vi<strong>de</strong>” –, quer<br />
os famosos monocromos azuis, os<br />
IKB.<br />
A exposição patente na Culturgest<br />
procura <strong>da</strong>r conta do percurso <strong>de</strong><br />
Daan van gol<strong>de</strong>n <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os anos 1960<br />
até à actuali<strong>da</strong><strong>de</strong>. Com uma<br />
montagem menos consegui<strong>da</strong> do<br />
que, por exemplo, numa <strong>da</strong>s<br />
anteriores paragens <strong>da</strong> mostra, no<br />
Cam<strong>de</strong>n Arts Centre, em Londres –<br />
ali, os trabalhos respiravam mais e<br />
as séries surgiam melhor<br />
diferencia<strong>da</strong>s, permitindo assim<br />
uma leitura mais clara <strong>da</strong>s diferentes<br />
fases <strong>de</strong>senvolvi<strong>da</strong>s pelo artista –, a<br />
retrospectiva é contudo enriqueci<strong>da</strong><br />
em <strong>Lisboa</strong> por um <strong>da</strong>s obras<br />
seminais do artista, esta apresenta<strong>da</strong><br />
como ditam as regras, numa única<br />
linha, em contínuo: “Gol<strong>de</strong>n Years”,<br />
título inspirado por uma canção <strong>de</strong><br />
David Bowie. Nesta peça <strong>de</strong> teor<br />
conceptual, o pintor, com recurso a<br />
recortes <strong>de</strong> jornal, escolhe uma<br />
imagem legen<strong>da</strong><strong>da</strong> por ca<strong>da</strong> ano <strong>da</strong><br />
sua vi<strong>da</strong>, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que nasceu até fazer<br />
70 anos, criando assim uma história<br />
singular: do <strong>de</strong>sporto à guerra,<br />
passando pelas artes (música,<br />
pintura, cinema), é-nos assim<br />
<strong>de</strong>volvido o real, o mundo, através<br />
<strong>de</strong>ste improvável espelho, que ecoa<br />
a estratégia dos pintores gregos<br />
quando colocados perante o <strong>de</strong>safio<br />
<strong>de</strong> criar um mural. Esta reunião <strong>de</strong><br />
acontecimentos po<strong>de</strong> também ser<br />
vista como uma espécie <strong>de</strong> jardim <strong>de</strong><br />
pedras, que não se consegue abarcar<br />
com um só olhar. Apenas quem<br />
tanto viveu po<strong>de</strong> afirmar: “Discurso<br />
é silêncio, prata é ouro” (“Speech is<br />
silence, silver is gold”).<br />
A i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
angolana<br />
Sem preconceitos,<br />
Yonamime serve-se<br />
<strong>da</strong> pintura para interrogar<br />
a sua i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
Luísa Soares Oliveira<br />
Control Z<br />
De Yonamine<br />
<strong>Lisboa</strong>. Cristina Guerra Contemporary Art. R. <strong>de</strong><br />
Santo António à Estrela, 33. De 3ª a 6ª, <strong>da</strong>s 11h às<br />
20h. Sábados, <strong>da</strong>s 12h às 20h. Até 19 <strong>de</strong> Setembro.<br />
Ví<strong>de</strong>o, Instalação, Outros<br />
mmmmn<br />
“Control Z” é a primeira exposição<br />
<strong>de</strong> Yonamine (n. Luan<strong>da</strong>, 1975) no
Yonamine reflecte sobre a i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> uma Angola<br />
em que a tradição se apaga ca<strong>da</strong> vez mais perante o dólar<br />
e a areia <strong>da</strong> praia se transforma em “beach sand”<br />
espaço <strong>da</strong> galeria Cristina Guerra.<br />
O público lisboeta já terá<br />
eventualmente visto o seu trabalho<br />
em iniciativas <strong>da</strong> galeria 3+1 (uma<br />
exposição individual em 2008,<br />
“Tuga Suave”, e participação na<br />
colectiva “Sara e André”, no<br />
mesmo lugar) e, sobretudo, nos<br />
toldos <strong>de</strong> artistas do programa<br />
“Distância e Proximi<strong>da</strong><strong>de</strong>”<br />
(Fun<strong>da</strong>ção Calouste Gulbenkian,<br />
Verão <strong>de</strong> 2008). Yonamine exibe<br />
também um currículo já notável<br />
em termos <strong>de</strong> apresentações<br />
internacionais, incluindo o<br />
Pavilhão Africano <strong>da</strong> Bienal <strong>de</strong><br />
Veneza <strong>de</strong> 2007 e “Réplica e<br />
Rebeldia”, uma gran<strong>de</strong> colectiva<br />
que circulou em ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s lusófonas<br />
em 2006, mas que Portugal não<br />
recebeu.<br />
Esta individual insere-se na linha<br />
<strong>de</strong> trabalho que algumas <strong>de</strong>stas<br />
mostras indicavam já. Obras<br />
bidimensionais, sobretudo, que<br />
evocam ou se constroem com base<br />
na pintura, e em geral uma<br />
abundância <strong>de</strong> imagens próprias<br />
ou apropria<strong>da</strong>s que evocam a<br />
tradição <strong>da</strong> Pop Art – facto que,<br />
aliás, é assinalado num texto <strong>de</strong><br />
sala que apresenta a exposição.<br />
Depois há uma instalação monta<strong>da</strong><br />
nos <strong>de</strong>graus que conduzem ao piso<br />
<strong>da</strong> cave: um amontoado <strong>de</strong> sacos<br />
<strong>de</strong> plástico cheios <strong>de</strong> areia – “beach<br />
sand”, como nos é indicado em<br />
marcas impressas – com os quais o<br />
visitante po<strong>de</strong> interagir (mexer,<br />
<strong>de</strong>slocar, ler os slogans e as<br />
imagens que o artista neles fez<br />
imprimir).<br />
Muitos <strong>de</strong>stes slogans indicam a<br />
proibição através <strong>de</strong> alterações<br />
mínimas <strong>de</strong> sinais universalmente<br />
adoptados em códigos <strong>de</strong><br />
mobili<strong>da</strong><strong>de</strong>: o círculo atravessado<br />
por uma diagonal do código <strong>da</strong><br />
estra<strong>da</strong>, por exemplo, indica não a<br />
proibição <strong>de</strong> estacionar, mas a <strong>de</strong><br />
usar sapatos <strong>de</strong> saltos altos.<br />
Noutros casos, são imagens e<br />
símbolos <strong>de</strong> outra origem que<br />
Yonamine usa e repete <strong>de</strong> suporte<br />
para suporte: o cifrão do dólar,<br />
utilizado uma e outra vez à<br />
maneira <strong>de</strong> um carimbo, ou<br />
fotografias <strong>de</strong> jornais ou revistas<br />
que tenham por assunto<br />
acontecimentos ou<br />
individuali<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> relevo no<br />
continente africano. Em to<strong>da</strong>s<br />
estas imagens, que são utiliza<strong>da</strong>s<br />
na pintura segundo um processo<br />
que recor<strong>da</strong> processos e efeitos dos<br />
“graffiti” <strong>da</strong>s culturas urbanas<br />
marginais, a repetição é a tónica. E<br />
essa repetição gera, por sua vez,<br />
um excesso <strong>de</strong> imagens que se<br />
conjugam com alguma violência,<br />
in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>da</strong> sua origem<br />
geográfica e política.<br />
Esta violência acaba por se<br />
metaforizar como a própria marca<br />
<strong>da</strong> i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong> do artista. Nascido<br />
em Angola, capta no seu trabalho a<br />
miscigenação <strong>de</strong> elementos<br />
oci<strong>de</strong>ntais e africanos que<br />
caracterizam hoje a vi<strong>da</strong> no seu<br />
país <strong>de</strong> origem. Aliás, se se<br />
mergulhar mais fundo na própria<br />
natureza <strong>de</strong>sta obra – que junta na<br />
pintura, uma disciplina carrega<strong>da</strong><br />
<strong>de</strong> sentido no oci<strong>de</strong>nte ju<strong>da</strong>icocristão,<br />
a combinação <strong>de</strong><br />
referências sociais e políticas à<br />
história e à actuali<strong>da</strong><strong>de</strong> do seu país<br />
-, é ela própria que se afirma como<br />
uma reflexão sobre essa<br />
i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong>, on<strong>de</strong> a tradição se<br />
apaga ca<strong>da</strong> vez mais perante o<br />
dólar, on<strong>de</strong> a areia <strong>da</strong> praia se<br />
transforma em “beach sand”.<br />
“Control Z”, o comando que<br />
permite <strong>de</strong>sfazer um erro<br />
informático e voltar à origem, é<br />
aqui mais do que o nome <strong>da</strong><br />
exposição: é um <strong>de</strong>sejo que já não<br />
é possível realizar.<br />
A peça central <strong>da</strong> mostra, um<br />
painel colorido on<strong>de</strong> as pega<strong>da</strong>s<br />
(do artista?) se assumem como<br />
motivo <strong>de</strong>corativo principal, acaba<br />
por resumir e con<strong>de</strong>nsar esta linha<br />
<strong>de</strong> pensamento: sobre a pintura<br />
oci<strong>de</strong>ntal, Yonamine imprime a<br />
marca do seu corpo angolano. Não<br />
a <strong>de</strong>strói, nem esse é o seu<br />
propósito. Mas também não a<br />
<strong>de</strong>ixa intacta.<br />
“A Experiência <strong>da</strong><br />
Forma” na Casa <strong>da</strong>s Mu<strong>da</strong>s<br />
Agen<strong>da</strong><br />
Inauguram<br />
Hanoi, Ha Long, Hoi An, Hue -<br />
Quatro Paragens no Vietname<br />
O Vietname<br />
no Museu do Oriente<br />
De Ricardo França.<br />
<strong>Lisboa</strong>. Museu do Oriente. Av. Brasília - Edifício<br />
Pedro Álvares Cabral - Doca <strong>de</strong> Alcântara Norte.<br />
Tel.: 213585200. Até 20/09. 6ª <strong>da</strong>s 10h às 22h. 2ª,<br />
4ª, 5ª, Sáb. e Dom. <strong>da</strong>s 10h às 18h. Inaugura 21/8 às<br />
21h.<br />
Fotografia.<br />
Capas e Narrativas<br />
De Carlos Barão.<br />
São Lourenço. Centro Cultural São Lourenço. R.<br />
Igreja. Tel.: 289395475. Até 01/10. 3ª, 4ª, 5ª, 6ª,<br />
Sáb., Dom. e Feriados <strong>da</strong>s 10h às 19h. Inaugura 22/8<br />
às 19h.<br />
Pintura.<br />
Continuam<br />
Arriscar o Real<br />
De vários autores.<br />
<strong>Lisboa</strong>. Museu Colecção Berardo. Praça do Império<br />
- Centro Cultural <strong>de</strong> Belém. Tel.: 213612878. Até<br />
30/08. 6ª <strong>da</strong>s 10h às 22h (última admissão às<br />
21h30). 2ª a 5ª, Sáb. e Dom. <strong>da</strong>s 10h às 19h (última<br />
admissão às 18h30).<br />
Pintura, Outros.<br />
A Experiência <strong>da</strong> Forma<br />
De Joaquim Rodrigo, Artur Rosa,<br />
Helena Almei<strong>da</strong>, António Areal,<br />
Lour<strong>de</strong>s Castro, Jorge Martins, Pedro<br />
Calapez, Pedro Proença, Rui<br />
Sanches, Joana Vasconcelos, Sofia<br />
Areal, entre outros.<br />
Calheta, Vale dos Amores. Estrela à Baixo, Centro<br />
<strong>da</strong>s Artes - Casa <strong>da</strong>s Mu<strong>da</strong>s. Tel.: 291822808 Até<br />
15/11. 3ª a Dom <strong>da</strong>s 10h às 13h e <strong>da</strong>s 14h às 18h.<br />
Pintura, Outros.<br />
Henri Fantin-Latour (1836-1904)<br />
<strong>Lisboa</strong>. Fun<strong>da</strong>ção e Museu Calouste Gulbenkian.<br />
Aveni<strong>da</strong> <strong>de</strong> Berna, 45A. Tel.: 217823700. Até 06/09.<br />
3ª a. e Dom. <strong>da</strong>s 10h às 18h.<br />
Pintura, Desenho.<br />
Teoria <strong>da</strong> Fala<br />
De Pedro Barateiro.<br />
Porto. Museu <strong>de</strong> Serralves. Rua Dom João <strong>de</strong> Castro,<br />
210. Tel.: 226156500. Até 29/09. 3ª a 6ª <strong>da</strong>s 10h às<br />
17h. Sáb., Dom. e Feriados <strong>da</strong>s 10h às 19h. Na Casa<br />
<strong>de</strong> Serralves.<br />
Ví<strong>de</strong>o, Outros.<br />
Jacques-Émile Ruhlmann<br />
Porto. Museu <strong>de</strong> Serralves. Rua Dom João <strong>de</strong> Castro,<br />
210. Tel.: 226156500. Até 27/09. 3ª a 6ª <strong>da</strong>s 10h às<br />
17h. Sáb., Dom. e Feriados <strong>da</strong>s 10h às 19h. Na Casa<br />
<strong>de</strong> Serralves.<br />
Objectos.<br />
Encompassing The Globe.<br />
Portugal e o Mundo nos Séculos<br />
XVI E XVII<br />
De vários autores.<br />
<strong>Lisboa</strong>. Museu Nacional <strong>de</strong> Arte Antiga. Rua <strong>da</strong>s<br />
Janelas Ver<strong>de</strong>s - Palácio do Alvor. Tel.: 213912800.<br />
Até 11/10. 3ª <strong>da</strong>s 14h às 18h. 4ª a Dom. <strong>da</strong>s 10h às<br />
18h.<br />
Pintura, Escultura, Ourivesaria,<br />
Desenho, Outros.<br />
Emissores Reunidos - Episódio 1:<br />
O Amanhã <strong>de</strong> Ontem Não é Hoje<br />
De Isabel Carvalho, Nicolás Robbio.<br />
Porto. Radiodifusão Portuguesa (Antiga RDP). R.<br />
Cândido dos Reis, 74. Até 20/09. 6ª e Sáb. <strong>da</strong>s 15h às<br />
23h. 3ª, 4ª, 5ª e Dom. <strong>da</strong>s 15h às 20h.<br />
Ví<strong>de</strong>o, Outros.<br />
Serralves 2009: A Colecção -<br />
Filmes e Ví<strong>de</strong>os<br />
Porto. Radiodifusão Portuguesa (Antiga RDP). R.<br />
Cândido dos Reis, 74. Até 20/09. 6ª e Sáb. <strong>da</strong>s 15h às<br />
23h. 3ª, 4ª, 5ª e Dom. <strong>da</strong>s 15h às 20h.<br />
Ví<strong>de</strong>o, Outros.<br />
Feijoeiro<br />
De João Pedro Vale.<br />
<strong>Lisboa</strong>. MNAC - Museu do Chiado. Rua Serpa Pinto,<br />
4. Tel.: 213432148. Até 30/10. 3ª a Dom. <strong>da</strong>s 10h às<br />
18h. No Piso 1.<br />
Escultura.<br />
Aspectos <strong>da</strong> Colecção<br />
De António Areal, Manuel Cargaleiro,<br />
Armando Basto, Fernando Calhau,<br />
Michael Biberstein, Cristino <strong>da</strong> Silva,<br />
Pepe Diniz.<br />
<strong>Lisboa</strong>. Centro <strong>de</strong> Arte Mo<strong>de</strong>rna - José <strong>de</strong> Azeredo<br />
Perdigão. Rua Dr. Nicolau Bettencourt. Tel.:<br />
217823474. Até 30/08. 3ª a Dom. <strong>da</strong>s 10h às 18h.<br />
Pintura, Desenho, Outros.<br />
A Colecção do CAM por Heimo<br />
Zobernig<br />
<strong>Lisboa</strong>. Centro <strong>de</strong> Arte Mo<strong>de</strong>rna - José <strong>de</strong> Azeredo<br />
Perdigão. Rua Dr. Nicolau Bettencourt. Tel.:<br />
217823474. Até 30/08. 3ª a Dom. <strong>da</strong>s 10h às 18h.<br />
Instalação, Pintura, Outros.<br />
Mu. Lua em Chão <strong>de</strong> Terra Bati<strong>da</strong><br />
De Pedro Morais.<br />
<strong>Lisboa</strong>. Centro <strong>de</strong> Arte Mo<strong>de</strong>rna - José <strong>de</strong> Azeredo<br />
Perdigão. Rua Dr. Nicolau Bettencourt. Tel.:<br />
217823474. Até 30/08. 3ª a Dom. <strong>da</strong>s 10h às 18h..<br />
Instalação.<br />
Dan Flavin na Colecção Panza<br />
De Dan Flavin.<br />
<strong>Lisboa</strong>. Museu Colecção Berardo. Praça do Império -<br />
Centro Cultural <strong>de</strong> Belém. Tel.: 213612878. Até 30/08.<br />
6ª <strong>da</strong>s 10h às 22h (última admissão às 21h30). 2ª a<br />
5ª, Sáb. e Dom. <strong>da</strong>s 10h às 19h (última admissão às<br />
18h30).<br />
Instalação, Outros.<br />
Serralves 2009 - a Colecção<br />
De vários autores.<br />
Porto. Museu <strong>de</strong> Serralves. Rua Dom João <strong>de</strong> Castro,<br />
210. Tel.: 226156500. Até 27/09. 3ª a 6ª <strong>da</strong>s 10h às<br />
17h. Sáb., Dom. e Feriados <strong>da</strong>s 10h às 20h.<br />
Pintura, Escultura, Outros.<br />
Daniel Buren<br />
Porto. Museu <strong>de</strong> Serralves. Rua Dom João <strong>de</strong> Castro,<br />
210. Tel.: 226156500. Até 30/08. 2ª a Sáb. <strong>da</strong>s 10h às<br />
19h. Na Biblioteca.<br />
Objectos, Publicações.<br />
Ombro a Ombro: Retratos<br />
Políticos<br />
<strong>Lisboa</strong>. MUDE - Museu do Design e <strong>da</strong> Mo<strong>da</strong>. Rua<br />
Augusta 24. Tel.: 218886117. Até 13/09. 6ª e Sáb. <strong>da</strong>s<br />
10h às 22h. 3ª a 5ª e Dom. <strong>da</strong>s 10h às 20h.<br />
Design, Outros.<br />
Colecção #1 - Ana Jotta<br />
<strong>Lisboa</strong>. Culturgest. Rua Arco do Cego - Edifício <strong>da</strong><br />
CGD. Tel.: 217905155. Até 06/09. 2ª, 4ª, 5ª e 6ª <strong>da</strong>s<br />
11h às 19h (última admissão às 18h30). Sáb., Dom. e<br />
Feriados <strong>da</strong>s 14h às 20h (última admissão às 19h30).<br />
Fotografia, Pintura, Desenho,<br />
Escultura, Outros.<br />
Colecção #2 - Francisco Tropa<br />
<strong>Lisboa</strong>. Culturgest. Rua Arco do Cego - Edifício <strong>da</strong><br />
CGD. Tel.: 217905155. Até 06/09. 2ª, 4ª, 5ª e 6ª <strong>da</strong>s<br />
11h às 19h (última admissão às 18h30). Sáb., Dom. e<br />
Feriados <strong>da</strong>s 14h às 20h (última admissão às 19h30).<br />
Escultura, Ví<strong>de</strong>o.<br />
Erwin Olaf<br />
Montemor-o-Novo. Convento <strong>da</strong> Sau<strong>da</strong>ção. Dentro<br />
<strong>da</strong>s muralhas do Castelo. Tel.: 266899857. Até 31/08.<br />
2ª a 6ª <strong>da</strong>s 18h às 00h. Sáb. e Dom. <strong>da</strong>s 16h às 00h.<br />
Fotografia.<br />
André & Sara<br />
<strong>Lisboa</strong>. Pavilhão 28. Av. do Brasil, 53. Tel.:<br />
Erwin Olaf em Montemor-o-Novo<br />
217917000. Até 27/08. 2ª a 6ª <strong>da</strong>s 10h às 17h.<br />
Ví<strong>de</strong>o.<br />
Quartos/Chambres/Rooms/<br />
Zimmers<br />
De Ana Cintra, Diana Policarpo,<br />
Joana Paraíso, Magali Marinho,<br />
Mariana Gomes, Teresa Cortez,<br />
Pedro Ferreira.<br />
<strong>Lisboa</strong>. Pavilhão 28. Av. do Brasil, 53. Tel.:<br />
217917000. Até 27/08. 2ª a Dom. <strong>da</strong>s 10h às 18h.<br />
Desenho, Instalação, Ví<strong>de</strong>o, Outros.<br />
Bruno Pacheco<br />
Porto. Culturgest. Aveni<strong>da</strong> dos Aliados, 104 -<br />
Edifício <strong>da</strong> CGD. Tel.: 222098116. Até 26/09. 2ª, 4ª,<br />
5ª e 6ª <strong>da</strong>s 11h às 19h (última admissão às 18h30).<br />
Sáb., Dom. e Feriados <strong>da</strong>s 14h às 20h (última<br />
admissão às 19h30).<br />
Pintura, Outros.<br />
Notas Sobre um Problema <strong>de</strong><br />
Método<br />
De Pedro Calapez.<br />
Coimbra. Centro <strong>de</strong> Artes Visuais - CAV. Pátio <strong>da</strong><br />
Inquisição, 10. Tel.: 239826178. Até 06/09. 3ª a<br />
Dom. <strong>da</strong>s 14h às 19h.<br />
Pintura.<br />
The Night Walker e Outras<br />
Obras<br />
De Ra di Martino.<br />
Coimbra. Centro <strong>de</strong> Artes Visuais - CAV. Pátio <strong>da</strong><br />
Inquisição, 10. Tel.: 239826178. Até 06/09. 3ªa<br />
Dom. <strong>da</strong>s 14h às 19h.<br />
Ví<strong>de</strong>o, Instalação.<br />
Paisagem<br />
Com Edgar Martins. De João Luís<br />
Carrilho <strong>da</strong> Graça, Augusto Brázio,<br />
Frédéric Bellay.<br />
Coimbra. Centro <strong>de</strong> Artes Visuais - CAV. Pátio <strong>da</strong><br />
Inquisição, 10. Tel.: 239826178. Até 06/09. 3ª a<br />
Dom. <strong>da</strong>s 14h às 19h.<br />
Arquitectura, Fotografia.<br />
De Ama<strong>de</strong>o a Paula Rego, 50<br />
Anos <strong>de</strong> Arte Portuguesa (1910-<br />
1960)<br />
De vários autores.<br />
<strong>Lisboa</strong>. MNAC - Museu do Chiado. Rua Serpa Pinto,<br />
4. Tel.: 213432148. Até 30/10. 3ª a Dom. <strong>da</strong>s 10h às<br />
18h.<br />
Pintura, Outros.<br />
Paisagens Oblíquas<br />
De Lothar Baumgarten, Pedro<br />
Calapez, Alberto Carneiro, Tacita<br />
Dean, Caetano Dias, Alexandre Joly,<br />
Robert Frank, Hamish Fulton,<br />
Laurent Grasso, Andreas Gursky,<br />
David Hockney, Richard Long, Eric<br />
Poitevin, Yvan Salomone, I<strong>da</strong> Tursic,<br />
Wilfried Mille.<br />
Faro. Museu <strong>Municipal</strong> <strong>de</strong> Faro. Largo Afonso III,<br />
14. Tel.: 289897400. 3ª a 6ª <strong>da</strong>s 10h às 19h. Sáb. e<br />
Dom. <strong>da</strong>s 11h às 18h (De 1/7 a 31/8 encerra às 22h30,<br />
<strong>de</strong> 1/7 a 31/8 <strong>da</strong>s 10h30 às 17h).<br />
Faro. Núcleo Museológico do Brinquedo. Galeria<br />
<strong>Municipal</strong> Arco. Tel.: 289897400. Até 27/09. 3ª a<br />
Dom. <strong>da</strong>s 10h30 às 17h. Allgarve 09.<br />
Instalação, Outros.<br />
Estranhas Formas <strong>de</strong> <strong>Vi<strong>da</strong></strong><br />
De Francesco Vezzoli, Luís Palma,<br />
Patrícia Almei<strong>da</strong>.<br />
Loulé. Convento <strong>de</strong> Santo António dos Capuchos. R.<br />
Nossa Senhora <strong>da</strong> Pie<strong>da</strong><strong>de</strong> - Campo do Olival. Tel.:<br />
289400957. Até 27/09. Sáb. <strong>da</strong>s 10h às 23h. 3ª a 6ª e<br />
Dom. <strong>da</strong>s 15h às 23h. Allgarve 09.<br />
Fotografia, Outros.<br />
Dialogue Boxes on Street<br />
Windows<br />
De Ana Vidigal, Costa Pinheiro,<br />
Manuel Baptista, Susanne Themlitz,<br />
entre outros.<br />
Faro. Na Baixa <strong>de</strong> Faro. Percurso: Rua <strong>de</strong> Santo<br />
António, Rua Manuel Belmarço, Rua do Albergue<br />
até a entra<strong>da</strong> <strong>da</strong> Vila-a-<strong>de</strong>ntro. Allgarve 09.<br />
Outros.<br />
Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 39