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JF 170 ANOS
ESPECIAL
Os últimos passos
ANTES DO RIO
PERTENCENTE
A JUIZ DE
FORA ATÉ
1940, SIMÃO
PEREIRA
PRESERVA
CEMITÉRIO E
PRÉDIO QUE
FUNCIONOU
COMO
PEDÁGIO NO
PERÍODO
COLONIAL
NO CAMINHO NOVO,
está o Cemitério da
Rocinha da Negra,
onde estão sepultados
nomes como Pedro de
Alcântara Cerqueira
Leite, o Barão de São
João Nepomuceno, que
dá nome a uma das
principais ruas de Juiz
de Fora
Uma ponte sobre o Rio Paraibuna divide
os estados de Minas Gerais e Rio de Janeiro.
Num dos lados está a mineira Simão
Pereira, outrora chamada de Rancharia e
São Pedro de Alcântara, lugarejo que, como
Matias Barbosa, surgiu a partir de uma
sesmaria doada pela Coroa Portuguesa ao
português Simão Pereira de Sá no quinto
ano da segunda década do século XVIII.
“Rever a Juiz de Fora de 1850 nos obriga a
passear pelos seus antigos distritos que viraram
cidades posteriormente. E, nessas
visitas, ainda observar construções que já
estavam erguidas naquele ano”, defende o
historiador Vanderlei Tomaz, apontando
para um dos principais casarões do lugar,
há poucos metros da ponte, o Registro do
Paraibuna, uma das mais antigas edificações
do estado.
“O Registro do Paraibuna foi edificado
em 1709, logo no início do tráfego do
Caminho Novo da Estrada Real. O lugar
funcionava como uma alfândega. Exercia-
-se ali a função de posto fiscal. No Registro
eram cobrados taxas, impostos e o direito
de trafegar pela estrada. Uma espécie de
pedágio. Controlava-se a entrada e saída de
cargas e pessoas pelo Caminho Novo, e era
trocado ali o ouro por moedas cunhadas.
Combatia-se o contrabando de ouro e de
pedras preciosas extraídos do solo mineiro.
Todo este tesouro explorado na Capitania
das Minas Gerais passava pelo Caminho
Novo com destino ao Rio de Janeiro e, de
lá, seguia em navios para Portugal”, narra
Tomaz.
O imóvel serviu ao alferes Joaquim José
da Silva Xavier, aponta o secretário de
Cultura de Simão Pereira, Geraldo Nascimento.
“Tiradentes, por ser um patrulheiro
do Caminho Novo, perseguindo as pessoas
que trafegavam por aqui, passava e pernoitava
no Casarão do Paraibuna”, indica Geraldo
Nascimento, mostrando as divisões
dos quartos, indícios de uma escadaria
para o segundo piso e os vestígios de uma
espécie de cadeia para as pessoas que não
conseguiam apresentar documentos para o
trânsito entre os estados.
“Uma das grandes curiosidades da
construção é que ela conserva em seu interior
um conjunto de telhas utilizadas em
sua cobertura, ainda originais. Antigamente
elas eram popularmente conhecidas
como feitas nas coxas. Falavam que eram
feitas nas coxas dos escravos, o que não
é verdade, porque eram utilizados troncos
de árvores, inclusive de bananeiras. É
possível observar que boa parte das telhas
indica o caminho dos dedos em sua moldagem”,
afirma Tomaz, destacando, ainda,
que o prédio histórico recebeu Dom Pedro
I e sua comitiva quando seguiam para São
João Del Rei, além de ter sido o local de
nascimento da mãe do Duque de Caxias.
Em 2012, Minas Gerais reconheceu o
múltiplo valor do conjunto arquitetônico e
paisagístico compreendido pelo casarão e
o inscreveu nos livros de tombo arqueológico,
etnográfico e paisagístico; de belas artes
e histórico, das obras de artes históricas
e dos documentos paleográficos ou bibliográficos.
Um dos últimos remanescentes
com essas características em todo o estado,
o imóvel aguarda restauração.
No mesmo Caminho Novo da Estrada
Real, está a Fazenda do Cabuí e um pequeno
terreno repleto de cruzes já enferrujadas.
É o Cemitério da Rocinha da Negra
com sua velha capela. “Ali estão sepultados
nomes conhecidos em nossa cidade, como
o Comendador Manoel do Vale Amado,
que construiu o prédio dos Grupos Centrais,
o Palacete Santa Mafalda, e Pedro de
Alcântara Cerqueira Leite, o Barão de São
João Nepomuceno, que dá nome a uma
das principais ruas do centro de Juiz de
Fora”, enumera Tomaz, informando que o
nome do lugar faz referência a uma antiga
fazenda da época, também parada de descanso
do inconfidente Tiradentes.
Simão Pereira, que na década de 1940
tornou-se distrito de Matias Barbosa e, duas
décadas depois se desmembrou, sendo
também elevado a município, guardou
outros vestígios de seu passado. “Na praça
da nova Simão Pereira, encontramos um
antigo chafariz que a tradição diz ser uma
fonte do período colonial”, aponta o historiador
Vanderlei Tomaz, sobre um dos tantos
distritos que nesses 170 anos formaram
Juiz de Fora. Ao longo de sua história, a cidade
chegou a englobar quase 20 distritos,
que hoje limitam-se à sede e a outros três:
Rosário de Minas, Sarandira e Torreões. A
cidade, surgida nas margens do Caminho
Novo, nunca perdeu sua missão de servir
como caminho e também como parada.
“Provável é que ainda existam em todos
os lugares citados (mesmo nos antigos distritos
e, hoje, cidades) outras construções mais
que sesquicentenárias, como antigas sedes
de fazendas (restauradas ou não), como outras
colunas em templos e casarões reformados
depois. Mas também podem existir vestígios
de demolições no meio do mato como
ruínas e fundações em pedra. A Juiz de Fora
de 1850 pode ser ainda revelada em objetos,
mobiliário ou imagens sacras em alguma
casa ou coleção particular. Pode estar em
Torreões e em Rosário de Minas, em Paula
Lima e na Fazenda São Mateus, na Fazenda
Fortaleza, no caminho de Caeté, em Matias
Barbosa”, finaliza Vanderlei Tomaz, sugerindo
que a história não se encerra por aqui - e
ainda há muito a ser descoberto.
DOMINGO, 31 DE MAIO DE 2020 | tribunademinas.com.br | • PÁGINA 58