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Vida e morte da dança - Fonoteca Municipal de Lisboa

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Sexta-feira<br />

21 Agosto 2009<br />

www.ipsilon.pt<br />

<strong>Vi<strong>da</strong></strong> e <strong>morte</strong> <strong>da</strong> <strong>da</strong>nça<br />

Manuel MozosCharlie KaufmanLee FieldsSizoGol<strong>de</strong>n Silvers<br />

CHARLES E. ROTKIN/CORBIS ESTE SUPLEMENTO FAZ PARTE INTEGRANTE DA EDIÇÃO Nº 7066 DO PÚBLICO, E NÃO PODE SER VENDIDO SEPARADAMENTE


Flash<br />

Sumário<br />

Dança 4<br />

Questões <strong>de</strong> herança e<br />

transmissão, no “<strong>da</strong>y-after”<br />

<strong>da</strong>s <strong>morte</strong>s <strong>de</strong> Pina Bausch e<br />

Merce Cunningham<br />

Manuel Mozos 11<br />

Filma uma família que o<br />

amor liga, mesmo quando<br />

separa, em “Quatro Copas”<br />

Charlie Kaufman 14<br />

Dentro <strong>da</strong> cabeça mais<br />

peculiar <strong>de</strong> Hollywood,<br />

a propósito do novo<br />

“Sinédoque, Nova Iorque”<br />

Lee Fields 16<br />

Como é que este homem<br />

não tem <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> discos<br />

gravados?<br />

Sizo 18<br />

Ao terceiro EP, já são um caso<br />

sério do ano português<br />

Gol<strong>de</strong>n Silvers 20<br />

Fizeram o single <strong>de</strong>ste Verão,<br />

e mais?<br />

Ficha Técnica<br />

Director José Manuel Fernan<strong>de</strong>s<br />

Editor Vasco Câmara, Inês Na<strong>da</strong>is<br />

(adjunta)<br />

Conselho editorial Isabel<br />

Coutinho, Óscar Faria, Cristina<br />

Fernan<strong>de</strong>s, Vítor Belanciano<br />

Design Mark Porter, Simon<br />

Esterson, Kuchar Swara<br />

Directora <strong>de</strong> arte Sónia Matos<br />

Designers Ana Carvalho, Carla<br />

Noronha, Mariana Soares<br />

Editor <strong>de</strong> fotografia Miguel<br />

Ma<strong>de</strong>ira<br />

E-mail: ipsilon@publico.pt<br />

2 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon<br />

John Landis vem<br />

dormir ao MOTELx<br />

É a mais recente novi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong><br />

programação do MOTELx – a<br />

terceira edição do Festival<br />

Internacional <strong>de</strong> Cinema <strong>de</strong><br />

Terror <strong>de</strong> <strong>Lisboa</strong> traz a <strong>Lisboa</strong><br />

John Landis, o autor <strong>de</strong> “Um<br />

Lobisomem Americano em<br />

Londres” e “Não Há Pescoço<br />

que Aguente” (mas também <strong>de</strong><br />

“Os Ricos e os Pobres”, “A<br />

República dos Cucos” ou “Pela<br />

Noite Dentro”). Um dos<br />

cineastas-chave do cinema<br />

americano <strong>da</strong> déca<strong>da</strong> <strong>de</strong> 1980,<br />

“especialista” na conjugação do<br />

humor e do horror, Landis tem<br />

passado a última déca<strong>da</strong> activo<br />

maioritariamente na televisão,<br />

para a qual realizou episódios<br />

<strong>da</strong>s séries “Masters of Horror” e<br />

“Fear Itself” e dois<br />

documentários aclamadíssimos<br />

(“Slasher”, sobre os ven<strong>de</strong>dores<br />

<strong>de</strong> automóveis, e “Mr.<br />

Warmth”, sobre o comediante<br />

Don Rickles). Aproveitando a<br />

presença do realizador, o<br />

MOTELx, que <strong>de</strong>corre entre 2 e<br />

6 <strong>de</strong> Setembro no cinema São<br />

Jorge, homenageia-o com a<br />

projecção do seminal “Um<br />

Lobisomem Americano em<br />

Londres”. O festival, que traz<br />

igualmente a <strong>Lisboa</strong> outro<br />

veterano do cinema <strong>de</strong> género,<br />

Stuart Gordon, fechou<br />

entretanto a programação <strong>da</strong><br />

sua secção principal, com a<br />

entra<strong>da</strong> <strong>de</strong> um dos mais<br />

recentes filmes do imparável<br />

nipónico Takashi Miike,<br />

“Detective Story”.<br />

Mais informações<br />

em www.<br />

motelx.org.<br />

John Landis é o coelho<br />

na cartola do festival<br />

Os diários <strong>de</strong> Byrne<br />

em bicicleta<br />

O músico e realizador David<br />

Byrne, um dos fun<strong>da</strong>dores dos<br />

Talking Heads (e também artista<br />

plástico: faz fotografia e<br />

instalações), acaba <strong>de</strong> publicar<br />

no Reino Unido o seu sexto<br />

livro, “Bicycle Diaries”. Des<strong>de</strong><br />

os anos 80 que o meio <strong>de</strong><br />

transporte preferido <strong>de</strong> David<br />

Byrne (57 anos) em Nova Iorque<br />

é a bicicleta. “Quando fiz a<br />

Bergman<br />

e as<br />

mulheres<br />

<strong>de</strong>ram<br />

um livro<br />

Que o cinema <strong>de</strong> Ingmar<br />

Bergman é uma fonte<br />

inesgotável <strong>de</strong> fascínio e<br />

admiração não é novi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

nenhuma, e que a relação<br />

entre a sua arte e a sua<br />

conturba<strong>da</strong> vi<strong>da</strong> priva<strong>da</strong><br />

era bem maior do que<br />

pareceria à primeira vista<br />

ain<strong>da</strong> menos. Mas o crítico<br />

britânico Geoffrey Macnab,<br />

colaborador regular do<br />

jornal “The Guardian” e <strong>da</strong><br />

revista “Sight & Sound”,<br />

mergulha até ao fundo<br />

<strong>de</strong>ssas “ligações perigosas”<br />

no novo estudo biográfico<br />

“The Life and Films of the<br />

Last Great European<br />

Director” (acabado <strong>de</strong><br />

publicar em Inglaterra pela<br />

I. B. Tauris). Nele, Macnab<br />

cruza as vi<strong>da</strong>s pessoal e<br />

profissional do realizador<br />

para <strong>de</strong>sven<strong>da</strong>r exactamente<br />

quanto <strong>de</strong> pessoal<br />

era visível nos seus filmes, e<br />

<strong>de</strong>dica especial atenção às<br />

suas complexas relações<br />

emocionais e profissionais<br />

com as actrizes que dirigiu,<br />

muitas <strong>da</strong>s quais cita<strong>da</strong>s no<br />

livro através <strong>de</strong> entrevistas<br />

inéditas – e com três <strong>da</strong>s<br />

quais teve casos mais ou<br />

menos longos (Harriet<br />

An<strong>de</strong>rsson, Bibi An<strong>de</strong>rsson<br />

e Liv Ullmann)<br />

O crítico pinta um retrato<br />

<strong>de</strong> Bergman como um<br />

cineasta intenso, obcecado,<br />

quase tirânico (mais com os<br />

técnicos, mas também com<br />

os actores), que, nas<br />

palavras <strong>da</strong> sua assistente<br />

Katinka Farago, “<strong>da</strong>va tudo<br />

<strong>de</strong> si em ca<strong>da</strong> cena <strong>de</strong> ca<strong>da</strong><br />

filme e queria que todos à<br />

sua volta fizessem o mesmo”.<br />

Bibi An<strong>de</strong>rsson queixou-se,<br />

uma vez, que Bergman<br />

não gostava que as<br />

suas actrizes entrassem no<br />

Intenso, obcecado, quase tirânico:<br />

o novo retrato a corpo inteiro <strong>de</strong> Bergman<br />

“plateau” sem i<strong>de</strong>ias próprias<br />

sobre as personagens,<br />

mas que era capaz <strong>de</strong> discussões<br />

terríveis quando essas<br />

i<strong>de</strong>ias não coincidiam com as<br />

suas. E Harriet An<strong>de</strong>rsson<br />

aponta que o realizador<br />

parecia atribuir-lhe papéis<br />

consoante se estivessem a<br />

<strong>da</strong>r melhor ou pior na altura.<br />

Mas, apesar <strong>de</strong> tudo, to<strong>da</strong>s<br />

elas não trocariam por na<strong>da</strong><br />

a experiência <strong>de</strong> serem<br />

dirigi<strong>da</strong>s por Bergman -<br />

mesmo a faleci<strong>da</strong> Ingrid<br />

Bergman, que o esbofeteou<br />

nas ro<strong>da</strong>gens <strong>de</strong> “Sonata <strong>de</strong><br />

Outono”, ou Lena Olin, que<br />

incorreu no <strong>de</strong>sagrado do<br />

realizador por ter engravi<strong>da</strong>do<br />

durante os ensaios <strong>de</strong><br />

uma peça <strong>de</strong> Strindberg.<br />

Macnab aponta que nenhum<br />

outro realizador europeu<br />

seu contemporâneo terá<br />

Com Liv Ullmann,<br />

<strong>de</strong> quem teve uma filha


estado tão atento e sido tão<br />

compre-ensivo com a vi<strong>da</strong><br />

emocio-nal do sexo<br />

feminino e, a propósito, Liv<br />

Ullmann, mãe <strong>de</strong> Linn, a<br />

mais jovem <strong>da</strong>s nove filhas<br />

e filhos <strong>de</strong> Bergman, fez<br />

esta confis-são: “Pela<br />

primeira vez en-contrei um<br />

realizador que me <strong>de</strong>ixou<br />

expressar emo-ções e i<strong>de</strong>ias<br />

que mais nin-guém tinha<br />

visto em mim.”<br />

Jorge Mourinha<br />

David Byrne<br />

não larga a bicicleta<br />

AFP<br />

minha primeira tentativa, sentime<br />

liberto e com imensa<br />

energia. Foi estimulante circular<br />

pelas ruas sujas. No final dos<br />

anos 80 <strong>de</strong>scobri as bicicletas<br />

<strong>de</strong>smontáveis, e quando ou o<br />

meu trabalho ou a minha<br />

curiosi<strong>da</strong><strong>de</strong> me levam para<br />

outras partes do mundo<br />

costumo levar uma bicicleta<br />

comigo”, escreve ele.<br />

No novo livro, Byrne conta<br />

como foram as suas viagens em<br />

bicicleta em oito ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s:<br />

Londres, Berlim, Istambul,<br />

Buenos Aires, Manila, Sydney,<br />

São Francisco e Nova Iorque. E<br />

também por outros sítios <strong>da</strong><br />

América. O jornal britânico<br />

“The Guardian”, que já leu o<br />

livro, acredita que este tem<br />

muito em comum com “What I<br />

Talk About When I Talk About<br />

Running”, do romancista<br />

japonês Haruki Murakami (que<br />

vai ser publicado em Portugal<br />

pela Casa <strong>da</strong>s Letras). Ambos os<br />

livros reflectem o que os autores<br />

vão meditando e pensando<br />

enquanto atravessam as ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />

(um <strong>de</strong> bicicleta e outro a pé).<br />

Escreve também o crítico do<br />

“The Guardian” que este não é<br />

um livro on<strong>de</strong> se apren<strong>de</strong> a<br />

mu<strong>da</strong>r um pneu ou a tapar um<br />

furo. Não é um guia <strong>da</strong>queles<br />

em que nos dizem que tipo <strong>de</strong><br />

bicicleta comprar, apesar <strong>de</strong> no<br />

final do livro existir um capítulo<br />

com algumas dicas. A<br />

<strong>de</strong>termina<strong>da</strong> altura David Byrne<br />

está a falar dos ciclistas novaiorquinos<br />

e escreve: “Talvez<br />

seja irrealista mas acho que se<br />

os ciclistas querem ser mais<br />

bem tratados pelos motoristas e<br />

pelos peões têm que obe<strong>de</strong>cer<br />

às regras <strong>de</strong> trânsito tal como<br />

eles esperam que os carros o<br />

façam.” Um aviso sensato.<br />

Novas edições<br />

no centenário<br />

<strong>da</strong> <strong>morte</strong> <strong>de</strong> Eucli<strong>de</strong>s<br />

<strong>da</strong> Cunha<br />

O centenário <strong>da</strong> <strong>morte</strong> <strong>de</strong><br />

Eucli<strong>de</strong>s <strong>da</strong> Cunha, autor <strong>de</strong> “Os<br />

Sertões” (obra <strong>de</strong> ciência e<br />

literatura), está a ser assinalado<br />

no Brasil <strong>de</strong> várias maneiras.<br />

Jornalista, escritor, poeta,<br />

historiador, engenheiro,<br />

Eucli<strong>de</strong>s <strong>da</strong> Cunha morreu no<br />

dia 15 <strong>de</strong> Agosto <strong>de</strong> 1909 numa<br />

troca <strong>de</strong> tiros no subúrbio<br />

carioca <strong>de</strong> Pie<strong>da</strong><strong>de</strong>. Tinha 43<br />

anos e foi morto por<br />

Dilermando <strong>de</strong> Assis, em quem<br />

tinha atirado primeiro, quando<br />

confirmou que este era amante<br />

<strong>da</strong> sua mulher, Ana Ribeiro.<br />

Além <strong>da</strong>s exposições “Eucli<strong>de</strong>s<br />

<strong>da</strong> Cunha, uma poética do<br />

espaço brasileiro” na Biblioteca<br />

Nacional e “Eucli<strong>de</strong>s, um<br />

Eucli<strong>de</strong>s <strong>da</strong> Cunha<br />

está a ser re<strong>de</strong>scoberto<br />

brasileiro” na Aca<strong>de</strong>mia<br />

Brasileira <strong>de</strong> Letras, vão ser<br />

publicados vários livros. Em<br />

Setembro, divulgou o<br />

suplemento “Prosa & Verso” do<br />

jornal “O Globo” <strong>de</strong>sta semana,<br />

vai ser edita<strong>da</strong> na editora Ateliê<br />

Editorial a biografia<br />

“Eucli<strong>de</strong>s <strong>da</strong> Cunha: Uma<br />

Odisseia nos Trópicos”,<br />

escrita pelo professor <strong>de</strong><br />

literatura norte-americano<br />

Fre<strong>de</strong>ric Amory, que morreu<br />

em Fevereiro. Também nos<br />

próximos meses vai para as<br />

livrarias brasileiras “Eucli<strong>de</strong>s<br />

<strong>da</strong> Cunha: Poesia Reuni<strong>da</strong>”,<br />

uma antologia organiza<strong>da</strong> pelos<br />

professores Francisco Foot<br />

Hardman e Leopoldo M.<br />

Bernucci e edita<strong>da</strong> pela Unesp.<br />

É uma edição comenta<strong>da</strong> que<br />

junta num só volume a<br />

produção poética <strong>de</strong> Eucli<strong>de</strong>s,<br />

que estava dispersa, bem como<br />

algum material inédito. São 133<br />

poemas (inéditos, dispersos e<br />

variantes <strong>de</strong> alguns poemas).<br />

Estes professores universitários<br />

<strong>de</strong>moraram <strong>de</strong>z anos a concluir<br />

este projecto: ao “Prosa &<br />

Verso”, Foot Hardman explicou<br />

que “a letra <strong>de</strong>le é dificílima, o<br />

estado do material não é<br />

excelente, o trabalho <strong>de</strong><br />

transcrição dos manuscritos<br />

não foi fácil.” Por fim, a editora<br />

brasileira Nova Aguilar vai<br />

reeditar a “Obra Completa”,<br />

com organização do professor<br />

Paulo Roberto Pereira.<br />

Mike Nichols<br />

leva mais um<br />

romance<br />

<strong>de</strong> Highsmith<br />

ao cinema<br />

“Águas Profun<strong>da</strong>s”,<br />

o romance que<br />

Patricia Highsmith<br />

publicou em 1957,<br />

vai ser a<strong>da</strong>ptado ao<br />

cinema por Mike<br />

Nichols numa<br />

produção <strong>da</strong> Fox<br />

2000. Quem o diz é a<br />

revista “Variety”, que<br />

sabe ain<strong>da</strong> que a a<strong>da</strong>ptação<br />

do romance caberá ao<br />

argumentista Joe Penhall, que<br />

recentemente também escreveu<br />

o argumento que a<strong>da</strong>pta ao<br />

cinema “A Estra<strong>da</strong>”, <strong>de</strong> Cormac<br />

McCarthy. O romance escrito<br />

pela autora <strong>de</strong> “O Talentoso Mr.<br />

Ripley” (também já a<strong>da</strong>ptado ao<br />

cinema) conta a história <strong>de</strong> um<br />

casal norte-americano, Victor<br />

Van Allen e Melin<strong>da</strong>, que<br />

parecia ter um casamento<br />

perfeito. Mas Melin<strong>da</strong> tem<br />

amantes e tudo se complica<br />

quando estes começam a<br />

morrer.<br />

“Bleach” inclui um segundo<br />

CD com um registo inédito <strong>de</strong> 1990<br />

Depois do labirinto<br />

<strong>de</strong> “Closer”, o labirinto<br />

<strong>de</strong> “Águas Profun<strong>da</strong>s”<br />

Primeiro álbum<br />

dos Nirvana em<br />

reedição <strong>de</strong> luxo<br />

Há mais um álbum mítico a fazer 20<br />

anos em 2009 (há umas semanas<br />

estávamos aqui a falar <strong>de</strong><br />

“Doolittle”, dos Pixies) e a ter direito<br />

a uma reedição <strong>de</strong> luxo. “Bleach”, a<br />

primeira coisa que os Nirvana<br />

fizeram juntos, vai voltar a sair no<br />

Outono (a <strong>da</strong>ta certa é 3 <strong>de</strong> Novembro),<br />

agora em versão revista e<br />

aumenta<strong>da</strong>, com o selo <strong>da</strong> Sub Pop,<br />

a editora original <strong>da</strong> ban<strong>da</strong> <strong>de</strong> Kurt<br />

Cobain. O novo “Bleach” vai ser um<br />

CD duplo que inclui, além <strong>da</strong>s 13<br />

canções do disco, o registo inédito<br />

<strong>de</strong> uma actuação dos Nirvana no<br />

Pine Street Theatre <strong>de</strong> Portland, a 9<br />

<strong>de</strong> Fevereiro <strong>de</strong> 1990 (“featuring”,<br />

por exemplo, “About a girl” e uma<br />

“cover” <strong>de</strong> “Molly’s Lips”, dos<br />

Vaselines) e um livrinho <strong>de</strong> 16<br />

páginas com fotografias que nunca<br />

foram mostra<strong>da</strong>s. Tal como o álbum<br />

original, o duplo LP também vai<br />

estar disponível em vinil branco.<br />

Jack Endino, que em 1989 gravou<br />

“Bleach” em apenas 30 horas, foi o<br />

produtor chamado para remasterizar<br />

a reedição. Já não tem gran<strong>de</strong>s<br />

memórias <strong>da</strong>s sessões <strong>de</strong> gravação<br />

mas tem memória <strong>de</strong> ter passado a<br />

ser reconhecido por isso, disse à<br />

“Rolling Stone”: “Quando conheci o<br />

Iggy Pop, ele disse-me: ‘Ah sim, tu<br />

fizeste aquele gran<strong>de</strong> álbum dos<br />

Nirvana’. Estava efusivo, completamente<br />

pasmado, e não parava <strong>de</strong><br />

dizer que adorava aquilo”.<br />

Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 3<br />

MARK SELIGER/CORBIS OUTLINE


TIMOTHY A. CLARY/ AFP<br />

E para on<strong>de</strong> vai a<br />

<strong>da</strong>nça quando não<br />

estamos a olhar?<br />

É imaginar pinturas a serem retira<strong>da</strong>s <strong>da</strong>s pare<strong>de</strong>s dos museus ou livros<br />

a sair <strong>da</strong>s lojas e bibliotecas no dia <strong>da</strong> <strong>morte</strong> dos seus autores. É imaginar<br />

um poema a não voltar a ser dito. Na <strong>da</strong>nça, é assim – com a <strong>morte</strong>,<br />

as luzes <strong>de</strong> cena começam lentamente a apagar-se. Nos últimos meses<br />

per<strong>de</strong>mos Pina Bausch e Merce Cunningham, dois gigantes. Alguém sabe<br />

o que vai acontecer às obras com que mu<strong>da</strong>ram o mundo? Vanessa Rato<br />

4 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon


“É preciso amar a <strong>da</strong>nça para continuar<br />

a <strong>da</strong>nçar. Não nos <strong>de</strong>volve na<strong>da</strong>,<br />

nenhuns manuscritos para guar<strong>da</strong>r,<br />

nenhumas pinturas para pendurar nos<br />

museus, nenhuns poemas para serem<br />

impressos e vendidos, na<strong>da</strong> a não ser<br />

aquele momento fugaz em que nos sentimos<br />

vivos. Não é para almas instáveis.”<br />

Merce Cunningham<br />

Primeiro foi a surpresa, o choque,<br />

<strong>de</strong>pois veio o pânico, com a mesma<br />

pergunta a passar pela cabeça <strong>de</strong> to<strong>da</strong><br />

a gente: e agora?<br />

Afinal, a quem pertence e como se<br />

preserva um tipo <strong>de</strong> legado que, por<br />

<strong>de</strong>finição, é imaterial, um património<br />

como a <strong>da</strong>nça, que existe apenas no<br />

momento em que o corpo <strong>de</strong> alguém<br />

a recebe? A <strong>da</strong>nça é uma questão <strong>de</strong><br />

apropriação e, por isso mesmo, <strong>de</strong><br />

constante contaminação e transformação.<br />

Uma dinâmica <strong>de</strong> vi<strong>da</strong>. O contrário<br />

<strong>de</strong> <strong>morte</strong>. E, contudo...<br />

26 <strong>de</strong> Julho <strong>de</strong> 2009: Merce Cunningham,<br />

um dos génios maiores <strong>da</strong><br />

transformação <strong>da</strong> <strong>da</strong>nça numa forma<br />

<strong>de</strong> arte mo<strong>de</strong>rna, morre em casa, em<br />

Nova Iorque, aos 90 anos.<br />

30 <strong>de</strong> Junho <strong>de</strong> 2009: Pina Bausch,<br />

a voz mais transformadora e influente<br />

<strong>da</strong> <strong>da</strong>nça europeia <strong>da</strong>s últimas três<br />

déca<strong>da</strong>s, morre inespera<strong>da</strong>mente em<br />

Wuppertal, na Alemanha, aos 68 anos,<br />

apenas cinco dias <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> se saber<br />

doente com um cancro.<br />

21 <strong>de</strong> Novembro <strong>de</strong> 2007: Maurice<br />

Béjart, o último gran<strong>de</strong> coreógrafo<br />

dos revolucionários Ballets Russes e<br />

ele próprio um dos mais influentes<br />

autores <strong>da</strong> Europa <strong>da</strong>s déca<strong>da</strong>s <strong>de</strong><br />

1960 e 1970, morre em Lausanne, na<br />

Suíça, aos 80 anos, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> um mês<br />

<strong>de</strong> tratamentos cardíacos e renais intensivos.<br />

Capa<br />

Todos eles. E antes <strong>de</strong>les tantos outros.<br />

Martha Graham, José Limón, Alvin<br />

Ailey, Kurt Joos, Dominique Bagouet...<br />

É a nossa memória a <strong>de</strong>saparecer<br />

aos poucos, e tentar travar esse<br />

processo tem sido como tentar segurar<br />

um punhado <strong>de</strong> areia <strong>de</strong>masiado<br />

volumoso para a nossa mão. Tudo a<br />

escapar-se-nos por entre os <strong>de</strong>dos.<br />

“A tragédia <strong>da</strong> <strong>da</strong>nça é que 99 por<br />

cento <strong>da</strong>s peças produzi<strong>da</strong>s <strong>de</strong>saparecem<br />

passados cinco anos”, dizia-nos<br />

a historiadora <strong>de</strong> <strong>da</strong>nça norte-americana<br />

Lynn Garafola há apenas três<br />

meses, por altura do centenário do<br />

nascimento do Ballets Russes, a companhia-revolução<br />

cria<strong>da</strong> por Sergei<br />

Diaghilev na Paris <strong>de</strong> 1909. “Quantas<br />

peças sobrevivem a uma tempora<strong>da</strong>?<br />

Como se passam reportórios quando<br />

as instituições estão permanentemente<br />

a colapsar?”, perguntava-se. Foi<br />

<strong>de</strong>pois que começaram as <strong>morte</strong>s.<br />

Merce foi previ<strong>de</strong>nte e taxativo.<br />

Com ca<strong>da</strong> vez menos energia, confinado<br />

a uma ca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> ro<strong>da</strong>s <strong>de</strong>vido<br />

à artrite que tinha há déca<strong>da</strong>s e longe<br />

<strong>da</strong> figura alta e esguia <strong>de</strong> longo pescoço<br />

cuja invulgar graciosi<strong>da</strong><strong>de</strong> foi<br />

em tempos compara<strong>da</strong> à <strong>de</strong> Nijinsky,<br />

sabia que o fim estava próximo. Organizou<br />

tudo.<br />

Dois meses antes <strong>da</strong> sua <strong>morte</strong><br />

anunciou uma estratégia <strong>de</strong> preservação<br />

patrimonial sem prece<strong>de</strong>ntes. Um<br />

Living Legacy Plan segundo o qual<br />

<strong>de</strong>verão ser angariados junto <strong>de</strong> mecenas<br />

oito milhões <strong>de</strong> dólares a aplicar<br />

em acções metodicamente <strong>de</strong>linea<strong>da</strong>s:<br />

a elaboração <strong>de</strong> um centro <strong>de</strong><br />

documentação do seu percurso dos<br />

anos 1940 à actuali<strong>da</strong><strong>de</strong>; a remontagem<br />

<strong>de</strong> trabalhos seminais; uma última<br />

digressão mundial <strong>da</strong> Merce Cunningham<br />

Dance Company ao longo<br />

dos próximos dois anos; o encerramento<br />

<strong>da</strong> companhia no regresso a<br />

casa, com um plano <strong>de</strong> reconversão<br />

<strong>de</strong> carreiras; e, por fim, a transferência<br />

<strong>de</strong> todos os bens para o Merce Cunningham<br />

Trust, que fica com a gestão<br />

do legado do coreógrafo.<br />

“O Living Legacy Plan é abrangente,<br />

multifacetado e – como o próprio Merce<br />

– pioneiro. Oferece um novo mo<strong>de</strong>lo<br />

para companhias <strong>de</strong> <strong>da</strong>nça e outras<br />

organizações dirigi<strong>da</strong>s por artistas<br />

em trânsito para uma existência pósfun<strong>da</strong>dor”,<br />

dizia em Abril Trevor Carlson,<br />

director executivo <strong>da</strong> Cunningham<br />

Dance Foun<strong>da</strong>tion.<br />

Agora, sem Merce, há quem diga<br />

que vai ser difícil conseguir fundos<br />

para um projecto a três anos. Mas,<br />

com 3,5 milhões <strong>de</strong> dólares reunidos,<br />

os directamente envolvidos mostramse<br />

optimistas. “A companhia já tem<br />

perspectivas e está confiante <strong>de</strong> que<br />

vai conseguir os fundos necessários”,<br />

dizia-nos há três semanas Leah San<strong>da</strong>ls,<br />

assessora <strong>de</strong> imprensa <strong>da</strong> fun<strong>da</strong>ção.<br />

Segundo Leah, os 14 bailarinos neste<br />

momento no activo estu<strong>da</strong>ram<br />

com Merce e estão preparados para<br />

continuar a ensinar a sua técnica,<br />

<strong>da</strong>ndo continui<strong>da</strong><strong>de</strong> a uma linguagem<br />

<strong>de</strong> excelência extrema, enraiza<strong>da</strong> numa<br />

i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> movimento puro, seco<br />

<strong>de</strong> qualquer teatrali<strong>da</strong><strong>de</strong> ou pesquisa<br />

psicológica. É a estes bailarinos que<br />

caberá também assegurar a digressão<br />

já em curso e que em Novembro chega<br />

à Europa, incluindo a apresentação<br />

<strong>de</strong> peças como “Suite for Five”<br />

(1956-1958), a mais antiga do reportório<br />

<strong>da</strong> companhia e com figurinos<br />

<strong>de</strong> Robert Rauschenberg (Mónaco,<br />

dias 14 e 15 <strong>de</strong> Abril) e “Squaregame”,<br />

(1976), uma obra muito raramente<br />

vista, estando por remontar quase<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> a <strong>da</strong>ta <strong>da</strong> sua criação (Charleroi,<br />

Bélgica, 12 a 14 <strong>de</strong> Novembro).<br />

Foi o plano <strong>de</strong> Merce, o visionário<br />

que <strong>de</strong>ixou tudo o que pô<strong>de</strong> – textos,<br />

registos vi<strong>de</strong>ográficos <strong>de</strong> espectáculos,<br />

aulas, ensaios e até uma série<br />

documental a ser difundi<strong>da</strong> via Internet<br />

em que as suas motivações e técnicas<br />

são explica<strong>da</strong>s quer em testemunho<br />

directo quer pela voz <strong>de</strong> especialistas.<br />

Palavras <strong>de</strong>le: “É <strong>de</strong> facto um problema<br />

preservar os elementos <strong>de</strong><br />

uma forma <strong>de</strong> arte que é realmente<br />

evanescente, que é realmente como<br />

a água.”<br />

Como a água, pois: perante as sucessivas<br />

<strong>morte</strong>s, a conheci<strong>da</strong> crítica<br />

<strong>de</strong> <strong>da</strong>nça Judith Mackrell encontrou<br />

palavras particularmente clarivi<strong>de</strong>ntes<br />

para expressar essa espécie <strong>de</strong><br />

evaporação sistemática <strong>da</strong> <strong>da</strong>nça: “É<br />

imaginar a situação em que as pinturas<br />

<strong>de</strong> Rauschenberg ou Bacon fossem<br />

<strong>de</strong>sci<strong>da</strong>s <strong>da</strong>s pare<strong>de</strong>s no momento<br />

“A tragédia <strong>da</strong> <strong>da</strong>nça<br />

é que 99 por cento<br />

<strong>da</strong>s peças produzi<strong>da</strong>s<br />

<strong>de</strong>saparecem<br />

passados cinco anos.<br />

Quantas peças<br />

sobrevivem a uma<br />

tempora<strong>da</strong>?”<br />

Lynn Garafola<br />

Martha<br />

Graham, um<br />

dos casos<br />

mais<br />

controversos<br />

<strong>de</strong><br />

transmissão<br />

do reportório<br />

Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 5


6 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon<br />

Martha Graham<br />

Um prece<strong>de</strong>nte<br />

jurídico<br />

Com uma influência artística<br />

comparável à <strong>de</strong> Picasso,<br />

Stravinsky ou James Joyce,<br />

Martha Graham foi a gran<strong>de</strong><br />

pioneira <strong>da</strong> <strong>da</strong>nça mo<strong>de</strong>rna<br />

nos Estado Unidos, autora<br />

<strong>da</strong> primeira alternativa ao<br />

vocabulário clássico a tornarse<br />

numa técnica usa<strong>da</strong> por<br />

companhias <strong>de</strong> todo o mundo.<br />

Tinha 96 anos quando morreu<br />

em sua casa, em Manhattan,<br />

a 1 <strong>de</strong> Abril <strong>de</strong> 1991, com uma<br />

paragem cardíaca, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong><br />

meses <strong>de</strong> tratamento hospitalar<br />

a uma pneumonia contraí<strong>da</strong><br />

durante uma digressão recente<br />

com a sua companhia pela<br />

Europa <strong>de</strong> Leste. Professora<br />

<strong>de</strong> futuros bailarinos <strong>de</strong><br />

coreógrafos <strong>de</strong> renome como<br />

Alvin Ailey, Twyla Tharp, Paul<br />

Taylor, Merce Cunningham e<br />

Mark Morris – mas também <strong>de</strong><br />

actores como Gregory Peck e<br />

Bette Davis... –, Graham escolheu<br />

em testamento um her<strong>de</strong>iro<br />

universal: Ron Protas, seu<br />

companheiro há 30 anos.<br />

Graham e Protas conheceramse<br />

em 1967. Ele era um estu<strong>da</strong>nte<br />

<strong>de</strong> direito e fotógrafo amador<br />

<strong>de</strong> cerca <strong>de</strong> 20 anos. Ela tinha<br />

70 e problemas <strong>de</strong> <strong>de</strong>pressão e<br />

alcoolismo ligados à retira<strong>da</strong><br />

dos palcos.<br />

Segundo alguns relatos,<br />

apesar <strong>de</strong> não ser uma figura<br />

estima<strong>da</strong> pelos restantes<br />

colaboradores <strong>de</strong> Graham,<br />

Protas terá sido o responsável<br />

pela recuperação <strong>da</strong> coreógrafa<br />

e, com a sua <strong>morte</strong>, acabaria<br />

por se tornar director-geral do<br />

Centro <strong>de</strong> Dança Contemporânea<br />

Martha Graham, lugar que<br />

<strong>de</strong>ixaria em ruptura em 2000,<br />

quando se lançou numa batalha<br />

legal multimilionária pelos<br />

direitos <strong>da</strong>s peças assina<strong>da</strong>s<br />

pela sua companheira.<br />

Um primeiro tribunal, um<br />

tribunal <strong>de</strong> recurso e o Supremo:<br />

todos chegaram à conclusão <strong>de</strong><br />

que Graham não podia <strong>de</strong>ixar<br />

a Protas o que não era <strong>de</strong>la,<br />

todos chegaram à conclusão<br />

<strong>de</strong> que, como assalaria<strong>da</strong>,<br />

Graham trabalhava para a<br />

sua companhia, sendo esta<br />

a legítima proprietária <strong>de</strong><br />

quaisquer direitos <strong>de</strong> autor.<br />

Para os responsáveis do centro<br />

e <strong>da</strong> companhia foi um alívio: a<br />

<strong>de</strong>cisão permitiu-lhes continuar<br />

a levar à cena os espectáculos<br />

<strong>de</strong> sempre. Já Protas, que<br />

recebeu os direitos <strong>de</strong> apenas<br />

duas <strong>da</strong>s cerca <strong>de</strong> 180 peças<br />

assina<strong>da</strong>s por Graham e acabou<br />

responsabilizado pelos prejuízos<br />

causados ao centro pela acção<br />

legal, viu o caso como um<br />

aviso aos artistas: “Espero que<br />

percebam que estão em risco. Ela<br />

acreditava que os seus ‘ballets’<br />

lhe pertenciam”, explicou na<br />

altura. Sublinhando: “Estou<br />

zangado com o que está a ser<br />

feito supostamente em nome <strong>de</strong><br />

Martha e dos seus <strong>de</strong>sejos. Com<br />

to<strong>da</strong> a humil<strong>da</strong><strong>de</strong>, eu fui a pessoa<br />

mais próxima <strong>de</strong>la nos últimos<br />

30 anos <strong>da</strong> sua vi<strong>da</strong>. É absurdo<br />

pensar que ela tenha morrido a<br />

consi<strong>de</strong>rar-se uma assalaria<strong>da</strong>.”<br />

Janet Eilbert, actual directora<br />

artística <strong>da</strong> companhia,<br />

reconhece que, para além do<br />

Graham <strong>de</strong>ixou<br />

todos os direitos<br />

<strong>da</strong>s suas peças<br />

a Ron Protas, o seu<br />

companheiro; os<br />

tribunais anularam<br />

a <strong>de</strong>cisão<br />

testamento, Graham não <strong>de</strong>ixou<br />

qualquer <strong>de</strong>claração expressa<br />

sobre o que pretendia que<br />

acontecesse ao seu legado, mas<br />

fala <strong>de</strong> “<strong>de</strong>clarações implícitas”:<br />

“Martha Graham criou o<br />

centro precisamente para que<br />

este protegesse o seu legado.<br />

Era assalaria<strong>da</strong> do centro e<br />

<strong>de</strong>monstrou ao longo dos anos<br />

que queria ver o seu legado<br />

vivo, renovado: documentava<br />

o seu trabalho em filme,<br />

ensinava a sua técnica – as suas<br />

acções <strong>de</strong>monstravam as suas<br />

intenções para o futuro.”<br />

A Protas foram atribuídos<br />

direitos sobre “Seraphic<br />

Dialogue”, uma obra <strong>de</strong> 1955<br />

basea<strong>da</strong> na história <strong>de</strong> Joana<br />

D’Arc, e “Acrobats of God”, <strong>da</strong>ta<strong>da</strong><br />

<strong>de</strong> 1960 (“acrobatas <strong>de</strong> Deus”<br />

era o que Graham chamava aos<br />

bailarinos) – os direitos sobre as<br />

coreografias, porque os direitos<br />

sobre os cenários e figurinos<br />

<strong>da</strong>s mesmas peças ficaram com<br />

o centro. Quando perguntamos<br />

a Janet se imagina ce<strong>de</strong>r esses<br />

materiais a Protas para que<br />

pelo menos as peças possam<br />

continuar a ser feitas, ain<strong>da</strong><br />

que por outras companhias, ela<br />

respon<strong>de</strong>: “Não imagino <strong>de</strong>ixá-lo<br />

ficar com eles. Esperamos que<br />

um dia ele nos <strong>de</strong>ixe a nós <strong>da</strong>nçar<br />

essas peças.” V.R.<br />

Vaslav<br />

Nijinsky<br />

<strong>da</strong> <strong>morte</strong> <strong>de</strong>sses artistas; é imaginar<br />

a situação em que os romances<br />

<strong>de</strong> Saul Bellow fossem retirados <strong>da</strong>s<br />

estantes ou a música <strong>de</strong> Stravinsky<br />

fosse silencia<strong>da</strong>. Nenhuma outra forma<br />

<strong>de</strong> arte aceitaria por um segundo<br />

que a <strong>morte</strong> [<strong>de</strong> um autor] implicasse<br />

a possível <strong>morte</strong> <strong>da</strong> sua obra.”<br />

Da criação ao reportório<br />

Po<strong>de</strong>rá parecer um exagero falar em<br />

silêncio perante um plano como o<br />

<strong>de</strong>ixado por Merce, mas parece bem<br />

menos um exagero perante a incerteza<br />

que paira sobre o Tanztheater Wuppertal<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> a <strong>morte</strong> <strong>de</strong> Pina. “A<br />

única coisa que sabemos é que vamos<br />

manter as <strong>da</strong>tas agen<strong>da</strong><strong>da</strong>s”, dizia-nos<br />

há dias Ursula Popp, porta-voz <strong>da</strong><br />

companhia, explicando que “na<strong>da</strong> do<br />

resto está <strong>de</strong>cidido”.<br />

Depois <strong>de</strong> semanas em que a companhia<br />

teve a sua página na Internet<br />

suspensa, nesta vê-se agora um plano<br />

<strong>de</strong> espectáculos até Julho <strong>de</strong> 2010. Segundo<br />

Popp, Pina não <strong>de</strong>ixou qualquer<br />

testamento ou vonta<strong>de</strong> escrita<br />

no que toca ao seu legado: “É difícil<br />

dizer. Ela sempre quis que [a companhia]<br />

continuasse, mas não havia qualquer<br />

indicação específica.”<br />

Entre os bailarinos, o francês Dominique<br />

Mercy e a espanhola Nazareth<br />

Pana<strong>de</strong>ro são os mais velhos,<br />

estando em Wuppertal praticamente<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> a fun<strong>da</strong>ção <strong>da</strong> companhia, em<br />

1973; conhecedores profundos <strong>da</strong>s<br />

metodologias e motivações <strong>da</strong> coreógrafa,<br />

seriam sucessores possíveis.<br />

Mas à frente <strong>de</strong> quê? De uma companhia<br />

<strong>de</strong> autor feita <strong>de</strong> reportório?<br />

Para esse cenário, há o exemplo do<br />

Béjart Ballet Lausanne on<strong>de</strong> nos últimos<br />

dois anos tem assumido as ré<strong>de</strong>as<br />

o bailarino francês Gil Roman,<br />

que esteve ao lado do seu mestre <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />

os anos 1960 até ao fim.<br />

“As novas peças serão assina<strong>da</strong>s por<br />

ele, como já aconteceu em Dezembro<br />

<strong>de</strong> 2008, e o reportório será uma mistura<br />

entre herança e novas produções”,<br />

diz-nos uma porta-voz <strong>da</strong> companhia.<br />

No site, contudo, há <strong>da</strong>tas<br />

marca<strong>da</strong>s apenas até Outubro <strong>de</strong>ste<br />

ano – o que resta <strong>da</strong> companhia <strong>de</strong> um<br />

autor que nos últimos tempos era visto<br />

como pouco mais do que “kitsch”<br />

mas que assinou obras <strong>de</strong> referência<br />

como “Sinfonia para um Homem Só”<br />

(1955), o primeiro “ballet” <strong>de</strong> sempre<br />

a utilizar música concreta.<br />

José Sasportes, historiador <strong>de</strong> <strong>da</strong>nça<br />

próximo <strong>de</strong> Wuppertal, traça um<br />

quadro igualmente negro para a companhia<br />

<strong>de</strong> Pina: consi<strong>de</strong>ra “bastante<br />

provável” que não resista à falta <strong>de</strong><br />

novas produções, base primeira <strong>da</strong><br />

sua subsistência. “Durante um ano,<br />

dois, é natural que o interesse do público<br />

se mantenha, até como homenagem;<br />

<strong>de</strong>pois, quando não houver<br />

‘tournées’ [com novas produções], a<br />

companhia acaba.”<br />

Optimismo zero: na opinião <strong>de</strong> Sasportes,<br />

encerra<strong>da</strong> a companhia, <strong>da</strong>s<br />

cerca <strong>de</strong> 40 obras assina<strong>da</strong>s por Bausch<br />

ao longo dos últimos 36 anos o<br />

mais expectável é que apenas três<br />

subsistam – “Orfeu e Eurídice” e “A<br />

Sagração <strong>da</strong> Primavera”, ambas <strong>de</strong><br />

1975 e ambas ofereci<strong>da</strong>s à Ópera <strong>de</strong><br />

Paris, cuja companhia Pina instruiu<br />

pessoalmente e que em qualquer altura<br />

as po<strong>de</strong>rá ter em cena, e “Kontakthof”,<br />

uma peça <strong>de</strong> 1978 que a<br />

coreógrafa foi montando com diferentes<br />

grupos <strong>de</strong> intérpretes.<br />

Quase quatro <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> peças<br />

vota<strong>da</strong>s ao <strong>de</strong>saparecimento, incluindo<br />

ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros marcos <strong>da</strong> contem-


“Durante um ano,<br />

dois, é natural que<br />

o interesse do público<br />

se mantenha, até<br />

como homenagem;<br />

<strong>de</strong>pois, quando<br />

não houver novas<br />

produções,<br />

a companhia acaba”<br />

José Sasportes<br />

poranei<strong>da</strong><strong>de</strong> como “Café Müller”, <strong>de</strong><br />

1978 e a única peça em que vimos<br />

Pina <strong>da</strong>nçar, ou “Palermo, Palermo”,<br />

<strong>de</strong> 1989, a primeira <strong>da</strong> longa série <strong>de</strong><br />

peças sobre ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s que acabaria por<br />

incluir <strong>Lisboa</strong>, com “Mazurca Fogo”,<br />

em 1998. Chocante? É o que tem vindo<br />

a acontecer <strong>de</strong>s<strong>de</strong> sempre. Afinal,<br />

quantas peças <strong>de</strong> Marius Petipa chegaram<br />

até nós?<br />

À frente do Teatro Mariinsky, o “ballet”<br />

imperial <strong>de</strong> São Petersburgo, entre<br />

1871 e 1903, on<strong>de</strong> ensinou e dirigiu bailarinos<br />

míticos como Nijinsky e Anna<br />

Pavlova, Petipa assinou mais <strong>de</strong> 50<br />

produções, trabalhos financiados com<br />

milhões <strong>de</strong> rublos pela corte russa, à<br />

época a mais rica <strong>da</strong> Europa. Se o “ballet”<br />

é hoje entendido como uma forma<br />

<strong>de</strong> arte russa é, precisamente, <strong>de</strong>vido<br />

a Petipa, que resgatou <strong>da</strong> <strong>de</strong>cadência<br />

a tradição francesa e italiana, elevando-a<br />

ao nível <strong>de</strong> excelência e <strong>de</strong> fausto<br />

que hoje i<strong>de</strong>ntificamos como o apogeu<br />

do clássico. E, contudo, para além <strong>de</strong><br />

versões <strong>de</strong> “Giselle”, “Coppélia” e “O<br />

Lago dos Cisnes”, remontagens <strong>de</strong><br />

obras pré-existentes, dos trabalhos <strong>de</strong><br />

Petipa o público <strong>de</strong> hoje i<strong>de</strong>ntificará<br />

pouco mais do que “A Bela Adormeci<strong>da</strong>”,<br />

<strong>de</strong> 1890, “O Quebra-Nozes”, <strong>de</strong><br />

1892, e “Raimun<strong>da</strong>”, <strong>de</strong> 1898.<br />

Mais: apenas uma excepção entre<br />

autores do século XIX – a constituí<strong>da</strong><br />

por August Bournonville, à frente do<br />

Royal Danish Ballet entre 1828 e 1879<br />

on<strong>de</strong> coreografou cerca <strong>de</strong> 50 peças,<br />

<strong>da</strong>s quais à volta <strong>de</strong> 12 continuam hoje<br />

a ser interpreta<strong>da</strong>s pela companhia,<br />

uma <strong>da</strong>s mais antigas do mundo.<br />

É ain<strong>da</strong> José Sasportes quem alerta:<br />

“A história <strong>da</strong> <strong>da</strong>nça sempre se<br />

construiu sobre o efémero, sempre<br />

se <strong>de</strong>itou fora o que se fazia. Até ao<br />

fim do século XIX o que interessava<br />

era o novo. Mas os coreógrafos tinham<br />

discípulos, mantinha-se o modo<br />

<strong>de</strong> fazer.”<br />

Começar do zero<br />

Discípulos, uma tradição passa<strong>da</strong> <strong>de</strong><br />

geração em geração: era a lógica anterior<br />

à hoje omnipresente estratégia<br />

<strong>da</strong>s companhias centra<strong>da</strong>s num autor<br />

e seus produtores que, para conter<br />

custos, contratam intérpretes apenas<br />

no momento <strong>da</strong>s novas criações; é a<br />

lógica que começou a morrer com as<br />

gran<strong>de</strong>s companhias <strong>de</strong> reportório,<br />

uma figura hoje em extinção perante<br />

a carência <strong>de</strong> apoios. O tipo <strong>de</strong> carência<br />

que levou, entre outras, à dissolução<br />

do Frankfurt Ballet, fun<strong>da</strong>do em<br />

1984 por William Forsythe, talvez o<br />

mais brilhante dos coreógrafos que<br />

continuam a trabalhar e reinventar o<br />

vocabulário clássico.<br />

Depois <strong>de</strong> 20 anos à frente do<br />

Frankfurt Ballet, Forsythe enten<strong>de</strong>u<br />

que os cortes <strong>de</strong> financiamentos estatais<br />

com que se confrontava com-<br />

PAULO PIMENTA<br />

Pina Bausch<br />

em “Café<br />

Muller”<br />

(1978), a única<br />

peça em que a<br />

vimos <strong>da</strong>nçar<br />

e que ain<strong>da</strong><br />

em 2008 repôs<br />

em <strong>Lisboa</strong><br />

prometiam irremediavelmente a quali<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

do seu projecto artístico. Optou<br />

por abandonar a companhia,<br />

criando outra, a Forsythe Company,<br />

com apenas 18 bailarinos, contra os<br />

42 com que o Ballet <strong>de</strong> Frankfurt começou<br />

e os 34 a que estava reduzido<br />

na altura <strong>da</strong> dissolução.<br />

“O que lamento é a falta <strong>de</strong> continui<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

numa estrutura que estava<br />

tão bem organiza<strong>da</strong>”, disse à época<br />

o coreógrafo. Explicando: “Ao longo<br />

dos últimos 20 anos, passaram pela<br />

companhia 130 bailarinos. O conhecimento<br />

foi passado. A quebra disso<br />

é <strong>de</strong>vastadora.”<br />

Vera Mantero, uma <strong>da</strong>s mais consi<strong>de</strong>ra<strong>da</strong>s<br />

autoras <strong>da</strong> chama<strong>da</strong> Nova<br />

Dança Portuguesa, menciona uma<br />

<strong>da</strong>s consequências mais <strong>de</strong>sconcertantes<br />

<strong>da</strong> falta <strong>de</strong> passagem <strong>de</strong> conhecimento<br />

na sua área: a permanente<br />

sensação <strong>de</strong> se estar a começar do<br />

zero (perspectiva dos criadores); isso<br />

ou o sentimento cíclico <strong>de</strong> estar a viver<br />

um “déjà vu” ten<strong>de</strong>ncialmente<br />

mais pobre do que a experiência original,<br />

acrescentaríamos nós (perspectiva<br />

do público).<br />

Uma simples biblioteca: “Quando<br />

fui para Nova Iorque [nos anos 1980],<br />

no fim, quando já nem estava a fazer<br />

aulas <strong>de</strong> <strong>da</strong>nça, passava a vi<strong>da</strong> na biblioteca<br />

<strong>de</strong> artes performativas do<br />

Lincoln Center, a ver to<strong>da</strong>s aquelas<br />

peças fantásticas dos arquivos <strong>de</strong> ví<strong>de</strong>o.<br />

Não há transmissão <strong>de</strong> conhecimento,<br />

não há ensino sem este tipo<br />

<strong>de</strong> ferramenta. Desaparece tudo o que<br />

foi feito sem que as coisas novas fiquem<br />

também regista<strong>da</strong>s.”<br />

Em Nova Iorque há o Licoln Center<br />

e a Public Library, em Paris o arquivo<br />

do Centre National <strong>de</strong> La Danse, com<br />

fundos que vão do espólio <strong>de</strong> Lisa<br />

MUSEU DO ORIENTE<br />

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Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 7


“Comer o<br />

Coração”, <strong>de</strong><br />

Vera Mantero<br />

e Rui Chafes<br />

Ullman, colaboradora <strong>de</strong> Kurt Jooss<br />

e Rudolf Laban, a material <strong>de</strong> coreógrafos<br />

<strong>de</strong> hoje como Jérôme Bel, o<br />

Fundo Rodolf Noureyev e o Arquivo<br />

Isabelle Ginot, sobre Dominique Bagouet.<br />

Em Portugal, o Fórum Dança<br />

tem tentado manter um pequeno arquivo<br />

vi<strong>de</strong>ográfico <strong>de</strong> novas produções,<br />

mas que nem sempre consegue<br />

actualizar, sobretudo em termos internacionais.<br />

De resto, o registo <strong>de</strong><br />

algumas obras importantes <strong>da</strong> história<br />

<strong>da</strong> <strong>da</strong>nça contemporânea portuguesa<br />

po<strong>de</strong> estar <strong>de</strong>finitivamente<br />

perdido. Como acontece com “Gust”,<br />

<strong>de</strong> Francisco Camacho.<br />

Estrea<strong>da</strong> em 1997 e consi<strong>de</strong>ra<strong>da</strong><br />

uma <strong>da</strong>s melhores produções <strong>de</strong> sempre<br />

<strong>da</strong> <strong>da</strong>nça portuguesa in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte,<br />

“Gust” acabou por ficar regista<strong>da</strong><br />

apenas num plano geral <strong>de</strong> quali<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

fraca, imagem <strong>de</strong> “régie” sem pormenores<br />

individuais e a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> uma<br />

reposição, ain<strong>da</strong> que apenas para filmagens,<br />

é complexa. Para além dos<br />

custos, há que ter em conta os 12 anos<br />

entretanto <strong>de</strong>corridos: com a <strong>morte</strong><br />

<strong>da</strong> bailarina Paula Castro, há dois anos<br />

e meio, dos restantes 13 intérpretes<br />

originais – os que mais facilmente retomariam<br />

o espírito <strong>da</strong> produção –,<br />

dois, os mais velhos, estão retirados,<br />

e, <strong>da</strong>s duas bailarinas mais jovens,<br />

uma não <strong>de</strong>u continui<strong>da</strong><strong>de</strong> à carreira<br />

que estava então a começar.<br />

Um problema <strong>de</strong> memória<br />

“Quando fazemos as coisas nunca<br />

pensamos que elas vão se vão tornar<br />

história”, diz João Fia<strong>de</strong>iro. A Re.Al,<br />

produtora <strong>de</strong>ste coreógrafo, revela<br />

algumas <strong>da</strong>s marcas <strong>da</strong> história <strong>de</strong><br />

precarie<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> <strong>da</strong>nça, em geral, e<br />

<strong>da</strong> <strong>da</strong>nça portuguesa, em particular.<br />

Em caixas fecha<strong>da</strong>s há anos, Fia<strong>de</strong>iro<br />

8 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon<br />

“Para<strong>de</strong>s and Changes”<br />

Como fazer do presente futuro<br />

Anna Halprin ficou<br />

surpreendi<strong>da</strong> quando a<br />

coreógrafa Anne Collod a<br />

contactou recentemente<br />

pedindo autorização para<br />

remontar “Para<strong>de</strong>s and<br />

Changes”, um dos seus<br />

trabalhos <strong>de</strong> 1965 (esteve em<br />

Janeiro na Culturgest e na<br />

Fun<strong>da</strong>ção <strong>de</strong> Serralves). Parece<br />

ridículo à luz do século XXI e<br />

<strong>da</strong> quanti<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> corpos nus<br />

que vemos <strong>de</strong>sfilar pelos palcos<br />

<strong>de</strong> todo o mundo, mas foi a<br />

peça que levou a que, em plena<br />

época do amor livre, Halprin,<br />

hoje com 89 anos, recebesse<br />

voz <strong>de</strong> prisão. Por isso mesmo:<br />

a nu<strong>de</strong>z dos intérpretes. Mais<br />

<strong>de</strong> 40 anos volvidos e diluí<strong>da</strong>s<br />

“Mantenho to<strong>da</strong>s<br />

as cassetes <strong>de</strong> ensaios.<br />

É impensável apagar,<br />

gravar por cima”<br />

Vera Mantero<br />

tem cerca <strong>de</strong> duas mil cassetes – sobretudo<br />

VHS e Hi8 – <strong>de</strong> ensaios,<br />

“workshops”, conferências-<strong>de</strong>monstração<br />

e peças, só que muito <strong>de</strong>sse<br />

material, correspon<strong>de</strong>nte a cinco ou<br />

seis anos <strong>de</strong> activi<strong>da</strong><strong>de</strong> até 1998, po<strong>de</strong><br />

estar (talvez irremediavelmente) corrompido:<br />

ficou submerso quando o<br />

Tejo inundou o Espaço Ginjal, on<strong>de</strong><br />

a companhia teve se<strong>de</strong>, e continua<br />

guar<strong>da</strong>do <strong>de</strong>s<strong>de</strong> então. Da mesma<br />

forma, ao longo do tempo “<strong>de</strong>sapareceu<br />

quase tudo” no que toca a figurinos<br />

e cenários, nomea<strong>da</strong>mente com<br />

o encerramento do Espaço A Capital,<br />

no Bairro Alto, on<strong>de</strong> a 29 <strong>de</strong> Agosto<br />

<strong>de</strong> 2002 a polícia entrou e <strong>de</strong>u or<strong>de</strong>m<br />

<strong>de</strong> encerramento imediato alegando<br />

falta <strong>de</strong> condições <strong>de</strong> segurança do<br />

velho edifício on<strong>de</strong> uma série <strong>de</strong> estruturas<br />

tentaram criar um centro<br />

DANIEL ROCHA<br />

A remontagem <strong>de</strong> Anne Collod<br />

evitou uma reconstituição<br />

arqueológica<br />

Em 1965 , a nu<strong>de</strong>z<br />

<strong>de</strong> “Para<strong>de</strong>s and<br />

Changes” resultou<br />

na prisão <strong>de</strong> Anne<br />

Halprin; a coreógrafa<br />

quis que esse fosse<br />

um dos aspectos<br />

“revistos” na<br />

remontagem actual<br />

artístico multidisciplinar. Nesse dia,<br />

os responsáveis pelo colectivo teatral<br />

Artistas Unidos abriram a bagageira<br />

<strong>de</strong> um Hon<strong>da</strong> Civic e enfiaram lá <strong>de</strong>ntro<br />

o essencial – dossiers, computadores<br />

e impressoras. No fim entraram<br />

eles e arrancaram. A Eira, a Re.Al e<br />

os outros fizeram o mesmo.<br />

“Se não preservarmos as coisas<br />

agora, <strong>de</strong> facto, tudo se per<strong>de</strong>. É o<br />

problema <strong>da</strong> não inscrição <strong>da</strong> história,<br />

um problema <strong>de</strong> memória. Eu<br />

acho que as minhas peças têm uma<br />

autoria, são do João Fia<strong>de</strong>iro, mas<br />

pertencem também à comuni<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

É um património colectivo. Não pensei<br />

muito no que acontece ao meu<br />

trabalho quando eu morrer; mais do<br />

que o que lhe vai acontecer quando<br />

morrer, interessa-me o que lhe acontece<br />

enquanto estou vivo. Porque<br />

mesmo que eu não morra, esqueçome.<br />

É um património que acho que<br />

compete também às escolas, à universi<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />

manter, preservar. De preferência<br />

enquanto estamos vivos.”<br />

Em Maio, Francisco Camacho <strong>de</strong>u<br />

um passo nesse sentido, quando teve<br />

oportuni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> dirigir uma reposição<br />

<strong>de</strong> uma <strong>da</strong>s suas peças iniciais<br />

com alunos do Fórum Dança – “O Rei<br />

no Exílio”, feito para a Europália, em<br />

1992. Tal como com outras peças, havia<br />

elementos <strong>de</strong> cenário e figurinos<br />

já perdidos. “Eu próprio tive que a<br />

apren<strong>de</strong>r a peça <strong>de</strong> novo, porque já<br />

não me lembrava”, explica o coreógrafo,<br />

dizendo ser um trabalho quenão<br />

faz sentido retomar como intérprete:<br />

“Já não tenho i<strong>da</strong><strong>de</strong>, não tenho<br />

a energia nem o perfil.”<br />

É outro problema que se levanta: a<br />

relação umbilical entre a linguagem<br />

dos coreógrafos e bailarinos contemporâneos<br />

e o seu próprio corpo ou a<br />

as normas contras as quais à<br />

época trabalhava, foi um dos<br />

vários aspectos que Halprin<br />

quis ver revistos na sua peça,<br />

interdita durante 20 anos nos<br />

Estados Unidos e um marco <strong>da</strong><br />

contemporanei<strong>da</strong><strong>de</strong>. Assim,<br />

em vez <strong>de</strong> uma reconstituição<br />

“arqueológica”, Halprin,<br />

Collod e os intérpretes, entre<br />

os quais a portuguesa Vera<br />

Mantero, <strong>de</strong>dicaram-se a<br />

recuperar os trilhos originais,<br />

para os percorrer à luz <strong>de</strong> hoje.<br />

Porventura, precisamente o<br />

que fará mais sentido numa<br />

peça construí<strong>da</strong> a partir <strong>de</strong><br />

uma partitura <strong>de</strong> tarefas (vestir,<br />

<strong>de</strong>spir, caminhar até à boca <strong>de</strong><br />

cena…) ou em qualquer trabalho<br />

em que a improvisação tenha<br />

cumprido um papel importante.<br />

“Não há uma maneira específica<br />

<strong>de</strong> cumprir a partitura”,<br />

diz Vera Mantero, “trata-se<br />

<strong>de</strong> experimentar, inventar<br />

maneiras. Vimos filmes, lemos<br />

livros, textos que se escreveram<br />

sobre a peça, mas a i<strong>de</strong>ia não<br />

foi imitar. O que ela nos disse<br />

foi: ‘É preciso ver o que fazia<br />

sentido na altura e já não faz<br />

hoje.’” A nova versão acabou<br />

por <strong>de</strong>sembocar, contudo,<br />

essencialmente no mesmo lugar<br />

que a original. “Se calhar não<br />

estamos a cumprir os <strong>de</strong>sígnios<br />

<strong>da</strong> peça ao fazê-la tal e qual, mas<br />

cumprimos as partituras…”. V.R.<br />

fisicali<strong>da</strong><strong>de</strong> e bagagem referencial dos<br />

seus cúmplices. Ao contrário do que<br />

acontece com o clássico, com vocábulos<br />

específicos que po<strong>de</strong>m ser treinados<br />

todos os dias, passados 100<br />

anos sobre o nascimento <strong>da</strong> <strong>da</strong>nça<br />

mo<strong>de</strong>rna a maioria dos autores <strong>de</strong><br />

hoje usa nas suas criações um cruzamento<br />

multifacetado e idiossincrático<br />

<strong>de</strong> linguagens, um universo que acaba<br />

por ter mais a ver com uma posição<br />

na arte e no mundo do que com<br />

uma tradição propriamente dita.<br />

Martha Graham, Cunningham e<br />

Limón <strong>de</strong>senvolveram técnicas <strong>de</strong><br />

movimento. Já não é o caso <strong>de</strong> Pina,<br />

a quem <strong>de</strong>vemos esse extraordinário<br />

facto <strong>de</strong> os bailarinos terem ganho<br />

voz. Não é também o caso <strong>da</strong> maioria<br />

dos autores portugueses. José Sasportes<br />

compara, aliás, Vera Mantero<br />

a Isadora Duncan, <strong>de</strong> tal forma a sua<br />

linguagem é pessoal: “A Vera é ela,<br />

aqui. É um caso <strong>de</strong> <strong>de</strong>struição natural.”<br />

É também, contudo, um caso raro<br />

<strong>de</strong> preservação <strong>de</strong> material: “Mantenho<br />

to<strong>da</strong>s as cassetes <strong>de</strong> ensaios, dos<br />

processos <strong>de</strong> trabalho. É impensável<br />

apagar, gravar por cima. Tenho a noção<br />

<strong>de</strong> que vai ser preciso perceber<br />

como se chegou ali. Ca<strong>de</strong>rnos, notas...<br />

Guardo tu do. Até diários <strong>de</strong><br />

adolescência: têm coisas que são já<br />

a formação <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias para o que queria<br />

fazer.”<br />

Tudo ali. E, contudo, será material<br />

morto se ninguém o retomar. Martha<br />

Graham costumava dizer: “Nenhum<br />

artista está à frente do seu tempo.<br />

Ele é o seu tempo; são os outros que<br />

estão atrasados.” No caso <strong>da</strong> <strong>da</strong>nça<br />

é fun<strong>da</strong>mental que não nos <strong>de</strong>ixemos<br />

atrasar <strong>de</strong>mais. Ela não fica à espera.<br />

Foi.<br />

João Fia<strong>de</strong>iro tem cerca <strong>de</strong><br />

duas mil cassetes <strong>de</strong> ensaios,<br />

“workshops” e peças; muito <strong>de</strong>sse<br />

material po<strong>de</strong> ter-se perdido<br />

nas inun<strong>da</strong>ções do Espaço Ginjal


SARA MATOS<br />

“O Pássaro <strong>de</strong><br />

Fogo” na<br />

montagem<br />

mítica <strong>de</strong><br />

Maurice<br />

Béjart<br />

Millicent Hodson<br />

Como manter o<br />

passado presente<br />

Hodson e o marido reconstruiram o reportório <strong>de</strong> Vaslav Nijinsky,<br />

incluindo esta “Sagração <strong>da</strong> Primavera”<br />

É uma <strong>da</strong>s obras mais<br />

importantes do século XX: em<br />

1913, “Sagração <strong>da</strong> Primavera”<br />

foi a segun<strong>da</strong> coreografia<br />

do bailarino russo Vaslav<br />

Nijinsky para os Ballets<br />

Russes, porventura a mais<br />

célebre <strong>da</strong>s peças célebres <strong>da</strong><br />

primeira gran<strong>de</strong> companhia<br />

<strong>de</strong> bailado in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte do<br />

mundo. Depois <strong>da</strong> polémica<br />

provoca<strong>da</strong> no ano anterior<br />

com “Prelúdio à Tar<strong>de</strong> <strong>de</strong> um<br />

Fauno”, um trabalho em que<br />

Des<strong>de</strong><br />

os anos<br />

1970,<br />

Millicent<br />

Hodson<br />

e o marido<br />

recolheram<br />

<strong>de</strong>zenas <strong>de</strong><br />

testemunhos<br />

directos<br />

<strong>de</strong> forma<br />

a conseguir<br />

aproximar-se<br />

do que terão sido<br />

as produções<br />

originais dos<br />

Ballets Russes<br />

Nijinsky – o fauno – simulava<br />

masturbar-se com um lenço (um<br />

choque para o público médio<br />

<strong>da</strong> época, com a peça a acabar<br />

acusa<strong>da</strong> <strong>de</strong> obsceni<strong>da</strong><strong>de</strong>),<br />

“Sagração <strong>da</strong> Primavera”<br />

redobraria a provocação sexual<br />

dos ambientes primitivistas<br />

– redobraria também, claro, o<br />

escân<strong>da</strong>lo, acabando com um<br />

motim em que a polícia teve que<br />

intervir.<br />

Inspira<strong>da</strong> em antigos<br />

rituais <strong>de</strong> fertili<strong>da</strong><strong>de</strong> e com<br />

movimentos tão inesperados e<br />

crus quanto a partitura musical<br />

<strong>de</strong> Igor Stravinsky, cheia <strong>de</strong><br />

dissonâncias e assimetrias,<br />

nenhuma <strong>da</strong> flui<strong>de</strong>z comum à<br />

época, “Sagração <strong>da</strong> Primavera”<br />

acabaria por passar déca<strong>da</strong>s<br />

perdi<strong>da</strong> <strong>de</strong>pois do fim dos<br />

Ballets Russes em 1929,<br />

recupera<strong>da</strong> apenas em 1987 pela<br />

companhia norte-americana <strong>de</strong><br />

Robert Joffrey em colaboração<br />

com a coreógrafa e historiadora<br />

Millicent Hodson e o marido<br />

<strong>de</strong>sta, o também historiador<br />

Kenneth Archer. Juntos, Hodson<br />

e Archer têm vindo a investigar<br />

o período dos Ballets Russes,<br />

reconstruindo o seu reportório<br />

para gran<strong>de</strong>s companhias<br />

internacionais. Des<strong>de</strong> os anos<br />

1970 recolheram <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong><br />

testemunhos directos <strong>de</strong> forma a<br />

conseguir aproximar-se o mais<br />

possível do que terão sido as<br />

produções iniciais. Numa breve<br />

entrevista por telefone, Hodson<br />

conta o caso emblemático <strong>da</strong><br />

entrevista feita a uma antiga<br />

bailarina que, enquanto criança,<br />

entrara num dos espectáculos<br />

<strong>da</strong> companhia e se lembrava <strong>de</strong>,<br />

antes <strong>de</strong> entrar em cena, estar<br />

apoia<strong>da</strong> numa trave <strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira,<br />

à espera – a trave <strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira<br />

era o <strong>da</strong>do que faltava a Hodson<br />

e Archer para perceber como<br />

montar o cenário. A maior parte<br />

dos figurinos originais, feitos<br />

<strong>de</strong> lã e com pesados apliques<br />

<strong>de</strong> metal e osso, estão hoje no<br />

Victoria and Albert Museum, em<br />

Londres. V.R.<br />

Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 9


Sacanas Sem Lei<br />

“E <strong>de</strong> repente, bum!,<br />

um filme sobre a II Guerra<br />

Mundial transforma-se numa<br />

carta <strong>de</strong> amor ao cinema”<br />

Quentin Tarantino<br />

www.ipsilon.pt<br />

Em Londres com Quentin Tarantino<br />

e os actores Diane Kruger e Christoph Waltz<br />

(prémio <strong>de</strong> interpretação em Cannes)<br />

Não perca a edição <strong>de</strong> 28/08/09


Cinema<br />

“4 Copas” é a quarta longa-metragem<br />

<strong>de</strong> ficção <strong>de</strong> Manuel Mozos (n. 1959),<br />

história <strong>de</strong> um trio <strong>de</strong> personagens<br />

que <strong>de</strong>pois passa a quarteto unido e<br />

<strong>de</strong>sunido pelas circunstâncias afectivas,<br />

numa <strong>Lisboa</strong> sempre reconhecível<br />

mesmo quando não é i<strong>de</strong>ntificável.<br />

É um momento feliz na obra <strong>de</strong> Mozos,<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> sempre assola<strong>da</strong> por percalços<br />

variados: “4 Copas” estreia-se<br />

comercialmente, “Ruínas” (ain<strong>da</strong> não<br />

estreado) tem ganho alguns prémios<br />

importantes. Em conversa com o Ípsilon,<br />

Manuel Mozos falou <strong>de</strong> “4 Copas”<br />

e dos caminhos difíceis percorridos<br />

pelos jovens cineastas portugueses<br />

que se iniciaram nos anos 80.<br />

Mozos foi um <strong>de</strong>les, e apren<strong>de</strong>u que<br />

“nunca se ganha e nunca se per<strong>de</strong>”.<br />

A sua carreira vive em 2009 um<br />

momento particularmente feliz.<br />

“Ruínas” tem <strong>da</strong>do nas vistas<br />

[foi premiado no Indie<strong>Lisboa</strong><br />

e no FID-Marselha], “4 Copas”<br />

estreia-se comercialmente... E<br />

apresentou ain<strong>da</strong> “Aldina Duarte<br />

- Princesa Prometi<strong>da</strong>”. Numa<br />

obra que tem sofrido com tantas<br />

irregulari<strong>da</strong><strong>de</strong>s, tem alguma<br />

explicação para esta conjuntura<br />

afortuna<strong>da</strong>?<br />

É uma coincidência, que até é <strong>de</strong>vi<strong>da</strong><br />

a essas irregulari<strong>da</strong><strong>de</strong>s. A ro<strong>da</strong>gem<br />

do “4 Copas” foi em 2005, está pronto<br />

praticamente <strong>de</strong>s<strong>de</strong> há dois anos,<br />

e há um ano e meio que estava à espera<br />

<strong>da</strong> estreia. O “Ruínas” também<br />

foi um processo prolongado, ficou<br />

pronto agora. Assim como o <strong>da</strong> Aldina.<br />

É uma coincidência, mas acho que<br />

há uma coerência [risos] na relação<br />

com as irregulari<strong>da</strong><strong>de</strong>s. O caso extremo<br />

é o “Xavier”, que ficou muitos<br />

anos à espera <strong>de</strong> ser estreado, mas há<br />

uma aura <strong>de</strong> invisibili<strong>da</strong><strong>de</strong> em torno<br />

<strong>de</strong> tantas coisas que fiz...<br />

P- “4 Copas” é a sua quarta<br />

ficção. Como é que a relaciona<br />

com as outras três [“Um Passo,<br />

Outro Passo, e Depois”, 1989,<br />

“Xavier”, 1992, e “...Quando<br />

Troveja”, 1999]?<br />

Por um lado, ambientam-se todos em<br />

<strong>Lisboa</strong>, e, por outro, [há] uma proximi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

nos traços <strong>da</strong>s personagens.<br />

Personagens em que<strong>da</strong>, que acabam<br />

por ter uma espécie <strong>de</strong> re<strong>de</strong>nção, e<br />

se movem no quotidiano. No “4 Copas”<br />

isso sente-se <strong>de</strong> maneira diferente,<br />

porque seguimos quatro personagens<br />

e não uma, mas isso para mim<br />

até é um pouco uma súmula, permiteme<br />

apanhar quatro personagens <strong>de</strong><br />

gerações diferentes.<br />

A <strong>Lisboa</strong> <strong>de</strong> “4 Copas” é um<br />

pouco mais tortuosa. Gira<br />

entre o corriqueiro do centro<br />

comercial e a clan<strong>de</strong>stini<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong><br />

casa <strong>de</strong> jogo. É uma <strong>Lisboa</strong> <strong>da</strong><strong>da</strong><br />

mais por ambientes do que pela<br />

rua.<br />

Concordo. Não é o aspecto realista <strong>da</strong><br />

ci<strong>da</strong><strong>de</strong> que me interessa. Antes usar<br />

a geografia como “décor”, procurar<br />

o que nela há <strong>de</strong> “papelão”, usá-la<br />

como uma paleta. Neste filme há mais<br />

interiores, <strong>de</strong> facto. A i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> ter personagens<br />

a moverem-se numa aparência<br />

<strong>de</strong> subterrâneo já me tinha<br />

interessado no “...Quando Troveja”,<br />

mesmo se aí acabei por não a explorar<br />

como queria. Em todo o caso não<br />

Margari<strong>da</strong><br />

Marinho em<br />

“4 Copas”<br />

Nunca se ganha<br />

e nunca se per<strong>de</strong><br />

A quarta longa-metragem <strong>de</strong> ficção <strong>de</strong> Manuel Mozos, “4 Copas”, é um momento feliz numa obra<br />

assola<strong>da</strong> por percalços que continua, como diz o próprio, parcialmente “invisível” - mas que<br />

correspon<strong>de</strong> a um dos percursos mais originais do cinema português. Luís Miguel Oliveira<br />

Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 11<br />

NUNO FERREIRA SANTOS


é o realismo estrito que me motiva.<br />

O casino clan<strong>de</strong>stino, por exemplo,<br />

tem um lado postiço, é sobretudo<br />

uma i<strong>de</strong>ia, um ambiente...<br />

Se há uma coisa que <strong>de</strong>fine<br />

os seus filmes é a maneira<br />

<strong>de</strong> trabalhar as personagens<br />

e <strong>de</strong> se relacionar com elas.<br />

É única e inconfundível no<br />

cinema português. Em termos<br />

<strong>de</strong> construção, diria que é a<br />

narrativa que as <strong>de</strong>ci<strong>de</strong>, ou<br />

que são elas que <strong>de</strong>ci<strong>de</strong>m a<br />

narrativa? É que fica a sensação<br />

<strong>de</strong> que, a partir <strong>de</strong> certa altura, o<br />

seu amor pelas personagens, por<br />

to<strong>da</strong>s elas, se sobrepõe a tudo.<br />

Este filme tem uma nuance. Ao contrário<br />

<strong>da</strong>s minhas outras ficções, que<br />

partiam <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias minhas ain<strong>da</strong> que<br />

<strong>de</strong>pois as <strong>de</strong>senvolvesse com outras<br />

pessoas, o argumento do “4 Copas”<br />

nasceu <strong>de</strong> um trabalho conjunto com<br />

a Cláudia Sampaio e o Octávio Rosado.<br />

Julgo que para eles o mais interessante<br />

até era o trabalho sobre a história.<br />

Mas eu envolvi-me especialmente no<br />

<strong>de</strong>senvolvimento <strong>da</strong>s personagens, <strong>de</strong><br />

maneira a que nalgumas partes se po<strong>de</strong>ria<br />

até dizer que a história ficou fragiliza<strong>da</strong>.<br />

Na montagem ain<strong>da</strong> reforcei<br />

mais isso. Tentei tirar partido do que<br />

havia <strong>de</strong> mais forte no trabalho dos<br />

actores. Digo “fragiliza<strong>da</strong>” no sentido<br />

em que a certa altura me preocupei<br />

menos com a “coerência” <strong>da</strong> história<br />

do que com o que fazia com que se<br />

pu<strong>de</strong>sse acreditar nas personagens.<br />

Uma história alternativa<br />

do cinema português<br />

Tendo formação e experiência<br />

<strong>de</strong> montador, com inúmeros<br />

trabalhos para outros<br />

realizadores, consegue criar<br />

uma distância face ao material<br />

filmado por si?<br />

É complicado. Nos meus filmes trabalho<br />

sempre com outros montadores.<br />

E gosto <strong>de</strong> lhes <strong>de</strong>ixar algum espaço<br />

para eles fazerem a sua leitura. A sua<br />

leitura e a sua escrita. Mas por força<br />

<strong>da</strong>s circunstâncias acabei, neste filme<br />

assim como no “Xavier”, por estar<br />

muito directamente ligado à montagem.<br />

Houve uma primeira versão,<br />

monta<strong>da</strong> pelo Pedro Marques, com a<br />

qual estávamos bastante satisfeitos,<br />

mas era uma versão <strong>de</strong>cidi<strong>da</strong> na relação<br />

com uma série <strong>de</strong> trechos musicais<br />

<strong>de</strong> que não pu<strong>de</strong>mos comprar os<br />

direitos, que eram uma exorbitância.<br />

Como ele <strong>de</strong>pois não estava disponí-<br />

“[Há] uma<br />

proximi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

nas personagens<br />

[dos meus filmes].<br />

Personagens em<br />

que<strong>da</strong>, que acabam<br />

por ter uma (...)<br />

re<strong>de</strong>nção, e se movem<br />

no quotidiano”<br />

12 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon<br />

“Ruínas” foi<br />

premiado na<br />

última edição<br />

do<br />

Indie<strong>Lisboa</strong><br />

e no FID-<br />

Marselha<br />

NUNO FERREIRA SANTOS


“Xavier” (1992), um filme que ficou anos à espera <strong>de</strong> ser mostrado<br />

vel, fiquei eu, um bocado a contragosto,<br />

a trabalhar na remontagem.<br />

Percalços e interrupções... A<br />

sua carreira parece atraí-los: o<br />

“Xavier” foi o que foi, o “Passo”<br />

é um dos poucos “missing films”<br />

dos anos 90...<br />

Há mais, há mais... [risos]<br />

A pergunta é: num meio<br />

já <strong>de</strong> si tão complicado e<br />

frequentemente adverso como<br />

é o do cinema português, como<br />

é que se li<strong>da</strong> com to<strong>da</strong> esta<br />

adversi<strong>da</strong><strong>de</strong> adicional?<br />

Já me angustiei mais com isso. Hoje<br />

acho que não vale a pena per<strong>de</strong>r muito<br />

tempo a pensar nessas contrarie<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />

Prefiro estar contente com a<br />

vi<strong>da</strong> do que viver amargurado por<br />

causa <strong>de</strong> alguns azares. Também já<br />

não tenho as pretensões e as ambições<br />

que tinha há vinte ou mesmo há<br />

<strong>de</strong>z anos. Há uma certa resignação,<br />

se calhar um pouco estúpi<strong>da</strong>. O caso<br />

do “Passo” ain<strong>da</strong> me faz sofrer um<br />

bocadinho, embora tenha esperança<br />

que algum dia venha a ser encontrado<br />

[o filme só é visível actualmente em<br />

transcrições ví<strong>de</strong>o]. Mas em Portugal<br />

há tanta coisa que se per<strong>de</strong>, que fica<br />

para trás... Também não me angustio<br />

com o futuro. Se fizer outro filme, farei.<br />

Já não tenho muita paciência para<br />

as minhas próprias angústias. Fiz<br />

um número razoável <strong>de</strong> filmes, mesmo<br />

que não sejam vistos. Mas eu sei<br />

que os fiz. Para mim isto já é uma satisfação.<br />

É claro que me posso perguntar<br />

se as coisas como me estão a<br />

correr hoje...<br />

...tivessem corrido assim <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o<br />

princípio...<br />

...mas nem vale a pena. Tenho-me<br />

divertido...<br />

Deve ser <strong>da</strong>s pessoas com um<br />

interesse mais intenso, e quase<br />

enciclopédico, no cinema<br />

português e nos seus recantos<br />

mais obscuros. É capaz <strong>de</strong> falar<br />

com profun<strong>da</strong> estima <strong>de</strong> um<br />

filme falhadíssimo dos anos 50,<br />

ou <strong>de</strong> uma produção amadora<br />

feita sabe-se lá on<strong>de</strong>... Para dizer<br />

que são maus, mas sem que isso<br />

impeça uma espécie <strong>de</strong> apreço.<br />

De on<strong>de</strong> é que isto vem? O que<br />

é que o interessa tanto nesta<br />

história alternativa do cinema<br />

português como falhanço?<br />

Não é só no cinema...<br />

Eu sei, mas circunscrevendo...<br />

Por um lado, e genericamente, tenho<br />

tendência a comover-me com a “décalage”<br />

entre uma intenção e o resultado<br />

<strong>de</strong>la. Por outro, no cinema português<br />

há, ou havia, algumas pessoas<br />

que mesmo sem talento ou condições<br />

se entregavam ao que estavam a fazer<br />

com total convicção. O resultado podia<br />

ser péssimo mas era a vi<strong>da</strong> <strong>da</strong>quelas<br />

pessoas. Para além disso, e por<br />

maus que sejam, po<strong>de</strong>m-se sempre<br />

encontrar coisas interessantes nesses<br />

filmes. Pormenores <strong>de</strong> arquitectura,<br />

a maneira como as pessoas se vestiam.<br />

O esforço inglório <strong>de</strong> alguns actores,<br />

a <strong>da</strong>rem o melhor <strong>de</strong> si e <strong>de</strong>pois o filme<br />

não presta para na<strong>da</strong>... Às vezes<br />

“Não me angustio<br />

com o futuro. Se fizer<br />

outro filme, farei.<br />

Já não tenho muita<br />

paciência para as<br />

minhas angústias. Fiz<br />

um número razoável<br />

<strong>de</strong> filmes, mesmo que<br />

não sejam vistos.<br />

Mas eu sei que os fiz”<br />

há momentos fantásticos. Claro que<br />

é um bocadinho enfadonho estar a<br />

ver uma hora e meia para aproveitar<br />

trinta segundos. Mas pronto.<br />

Matar o pai<br />

A sua geração, por discutível<br />

que seja o conceito <strong>de</strong> “geração”<br />

mas aceitemo-lo para <strong>de</strong>finir o<br />

conjunto <strong>de</strong> pessoas que chegou<br />

ao cinema nos anos 80, teve<br />

imensas baixas e <strong>de</strong>saparecidos<br />

em combate. Quase se lhe po<strong>de</strong><br />

chamar, a si, um “sobrevivente”.<br />

O que é que esta geração<br />

encontrou <strong>de</strong> tão especialmente<br />

difícil? Tem alguma explicação?<br />

Havia um problema geral, que sempre<br />

houve: falta <strong>de</strong> espaço. As próprias<br />

condições <strong>de</strong> produção o ditam.<br />

Nunca houve um investimento sério<br />

para criar, não uma gran<strong>de</strong> indústria,<br />

que seria impossível, mas algum tipo<br />

<strong>de</strong> abertura. Da geração dos anos 80<br />

muitos ficaram pelo caminho, <strong>de</strong> fac-<br />

to. Começava logo nos concursos do<br />

Instituto [Português <strong>de</strong> Cinema, então],<br />

on<strong>de</strong> só havia lugar para uma<br />

ou duas primeiras-obras. Havia aquelas<br />

pessoas ain<strong>da</strong> muita próximas,<br />

etariamente, <strong>da</strong> geração do Cinema<br />

Novo - o João Botelho, o Luis Filipe<br />

Rocha, o José Alvaro Morais, o Jorge<br />

Silva Melo -, e a vi<strong>da</strong> também não foi<br />

fácil para eles. Mas dos que vieram a<br />

seguir, durante os anos 80, muitos<br />

ficaram bloqueados, praticamente só<br />

o Pedro Costa, o Joaquim Leitão e a<br />

Teresa Villaver<strong>de</strong> é que conseguiram<br />

singrar. Pessoas como o Vitor Gonçalves,<br />

ou o Daniel Del Negro, fizeram<br />

filmes que como era habitual na época<br />

tiveram dificul<strong>da</strong><strong>de</strong>s em estrear<br />

mas foram muito projectados num<br />

círculo restrito, e isto também po<strong>de</strong><br />

ser um bocado intimi<strong>da</strong>tório por causa<br />

<strong>da</strong>s expectativas que se criam. E<br />

muitos tiveram infortúnios <strong>de</strong> todo o<br />

tipo. Se quisesse ir por uma teoria <strong>da</strong><br />

conspiração diria que esta conjuntura<br />

até podia ter sido geri<strong>da</strong> por pessoas<br />

liga<strong>da</strong>s às <strong>de</strong>cisões sobre o cinema<br />

português, que optaram por estrangular<br />

em vez <strong>de</strong> abrir. E então<br />

pronto, tinha que haver vítimas e<br />

quem se aguentasse aguentava. Muitos<br />

dos filmes, mesmo cheios <strong>de</strong> fragili<strong>da</strong><strong>de</strong>s,<br />

não mereciam ter levado a<br />

panca<strong>da</strong> que levaram. Os primeiros<br />

filmes do João Canijo, por exemplo,<br />

aquilo foi complicado. Depois há o<br />

“Nós apanhámos<br />

a geração do Cinema<br />

Novo ain<strong>da</strong> liga<strong>da</strong><br />

a todos os lugares<br />

importantes (...)<br />

e [isso] criou (...)<br />

constrangimento.<br />

É um sentimento <strong>de</strong><br />

dívi<strong>da</strong> que os tipos<br />

<strong>de</strong> agora, que já não<br />

os apanharam nos<br />

lugares <strong>de</strong>cisivos,<br />

não têm. Não lhes<br />

<strong>de</strong>vem na<strong>da</strong>”<br />

caso do [Edgar] Pêra, que é um caso<br />

<strong>de</strong> resistência. Em resumo, não consigo<br />

dizer: foi por isto ou foi por aquilo.<br />

Houve um conjunto <strong>de</strong> factores<br />

que atirou muita gente para fora <strong>da</strong><br />

pista. E quando finalmente podiam<br />

estar em condições <strong>de</strong> recuperar o<br />

tempo perdido aparece uma nova<br />

geração. Voltar 15 ou 20 anos <strong>de</strong>pois<br />

é sempre muito complicado.<br />

Pensando nalguns casos <strong>de</strong>ssa<br />

nova geração, o Joaquim<br />

Sapinho, o João Pedro<br />

Rodrigues, mesmo o Miguel<br />

Gomes, dá a impressão <strong>de</strong> que<br />

encontraram uma conjuntura<br />

menos agreste. Por outro lado, a<br />

vossa geração era uma geração<br />

<strong>de</strong> “filhos”, e estes já não são<br />

bem “filhos”. Até que ponto isto<br />

po<strong>de</strong> ser importante?<br />

Acho que isso é realmente importante.<br />

Quer dizer, eu não sei se o Pedro<br />

Costa ou a Teresa Villaver<strong>de</strong>...<br />

...se consi<strong>de</strong>ram “filhos”...<br />

...pois, mas isto é um facto: nós ain<strong>da</strong><br />

conhecemos os “pais”. Até pelos filmes<br />

isso se nota. Havia algumas referências<br />

em comum, até numa linha<br />

<strong>de</strong> continui<strong>da</strong><strong>de</strong> com o cinema português.<br />

Querendo ou não, ain<strong>da</strong> estávamos<br />

muito ligados ao Paulo Rocha,<br />

ao António Reis, ao Fernando<br />

Lopes, ao João Bénard <strong>da</strong> Costa, ao<br />

Seixas Santos ou ao César Monteiro.<br />

Até mesmo, <strong>de</strong> maneira diferente, ao<br />

João Mário Grilo. Havia uma herança<br />

que era veicula<strong>da</strong> pela Escola <strong>de</strong> Cinema.<br />

Julgo que nestes, no Sapinho,<br />

no João Pedro, no Sandro Aguilar, no<br />

Miguel Gomes, há um <strong>de</strong>spojamento<br />

maior. Outra abertura ao mundo.<br />

Ao mesmo tempo, e não<br />

querendo transformar isto em<br />

psicanálise barata, nos vossos<br />

filmes sente-se a noção, ain<strong>da</strong><br />

que inconsciente, <strong>de</strong> estarem a<br />

filmar <strong>de</strong>ntro <strong>da</strong> “família”, sob o<br />

olhar do “pai”.<br />

Nós apanhámos a geração do Cinema<br />

Novo ain<strong>da</strong> liga<strong>da</strong> a todos os lugares<br />

importantes, no IPC, na RTP... Eu por<br />

exemplo <strong>de</strong>vo o meu primeiro filme<br />

ao Fernando Lopes, foi ele quem me<br />

convidou para os “Corações Periféricos”<br />

[a série on<strong>de</strong> se integrava “Um<br />

Passo, Outro Passo e Depois”]. E acho<br />

que este tipo <strong>de</strong> relacionamento criou<br />

uma espécie <strong>de</strong> constrangimento nos<br />

mais novos, que aliás era incentivado<br />

pelos mais velhos. Estou a dizer isto<br />

mas não implica que não tenha admiração,<br />

respeito e amiza<strong>de</strong> por muitos<br />

<strong>de</strong>sses cineastas. Mas é um sentimento<br />

<strong>de</strong> dívi<strong>da</strong> que os tipos <strong>de</strong> agora, que<br />

já não os apanharam nos lugares <strong>de</strong>cisivos,<br />

não têm. Não lhes <strong>de</strong>vem na<strong>da</strong>.<br />

Quando “Xavier” teve uma<br />

sessão <strong>de</strong> antestreia na<br />

Cinemateca, incluiu na folha<br />

<strong>de</strong> sala um poema <strong>de</strong> Jaime<br />

Gil <strong>de</strong> Biedma [“Príncipe <strong>da</strong><br />

Aquitania, En su Torre Aboli<strong>da</strong>”]<br />

que começa assim: “Una clara<br />

consciência <strong>de</strong> lo que ha perdido<br />

/ es lo que le consuela”. É tão<br />

fácil adivinhar que se i<strong>de</strong>ntifica<br />

com este verso...<br />

Ah, sim, sim. Isto po<strong>de</strong> fazer confusão<br />

a algumas pessoas, mas serve-me para<br />

avançar. OK, perdi certas coisas<br />

mas... é como na canção do [John]<br />

Cale, “never win and never lose”<br />

[“nunca se ganha e nunca se per<strong>de</strong>”]...<br />

...ou na do Dylan, “there’s<br />

no success like failure but<br />

failure’s no success at all” [“não<br />

há triunfo como o falhanço,<br />

mas o falhanço não é triunfo<br />

nenhum”]...<br />

As coisas equilibram-se. Mesmo quando<br />

per<strong>de</strong>mos muito ganhamos alguma<br />

coisa. E isto é importante.<br />

Ver crítica <strong>de</strong> filmes na pág. 33 e segs.


Queres ser<br />

Charlie Kaufman?<br />

Dez anos <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> Spike Jonze ter ro<strong>da</strong>do “Queres Ser John<br />

Malkovich?”, Charlie Kaufman estreia-se na realização com “Sinédo<br />

que, Nova Iorque”, filme que é síntese e <strong>de</strong>sconstrução <strong>da</strong> voz<br />

autoral <strong>de</strong> um dos mais peculiares argumentistas dos<br />

últimos anos. Jorge Mourinha<br />

Há um velho adágio que diz que<br />

Hollywood paga bem aos seus argumentistas<br />

mas <strong>de</strong>pois compensa tratando-os<br />

abaixo <strong>de</strong> cão.<br />

Charlie Kaufman é a excepção que<br />

confirma a regra. Sobretudo porque<br />

o guião que fez o seu nome andou<br />

anos aos tombos por Hollywood, com<br />

to<strong>da</strong> a gente a dizer-lhe que era espantoso<br />

mas infilmável. Um Oscar (e duas<br />

nomeações) <strong>de</strong>pois, Kaufman é um<br />

dos guionistas mais intocáveis, mais<br />

influentes e mais raros do cinema<br />

americano. Intocável porque ninguém<br />

consegue escrever como ele,<br />

influente porque ninguém <strong>de</strong>siste <strong>de</strong><br />

o tentar, raro porque em <strong>de</strong>z anos<br />

apenas produziu seis guiões.<br />

Seis guiões que cristalizaram uma<br />

voz autoral com uma i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong> narrativa<br />

tão forte que nem mesmo uma<br />

mu<strong>da</strong>nça <strong>de</strong> realizador (quatro, até<br />

agora) a consegue apagar ou diluir.<br />

Seis pontos <strong>de</strong> vista diferentes que<br />

concentram em si a essência do seu<br />

tema central: a i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong>. Ou a vi<strong>da</strong>.<br />

Ou a <strong>morte</strong>. Ou a per<strong>da</strong>. Ou, apenas,<br />

a mente <strong>de</strong> Charlie Kaufman.<br />

Num filme-Kaufman, o ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro<br />

autor (coisa rara no cinema contemporâneo,<br />

venha ela dos EUA ou <strong>de</strong><br />

outros sítios) é o argumentista, e o<br />

que varia <strong>de</strong> filme para filme é o modo<br />

como ca<strong>da</strong> realizador se entrosa,<br />

ou não, com o seu peculiar modo <strong>de</strong><br />

olhar o mundo, com uma <strong>da</strong>s escritas<br />

mais originais que o cinema americano<br />

revelou em muito tempo.<br />

Tão original que não percebemos<br />

exactamente <strong>de</strong> on<strong>de</strong> ela vem, como<br />

é que chegou aqui e como é que a formatação<br />

<strong>de</strong> Hollywood ain<strong>da</strong> não <strong>de</strong>u<br />

cabo <strong>de</strong>la.<br />

Questões <strong>de</strong> i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

Em “Confissões <strong>de</strong> uma Mente Perigosa”<br />

(2002), George Clooney, no papel<br />

<strong>de</strong> um agente <strong>da</strong> CIA, diz à ve<strong>de</strong>ta<br />

televisiva interpreta<strong>da</strong> por Sam Rockwell:<br />

“Jesus Cristo morreu e ressuscitou<br />

aos 33 anos. Você tem 32 e ain<strong>da</strong><br />

não fez na<strong>da</strong> que se visse. É melhor<br />

<strong>de</strong>spachar-se”.<br />

Charlie Kaufman estudou cinema<br />

em Nova Iorque, mas chegou aos trintas<br />

a trabalhar no <strong>de</strong>partamento <strong>de</strong><br />

14 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon<br />

assinaturas <strong>de</strong> um jornal <strong>de</strong> Minneapolis<br />

com a sensação <strong>de</strong> que a vi<strong>da</strong><br />

lhe estava a passar ao lado. Foi para<br />

Los Angeles trabalhar como argumentista,<br />

passou anos em séries televisivas<br />

que nunca foram a lado nenhum,<br />

e expressou a sua frustração no tal<br />

guião espantoso mas infilmável, “Queres<br />

Ser John Malkovich?”, história <strong>de</strong><br />

um marionetista frustrado que, forçado<br />

a trabalhar para ganhar a vi<strong>da</strong>,<br />

<strong>de</strong>scobre um portal que permite passar<br />

quinze minutos <strong>de</strong>ntro <strong>da</strong> cabeça<br />

do actor John Malkovich — e o preço<br />

<strong>de</strong> se querer ser quem não se é.<br />

Filmado em 1999 por Spike Jonze,<br />

“Queres Ser John Malkovich?” transformou-se<br />

num fenómeno, integrando<br />

Kaufman numa nova geração <strong>de</strong><br />

criativos capitanea<strong>da</strong> por Jonze e pela<br />

(sua então esposa) Sofia Coppola<br />

que parecia prestes a re<strong>de</strong>finir o cinema<br />

americano.<br />

No espaço <strong>de</strong> dois anos, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong><br />

ter passado anos a batalhar em vão,<br />

Kaufman viu três guiões colocados em<br />

produção — o melhor dos três, ironicamente,<br />

a “encomen<strong>da</strong>” feita por um<br />

estúdio (a Columbia). “Ina<strong>da</strong>ptado”<br />

(2002), <strong>de</strong> novo dirigido por Jonze,<br />

distorcia o ca<strong>de</strong>rno <strong>de</strong> encargos (a<br />

a<strong>da</strong>ptação do “best-seller” não-ficcional<br />

<strong>de</strong> Susan Orlean) para se tornar<br />

num fervilhante laboratório formal<br />

meta-narrativo, encenando, em vez<br />

<strong>da</strong> narrativa do livro, o processo <strong>da</strong><br />

sua própria a<strong>da</strong>ptação ao cinema: um<br />

filme sobre a criação do próprio filme,<br />

com Nicolas Cage a <strong>da</strong>r corpo a uma<br />

personagem chama<strong>da</strong> “Charlie Kauf-<br />

Charlie Kaufman<br />

é uma voz autoral<br />

com uma i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

tão forte que nem<br />

mesmo uma mu<strong>da</strong>nça<br />

<strong>de</strong> realizador (quatro,<br />

até agora) a consegue<br />

apagar ou diluir<br />

Cinema<br />

“Queres Ser John Malkovich?” 1999<br />

“Confissões <strong>de</strong> uma Mente Perigosa” 2002<br />

“Human Nature” 2001<br />

“Ina<strong>da</strong>ptado” 2002


RUNE HELLESTAD/CORBIS<br />

“O Despertar <strong>da</strong> Mente” 2004<br />

A escrita <strong>de</strong><br />

Kaufman<br />

é tão original<br />

que não<br />

percebemos<br />

<strong>de</strong> on<strong>de</strong> ela<br />

vem, como<br />

é que chegou<br />

aqui e como<br />

é que a<br />

formatação<br />

<strong>de</strong> Hollywood<br />

ain<strong>da</strong> não<br />

<strong>de</strong>u cabo <strong>de</strong>la<br />

“Sinédoque, Nova Iorque” 2009<br />

man” e ao seu irmão gémeo “Donald”,<br />

aliás creditado como co-autor do argumento.<br />

E se a tentação <strong>de</strong> ver autobiografia<br />

nisto é gran<strong>de</strong> (como é,<br />

aliás, em todos os seus filmes, tal é a<br />

componente emocional que Kaufman<br />

consegue injectar no que à parti<strong>da</strong><br />

são conceitos <strong>de</strong>masiado secos e teóricos),<br />

consi<strong>de</strong>rem o seguinte: Donald<br />

Kaufman não existe.<br />

“Ina<strong>da</strong>ptado”, filme sobre um artista<br />

que procura compreen<strong>de</strong>r o seu<br />

lugar no mundo, ressoa directamente<br />

em “Sinédoque, Nova Iorque” (2008),<br />

a sua estreia na realização, ontem chega<strong>da</strong><br />

às salas portuguesas <strong>de</strong>pois <strong>de</strong><br />

ter estado a concurso em Cannes<br />

2008, também sobre um artista à procura<br />

do seu lugar (embora <strong>de</strong> modo<br />

muito mais elíptico). Mas encontramos<br />

também ecos seus em “Human<br />

Nature” (2001), espécie <strong>de</strong> “negativo”<br />

do “Menino Selvagem” <strong>de</strong> Truffaut,<br />

e no vaivém entre a ver<strong>da</strong><strong>de</strong> e a<br />

mentira <strong>de</strong> “Confissões <strong>de</strong> uma<br />

Mente Perigosa” (2002), a<strong>da</strong>ptação<br />

<strong>da</strong> “autobiografia” do<br />

apresentador televisivo Chuck<br />

Barris, que se apregoava<br />

uma suposta vi<strong>da</strong> secreta<br />

como assassino contratado<br />

<strong>da</strong> CIA.<br />

Com a questão <strong>da</strong> i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

— quem somos; como<br />

chegámos a sê-lo; po<strong>de</strong><br />

alguem ser quem não é?<br />

— como chave <strong>de</strong> leitura comum,<br />

“Ina<strong>da</strong>ptado” <strong>de</strong>stacava-se<br />

pela sintonia entre<br />

realizador e argumentista:<br />

nem Michel Gondry nem George<br />

Clooney, ambos em tempo <strong>de</strong><br />

estreia na realização, souberam fazer<br />

inteira justiça às explosões criativas<br />

<strong>de</strong> Kaufman, tombando em armadilhas<br />

clássicas <strong>de</strong> primeiro filme.<br />

A lição <strong>de</strong> “Human Nature” foi<br />

aprendi<strong>da</strong> por Gondry, que partilhava<br />

com Jonze um passado <strong>de</strong> inovador<br />

no campo do teledisco e que <strong>de</strong>u carta<br />

branca a Kaufman para trabalhar<br />

uma i<strong>de</strong>ia que <strong>de</strong>senvolvera com um<br />

amigo. A colaboração entre ambos,<br />

cristalizando a meditação do argumentista<br />

sobre a i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong> através<br />

<strong>de</strong> um artesanal <strong>de</strong>svio Gondryano<br />

pelos mecanismos <strong>da</strong> memória, <strong>de</strong>u<br />

origem a um dos mais notáveis filmes<br />

<strong>da</strong> déca<strong>da</strong>, o sublime “O Despertar<br />

<strong>da</strong> Mente” (2004), valendo a Kaufman<br />

o Oscar do argumento (<strong>de</strong>pois <strong>de</strong> duas<br />

nomeações não concretiza<strong>da</strong>s por<br />

“Malkovich” e “Ina<strong>da</strong>ptado”).<br />

Esta história <strong>de</strong> amor que literalmente<br />

se recusa a ser esqueci<strong>da</strong> (porque<br />

esquecer implicaria apagar a ver<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>da</strong>s emoções e <strong>da</strong> i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />

per<strong>de</strong>r a humani<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> quem somos)<br />

é ao mesmo tempo a sequela<br />

perfeita aos filmes anteriores e a introdução<br />

i<strong>de</strong>al a “Sinédoque, Nova<br />

Iorque”, <strong>de</strong>senvolvido inicialmente<br />

como (pasme-se) um filme <strong>de</strong> terror<br />

para Spike Jonze dirigir.<br />

Universos paralelos<br />

Concebido como um filme <strong>de</strong> género,<br />

“Sinédoque, Nova Iorque” transformou-se<br />

numa meditação claustrofóbica<br />

sobre a i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong>, a arte e a vi<strong>da</strong><br />

que a Columbia não quis financiar,<br />

que Jonze (retido na produção conturba<strong>da</strong><br />

<strong>de</strong> “O Sítio <strong>da</strong>s Coisas Selvagens”)<br />

não pô<strong>de</strong> realizar, e que Kaufman<br />

acabou por dirigir sozinho na sua<br />

Não há ninguém que<br />

consiga aproximar-se<br />

<strong>de</strong> Kaufman na<br />

construção <strong>de</strong><br />

universos paralelos.<br />

“Sinédoque” é um<br />

labirinto em<br />

constante mutação,<br />

on<strong>de</strong> é tão fácil per<strong>de</strong>r<br />

o pé que o próprio<br />

autor se terá perdido<br />

pelo meio<br />

estreia atrás <strong>da</strong> câmara. Confirmando<br />

ao mesmo tempo duas coisas.<br />

Primeira: Kaufman é mais argumentista<br />

(teórico <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias) do que<br />

realizador (praticante <strong>de</strong> imagens), e<br />

a sua inexperiência confirma que é<br />

preciso uma invulgar conjugação <strong>de</strong><br />

talentos para levar a bom porto um<br />

filme seu — “Sinédoque” é muito mais<br />

filme <strong>de</strong> argumentista do que primeira<br />

obra <strong>de</strong> realizador estreante.<br />

Segun<strong>da</strong>: não há ninguém que consiga<br />

sequer aproximar-se <strong>de</strong> Kaufman<br />

no que diz respeito à construção <strong>de</strong><br />

universos paralelos. “Sinédoque” é<br />

um labirinto em constante mutação,<br />

on<strong>de</strong> é tão fácil per<strong>de</strong>r o pé entre os<br />

vários níveis <strong>de</strong> referenciali<strong>da</strong><strong>de</strong> que,<br />

alega<strong>da</strong>mente, o próprio autor se terá<br />

perdido pelo meio.<br />

A história <strong>de</strong> um encenador <strong>de</strong> teatro<br />

preso numa espiral obsessiva<br />

afina, refina e pormenoriza a invenção<br />

<strong>de</strong> uma reali<strong>da</strong><strong>de</strong> paralela que<br />

reencontramos em todos os filmes<br />

escritos por Kaufman, a meta-narrativa<br />

que navega entre a arte a vi<strong>da</strong>, a<br />

incapaci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> esquecer o passado<br />

que fez <strong>de</strong> nós quem somos, a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> tentar fazer sentido do<br />

mundo que nos ro<strong>de</strong>ia (mesmo que<br />

esse mundo seja um casulo puramente<br />

interno...). É uma espécie <strong>de</strong> “Kaufman<br />

redux”, só que sem a escapatória<br />

<strong>de</strong> um final mais ou menos feliz<br />

ou <strong>de</strong> um regresso à reali<strong>da</strong><strong>de</strong>: “Sinédoque”<br />

é uma toca <strong>de</strong> coelho que se<br />

esboroa atrás <strong>de</strong> nós em direcção a<br />

um final abrupto mas inescapável.<br />

“Só existe um único final para qualquer<br />

história. A vi<strong>da</strong> humana acaba<br />

com a <strong>morte</strong>. Até lá chegarmos, a vi<strong>da</strong><br />

vai an<strong>da</strong>ndo, vai ficando mais complica<strong>da</strong>.<br />

Tudo implica per<strong>da</strong>.”<br />

As palavras são do próprio Kaufman,<br />

à revista “Wired”, aquando <strong>da</strong><br />

estreia americana <strong>de</strong> “Sinédoque”. E<br />

se elas sugerem que a estreia na realização<br />

do argumentista é um filme<br />

<strong>de</strong>primido/<strong>de</strong>pressivo, pensemos<br />

apenas no seguinte: para quem imaginou<br />

a reencarnação no corpo <strong>de</strong><br />

John Malkovich, o sacrifício <strong>de</strong> um<br />

irmão gémeo que nunca existiu ou<br />

uma memória que se recusa a ser apaga<strong>da</strong>,<br />

admitir que <strong>da</strong>qui ninguém sai<br />

vivo é um triunfo <strong>de</strong> pragmatismo.<br />

A não ser, claro, que tudo isto apenas<br />

exista na cabeça <strong>de</strong> Charlie Kaufman.<br />

Ver crítica <strong>de</strong> filmes na pág. 33 e segs.<br />

Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 15


ANDREW ZAEH<br />

Música<br />

Lee Fields po<strong>de</strong> não ser uma estrela<br />

e po<strong>de</strong> nunca vir a ser uma estrela,<br />

mas está há tempo <strong>de</strong> mais no circuito<br />

para não se divertir com o que lhe<br />

está a acontecer.<br />

Ao fim e ao cabo, este é o tipo que<br />

esteve mais <strong>de</strong> <strong>de</strong>z anos à espera até<br />

gravar o primeiro disco e 13 até ao<br />

segundo, que se <strong>de</strong>u com as gentes<br />

<strong>da</strong> Stax mas nunca capitalizou no sucesso<br />

<strong>da</strong> editora, que foi consi<strong>de</strong>rado<br />

um émulo <strong>de</strong> James Brown, que <strong>de</strong>u<br />

dicas em discos <strong>de</strong> hip-hop, que sobreviveu<br />

fazendo segun<strong>da</strong>s vozes,<br />

sem que por um segundo o nome <strong>de</strong>le<br />

fosse conhecido para lá <strong>de</strong> um circuito<br />

mínimo <strong>de</strong> entendidos.<br />

Não é a primeira vez que isto acontece:<br />

Bettye LaVette e Sharon Jones<br />

são exemplos <strong>de</strong> divas que an<strong>da</strong>ram<br />

séculos perdi<strong>da</strong>s antes <strong>de</strong> serem re<strong>de</strong>scobertas<br />

por miúdos com i<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

para serem filhos <strong>de</strong>las, e que as fizeram<br />

gravar discos com as canções e<br />

condições necessárias.<br />

E agora é a vez <strong>de</strong> Fields ser entronado<br />

neste revivalismo <strong>da</strong> soul. Fields<br />

há-<strong>de</strong> ter tremen<strong>da</strong>s histórias para<br />

contar. Mas há coisas que ele não conta<br />

– e diverte-se com isso.<br />

A <strong>da</strong><strong>da</strong> altura, em conversa telefónica<br />

para sua casa, fazemos-lhe uma<br />

pergunta, uma simples pergunta. A<br />

resposta, que não estávamos <strong>de</strong> todo<br />

à espera, vem num tom roufenho,<br />

entre o divertido e o muito sério.<br />

“Má pergunta”, diz, e não sabemos<br />

se o homem está zangado ou não.<br />

“Essa é uma má pergunta”, repete<br />

e aqui começa a rir-se, indicando que<br />

não há zanga <strong>da</strong> sua parte.<br />

Que assunto será esse que o senhor<br />

Fields quer guar<strong>da</strong>r a sete chaves?<br />

Um passado <strong>de</strong> arrombador <strong>de</strong> cofres?<br />

Os anos passados como “drag queen”<br />

num botequim no Harlem?<br />

Um fetiche zoófilo?<br />

Não, na<strong>da</strong> disso. A resposta é: a<br />

i<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

No que toca à i<strong>da</strong><strong>de</strong> Lee Fields é<br />

pior do que algumas senhoras e alguns<br />

futebolistas que retiram anos ao<br />

BI. Ele nem sequer diz em que ano<br />

nasceu.<br />

Mas porquê? Porque raio há-<strong>de</strong> um<br />

homem que passou quase to<strong>da</strong> a sua<br />

vi<strong>da</strong> na semi-obscuri<strong>da</strong><strong>de</strong> escon<strong>de</strong>r<br />

16 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon<br />

a sua <strong>da</strong>ta <strong>de</strong> nascimento logo agora<br />

que começam a olhar para ele?<br />

Muito simples: “Neste momento<br />

há muita curiosi<strong>da</strong><strong>de</strong> a meu respeito<br />

e não me apetece que a curiosi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

acabe. Deixa-os continuar a perguntar.”<br />

E <strong>de</strong>pois, para que não restem<br />

dúvi<strong>da</strong>s <strong>de</strong> que há humor <strong>da</strong> sua parte,<br />

acrescenta a rir: “Desculpe, mas<br />

é assim que as coisas são”.<br />

É assim que as coisas são, mas não<br />

foi sempre assim que as coisas foram.<br />

O sucesso, por exemplo, é uma coisa<br />

que (parece que) Fields nunca teve. E<br />

agora (parece que) está a ter. Tudo por<br />

causa <strong>de</strong> um disco acabado <strong>de</strong> editar,<br />

feito <strong>de</strong> linhas <strong>de</strong> baixo dirigi<strong>da</strong>s à espinha,<br />

guitarras que fazem cócegas<br />

nos pés, órgãos saídos <strong>de</strong> uma igreja<br />

sulista, cor<strong>da</strong>s com arrependimento<br />

e metais cheios <strong>de</strong> pecado.<br />

Chama-se “My Life”, é soul à antiga<br />

e parece que é apenas o sétimo disco<br />

em nome próprio que Fields gravou.<br />

Dizemos “parece” porque o próprio<br />

Fields não está muito certo <strong>da</strong> sua<br />

discografia.<br />

“Sabe quantas canções gravei em<br />

meu nome? Umas sessenta, não mais<br />

que isso”.<br />

“My Life” é um disco <strong>de</strong> outro mundo,<br />

refina<strong>da</strong>mente arranjado, soberbamente<br />

interpretado. Fields espalha<br />

classe em ca<strong>da</strong> canção. Tem o seu<br />

número James Brown, o seu número<br />

Marvin Gaye, o seu número Smokey<br />

Robinson, o seu número Eddie<br />

Floyd.<br />

Ouve-se o disco e pensa-se: como<br />

é que este homem não tem <strong>de</strong>zenas<br />

<strong>de</strong> discos gravados?<br />

“Deixei-me explicar-lhe uma coisa,<br />

jovem: não gravei mais porque eu não<br />

queria gravar o que a indústria me<br />

man<strong>da</strong>va gravar. Eu queria gravar o<br />

que eu quisesse gravar. Não estou a<br />

dizer que o que fiz era o que tinha<br />

mesmo <strong>de</strong> ser feito, eu só fiz o que eu<br />

queria fazer. E foi por isso que gravei<br />

poucos discos”.<br />

A soul nunca foi negra<br />

Fields fala como se estivesse cheio <strong>de</strong><br />

vi<strong>da</strong> na boca: começa por respon<strong>de</strong>r<br />

a uma pergunta e <strong>de</strong>pois, à maneira<br />

dos pregadores <strong>de</strong> igreja, não para.<br />

Um assunto leva a outro, por tudo e<br />

por na<strong>da</strong> diz que está cheio <strong>de</strong> amor<br />

Lee Fields pôs<br />

“tudo o que<br />

tinha” em “My<br />

World”<br />

por to<strong>da</strong> a gente, ri-se, volta atrás, faz<br />

confissões, jura amor pela mulher,<br />

oferece <strong>de</strong>finições para a soul, diz<br />

que a “black music” há-<strong>de</strong> ser<br />

“everybody’s music”, diz que a soul<br />

acabou com a segregação porque “é<br />

música soul, não é música <strong>da</strong> soul dos<br />

pretos”. É tão conversador que a <strong>da</strong><strong>da</strong><br />

altura resolve explicar a génese <strong>da</strong><br />

música soul. “Primeiro chamaramlhe<br />

blues. E o blues era sobre os altos<br />

e baixos <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> <strong>da</strong>s pessoas normais.<br />

Quando chegou a soul o canto aproximou-se<br />

do gospel. Cantava-se como<br />

se se estivesse na igreja. É r’n’b na<br />

forma <strong>de</strong> igreja. E o r’n’b <strong>de</strong> hoje reflecte<br />

o mesmo, é uma canção sobre<br />

os altos e baixos do homem comum”,<br />

diz, embora seja uma tese difícil <strong>de</strong><br />

aceitar.<br />

Fields não é bem um teórico, é antes<br />

um génio do improviso, sacando<br />

teorias do bolso à medi<strong>da</strong> que lhe<br />

aparecem. Uma <strong>da</strong>s suas melhores<br />

teorias é que a soul nunca foi negra.<br />

“Havia brancos na Stax. Havia<br />

brancos na audiência. Havia brancos<br />

entre os músicos. Eu sei o que estou<br />

a dizer: eu estava lá”.<br />

E porque é que a soul nunca foi tão<br />

“mainstream” quanto po<strong>de</strong>ria ter sido,<br />

se havia tantos brancos a apreciála?<br />

Simples: “O ‘mainstream’ é o que<br />

a gran<strong>de</strong> indústria quiser que seja. É<br />

o que está na agen<strong>da</strong> <strong>de</strong>les. Po<strong>de</strong>-se<br />

pôr um porco na TV e se o <strong>de</strong>ixarmos<br />

tempo suficiente as pessoas acham<br />

que é bom.”<br />

Com to<strong>da</strong> a sua proficui<strong>da</strong><strong>de</strong> verbal,<br />

com todo o seu humor, Fields está,<br />

niti<strong>da</strong>mente, a divertir-se com o seu<br />

“suposto” sucesso. E diz suposto porque,<br />

apesar <strong>de</strong> “My World” an<strong>da</strong>r a<br />

ser citado por todo o lado, ele não faz<br />

i<strong>de</strong>ia “do que os mais novos acham<br />

<strong>de</strong>ste disco” mas sabe que “fazia mais<br />

dinheiro a ser músico <strong>de</strong> sessão”.<br />

Para Lee Fields, haja ou não sucesso,<br />

seja ou não “My World” um disco<br />

<strong>de</strong> retro-soul, as coisas são simples:<br />

“Isto é apenas soul, isto é a mesma<br />

coisa que sempre fiz”.<br />

Então raios partam a indústria que<br />

<strong>de</strong>ixa passar incógnito um talento<br />

<strong>de</strong>stes.<br />

“Little James Brown”<br />

O que é que sabemos ao certo <strong>de</strong> Lee<br />

“Não gravei mais<br />

porque não queria<br />

gravar o que a<br />

indústria me<br />

man<strong>da</strong>va gravar.<br />

Queria gravar o que<br />

eu quisesse gravar”<br />

Lee Fields<br />

Fields? Nasceu em Wilson, uma pequena<br />

terra <strong>da</strong> Carolina do Norte,<br />

informação que ele confirma, bem<br />

como a <strong>de</strong> que tem mais três irmãos.<br />

Não conta como aconteceu, mas “já<br />

fazia discos em 1969”.<br />

Tendo em conta que a sua alcunha<br />

era “Little JB”, por causa <strong>da</strong>s semelhanças<br />

faciais com James Brown, é<br />

possível que tenha começado cedo.<br />

Ele <strong>de</strong>fine essa época como “a altura<br />

em que a soul tal como a conhecíamos<br />

estava a morrer”. O rock e o funk<br />

psicadélico, “como o Sly Stone”, diz,<br />

“estavam a pegar”. “Mas eu nunca<br />

fui cool”, acrescenta, e o seu amor<br />

era só um: a soul.<br />

Fields, apesar <strong>de</strong> imensamente conversador<br />

(note-se: nunca ouvimos<br />

ninguém falar tanto) não é muito prolixo<br />

em relação às suas activi<strong>da</strong><strong>de</strong>s no<br />

circuito. Diz que gravou umas canções,<br />

o que quer dizer, em termos antigos,<br />

singles. É curioso que ele ain<strong>da</strong><br />

fala nesses termos, como se nunca<br />

tivesse havido LP, CD, EP, mp3.<br />

Era, admiti<strong>da</strong>mente, um James<br />

Brown em ponto pequeno. “Eu adoro<br />

o James Brown, meu. Ele era um<br />

Deus no meu coração e continuo a<br />

respeitá-lo. Um dos gran<strong>de</strong>s ‘entertainers’<br />

que viveram até hoje, ele e o<br />

Michael Jackson”.<br />

As comparações com o homem<br />

mais trabalhador do negócio mantiveram-se<br />

o tempo suficiente para a<br />

<strong>da</strong><strong>da</strong> altura ele ter sentido que estava<br />

na hora “<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> ser o pequeno<br />

JB”. “Lá pelos meus vintes comecei<br />

a achar que não era apreciado pelo<br />

que era. E ain<strong>da</strong> por cima era parecido<br />

com ele. Sempre <strong>de</strong>sviei a conversa<br />

quando se falava disso. Dizia ‘Ouve<br />

Lee Fields<br />

finalmente<br />

é a hora <strong>de</strong>le<br />

Não se sabe que i<strong>da</strong><strong>de</strong> tem Lee Fields mas an<strong>da</strong> nisto há muito.<br />

Com “My World” já ganhou o ano. Como é que este homem<br />

não tem <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> discos gravados? João Bonifácio


o meu disco’. Mas não me importava<br />

porque estava a divertir-me”.<br />

É difícil dizer o que Fields andou a<br />

fazer <strong>de</strong>s<strong>de</strong> então. “Estive sempre a<br />

trabalhar”, diz, <strong>de</strong> forma incisiva. Fez<br />

“muitos coros, muitas segun<strong>da</strong>s vozes”,<br />

incluindo para os Kool and The<br />

Gang; cantou “linhas em discos do<br />

Jay-Z”. Resumindo: “Sempre estive<br />

no circuito”.<br />

Há um momento muito engraçado,<br />

em que, referindo-se a questões monetárias,<br />

Fields diz: “Não preciso <strong>de</strong><br />

champanhe caro, não é o meu chá”.<br />

Tendo em conta o peso que o champanhe<br />

tem no imaginário e na vi<strong>da</strong><br />

<strong>de</strong> Jay-Z, parece haver aqui um certo<br />

gozo ao rei do hip-hop.<br />

Um disco imprevisto<br />

O dinheiro, note-se, é uma questão<br />

importante para Fields. Ele faz questão<br />

que fique bem claro que apesar <strong>de</strong><br />

“nunca ter tido um êxito” também<br />

nunca teve problemas. “Nunca fui rico,<br />

mas sempre tive dinheiro para viver<br />

bem”, afirma enfaticamente. “Se vier<br />

a minha casa verá que não vivo como<br />

um rei mas vivo muito bem. Sempre<br />

vivi. Sempre viajei para on<strong>de</strong> quis e os<br />

carros que quis ter pu<strong>de</strong> tê-los”.<br />

Claro que um discurso <strong>de</strong>stes tem<br />

sempre pequenas falhas e contradições.<br />

A certo momento Fields afirma:<br />

“Já não tenho um período em baixo<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> os anos 80”. Nessa altura fazia<br />

faixas disco para sobreviver. “Não<br />

estou a lutar contra na<strong>da</strong>, também<br />

tenho <strong>de</strong> pôr pão na mesa”, faz questão<br />

<strong>de</strong> dizer.<br />

Mas a sorte do pequeno JB <strong>de</strong>u-se<br />

quando Jeff Silverman and Leon Michels<br />

montaram a Truth & Soul records<br />

em 2004 e <strong>de</strong>finiram como<br />

priori<strong>da</strong><strong>de</strong> fazer um gran<strong>de</strong> disco para<br />

Lee. Montaram um ban<strong>da</strong>, os Expressions,<br />

com malta dos Dap Kings,<br />

dos Antibalas, mas esqueceram-se <strong>de</strong><br />

lhe dizer que estavam a fazer um disco<br />

para ele.<br />

Para nossa surpresa, Lee diz a <strong>da</strong><strong>da</strong><br />

altura: “Não sabia que estava a gravar<br />

‘My World’. Não sabia”. Compreen<strong>de</strong>se:<br />

o disco foi gravado ao longo <strong>de</strong><br />

quatro anos. “Chamavam-me para<br />

gravar uma canção e eu ia, mas entre<br />

ca<strong>da</strong> telefonema passava tanto tempo<br />

que nunca me ocorreu que estivéssemos<br />

a fazer um disco. Pensei que<br />

estivéssemos a gravar uma canção ou<br />

outra para um disco dos Expressions,<br />

não o meu disco. Talvez eles me tenham<br />

dito, mas eu falo com <strong>de</strong>z pessoas<br />

por dia e estou sempre a viajar<br />

<strong>de</strong> um lado para o outro, por isso não<br />

<strong>de</strong>coro tudo o que dizem”.<br />

Apesar <strong>de</strong> estar a gravar sem saber<br />

o quê, Fields pôs “tudo o que tinha<br />

naquele disco”. Que, para ele, “é um<br />

regresso à ‘sweet soul music’ e é lindo”.<br />

Penúltimas famosas palavras <strong>de</strong><br />

Lee Fields, homem <strong>de</strong> i<strong>da</strong><strong>de</strong> incerta<br />

e que tornou a soul doce outra vez:<br />

“Não tenho arrependimentos. O que<br />

me interessava era divertir-me – e diverti-me<br />

o mais que pu<strong>de</strong>. Não mu<strong>da</strong>ria<br />

a minha vi<strong>da</strong>.”<br />

E como bom homem soul acaba a<br />

dizer “Diga aí em Portugal que o Lee<br />

Fields ama to<strong>da</strong> a gente”.<br />

Ver crítica <strong>de</strong> discos na pág. 22 e segs.<br />

Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 17


Música<br />

Poucas coisas nos Sizo são como costumam<br />

ser as coisas no rock’n’roll.<br />

Afirmam-se como um “power trio”<br />

com quatro membros, dislate que tem<br />

a sua correspondência na prática; fazem<br />

“singles” memoráveis que man<strong>da</strong>m<br />

para as urtigas as sacrossantas<br />

regras <strong>da</strong> canção pop; não têm o objectivo<br />

supremo <strong>de</strong> lançar um álbum.<br />

Editaram recentemente “Got To Love<br />

People Who Set Themselves Up for<br />

Disaster”, o seu terceiro registo (os<br />

20 minutos que tem encaixam-no oficialmente<br />

na categoria EP, mas a ban<strong>da</strong><br />

prefere não pensar nisso) e um dos<br />

mais promissores discos do ano português.<br />

Em 2005, André Cruz e João Gue<strong>de</strong>s<br />

an<strong>da</strong>vam na Escola Superior <strong>de</strong><br />

Arte e Design, em Matosinhos. “Tínhamos<br />

interesses musicais em comum<br />

- ain<strong>da</strong> temos - e outros. Começámos<br />

a falar. Eu já tinha tido ban<strong>da</strong>s,<br />

se é que lhes posso chamar ban<strong>da</strong>s.<br />

Fizemos umas experiências em salas<br />

<strong>de</strong> ensaios com uns amigos”, recor<strong>da</strong><br />

André, em conversa com o Ípsilon<br />

numa confeitaria no centro do Porto,<br />

num calmo final <strong>de</strong> tar<strong>de</strong> <strong>de</strong> Agosto.<br />

Nessa altura, a ban<strong>da</strong> do Porto era<br />

“uma formação clássica <strong>de</strong><br />

rock’n’roll”: baixo, guitarra, bateria<br />

e voz, a que se juntou, mais tar<strong>de</strong>,<br />

Eurico Amorim no sintetizador e nos<br />

teclados. Até que o baixista rumou a<br />

Barcelona e, em vez <strong>de</strong> procurarem<br />

um substituto, <strong>de</strong>ram a Eurico um<br />

papel <strong>de</strong> maior <strong>de</strong>staque. “Com uma<br />

restrição acabámos por encontrar um<br />

som. Quando tens um problema acabas<br />

por encontrar uma solução. Resolver<br />

um problema através <strong>de</strong> outro<br />

problema tem bastante a ver connosco”,<br />

diz João Gue<strong>de</strong>s.<br />

O que resultou <strong>da</strong> estratégia foi uma<br />

ban<strong>da</strong> que suga a energia <strong>de</strong> várias<br />

formas <strong>de</strong> rock (<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o garage ao<br />

pós-punk) e a aplica em canções simples,<br />

concisas, sem ornamentos. E<br />

com espaço para surpresas. “She nods”,<br />

por exemplo, sintomaticamente<br />

o “single”, tem algo que se parece<br />

com um refrão mas… não o repete.<br />

18 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon<br />

Na cabeça hiper<br />

A ban<strong>da</strong> do Porto tem um novo EP, formato que assenta b<br />

“Got To Love People Who Set Themselves Up for Disaster” mostra como r<br />

Uma ban<strong>da</strong> <strong>de</strong> pop-rock (sim, os Sizo<br />

cabem nessa imensa gaveta) <strong>de</strong>sconstrutivista?<br />

Eles dizem que não. “A ‘She<br />

nods’ apareceu estava eu sentado na<br />

bateria – e não sei tocar bateria -, o<br />

baterista no teclado - o Eurico tinha<br />

talvez ido à casa <strong>de</strong> banho Foi assim<br />

que apareceu a base. É a isso que acho<br />

pia<strong>da</strong>: <strong>de</strong> repente temos um ‘single’,<br />

mas só porque apareceu”, revela André.<br />

E, apesar <strong>de</strong> tudo, “a estrutura<br />

pop está lá”.<br />

Trata-se, afinal, <strong>de</strong> reduzir tudo “ao<br />

essencial”, prossegue Eurico. “Nunca<br />

fazemos coisas arrisca<strong>da</strong>s a nível <strong>de</strong><br />

produção. Procuramos não disfarçar<br />

na<strong>da</strong>, queremos que o disco soe como<br />

um ensaio ou um concerto. As músicas<br />

são reduzi<strong>da</strong>s às partes mais simples,<br />

são quase to<strong>da</strong>s muito pequeninas,<br />

com poucas partes. Nasceram<br />

assim”. Agora percebe-se o que queriam<br />

dizer com a misteriosa afirma-<br />

“Nos anos 70 houve<br />

um revisitar do rock<br />

pelos Suici<strong>de</strong>, que têm<br />

muito <strong>de</strong> garage rock,<br />

apesar <strong>de</strong> não terem<br />

guitarras. Isso<br />

reflecte um pouco<br />

o que são os Sizo: tens<br />

a história do rock,<br />

com um lado<br />

electrónico mais<br />

contemporâneo<br />

e a guitarra e bateria<br />

clássicas do<br />

rock’n’roll...”<br />

André Cruz<br />

O abismo é um lugar bonito<br />

Há uma famosa “gaffe” atribuí<strong>da</strong> a um jogador <strong>de</strong> futebol que reza assim: “Estivemos à beira do abismo,<br />

mas soubemos <strong>da</strong>r um passo em frente”. Os Sizo gostam <strong>de</strong> pessoas que a levam à letra. Enquanto<br />

preparavam “Got To Love People Who Set Themselves Up for Disaster”, fizeram uma extensa lista com<br />

esses nomes. Eis algumas <strong>de</strong>ssas pessoas que “têm uma atitu<strong>de</strong> rock’n’roll para com a vi<strong>da</strong>”.<br />

Charles Bukowski<br />

Escritor (1920-1994)<br />

Atrai-lhes a “<strong>de</strong>smistificação<br />

dos ídolos”. “A maior parte<br />

<strong>da</strong>s pessoas tem esse lado<br />

dos mitos, <strong>de</strong> olhar para<br />

uma estrela <strong>de</strong> rock ou um<br />

jogador <strong>de</strong> futebol como um<br />

mito e, se calhar, são uns idiotas<br />

<strong>de</strong> todo o tamanho”, diz André.<br />

Bukowski “era genuíno, um gajo<br />

puro que curtia beber uns copos<br />

e escrever umas histórias. Era<br />

criativo muito por isso, por ser<br />

genuíno. Sentia aquela urgência<br />

<strong>de</strong> escrever e também escrevia<br />

sobre pessoas como ele”.<br />

Hunter S. Thompson<br />

Jornalista e escritor (1937-2005)<br />

Há um lado melómano na


activa dos Sizo<br />

bem à imediatez que se transformou na sua imagem <strong>de</strong> marca.<br />

reduzir as coisas ao essencial é, muitas vezes, o melhor remédio. Pedro Rios<br />

admiração por Thompson, o<br />

pai do “Gonzo Journalism”,<br />

que punha o repórter como<br />

parte integrante <strong>da</strong><br />

história, rejeitando o<br />

mito <strong>da</strong> objectivi<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

“Escreveu para a ‘Rolling<br />

Stone’ artigos importantes<br />

<strong>da</strong> história <strong>da</strong> música”,<br />

diz João. Mas há mais<br />

em Thompson <strong>de</strong><br />

que os Sizo gostam:<br />

“refugiou-se num<br />

rancho” e tem um “lado<br />

<strong>de</strong> perigo, rock, drogas, <strong>de</strong><br />

‘faço aquilo que quero e quem<br />

quiser gosta, quem não quiser<br />

não gosta’”.<br />

PAULO RICCA<br />

André Cruz,<br />

André<br />

Holan<strong>da</strong>, João<br />

Gue<strong>de</strong>s (atrás)<br />

e Eurico<br />

Amorim (à<br />

frente): os Sizo<br />

vão no<br />

terceiro EP e<br />

não pensam<br />

no álbum. Por<br />

eles faziam<br />

um EP <strong>de</strong> meio<br />

em meio ano e<br />

<strong>de</strong>ixavam as<br />

coisas assim,<br />

à Radiohead<br />

Bill Hicks<br />

Comediante (1961-1994)<br />

“Ele fala bastante do<br />

Jimi Hendrix. Dizia que a música<br />

<strong>da</strong> altura <strong>de</strong>le – isto no fim dos<br />

anos 80 – não o entusiasmava,<br />

que faltava<br />

rock cá <strong>de</strong> <strong>de</strong>ntro, atitu<strong>de</strong> [os<br />

alvos eram, por exemplo,<br />

os New Kids On The Block].<br />

O gajo, querendo ser um<br />

músico, coisa que nunca foi,<br />

dizia as coisas com humor.<br />

Há uma frase <strong>de</strong>le que é ‘Play<br />

from your fucking heart”.<br />

Ele sempre batalhou por ser<br />

genuíno, por fazer o que queria”,<br />

refere João.<br />

VALERY HACHE/ AFP<br />

ção que puseram num comunicado<br />

<strong>de</strong> imprensa: “’power trio’ mas com<br />

quatro elementos”.<br />

O espírito do rock’n’roll<br />

A haver canção que <strong>de</strong>fine o que os<br />

Sizo querem ela é “Strychnine”, a versão<br />

dos Sonics, um dos nomes fun<strong>da</strong>mentais<br />

do garage rock dos anos 60.<br />

Como num “mashup”, os Sizo colocaram<br />

a linha <strong>de</strong> sintetizador <strong>de</strong><br />

“Ghost ri<strong>de</strong>r”, dos Suici<strong>de</strong> (duo que<br />

no seu disco <strong>de</strong> 1977 foi pioneiro <strong>de</strong><br />

mil aventuras electrónicas que se seguiriam).<br />

“Foi um bocado premeditado.<br />

É uma reflexão sobre a história<br />

do rock <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1965, que é a <strong>da</strong>ta <strong>da</strong><br />

‘Strychnine’. Depois, nos anos 70,<br />

houve um revisitar do rock pelos Suici<strong>de</strong>,<br />

que têm muito <strong>de</strong> garage rock,<br />

apesar <strong>de</strong> não terem guitarras. Isso<br />

reflecte um pouco o que são os Sizo:<br />

tens a história do rock, com um lado<br />

electrónico mais contemporâneo e a<br />

guitarra e bateria clássicas do<br />

rock’n’roll... Daí uma vonta<strong>de</strong> quase<br />

intuitiva <strong>de</strong> misturar os Suici<strong>de</strong> e os<br />

Sonics como um elogio ao<br />

rock’n’roll”.<br />

A conversa adquire contornos <strong>de</strong><br />

melomania exacerba<strong>da</strong>. André elogia<br />

os Sonics e outras “ban<strong>da</strong>s <strong>de</strong> garage<br />

dos Estados Unidos”, “os primeiros<br />

punks”, que “furavam os amplificadores<br />

com picadores <strong>de</strong> gelo para terem<br />

distorção, porque não havia pe<strong>da</strong>is,<br />

e com um microfone gravavam<br />

um disco inteiro com a ban<strong>da</strong> to<strong>da</strong> a<br />

tocar”. “É isso que nos interessa”, explica.<br />

A atitu<strong>de</strong> punk “está presente nos<br />

Sizo <strong>de</strong> uma forma bastante evi<strong>de</strong>nte”,<br />

continua o guitarrista, que aos<br />

nove anos ficou “fascinado” com os<br />

Toy Dolls, ban<strong>da</strong> punk inglesa: “No<br />

lado imediato <strong>de</strong> fazer as músicas, <strong>de</strong><br />

não pensar muito como é que vai soar,<br />

o que é que as pessoas vão achar.<br />

A forma como gravamos também tem<br />

um lado punk”. As canções <strong>de</strong> “Got<br />

To Love People Who Set Themselves<br />

Up for Disaster” não foram grava<strong>da</strong>s<br />

com a ban<strong>da</strong> to<strong>da</strong> a tocar ao mesmo<br />

Maradona<br />

Futebolista (1960- )<br />

“Para nós não foi só um jogador<br />

<strong>de</strong> futebol”, diz André. “Na<br />

altura em que jogou, o que<br />

representava para os a<strong>de</strong>ptos<br />

do Nápoles ou <strong>da</strong> Argentina<br />

não era apenas o melhor<br />

jogador do mundo: era<br />

tempo (o anterior, “Nice To Miss You”,<br />

disco bónus do novo trabalho, foi resultado<br />

<strong>de</strong> uma sessão ininterrupta<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>z horas <strong>de</strong> gravação), mas a imediatez<br />

mantém-se.<br />

Não estranha, por isso, que a ban<strong>da</strong><br />

tenha, até ao momento, três EP e nem<br />

acalente o tradicional sonho do álbum.<br />

“Não passam <strong>de</strong> três registos<br />

“A ‘She nods’ apareceu<br />

estava eu sentado<br />

na bateria – e não sei<br />

tocar bateria -, o<br />

baterista no teclado.<br />

É a isso que acho<br />

pia<strong>da</strong>: <strong>de</strong> repente<br />

temos um ‘single’, mas<br />

só porque apareceu”<br />

André Cruz<br />

que fizemos em condições técnicas e<br />

logísticas distintas, em alturas distintas<br />

e com músicas distintas”, resume<br />

André. Eurico acrescenta: “Estamos<br />

sempre em produção. Por nós, até<br />

fazíamos um EP <strong>de</strong> meio em meio<br />

ano”.<br />

Apontamos o exemplo dos Radiohead,<br />

que recentemente anunciaram<br />

que vão apostar em edições mais curtas<br />

em vez <strong>de</strong> álbuns, e eles riem-se.<br />

“Eles seguem-nos muito”, diz André,<br />

com ironia e ares <strong>de</strong> quem conta uma<br />

pia<strong>da</strong> priva<strong>da</strong> <strong>da</strong> ban<strong>da</strong> – uma suposta<br />

conspiração em que os Radiohead<br />

espiam os Sizo. “Lançámos o primeiro<br />

EP na Net antes dos Radiohead e<br />

passado uns meses também fizeram<br />

isso [com o álbum ‘In Rainbows’].<br />

Agora temos esta lógica e os Radiohead<br />

também têm. Não vou dizer mais<br />

na<strong>da</strong> [risos]”.<br />

Ver crítica <strong>de</strong> discos na pág. 22 e segs.<br />

o símbolo <strong>de</strong> uma libertação<br />

política, pessoal e social que<br />

nos interessa e que nos cativa”.<br />

“Era um rock’n’roller, um Jimi<br />

Hendrix do futebol: saía à noite,<br />

não dormia e ia jogar<br />

futebol como ninguém.<br />

A droga na altura <strong>de</strong>via<br />

ser melhor”. P.R.<br />

Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 19


Um sonho pop<br />

chamado Gol<strong>de</strong>n Silvers<br />

“True Romance” é a canção-fetiche <strong>de</strong>ste Verão. Definiram-na como<br />

“Prince li<strong>de</strong>rando os Span<strong>da</strong>u Ballet” (nós preferimos o Prince <strong>da</strong> equação).<br />

Os Gol<strong>de</strong>n Silvers não são tão bons quanto o tema título do álbum<br />

<strong>de</strong> estreia, mas po<strong>de</strong>m vir a sê-lo. Mário Lopes<br />

20 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon<br />

Neste preciso momento, os Gol<strong>de</strong>n<br />

Silvers, trio com inegável apreço por<br />

metais preciosos e o exuberante púrpura<br />

psicadélico, são inescapáveis. A<br />

culpa, como quase sempre nestas coisas<br />

<strong>da</strong> pop, é <strong>de</strong> um single. Já o viram<br />

certamente – se não o viram, corram<br />

ao MySpace ou ao You Tube e procurem<br />

por “True Romance”. Um cenário<br />

<strong>de</strong> programa alemão dos anos 1980,<br />

(mal) armado em Top Of The Pops, e<br />

muitas raparigas <strong>da</strong>nçando pelo cenário,<br />

com um feiticeiro <strong>de</strong> barrete<br />

bizarro e um B-boy pouco gracioso a<br />

<strong>de</strong>stoarem e uma “go-go <strong>da</strong>ncer” doura<strong>da</strong><br />

a compor o enquadramento. E<br />

<strong>de</strong>pois eles os três, o baterista <strong>de</strong> afro<br />

imponente, Alexis Martinez, o baixista<br />

<strong>de</strong> bigo<strong>de</strong> e patilha bem <strong>de</strong>finidos,<br />

Ben Moorhouse, homem do groove<br />

funk e <strong>da</strong>s segun<strong>da</strong>s vozes, e Gwilym<br />

Gold, o vocalista e teclista com pose<br />

<strong>de</strong> aristocrata pop que consi<strong>de</strong>ra ves-


O baterista<br />

<strong>de</strong> afro<br />

imponente,<br />

o baixista<br />

<strong>de</strong> bigo<strong>de</strong> e<br />

patilha bem<br />

<strong>de</strong>finidos e o<br />

vocalista e<br />

teclista com<br />

pose <strong>de</strong><br />

aristocrata<br />

pop<br />

tir-se <strong>de</strong> forma elegante uma <strong>de</strong>monstração<br />

<strong>de</strong> respeito – camisa púrpura,<br />

claro, fio <strong>de</strong> prata a cair sobre ela e os<br />

braços movendo-se <strong>de</strong>scoor<strong>de</strong>nados<br />

quando não se atiram ao pequeno teclado<br />

que têm à frente.<br />

“True Romance” é a canção-fetiche<br />

<strong>de</strong>ste Verão. Já a <strong>de</strong>finiram como<br />

“Prince, produzido por Niles Rogers,<br />

li<strong>de</strong>rando os Span<strong>da</strong>u Ballet”, e não<br />

está na<strong>da</strong> mal – mas nós preferimos<br />

trocar os Span<strong>da</strong>u Ballet pelos Duran<br />

Duran; ou melhor, o que preferimos<br />

mesmo é o Prince <strong>da</strong> equação, aquele<br />

quase rap <strong>de</strong> Gwilym nos versos e o<br />

ataque <strong>da</strong>s teclas num refrão que <strong>de</strong>monstra<br />

a superiori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> uma ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira<br />

pose cool neste mundo <strong>da</strong><br />

pop.<br />

Os Gol<strong>de</strong>n Silvers não são tão bons<br />

quanto “True Romance”, a canção<br />

que dá título ao seu álbum <strong>de</strong> estreia.<br />

Mas, ouvindo esse primeiro longa duração,<br />

fica a sensação que po<strong>de</strong>m vir<br />

a sê-lo. A sua música, iminentemente<br />

britânica, vagueia entre uma tradição<br />

<strong>de</strong> contadores <strong>de</strong> histórias ao piano<br />

(curtas fantasias <strong>de</strong> subtexto invariavelmente<br />

romântico e trágico), e um<br />

jogo pop que ora <strong>de</strong>ixa que as harmonias<br />

vocais se imponham, ora investe<br />

pela <strong>da</strong>nça com o funk no horizonte<br />

“Quando há tanta<br />

ilusória criação <strong>de</strong><br />

fenómenos por parte<br />

dos media, o melhor<br />

mesmo é construir a<br />

nossa própria cena,<br />

ou irão fazê-lo por<br />

nós. Hoje em dia é<br />

muito fácil as ban<strong>da</strong>s<br />

reunirem-se nos<br />

termos por elas<br />

<strong>de</strong>finidos, ocuparem<br />

um espaço e<br />

crescerem sem se<br />

sentirem intimi<strong>da</strong><strong>da</strong>s<br />

pela indústria”<br />

Gwylim Gold<br />

(a inevitável “True romance”) ou <strong>de</strong><br />

caipirinha na mão em “resort” imaginário<br />

(a <strong>de</strong>liciosa chungaria “high<br />

class” <strong>de</strong> “Arrows of eros”). Para além<br />

disso, os Gol<strong>de</strong>n Silvers, os contraditórios<br />

Gol<strong>de</strong>n Silvers (já lá vamos), são<br />

tipos ambiciosos e a contra-corrente<br />

do que é, actualmente, a norma na<br />

pop britânica.<br />

A pop como fantasia<br />

Gwilym Gold, que o Ípsilon entrevistou<br />

a meio <strong>da</strong> maratona <strong>de</strong> festivais<br />

que o trio cumpre actualmente, queixa-se<br />

<strong>de</strong> haver <strong>de</strong>masia<strong>da</strong> gente a<br />

anunciar a sua música como “incrivelmente<br />

nova e refrescante” quando<br />

“é <strong>de</strong>masiado óbvio que não o é”. Cavalheiro<br />

ou politicamente correcto,<br />

recusa-se a concretizar: “Não quero<br />

<strong>de</strong>itar abaixo o trabalho dos outros”,<br />

<strong>de</strong>clara. Fala então <strong>da</strong> sua própria<br />

ban<strong>da</strong>. Presenteia-nos com um par <strong>de</strong><br />

banali<strong>da</strong><strong>de</strong>s, as habituais - quer “escancarar<br />

as portas a algo “fresco e<br />

exuberante”, “que sobreviva ao teste<br />

do tempo” – antes <strong>de</strong> chegar a algo<br />

mais interessante.<br />

Nas entrevistas que <strong>de</strong>les lemos, há<br />

uma linha que Gwilym raramente atravessa,<br />

aquela que separa a vi<strong>da</strong> pública,<br />

a do músico em palco, <strong>da</strong> priva<strong>da</strong>.<br />

Num contexto mediático que, no universo<br />

<strong>da</strong> pop, vive obcecado com os<br />

bastidores, isto, não sendo inédito, é<br />

<strong>de</strong>certo pouco comum. É-o ain<strong>da</strong> mais<br />

quando percebemos que essa “protecção”<br />

não surge por reacção a uma<br />

cultura tablói<strong>de</strong>: é, antes, essencial à<br />

forma como o vocalista quer projectar<br />

a música dos Gol<strong>de</strong>n Silvers.<br />

Gwilym queixa-se do excesso <strong>de</strong><br />

“mun<strong>da</strong>ni<strong>da</strong><strong>de</strong>” nas letras que ouve<br />

– prefere as figuras com algo <strong>de</strong> negro,<br />

com o sentido trágico do velho blues,<br />

“poéticas sem se esforçarem por sêlo”.<br />

Exactamente o contrário do que<br />

vê hoje, quando “todos querem exibir<br />

as suas vi<strong>da</strong>s perante todos os outros<br />

no Facebook”. Os Gol<strong>de</strong>n Silvers recusam-se<br />

a fazê-lo: “Existimos na ban<strong>da</strong>.<br />

O resto <strong>da</strong>s nossas vi<strong>da</strong>s é supérfluo”.<br />

Fica assim enquadra<strong>da</strong> a forma<br />

que escolhe para elogiar David Bowie,<br />

uma <strong>da</strong>s suas maiores referências, a<br />

par dos Beach Boys ou <strong>de</strong> Sly & The<br />

Family Stone. Aprecia-o pela “capaci<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> <strong>da</strong>r um passo em frente” e <strong>de</strong><br />

“transformar-se realmente, convictamente,<br />

naquilo que i<strong>de</strong>alizou”. Aprecia<br />

David Bowie, enten<strong>da</strong>-se, pela<br />

forma como inventou corpo e música<br />

para Ziggy ou Thin White Duke. Ou<br />

seja, Gwilym, ele que se <strong>de</strong>fine, antes<br />

<strong>de</strong> tudo o resto, como um “compositor<br />

<strong>de</strong> canções”, acredita na força <strong>de</strong><br />

Música<br />

uma i<strong>de</strong>ia pop e no imaginário <strong>de</strong> fantasia<br />

para on<strong>de</strong> ela nos transporta –<br />

uma fantasia, enten<strong>da</strong>-se, sem dragões<br />

ou bolas <strong>de</strong> sabão, antes construí<strong>da</strong><br />

sobre aquelas que a fértil história <strong>da</strong><br />

pop foi construindo ao longo dos tempos.<br />

É precisamente neste ponto que<br />

cai sobre a mesa a contradição a que<br />

nos referimos acima. Porque, se ouvimos<br />

hoje falar dos Gol<strong>de</strong>n Silvers,<br />

se em pouco menos <strong>de</strong> um ano passaram<br />

<strong>de</strong> obscura ban<strong>da</strong> londrina a<br />

estrelas em ascensão, isso <strong>de</strong>ve-se a<br />

algo que, na escala pop, correspon<strong>de</strong><br />

ao grau zero <strong>de</strong> “coolness”.<br />

Em 2008, estiveram em Glastonbury,<br />

actuaram em Glastonbury. No<br />

palco principal? No secundário? Num<br />

camião estacionado à entra<strong>da</strong>? Na<strong>da</strong><br />

disso, subiram a palco para, perante<br />

um painel <strong>de</strong> júris, actuar no concurso<br />

“novos talentos” do festival. Ain<strong>da</strong><br />

por cima ganharam-no, o que po<strong>de</strong><br />

ser a macha<strong>da</strong><strong>da</strong> final na credibili<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> uma ban<strong>da</strong> – a magia <strong>da</strong> pop não<br />

se dá bem com concursos e ninguém<br />

respeita o vencedor <strong>de</strong> um <strong>de</strong>les.<br />

Gwylim, que tem perfeita consciência<br />

disso mesmo, <strong>de</strong>svaloriza o “inci<strong>de</strong>nte”.<br />

Explica que o manager os inscreveu<br />

sem avisar e confessa que sim, “foi<br />

estranho actuar perante júris”. Isto<br />

para concluir que, “apesar <strong>de</strong> tudo ter<br />

acontecido muito rápido a partir do<br />

concurso”, viram-no apenas como<br />

mais um concerto. Os Gol<strong>de</strong>n Silvers<br />

já existiam há algum tempo e to<strong>da</strong><br />

aquela trupe colori<strong>da</strong> que vemos no<br />

ví<strong>de</strong>o <strong>de</strong> “True romance” já os seguia.<br />

O concurso, dizem-nos, foi um pormenor<br />

<strong>de</strong> percurso.<br />

Quando a ban<strong>da</strong> nasceu, começou<br />

por fazer o circuito habitual londrino,<br />

trabalhando com os promotores habituais<br />

nas salas habituais. Fartaramse<br />

rapi<strong>da</strong>mente: “Os concertos não<br />

eram propriamente inspiradores, a<br />

promoção era medíocre, na<strong>da</strong> acon-<br />

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tecia”. A solução? “Fazer tudo por nós<br />

próprios”. Garantiram uma residência<br />

no MacBeth, um clube <strong>de</strong> Hoxton, no<br />

Noroeste <strong>de</strong> Londres, e começaram a<br />

organizar o Bronze Club. Tocavam<br />

eles, tocavam ban<strong>da</strong>s <strong>de</strong> que gostavam,<br />

promoviam os seus próprios DJ<br />

sets e convi<strong>da</strong>vam DJs para os fazerem.<br />

O primeiro concerto <strong>de</strong> Micachu<br />

com os Shapes, por exemplo, teve ali<br />

lugar. Gwylim, cuja música é tão obviamente<br />

diferente <strong>da</strong> <strong>da</strong> autora <strong>de</strong><br />

“Jewellery”, faz questão <strong>de</strong> acentuar<br />

que aquilo que os une é “uma vonta<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> reinvenção” – entretanto ela assinou<br />

uma remistura para os Gol<strong>de</strong>n<br />

Silvers e ele foi co-autor <strong>de</strong> uma canção<br />

<strong>de</strong> Micachu, “Train for a brain”.<br />

Gwylim Gold: “Quando há tanta ilusória<br />

criação <strong>de</strong> fenómenos por parte<br />

dos media, o melhor mesmo é construir<br />

a nossa própria cena, ou irão<br />

fazê-lo por nós. Hoje em dia é muito<br />

fácil fazê-lo, é fácil as ban<strong>da</strong>s reunirem-se<br />

nos termos por elas <strong>de</strong>finidos,<br />

ocuparem um espaço e crescerem<br />

sem se sentirem intimi<strong>da</strong><strong>da</strong>s por to<strong>da</strong><br />

a mer<strong>da</strong> <strong>da</strong> indústria”.<br />

Resumindo, os Gol<strong>de</strong>n Silvers utilizam<br />

as possibili<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> hoje para<br />

regressar a um mundo <strong>de</strong> fantasias<br />

pop que, <strong>de</strong>sgraça<strong>da</strong>mente, acreditam<br />

ter <strong>de</strong>saparecido. Cantam sobre<br />

miú<strong>da</strong>s que querem ser estrelas, mas<br />

nunca chegarão a sê-lo, cantam um<br />

par que ambiciona morrer <strong>de</strong> um coração<br />

<strong>de</strong>stroçado. Depois, saltam para<br />

a pista <strong>de</strong> <strong>da</strong>nça e oferecem-nos<br />

híbridos funk e psica<strong>de</strong>lismos transviados.<br />

Não serão consensuais e imaginamos<br />

que haverá quem os veja como<br />

“um Mika que resultou bem” – uma<br />

dica para os <strong>de</strong>tractores. Seja. Nós<br />

achamos que o seu romantismo e fantasia<br />

são bem-vindos a 2009 - e elegemos<br />

“True romance” canção do<br />

ano.<br />

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Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 21<br />

<br />

<br />

silva!<strong>de</strong>signers


Discos<br />

22 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon<br />

Pop<br />

Um “soul<br />

man” <strong>de</strong><br />

encantar<br />

“My World”, um dos raros<br />

álbuns do raro Lee Fields,<br />

tem uma produção cheia <strong>de</strong><br />

cetim, mas acima <strong>de</strong> tudo<br />

tem canções extraordinárias,<br />

arranjos imaculados e uma<br />

voz tremen<strong>da</strong>.<br />

João Bonifácio<br />

Lee Fields<br />

My World<br />

Truth & Soul; distri. Flur<br />

mmmmn<br />

Por mais que<br />

queiram, não é<br />

ver<strong>da</strong><strong>de</strong> que “My<br />

World” seja um<br />

disco<br />

exclusivamente<br />

retro, com<br />

aquele som sujo e repleto <strong>de</strong><br />

suor <strong>da</strong> soul muito<br />

antiga. “My World” é<br />

quase, quase,<br />

quase um disco<br />

retro, mas<br />

limado com<br />

uma<br />

precisão<br />

cirúrgica <strong>de</strong> modo a encantar não<br />

apenas duas <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> velhinhos<br />

melómanos rabugentos (como nós)<br />

mas também as jovenzinhas que<br />

apreciam Duffy. (Não por acaso,<br />

Fields é fã <strong>de</strong> Duffy.). Mais que<br />

aproximar-se do funk que o senhor<br />

Fields tanto preza, “My World” é um<br />

exemplo <strong>de</strong> melodia e arranjo, <strong>de</strong><br />

“sweet soul music”. (Curiosi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

soul: o gran<strong>de</strong> Arthur Conley tem<br />

um tema chamado “Sweet soul<br />

music”. A sua melhor canção, no<br />

entanto, é “A night is all I need”, um<br />

dos melhores temas soul <strong>de</strong> sempre.<br />

Está na hora do revivalismo <strong>de</strong><br />

Conley.) Tem os metais cheios <strong>de</strong><br />

mel, os coros <strong>de</strong>votos, os órgãos<br />

cool, as cor<strong>da</strong>s <strong>de</strong>lica<strong>da</strong>s que<br />

povoaram os discos <strong>da</strong> Stax e <strong>de</strong><br />

milhentas subsidiárias e editoras<br />

minúsculas dos anos 60, mas nunca<br />

se explo<strong>de</strong>: antes se pega no ouvinte<br />

pela mãozinha e, quando ele repara,<br />

está viciado nos órgãos, na<br />

bati<strong>da</strong>zinha ligeira, nos metais <strong>de</strong><br />

sopro <strong>de</strong> Verão. E na voz, a voz <strong>de</strong><br />

“soul man” <strong>de</strong> Lee Fields. “My<br />

World” tem uma produção cheia <strong>de</strong><br />

cetim (Al Green ia adorar cantar<br />

num disco assim), mas acima <strong>de</strong><br />

tudo tem canções. Logo à cabeça o<br />

tema-título, cujos órgãos e cor<strong>da</strong>s<br />

recor<strong>da</strong>m o<br />

Marvin<br />

Gaye<br />

aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />

<strong>de</strong> “What’s Going On”, é um<br />

supremo single, recheado <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>talhes: os metais em contra-ponto<br />

a um pizzicato <strong>de</strong> (parece ser)<br />

xilofone, a linha <strong>de</strong> guitarra, etc. As<br />

cor<strong>da</strong>s <strong>de</strong> “Ladies” vêm com unhas<br />

pinta<strong>da</strong>s, a guitarra wah-wah rebola<br />

as ancas, aqueles metais são uma<br />

homenagem aos <strong>de</strong>cotes<br />

pronunciados. E <strong>de</strong>via inventar-se<br />

um prémio para os coros <strong>de</strong> “My<br />

world is empty without you”: a linha<br />

melódica é <strong>de</strong>fini<strong>da</strong> por sinos,<br />

cor<strong>da</strong>s volteiam torno <strong>da</strong> guitarra, a<br />

voz é plena <strong>de</strong> um qualquer<br />

sofrimento que só vale a pena em<br />

canção. Do princípio ao fim é assim:<br />

canções extraordinárias, arranjos<br />

imaculados, uma voz tremen<strong>da</strong>. Isto<br />

não é retro. Isto é gran<strong>de</strong> música.<br />

Sizo<br />

Got To Love People Who Set<br />

Themselves Up for Disaster<br />

Wash, distri. Locomotive<br />

mmmnn<br />

O terceiro EP dos<br />

Sizo começa com<br />

uma bateria<br />

locomotiva, a que<br />

se juntam, poucos<br />

segundos <strong>de</strong>pois,<br />

guitarras à Sonic<br />

Youth, uma voz áspera. É uma<br />

espécie <strong>de</strong> la<strong>da</strong>inha eléctrica,<br />

simples, sem manhas, nem<br />

rodriguinhos e que <strong>de</strong>fine ao que<br />

vem a ban<strong>da</strong> do Porto.<br />

Esta é, coisa rara, uma ban<strong>da</strong> rock<br />

com “singles” radiofónicos mas sem<br />

medo <strong>de</strong> berrar e <strong>de</strong> armar uma<br />

chinfrineira. Têm a dose certa <strong>de</strong><br />

perigosi<strong>da</strong><strong>de</strong>, que aplicam com<br />

sapiência em canções memoráveis,<br />

curtas e eficazes. Ouça-se “She<br />

nods”: abre com uma linha<br />

fantasmagórica <strong>de</strong> sintetizador,<br />

entram <strong>de</strong>pois guitarras <strong>de</strong>vedoras<br />

do pós-punk e João Gue<strong>de</strong>s, o<br />

Com “My World”,<br />

Lee Fields <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong><br />

ser um segredo<br />

Sizo, uma ban<strong>da</strong> rock<br />

com singles radiofónicos<br />

mas sem medo <strong>de</strong> armar<br />

uma chinfrineira<br />

vocalista, em registo quase “spoken<br />

word”, e ouvimos algo que teria<br />

tudo para ser um refrão, mas que o<br />

grupo <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> não repetir, num<br />

saudável <strong>de</strong>srespeito pelas regras<br />

<strong>da</strong>s rádios.<br />

“Obsession/Reaction” faz-se em<br />

torno <strong>de</strong> um “riff” <strong>de</strong> guitarra<br />

circular, os teclados a fazer as vezes<br />

<strong>de</strong> baixo e gritos escondidos por<br />

uma nuvem <strong>de</strong> “reverb”.<br />

“Strychnine”, o melhor momento do<br />

EP, acelera o original dos Sonics,<br />

casa a métrica <strong>da</strong> guitarra com a<br />

dolente linha clássica <strong>de</strong> sintetizador<br />

<strong>de</strong> “Ghost ri<strong>de</strong>r” dos Suici<strong>de</strong>, e a<br />

fusão tem tanto <strong>de</strong> interessante<br />

como <strong>de</strong> simbólico, colocando os<br />

Sizo algures entre duas formas <strong>de</strong><br />

ver o rock, afinal tão próximas.<br />

“Tour <strong>de</strong> force” é outro atestado <strong>de</strong><br />

força percussiva, com um solo <strong>de</strong><br />

guitarra que lembra “East Bay ray”<br />

dos Dead Kennedys.<br />

“Got To Love People Who Set<br />

Themselves Up for Disaster” vem<br />

acompanhado do EP “Nice to Miss<br />

You” e é notória a evolução <strong>da</strong><br />

ban<strong>da</strong>: no EP anterior havia boas<br />

i<strong>de</strong>ias (como o “single” “Big three”),<br />

cuja força era conti<strong>da</strong> pela gravação<br />

mais roufenha. Postos lado a lado,<br />

percebe-se que os Sizo têm uma<br />

ampla margem <strong>de</strong> progressão. Para<br />

já, os sinais são muito animadores.<br />

Pedro Rios<br />

Gol<strong>de</strong>n Silvers<br />

True Romance<br />

XL Recordings; distri. Popstock<br />

mmmnn<br />

Existe esta música<br />

e esta música<br />

apenas: “True<br />

romance”, três<br />

minutos e meio <strong>de</strong><br />

inexcedível<br />

perfeição pop. Um<br />

homem, que canta como vocalista<br />

cool a arriscar o rap dos beatnicks e<br />

dos MCs, a alinhar frases como “be a<br />

fabulous weekend won<strong>de</strong>r, and a<br />

miracle worker in the week / you are


a genius every<strong>da</strong>y, but don’t lose your<br />

common touch / Join a gang, learn<br />

rhyming slang, learn greek, learn<br />

double dutch”. Já estamos<br />

entusiasmados e ain<strong>da</strong> nem<br />

chegámos ao “cowbell” unido à linha<br />

<strong>de</strong> baixo, àquele “true romance” que<br />

o coro entoa em tom vaporoso e ao<br />

teclado que nos põe a <strong>da</strong>nçar como<br />

se Prince tivesse <strong>de</strong>scido <strong>de</strong> novo à<br />

Terra e fosse três tipo ingleses a tocar<br />

PAULO RICCA<br />

o funk retro-futurista mais funky <strong>de</strong><br />

2009.<br />

A estreia dos Gol<strong>de</strong>n Silvers tem o<br />

seu tema título e só ele vale o disco<br />

todo. O resto? O resto é um conjunto<br />

<strong>de</strong> canções pop repletas <strong>de</strong> um<br />

romantismo que ilu<strong>de</strong> a ingenui<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

com <strong>de</strong>sencanto – sonhadores que<br />

antevêem a que<strong>da</strong> antes do sonho<br />

concretizado -, canções on<strong>de</strong> as<br />

guitarras estão ausentes – tudo<br />

secção rítmica, pianos e<br />

sintetizadores – e po<strong>de</strong>m ser doo-wop<br />

marado em canção <strong>de</strong> Randy<br />

Newman (“Please Venus”), a visão <strong>de</strong><br />

Morrissey com os Duran Duran no<br />

Tropicana Club (“Arrows of Eros”)<br />

ou, nos antípo<strong>da</strong>s <strong>de</strong> tamanha<br />

efervescência, o negrume romântico<br />

<strong>da</strong> alma folk que atravessa as<br />

tragédias <strong>de</strong> “Magic touch”.<br />

Álbum <strong>de</strong>sequilibrado, tem coisas<br />

entusiasmantes, como o<br />

psica<strong>de</strong>lismo neurótico <strong>de</strong> “Shakes”<br />

(perturbados, <strong>da</strong>ncemos!), lado a<br />

lado com a sensaboria para piano e<br />

harmonias vocais à Queen <strong>de</strong> “Queen<br />

of the 21st century”.<br />

É apenas o primeiro disco e os<br />

Gol<strong>de</strong>n Silvers lá saberão por on<strong>de</strong><br />

quererão ir no futuro. Por agora,<br />

como nos ofereceram “True<br />

romance”, perdoamos-lhes<br />

tudo. Mário Lopes<br />

Gol<strong>de</strong>n Silvers: tudo por “True romance”, a canção do ano<br />

Espaço<br />

Público<br />

Jazz<br />

A canção<br />

<strong>da</strong> Broadway<br />

Uma improvável parceria<br />

entre dois músicos dá<br />

origem a uma <strong>da</strong>s obras mais<br />

fascinantes <strong>da</strong> história do<br />

jazz vocal masculino.<br />

Rodrigo Amado<br />

Tony Bennett / Bill Evans<br />

The Complete Recordings<br />

Fantasy, distri. Universal<br />

mmmmn<br />

Da Madragoa ao Bairro<br />

Alto, por Alfama ao<br />

Castelo, paramos na<br />

Mouraria, porque “na<br />

Mouraria só falam do<br />

namorico, que a Bia<br />

namora o Chico”. Curiosos,<br />

caminhamos pelo ventre<br />

<strong>da</strong>s vielas, travessas e<br />

pátios, on<strong>de</strong> choram as<br />

guitarras carpi<strong>de</strong>iras<br />

e Carminho recua no<br />

Tony Bennett foi,<br />

juntamente com<br />

Frank Sinatra, um<br />

dos cantores cuja<br />

música cresceu<br />

comigo, mais<br />

concretamente<br />

através do seu primeiro registo em<br />

duo com o pianista Bill Evans, o<br />

qual ouvia em casa dos meus pais,<br />

ain<strong>da</strong> miúdo. Por diversas vezes<br />

procurei a música <strong>de</strong> Bennett<br />

noutros contextos, longe <strong>da</strong><br />

colaboração com o pianista, mas<br />

fiquei sistematicamente<br />

<strong>de</strong>sapontado, <strong>de</strong>scobrindo que a<br />

sua música perdia a<br />

intemporali<strong>da</strong><strong>de</strong> que ali se sentia.<br />

Esse é, para mim, o gran<strong>de</strong> mistério<br />

<strong>de</strong>stas gravações – como po<strong>de</strong> um<br />

músico como Bennett, que noutros<br />

contextos soa banal e até mesmo<br />

brejeiro, realizar uma música <strong>de</strong><br />

tamanha perfeição, simplici<strong>da</strong><strong>de</strong> e<br />

magnetismo. Este último adjectivo é<br />

talvez o mais indicado para<br />

<strong>de</strong>screver a sensação provoca<strong>da</strong><br />

pela familiari<strong>da</strong><strong>de</strong> com a música<br />

incluí<strong>da</strong> nesta edição, algo que<br />

acontece pela forma como Bennett<br />

articula as palavras, com uma<br />

intenção e uma força raras num<br />

vocalista cuja frontali<strong>da</strong><strong>de</strong> crua é<br />

torna<strong>da</strong> poesia pelas notas do piano<br />

<strong>de</strong> Evans. Grava<strong>da</strong>s em 1975 e<br />

1976 sob o signo <strong>da</strong> Broadway<br />

e do Great American<br />

Songbook,<br />

A dupla Bill Evans e Tony Bennett<br />

marca<strong>da</strong>s por uma forte nostalgia,<br />

estas canções surgiram<br />

originalmente em dois diferentes<br />

registos, “The Tony Bennett / Bill<br />

Evans Album” e “Together Again”,<br />

estando o segundo uns furos abaixo<br />

do primeiro. A canções clássicas<br />

como “Young and foolish”, “The<br />

touch of your lips”, “My foolish<br />

heart” ou “You don’t know what<br />

love is”, junta-se nesta edição um<br />

punhado <strong>de</strong> “takes” alternativos<br />

que pouco acrescentam ao<br />

resultado final. Introvertido e<br />

vulnerável, Evans constituía a figura<br />

oposta à <strong>de</strong> Bennett, confiante e<br />

espirituoso, formando ambos uma<br />

improvável parceria musical.<br />

Funky!<br />

cantar, às histórias do<br />

fatum lusitano, <strong>de</strong> olhos<br />

fechados por tanto as<br />

saber entoar. Carminho<br />

não faz parte do “povo<br />

que lava no rio”, sofrido<br />

e amargurado. A sua voz<br />

veste um vestido colorido<br />

<strong>de</strong> “chita às pintinhas”,<br />

uma “nova roupagem”,<br />

pelo que o seu cantar não<br />

é um sufoco mas um alívio<br />

Infame por diversas razões,<br />

a fusão do jazz com os<br />

ritmos do funk e do rock <strong>de</strong>u<br />

origem a algumas obras que<br />

nos intrigam e fascinam.<br />

Rodrigo Amado<br />

Nathan Davis<br />

“If”<br />

Universal Sound,<br />

distri. Multidisc<br />

mmmmn<br />

Alphonse<br />

Mouzon<br />

“Virtue”<br />

MPS, distri.<br />

Compact Records<br />

mmmmn<br />

Jan Hammer<br />

Trio<br />

“Maliny, Maliny”<br />

MPS, distri.<br />

Compact Records<br />

mmmmn<br />

Editado originalmente na sua<br />

própria editora com uma prensagem<br />

<strong>de</strong> apenas mil exemplares, “If”,<br />

do saxofonista Nathan<br />

Davis, conquistou ao<br />

longo dos anos um<br />

estatuto lendário<br />

no meio do jazz <strong>de</strong><br />

fusão, estatuto<br />

reforçado pela sua<br />

longa indisponibili<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

no mercado. Agora<br />

reeditado pela Universal<br />

Sound – após uma<br />

anterior<br />

reedição<br />

japonesa –,<br />

“If”<br />

do coração, <strong>de</strong> um amor<br />

que o vento teima em<br />

lembrar: “porque quando<br />

se agita, agita-se o meu<br />

tormento, quero esquecerte,<br />

acredita, mas ca<strong>da</strong> vez<br />

há mais vento”. A sua voz<br />

resulta <strong>de</strong> uma mistura <strong>de</strong><br />

um tempo que foi, mas não<br />

esquecido!<br />

Ana Gil, estu<strong>da</strong>nte <strong>de</strong><br />

arquitectura, 22 anos<br />

Alphonse Mouzon<br />

mostra ter resistido particularmente<br />

bem à passagem do tempo, soando<br />

nos seus melhores momentos como<br />

uma <strong>de</strong>rivação <strong>da</strong>s correntes<br />

eléctricas trabalha<strong>da</strong>s nos anos 70<br />

por Miles Davis ou Herbie Hancock.<br />

Nathan Davis, que toca aqui<br />

saxofones tenor, alto, soprano e<br />

flauta, chegou a ir em “tournée”<br />

com os grupos <strong>de</strong> Art Blakey e Ray<br />

Charles, tendo-se posteriormente<br />

<strong>de</strong>dicado ao ensino. Gravado em 76,<br />

“If” é o mais funky dos seus álbuns,<br />

bem distante dos registos bop<br />

editados na MPS ou do excelente<br />

projecto Roots, partilhado com<br />

Arthur Blythe, Sam Rivers e Chico<br />

Freeman.<br />

De todos os músicos <strong>de</strong> fusão,<br />

Alphonse Mouzon é dos mais<br />

infames. Amado por muitos,<br />

repudiado por muitos outros,<br />

pratica uma mistura explosiva <strong>de</strong><br />

ritmos funk, rock abrasador,<br />

ambiente disco, muitos<br />

sintetizadores e produção excessiva.<br />

Tendo tido os seus melhores<br />

momentos ao lado dos Weather<br />

Report, Albert Mangelsdorf ou<br />

McCoy Tyner, neste “Virtue”<br />

Mouzon evoca alguns <strong>de</strong>sses<br />

momentos ro<strong>de</strong>ando-se <strong>de</strong> um<br />

super-grupo <strong>de</strong> músicos: o<br />

saxofonista Gary Bartz (em gran<strong>de</strong><br />

forma), o baixista Welton Gite e Stu<br />

Goldberg, o reputado teclista <strong>da</strong><br />

Mahavishnu Orchestra. Gravado<br />

para a germânica MPS, “Virtue”<br />

permanece como um dos melhores<br />

exemplos <strong>da</strong> sua música.<br />

Jan Hammer é outro dos músicos<br />

<strong>de</strong> fusão que não parece ter muitos<br />

amigos. Criticado essencialmente<br />

pelo trabalho horripilante que<br />

realizou para a série Miami Vice,<br />

Hammer tem no entanto uma legião<br />

<strong>de</strong> seguidores <strong>de</strong>vido à música que<br />

gravou para diversas editoras, ain<strong>da</strong><br />

na Checoslováquia, seu país <strong>de</strong><br />

origem, ou posteriormente com a<br />

Mahavishnu Orchestra. Gravado ao<br />

vivo em 1968, este é o mais<br />

“acústico” <strong>de</strong>stes três registos,<br />

afastando-se um pouco do<br />

conceito puro e duro <strong>de</strong> fusão.<br />

Tavez por isso, é também o que<br />

melhor resistiu à passagem do<br />

tempo. Hammer toca orgão e<br />

piano, subtilmente acompanhado<br />

por George Mraz, no contrabaixo e<br />

baixo eléctrico, e Cees See na<br />

bateria.<br />

Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 23


Discos<br />

Clássica<br />

A luz que<br />

emerge<br />

<strong>da</strong>s trevas<br />

Magnífica interpretação<br />

<strong>da</strong>s “Leçons <strong>de</strong> Ténèbres”<br />

<strong>de</strong> Couperin pelas<br />

Demoiselles <strong>de</strong> Saint-Cyr, um<br />

agrupamento que reaparece<br />

em gran<strong>de</strong> forma após <strong>de</strong>z<br />

anos <strong>de</strong> silêncio.<br />

Cristina Fernan<strong>de</strong>s<br />

François Couperin<br />

“Ténèbres du Premier Jour”<br />

Les Demoiselles <strong>de</strong> Saint-Cyr<br />

Emmanuel Mandrin (órgão e<br />

direcção)<br />

Ambronay<br />

mmmmm<br />

Espaço<br />

Público<br />

Fun<strong>da</strong>do em 1991<br />

pelo organista<br />

Emmanuel<br />

Mandrin, o<br />

agrupamento Les<br />

Demoiselles <strong>de</strong><br />

Saint-Cyr,<br />

especializado em música barroca<br />

para vozes femininas, esteve uma<br />

<strong>de</strong>zena <strong>de</strong> anos sem gravar. O seu<br />

reaparecimento no Festival <strong>de</strong><br />

Ambronay <strong>de</strong> 2008 com um<br />

magnífico programa consagrado às<br />

“Leçons <strong>de</strong> Ténèbres” <strong>de</strong> Couperin,<br />

complementado por dois Responsórios<br />

<strong>de</strong> Charpentier e um “Miserere”<br />

inédito <strong>de</strong> Michel Lambert, foi<br />

triunfal como se po<strong>de</strong> constatar<br />

24 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon<br />

O melhor <strong>da</strong> britpop vem<br />

<strong>da</strong> escócia e chama-se<br />

Camera Obscura. “My<br />

Maudlin Career”, o<br />

novo álbum, é mais um<br />

excelente passo na sua<br />

invejável carreira. Feito<br />

tanto mais assinalável se<br />

pensarmos que se trata<br />

do seu quarto álbum<br />

<strong>de</strong> originais e que se<br />

movimentam nesta área<br />

através <strong>de</strong>sta belíssima gravação,<br />

edita<strong>da</strong> pelo próprio festival.<br />

As Demoiselles e o seu director<br />

musical encontram-se em óptima<br />

forma e oferecem-nos uma<br />

interpretação mágica, plena <strong>de</strong><br />

espirituali<strong>da</strong><strong>de</strong>, mas também <strong>de</strong><br />

sensuali<strong>da</strong><strong>de</strong>. As vozes solistas <strong>de</strong><br />

Dorothée Leclair, Eugénie Warnier e<br />

Juliette Perret espraiam-se com<br />

convicção e brilho nos sinuosos<br />

melismas <strong>da</strong>s letras hebraicas que<br />

pontuam o texto <strong>da</strong>s Lamentações <strong>de</strong><br />

Jeremias e mostram-nos uma imensa<br />

paleta <strong>de</strong> cores, gran<strong>de</strong> flexibili<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

vocal e uma expressivi<strong>da</strong><strong>de</strong> pungente<br />

na <strong>de</strong>clamação do restante texto. O<br />

grupo funciona igualmente bem em<br />

conjunto, mostrando uma<br />

sonori<strong>da</strong><strong>de</strong> esplendorosa nos<br />

Responsórios <strong>de</strong> Charpentier (“In<br />

Monte Oliveti” e “Tristis est anima<br />

mea”) e uma sobrie<strong>da</strong><strong>de</strong> mais<br />

contemplativa no “Miserere”, <strong>de</strong><br />

Lambert.<br />

O alinhamento procura<br />

reconstituir o quadro litúrgico do<br />

Ofício <strong>de</strong> Trevas durante as Matinas<br />

<strong>da</strong> Semana Santa (cerimónia <strong>de</strong> forte<br />

carga simbólica celebra<strong>da</strong> <strong>de</strong>pois do<br />

pôr-do-sol, on<strong>de</strong> as 15 velas <strong>de</strong> um<br />

can<strong>de</strong>labro triangular eram<br />

apaga<strong>da</strong>s uma a uma), incluindo<br />

como introdução a antífona “Zelus<br />

domus tuae”, o Salmo 68 e o<br />

versículo “Avertantur retrorsum”<br />

executados em cantochão ou em<br />

“fauxbourdon” [sobreposição <strong>de</strong><br />

vozes paralelas à melodia principal à<br />

distância <strong>de</strong> um intervalo <strong>de</strong> quarta<br />

e outro <strong>de</strong> sexta]. O som imponente<br />

do gran<strong>de</strong> órgão <strong>de</strong> Saint-Antoine<br />

l’Abbaye (<strong>de</strong> 1748) apoia as vozes<br />

etéreas <strong>da</strong>s intérpretes que cantam a<br />

partir <strong>da</strong> tribuna. A sensação <strong>de</strong><br />

espaço e a reberveração <strong>da</strong> igreja é<br />

transmiti<strong>da</strong> pelo registo fonográfico<br />

que transporta assim o ouvinte para<br />

o contexto <strong>da</strong> execução.<br />

tão movediça e efémera do<br />

universo pop. Seguindo<br />

as premissas estéticas<br />

dos antecessores, o<br />

novo álbum apresenta,<br />

ain<strong>da</strong> assim, novos<br />

motivos <strong>de</strong> gáudio. O<br />

mais significativo serão<br />

os arranjos <strong>de</strong> cor<strong>da</strong>s,<br />

aqui mais expressivos e<br />

elaborados do que nunca.<br />

Exemplo incontornável<br />

A reverberação <strong>da</strong> igreja transparece no registo fonográfico <strong>da</strong>s Demoiselles <strong>de</strong> Saint-Cyr<br />

Diz-me com<br />

quem tocas<br />

Uma surpresa agradável na<br />

escolha improvável <strong>de</strong> dois<br />

solistas tão diferentes numa<br />

mesma obra. Rui Pereira<br />

Brahms<br />

Concerto para violino e Duplo<br />

concerto<br />

Vadim Repin (violino), Truls Mork<br />

(violoncelo), Ricardo Chailly<br />

(direcção)<br />

Gewandhausorchester<br />

DG 477 7470<br />

mmmmn<br />

Se<br />

dissessem<br />

que<br />

Vadim<br />

Repin<br />

tinha<br />

gravado<br />

o Duplo Concerto para<br />

violino e violoncelo <strong>de</strong> Brahms<br />

na companhia <strong>de</strong> Truls Mork não<br />

acreditávamos. É que o violinista é<br />

um <strong>da</strong>queles músicos com o coração<br />

à flor <strong>da</strong> pele e Mork é um<br />

violoncelista extremamente sóbrio<br />

nas suas interpretações. No entanto,<br />

isso aconteceu e o resultado é<br />

soberbo, mantendo intacta a distinta<br />

personali<strong>da</strong><strong>de</strong> dos dois músicos que<br />

dialogam numa dramaturgia<br />

cativante que Riccardo Chailly dirige<br />

fluentemente.<br />

Ao nível do virtuosismo, ambos<br />

ultrapassam todos os <strong>de</strong>safios<br />

técnicos com igual facili<strong>da</strong><strong>de</strong>. Se o<br />

violino po<strong>de</strong> manifestar uma outra<br />

exuberância, até pelo seu próprio<br />

timbre mais penetrante, os dois<br />

aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />

será o tema “Careless<br />

love”, provavelmente, o<br />

melhor <strong>de</strong> um trabalho<br />

recheado <strong>de</strong> pérolas.<br />

Poucos nos têm habituado<br />

tão mal como estes<br />

escoceses. Imperdível.<br />

António Freitas,<br />

Radialista, 37 anos<br />

solistas estão em perfeita sintonia.<br />

Mas o cartão <strong>de</strong> visita do disco é a<br />

gravação <strong>de</strong> Repin do Concerto para<br />

violino e orquestra <strong>de</strong> Brahms, a<br />

primeira que o violinista russo lança<br />

no mercado. As longas introduções<br />

orquestrais do primeiro e do<br />

segundo an<strong>da</strong>mento são feitas com<br />

gran<strong>de</strong> dramatismo e criam a<br />

atmosfera a<strong>de</strong>qua<strong>da</strong> para o tipo <strong>de</strong><br />

interpretação apaixona<strong>da</strong> e<br />

impetuosa <strong>de</strong> Repin, que atinge os<br />

seus momentos mais belos nos<br />

comoventes timbres do registo<br />

agudo. Este é mesmo um “som <strong>de</strong><br />

marca” do aclamado violinista que<br />

encontra poucos<br />

rivais na<br />

actuali<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Vadim Repin,<br />

um violinista<br />

com o coração<br />

na boca


O exercício<br />

<strong>da</strong> Fantasia<br />

Henry Purcell<br />

The Complete Fantasias<br />

Fretwork; distri. Harmonia Mundi<br />

mmmmn<br />

Her<strong>de</strong>iras <strong>da</strong> rica<br />

tradição inglesa<br />

dos século XVI e<br />

XVII no domínio<br />

<strong>da</strong> música para<br />

“consort” <strong>de</strong><br />

violas <strong>da</strong> gamba, as Fantasias <strong>de</strong><br />

Purcell são obras-primas <strong>de</strong> mestria<br />

contrapontística, reveladoras <strong>de</strong><br />

uma gran<strong>de</strong> profundi<strong>da</strong><strong>de</strong> musical.<br />

Reuni<strong>da</strong>s num volume autógrafo<br />

pertencente ao British Museum,<br />

permaneceram na forma manuscrita<br />

até ao século XX, época em que<br />

voltaram a ser <strong>de</strong>vi<strong>da</strong>mente<br />

valoriza<strong>da</strong>s. Purcell <strong>de</strong>monstra um<br />

perfeito domínio <strong>da</strong>s antigas<br />

técnicas contrapontísticas como a<br />

imitação, a aumentação, a<br />

diminuição ou a inversão, ao mesmo<br />

tempo que recorre a alguns<br />

engenhosos efeitos harmónicos do<br />

estilo “mo<strong>de</strong>rno”. A colecção inclui<br />

três Fantasias a três partes, nove a<br />

quatro partes (compostas entre<br />

Julho e Agosto <strong>de</strong> 1680), uma<br />

Fantasia a cinco partes “sobre uma<br />

nota” (um curioso <strong>de</strong>safio <strong>de</strong><br />

composição on<strong>de</strong> as várias vozes<br />

tecem uma elabora<strong>da</strong> teia<br />

contrapontística, enquanto a quinta<br />

voz se mantém do princípio ao fim<br />

Os Fretwork propõem uma releitura<br />

sedutora <strong>da</strong>s Fantasias <strong>de</strong> Purcell<br />

na nota Dó) e dois “In Nomine” a<br />

seis e sete partes. O “In nomine” é<br />

uma forma <strong>de</strong> fantasia instrumental<br />

inglesa construí<strong>da</strong> sobre excertos<br />

melódicos correspon<strong>de</strong>ntes às<br />

palavras “in nomini Domini” do<br />

Benedictus <strong>da</strong> Missa “gloria tibi<br />

trinitas” <strong>de</strong> John Taverner.<br />

O agrupamento Fretwork, que já<br />

tinha gravado estas obras em 1995 na<br />

etiqueta Virgin, propõe agora uma<br />

nova leitura muito sedutora, que se<br />

distingue por uma exemplar sintonia<br />

entre os vários instrumentistas, pela<br />

clareza <strong>da</strong> polifonia, pela atenção às<br />

nuances expressivas (várias <strong>de</strong>las<br />

anota<strong>da</strong>s pelo próprio Purcell) e pela<br />

tentativa <strong>de</strong> mostrar o carácter<br />

distintivo <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> peça. Um<br />

repertório que facilmente po<strong>de</strong> soar<br />

<strong>de</strong>masiado uniforme numa audição<br />

superficial ganha assim relevo e<br />

diversi<strong>da</strong><strong>de</strong>. C.F.<br />

Lamentos barrocos<br />

“Il Pianto di Maria<br />

– The Virgin’s Lament”<br />

Bernar<strong>da</strong> Fink (meio-soprano)<br />

Il Giardino Armonico<br />

Giovanni Antonini (direcção)<br />

Decca – L’Oiseau-Lyre<br />

mmmnn<br />

Durante muito<br />

tempo pensou-se<br />

que a cantata “Il<br />

Pianto di Maria”,<br />

<strong>de</strong> Giovanni<br />

Ferrandini (c.<br />

1710-1791), compositor italiano activo<br />

em Munique, era <strong>da</strong> autoria <strong>de</strong><br />

Han<strong>de</strong>l, mas o equívoco foi <strong>de</strong>sfeito<br />

por um conjunto <strong>de</strong> musicólogos em<br />

1993. Devolvi<strong>da</strong> ao seu autor<br />

original, esta extensa peça marca<strong>da</strong><br />

por uma expressivi<strong>da</strong><strong>de</strong> dolorosa e<br />

<strong>de</strong>stina<strong>da</strong> a ser interpreta<strong>da</strong> perante<br />

o Santo Sepulcro na Semana Santa,<br />

serve <strong>de</strong> núcleo central ao programa<br />

proposto por Bernar<strong>da</strong> Fink e por Il<br />

Giardino Armonico. Os temas <strong>da</strong><br />

Paixão <strong>de</strong> Cristo, do martírio e <strong>da</strong><br />

dor <strong>da</strong> Virgem Maria são evocados<br />

através <strong>de</strong> obras vocais como “Il<br />

pianto <strong>de</strong>lla Madonna” <strong>de</strong><br />

Monteverdi (“contrafactum” sacro<br />

do famoso “Lamento d’ Arianna”) e<br />

a primeira gravação mundial <strong>de</strong> uma<br />

ária <strong>de</strong> “Il Martirio di San Lorenzo”,<br />

<strong>de</strong> Francesco Conti (1881/82-1732), e<br />

complementados por páginas<br />

instrumentais <strong>de</strong> Vivaldi (Sonata RV<br />

130 e Sinfonia RV 169 “Al Sancto<br />

Sepolcro” e Concerto<br />

“Madrigalesco”), Biaggio Marini<br />

(“Passacaglia”) e Johann Pisen<strong>de</strong>l<br />

(Sonata para dois oboés, cor<strong>da</strong>s e<br />

A interpretação <strong>de</strong> Bernar<strong>da</strong> Fink carece <strong>de</strong> suficiente “pathos”<br />

baixo contínuo). Este reportório <strong>de</strong><br />

tom sombrio é objecto <strong>de</strong> uma<br />

interpretação cui<strong>da</strong><strong>da</strong> ao nível <strong>da</strong><br />

técnica e do estilo, mas carece por<br />

vezes <strong>de</strong> suficiente “pathos”. Em<br />

recitativos como “Ah! Me infelice!” e<br />

“Si disse la gran Madre”, <strong>da</strong> cantata<br />

<strong>de</strong> Ferrandini, a meio-soprano<br />

<br />

<br />

<br />

<br />

<br />

<br />

<br />

acentua a carga dramática <strong>de</strong> forma<br />

veemente, mas o tom geral é o <strong>da</strong><br />

introspecção contemplativa. Esta<br />

dimensão casa bem com a<br />

personali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> cantora, mas<br />

parece reprimir a exuberância<br />

natural dos instrumentistas <strong>de</strong> Il<br />

Giardino Armonico. C.F.<br />

<br />

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<br />

Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 25


Concertos<br />

26 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon<br />

Além dos Etran Finatawa, o programa <strong>de</strong> música africana do CCB<br />

traz também a <strong>Lisboa</strong> os portugueses Terrakota e o nigeriano Seun Kuti, filho <strong>de</strong> Fela<br />

Pop<br />

Os encantadores<br />

do Níger<br />

Os Etran Finatawa trazem<br />

a sua música xamânica,<br />

parente do “blues do<br />

<strong>de</strong>serto” dos Tinariwen, ao<br />

Centro Cultural <strong>de</strong> Belém.<br />

Mário Lopes<br />

Etran Finatawa<br />

<strong>Lisboa</strong>. Centro Cultural <strong>de</strong> Belém. Praça do Império.<br />

Amanhã, dia 22, às 22h. Tel.: 213612400. Entra<strong>da</strong><br />

gratuita.<br />

CCB Fora <strong>de</strong> Si.<br />

São do Níger e são formados por três<br />

tuaregues e três Wo<strong>da</strong>abe, dois dos<br />

povos que habitam esse país que é<br />

ponte entre a África árabe e a África<br />

negra. Chamam-se Etran Finatawa<br />

(“as estrelas <strong>da</strong> tradição”) e são, eles<br />

próprios, uma ponte – neste caso,<br />

cultural e musical. Nascidos em<br />

2004, reúnem a música dos<br />

Wo<strong>da</strong>abe, essencialmente vocal e<br />

rítmica, à dos tuaregues, feita <strong>de</strong><br />

percussões e guitarras hipnóticas<br />

que criam o “blues do <strong>de</strong>serto” que<br />

tão bem conhecemos dos Tinariwen.<br />

Ao Centro Cultural <strong>de</strong> Belém,<br />

on<strong>de</strong> actuam este sábado,<br />

integrados no programa <strong>de</strong>dicado à<br />

música africana que <strong>de</strong>corre<br />

actualmente (domingo há Terrakota;<br />

dia 29 <strong>de</strong> Agosto chega Seun Kuti,<br />

filho <strong>de</strong> Fela), trazem “Desert<br />

Crossroads”, o seu último álbum,<br />

editado em 2008. Mais importante<br />

do que isso, e como saberão aqueles<br />

que os viram há dois anos no<br />

Músicas do Mundo <strong>de</strong> Sines, trazem<br />

esta música <strong>de</strong> cantos guturais<br />

“xamanísticos” e falsetes<br />

encantatórios, estas canções em que<br />

as guitarras eléctricas serpenteiam<br />

entre as polirritmias dos<br />

percussionistas, qual rock’n’roll que<br />

já se tinha <strong>de</strong>scoberto enquanto tal<br />

muito antes <strong>de</strong> um DJ americano,<br />

nos anos 1950, se lembrar <strong>de</strong><br />

arranjar nome para aquela música<br />

“infernal”.<br />

Os Etran Finatawa são música<br />

mo<strong>de</strong>rna, pela electrificação <strong>da</strong>s<br />

canções Wo<strong>da</strong>abe, pelo cruzamento<br />

<strong>de</strong>stas com os sons tuaregues – a<br />

ban<strong>da</strong> chamou-lhe “blues nóma<strong>da</strong>” -<br />

, mas música que se mantém<br />

aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />

umbilicalmente liga<strong>da</strong> à terra e aos<br />

povos on<strong>de</strong> primeiro se fez ouvir.<br />

Para nós que a recebemos vin<strong>da</strong> <strong>de</strong><br />

longe, será contudo uma outra coisa.<br />

Muito resumi<strong>da</strong>mente: uma forma<br />

<strong>de</strong> encantamento.<br />

Wraygunn e Sean<br />

Riley a rockar<br />

Guimarães<br />

Barco Rock Fest’09<br />

Barco (Guimarães). Praia Fluvial <strong>de</strong> Barco. Hoje e<br />

amanhã, às 22h00. Tel.: Informações: 936412637 e<br />

916687449. 10€ (dia) a 16€ (passe).<br />

Dia 21: Sean Riley & The Slowri<strong>de</strong>rs<br />

+ Born a Lion + d3ö + If Lucy Fell<br />

+ Cratera + Insert Coin<br />

+ PharmaciaPainKiller<br />

Dia 22: Wraygunn + Abandon Mute<br />

+ Smix Smox Smux + doismileoito<br />

+ Let The Jam Roll + Les Dirty Two<br />

O Barco Rock Fest, na Praia Fluvial<br />

<strong>de</strong> Barco, em Guimarães, já dura há<br />

dois dias, com projecções <strong>de</strong> filmes e<br />

DJ “sets” para o povo <strong>da</strong>nçar, mas é<br />

esta noite que a festa começa a sério<br />

– e o rock do título assenta-lhe bem.<br />

Entre hoje e amanhã, um festim com<br />

algumas <strong>da</strong>s mais recomendáveis<br />

ban<strong>da</strong>s portuguesas <strong>da</strong> actuali<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Lá estarão os sempre<br />

incendiários Wraygunn <strong>de</strong> Paulo<br />

Furtado, provocadores com o<br />

diabo e a soul no corpo, a berrar<br />

“gotta love that woman” para nosso<br />

prazer (cabe-lhes, amanhã, encerrar<br />

o festival). Com eles, estarão os<br />

eclécticos doismileoito, pessoal <strong>de</strong><br />

pop bem encena<strong>da</strong> e <strong>de</strong>scargas<br />

sónicas catárticas, os Smix Smox<br />

Smux que põem ironia corrosiva em<br />

canções que <strong>de</strong>nunciam audições<br />

atentas <strong>de</strong> Pavement, os angloportugueses<br />

Abandon Mute,<br />

se<strong>de</strong>ados em Londres, e as “jams”<br />

<strong>de</strong> uns vimaranenses que não<br />

escon<strong>de</strong>m ao que vêm (chamam-se,<br />

precisamente, Let The Jam Roll).<br />

Isso, contudo, está reservado para<br />

sábado.<br />

Hoje, <strong>de</strong>pois dos Cratera (gente <strong>da</strong><br />

terra, ban<strong>da</strong> afilha<strong>da</strong> do grunge),<br />

chegam os histriónicos If Lucy Fell,<br />

<strong>de</strong> punk dilacerante e frenesim nonstop,<br />

li<strong>de</strong>rados por um vocalista<br />

incontrolável, Makoto. Seguem-se os<br />

conimbricenses d3ö, igualmente<br />

incontroláveis, trio <strong>de</strong> rock’n’roll<br />

garageiro que é uma <strong>da</strong>s melhores<br />

ban<strong>da</strong>s portuguesas ao vivo e que<br />

acaba <strong>de</strong> editar o recomen<strong>da</strong>díssimo<br />

“Exposed”. A noite encerrará com<br />

os Born A Lion, que em “Bluezebu”,<br />

o seu último álbum, encarceram<br />

Johnny Cash num pentagrama dos<br />

Black Sabbath – o espírito <strong>de</strong> Cash,<br />

aparentemente, não se queixou -, e<br />

com Sean Riley & The Slowri<strong>de</strong>rs,<br />

cultores <strong>da</strong>s planícies <strong>da</strong> canção<br />

americana que se revelaram<br />

<strong>de</strong>finitivamente em “Only time will<br />

tell”. Recentemente, abriram o<br />

Festival <strong>de</strong> Pare<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Coura com<br />

um concerto magnífico e, em<br />

Guimarães, não se espera na<strong>da</strong><br />

menos do que a repetição <strong>de</strong>sse<br />

momento. M.L.<br />

Jazz<br />

Matéria<br />

Prima<br />

no Porto<br />

No encerramento <strong>da</strong>s noites<br />

Porto Blue Jazz, Carlos Bica<br />

regressa à ci<strong>da</strong><strong>de</strong> com um<br />

dos seus projectos mais<br />

<strong>de</strong>safiantes.<br />

Rodrigo Amado<br />

Carlos Bica Matéria Prima<br />

Com Matthias Schriefl, João Paulo,<br />

Mário Delgado e João Lobo<br />

Porto. Jardins do Palácio <strong>de</strong> Cristal. Rua D. Manuel<br />

II. Amanhã, dia 22, às 22h. Tel.: 226057080.<br />

Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

Porto BlueJazz 09<br />

A encerrar um ciclo <strong>de</strong> concertos<br />

que apresentou projectos como o<br />

duo Chick Corea e Gary Burton, o


Bernardo<br />

Sassetti Trio,<br />

ou o espectáculo<br />

“Cumplici<strong>da</strong><strong>de</strong>s” <strong>de</strong> Vânia<br />

Fernan<strong>de</strong>s e Júlio Resen<strong>de</strong>,<br />

apresentam-se os Matéria Prima,<br />

quinteto que representa uma <strong>da</strong>s<br />

facetas mais exploratórias e<br />

<strong>de</strong>safiantes do trabalho <strong>de</strong> Carlos<br />

Bica. Contrabaixista consagrado no<br />

meio jazzístico nacional, há muito<br />

com residência partilha<strong>da</strong> entre<br />

<strong>Lisboa</strong> e Berlim, Bica recrutou três<br />

dos mais versáteis músicos nacionais<br />

– o pianista João Paulo, o guitarrista<br />

Mário Delgado e o baterista João<br />

Lobo – aos quais juntou um jovem<br />

talento alemão, o trompetista<br />

Matthias Shriefl. Projecto que<br />

procura explorar as características<br />

intrínsecas do jazz feito por músicos<br />

portugueses, os Matéria Prima<br />

apostam forte na componente <strong>da</strong><br />

improvisação, tornando ca<strong>da</strong><br />

espectáculo um evento único, não<br />

repetível. Numa fase <strong>de</strong> gran<strong>de</strong><br />

activi<strong>da</strong><strong>de</strong>, Bica assume-se ca<strong>da</strong> vez<br />

mais como dinamizador <strong>da</strong> cena jazz<br />

nacional, compositor e improvisador<br />

<strong>de</strong> excepção, aguar<strong>da</strong>ndo-se com<br />

alguma expectativa o sucessor do<br />

excelente “Believer”, o mais recente<br />

registo com o seu projecto Azul.<br />

Carlos Bica encerra amanhã<br />

no Palácio <strong>de</strong> Cristal as noites<br />

Porto BlueJazz<br />

Agen<strong>da</strong><br />

Sexta 21<br />

Mão Morta<br />

Os Wraygunn em mais um festival <strong>de</strong> Verão<br />

Camané<br />

Esposen<strong>de</strong>. Largo dos Bombeiros, às 22h.<br />

Tel.: 253960100. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

Sons <strong>de</strong> Verão 09.<br />

Rui Veloso<br />

Bragança. Parque do Eixo Atlântico. Av. Aba<strong>de</strong><br />

Baçal / Av. Professor António Gonçalves Rodrigues,<br />

às 22h. Tel.: 253203150. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

Festas <strong>da</strong> Ci<strong>da</strong><strong>de</strong> 09.<br />

Ana van Zeller e Carlos Gomes<br />

Com Ana van Zeller (flauta<br />

transversal), Carlos Gomes (piano).<br />

<strong>Lisboa</strong>. Miradouro <strong>de</strong> São Pedro <strong>de</strong> Alcântara.<br />

Jardim São Pedro <strong>de</strong> Alcântara, às 19h. Tel.:<br />

213236200. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

Clássicos na Rua. Obras <strong>de</strong><br />

Febonio, Bach, Danzi, Villa-Lobos.<br />

Nancy Vieira<br />

Barreiro. Palco <strong>da</strong>s Marés. R. Bento <strong>de</strong> Jesus<br />

Caraça, às 22h. Tel.: 212068203. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

Festas do Barreiro.<br />

Afonso Pais Trio<br />

Sines. Centro <strong>de</strong> Artes <strong>de</strong> Sines - Auditório.<br />

R. Cândido dos Reis, às 22h. Tel.: 269860080.<br />

5€ (dois concertos).<br />

Sines em Jazz.<br />

Acácio Salero<br />

Sines. Centro <strong>de</strong> Artes <strong>de</strong> Sines - Auditório.<br />

R. Cândido dos Reis, às 23h15. Tel.: 269860080.<br />

5€ (dois concertos).<br />

Sines em Jazz.<br />

Raquel Peters + Afonso Dias<br />

Lagos. Centro Cultural <strong>de</strong> Lagos. R. Lançarote <strong>de</strong><br />

Freitas, 7, às 22h00. Tel.: 282770450. 10€.<br />

Yuri Daniel Quartet<br />

Com Yuri Daniel, João Paulo Esteves<br />

<strong>da</strong> Silva, José Salgueiro, Johannes<br />

Kriger.<br />

Figueira <strong>da</strong> Foz. Centro <strong>de</strong> Artes e Espectáculos -<br />

Auditório Exterior. R. Aba<strong>de</strong> Pedro, às 22h00.<br />

Tel.: 233407200. 7,5€.<br />

Rocio Marquez<br />

Barcarena. Fábrica <strong>da</strong> Pólvora <strong>de</strong> Barcarena.<br />

Estra<strong>da</strong> <strong>da</strong>s Fontaínhas, às 22h. Tel.: 214387460.<br />

Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

Festival Sete Sóis Sete Luas 2009<br />

Mão Morta + Os Pontos Negros<br />

+ Fato Feto<br />

Vale <strong>de</strong> Milhaços. Quinta <strong>da</strong> Marialva. Corroios,<br />

às 22h00. Tel.: 212535814. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

Festas Populares <strong>de</strong> Corroios.<br />

Da Weasel + La Resinance<br />

+ Stone Slaves + Nokin<br />

Alcácer do Sal. Margem Sul do Sado, a partir<br />

<strong>da</strong>s 22h. Tel.: 265610040. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

Festival <strong>de</strong> Verão à Beira Sado.<br />

DJ Patife<br />

Aveiro. Centro Cultural e <strong>de</strong> Congressos <strong>de</strong> Aveiro.<br />

R. Cais <strong>da</strong> Fonte Nova - Apartado 1520, às 22h00.<br />

Tel.: 234406481. 10€.<br />

Mercado Negro + Souls of Fire<br />

+ Original Electro Groove<br />

+ Jula Jah Soundsystem<br />

Quarteira. Calçadão <strong>de</strong> Quarteira, às 21h00. Tel.:<br />

289400660. 10€.<br />

Festival Surfóreggae<br />

Raquel Tavares<br />

Com Eurico Machado (guitarra<br />

portuguesa), Marco Oliveira<br />

(viola), Nando<br />

Araújo<br />

(baixo).<br />

<strong>Lisboa</strong>. Parque<br />

Mayer.<br />

Os Pontos Negros<br />

ENRIC VIVES-RUBIO<br />

Travessa do Salitre - Parque Mayer, às 21h30.<br />

Tel.: 966917499. 5€.<br />

<strong>Lisboa</strong> ao Parque.<br />

The Portugals<br />

Lousã. Parque Carlos Reis - Anfiteatro, às 22h00.<br />

Tel.: 239990370. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

Sábado 22<br />

Da Weasel<br />

Barreiro. Palco <strong>da</strong>s Marés. R. Bento <strong>de</strong> Jesus Caraça,<br />

às 22h00. Tel.: 212068203. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

Festas do Barreiro.<br />

Sidv Sissokho + Dubravko<br />

Lapaine + Wild Marmela<strong>de</strong><br />

Ameixial. Loulé, às 20h30. Tel.: 967252145.<br />

5€ (dia) a 15€ (passe).<br />

VIII Festival <strong>de</strong> Didgeridoo.<br />

Setsax Quarteto<br />

Com Pedro Rego (saxofone soprano),<br />

Ricardo Branco (saxofone alto),<br />

Daniel Costa (saxofone tenor), André<br />

Cabica (saxofone barítono).<br />

<strong>Lisboa</strong>. Miradouro <strong>de</strong> São Pedro <strong>de</strong> Alcântara. Jardim<br />

São Pedro <strong>de</strong> Alcântara, às 19h00. Tel.: 213236200.<br />

Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

Clássicos na Rua. Obras <strong>de</strong> Piazzolla,<br />

Pierné, Gershwin e Florenzo.<br />

Jacinta Canta Songs Of Freedom<br />

Com Jacinta (voz), Paulo Gravato<br />

(saxofone), Pedro Costa (piano), João<br />

Gustavo (arranjos).<br />

Estoril. Centro <strong>de</strong> Congressos do Estoril. Av. Amaral,<br />

às 21h30. Tel.: 214647575. 15€.<br />

Estoril Summer Fun’09.<br />

Nasko Hristov<br />

Com Nasko Hristov (acor<strong>de</strong>ão), Ivo<br />

Hristov (clarinete), Krastayo Metodiev<br />

(percussão).<br />

Monte <strong>de</strong> Caparica. Convento dos Capuchos.<br />

Rç Lourenço Pires <strong>de</strong> Távora, 42, às 21h30.<br />

Tel.: 212919342. 5€.<br />

Ciclo 3 Culturas<br />

Xutos & Pontapés<br />

Esposen<strong>de</strong>. Largo dos Bombeiros, às 22h.<br />

Tel.: 253960100. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

Sons <strong>de</strong> Verão 09.<br />

Concerto <strong>de</strong> Encerramento<br />

Com Carmelo Corrado Caruso<br />

(barítono), Marco Alves dos Santos<br />

(tenor), Bárbara Barra<strong>da</strong>s (soprano),<br />

Maria Luísa <strong>de</strong> Freitas (mezzo).<br />

Direcção musical <strong>de</strong> Osvaldo Ferreira.<br />

Óbidos. Castelo, às 21h30.<br />

Tel.: 262959231. 25€.<br />

Obras <strong>de</strong> Rossini, Verdi, Bizet,<br />

Mascagni, Gounod e Strauss.<br />

António Pinho Vargas<br />

Vila Nova <strong>de</strong> Cerveira. Auditório <strong>Municipal</strong> <strong>de</strong> Vila<br />

Nova <strong>de</strong> Cerveira. Praça do Município, às 22h00.<br />

Tel.: 251708020. 5€.<br />

Cerveira ao Piano.<br />

V3SKA<br />

Vila Real. Teatro <strong>de</strong> Vila Real - Auditório Exterior.<br />

Alame<strong>da</strong> <strong>de</strong> Grasse, às 22h30. Tel.: 259320000.<br />

Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

Festival <strong>de</strong> Músicas do Mundo.<br />

David Fonseca<br />

Cascais. Baía <strong>de</strong> Cascais, às 22h00.<br />

Tel.: 214815810. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

Festas do Mar.<br />

Blasted<br />

Mechanism<br />

NELSON GARRIDO<br />

Blasted Mechanism nas<br />

festas <strong>de</strong> Pinhel e <strong>de</strong> Corroios<br />

Pinhel. Largo dos Combatentes, às 23h30.<br />

Tel.: 271410000. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

Festas <strong>da</strong> Ci<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Jori Hulkkonen + Junior Boys<br />

+ Un<strong>de</strong>rworld + Mike Mind<br />

+ Thomas von Party + Jesper<br />

Dahlbäck + Zombie Nation<br />

+ Riton + Proxy + Tiga + Seth<br />

Troxler<br />

Vilamoura. Hipódromo <strong>de</strong> Vilamoura, às 21h.<br />

213933770. 25€.<br />

Creamfields 09.<br />

El Fad<br />

Com José Peixoto (guitarra),<br />

Carlos Zíngaro (violino), Yuri Daniel<br />

(contrabaixo), José Salgueiro<br />

(percussão).<br />

Sines. Centro <strong>de</strong> Artes <strong>de</strong> Sines - Auditório.<br />

R. Cândido dos Reis, às 22h00. Tel.: 269860080.<br />

5€ (dois concertos).<br />

Sines em Jazz.<br />

Low Budget Research Kitchen<br />

Sines. Centro <strong>de</strong> Artes <strong>de</strong> Sines - Auditório. R.<br />

Cândido dos Reis, às 23h15. Tel.: 269860080.<br />

5€ (dois concertos).<br />

Sines em Jazz.<br />

Lin<strong>da</strong> Martini + Blasfemea<br />

+ Socie<strong>da</strong><strong>de</strong> Filarmónica<br />

Progresso Matos Galamba<br />

+ Sequela Brothers<br />

Alcácer do Sal. Margem Sul do Sado, a partir<br />

<strong>da</strong>s 22h. Tel.: 265610040. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

Festival <strong>de</strong> Verão à Beira Sado.<br />

Rita Guerra<br />

<strong>Lisboa</strong>. Parque Mayer. Travessa do Salitre,<br />

às 21h30. Tel.: 966917499. 5€.<br />

<strong>Lisboa</strong> ao Parque.<br />

Domingo 23<br />

Junior Boys<br />

no Creamfields, em<br />

Vilamoura<br />

Pedro Abrunhosa<br />

Barreiro. Palco <strong>da</strong>s Marés. R. Bento <strong>de</strong> Jesus Caraça,<br />

às 22h00. Tel.: 212068203. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

Festas do Barreiro.<br />

Orquestra do Norte<br />

Direcção Musical <strong>de</strong> Manuel Teixeira.<br />

Agrelos. Igreja <strong>de</strong> São Miguel <strong>de</strong> Gân<strong>da</strong>ra, paroquial<br />

<strong>de</strong> Cabeça Santa. Estra<strong>da</strong> Nacional 106, às 16h30.<br />

Tel.: 255410470. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

Obras <strong>de</strong> Haydn e Verdi.<br />

Terrakota<br />

<strong>Lisboa</strong>. Centro Cultural <strong>de</strong> Belém - Praça do Museu.<br />

Praça do Império, às 22h00. Tel.: 213612400.<br />

Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

CCB Fora <strong>de</strong> Si.<br />

Ana Moura<br />

Vale <strong>de</strong> Milhaços. Quinta <strong>da</strong> Marialva. Corroios,<br />

às 22h00. Tel.: 212535814. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

Festas Populares <strong>de</strong> Corroios.<br />

Paula Oliveira<br />

Com Paula Oliveira (voz),<br />

Lo Tardin (piano).<br />

Sines. Centro <strong>de</strong> Artes <strong>de</strong> Sines - Auditório.<br />

R. Cândido dos Reis, às 22h00. Tel.: 269860080.<br />

5€ (dois concertos).<br />

Sines em Jazz.<br />

Quarteto <strong>de</strong> Vasco Agostinho<br />

Com Vasco Agostinho (guitarra),<br />

Jeff Davis (vibrafone), Filipe teixeira<br />

(contrabaixo), Bruno Pedroso<br />

(bateria).<br />

Sines. Centro <strong>de</strong> Artes <strong>de</strong> Sines - Auditório.<br />

R. Cândido dos Reis, às 23h15. Tel.: 269860080.<br />

5€ (dois concertos).<br />

Sines em Jazz.<br />

Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

Feira Internacional do Fundão.<br />

Xutos & Pontapés<br />

Fundão. Pavilhão<br />

Multiusos, às 22h00.<br />

Tel.: 275771829.<br />

Xutos & Pontapés no Norte<br />

(Esposen<strong>de</strong>) e no Centro (Fundão)<br />

Alcácer do Sal e Barreiro<br />

na agen<strong>da</strong> dos Da Weasel<br />

Reviver Mozart<br />

<strong>Lisboa</strong>. Parque Mayer. Travessa do Salitre<br />

- Parque Mayer, às 21h00. Tel.: 966917499. 5€.<br />

<strong>Lisboa</strong> ao Parque.<br />

Terça 25<br />

O’queStra<strong>da</strong><br />

Com Marta Miran<strong>da</strong> (voz), João Lima<br />

(guitarra portuguesa), Zeto (guitarra<br />

e voz), Pablo (contrabaixo),<br />

Donatello (acor<strong>de</strong>ão).<br />

Pinhel. Largo dos Combatentes, às 23h30.<br />

Tel.: 271410000. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

Festas <strong>da</strong> Ci<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Quarta 26<br />

Mafal<strong>da</strong> Veiga<br />

Vila Praia <strong>de</strong> Âncora. Praça <strong>da</strong> República,<br />

às 22h00. Tel.: 218508060. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

WOK - Ritmo Avassalador<br />

Grândola. Parque <strong>de</strong> Feiras e Exposições,<br />

às 22h00. Tel.: 269750260. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

Joana Amendoeira<br />

Cascais. Baía <strong>de</strong> Cascais, às 22h00.<br />

Tel.: 214815810. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

Festas do Mar.<br />

Ana Moura<br />

Óbidos. Castelo, às 22h00. Tel.: 262959231. 15€<br />

Quinta 27<br />

Susana Félix + Classificados<br />

Grândola. Parque <strong>de</strong> Feiras e Exposições,<br />

às 22h00. Tel.: 269750260. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

Mafal<strong>da</strong> Veiga<br />

Viseu. Expovis - Feira <strong>de</strong> São Mateus. Campo<br />

<strong>de</strong> Viriato, às 22h00. Tel.: 232422018. Entra<strong>da</strong><br />

gratuita.<br />

Kussondulola<br />

Sesimbra. Cine-Teatro <strong>Municipal</strong> João Mota.<br />

Av. Liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, 46, às 22h. Tel.: 212288715. 3€.<br />

Blasted Mechanism<br />

Vale <strong>de</strong> Milhaços. Quinta <strong>da</strong> Marialva. Corroios,<br />

às 22h00. Tel.: 212535814. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

Festas Populares <strong>de</strong> Corroios.<br />

Rita Redshoes<br />

Cascais. Baía <strong>de</strong> Cascais, às 22h00. Tel.: 214815810.<br />

Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

Festas do Mar.<br />

Gonçalo Prazeres Quarteto<br />

Com Gonçalo Prazeres (saxofone<br />

alto), Nuno Costa (guitarra),<br />

Bernardo Moreira (contrabaixo),<br />

Luís Can<strong>de</strong>ias (bateria).<br />

<strong>Lisboa</strong>. Centro Cultural <strong>de</strong> Belém - Cafetaria<br />

Quadrante. Praça do Império, às 22h00.<br />

Tel.: 213612400. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

Jazz às 5.ªs. CCB Fora <strong>de</strong> Si.<br />

Raquel Tavares<br />

Com Eurico Machado<br />

(guitarra<br />

portuguesa), Marco<br />

Oliveira (viola),<br />

Nando Araújo<br />

(baixo).<br />

Mogadouro. Praça<br />

Central, às 22h30.<br />

Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

Ana Moura<br />

no Castelo<br />

<strong>de</strong> Óbidos<br />

Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 27<br />

AUGUSTO BRAZIO


- PARA SEMPRE


Livros<br />

Ficção<br />

A música<br />

mais triste<br />

do mundo<br />

Kazuo Ishiguro é um escritor<br />

peculiar que, como já tem<br />

<strong>de</strong>monstrado no total <strong>da</strong><br />

sua obra, se obstina em<br />

<strong>de</strong>smontar estruturas<br />

literárias tradicionais.<br />

Helena Vasconcelos<br />

Nocturnos<br />

Kazuo Ishiguro<br />

(Tradução <strong>de</strong> Rui Pires Cabral)<br />

Gradiva<br />

mmmmm<br />

Em “Crooner”,<br />

numa Veneza<br />

invadi<strong>da</strong> por<br />

turistas, um<br />

jovem polaco que<br />

ganha a vi<strong>da</strong> a<br />

tocar nos cafés <strong>da</strong><br />

piazza é <strong>de</strong>safiado<br />

por um famoso e<br />

<strong>de</strong>ca<strong>de</strong>nte cantor<br />

romântico a acompanhá-lo numa<br />

serenata à sua jovem mulher. Mas o<br />

que começa como uma manifestação<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>dicação e amor conhece uma<br />

reviravolta surpreen<strong>de</strong>nte, tal como<br />

acontece em “Faça Chuva ou Faça<br />

Sol”. Neste segundo conto um<br />

<strong>de</strong>senraizado professor <strong>de</strong> Inglês no<br />

estrangeiro que regressa a Londres é<br />

convi<strong>da</strong>do a ficar em casa <strong>de</strong> antigos<br />

amigos <strong>da</strong> facul<strong>da</strong><strong>de</strong>. Numa<br />

tentativa para recuperar o<br />

ambiente <strong>da</strong> juventu<strong>de</strong>, quando<br />

todos viviam uma existência <strong>de</strong><br />

hippies <strong>de</strong>spreocupados, o<br />

professor vê-se envolvido nos<br />

psicodramas do casal, a braços com<br />

mal-entendidos e falsos passos, o<br />

que dá origem a situações bizarras e<br />

trágico-cómicas.<br />

Em “Malvern Hills”, um<br />

compositor e tocador <strong>de</strong> viola<br />

acústica <strong>de</strong>ixa para trás Londres e<br />

uma série <strong>de</strong> insucessos para visitar<br />

a irmã e o cunhado, donos <strong>de</strong> um<br />

café no campo. Aí, conhece um casal<br />

<strong>de</strong> suíços que o obrigam a<br />

questionar a sua vi<strong>da</strong> e ambições.<br />

Em “Nocturno”, um saxofonista a<br />

recuperar <strong>de</strong> um operação plástica<br />

que, supostamente, lhe irá corrigir a<br />

feal<strong>da</strong><strong>de</strong>, melhorando, <strong>de</strong>sse modo,<br />

a sua carreira, é arrastado para<br />

<strong>de</strong>lirantes aventuras pela sua vizinha<br />

<strong>de</strong> quarto, uma rica americana que<br />

não é senão a ex-mulher do<br />

“crooner” <strong>da</strong> primeira história.<br />

Em “Os Violoncelistas”, o cenário<br />

volta a ser Veneza e o autor recupera<br />

as personagens do primeiro conto,<br />

focando a atenção, <strong>de</strong>sta vez, no<br />

violoncelista húngaro Tibor. Este,<br />

seduzido por uma suposta diva que<br />

lhe exacerba a vai<strong>da</strong><strong>de</strong>, é levado a<br />

acreditar que é bem mais genial do<br />

que supõe.<br />

Neste volume <strong>de</strong> contos cujo título<br />

completo é “Nocturnos: Cinco<br />

Histórias sobre Música e o Cair <strong>da</strong><br />

Noite” Kazuo Ishiguro reflecte a<br />

intenção <strong>de</strong> explorar a natureza do<br />

acto criativo, compondo algo<br />

semelhante a uma partitura com<br />

ênfase na <strong>de</strong>cadência e na<br />

melancolia, uma vez que o<br />

entar<strong>de</strong>cer não é só referente ao<br />

ciclo dos dias mas também ao<br />

ocaso <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>. Uma leitura mais<br />

atenta po<strong>de</strong> revelar a ligação<br />

entre ca<strong>da</strong> conto a um tipo<br />

particular <strong>de</strong> música, uma vez<br />

que as menções casuais a<br />

compositores e intérpretes<br />

famosos estabelecem vínculos<br />

com figuras como os românticos<br />

e crepusculares Chopin e Gabriel<br />

Fauré, Janácek e a sua obra,<br />

influencia<strong>da</strong> pela música “folk“ do<br />

seu país, Elgar e a sua ligação à<br />

Natureza (satiricamente tratado em<br />

“Malvern Hills) ou, ain<strong>da</strong>, as<br />

canções íntimas e<br />

simultaneamente<br />

cínicas <strong>de</strong><br />

Cole<br />

Porter, o<br />

ritmo <strong>de</strong><br />

Irving<br />

Berlin<br />

ou a<br />

Antes <strong>de</strong> se tornar escritor, Ishiguro quis ser músico<br />

<strong>de</strong> rock e essa vocação perdi<strong>da</strong> atravessa a sua obra<br />

aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />

sensuali<strong>da</strong><strong>de</strong> evocativa <strong>de</strong> Sarah<br />

Vaughan.<br />

Sabe-se que Ishiguro, antes <strong>de</strong> se<br />

<strong>de</strong>cidir pela escrita, <strong>de</strong>sejou ser<br />

músico (<strong>de</strong> rock) e essa vocação temse<br />

revelado em to<strong>da</strong> a sua obra. Ao<br />

longo <strong>de</strong>stes contos é possível<br />

<strong>de</strong>tectar traços <strong>de</strong> anteriores<br />

romances, como é o caso <strong>de</strong> “ Os<br />

Inconsolados” -<br />

on<strong>de</strong> um<br />

pianista<br />

famoso<br />

é<br />

MIKE SEGAR/ REUTERS<br />

assombrado por um mundo<br />

estranho e cheio <strong>de</strong> sinais que ele<br />

não consegue apreen<strong>de</strong>r -, <strong>de</strong><br />

“Nunca Me Deixes”, em que a<br />

melodia toca<strong>da</strong> numa cassete é<br />

repeti<strong>da</strong>mente <strong>da</strong>nça<strong>da</strong> por Kathy, e<br />

mesmo <strong>de</strong> uma peça que Ishiguro<br />

escreveu para o teatro, “The Sad<strong>de</strong>st<br />

Music in the World”, uma comédia<br />

negra on<strong>de</strong> uma mulher patrocina<br />

um concurso para encontrar a “<br />

música mais triste do mundo”.<br />

Ishiguro é um escritor peculiar<br />

que, como já tem <strong>de</strong>monstrado no<br />

total <strong>da</strong> sua obra, se obstina em<br />

<strong>de</strong>smontar estruturas literárias<br />

tradicionais, mantendo, no entanto,<br />

um tom <strong>de</strong> aparente e perversa<br />

“normali<strong>da</strong><strong>de</strong>”, num universo em<br />

que indivíduos mais ou menos<br />

disfuncionais são influenciados por<br />

sinais que os arrastam para situações<br />

bizarras, dramáticas e, como é o<br />

caso em pelo menos duas histórias<br />

<strong>de</strong>ste volume, cómicas e com um<br />

toque <strong>de</strong> “slapstick”. A tristeza, a<br />

impaciência e o <strong>de</strong>speito<br />

atormentam as personagens,<br />

pessoas <strong>de</strong>senraiza<strong>da</strong>s, vivendo<br />

longe <strong>da</strong>s suas pátrias, em<br />

situações precárias e, por<br />

vezes humilhantes, mas<br />

que <strong>de</strong>senvolvem<br />

estranhos afectos e<br />

cumplici<strong>da</strong><strong>de</strong>s fortuitas.<br />

Não é por acaso que o<br />

autor coloca em<br />

confronto jovens<br />

artistas com mentores<br />

muito mais velhos,<br />

enfatizando <strong>de</strong>ssa forma<br />

o contraste entre a<br />

esperança e o<br />

conformismo, entre a<br />

expectativa e o cinismo.<br />

Apesar <strong>da</strong> óbvia referência<br />

ao romantismo, Ishiguro está<br />

muito mais próximo <strong>de</strong> Swift e<br />

<strong>de</strong> Austen, no que diz respeito à<br />

<strong>de</strong>sa<strong>de</strong>quação <strong>da</strong>s personagens<br />

à reali<strong>da</strong><strong>de</strong> e à sua preocupação<br />

em seguir certas regras<br />

impostas por uma socie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

que dita comportamentos<br />

absurdos. Mas o mais<br />

interessante é a forma como<br />

Ishiguro questiona a<br />

essência <strong>da</strong> arte e reflecte<br />

sobre o narcisismo dos<br />

criadores e o dilema entre<br />

a “pureza” <strong>da</strong> criação e a<br />

atracção pela fama e pelo<br />

sucesso. Este autor<br />

inglês que nasceu em<br />

Nagasáqui, no rescaldo<br />

<strong>da</strong> bomba atómica,<br />

carrega consigo e<br />

transmite nos seus<br />

livros o sentimento<br />

<strong>de</strong> que somos<br />

todos órfãos,<br />

arrastados pelas<br />

correntes <strong>da</strong><br />

história e do<br />

acaso, vítimas <strong>da</strong><br />

incomunicabili<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

e <strong>da</strong><br />

incerteza.<br />

Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 29


Livros<br />

Isabel<br />

Coutinho<br />

Chico Buarque gostou<br />

muito do livro. Aquele,<br />

disse, só podia ser um<br />

livro escrito por um<br />

autor <strong>de</strong> “quadrinhos”<br />

Lourenço Mutarelli<br />

http://www.<br />

mutarelli.com.<br />

br/mutarelli/<br />

O filme<br />

http://www.<br />

ocheirodoralo.<br />

com.br/<br />

Diário em BD na<br />

revista Piauí<br />

http://www.<br />

revistapiaui.com.<br />

br/edicao_35/artigo_1104/Rotina_em_nanquim.<br />

aspx<br />

Ciberescritas<br />

30 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon<br />

Ai que bom é<br />

“O Cheiro do Ralo”<br />

Finalmente li “O Cheiro do Ralo” do brasileiro<br />

Lourenço Mutarelli. E, como já esperava, valeu<br />

bem a pena. Quem primeiro me falou <strong>de</strong>ste<br />

escritor, autor <strong>de</strong> ban<strong>da</strong>-<strong>de</strong>senha<strong>da</strong> e actor foi<br />

Marçal Aquino quando esteve em Matosinhos a<br />

participar no 4º Encontro Internacional Literatura em<br />

Viagem. O autor <strong>de</strong> “Cabeça a Prémio” é também<br />

argumentista e foi graças a ele que esta obra foi a<strong>da</strong>pta<strong>da</strong><br />

ao cinema no Brasil.<br />

Em 2002, Lourenço Mutarelli (São Paulo, 1964) <strong>de</strong>pois<br />

<strong>de</strong> ter publicado nove livros <strong>de</strong> ban<strong>da</strong>-<strong>de</strong>senha<strong>da</strong> e <strong>de</strong><br />

ser um dos autores <strong>de</strong> BD mais premiados no Brasil,<br />

publicou o seu primeiro romance. Escreveu-o <strong>de</strong><br />

raja<strong>da</strong>, durante cinco dias, num Carnaval em que estava<br />

sozinho.<br />

Chico Buarque, durante a conversa que teve com<br />

Milton Hatoum e Samuel Titan Jr. na Festa Literária <strong>de</strong><br />

Paraty, em Julho, disse que “a literatura hoje em dia<br />

não precisa <strong>de</strong> se alimentar somente <strong>de</strong> literatura”.<br />

Contou que há uns cinco, seis anos, tinha lido “O Cheiro<br />

do Ralo” <strong>de</strong> Mutarelli e que o romance “era muito<br />

bom”. Gostou muito do livro e percebeu que era “muito<br />

novo” porque Lourenço Mutarelli é um autor <strong>de</strong> BD.<br />

Aquele só podia ser um livro escrito por um autor <strong>de</strong><br />

“quadrinhos”. “[No romance] Há um sujeito atrás <strong>de</strong> um<br />

balcão naquela loja maluca e aparece um tipo, aparece<br />

um outro, e é muito bom que<br />

ele tenha trazido isso para a<br />

literatura. Isso é bom para a<br />

literatura”, afirmou.<br />

“O Cheiro do Ralo” tem 140<br />

páginas que se lêem tal como<br />

foi escrito, num repente.<br />

Risos, surpresa, indignação,<br />

excitação, pena, todos estes<br />

sentimentos surgem durante<br />

a leitura. Estamos a ler um<br />

romance e parece que estamos a ler poesia. O narrador<br />

do livro nunca é i<strong>de</strong>ntificado. Passa parte <strong>da</strong> sua vi<strong>da</strong><br />

atrás do balcão numa loja <strong>de</strong> penhores e, quando os<br />

clientes atravessam a porta, já ele está a pensar como os<br />

vai tramar. Na sua loja há um problema, um cheiro surge<br />

<strong>da</strong> fossa <strong>da</strong> casa <strong>de</strong> banho, do ralo entupido. Um cheiro<br />

tão insuportável que atravessa os diálogos do livro do<br />

princípio ao fim. O narrador tem também uma obsessão<br />

por uma <strong>de</strong>termina<strong>da</strong> “bun<strong>da</strong>”, o rabinho perfeito <strong>de</strong><br />

uma emprega<strong>da</strong> <strong>de</strong> um restaurante on<strong>de</strong> ele costuma ir<br />

almoçar só para espreitar “a dona bun<strong>da</strong>”.<br />

“‘O Cheiro do Ralo’, em síntese, é a história <strong>da</strong> busca.<br />

Fazendo justiça ao título, os caminhos trilhados pelo<br />

protagonista só serão percorridos se o leitor tiver a<br />

capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> suportar o odor”, lê-se no site oficial <strong>de</strong><br />

Lourenço Mutarelli, on<strong>de</strong> po<strong>de</strong>m ser visualiza<strong>da</strong>s quatro<br />

páginas do livro em PDF.<br />

Enquanto se espera que algum editor português<br />

resolva editar por cá esta obra <strong>de</strong> Mutarelli, po<strong>de</strong>mos<br />

ver no site <strong>da</strong> revista brasileira “Piauí” o diário ilustrado<br />

que o escritor fez durante um mês a pedido dos editores<br />

<strong>da</strong> revista: “Acor<strong>de</strong>i irritado. Os gatos parecem cinco<br />

macacos. Tenho que ir ao banco pagar uma dúzia <strong>de</strong><br />

contas.” São coisas assim.<br />

E quem quiser saber mais sobre o trabalho <strong>de</strong><br />

Mutarelli po<strong>de</strong> ir assistir a “Corpo Estranho” no projecto<br />

na Internet <strong>de</strong> Renata Jesion a partir do texto original do<br />

autor. A actriz faz peças <strong>de</strong> teatro na sua sala <strong>de</strong> estar,<br />

que são filma<strong>da</strong>s e transmiti<strong>da</strong>s na Internet.<br />

Corpo Estranho<br />

http://www.teatroparaalguem.<br />

com.br/ isabel.coutinho@publico.pt<br />

(Ciberescritas já é um blogue http://blogs.publico.pt/ciberescritas)<br />

Era uma vez<br />

na Noruega<br />

Karin Fossum faz um<br />

admirável retrato <strong>de</strong> uma<br />

al<strong>de</strong>ia adormeci<strong>da</strong> em que<br />

todos os habitantes parecem<br />

ter algo a escon<strong>de</strong>r.<br />

José Riço Direitinho<br />

A Noiva Indiana<br />

Karin Fossum<br />

(Tradução <strong>de</strong> José Mendonça<br />

<strong>da</strong> Cruz)<br />

Oceanos<br />

mmmmn<br />

A norueguesa<br />

Karin Fossum (n.<br />

1954) é uma <strong>da</strong>s<br />

autoras mais<br />

reconheci<strong>da</strong>s<br />

<strong>de</strong>ste recente<br />

“boom” <strong>de</strong><br />

policiais nórdicos<br />

que há já alguns<br />

anos se instalou<br />

nos catálogos <strong>da</strong>s editoras europeias<br />

(mais recentemente também no <strong>da</strong>s<br />

norte-americanas), e que um pouco a<br />

medo parece estar agora a chegar a<br />

Portugal – se não ain<strong>da</strong> em termos <strong>de</strong><br />

sucesso junto dos leitores, pelo<br />

menos em número <strong>de</strong> autores<br />

traduzidos. Karin Fossum, que<br />

curiosamente começou a sua carreira<br />

literária publicando poesia (tendo<br />

sido bastante elogia<strong>da</strong> pela crítica),<br />

só a meio <strong>da</strong> déca<strong>da</strong> <strong>de</strong> 90 é que se<br />

converteu à escrita <strong>de</strong> romances<br />

policiais, tendo iniciado então a<br />

“série do Inspector Konrad Sejer”, <strong>da</strong><br />

qual foram publicados até agora, na<br />

Noruega, nove volumes. “A<br />

Noiva Indiana” (o quinto<br />

<strong>da</strong> série) – distinguido<br />

em 2007 com o “Best<br />

European Crime<br />

Novel”, e<br />

consi<strong>de</strong>rado, em<br />

2008, pelo “Los<br />

Angeles Times”<br />

como o melhor<br />

romance policial<br />

publicado nos EUA – é<br />

o terceiro livro <strong>de</strong> Karin<br />

Fossum por cá<br />

traduzido: a Presença<br />

publicara antes “A Ilusão<br />

<strong>de</strong> Eva” (2002) e “O<br />

Olhar <strong>de</strong> um<br />

Desconhecido”<br />

(2005).<br />

Um<br />

pouco na<br />

linha <strong>de</strong><br />

outras<br />

norueguesa Anne Holt ou a sueca<br />

Liza Marklund – para referir apenas<br />

escritoras traduzi<strong>da</strong>s para português<br />

– Karin Fossum parece querer<br />

remeter a resolução do puzzle do<br />

crime para um segundo plano,<br />

preferindo centrar-se nas causas e<br />

nos efeitos do acto violento no tecido<br />

social. Para isso, criou personagens<br />

bastante vívi<strong>da</strong>s, convincentes, e<br />

aprofundou-as emocionalmente<br />

realçando as suas inseguranças.<br />

Gun<strong>de</strong>r Jomann é um recatado<br />

ven<strong>de</strong>dor <strong>de</strong> maquinaria agrícola,<br />

sem problemas monetários, 51 anos<br />

<strong>de</strong> i<strong>da</strong><strong>de</strong>, e que ain<strong>da</strong> não per<strong>de</strong>u a<br />

esperança <strong>de</strong> um dia se casar. Vive<br />

em Elvestad, uma al<strong>de</strong>ia com 2347<br />

habitantes. Um dia, ao folhear um<br />

livro que lhe fora oferecido pela<br />

irmã, Povos <strong>de</strong> To<strong>da</strong>s as Nações,<br />

apaixona-se pela beleza <strong>da</strong>s<br />

mulheres indianas. Daí até viajar<br />

para a Índia, para Mumbai (a antiga<br />

Bombaim), com a intenção <strong>de</strong> por lá<br />

encontrar uma companheira,<br />

<strong>de</strong>corre pouco tempo. “Havia outras<br />

opções. Mas ele não tinha coragem<br />

para embarcar com outros, com<br />

estranhos, num autocarro com<br />

<strong>de</strong>stino à Polónia. E não queria<br />

saltar para um avião rumo à<br />

Tailândia. Havia tantos boatos sobre<br />

o que por lá se passava…”<br />

Para espanto <strong>da</strong> irmã, quando<br />

Gun<strong>de</strong>r regressa à Noruega, passa<strong>da</strong>s<br />

as duas semanas <strong>de</strong> férias, é já um<br />

homem casado. A sua mulher, Poona<br />

Bai, não o po<strong>de</strong> acompanhar mas em<br />

breve se lhe virá juntar. Mas no dia<br />

aprazado para Gun<strong>de</strong>r a ir esperar ao<br />

aeroporto, Marie, a irmã, tem um<br />

violento aci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> viação e é<br />

interna<strong>da</strong> no hospital com<br />

traumatismos graves e em estado <strong>de</strong><br />

coma. Ele pe<strong>de</strong> então ao único taxista<br />

<strong>da</strong> al<strong>de</strong>ia que vá ao aeroporto buscar<br />

Poona Bai. Mas este regressa<br />

sozinho. No dia seguinte, o<br />

corpo <strong>de</strong> uma mulher é<br />

encontrado na<br />

bor<strong>da</strong> <strong>de</strong> um<br />

prado, junto a um<br />

bosque. É uma<br />

mulher<br />

pequena, <strong>de</strong><br />

pele escura e<br />

vesti<strong>da</strong> com<br />

roupas exóticas.<br />

Tem o rosto<br />

irreconhecível,<br />

esmagado. É então<br />

que é chamado<br />

o calmo<br />

autoras<br />

Karin Fossum é uma <strong>da</strong>s mais reconheci<strong>da</strong>s<br />

nórdicas,<br />

representantes do policial nórdico<br />

como a<br />

islan<strong>de</strong>sa Yrsa<br />

Sigur<strong>da</strong>rdóttir,<br />

a também<br />

aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />

Inspector Konrad Sejer – um dos mais<br />

civilizados <strong>da</strong> constelação do<br />

romance policial – que frente ao<br />

corpo nota que se tratou <strong>de</strong> “um<br />

ataque <strong>de</strong> uma violência muito rara<br />

na história criminal <strong>da</strong> Noruega.”<br />

Ninguém na adormeci<strong>da</strong> al<strong>de</strong>ia <strong>de</strong><br />

Elvestad consegue acreditar que um<br />

dos seus cometeu aquele horrendo e<br />

brutal crime. Mas para Konrad Sejer e<br />

para o seu assistente Jacob Skane<br />

todos são suspeitos. E alguns<br />

parecem ter algo a escon<strong>de</strong>r, quando<br />

não sobre o crime, pelo menos sobre<br />

as suas vi<strong>da</strong>s. “Há uma via <strong>de</strong> acesso<br />

a todo o ser humano. É isso que<br />

procuro, pensou Sejer.”<br />

Neste romance lento e pungente,<br />

Fossum faz um retrato talentoso <strong>da</strong><br />

vi<strong>da</strong> numa al<strong>de</strong>ia quase isola<strong>da</strong>.<br />

Des<strong>de</strong> o ostracismo a que é remeti<strong>da</strong><br />

uma testemunha casual, até às<br />

conversas <strong>de</strong> café em que vários se<br />

vão acusando em jeito <strong>de</strong><br />

“brinca<strong>de</strong>ira”, passando pela<br />

enunciação dos pecadilhos venais <strong>de</strong><br />

ca<strong>da</strong> um, que to<strong>da</strong> a gente conhece<br />

mas que finge não saber. Como<br />

convém num romance que se<br />

preten<strong>de</strong> subtil, a ambigui<strong>da</strong><strong>de</strong> final<br />

dá-lhe um certo toque <strong>de</strong> <strong>de</strong>lica<strong>de</strong>za.<br />

Ensaio<br />

E Alice<br />

com isso?<br />

Carroll é uma fasquia muito<br />

alta para a prosa amanuense<br />

<strong>de</strong>ste argentino “déraciné.”<br />

Eduardo Pitta<br />

No Bosque do Espelho<br />

Alberto Manguel<br />

(Tradução <strong>de</strong> Margari<strong>da</strong> Santiago)<br />

Dom Quixote<br />

mmmnn<br />

Foi em 1996, com<br />

“Uma História <strong>da</strong><br />

Leitura”, que<br />

Alberto Manguel<br />

(n. 1948) chamou<br />

a atenção <strong>de</strong> to<strong>da</strong><br />

a gente. Nessa<br />

época já ele era<br />

um autor<br />

canadiano. Na<br />

vasta bibliografia, só o livro<br />

inaugural foi escrito na língua<br />

materna: “Dicionário <strong>de</strong> Lugares<br />

Imaginários” (1980), obra <strong>de</strong> que é<br />

co-autor com Gianni Gua<strong>da</strong>lupi. A<br />

partir <strong>da</strong>í escreveu sempre em<br />

inglês. Manguel nasceu em Buenos<br />

Aires, mas passou a infância e parte<br />

<strong>da</strong> adolescência em Israel, on<strong>de</strong> o<br />

pai era embaixador. Voltou à<br />

Argentina para completar o ensino<br />

secundário, tornou-se íntimo <strong>de</strong><br />

Jorge Luís Borges, viajou por todo o<br />

mundo antes <strong>de</strong> fixar-se no Canadá<br />

nos anos 1980, mas, não obstante a


ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia canadiana, vive<br />

actualmente em França. Manguel<br />

goza <strong>de</strong> uma fama notoriamente<br />

excessiva (a lista <strong>de</strong> prémios<br />

internacionais é impressionante).<br />

Embora tenha escrito romances e<br />

contos, alguns <strong>de</strong> natureza gay, e<br />

organizado antologias <strong>de</strong> diversa<br />

índole, é como ensaísta que se<br />

<strong>de</strong>staca. Os anos em que lia para<br />

Borges, já então cego, foram um<br />

bom tirocínio.<br />

“No Bosque do Espelho” toma<br />

como ponto <strong>de</strong> parti<strong>da</strong> a obra-prima<br />

<strong>de</strong> Lewis Carroll, adoptando como<br />

divisa o “mot” <strong>de</strong> Heraclito: “Nunca<br />

mergulhas no mesmo livro duas<br />

vezes”. Trata-se <strong>de</strong> uma colectânea<br />

<strong>de</strong> ensaios <strong>de</strong> muito diversa<br />

proveniência: artigos<br />

encomen<strong>da</strong>dos, textos para cursos<br />

<strong>de</strong> jornalismo <strong>da</strong>s artes,<br />

conferências, recensões críticas,<br />

antologias gay, introduções e<br />

posfácios. Manguel estabece um fio<br />

condutor entre textos <strong>de</strong> Borges,<br />

Cortázar, Chesterton, Melville,<br />

Cynthia Ozick, Santo Agostinho e<br />

outros. Do ponto <strong>de</strong> vista <strong>da</strong><br />

erudição e do “ofício”, tem a<br />

perfeição do amanuense culto. Mas<br />

raramente nos surpreen<strong>de</strong> com um<br />

golpe <strong>de</strong> asa.<br />

Uma <strong>da</strong>s excepções é a sanha com<br />

que “<strong>de</strong>smonta” Bret Easton Ellis a<br />

Espaço<br />

Público<br />

Este espaço vai ser seu.<br />

Que filme, peça <strong>de</strong> teatro,<br />

livro, exposição, disco,<br />

álbum, canção, concerto,<br />

DVD viu e gostou tanto<br />

que lhe apeteceu escrever<br />

sobre ele, concor<strong>da</strong>ndo ou<br />

Alberto Manguel: Lewis Carroll é uma fasquia<br />

<strong>de</strong>masiado gran<strong>de</strong> para este argentino<br />

partir <strong>de</strong> “Psicopata Americano”<br />

(1991). A parte do anedotário é<br />

conheci<strong>da</strong>: <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> ter pago um<br />

adiantamento avultado a Ellis, e ter<br />

o livro impresso, a Simon & Schuster<br />

<strong>de</strong>sistiu <strong>de</strong> o pôr à ven<strong>da</strong> por causa<br />

<strong>da</strong> violência do conteúdo; saiu,<br />

como é sabido, sob chancela <strong>da</strong><br />

“Vintage Contemporaries” <strong>da</strong><br />

Random House. Mas Manguel<br />

aproveita para aliviar o fígado: “A<br />

primeira linha do livro é o lema <strong>de</strong><br />

Dante para as portas do Inferno [...].<br />

De facto, tudo está montado <strong>de</strong><br />

modo a levar o leitor a crer que a<br />

história que se segue é, <strong>de</strong> facto, <strong>de</strong><br />

natureza literária: contemporâneo e<br />

irónico [...], mo<strong>de</strong>rno [...], sério e<br />

filosófico. As 128 páginas que se<br />

seguem (a primeira cena brutal<br />

começa na página 129) são<br />

agonizantes para qualquer pessoa<br />

que não esteja habitua<strong>da</strong> a ler<br />

publici<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> mo<strong>da</strong>. [...] Não é<br />

escrita; é um <strong>de</strong>sfile <strong>de</strong> palavras com<br />

o propósito <strong>de</strong> fazer um catálogo.” E<br />

não poupa nos adjectivos: os relatos<br />

são “grotescos”, a prosa<br />

“<strong>de</strong>sajeita<strong>da</strong>”, o estilo “débil” e o<br />

vocabulário “magro”. Tudo por<br />

contraponto com Ovídio, Dante,<br />

Novalis, Sa<strong>de</strong>, Kafka e Dostoievsky.<br />

Convenhamos na <strong>de</strong>sproporção.<br />

O ensaio <strong>de</strong>dicado a Cynthia Ozick<br />

é dos mais estimulantes. A partir <strong>da</strong>s<br />

PHILIPPE MATSAS/ OPALE<br />

leituras que Ozick fez <strong>de</strong> Primo Levi,<br />

Manguel reflecte sobre a condição<br />

ju<strong>da</strong>ica, ameaça<strong>da</strong> pela “galáxia<br />

canibal <strong>da</strong> cultura cristã”. Faz isso<br />

com argúcia e <strong>de</strong>senvoltura,<br />

sobretudo quando contrapõe os<br />

conceitos <strong>de</strong> raiva e misericórdia<br />

que, na perspectiva <strong>de</strong> Ozick, Levi<br />

relacionava com auto<strong>de</strong>struição.<br />

A afirmação <strong>de</strong> que, “até à déca<strong>da</strong><br />

<strong>de</strong> 1960, o Canadá mal reconhecia a<br />

existência <strong>da</strong> literatura canadiana” é<br />

completamente inespera<strong>da</strong>.<br />

Creditando esse reconhecimento à<br />

teimosia e perseverança <strong>de</strong> alguns<br />

editores, bem como à projecção <strong>da</strong><br />

obra <strong>de</strong> Margaret Atwood — que<br />

classifica com paternalismo —,<br />

Manguel reserva os elogios para<br />

Richard Outram (1930-2005), “um<br />

dos melhores poetas em língua<br />

inglesa”.<br />

Tudo visto, parece-me fútil, para<br />

não lhe chamar pe<strong>da</strong>nte, ter<br />

alinhado os textos sob o enigmático<br />

patrocíno <strong>de</strong> “Alice no País <strong>da</strong>s<br />

Maravilhas”. Mesmo nos ensaios<br />

sobre Borges, porventura aqueles<br />

em que está mais à-vonta<strong>de</strong>, Carroll<br />

é uma fasquia muito alta para este<br />

argentino “déraciné”.<br />

Uma<br />

metamorfose<br />

exaspera<strong>da</strong><br />

Um atento estudo <strong>de</strong><br />

literatura compara<strong>da</strong>:<br />

o poema em prosa em<br />

Bau<strong>de</strong>laire e Herberto.<br />

Pedro Mexia<br />

O Espaço sem Volta<br />

Marco Alexandre Rebelo<br />

Ven<strong>da</strong>val<br />

mmmnn<br />

não concor<strong>da</strong>ndo com o<br />

que escrevemos? Envienos<br />

uma nota até 500<br />

caracteres para ipsilon@<br />

publico.pt. E nós <strong>de</strong>pois<br />

publicamos.<br />

Cem anos<br />

me<strong>de</strong>iam o<br />

aparecimento, em<br />

1862, dos<br />

primeiros textos<br />

que constituiriam<br />

“O Spleen <strong>de</strong><br />

Paris” e a<br />

publicação <strong>de</strong> “Os<br />

Passos em Volta”,<br />

em 1963. No breve ensaio “O Espaço<br />

sem Volta”, Marco Alexandre Rebelo<br />

tenta perceber o percurso do poema<br />

em prosa ao longo <strong>de</strong>sse século,<br />

tomando como ponto <strong>de</strong> parti<strong>da</strong> as<br />

colectâneas <strong>de</strong> Bau<strong>de</strong>laire e<br />

Herberto Hel<strong>de</strong>r. E “poema em<br />

prosa” surge aqui quase como<br />

sinónimo <strong>de</strong> “mo<strong>de</strong>rni<strong>da</strong><strong>de</strong>”.<br />

Quando Bau<strong>de</strong>laire começou a<br />

escrever os seus “petits poèmes en<br />

prose”, tomou como mo<strong>de</strong>lo o<br />

“Gaspard <strong>de</strong> la Nuit” (1842), <strong>de</strong><br />

Aloysius Bertrand, a<strong>da</strong>ptando-o à<br />

“<strong>de</strong>scrição <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> mo<strong>de</strong>rna”. O<br />

novo poema em prosa era<br />

“pequeno” e não épico, e usava uma<br />

prosa musical e maleável que<br />

marcava o ritmo <strong>de</strong> um tempo novo.<br />

Esse tempo novo tinha também um<br />

novo espaço: Paris, centro do<br />

mundo civilizado, ci<strong>da</strong><strong>de</strong> já com dois<br />

milhões <strong>de</strong> habitantes e que, com o<br />

plano do Barão Haussmann,<br />

duplicou o número <strong>de</strong> bairros e<br />

ergueu uma infini<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> ruas,<br />

praças, aveni<strong>da</strong>s. A gran<strong>de</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

tinha nascido <strong>da</strong> <strong>de</strong>molição <strong>da</strong><br />

ci<strong>da</strong><strong>de</strong> antiga, e por isso era um<br />

espaço <strong>de</strong> multidões, anonimato e<br />

tédio: “No mundo estreito <strong>de</strong>sta<br />

Paris mo<strong>de</strong>rna e industrial, a<br />

linguagem e a forma empregues<br />

pelos clássicos ao cantar o<br />

quotidiano <strong>de</strong>ixam <strong>de</strong> fazer sentido.<br />

O ritmo <strong>de</strong> vi<strong>da</strong> mudou, a<br />

linguagem, on<strong>de</strong> o ritmo poético é<br />

criado, <strong>de</strong>ve a<strong>da</strong>ptar-se a essa<br />

mu<strong>da</strong>nça, não com o fim <strong>de</strong><br />

reproduzir o real, mas sim para o<br />

transformar” (pág. 15).<br />

A ci<strong>da</strong><strong>de</strong> inumana gera uma nova<br />

subjectivi<strong>da</strong><strong>de</strong>, uma subjectivi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

que vive entre o i<strong>de</strong>alismo e a<br />

triviali<strong>da</strong><strong>de</strong>: “O pequeno poema em<br />

prosa a<strong>da</strong>pta-se ao ritmo quotidiano<br />

do poeta do poeta flâneur e <strong>da</strong>ndy,<br />

um ritmo que oscila entre o viver <strong>de</strong><br />

um acontecimento pitoresco, o<br />

pensar-sonhar-viajar <strong>de</strong> um outro<br />

mundo, os sobressaltos críticos <strong>da</strong><br />

consciência e o simples sentir do<br />

spleen” (pág. 16). É uma<br />

poesia <strong>de</strong> instantâneos,<br />

uma “musa citadina”<br />

feita <strong>de</strong> acasos,<br />

melancolias, do<br />

elogio do feio e do<br />

artificial. O novo<br />

paradigma<br />

civilizacional cria um<br />

novo paradigma<br />

poético, uma poesia<br />

com a linguagem e a<br />

liber<strong>da</strong><strong>de</strong> formal <strong>da</strong><br />

prosa mas com<br />

mecanismos transpostos<br />

<strong>da</strong> versificação, como a<br />

aliteração ou a assonância.<br />

O poema em prosa não foi<br />

inventado por Bau<strong>de</strong>laire, mas<br />

ele reinventou-o como<br />

linguagem <strong>de</strong> um novo<br />

espaço e <strong>de</strong> um novo<br />

tempo.<br />

Passados cem<br />

anos (e <strong>de</strong>pois<br />

<strong>da</strong>s teses<br />

revolucionárias <strong>de</strong> Einstein), espaço<br />

e tempo estavam ain<strong>da</strong> mais<br />

associados, ao ponto <strong>de</strong> serem<br />

indistinguíveis. Mas agora o mundo<br />

já não tinha centro, o spleen tinha<br />

sido substituído pela veloci<strong>da</strong><strong>de</strong>, e a<br />

viagem era uma experiência banal.<br />

“Os Passos em Volta” é um<br />

acontecimento fulgurante na<br />

literatura portuguesa, em parte,<br />

escreve Rebelo, porque actualiza<br />

essa questão do espaço e do tempo<br />

para 1963.<br />

Embora a primeira edição do livro<br />

trouxesse a indicação “contos”<br />

(abandona<strong>da</strong> nas reedições), é à<br />

tradição do poema em prosa que<br />

Herberto vai beber. Aqueles textos<br />

são ficções, mas também narrativas<br />

<strong>de</strong> viagem e monólogos dramáticos,<br />

com ecos autobiográficos e uma<br />

gran<strong>de</strong> inventivi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> escrita. O<br />

sujeito não está preso a uma ci<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

mas <strong>de</strong>ambula por várias ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />

europeias, num espaço em expansão<br />

que gera também um tempo<br />

expansivo. E esse tempo exige uma<br />

escrita circular, “em volta”, uma<br />

escrita que implica uma ruptura<br />

com a linguagem comum. É uma<br />

espécie <strong>de</strong> poesia primitiva, uma<br />

poesia dionisíaca e alucina<strong>da</strong> que<br />

tem também outro mestre:<br />

Lautréamont e a sua “metamorfose<br />

exaspera<strong>da</strong>”.<br />

Publicado numa pequena e<br />

exigente editora <strong>de</strong> teoria e<br />

crítica, “O Espaço<br />

sem Volta” é um<br />

atento estudo<br />

<strong>de</strong> literatura<br />

compara<strong>da</strong>.<br />

Bau<strong>de</strong>laire reinventou o poema em prosa como linguagem<br />

<strong>de</strong> um novo espaço, a gran<strong>de</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong> haussmaniana<br />

Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 31


Teatro/Dança<br />

32 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon<br />

Espaço<br />

Público<br />

Bem vindos<br />

à Euráfrica<br />

No programa que o CCB<br />

<strong>de</strong>dica a África, a francesa<br />

Julie Dossavi apresenta-se<br />

como um ser compósito <strong>de</strong><br />

referências tanto ancestrais<br />

como contemporâneas,<br />

tanto europeias quanto<br />

africanas. Vanessa Rato<br />

P.I. (Pays)<br />

De e com Julie Dossavi.<br />

<strong>Lisboa</strong>. Centro Cultural <strong>de</strong> Belém - Praça do Museu.<br />

Praça do Império. Dia 21/08. 6ª às 22h. Tel.:<br />

213612400. Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

CCB Fora <strong>de</strong> Si.<br />

Walid Raad, o artista plástico por<br />

<strong>de</strong>trás do conhecido projecto The<br />

Atlas Group, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> uma teoria<br />

interessante: segundo ele, que<br />

nasceu no Líbano e viu o seu país ser<br />

literalmente arrasado, um evento<br />

traumático como a guerra <strong>de</strong>strói<br />

qualquer possibili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> retomar o<br />

fio <strong>de</strong> certas tradições artísticas;<br />

qualquer autor que o tente, diz ele,<br />

acabará mergulhado no submundo<br />

<strong>da</strong> “falsa cultura”, criador <strong>de</strong> na<strong>da</strong><br />

mais do que duplos, cópias.<br />

É o reverso <strong>da</strong> me<strong>da</strong>lha <strong>da</strong>s teorias<br />

pós-colonialistas. Mas, claro, Walid é<br />

um artista plástico e Julie Dossavi<br />

uma bailarina. Aqui, o corpo é a<br />

questão. Porque o corpo tem uma<br />

memória própria.<br />

Nasci<strong>da</strong> em Toulon em 1968,<br />

Dossavi, hoje com 41 anos, cresceu<br />

em Brest, na Bretanha, e mudou-se<br />

para Paris apenas no final do liceu.<br />

Foi primeiro atleta, <strong>de</strong>pois<br />

patinadora e só <strong>de</strong>pois bailarina,<br />

Agen<strong>da</strong><br />

Teatro<br />

Estreiam<br />

Este espaço vai ser<br />

seu. Que filme, peça <strong>de</strong><br />

teatro, livro, exposição,<br />

disco, álbum, canção,<br />

concerto, DVD viu e<br />

gostou tanto que lhe<br />

apeteceu escrever<br />

A I<strong>da</strong><strong>de</strong> do Ouro<br />

Encenação <strong>de</strong> Filipe Crawford. Com<br />

Ana Peres, Carla Men<strong>de</strong>s, Fernando<br />

Cunha, Hugo Gama, Luís<br />

Nascimento, Mariana Schou, Marta<br />

Pacheco, Rui Ferreira, Vasco Lavado,<br />

Pedro Luzindro.<br />

<strong>Lisboa</strong>. Castelo <strong>de</strong> São Jorge. De 27/08 a 29/08. 5ª a<br />

Sáb. às 21h30. Tel.: 218800620. 5€ a 10€.<br />

Drákula<br />

Encenação <strong>de</strong> John Mowat. Pela<br />

Companhia <strong>de</strong> Teatro do Chapitô.<br />

Com Jorge Cruz, José Carlos Garcia,<br />

Tiago Viegas.<br />

Fundão. Espaço Gardunha Viva. Dia 21/08. 6ª às<br />

22h. 3€ a 10€.<br />

Festival TeatroAgosto.<br />

Tulius Claunus<br />

De Nuno Pino Custódio e Sérgio<br />

Fernan<strong>de</strong>s. Encenação <strong>de</strong> Nuno Pino<br />

Custódio. Pela Este. Com Sérgio<br />

Fernan<strong>de</strong>s e Pedro Rufino.<br />

sobre ele, concor<strong>da</strong>ndo<br />

ou não concor<strong>da</strong>ndo<br />

com o que escrevemos?<br />

Envie-nos uma nota até<br />

500 caracteres para<br />

ipsilon@publico.pt. E<br />

nós <strong>de</strong>pois publicamos.<br />

Julie Dossavi, uma franco-africana à procura <strong>da</strong>s origens<br />

Fundão. Espaço Gardunha Viva. Dia 22/08. Sáb. às<br />

22h. 3€ a 10€.<br />

Festival TeatroAgosto.<br />

Hed<strong>da</strong> Gabler<br />

De Henrik<br />

Ibsen.<br />

Encenação<br />

<strong>de</strong> Celso Cleto.<br />

Com Sofia<br />

Alves, Ana<br />

Rocha, Elisa<br />

<strong>Lisboa</strong>,<br />

Guilherme<br />

Filipe,<br />

Maria Dulce,<br />

Paulo Rocha, Vítor <strong>de</strong> Sousa.<br />

Cal<strong>da</strong>s <strong>da</strong> Rainha. Centro Cultural e Congressos <strong>da</strong>s<br />

Cal<strong>da</strong>s <strong>da</strong> Rainha. Rua Doutor Leonel Sotto Mayor.<br />

De 21/08 a 22/08. 5ª e 6ª às 21h30. Tel.: 262889650.<br />

7,5€ a 15€.<br />

Presos por uma Corrente <strong>de</strong> Ar<br />

De Helen Ainsworth e Graeme<br />

Pulleyn. Encenação <strong>de</strong> Graeme<br />

Pulleyn. Pelo Teatro Regional <strong>da</strong> Serra<br />

<strong>de</strong> Montemuro.<br />

Arouca. Espaço <strong>da</strong> Feira. Dia 22/08. Sáb. às 21h30.<br />

Entra<strong>da</strong> gratuita.<br />

aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />

Continuam<br />

TINK<br />

A partir <strong>de</strong> Herman Melville.<br />

Pela Cão Solteiro. Com Paula Sá<br />

Nogueira, Paulo Lages, Miguel<br />

Manso, Mariana Sá Nogueira, entre<br />

outros.<br />

<strong>Lisboa</strong>. Cão Solteiro. R. Poço dos Negros, 120. Até<br />

30/08. 3ª a Dom. às 22h00. 5€ a 10€.<br />

Piaf<br />

Encenação <strong>de</strong> Filipe La Féria. Com<br />

Sónia <strong>Lisboa</strong> e Wan<strong>da</strong> Stuart, entre<br />

outros.<br />

<strong>Lisboa</strong>. Teatro Politeama. R. Portas <strong>de</strong><br />

Santo Antão, 109. Até 31/12. 3ª a 6ª às 21h30.<br />

Sáb. às 17h00 e 21h30. Dom. às 17h00. Tel.:<br />

213245500.<br />

A Gaiola <strong>da</strong>s Loucas<br />

De Jean Poirte. Encenação: Filipe La<br />

Féria. Com José Raposo, Carlos<br />

Quintas, Rita Ribeiro, Joel Branco,<br />

Hugo Ren<strong>da</strong>s.<br />

Porto. Rivoli Teatro <strong>Municipal</strong> - Gran<strong>de</strong> Auditório.<br />

Pç. D. João I. Até 31/12. 3ª, 4ª, 5ª e 6ª às 21h30. Sáb.<br />

às 17h00 e 21h30. Dom. e Feriados às 17h00. Tel.:<br />

223392200.<br />

trabalhando com nomes conhecidos<br />

<strong>da</strong> cena francesa como Philippe<br />

Decouflé e Joseph Nadj. Mas África<br />

foi uma presença constante na sua<br />

família originária do Benim: “É o<br />

que tenho em mim <strong>de</strong>s<strong>de</strong> sempre e<br />

eu acho que as pessoas não po<strong>de</strong>m<br />

esquecer as suas raízes, <strong>de</strong> on<strong>de</strong><br />

vêm”, diz-nos numa breve conversa<br />

telefónica a partir <strong>de</strong> Paris. O<br />

pretexto: “P.I. (Pays)”, aquele que<br />

ela própria <strong>de</strong>screve como “o mais<br />

africano, o mais colorido” dos cinco<br />

espectáculos que tem em reportório.<br />

Data<strong>da</strong> <strong>de</strong> 2003, “P.I. (Pays)”<br />

evolui ao longo <strong>de</strong> um dia e <strong>da</strong><br />

viagem ritual <strong>de</strong> uma mulher (“uma<br />

mulher do mundo”, como diz<br />

Dossavi) que atravessa diferentes<br />

paisagens íntimas tingi<strong>da</strong>s com a<br />

influência <strong>da</strong> música e <strong>da</strong> <strong>da</strong>nça do<br />

Benim, do Mali, do Burkina Faso e,<br />

claro, <strong>de</strong> França.<br />

Rituais ancestrais, sim, mas<br />

também contemporâneos, ligados às<br />

gran<strong>de</strong>s zonas urbanas, como na<br />

música “tecno” e o “hip hop”: está<br />

tudo lá, a emergir estiliza<strong>da</strong>mente<br />

através <strong>de</strong> Dossavi numa série <strong>de</strong><br />

solos e duetos em que<br />

percussionistas africanos e<br />

sobretudo um cantor maliano<br />

surgem como alter-egos <strong>da</strong><br />

coreógrafa e bailarina.<br />

Não vale a pena tentar ir muito<br />

mais longe do que isto: “Realmente<br />

eu não faço parte <strong>da</strong> <strong>da</strong>nça chama<strong>da</strong><br />

conceptual. Eu estou na <strong>da</strong>nça pura,<br />

na troca, na transmissão do<br />

sentimento. Gosto quando as<br />

pessoas vêem o meu trabalho e<br />

sentem. Porque para mim a <strong>da</strong>nça é<br />

realmente um estado: vivo a <strong>da</strong>nça<br />

<strong>da</strong> cabeça aos pés.”<br />

É um clássico <strong>de</strong> quem vai à<br />

procura <strong>da</strong>s suas origens: “Acho que<br />

me sinto mais africana do que os<br />

africanos. Às vezes não po<strong>de</strong>mos<br />

explicar tudo.”<br />

O Teatro <strong>de</strong> Montemuro<br />

em Arouca


Cinema<br />

As estrelas do público<br />

Estreiam<br />

Gostar <strong>de</strong><br />

personagens<br />

O filme <strong>de</strong> Miguel Mozos<br />

tem a capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> se<br />

confundir, a ca<strong>da</strong> momento,<br />

com um infinito amor<br />

pelo seu conjunto <strong>de</strong><br />

personagens, que é <strong>de</strong> resto<br />

a principal razão <strong>da</strong> sua<br />

existência.<br />

Luís Miguel Oliveira<br />

4 Copas<br />

De Manuel Mozos,<br />

com Nuno Bernardo, Diana Costa e<br />

Silva, Margari<strong>da</strong> Marinho, João<br />

Lagarto. M/12<br />

MMMnn<br />

<strong>Lisboa</strong>: CinemaCity Campo Pequeno Praça <strong>de</strong><br />

Touros: Sala 8: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 14h20, 16h40, 19h,<br />

21h50, 00h10 Sábado Domingo 12h, 14h20, 16h40,<br />

19h, 21h50, 00h10; UCI Cinemas - El Corte Inglés:<br />

Sala 3: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 14h15, 16h50,<br />

19h25, 21h50, 00h25 Domingo 11h30, 14h15, 16h50,<br />

19h25, 21h50, 00h25; ZON Lusomundo<br />

CascaiShopping: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

13h10, 15h50, 18h10, 21h05, 23h30; ZON Lusomundo<br />

Colombo: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50,<br />

15h20, 18h10, 21h15, 23h50; ZON Lusomundo<br />

Alma<strong>da</strong> Fórum: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

13h15, 15h50, 18h20, 21h05, 23h40<br />

Jorge<br />

Mourinha<br />

Porto: Arrábi<strong>da</strong> 20: Sala 17: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 14h05, 16h40, 19h15, 21h45, 00h20 3ª<br />

4ª 16h40, 19h15, 21h45, 00h20; ZON Lusomundo<br />

Dolce Vita Porto: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

14h, 16h30, 19h, 21h30, 24h; ZON Lusomundo<br />

Parque Nascente: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª<br />

4ª 13h, 15h50, 19h, 21h50, 00h35<br />

Nem todos os filmes, e na ver<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

não é assim uma coisa tão comum,<br />

estão interessados em gostar <strong>da</strong>s suas<br />

personagens. E muito poucos<br />

querem, e sabem, mostrar a ca<strong>da</strong><br />

plano o amor que têm pelas suas<br />

personagens. A reduzirem-se - tarefa<br />

ingrata - as virtu<strong>de</strong>s <strong>de</strong> “4 Copas” a<br />

uma só, essencial, fique-se com essa:<br />

a capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> que o filme tem para se<br />

confundir, a ca<strong>da</strong> momento, com um<br />

infinito amor pelo seu conjunto <strong>de</strong><br />

personagens, como se fosse ele a<br />

guiá-lo, e <strong>de</strong>clará-lo a principal razão<br />

<strong>da</strong> sua existência. Doce mesmo<br />

quando é implacável (o plano em que<br />

João Lagarto adormece antes <strong>de</strong> a<br />

mulher, Margari<strong>da</strong> Marinho, se<br />

<strong>de</strong>itar, e assim com um pacífico<br />

ressonar se mostra um casamento em<br />

falência técnica), terno mesmo<br />

quando é severo (a bofeta<strong>da</strong> <strong>de</strong><br />

Lagarto na filha, Rita Martins), “4<br />

Copas” é um filme que parece feito<br />

para ele próprio, o filme, ficar a ver<br />

as suas personagens, ver o que elas<br />

fazem e como elas sentem, às vezes<br />

envergonhado com as suas falhas <strong>de</strong><br />

carácter (os planos com Marinho,<br />

vicia<strong>da</strong> no jogo, a rebaixar-se para<br />

conseguir algum dinheiro<br />

emprestado), outras orgulhoso <strong>da</strong>s<br />

Luís M.<br />

Oliveira<br />

Mário<br />

J. Torres<br />

Vasco<br />

Câmara<br />

4 Copas nnnnn mmmnn nnnnn mmmnn<br />

Blood: O Último Vampiro a nnnnn nnnnn nnnnn<br />

Duplo Amor mmmnn mmmmn nnnnn mmnnn<br />

G.I. Joe: O Ataque dos Cobra mnnnn nnnnn nnnnn nnnnn<br />

Inimigos Públicos mmmnn mmmmn nnnnn mmmmn<br />

Os Limites do Controlo mmmmn mmmmn mmnnn mnnnn<br />

Nunca é Tar<strong>de</strong> Demais nnnnn mnnnn nnnnn nnnnn<br />

As Praias <strong>de</strong> Agnès mmmnn mmmmn mmmmn mmmnn<br />

Sinédoque, Nova Iorque mmmnn nnnnn nnnnn mnnnn<br />

Up-Altamente mmmmn mmmnn nnnnn mmmnn<br />

Os actores certos nas personagens certas, em “4 Copas”<br />

suas virtu<strong>de</strong>s (a cabeça ergui<strong>da</strong>, o<br />

peito cheio <strong>de</strong> ar, <strong>de</strong> João Lagarto na<br />

cena a seguir ao divórcio), mas<br />

sempre <strong>de</strong>votado. A ver<strong>da</strong><strong>de</strong> é que,<br />

como ensinou um velho cineasta<br />

francês, todos têm as suas razões, e é<br />

isso que torna a escolha difícil. Ou<br />

impossível: mesmo quando as<br />

personagens estão já to<strong>da</strong>s zanga<strong>da</strong>s<br />

umas com as outras (as três cita<strong>da</strong>s<br />

mais a <strong>de</strong> Filipe Duarte), e não há um<br />

plano que possa conter duas <strong>de</strong>las ao<br />

mesmo tempo, o filme - e é talvez a<br />

sequência mais bonita - entra num<br />

vai e vem a saltar <strong>de</strong> umas para as<br />

outras, planos curtos sobre planos<br />

curtos, quase sem “avançar” coisa<br />

nenhuma, como se fosse só para<br />

conseguir estar com to<strong>da</strong>s em<br />

simultâneo (e também para se<br />

<strong>de</strong>scansar, e confirmar que elas são<br />

fortes, e se aguentaram durante o<br />

tempo em que a câmara as<br />

abandonou).<br />

Isto é uma questão <strong>de</strong> olhar, na<br />

ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira acepção <strong>da</strong> palavra, e<br />

juntamente com este tipo <strong>de</strong><br />

dramaturgia sussurra<strong>da</strong>, num tom<br />

menor (como todo o tom menor,<br />

uma questão <strong>de</strong> estilo, e <strong>de</strong> estilo<br />

clássico) que reflecte o esbatimento<br />

<strong>de</strong> uma inquietação numa resignação<br />

(re<strong>de</strong>ntora ou não), a marca distintiva<br />

do cinema <strong>de</strong> ficção <strong>de</strong> Manuel<br />

Mozos (embora fosse interessante<br />

<strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r que também se encontram<br />

estas exactas características num<br />

filme como “Ruínas”). “4 Copas”<br />

conta uma história “comum” como<br />

em “Xavier” ou no malfa<strong>da</strong>do “Um<br />

Passo, Outro Passo e Depois...”.<br />

Talvez não fosse tão “comum” a <strong>de</strong><br />

“...Quando Troveja” mesmo se “4<br />

Copas” conserva <strong>de</strong>le alguns ecos<br />

muito directos - Diana (Rita Martins),<br />

a miú<strong>da</strong> com nome <strong>de</strong> <strong>de</strong>usa <strong>da</strong> caça<br />

que para remen<strong>da</strong>r o casamento do<br />

pai se põe a seduzir o homem que lhe<br />

seduziu a mulher, é um pouco como<br />

os “duen<strong>de</strong>s” que nesse filme<br />

cui<strong>da</strong>vam <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> amorosa <strong>de</strong> Miguel<br />

Guilherme. Tornando-se a força<br />

motriz <strong>da</strong> história (espécie <strong>de</strong><br />

pequena “metteuse en scène”), é<br />

também a personagem mais<br />

enigmática - nela coexistem a<br />

candura e a perversi<strong>da</strong><strong>de</strong>, mas as<br />

doses <strong>de</strong> uma e <strong>de</strong> outra coisa são<br />

cui<strong>da</strong>dosamente camufla<strong>da</strong>s.<br />

Gostar <strong>da</strong>s personagens também<br />

implica respeitar-lhes o mistério. E,<br />

inevitavelmente, gostar dos actores.<br />

Dos secundários (a florista <strong>de</strong><br />

Cristina Alfaiate, o “espanhol” <strong>de</strong><br />

Vítor Correia) ao quarteto <strong>de</strong><br />

“copas”: a adolescente <strong>de</strong> Rita<br />

Martins é impecável, Filipe Duarte<br />

dá ao seu segurança <strong>de</strong> centro<br />

comercial o tom <strong>de</strong>vi<strong>da</strong>mente<br />

“sacudido” (ora por uma mulher ora<br />

por outra), João Lagarto empresta à<br />

sua personagem uma irrepreensível<br />

digni<strong>da</strong><strong>de</strong> apar<strong>da</strong>la<strong>da</strong>, e Margari<strong>da</strong><br />

Marinho tem os modos cansados e<br />

vagamente assustados <strong>da</strong> Eleonora<br />

Rossi Drago dos filmes <strong>de</strong> Zurlini.<br />

Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 33


Cinema<br />

Ca<strong>de</strong>n Cotard, um papel à medi<strong>da</strong><br />

do enorme Philip Seymour Hoffman<br />

Os limites<br />

do controlo<br />

A estreia <strong>da</strong> realização<br />

do argumentista <strong>de</strong> “O<br />

Despertar <strong>da</strong> Mente” e<br />

“Queres Ser John Malkovich”<br />

é um filme <strong>de</strong>sequilibrado<br />

mas perturbante sobre o<br />

terror do quotidiano.<br />

Jorge Mourinha<br />

Sinédoque, Nova Iorque<br />

Synecdoche, New York<br />

De Charlie Kaufman,<br />

com Philip Seymour Hoffman,<br />

Catherine Keener, Sadie Goldstein.<br />

M/12<br />

MMMnn<br />

<strong>Lisboa</strong>: Me<strong>de</strong>ia Monumental: Sala 1: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 14h30, 17h, 19h30, 22h, 00h30;<br />

UCI Cinemas - El Corte Inglés: Sala 12: 5ª 6ª<br />

Sábado 2ª 3ª 4ª 14h05, 16h40, 19h15, 21h50,<br />

00h25 Domingo 11h30, 14h05, 16h40, 19h15, 21h50,<br />

00h25<br />

A história do cinema está cheia <strong>de</strong><br />

argumentistas que se <strong>de</strong>cidiram a<br />

passar à realização, com resultados<br />

bastante variáveis. Charlie Kaufman,<br />

um dos mais inventivos e originais<br />

argumentistas americanos<br />

contemporâneos, não é excepção a<br />

essa regra, embora no seu caso a<br />

coisa tenha sido um pouco mais<br />

aci<strong>de</strong>ntal: “Sinédoque, Nova Iorque”<br />

começou vi<strong>da</strong> como um projecto <strong>de</strong><br />

filme <strong>de</strong> terror para a Columbia que<br />

<strong>de</strong>veria ser realizado por Spike<br />

Jonze, o realizador-alma gémea que<br />

filmara “Queres Ser John<br />

Malkovich?” e “Ina<strong>da</strong>ptado.” Mas o<br />

34 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon<br />

Espaço<br />

Público<br />

Disse, à mesa do jantar,<br />

com uma “coragem”<br />

inusita<strong>da</strong><br />

- Sabem que filme fui<br />

ver?... “Brüno”...<br />

- Ah!...<br />

- É quase como “Os<br />

Malucos do Riso”, tem<br />

pia<strong>da</strong>s bem consegui<strong>da</strong>s,<br />

outras menos bem<br />

consegui<strong>da</strong>s. Não me ri <strong>de</strong><br />

tudo...<br />

Aliás (isto não disse), no<br />

lugar do riso até tive medo<br />

porque a consciência<br />

atirava-me, <strong>de</strong> vez em<br />

que era suposto ser um filme <strong>de</strong><br />

género transformou-se durante a<br />

escrita noutra coisa, muito mais<br />

“kaufmaniana” mas também muito<br />

mais inclassificável. E Jonze, retido<br />

na produção conturba<strong>da</strong> <strong>de</strong> “O Sítio<br />

<strong>da</strong>s Coisas Selvagens”, sugeriu ao<br />

amigo que fosse ele próprio a<br />

realizar o que, sem ser um filme <strong>de</strong><br />

terror, é um filme sobre o terror -<br />

sobre o terror <strong>de</strong> morrer, sobre o<br />

terror <strong>de</strong> passar pela vi<strong>da</strong> sem <strong>de</strong>ixar<br />

marca, sobre o terror <strong>da</strong> irrelevância<br />

e do fracasso e <strong>da</strong> sensação <strong>de</strong><br />

termos <strong>de</strong>sperdiçado o nosso tempo<br />

neste mundo.<br />

É esse terror que persegue<br />

quotidianamente o encenador<br />

teatral Ca<strong>de</strong>n Cotard (papel à<br />

medi<strong>da</strong> do enorme Philip Seymour<br />

Hoffman), neurótico, inseguro,<br />

hipocondríaco, aprisionado num<br />

corpo em lenta <strong>de</strong>composição mas<br />

também num casamento que se<br />

<strong>de</strong>sintegra em lume brando, que<br />

recebe do na<strong>da</strong> uma bolsa <strong>de</strong><br />

mecenato cultural e <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> investi-la<br />

na criação <strong>da</strong> peça teatral para<br />

acabar com to<strong>da</strong>s as peças teatrais.<br />

Um simulacro que se <strong>de</strong>senrole em<br />

tempo real, tal como a vi<strong>da</strong>, num<br />

enorme armazém abandonado que<br />

se transforma numa ci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong>ntro<br />

<strong>da</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong> à medi<strong>da</strong> que a obra<br />

monumental <strong>de</strong> Ca<strong>de</strong>n vai ganhando<br />

corpo e estrutura - mas que, ao fim<br />

<strong>de</strong> 17 anos, continua em ensaios e<br />

ain<strong>da</strong> não foi mostra<strong>da</strong> ao público, e<br />

que se transforma progressivamente<br />

num espelho <strong>da</strong> própria vi<strong>da</strong><br />

amargura<strong>da</strong> do encenador que tanto<br />

quis ser alguém que se resumiu<br />

progressivamente ao anonimato.<br />

Des<strong>de</strong> a compactação <strong>de</strong> 25 anos<br />

<strong>de</strong> narrativa numa espécie <strong>de</strong> único<br />

longo dia on<strong>de</strong> Ca<strong>de</strong>n vai<br />

envelhecendo e rejuvenescendo<br />

consoante as necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong><br />

história até ao vertiginoso e<br />

infindável jogo <strong>de</strong> espelhos entre a<br />

vi<strong>da</strong> e a arte, passando pela casa que<br />

está permanentemente em fogo ou<br />

pela capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> tornar o surreal<br />

estranhamente credível, percebe-se<br />

rapi<strong>da</strong>mente que nenhum outro<br />

autor contemporâneo po<strong>de</strong>ria<br />

ter escrito “Sinédoque,<br />

Nova Iorque”. Mas ser um<br />

argumentista <strong>de</strong><br />

excepção não implica ser<br />

um gran<strong>de</strong> realizador, e<br />

o que sobra em talento<br />

<strong>de</strong> escrita a Kaufman<br />

falta-lhe em capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

visualização. Kaufman não<br />

tem o talento <strong>de</strong> Spike Jonze<br />

e Michel Gondry para construir<br />

um universo visual em imagens e<br />

limita-se a ilustrar aplica<strong>da</strong> e<br />

fielmente as palavras que<br />

escreveu, <strong>de</strong>ixando<br />

“Sinédoque, Nova Iorque”<br />

tombar numa espiral<br />

claustrofóbica que<br />

nenhum rasgo visual vem<br />

aligeirar. Esse lado <strong>de</strong><br />

“teatro filmado” não <strong>de</strong>ixa<br />

<strong>de</strong> ser a<strong>de</strong>quado a um<br />

filme que vai muito<br />

lentamente<br />

contaminando uma<br />

reali<strong>da</strong><strong>de</strong> reconhecível<br />

com uma série <strong>de</strong><br />

“non-sequiturs”<br />

tão absurdos<br />

quanto<br />

arrepiantes,<br />

mas não<br />

impe<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

sentirmos<br />

que faz<br />

aqui<br />

falta<br />

uma<br />

quando, <strong>da</strong> sala do<br />

cinema lá para fora... e os<br />

preconceitos mantêm-se.<br />

Voltando ao jantar (ou<br />

seja, à reali<strong>da</strong><strong>de</strong>), disse:<br />

- O que o filme preten<strong>de</strong> é<br />

<strong>de</strong>smontar o estereótipo<br />

do “gay” <strong>de</strong> tanto o<br />

montar/mostrar... O filme<br />

quer mostrar que nem<br />

todos os gays são assim...<br />

Mas fui interrompido pelo<br />

A.:<br />

- Mas são.<br />

Este “mas são” foi forte,<br />

foi taxativo, fez-me dizer<br />

espécie <strong>de</strong> válvula <strong>de</strong> escape - como<br />

se Kaufman tivesse, ele próprio,<br />

<strong>de</strong>ixado contagiar-se pela espiral<br />

neurótica <strong>de</strong> Ca<strong>de</strong>n e se mostrasse<br />

incapaz <strong>de</strong> lhe escapar, como se a<br />

sua necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> controlar ca<strong>da</strong><br />

um dos elementos <strong>de</strong>sta metanarrativa<br />

<strong>de</strong>sdobra<strong>da</strong> esbarrasse na<br />

sua impossibili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> o fazer<br />

constantemente. Querer ser<br />

<strong>de</strong>miurgo tem <strong>de</strong>stas coisas.<br />

Blood: O Último Vampiro<br />

Blood: The Last Vampire<br />

De Chris Nahon,<br />

com Allison Miller, Liam<br />

Cunningham, Jun Gianna. M/12<br />

a<br />

“alguns”... e voltar ao<br />

silêncio ... às vezes não me<br />

apetece armar discussões<br />

(ao contrário <strong>de</strong> Pasolini,<br />

que odiava a pacificação,<br />

ou <strong>de</strong> Brüno que também a<br />

o<strong>de</strong>ia), sobretudo quando<br />

o jantar está a correr<br />

bem...<br />

- Mas são. Mas são.<br />

A ignorância é sempre<br />

taxativa, é atrevi<strong>da</strong>. E o<br />

filme tornou-se real... O<br />

que havemos <strong>de</strong> fazer?...<br />

Nelson Ban<strong>de</strong>ira,<br />

<strong>de</strong>sempregado, Porto<br />

<strong>Lisboa</strong>: CinemaCity Alegro Alfragi<strong>de</strong>: Sala 5: 5ª 6ª<br />

2ª 3ª 4ª 13h40, 15h35, 17h45, 19h40, 21h45, 23h55<br />

Sábado Domingo 11h50, 13h40, 15h35, 17h45,<br />

19h40, 21h45, 23h55; UCI Dolce Vita Tejo: Sala 1: 5ª<br />

6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h55, 15h55, 17h55,<br />

19h55, 21h55, 00h05; ZON Lusomundo Alvaláxia:<br />

5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h40, 16h,<br />

18h30, 21h50, 24h; ZON Lusomundo Alma<strong>da</strong><br />

Fórum: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50,<br />

15h10, 17h30, 21h40, 00h05<br />

Porto: Arrábi<strong>da</strong> 20: Sala 18: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 13h45, 15h55, 18h05, 20h15, 22h25,<br />

00h35 3ª 4ª 15h55, 18h05, 20h15, 22h25, 00h35<br />

Nominalmente, “Blood: O Último<br />

Vampiro” é um “remake” <strong>de</strong> imagem<br />

real <strong>da</strong> animação <strong>de</strong> culto que<br />

Hiroyuki Kitakubo<br />

dirigiu em<br />

2000 a<br />

partir<br />

O “remake” <strong>da</strong> animação <strong>de</strong> culto<br />

<strong>de</strong> Hiroyuki Kitakubo é in<strong>de</strong>scritivelmente mau<br />

<strong>de</strong> um conceito <strong>de</strong> Mamoru “Ghost<br />

in the Shell” Oshii, sobre uma<br />

samurai teenager imortal caçadora<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>mónios por conta <strong>de</strong> uma<br />

agência super-secreta. Não foi, à<br />

altura, outro “Akira”, mas bastou<br />

para que, quase <strong>de</strong>z anos <strong>de</strong>pois, o<br />

francês Chris Nahon (“O Beijo Mortal<br />

do Dragão”) se abalance a esta<br />

a<strong>da</strong>ptação malfa<strong>da</strong><strong>da</strong> a meio<br />

caminho entre o filme <strong>de</strong> terror e a<br />

aventura <strong>de</strong> artes marciais. E<br />

malfa<strong>da</strong><strong>da</strong> porque vale tudo ? <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />

alguns bons combates <strong>de</strong> kung-fu<br />

coreografados por Cory Yuen a<br />

alguns dos piores efeitos especiais<br />

que já vimos, passando por um<br />

inspiradíssimo <strong>de</strong>sign visual (parte<br />

“Bla<strong>de</strong> Runner”-retro-”trash”, parte<br />

exotismo <strong>de</strong> pechisbeque BD), por<br />

alguns dos mais inexplicavelmente<br />

frenéticos movimentos <strong>de</strong> câmara<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> as gruas loucas <strong>de</strong> “Amália” e<br />

pela completa ausência <strong>de</strong> lógica<br />

narrativa ou mesmo <strong>de</strong> simples<br />

história. “Blood” é<br />

in<strong>de</strong>scritivelmente mau ? e não<br />

<strong>de</strong>ntro <strong>da</strong> estética tão-mau-que-ébom.<br />

J.M.<br />

Continuam<br />

Up - Altamente<br />

+ Parcialmente Nublado<br />

Up<br />

De Pete Docter,<br />

com Edward Asner (Voz),<br />

Christopher Plummer (Voz),<br />

Jor<strong>da</strong>n Nagai (Voz). M/4<br />

MMMMn<br />

<strong>Lisboa</strong>: Castello Lopes - Cascais Villa: Sala 5: 5ª<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 13h, 15h10, 17h20, 19h30,<br />

21h40 (V.Port.) 6ª Sábado 13h, 15h10, 17h20,<br />

19h30, 21h40, 23h50 (V.Port.); Castello Lopes -<br />

Londres: Sala 1: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 14h,<br />

16h30, 19h, 21h45 (V.Port.) 6ª Sábado 14h,<br />

16h30, 19h, 21h45, 24h (V.Port.); Castello<br />

Lopes - Loures Shopping: Sala 5: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h45, 14h50,<br />

17h, 19h10, 21h20, 23h30 (V.Port./3D);<br />

CinemaCity Alegro Alfragi<strong>de</strong>: Sala 2: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 11h30, 13h45,<br />

16h, 18h15, 21h30, 23h45 (V.Port.); CinemaCity<br />

Beloura Shopping: Sala 2: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 11h35, 13h55, 16h10, 18h35,<br />

21h35, 23h50 (V.Port./3D); CinemaCity Campo<br />

Pequeno Praça <strong>de</strong> Touros: Sala 3: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 11h30, 13h50, 16h15, 18h40,<br />

21h35, 23h55 (V.Port./3D); Me<strong>de</strong>ia Fonte Nova:<br />

Sala 3: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

14h10, 16h30, 19h, 21h30 (V.Port.); Me<strong>de</strong>ia<br />

Sal<strong>da</strong>nha Resi<strong>de</strong>nce: Sala 5: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 13h, 15h05, 17h10, 19h15,<br />

21h20, 23h30 (V.Port./3D); Me<strong>de</strong>ia Sal<strong>da</strong>nha<br />

Resi<strong>de</strong>nce: Sala 6: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 13h45, 15h45,<br />

17h50, 19h55, 22h, 24h; UCI<br />

Cinemas - El Corte<br />

Inglés:<br />

Sala 5: 5ª<br />

6ª Sábado 2ª<br />

3ª 4ª 14h10, 16h45,<br />

19h05, 22h, 00h15 Domingo<br />

11h30, 14h10, 16h45, 19h05, 22h,<br />

00h15; UCI Cinemas - El Corte<br />

Inglés: Sala 6: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª<br />

4ª 14h15, 16h30, 18h50, 21h15, 23h30 (V.<br />

Port./3D) Domingo 11h30, 14h15, 16h30, 18h50,<br />

21h15, 23h30 (V.Port./3D); UCI Dolce Vita Tejo:<br />

Sala 3: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 14h, 16h20,<br />

18h55, 21h35, 23h55 (V.Port.) Domingo 11h30,<br />

14h, 16h20, 18h55, 21h35, 23h55 (V.Port.); ZON<br />

Lusomundo Alvaláxia: 5ª 6ª Sábado Domingo<br />

2ª 3ª 4ª 14h10, 16h30, 18h45, 21h20, 23h40;<br />

ZON Lusomundo Alvaláxia: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª<br />

13h25, 15h45, 18h10, 21h, 23h15 (V.Port./3D)


“Up - Altamente”, um dos gran<strong>de</strong>s filmes do ano<br />

Sábado Domingo 11h, 13h25, 15h45, 18h10, 21h,<br />

23h15 (V.Port./3D); ZON Lusomundo Amoreiras: 5ª<br />

6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h, 15h30, 18h20, 21h20,<br />

23h40 (V.Port./3D) Domingo 11h, 13h, 15h30, 18h20,<br />

21h20, 23h40 (V.Port./3D); ZON Lusomundo<br />

CascaiShopping: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h20,<br />

16h, 18h30, 21h30, 23h50 (V.Port.) Domingo 11h,<br />

13h20, 16h, 18h30, 21h30, 23h50 (V.Port.); ZON<br />

Lusomundo Colombo: 5ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h05,<br />

15h30, 17h55, 21h45, 00h10 (V.Port./3D) 6ª 13h05,<br />

15h30, 00h10 (V.Port./3D) Domingo 11h, 13h05,<br />

15h30, 17h55, 21h45, 00h10 (V.Port./3D); ZON<br />

Lusomundo Colombo: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª<br />

3ª 4ª 13h15, 15h40, 18h15, 21h20, 23h45 (V.Port.);<br />

ZON Lusomundo Dolce Vita Miraflores: 5ª 6ª<br />

Sábado 2ª 3ª 4ª 15h10, 17h30, 19h40, 21h50, 24h<br />

(V.Port.) Domingo 11h, 15h10, 17h30, 19h40, 21h50,<br />

24h (V.Port.); ZON Lusomundo Odivelas Parque:<br />

5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h10, 15h20, 17h50,<br />

21h10, 23h30 (V.Port.) Domingo 11h, 13h10,<br />

15h20, 17h50, 21h10, 23h30 (V.Port.);<br />

ZON Lusomundo Oeiras Parque:<br />

5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h,<br />

15h20, 18h, 21h, 23h40<br />

(V.Port.) Domingo<br />

10h40, 13h, 15h20, 18h,<br />

21h, 23h40 (V.Port.); ZON<br />

Lusomundo Torres<br />

Vedras: 5ª 6ª Sábado<br />

2ª 3ª 4ª 13h30, 15h50,<br />

18h20, 21h15, 23h40 (V.<br />

Port./3D) Domingo 11h, 13h30,<br />

15h50, 18h20, 21h15, 23h40 (V.Port./3D);<br />

ZON Lusomundo Vasco <strong>da</strong> Gama: 5ª 6ª<br />

Sábado 2ª 3ª 4ª 13h05, 15h15, 17h30, 19h40,<br />

21h50, 23h55 (V.Port./3D) Domingo 11h, 13h05,<br />

15h15, 17h30, 19h40, 21h50, 23h55 (V.Port./3D);<br />

Auditório Charlot: Sala 1: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 21h30 (V.<br />

Port.) Sábado Domingo 16h, 21h30 (V.Port.);<br />

Castello Lopes - C. C. Jumbo: Sala 1: 5ª 2ª 3ª 4ª<br />

15h10, 17h20, 19h30, 21h40 6ª 15h10, 17h20, 19h30,<br />

21h40, 23h50 Sábado 13h, 15h10, 17h20, 19h30,<br />

21h40, 23h50 Domingo 13h, 15h10, 17h20, 19h30,<br />

21h40; Castello Lopes - Fórum Barreiro: Sala 1: 5ª<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50, 15h10, 17h10, 19h30,<br />

21h40 (V.Port./3D) 6ª Sábado 12h50, 15h10, 17h10,<br />

19h30, 21h40, 23h50 (V.Port./3D); Castello Lopes -<br />

Rio Sul Shopping: Sala 4: 5ª 6ª Sábado Domingo<br />

2ª 3ª 4ª 12h50, 15h10, 17h15, 19h20, 21h25, 23h40<br />

(V.Port./3D); UCI Freeport: Sala 1: 5ª 2ª 3ª 4ª<br />

15h45, 18h30, 21h10 (V.Port.) 6ª 15h45, 18h30, 21h10,<br />

23h30 (V.Port.) Sábado 13h30, 15h45, 18h30, 21h10,<br />

23h30 (V.Port.) Domingo 13h30, 15h45, 18h30, 21h10<br />

(V.Port.); ZON Lusomundo Alma<strong>da</strong> Fórum: 5ª 6ª<br />

Sábado 2ª 3ª 4ª 13h10, 15h35, 18h, 21h30, 23h55 (V.<br />

Port./3D) Domingo 10h50, 13h10, 15h35, 18h, 21h30,<br />

23h55 (V.Port./3D); ZON Lusomundo Alma<strong>da</strong><br />

Fórum: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h20, 16h, 18h25,<br />

21h, 23h30 (V.Port.) Domingo 11h, 13h20, 16h, 18h25,<br />

21h, 23h30 (V.Port.); ZON Lusomundo Fórum<br />

Montijo: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h35, 16h15,<br />

18h45, 21h15, 23h50 (V.Port./3D) Domingo 11h,<br />

13h35, 16h15, 18h45, 21h15, 23h50 (V.Port./3D)<br />

Porto: Arrábi<strong>da</strong> 20: Sala 1: 5ª Sábado Domingo 2ª<br />

13h35, 15h45, 17h55, 20h05, 22h15, 00h30 (V.<br />

Port./3D) 6ª 13h35, 15h45, 17h55, 20h05, 00h30 (V.<br />

Port./3D) 3ª 4ª 15h45, 17h55, 20h05, 22h15, 00h30<br />

(V.Port./3D); Arrábi<strong>da</strong> 20: Sala 12: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 14h10, 16h35, 19h, 21h30, 00h05 3ª 4ª<br />

16h35, 19h, 21h30, 00h05; Cinemax - Cinema <strong>da</strong><br />

Praça : Sala 1: 5ª 2ª 3ª 4ª 15h30, 21h45 (V.Port.)<br />

6ª 15h30, 21h45, 23h55 (V.Port.) Sábado 15h, 17h30,<br />

21h45, 23h55 (V.Port.) Domingo 15h, 17h30, 21h45<br />

(V.Port.); Cinemax - Penafiel: Sala 2: 5ª 2ª 3ª 4ª<br />

15h30, 21h50 (V.Port.) 6ª 15h30, 21h50, 23h55 (V.<br />

Port.) Sábado 15h, 17h30, 21h50, 23h55 (V.Port.)<br />

Domingo 15h, 17h30, 21h50 (V.Port.); Me<strong>de</strong>ia Ci<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

do Porto: Sala 2: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

13h40, 15h40, 17h40, 19h45, 21h50 (V.Port.); ZON<br />

Lusomundo Dolce Vita Porto: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50, 15h10, 17h45, 20h10,<br />

22h35 (V.Port.); ZON Lusomundo Dolce Vita Porto:<br />

5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h40, 16h, 18h40, 21h20,<br />

23h50 (V.Port./3D) Domingo 11h, 13h40, 16h, 18h40,<br />

21h20, 23h50 (V.Port./3D); ZON Lusomundo Ferrara<br />

Plaza: 5ª 2ª 3ª 4ª 15h, 17h15, 19h30, 21h40 (V.<br />

Port./3D) 6ª Sábado 15h, 17h15, 19h30, 21h40, 24h<br />

(V.Port./3D) Domingo 11h10, 15h, 17h15, 19h30,<br />

21h40 (V.Port./3D); ZON Lusomundo GaiaShopping:<br />

5ª 2ª 3ª 4ª 13h, 15h20, 18h, 21h30 (V.Port./3D) 6ª<br />

13h, 15h20, 18h, 21h30, 23h50 (V.Port./3D) Sábado<br />

10h50, 13h, 15h20, 18h, 21h30, 23h50 (V.Port./3D)<br />

Domingo 10h50, 13h, 15h20, 18h, 21h30 (V.Port./3D);<br />

ZON Lusomundo MaiaShopping: 5ª 2ª 3ª 4ª<br />

13h15, 16h, 18h45, 21h20 (V.Port./3D) 6ª Sábado<br />

13h15, 16h, 18h45, 21h20, 23h30 (V.Port./3D)<br />

Domingo 10h50, 13h15, 16h, 18h45, 21h20 (V.<br />

Port./3D); ZON Lusomundo Marshopping: 5ª 6ª<br />

Sábado 2ª 3ª 4ª 13h20, 15h40, 18h, 21h20, 23h50<br />

(V.Port./3D) Domingo 10h50, 13h20, 15h40, 18h,<br />

21h20, 23h50 (V.Port./3D); ZON Lusomundo<br />

NorteShopping: 5ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

12h40, 15h, 17h20, 19h40, 22h10, 00h40 (V.<br />

Port./3D) 6ª 13h30, 16h10, 19h40, 23h (V.Port./3D);<br />

ZON Lusomundo NorteShopping: 5ª 2ª 3ª 4ª<br />

13h40, 16h10, 18h40, 21h10, 23h50 (V.Port.) 6ª<br />

12h50, 15h20, 18h, 21h10, 23h50 (V.Port.) Sábado<br />

Domingo 11h, 13h40, 16h10, 18h40, 21h10, 23h50<br />

(V.Port.); ZON Lusomundo Parque Nascente: 5ª 6ª<br />

Sábado 2ª 3ª 4ª 13h10, 15h40, 18h10, 20h40,<br />

23h10 (V.Port.) Domingo 10h50, 13h10, 15h40,<br />

18h10, 20h40, 23h10 (V.Port.); ZON Lusomundo<br />

Parque Nascente: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 13h35, 16h10,<br />

18h50, 21h35, 00h10 (V.Port.) Sábado Domingo 11h,<br />

13h35, 16h10, 18h50, 21h35, 00h10 (V.Port.); Castello<br />

Lopes - 8ª Aveni<strong>da</strong>: Sala 2: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 15h10,<br />

17h20, 19h30, 21h40, 23h50 (V.Port./3D) Sábado<br />

Domingo 13h, 15h10, 17h20, 19h30, 21h40, 23h50<br />

(V.Port./3D); ZON Lusomundo Fórum Aveiro: 5ª 6ª<br />

Sábado 2ª 3ª 4ª 13h20, 16h05, 18h50, 21h35,<br />

00h25 (V.Port.) Domingo 10h40, 13h20, 16h05,<br />

18h50, 21h35, 00h25 (V.Port.); ZON Lusomundo<br />

Glicínias: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h40, 16h25,<br />

19h10, 21h55, 00h40 (V.Port./3D) Domingo 10h50,<br />

13h40, 16h25, 19h10, 21h55, 00h40 (V.Port./3D);<br />

Comecemos por eliminar a variável<br />

3-D, porque reduzir a décima longa<br />

<strong>da</strong> Pixar ao “truque” visual é passar<br />

ao lado <strong>da</strong> essência <strong>da</strong> produção do<br />

estúdio <strong>de</strong> John Lasseter: a sua<br />

atenção quase maníaca à narrativa<br />

e à emoção. É isso que explica<br />

porque é que “Altamente” confirma<br />

o “<strong>de</strong>svio” encetado em 2006 por<br />

“Carros”, em direcção a um<br />

horizonte on<strong>de</strong> estamos a falar <strong>de</strong><br />

cinema, em abstracto e absoluto, e<br />

não <strong>de</strong> animação: o “herói” <strong>de</strong><br />

“Altamente” é um viúvo rezingão e<br />

misantropo que se vê empurrado<br />

pelo <strong>de</strong>stino a entrar na aventura <strong>da</strong><br />

sua vi<strong>da</strong>. Só que, para lá chegar,<br />

Pete Docter (parte do quadro<br />

fun<strong>da</strong>dor do estúdio e realizador <strong>de</strong><br />

“Monstros & Cª”) segue um dos<br />

caminhos mais enviesados que<br />

vimos nos últimos anos, arrancando<br />

como melodrama clássico sobre um<br />

homem que já na<strong>da</strong> espera <strong>da</strong> vi<strong>da</strong><br />

para alternar em segui<strong>da</strong> uma<br />

aventura exótica saí<strong>da</strong> dos “serials”<br />

e <strong>da</strong>s séries B dos anos 30 com um<br />

lado <strong>de</strong> humor absurdo e alienígena<br />

muito próximo <strong>da</strong> estética dos<br />

Looney Tunes. As amplitu<strong>de</strong>s<br />

térmicas são <strong>de</strong>masiado<br />

abrangentes para conseguirem ser<br />

negocia<strong>da</strong>s sem o tropeção<br />

ocasional, mas não impe<strong>de</strong>m que<br />

“Altamente” seja um dos gran<strong>de</strong>s<br />

filmes do ano. J.M.<br />

aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />

Inimigos Públicos<br />

Public Enemies<br />

De Michael Mann,<br />

com Johnny Depp, Billy Crudup,<br />

Marion Cotillard, Christian Bale.<br />

M/16<br />

MMMnn<br />

<strong>Lisboa</strong>: Castello Lopes - Cascais Villa: Sala 3: 5ª<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50, 15h45, 18h40, 21h30 6ª<br />

Sábado 12h50, 15h45, 18h40, 21h30, 00h20; Castello<br />

Lopes - Londres: Sala 2: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

13h15, 16h, 18h45, 21h30 6ª Sábado 13h15, 16h,<br />

18h45, 21h30, 00h15; Castello Lopes - Loures<br />

Shopping: Sala 2: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª<br />

4ª 12h40, 15h20, 18h40, 21h30, 00h10; CinemaCity<br />

Alegro Alfragi<strong>de</strong>: Sala 3: 5ª 6ª Sábado Domingo<br />

2ª 3ª 4ª 18h45, 21h35, 00h25; CinemaCity Beloura<br />

Shopping: Sala 4: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª<br />

4ª 13h30, 16h35, 21h30, 00h20; CinemaCity<br />

Campo Pequeno Praça <strong>de</strong> Touros: Sala 2: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h40, 16h30, 21h30,<br />

00h20; CinemaCity Classic Alvala<strong>de</strong>: Sala 4: 5ª<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 13h45, 16h35, 21h30 6ª Sábado<br />

13h45, 16h35, 21h30, 00h20; Me<strong>de</strong>ia Fonte<br />

Nova: Sala 1: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª<br />

3ª 4ª 14h30, 18h15, 22h; Me<strong>de</strong>ia<br />

Monumental: Sala 4 - Cine Teatro: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 13h50, 16h30, 19h10, 21h50,<br />

00h20; UCI Cinemas - El Corte Inglés: Sala 13: 5ª 6ª<br />

Sábado 2ª 3ª 4ª 15h, 18h10, 21h30, 00h20<br />

Domingo 11h30, 15h, 18h10, 21h30, 00h20; UCI<br />

Dolce Vita Tejo: Sala 10: 5ª 6ª Sábado Domingo<br />

2ª 3ª 4ª 14h55, 18h, 21h35, 00h25; ZON<br />

Lusomundo Alvaláxia: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª<br />

3ª 4ª 13h35, 16h40, 21h15, 00h15; ZON<br />

Lusomundo Amoreiras: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 13h50, 17h, 21h,<br />

24h; ZON Lusomundo<br />

CascaiShopping: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 13h40, 17h, 21h,<br />

24h; ZON Lusomundo Colombo: 5ª<br />

6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

13h30, 16h50, 21h10, 00h20; ZON<br />

Lusomundo Odivelas Parque: 5ª<br />

6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

13h, 16h30, 21h, 24h; ZON<br />

Lusomundo Oeiras Parque:<br />

5ª 6ª Sábado Domingo 2ª<br />

3ª 4ª 12h35, 15h30, 18h25,<br />

21h20, 00h15; ZON<br />

Lusomundo Torres<br />

Vedras: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo<br />

2ª 3ª 4ª 13h50,<br />

17h40, 21h, 00h05; ZON Lusomundo Vasco <strong>da</strong><br />

Gama: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h15,<br />

16h15, 21h10, 00h05; Castello Lopes - Rio Sul<br />

Shopping: Sala 3: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª<br />

4ª 12h45, 15h40, 18h35, 21h20, 00h15; UCI Freeport:<br />

Sala 3: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 15h15, 18h10, 21h15 6ª<br />

Sábado 15h15, 18h10, 21h15, 00h10; ZON Lusomundo<br />

Alma<strong>da</strong> Fórum: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

15h, 18h05, 21h10, 00h20; ZON Lusomundo Fórum<br />

Montijo: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h20,<br />

17h, 21h10, 00h05<br />

Porto: Me<strong>de</strong>ia Ci<strong>da</strong><strong>de</strong> do Porto: Sala 1: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h45, 16h40, 19h20,<br />

22h; ZON Lusomundo Dolce Vita Porto: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h10, 16h20, 21h10,<br />

00h15; ZON Lusomundo GaiaShopping: 5ª<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 14h30, 18h10, 21h10 6ª Sábado<br />

14h30, 18h10, 21h10, 00h25; ZON Lusomundo<br />

MaiaShopping: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 13h50,<br />

17h10, 21h10 6ª Sábado 13h50, 17h10, 21h10, 00h30;<br />

ZON Lusomundo Marshopping: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 14h10, 17h40, 21h10, 00h20;<br />

ZON Lusomundo NorteShopping: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 14h30, 17h50, 21h20, 00h30;<br />

ZON Lusomundo Parque Nascente: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 13h50, 17h10, 21h10, 00h20;<br />

Castello Lopes - 8ª Aveni<strong>da</strong>: Sala 3: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª<br />

15h30, 18h20, 21h10, 24h Sábado Domingo 12h40,<br />

15h30, 18h20, 21h10, 24h; ZON Lusomundo Fórum<br />

Aveiro: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 14h30, 17h50, 21h05<br />

6ª Sábado 14h30, 17h50, 21h05, 00h35; ZON<br />

Lusomundo Glicínias: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª<br />

3ª 4ª 14h30, 17h50, 21h10, 00h25<br />

Michael Mann, mestre do noir<br />

contemporâneo, poeta do<br />

existencialismo <strong>de</strong> género como só<br />

Melville soube ser no seu tempo,<br />

reinci<strong>de</strong> nos seus épicos miniaturais<br />

<strong>de</strong> polícias e ladrões com este olhar<br />

realista sobre a Chicago dos anos<br />

1930, período áureo do cinema <strong>de</strong><br />

“gangsters”, e sobre o breve reinado<br />

<strong>de</strong> John Dillinger. aqui retratado por<br />

um Johnny Depp que raramente<br />

teremos visto tão sóbrio. “Inimigos<br />

Públicos” é um filme<br />

inteligentíssimo (nem outra coisa<br />

seria <strong>de</strong> esperar), que propõe uma<br />

leitura intrigante do criminoso como<br />

anti-herói e explica que a obsessão<br />

mediática com a celebri<strong>da</strong><strong>de</strong>, afinal,<br />

já vem <strong>de</strong> trás. O mais notável,<br />

contudo, é mesmo o modo como<br />

“Inimigos Públicos” é uma espécie<br />

<strong>de</strong> “meta- narrativa” que faz<br />

um filme <strong>de</strong> acção<br />

sobre uma vi<strong>da</strong><br />

real que se<br />

imaginava<br />

como uma<br />

vi<strong>da</strong><br />

<strong>de</strong><br />

cinema.<br />

J.M.<br />

Raramente teremos visto Johnny Depp<br />

tão sóbrio como em “Inimigos Públicos”<br />

Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 35


“Up - Altamente”, um dos gran<strong>de</strong>s filmes do ano<br />

Sábado Domingo 11h, 13h25, 15h45, 18h10, 21h,<br />

23h15 (V.Port./3D); ZON Lusomundo Amoreiras: 5ª<br />

6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h, 15h30, 18h20, 21h20,<br />

23h40 (V.Port./3D) Domingo 11h, 13h, 15h30, 18h20,<br />

21h20, 23h40 (V.Port./3D); ZON Lusomundo<br />

CascaiShopping: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h20,<br />

16h, 18h30, 21h30, 23h50 (V.Port.) Domingo 11h,<br />

13h20, 16h, 18h30, 21h30, 23h50 (V.Port.); ZON<br />

Lusomundo Colombo: 5ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h05,<br />

15h30, 17h55, 21h45, 00h10 (V.Port./3D) 6ª 13h05,<br />

15h30, 00h10 (V.Port./3D) Domingo 11h, 13h05,<br />

15h30, 17h55, 21h45, 00h10 (V.Port./3D); ZON<br />

Lusomundo Colombo: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª<br />

3ª 4ª 13h15, 15h40, 18h15, 21h20, 23h45 (V.Port.);<br />

ZON Lusomundo Dolce Vita Miraflores: 5ª 6ª<br />

Sábado 2ª 3ª 4ª 15h10, 17h30, 19h40, 21h50, 24h<br />

(V.Port.) Domingo 11h, 15h10, 17h30, 19h40, 21h50,<br />

24h (V.Port.); ZON Lusomundo Odivelas Parque:<br />

5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h10, 15h20, 17h50,<br />

21h10, 23h30 (V.Port.) Domingo 11h, 13h10,<br />

15h20, 17h50, 21h10, 23h30 (V.Port.);<br />

ZON Lusomundo Oeiras Parque:<br />

5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h,<br />

15h20, 18h, 21h, 23h40<br />

(V.Port.) Domingo<br />

10h40, 13h, 15h20, 18h,<br />

21h, 23h40 (V.Port.); ZON<br />

Lusomundo Torres<br />

Vedras: 5ª 6ª Sábado<br />

2ª 3ª 4ª 13h30, 15h50,<br />

18h20, 21h15, 23h40 (V.<br />

Port./3D) Domingo 11h, 13h30,<br />

15h50, 18h20, 21h15, 23h40 (V.Port./3D);<br />

ZON Lusomundo Vasco <strong>da</strong> Gama: 5ª 6ª<br />

Sábado 2ª 3ª 4ª 13h05, 15h15, 17h30, 19h40,<br />

21h50, 23h55 (V.Port./3D) Domingo 11h, 13h05,<br />

15h15, 17h30, 19h40, 21h50, 23h55 (V.Port./3D);<br />

Auditório Charlot: Sala 1: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 21h30 (V.<br />

Port.) Sábado Domingo 16h, 21h30 (V.Port.);<br />

Castello Lopes - C. C. Jumbo: Sala 1: 5ª 2ª 3ª 4ª<br />

15h10, 17h20, 19h30, 21h40 6ª 15h10, 17h20, 19h30,<br />

21h40, 23h50 Sábado 13h, 15h10, 17h20, 19h30,<br />

21h40, 23h50 Domingo 13h, 15h10, 17h20, 19h30,<br />

21h40; Castello Lopes - Fórum Barreiro: Sala 1: 5ª<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50, 15h10, 17h10, 19h30,<br />

21h40 (V.Port./3D) 6ª Sábado 12h50, 15h10, 17h10,<br />

19h30, 21h40, 23h50 (V.Port./3D); Castello Lopes -<br />

Rio Sul Shopping: Sala 4: 5ª 6ª Sábado Domingo<br />

2ª 3ª 4ª 12h50, 15h10, 17h15, 19h20, 21h25, 23h40<br />

(V.Port./3D); UCI Freeport: Sala 1: 5ª 2ª 3ª 4ª<br />

15h45, 18h30, 21h10 (V.Port.) 6ª 15h45, 18h30, 21h10,<br />

23h30 (V.Port.) Sábado 13h30, 15h45, 18h30, 21h10,<br />

23h30 (V.Port.) Domingo 13h30, 15h45, 18h30, 21h10<br />

(V.Port.); ZON Lusomundo Alma<strong>da</strong> Fórum: 5ª 6ª<br />

Sábado 2ª 3ª 4ª 13h10, 15h35, 18h, 21h30, 23h55 (V.<br />

Port./3D) Domingo 10h50, 13h10, 15h35, 18h, 21h30,<br />

23h55 (V.Port./3D); ZON Lusomundo Alma<strong>da</strong><br />

Fórum: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h20, 16h, 18h25,<br />

21h, 23h30 (V.Port.) Domingo 11h, 13h20, 16h, 18h25,<br />

21h, 23h30 (V.Port.); ZON Lusomundo Fórum<br />

Montijo: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h35, 16h15,<br />

18h45, 21h15, 23h50 (V.Port./3D) Domingo 11h,<br />

13h35, 16h15, 18h45, 21h15, 23h50 (V.Port./3D)<br />

Porto: Arrábi<strong>da</strong> 20: Sala 1: 5ª Sábado Domingo 2ª<br />

13h35, 15h45, 17h55, 20h05, 22h15, 00h30 (V.<br />

Port./3D) 6ª 13h35, 15h45, 17h55, 20h05, 00h30 (V.<br />

Port./3D) 3ª 4ª 15h45, 17h55, 20h05, 22h15, 00h30<br />

(V.Port./3D); Arrábi<strong>da</strong> 20: Sala 12: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 14h10, 16h35, 19h, 21h30, 00h05 3ª 4ª<br />

16h35, 19h, 21h30, 00h05; Cinemax - Cinema <strong>da</strong><br />

Praça : Sala 1: 5ª 2ª 3ª 4ª 15h30, 21h45 (V.Port.)<br />

6ª 15h30, 21h45, 23h55 (V.Port.) Sábado 15h, 17h30,<br />

21h45, 23h55 (V.Port.) Domingo 15h, 17h30, 21h45<br />

(V.Port.); Cinemax - Penafiel: Sala 2: 5ª 2ª 3ª 4ª<br />

15h30, 21h50 (V.Port.) 6ª 15h30, 21h50, 23h55 (V.<br />

Port.) Sábado 15h, 17h30, 21h50, 23h55 (V.Port.)<br />

Domingo 15h, 17h30, 21h50 (V.Port.); Me<strong>de</strong>ia Ci<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

do Porto: Sala 2: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

13h40, 15h40, 17h40, 19h45, 21h50 (V.Port.); ZON<br />

Lusomundo Dolce Vita Porto: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50, 15h10, 17h45, 20h10,<br />

22h35 (V.Port.); ZON Lusomundo Dolce Vita Porto:<br />

5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h40, 16h, 18h40, 21h20,<br />

23h50 (V.Port./3D) Domingo 11h, 13h40, 16h, 18h40,<br />

21h20, 23h50 (V.Port./3D); ZON Lusomundo Ferrara<br />

Plaza: 5ª 2ª 3ª 4ª 15h, 17h15, 19h30, 21h40 (V.<br />

Port./3D) 6ª Sábado 15h, 17h15, 19h30, 21h40, 24h<br />

(V.Port./3D) Domingo 11h10, 15h, 17h15, 19h30,<br />

21h40 (V.Port./3D); ZON Lusomundo GaiaShopping:<br />

5ª 2ª 3ª 4ª 13h, 15h20, 18h, 21h30 (V.Port./3D) 6ª<br />

13h, 15h20, 18h, 21h30, 23h50 (V.Port./3D) Sábado<br />

10h50, 13h, 15h20, 18h, 21h30, 23h50 (V.Port./3D)<br />

Domingo 10h50, 13h, 15h20, 18h, 21h30 (V.Port./3D);<br />

ZON Lusomundo MaiaShopping: 5ª 2ª 3ª 4ª<br />

13h15, 16h, 18h45, 21h20 (V.Port./3D) 6ª Sábado<br />

13h15, 16h, 18h45, 21h20, 23h30 (V.Port./3D)<br />

Domingo 10h50, 13h15, 16h, 18h45, 21h20 (V.<br />

Port./3D); ZON Lusomundo Marshopping: 5ª 6ª<br />

Sábado 2ª 3ª 4ª 13h20, 15h40, 18h, 21h20, 23h50<br />

(V.Port./3D) Domingo 10h50, 13h20, 15h40, 18h,<br />

21h20, 23h50 (V.Port./3D); ZON Lusomundo<br />

NorteShopping: 5ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

12h40, 15h, 17h20, 19h40, 22h10, 00h40 (V.<br />

Port./3D) 6ª 13h30, 16h10, 19h40, 23h (V.Port./3D);<br />

ZON Lusomundo NorteShopping: 5ª 2ª 3ª 4ª<br />

13h40, 16h10, 18h40, 21h10, 23h50 (V.Port.) 6ª<br />

12h50, 15h20, 18h, 21h10, 23h50 (V.Port.) Sábado<br />

Domingo 11h, 13h40, 16h10, 18h40, 21h10, 23h50<br />

(V.Port.); ZON Lusomundo Parque Nascente: 5ª 6ª<br />

Sábado 2ª 3ª 4ª 13h10, 15h40, 18h10, 20h40,<br />

23h10 (V.Port.) Domingo 10h50, 13h10, 15h40,<br />

18h10, 20h40, 23h10 (V.Port.); ZON Lusomundo<br />

Parque Nascente: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 13h35, 16h10,<br />

18h50, 21h35, 00h10 (V.Port.) Sábado Domingo 11h,<br />

13h35, 16h10, 18h50, 21h35, 00h10 (V.Port.); Castello<br />

Lopes - 8ª Aveni<strong>da</strong>: Sala 2: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 15h10,<br />

17h20, 19h30, 21h40, 23h50 (V.Port./3D) Sábado<br />

Domingo 13h, 15h10, 17h20, 19h30, 21h40, 23h50<br />

(V.Port./3D); ZON Lusomundo Fórum Aveiro: 5ª 6ª<br />

Sábado 2ª 3ª 4ª 13h20, 16h05, 18h50, 21h35,<br />

00h25 (V.Port.) Domingo 10h40, 13h20, 16h05,<br />

18h50, 21h35, 00h25 (V.Port.); ZON Lusomundo<br />

Glicínias: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h40, 16h25,<br />

19h10, 21h55, 00h40 (V.Port./3D) Domingo 10h50,<br />

13h40, 16h25, 19h10, 21h55, 00h40 (V.Port./3D);<br />

Comecemos por eliminar a variável<br />

3-D, porque reduzir a décima longa<br />

<strong>da</strong> Pixar ao “truque” visual é passar<br />

ao lado <strong>da</strong> essência <strong>da</strong> produção do<br />

estúdio <strong>de</strong> John Lasseter: a sua<br />

atenção quase maníaca à narrativa<br />

e à emoção. É isso que explica<br />

porque é que “Altamente” confirma<br />

o “<strong>de</strong>svio” encetado em 2006 por<br />

“Carros”, em direcção a um<br />

horizonte on<strong>de</strong> estamos a falar <strong>de</strong><br />

cinema, em abstracto e absoluto, e<br />

não <strong>de</strong> animação: o “herói” <strong>de</strong><br />

“Altamente” é um viúvo rezingão e<br />

misantropo que se vê empurrado<br />

pelo <strong>de</strong>stino a entrar na aventura <strong>da</strong><br />

sua vi<strong>da</strong>. Só que, para lá chegar,<br />

Pete Docter (parte do quadro<br />

fun<strong>da</strong>dor do estúdio e realizador <strong>de</strong><br />

“Monstros & Cª”) segue um dos<br />

caminhos mais enviesados que<br />

vimos nos últimos anos, arrancando<br />

como melodrama clássico sobre um<br />

homem que já na<strong>da</strong> espera <strong>da</strong> vi<strong>da</strong><br />

para alternar em segui<strong>da</strong> uma<br />

aventura exótica saí<strong>da</strong> dos “serials”<br />

e <strong>da</strong>s séries B dos anos 30 com um<br />

lado <strong>de</strong> humor absurdo e alienígena<br />

muito próximo <strong>da</strong> estética dos<br />

Looney Tunes. As amplitu<strong>de</strong>s<br />

térmicas são <strong>de</strong>masiado<br />

abrangentes para conseguirem ser<br />

negocia<strong>da</strong>s sem o tropeção<br />

ocasional, mas não impe<strong>de</strong>m que<br />

“Altamente” seja um dos gran<strong>de</strong>s<br />

filmes do ano. J.M.<br />

aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />

Inimigos Públicos<br />

Public Enemies<br />

De Michael Mann,<br />

com Johnny Depp, Billy Crudup,<br />

Marion Cotillard, Christian Bale.<br />

M/16<br />

MMMnn<br />

<strong>Lisboa</strong>: Castello Lopes - Cascais Villa: Sala 3: 5ª<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50, 15h45, 18h40, 21h30 6ª<br />

Sábado 12h50, 15h45, 18h40, 21h30, 00h20; Castello<br />

Lopes - Londres: Sala 2: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

13h15, 16h, 18h45, 21h30 6ª Sábado 13h15, 16h,<br />

18h45, 21h30, 00h15; Castello Lopes - Loures<br />

Shopping: Sala 2: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª<br />

4ª 12h40, 15h20, 18h40, 21h30, 00h10; CinemaCity<br />

Alegro Alfragi<strong>de</strong>: Sala 3: 5ª 6ª Sábado Domingo<br />

2ª 3ª 4ª 18h45, 21h35, 00h25; CinemaCity Beloura<br />

Shopping: Sala 4: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª<br />

4ª 13h30, 16h35, 21h30, 00h20; CinemaCity<br />

Campo Pequeno Praça <strong>de</strong> Touros: Sala 2: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h40, 16h30, 21h30,<br />

00h20; CinemaCity Classic Alvala<strong>de</strong>: Sala 4: 5ª<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 13h45, 16h35, 21h30 6ª Sábado<br />

13h45, 16h35, 21h30, 00h20; Me<strong>de</strong>ia Fonte<br />

Nova: Sala 1: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª<br />

3ª 4ª 14h30, 18h15, 22h; Me<strong>de</strong>ia<br />

Monumental: Sala 4 - Cine Teatro: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 13h50, 16h30, 19h10, 21h50,<br />

00h20; UCI Cinemas - El Corte Inglés: Sala 13: 5ª 6ª<br />

Sábado 2ª 3ª 4ª 15h, 18h10, 21h30, 00h20<br />

Domingo 11h30, 15h, 18h10, 21h30, 00h20; UCI<br />

Dolce Vita Tejo: Sala 10: 5ª 6ª Sábado Domingo<br />

2ª 3ª 4ª 14h55, 18h, 21h35, 00h25; ZON<br />

Lusomundo Alvaláxia: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª<br />

3ª 4ª 13h35, 16h40, 21h15, 00h15; ZON<br />

Lusomundo Amoreiras: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 13h50, 17h, 21h,<br />

24h; ZON Lusomundo<br />

CascaiShopping: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 13h40, 17h, 21h,<br />

24h; ZON Lusomundo Colombo: 5ª<br />

6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

13h30, 16h50, 21h10, 00h20; ZON<br />

Lusomundo Odivelas Parque: 5ª<br />

6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

13h, 16h30, 21h, 24h; ZON<br />

Lusomundo Oeiras Parque:<br />

5ª 6ª Sábado Domingo 2ª<br />

3ª 4ª 12h35, 15h30, 18h25,<br />

21h20, 00h15; ZON<br />

Lusomundo Torres<br />

Vedras: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo<br />

2ª 3ª 4ª 13h50,<br />

17h40, 21h, 00h05; ZON Lusomundo Vasco <strong>da</strong><br />

Gama: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h15,<br />

16h15, 21h10, 00h05; Castello Lopes - Rio Sul<br />

Shopping: Sala 3: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª<br />

4ª 12h45, 15h40, 18h35, 21h20, 00h15; UCI Freeport:<br />

Sala 3: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 15h15, 18h10, 21h15 6ª<br />

Sábado 15h15, 18h10, 21h15, 00h10; ZON Lusomundo<br />

Alma<strong>da</strong> Fórum: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

15h, 18h05, 21h10, 00h20; ZON Lusomundo Fórum<br />

Montijo: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h20,<br />

17h, 21h10, 00h05<br />

Porto: Me<strong>de</strong>ia Ci<strong>da</strong><strong>de</strong> do Porto: Sala 1: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h45, 16h40, 19h20,<br />

22h; ZON Lusomundo Dolce Vita Porto: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h10, 16h20, 21h10,<br />

00h15; ZON Lusomundo GaiaShopping: 5ª<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 14h30, 18h10, 21h10 6ª Sábado<br />

14h30, 18h10, 21h10, 00h25; ZON Lusomundo<br />

MaiaShopping: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 13h50,<br />

17h10, 21h10 6ª Sábado 13h50, 17h10, 21h10, 00h30;<br />

ZON Lusomundo Marshopping: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 14h10, 17h40, 21h10, 00h20;<br />

ZON Lusomundo NorteShopping: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 14h30, 17h50, 21h20, 00h30;<br />

ZON Lusomundo Parque Nascente: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 13h50, 17h10, 21h10, 00h20;<br />

Castello Lopes - 8ª Aveni<strong>da</strong>: Sala 3: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª<br />

15h30, 18h20, 21h10, 24h Sábado Domingo 12h40,<br />

15h30, 18h20, 21h10, 24h; ZON Lusomundo Fórum<br />

Aveiro: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 14h30, 17h50, 21h05<br />

6ª Sábado 14h30, 17h50, 21h05, 00h35; ZON<br />

Lusomundo Glicínias: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª<br />

3ª 4ª 14h30, 17h50, 21h10, 00h25<br />

Michael Mann, mestre do noir<br />

contemporâneo, poeta do<br />

existencialismo <strong>de</strong> género como só<br />

Melville soube ser no seu tempo,<br />

reinci<strong>de</strong> nos seus épicos miniaturais<br />

<strong>de</strong> polícias e ladrões com este olhar<br />

realista sobre a Chicago dos anos<br />

1930, período áureo do cinema <strong>de</strong><br />

“gangsters”, e sobre o breve reinado<br />

<strong>de</strong> John Dillinger. aqui retratado por<br />

um Johnny Depp que raramente<br />

teremos visto tão sóbrio. “Inimigos<br />

Públicos” é um filme<br />

inteligentíssimo (nem outra coisa<br />

seria <strong>de</strong> esperar), que propõe uma<br />

leitura intrigante do criminoso como<br />

anti-herói e explica que a obsessão<br />

mediática com a celebri<strong>da</strong><strong>de</strong>, afinal,<br />

já vem <strong>de</strong> trás. O mais notável,<br />

contudo, é mesmo o modo como<br />

“Inimigos Públicos” é uma espécie<br />

<strong>de</strong> “meta- narrativa” que faz<br />

um filme <strong>de</strong> acção<br />

sobre uma vi<strong>da</strong><br />

real que se<br />

imaginava<br />

como uma<br />

vi<strong>da</strong><br />

<strong>de</strong><br />

cinema.<br />

J.M.<br />

Raramente teremos visto Johnny Depp<br />

tão sóbrio como em “Inimigos Públicos”<br />

Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 35


DVD<br />

Espaço<br />

Público<br />

Cinema<br />

O filme<br />

é melhor<br />

que a música<br />

A ban<strong>da</strong> sonora dos British<br />

Sea Power parece querer<br />

impor-se às imagens<br />

admiráveis do documentário<br />

<strong>de</strong> Robert Flaherty, e isso<br />

acaba por enfraquecê-la.<br />

Mário Lopes<br />

Man Of Aran<br />

De Robert Flaherty<br />

BSO British Sea Power<br />

Rough Tra<strong>de</strong>; distri. Popstock<br />

mmmnn<br />

Este espaço vai ser<br />

seu. Que filme, peça <strong>de</strong><br />

teatro, livro, exposição,<br />

disco, álbum, canção,<br />

concerto, DVD viu e<br />

gostou tanto que lhe<br />

apeteceu escrever<br />

“O Homem <strong>de</strong><br />

Aran”, <strong>de</strong> Robert<br />

Flaherty, pai do<br />

documentário<br />

cinematográfico,<br />

é um filme<br />

imponente. O<br />

tema é o <strong>de</strong> sempre: a nobre<br />

sobrevivência do homem isolado<br />

perante a natureza, luta constante<br />

com tanto <strong>de</strong> inevitável quanto <strong>de</strong><br />

arduamente heróico. Filmado nas<br />

inóspitas ilhas <strong>de</strong> Aran, na zona mais<br />

oci<strong>de</strong>ntal <strong>da</strong> costa irlan<strong>de</strong>sa, foca o<br />

olhar numa família (o Homem <strong>de</strong><br />

Aran, a sua mulher, Maggie, e o filho<br />

Michael), para contar o mesmo que<br />

“Nanook”, o primeiro e mais<br />

emblemático filme <strong>de</strong> Flaherty.<br />

Em Aran, o gelo é substituído por<br />

um mar inclemente e incontrolável –<br />

são admiráveis as on<strong>da</strong>s gigantescas<br />

sobre ele, concor<strong>da</strong>ndo<br />

ou não concor<strong>da</strong>ndo<br />

com o que escrevemos?<br />

Envie-nos uma nota até<br />

500 caracteres para<br />

ipsilon@publico.pt. E<br />

nós <strong>de</strong>pois publicamos.<br />

fustigando a costa -, a caça pela<br />

pesca, em barcos minúsculos, <strong>de</strong><br />

tubarões gigantescos, e as roupas <strong>de</strong><br />

peles e os iglus dos esquimós pelas<br />

longas e pretas saias católicas <strong>de</strong><br />

Maggie e pelas boinas e camisas <strong>de</strong><br />

pescador dos homens. Filme <strong>de</strong> um<br />

romântico dramatismo – como<br />

habitual em Robert Flaherty, é,<br />

precisamente, um documentário<br />

dramatizado -, encena a nobreza<br />

<strong>de</strong>sencanta<strong>da</strong> <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> em Aran com<br />

momentos <strong>de</strong> extraordinária beleza<br />

(o pequeno Michael caminhando<br />

campo fora e o céu surgindo vivo<br />

como em pintura <strong>de</strong> William<br />

Turner), com sequências <strong>de</strong> uma<br />

épica intensi<strong>da</strong><strong>de</strong>, como a longa<br />

caça<strong>da</strong> ao tubarão fra<strong>de</strong>. Tudo isso<br />

está lá, nas imagens. E tudo isso,<br />

naturalmente, po<strong>de</strong> ser potenciado<br />

com a ban<strong>da</strong> sonora a<strong>de</strong>qua<strong>da</strong>. Foi<br />

isso que tentaram os British Sea<br />

Power, ban<strong>da</strong> britânica filia<strong>da</strong> no<br />

negrume pós-punk, autora <strong>de</strong> álbuns<br />

como “Open Season”, repletos <strong>de</strong><br />

referências literatas e boas i<strong>de</strong>ias a<br />

um passo <strong>de</strong> se transformarem em<br />

algo realmente interessante. Na<br />

ban<strong>da</strong> sonora elabora<strong>da</strong> para “O<br />

Homem <strong>de</strong> Aran”, agora edita<strong>da</strong> em<br />

CD e DVD, assim se mantiveram.<br />

A<strong>da</strong>ptando temas do cancioneiro<br />

folk irlandês e criando instrumentais,<br />

ora tétricos <strong>de</strong> guitarras uivando, ora<br />

drones insistentes, ora ca<strong>de</strong>nciados<br />

em rock a meio caminho entre os<br />

Velvet Un<strong>de</strong>rground e as explosões<br />

sónicas do pós-rock, os British Sea<br />

Power incorrem num erro que se<br />

revela fatal para a longevi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong>sta<br />

união à obra <strong>de</strong> Flaherty. Muitas<br />

vezes, a música parece querer imporse<br />

às imagens, mais do que<br />

complementá-las, e isso acaba por<br />

enfraquecê-la – digamos que,<br />

basicamente, o filme é melhor que a<br />

música e <strong>de</strong>veria falar mais alto. A<br />

cadência mecânica e eléctrica <strong>da</strong><br />

aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />

Os instrumentais dos British Sea Power<br />

não chegam a transformar-se em algo realmente interessante<br />

música, ruidosamente mo<strong>de</strong>rna,<br />

contraposta à i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> ancestrali<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

que atravessa o filme, até resulta em<br />

exercício interessante. No final,<br />

contudo, concor<strong>da</strong>mos que “O<br />

Homem <strong>de</strong> Aran” é um filme<br />

magnífico e que a ban<strong>da</strong> sonora que<br />

os British Sea Power lhe fizeram, caso<br />

houvesse voz nestas canções, po<strong>de</strong>ria<br />

ser o seu melhor álbum (mas seria,<br />

ain<strong>da</strong> assim, pior que o filme).<br />

O factor<br />

humano<br />

Emmanuelle Cuau equilibra<br />

a leveza do seu nonsense<br />

kafkiano com a serie<strong>da</strong><strong>de</strong> do<br />

olhar sobre uma socie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

menos atenta às pessoas,<br />

mas trai a loucura do<br />

argumento com um final<br />

certinho. Jorge Mourinha<br />

Muito Bem, Obrigado<br />

Très bien, merci<br />

De Emmanuelle Cuau<br />

Edição Atalanta Filmes<br />

mmnnn<br />

Sem extras<br />

Passou pelas salas<br />

portuguesas há<br />

dois anos sem<br />

gran<strong>de</strong><br />

repercussão,<br />

ressurge agora<br />

num DVD básico<br />

sem extras,<br />

con<strong>de</strong>nado à<br />

mesma indiferença que o recebeu na<br />

altura. Não se po<strong>de</strong> dizer, é certo,<br />

que a segun<strong>da</strong> longa <strong>da</strong> francesa<br />

Emmanuelle Cuau seja um gran<strong>de</strong><br />

filme — não é, falta a “Muito Bem,<br />

Obrigado” um pouco mais <strong>de</strong><br />

tarimba e personali<strong>da</strong><strong>de</strong> para se<br />

elevar acima <strong>da</strong> imensa produção <strong>de</strong><br />

“classe média” gaulesa a meio<br />

caminho entre o filme <strong>de</strong> autor e o<br />

filme comercial. Mas Cuau (que<br />

trabalhou como argumentista com<br />

Jacques Rivette, por exemplo) acerta<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o princípio no tom i<strong>de</strong>al para<br />

a sua comédia kafkiana sobre um<br />

contabilista insatisfeito que dá por si<br />

prisioneiro do labirinto burocrático<br />

dos serviços públicos franceses.<br />

Apanhado a fumar no átrio <strong>de</strong> saí<strong>da</strong><br />

<strong>de</strong> uma estação <strong>de</strong> metro, Alex<br />

<strong>de</strong>ci<strong>de</strong>-se a fazer valer os seus<br />

direitos <strong>de</strong> ci<strong>da</strong>dão e o seu pequeno<br />

ataque <strong>de</strong> civismo <strong>de</strong>spoleta um<br />

“efeito borboleta” que leva o pobre<br />

contabilista ao hospital psiquiátrico,<br />

sem que a sua esposa consiga<br />

<strong>de</strong>sfazer os absurdos resultantes <strong>da</strong><br />

aplicação estrita e cega <strong>da</strong>s leis.<br />

Cuau sublinha o absurdo <strong>da</strong>s<br />

situações através <strong>da</strong> serie<strong>da</strong><strong>de</strong> mais<br />

seca e sisu<strong>da</strong>, resultando num filme<br />

que joga constantemente com esse<br />

distanciamento quase em câmara<br />

lenta para criar o humor — que é,<br />

obviamente, seco e absurdo mas<br />

também <strong>de</strong> um peculiar burlesco<br />

<strong>de</strong>sconstruído, quase atomizado. É<br />

uma opção tanto mais difícil quanto<br />

seria muito fácil cair ora na farsa<br />

histérica ora na angústia <strong>de</strong>pressiva<br />

— e Cuau, muito aju<strong>da</strong><strong>da</strong> pelos<br />

actores (Gilbert Melki e Sandrine<br />

Kiberlain excelentes no papel do<br />

casal), consegue a proeza <strong>de</strong><br />

caminhar elegantemente na cor<strong>da</strong><br />

bamba, equilibrando a leveza do seu<br />

nonsense kafkiano com a serie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

certeira do olhar <strong>de</strong>sencantado para<br />

uma socie<strong>da</strong><strong>de</strong> progressivamente<br />

menos atenta ao factor humano. O<br />

que falha, <strong>de</strong>pois, é a resolução do<br />

argumento, cujo final “certinho” trai<br />

<strong>de</strong> alguma maneira a loucura que o<br />

antece<strong>de</strong>u e parece ter sido uma<br />

solução <strong>de</strong> recurso para se livrar do<br />

beco sem saí<strong>da</strong> para on<strong>de</strong> a história<br />

se dirige. E não conseguimos evitar a<br />

sensação <strong>de</strong> que Cuau não tem<br />

“unhas” <strong>de</strong> cineasta para fazer<br />

inteira justiça à “guitarra” que<br />

<strong>de</strong>cidiu tocar — é um filme<br />

visualmente anónimo e com alguns<br />

problemas <strong>de</strong> ritmo. Mas isso não<br />

invali<strong>da</strong> que “Muito Bem, Obrigado”<br />

seja fita suficientemente interessante<br />

para merecer uma visão<br />

<strong>de</strong>scomplexa<strong>da</strong>.<br />

Sandrine Kiberlain<br />

e Gilbert Melki<br />

Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 37


Expos<br />

As superfícies<br />

com padrões<br />

são um<br />

elemento-chave<br />

na pintura <strong>de</strong> Daan<br />

van Gol<strong>de</strong>n<br />

38 • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • Ípsilon<br />

Devolver<br />

o real<br />

Um exercício <strong>de</strong> meditação:<br />

Daan van Gol<strong>de</strong>n na<br />

Culturgest. Óscar Faria<br />

Vermelho ou Azul/Red or Blue<br />

De Daan van Gol<strong>de</strong>n.<br />

<strong>Lisboa</strong>. Culturgest. Rua Arco do Cego - Edifício <strong>da</strong><br />

CGD. Tel.: 217905155. Até 06/09. 2ª, 4ª, 5ª e 6ª <strong>da</strong>s<br />

11h às 19h (última admissão às 18h30). Sáb., Dom. e<br />

Feriados <strong>da</strong>s 14h às 20h (última admissão às 19h30).<br />

Pintura, Fotografia.<br />

mmmmn<br />

Em Quioto, no Japão, encontra-se o<br />

templo <strong>de</strong> Ryoanji, que faz parte <strong>de</strong><br />

um complexo <strong>de</strong> edifícios mantido<br />

pela escola Myoshinji, a mais<br />

importante <strong>de</strong> um dos ramos do<br />

budismo zen, o rinzai. Aquela<br />

arquitectura religiosa é sobretudo<br />

conheci<strong>da</strong> pelo “karesansui” –<br />

paisagem seca –, um jardim <strong>de</strong> pedras<br />

construído no final do século XV, que<br />

tem vindo a inspirar uma série <strong>de</strong><br />

artistas, como é o caso <strong>de</strong> John Cage.<br />

Nesse espaço <strong>de</strong> meditação os<br />

estu<strong>da</strong>ntes procuram reflectir não só<br />

no “koan” que lhes foi <strong>de</strong>stinado por<br />

um mestre, mas também nas relações<br />

entre a gravilha, o musgo e os quinze<br />

pedregulhos ali colocados, dos quais,<br />

<strong>de</strong> qualquer ângulo, apenas se<br />

conseguem observar<br />

simultaneamente 14 – só <strong>de</strong>pois <strong>de</strong><br />

alguém ter atingido a “iluminação”,<br />

nota a tradição, é que consegue<br />

visualizar a totali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s pedras.<br />

Uma <strong>da</strong>s histórias favoritas <strong>de</strong><br />

Daan van Gol<strong>de</strong>n (1936, Roterdão)<br />

está relaciona<strong>da</strong> com uma<br />

encomen<strong>da</strong> <strong>de</strong> um mural feita por<br />

um imperador a dois grupos <strong>de</strong><br />

artistas, um chinês e outro grego.<br />

Durante a realização dos trabalhos,<br />

uma barreira separava as obras, <strong>de</strong><br />

modo a que ninguém pu<strong>de</strong>sse ver<br />

aquilo que se passava do outro lado.<br />

Os chineses foram os primeiros a<br />

acabar, tendo revelado o resultado ao<br />

imperador. Umas semanas <strong>de</strong>pois, foi<br />

a vez <strong>de</strong> os gregos terminarem o seu<br />

mural: tinham polido tanto a pare<strong>de</strong><br />

que esta reflectia a pintura dos seus<br />

concorrentes.<br />

Não é por acaso que o artista<br />

holandês mudou radicalmente a sua<br />

obra – antes os seus trabalhos<br />

<strong>de</strong>notavam a influência do<br />

expressionismo abstracto – no Japão,<br />

on<strong>de</strong> viveu entre 1963 e 1965. Nesse<br />

período, van Gol<strong>de</strong>n começa a<br />

aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />

transmutar em pintura uma série <strong>de</strong><br />

padrões apropriados <strong>de</strong> papéis <strong>de</strong><br />

embrulho ou <strong>de</strong> pare<strong>de</strong>, <strong>de</strong> lenços <strong>de</strong><br />

assoar ou <strong>de</strong> toalhas <strong>de</strong> mesa,<br />

espelhando assim a beleza que<br />

encontrava no quotidiano, sobretudo<br />

nos mais banais dos objectos. Essa<br />

colagem ao real, uma estratégia<br />

assumi<strong>da</strong>mente pop, esvaziava-se,<br />

porém, dos sentidos críticos<br />

vislumbrados em algumas variantes<br />

do movimento, sobretudo o realismo<br />

capitalista alemão, protragonizado<br />

por Sigmar Polke, Konrad Lueg e<br />

Gerhard Richter. É igualmente na fase<br />

japonesa que van Gol<strong>de</strong>n toma<br />

contacto, através <strong>de</strong> uma discussão<br />

num jornal local <strong>de</strong> língua inglesa,<br />

com o conceito “ma”, po<strong>de</strong>ndo este<br />

ser traduzido como “intervalo” – <strong>de</strong><br />

notar a sua proximi<strong>da</strong><strong>de</strong> com “mu”,<br />

uma noção fun<strong>da</strong>mental do budismo<br />

zen, que inspira a instalação <strong>de</strong> Pedro<br />

Morais patente na sala <strong>de</strong> exposições<br />

temporárias do CAM <strong>da</strong> Fun<strong>da</strong>ção<br />

Gulbenkian.<br />

Em ensaio publicado no catálogo<br />

<strong>da</strong> exposição agora visível na<br />

Culturgest – “O virgem e o<br />

modificado: a apropriação vazia <strong>de</strong><br />

Daan van Gol<strong>de</strong>n” –, Luke Smythe<br />

nota que o interesse do pintor pelas<br />

imagens por si reproduzi<strong>da</strong>s é mais<br />

<strong>de</strong> natureza visual ou afectiva do que<br />

<strong>de</strong> or<strong>de</strong>m conceptual ou crítica,<br />

acrescentando ain<strong>da</strong> o facto <strong>de</strong> o<br />

artista procurar emprestar aos seus<br />

trabalhos a capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

produzirem “uma atmosfera <strong>de</strong><br />

calma introspecção, induzi<strong>da</strong> pela<br />

simplici<strong>da</strong><strong>de</strong> sedutora <strong>da</strong>s suas<br />

superfícies com padrões.” O ensaísta<br />

nota ain<strong>da</strong> que a influência dos<br />

conceitos <strong>de</strong> “ma” e <strong>de</strong> vazio em van<br />

Gol<strong>de</strong>n permite compreen<strong>de</strong>r<br />

melhor o facto <strong>de</strong> ter baseado as<br />

suas pinturas realiza<strong>da</strong>s no Japão a<br />

partir <strong>de</strong> motivos encontrados em<br />

embalagens e em têxteis: “Não só os<br />

seus <strong>de</strong>senhos simples e repetitivos<br />

po<strong>de</strong>m ser reproduzidos <strong>de</strong> maneira<br />

<strong>de</strong>scontraí<strong>da</strong> porém concentra<strong>da</strong>, e<br />

portanto meditativa, mas também o<br />

seu estatuto <strong>de</strong> objectos <strong>de</strong>corativos<br />

sem importância permite solicitar ao<br />

espectador uma recepção <strong>da</strong> mesma<br />

natureza.”<br />

É este tipo <strong>de</strong> relações – entre o<br />

cheio e o vazio, entre o intervalo e a<br />

acção, muitas vezes na fronteira<br />

entre o reconhecível e o camuflado –<br />

, que van Gol<strong>de</strong>n irá trabalhar<br />

lentamente ao longo dos últimos<br />

trinta anos, encarando a sua<br />

activi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> pintor como um<br />

exercício <strong>de</strong> meditação. Nesse<br />

trajecto, on<strong>de</strong> também surgem<br />

imagens fotográficas – a série “Youth<br />

is an art”, cerca <strong>de</strong> 100 fotografias <strong>da</strong><br />

sua filha Diana, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o nascimento<br />

até aos 18 anos – e uma instalação<br />

num jardim – em 1987, cobre os<br />

caminhos do Hortus Botanicus, em<br />

Amesterdão, com gravilha azul –,<br />

irão surgir as obras compostas por<br />

silhuetas motiva<strong>da</strong>s por trabalhos <strong>de</strong><br />

outros artistas, como Giacometti,<br />

Matisse e Pollock. É contudo Klein o<br />

nome mais próximo <strong>da</strong>s intenções<br />

<strong>de</strong> van Gol<strong>de</strong>n, uma aproximação<br />

passível <strong>de</strong> se realizar tendo como<br />

pontos <strong>de</strong> parti<strong>da</strong> quer a mostra do<br />

francês na galeria Iris Clert, em 1958,<br />

conheci<strong>da</strong> como “a exposição do<br />

vazio” – o título correcto é “La<br />

spécialisation <strong>de</strong> la sensibilité à l’état<br />

matière première en sensibilité<br />

picturale stabilisée, Le Vi<strong>de</strong>” –, quer<br />

os famosos monocromos azuis, os<br />

IKB.<br />

A exposição patente na Culturgest<br />

procura <strong>da</strong>r conta do percurso <strong>de</strong><br />

Daan van gol<strong>de</strong>n <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os anos 1960<br />

até à actuali<strong>da</strong><strong>de</strong>. Com uma<br />

montagem menos consegui<strong>da</strong> do<br />

que, por exemplo, numa <strong>da</strong>s<br />

anteriores paragens <strong>da</strong> mostra, no<br />

Cam<strong>de</strong>n Arts Centre, em Londres –<br />

ali, os trabalhos respiravam mais e<br />

as séries surgiam melhor<br />

diferencia<strong>da</strong>s, permitindo assim<br />

uma leitura mais clara <strong>da</strong>s diferentes<br />

fases <strong>de</strong>senvolvi<strong>da</strong>s pelo artista –, a<br />

retrospectiva é contudo enriqueci<strong>da</strong><br />

em <strong>Lisboa</strong> por um <strong>da</strong>s obras<br />

seminais do artista, esta apresenta<strong>da</strong><br />

como ditam as regras, numa única<br />

linha, em contínuo: “Gol<strong>de</strong>n Years”,<br />

título inspirado por uma canção <strong>de</strong><br />

David Bowie. Nesta peça <strong>de</strong> teor<br />

conceptual, o pintor, com recurso a<br />

recortes <strong>de</strong> jornal, escolhe uma<br />

imagem legen<strong>da</strong><strong>da</strong> por ca<strong>da</strong> ano <strong>da</strong><br />

sua vi<strong>da</strong>, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que nasceu até fazer<br />

70 anos, criando assim uma história<br />

singular: do <strong>de</strong>sporto à guerra,<br />

passando pelas artes (música,<br />

pintura, cinema), é-nos assim<br />

<strong>de</strong>volvido o real, o mundo, através<br />

<strong>de</strong>ste improvável espelho, que ecoa<br />

a estratégia dos pintores gregos<br />

quando colocados perante o <strong>de</strong>safio<br />

<strong>de</strong> criar um mural. Esta reunião <strong>de</strong><br />

acontecimentos po<strong>de</strong> também ser<br />

vista como uma espécie <strong>de</strong> jardim <strong>de</strong><br />

pedras, que não se consegue abarcar<br />

com um só olhar. Apenas quem<br />

tanto viveu po<strong>de</strong> afirmar: “Discurso<br />

é silêncio, prata é ouro” (“Speech is<br />

silence, silver is gold”).<br />

A i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

angolana<br />

Sem preconceitos,<br />

Yonamime serve-se<br />

<strong>da</strong> pintura para interrogar<br />

a sua i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Luísa Soares Oliveira<br />

Control Z<br />

De Yonamine<br />

<strong>Lisboa</strong>. Cristina Guerra Contemporary Art. R. <strong>de</strong><br />

Santo António à Estrela, 33. De 3ª a 6ª, <strong>da</strong>s 11h às<br />

20h. Sábados, <strong>da</strong>s 12h às 20h. Até 19 <strong>de</strong> Setembro.<br />

Ví<strong>de</strong>o, Instalação, Outros<br />

mmmmn<br />

“Control Z” é a primeira exposição<br />

<strong>de</strong> Yonamine (n. Luan<strong>da</strong>, 1975) no


Yonamine reflecte sobre a i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> uma Angola<br />

em que a tradição se apaga ca<strong>da</strong> vez mais perante o dólar<br />

e a areia <strong>da</strong> praia se transforma em “beach sand”<br />

espaço <strong>da</strong> galeria Cristina Guerra.<br />

O público lisboeta já terá<br />

eventualmente visto o seu trabalho<br />

em iniciativas <strong>da</strong> galeria 3+1 (uma<br />

exposição individual em 2008,<br />

“Tuga Suave”, e participação na<br />

colectiva “Sara e André”, no<br />

mesmo lugar) e, sobretudo, nos<br />

toldos <strong>de</strong> artistas do programa<br />

“Distância e Proximi<strong>da</strong><strong>de</strong>”<br />

(Fun<strong>da</strong>ção Calouste Gulbenkian,<br />

Verão <strong>de</strong> 2008). Yonamine exibe<br />

também um currículo já notável<br />

em termos <strong>de</strong> apresentações<br />

internacionais, incluindo o<br />

Pavilhão Africano <strong>da</strong> Bienal <strong>de</strong><br />

Veneza <strong>de</strong> 2007 e “Réplica e<br />

Rebeldia”, uma gran<strong>de</strong> colectiva<br />

que circulou em ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s lusófonas<br />

em 2006, mas que Portugal não<br />

recebeu.<br />

Esta individual insere-se na linha<br />

<strong>de</strong> trabalho que algumas <strong>de</strong>stas<br />

mostras indicavam já. Obras<br />

bidimensionais, sobretudo, que<br />

evocam ou se constroem com base<br />

na pintura, e em geral uma<br />

abundância <strong>de</strong> imagens próprias<br />

ou apropria<strong>da</strong>s que evocam a<br />

tradição <strong>da</strong> Pop Art – facto que,<br />

aliás, é assinalado num texto <strong>de</strong><br />

sala que apresenta a exposição.<br />

Depois há uma instalação monta<strong>da</strong><br />

nos <strong>de</strong>graus que conduzem ao piso<br />

<strong>da</strong> cave: um amontoado <strong>de</strong> sacos<br />

<strong>de</strong> plástico cheios <strong>de</strong> areia – “beach<br />

sand”, como nos é indicado em<br />

marcas impressas – com os quais o<br />

visitante po<strong>de</strong> interagir (mexer,<br />

<strong>de</strong>slocar, ler os slogans e as<br />

imagens que o artista neles fez<br />

imprimir).<br />

Muitos <strong>de</strong>stes slogans indicam a<br />

proibição através <strong>de</strong> alterações<br />

mínimas <strong>de</strong> sinais universalmente<br />

adoptados em códigos <strong>de</strong><br />

mobili<strong>da</strong><strong>de</strong>: o círculo atravessado<br />

por uma diagonal do código <strong>da</strong><br />

estra<strong>da</strong>, por exemplo, indica não a<br />

proibição <strong>de</strong> estacionar, mas a <strong>de</strong><br />

usar sapatos <strong>de</strong> saltos altos.<br />

Noutros casos, são imagens e<br />

símbolos <strong>de</strong> outra origem que<br />

Yonamine usa e repete <strong>de</strong> suporte<br />

para suporte: o cifrão do dólar,<br />

utilizado uma e outra vez à<br />

maneira <strong>de</strong> um carimbo, ou<br />

fotografias <strong>de</strong> jornais ou revistas<br />

que tenham por assunto<br />

acontecimentos ou<br />

individuali<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> relevo no<br />

continente africano. Em to<strong>da</strong>s<br />

estas imagens, que são utiliza<strong>da</strong>s<br />

na pintura segundo um processo<br />

que recor<strong>da</strong> processos e efeitos dos<br />

“graffiti” <strong>da</strong>s culturas urbanas<br />

marginais, a repetição é a tónica. E<br />

essa repetição gera, por sua vez,<br />

um excesso <strong>de</strong> imagens que se<br />

conjugam com alguma violência,<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>da</strong> sua origem<br />

geográfica e política.<br />

Esta violência acaba por se<br />

metaforizar como a própria marca<br />

<strong>da</strong> i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong> do artista. Nascido<br />

em Angola, capta no seu trabalho a<br />

miscigenação <strong>de</strong> elementos<br />

oci<strong>de</strong>ntais e africanos que<br />

caracterizam hoje a vi<strong>da</strong> no seu<br />

país <strong>de</strong> origem. Aliás, se se<br />

mergulhar mais fundo na própria<br />

natureza <strong>de</strong>sta obra – que junta na<br />

pintura, uma disciplina carrega<strong>da</strong><br />

<strong>de</strong> sentido no oci<strong>de</strong>nte ju<strong>da</strong>icocristão,<br />

a combinação <strong>de</strong><br />

referências sociais e políticas à<br />

história e à actuali<strong>da</strong><strong>de</strong> do seu país<br />

-, é ela própria que se afirma como<br />

uma reflexão sobre essa<br />

i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong>, on<strong>de</strong> a tradição se<br />

apaga ca<strong>da</strong> vez mais perante o<br />

dólar, on<strong>de</strong> a areia <strong>da</strong> praia se<br />

transforma em “beach sand”.<br />

“Control Z”, o comando que<br />

permite <strong>de</strong>sfazer um erro<br />

informático e voltar à origem, é<br />

aqui mais do que o nome <strong>da</strong><br />

exposição: é um <strong>de</strong>sejo que já não<br />

é possível realizar.<br />

A peça central <strong>da</strong> mostra, um<br />

painel colorido on<strong>de</strong> as pega<strong>da</strong>s<br />

(do artista?) se assumem como<br />

motivo <strong>de</strong>corativo principal, acaba<br />

por resumir e con<strong>de</strong>nsar esta linha<br />

<strong>de</strong> pensamento: sobre a pintura<br />

oci<strong>de</strong>ntal, Yonamine imprime a<br />

marca do seu corpo angolano. Não<br />

a <strong>de</strong>strói, nem esse é o seu<br />

propósito. Mas também não a<br />

<strong>de</strong>ixa intacta.<br />

“A Experiência <strong>da</strong><br />

Forma” na Casa <strong>da</strong>s Mu<strong>da</strong>s<br />

Agen<strong>da</strong><br />

Inauguram<br />

Hanoi, Ha Long, Hoi An, Hue -<br />

Quatro Paragens no Vietname<br />

O Vietname<br />

no Museu do Oriente<br />

De Ricardo França.<br />

<strong>Lisboa</strong>. Museu do Oriente. Av. Brasília - Edifício<br />

Pedro Álvares Cabral - Doca <strong>de</strong> Alcântara Norte.<br />

Tel.: 213585200. Até 20/09. 6ª <strong>da</strong>s 10h às 22h. 2ª,<br />

4ª, 5ª, Sáb. e Dom. <strong>da</strong>s 10h às 18h. Inaugura 21/8 às<br />

21h.<br />

Fotografia.<br />

Capas e Narrativas<br />

De Carlos Barão.<br />

São Lourenço. Centro Cultural São Lourenço. R.<br />

Igreja. Tel.: 289395475. Até 01/10. 3ª, 4ª, 5ª, 6ª,<br />

Sáb., Dom. e Feriados <strong>da</strong>s 10h às 19h. Inaugura 22/8<br />

às 19h.<br />

Pintura.<br />

Continuam<br />

Arriscar o Real<br />

De vários autores.<br />

<strong>Lisboa</strong>. Museu Colecção Berardo. Praça do Império<br />

- Centro Cultural <strong>de</strong> Belém. Tel.: 213612878. Até<br />

30/08. 6ª <strong>da</strong>s 10h às 22h (última admissão às<br />

21h30). 2ª a 5ª, Sáb. e Dom. <strong>da</strong>s 10h às 19h (última<br />

admissão às 18h30).<br />

Pintura, Outros.<br />

A Experiência <strong>da</strong> Forma<br />

De Joaquim Rodrigo, Artur Rosa,<br />

Helena Almei<strong>da</strong>, António Areal,<br />

Lour<strong>de</strong>s Castro, Jorge Martins, Pedro<br />

Calapez, Pedro Proença, Rui<br />

Sanches, Joana Vasconcelos, Sofia<br />

Areal, entre outros.<br />

Calheta, Vale dos Amores. Estrela à Baixo, Centro<br />

<strong>da</strong>s Artes - Casa <strong>da</strong>s Mu<strong>da</strong>s. Tel.: 291822808 Até<br />

15/11. 3ª a Dom <strong>da</strong>s 10h às 13h e <strong>da</strong>s 14h às 18h.<br />

Pintura, Outros.<br />

Henri Fantin-Latour (1836-1904)<br />

<strong>Lisboa</strong>. Fun<strong>da</strong>ção e Museu Calouste Gulbenkian.<br />

Aveni<strong>da</strong> <strong>de</strong> Berna, 45A. Tel.: 217823700. Até 06/09.<br />

3ª a. e Dom. <strong>da</strong>s 10h às 18h.<br />

Pintura, Desenho.<br />

Teoria <strong>da</strong> Fala<br />

De Pedro Barateiro.<br />

Porto. Museu <strong>de</strong> Serralves. Rua Dom João <strong>de</strong> Castro,<br />

210. Tel.: 226156500. Até 29/09. 3ª a 6ª <strong>da</strong>s 10h às<br />

17h. Sáb., Dom. e Feriados <strong>da</strong>s 10h às 19h. Na Casa<br />

<strong>de</strong> Serralves.<br />

Ví<strong>de</strong>o, Outros.<br />

Jacques-Émile Ruhlmann<br />

Porto. Museu <strong>de</strong> Serralves. Rua Dom João <strong>de</strong> Castro,<br />

210. Tel.: 226156500. Até 27/09. 3ª a 6ª <strong>da</strong>s 10h às<br />

17h. Sáb., Dom. e Feriados <strong>da</strong>s 10h às 19h. Na Casa<br />

<strong>de</strong> Serralves.<br />

Objectos.<br />

Encompassing The Globe.<br />

Portugal e o Mundo nos Séculos<br />

XVI E XVII<br />

De vários autores.<br />

<strong>Lisboa</strong>. Museu Nacional <strong>de</strong> Arte Antiga. Rua <strong>da</strong>s<br />

Janelas Ver<strong>de</strong>s - Palácio do Alvor. Tel.: 213912800.<br />

Até 11/10. 3ª <strong>da</strong>s 14h às 18h. 4ª a Dom. <strong>da</strong>s 10h às<br />

18h.<br />

Pintura, Escultura, Ourivesaria,<br />

Desenho, Outros.<br />

Emissores Reunidos - Episódio 1:<br />

O Amanhã <strong>de</strong> Ontem Não é Hoje<br />

De Isabel Carvalho, Nicolás Robbio.<br />

Porto. Radiodifusão Portuguesa (Antiga RDP). R.<br />

Cândido dos Reis, 74. Até 20/09. 6ª e Sáb. <strong>da</strong>s 15h às<br />

23h. 3ª, 4ª, 5ª e Dom. <strong>da</strong>s 15h às 20h.<br />

Ví<strong>de</strong>o, Outros.<br />

Serralves 2009: A Colecção -<br />

Filmes e Ví<strong>de</strong>os<br />

Porto. Radiodifusão Portuguesa (Antiga RDP). R.<br />

Cândido dos Reis, 74. Até 20/09. 6ª e Sáb. <strong>da</strong>s 15h às<br />

23h. 3ª, 4ª, 5ª e Dom. <strong>da</strong>s 15h às 20h.<br />

Ví<strong>de</strong>o, Outros.<br />

Feijoeiro<br />

De João Pedro Vale.<br />

<strong>Lisboa</strong>. MNAC - Museu do Chiado. Rua Serpa Pinto,<br />

4. Tel.: 213432148. Até 30/10. 3ª a Dom. <strong>da</strong>s 10h às<br />

18h. No Piso 1.<br />

Escultura.<br />

Aspectos <strong>da</strong> Colecção<br />

De António Areal, Manuel Cargaleiro,<br />

Armando Basto, Fernando Calhau,<br />

Michael Biberstein, Cristino <strong>da</strong> Silva,<br />

Pepe Diniz.<br />

<strong>Lisboa</strong>. Centro <strong>de</strong> Arte Mo<strong>de</strong>rna - José <strong>de</strong> Azeredo<br />

Perdigão. Rua Dr. Nicolau Bettencourt. Tel.:<br />

217823474. Até 30/08. 3ª a Dom. <strong>da</strong>s 10h às 18h.<br />

Pintura, Desenho, Outros.<br />

A Colecção do CAM por Heimo<br />

Zobernig<br />

<strong>Lisboa</strong>. Centro <strong>de</strong> Arte Mo<strong>de</strong>rna - José <strong>de</strong> Azeredo<br />

Perdigão. Rua Dr. Nicolau Bettencourt. Tel.:<br />

217823474. Até 30/08. 3ª a Dom. <strong>da</strong>s 10h às 18h.<br />

Instalação, Pintura, Outros.<br />

Mu. Lua em Chão <strong>de</strong> Terra Bati<strong>da</strong><br />

De Pedro Morais.<br />

<strong>Lisboa</strong>. Centro <strong>de</strong> Arte Mo<strong>de</strong>rna - José <strong>de</strong> Azeredo<br />

Perdigão. Rua Dr. Nicolau Bettencourt. Tel.:<br />

217823474. Até 30/08. 3ª a Dom. <strong>da</strong>s 10h às 18h..<br />

Instalação.<br />

Dan Flavin na Colecção Panza<br />

De Dan Flavin.<br />

<strong>Lisboa</strong>. Museu Colecção Berardo. Praça do Império -<br />

Centro Cultural <strong>de</strong> Belém. Tel.: 213612878. Até 30/08.<br />

6ª <strong>da</strong>s 10h às 22h (última admissão às 21h30). 2ª a<br />

5ª, Sáb. e Dom. <strong>da</strong>s 10h às 19h (última admissão às<br />

18h30).<br />

Instalação, Outros.<br />

Serralves 2009 - a Colecção<br />

De vários autores.<br />

Porto. Museu <strong>de</strong> Serralves. Rua Dom João <strong>de</strong> Castro,<br />

210. Tel.: 226156500. Até 27/09. 3ª a 6ª <strong>da</strong>s 10h às<br />

17h. Sáb., Dom. e Feriados <strong>da</strong>s 10h às 20h.<br />

Pintura, Escultura, Outros.<br />

Daniel Buren<br />

Porto. Museu <strong>de</strong> Serralves. Rua Dom João <strong>de</strong> Castro,<br />

210. Tel.: 226156500. Até 30/08. 2ª a Sáb. <strong>da</strong>s 10h às<br />

19h. Na Biblioteca.<br />

Objectos, Publicações.<br />

Ombro a Ombro: Retratos<br />

Políticos<br />

<strong>Lisboa</strong>. MUDE - Museu do Design e <strong>da</strong> Mo<strong>da</strong>. Rua<br />

Augusta 24. Tel.: 218886117. Até 13/09. 6ª e Sáb. <strong>da</strong>s<br />

10h às 22h. 3ª a 5ª e Dom. <strong>da</strong>s 10h às 20h.<br />

Design, Outros.<br />

Colecção #1 - Ana Jotta<br />

<strong>Lisboa</strong>. Culturgest. Rua Arco do Cego - Edifício <strong>da</strong><br />

CGD. Tel.: 217905155. Até 06/09. 2ª, 4ª, 5ª e 6ª <strong>da</strong>s<br />

11h às 19h (última admissão às 18h30). Sáb., Dom. e<br />

Feriados <strong>da</strong>s 14h às 20h (última admissão às 19h30).<br />

Fotografia, Pintura, Desenho,<br />

Escultura, Outros.<br />

Colecção #2 - Francisco Tropa<br />

<strong>Lisboa</strong>. Culturgest. Rua Arco do Cego - Edifício <strong>da</strong><br />

CGD. Tel.: 217905155. Até 06/09. 2ª, 4ª, 5ª e 6ª <strong>da</strong>s<br />

11h às 19h (última admissão às 18h30). Sáb., Dom. e<br />

Feriados <strong>da</strong>s 14h às 20h (última admissão às 19h30).<br />

Escultura, Ví<strong>de</strong>o.<br />

Erwin Olaf<br />

Montemor-o-Novo. Convento <strong>da</strong> Sau<strong>da</strong>ção. Dentro<br />

<strong>da</strong>s muralhas do Castelo. Tel.: 266899857. Até 31/08.<br />

2ª a 6ª <strong>da</strong>s 18h às 00h. Sáb. e Dom. <strong>da</strong>s 16h às 00h.<br />

Fotografia.<br />

André & Sara<br />

<strong>Lisboa</strong>. Pavilhão 28. Av. do Brasil, 53. Tel.:<br />

Erwin Olaf em Montemor-o-Novo<br />

217917000. Até 27/08. 2ª a 6ª <strong>da</strong>s 10h às 17h.<br />

Ví<strong>de</strong>o.<br />

Quartos/Chambres/Rooms/<br />

Zimmers<br />

De Ana Cintra, Diana Policarpo,<br />

Joana Paraíso, Magali Marinho,<br />

Mariana Gomes, Teresa Cortez,<br />

Pedro Ferreira.<br />

<strong>Lisboa</strong>. Pavilhão 28. Av. do Brasil, 53. Tel.:<br />

217917000. Até 27/08. 2ª a Dom. <strong>da</strong>s 10h às 18h.<br />

Desenho, Instalação, Ví<strong>de</strong>o, Outros.<br />

Bruno Pacheco<br />

Porto. Culturgest. Aveni<strong>da</strong> dos Aliados, 104 -<br />

Edifício <strong>da</strong> CGD. Tel.: 222098116. Até 26/09. 2ª, 4ª,<br />

5ª e 6ª <strong>da</strong>s 11h às 19h (última admissão às 18h30).<br />

Sáb., Dom. e Feriados <strong>da</strong>s 14h às 20h (última<br />

admissão às 19h30).<br />

Pintura, Outros.<br />

Notas Sobre um Problema <strong>de</strong><br />

Método<br />

De Pedro Calapez.<br />

Coimbra. Centro <strong>de</strong> Artes Visuais - CAV. Pátio <strong>da</strong><br />

Inquisição, 10. Tel.: 239826178. Até 06/09. 3ª a<br />

Dom. <strong>da</strong>s 14h às 19h.<br />

Pintura.<br />

The Night Walker e Outras<br />

Obras<br />

De Ra di Martino.<br />

Coimbra. Centro <strong>de</strong> Artes Visuais - CAV. Pátio <strong>da</strong><br />

Inquisição, 10. Tel.: 239826178. Até 06/09. 3ªa<br />

Dom. <strong>da</strong>s 14h às 19h.<br />

Ví<strong>de</strong>o, Instalação.<br />

Paisagem<br />

Com Edgar Martins. De João Luís<br />

Carrilho <strong>da</strong> Graça, Augusto Brázio,<br />

Frédéric Bellay.<br />

Coimbra. Centro <strong>de</strong> Artes Visuais - CAV. Pátio <strong>da</strong><br />

Inquisição, 10. Tel.: 239826178. Até 06/09. 3ª a<br />

Dom. <strong>da</strong>s 14h às 19h.<br />

Arquitectura, Fotografia.<br />

De Ama<strong>de</strong>o a Paula Rego, 50<br />

Anos <strong>de</strong> Arte Portuguesa (1910-<br />

1960)<br />

De vários autores.<br />

<strong>Lisboa</strong>. MNAC - Museu do Chiado. Rua Serpa Pinto,<br />

4. Tel.: 213432148. Até 30/10. 3ª a Dom. <strong>da</strong>s 10h às<br />

18h.<br />

Pintura, Outros.<br />

Paisagens Oblíquas<br />

De Lothar Baumgarten, Pedro<br />

Calapez, Alberto Carneiro, Tacita<br />

Dean, Caetano Dias, Alexandre Joly,<br />

Robert Frank, Hamish Fulton,<br />

Laurent Grasso, Andreas Gursky,<br />

David Hockney, Richard Long, Eric<br />

Poitevin, Yvan Salomone, I<strong>da</strong> Tursic,<br />

Wilfried Mille.<br />

Faro. Museu <strong>Municipal</strong> <strong>de</strong> Faro. Largo Afonso III,<br />

14. Tel.: 289897400. 3ª a 6ª <strong>da</strong>s 10h às 19h. Sáb. e<br />

Dom. <strong>da</strong>s 11h às 18h (De 1/7 a 31/8 encerra às 22h30,<br />

<strong>de</strong> 1/7 a 31/8 <strong>da</strong>s 10h30 às 17h).<br />

Faro. Núcleo Museológico do Brinquedo. Galeria<br />

<strong>Municipal</strong> Arco. Tel.: 289897400. Até 27/09. 3ª a<br />

Dom. <strong>da</strong>s 10h30 às 17h. Allgarve 09.<br />

Instalação, Outros.<br />

Estranhas Formas <strong>de</strong> <strong>Vi<strong>da</strong></strong><br />

De Francesco Vezzoli, Luís Palma,<br />

Patrícia Almei<strong>da</strong>.<br />

Loulé. Convento <strong>de</strong> Santo António dos Capuchos. R.<br />

Nossa Senhora <strong>da</strong> Pie<strong>da</strong><strong>de</strong> - Campo do Olival. Tel.:<br />

289400957. Até 27/09. Sáb. <strong>da</strong>s 10h às 23h. 3ª a 6ª e<br />

Dom. <strong>da</strong>s 15h às 23h. Allgarve 09.<br />

Fotografia, Outros.<br />

Dialogue Boxes on Street<br />

Windows<br />

De Ana Vidigal, Costa Pinheiro,<br />

Manuel Baptista, Susanne Themlitz,<br />

entre outros.<br />

Faro. Na Baixa <strong>de</strong> Faro. Percurso: Rua <strong>de</strong> Santo<br />

António, Rua Manuel Belmarço, Rua do Albergue<br />

até a entra<strong>da</strong> <strong>da</strong> Vila-a-<strong>de</strong>ntro. Allgarve 09.<br />

Outros.<br />

Ípsilon • Sexta-feira 21 Agosto 2009 • 39

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