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Edição 69 - Insieme

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O<br />

L’ITALIANO<br />

CHE È (C’È) IN TE<br />

Prof. Michel Guéneau<br />

(mgueneau@wanadoo.fr),<br />

de Lyon, França, vive e<br />

respira italianidade e se encantou pelo<br />

Italiano que está em você. Diz: “Li<br />

todos os textos do Italiano que está em<br />

você: representa um extraordinário<br />

testemunho da imigração italiana, de<br />

histórias de vida, com uma dimensão<br />

humana tão necessária atualmente.<br />

Assim, mando-lhe meu texto. Talvez seja<br />

um pouco simples e obscuro, mas será<br />

também a forma de expressão mais<br />

consentânea com minha forma de perceber<br />

as coisas. Ei-lo:<br />

“Tenho uma avó de origem<br />

dolomítica-piemontês, mas a minha<br />

italianidade é comum: como é o<br />

caso de muitos franceses. A França,<br />

faz séculos, está encharcada<br />

de italianidade.<br />

O poeta Guillaume Appolinaire<br />

escreveu: “A Itália, nossa mãe, nossa<br />

irmã”, eis talvez como se pode<br />

melhor resumir esta relação entre os<br />

dois países que, ao mesmo tempo se<br />

gostam e, estranhamente, se ignoram.<br />

Mais concretamente, passei minha<br />

juventude numa região operária, de<br />

minas de carvão, cosmopolita, onde<br />

23 - INSIEME - Setembro • Settembre 2004<br />

a comunidade mais numerosa era<br />

aquela dos italianos, principalmente<br />

sicilianos, sardos, calabreses, emilianos,<br />

toscanos, vênetos. Possuia muitos<br />

amigos italianos e usávamos<br />

palavras nossas ítalo-francesas, por<br />

exemplo “femmatz”, quando se queria<br />

falar de uma garota. O relacionamento<br />

com a Itália era material,<br />

nada de Dante, nada de Leonardo.<br />

Depois descobri o cinema italiano, o<br />

grandioso Fellini, um cinema de humanidade<br />

e no qual quem chora, ri:<br />

um cinema de vida; eis minha entrada<br />

na cultura italiana. Francófono<br />

que era, aprendi a língua italiana, e<br />

pela primeira vez aquilo que eu aprendia<br />

me parecia que vinha por conta.<br />

Com a língua e a cultura nas quais<br />

mergulhava sempre mais a cada dia,<br />

entrava num mundo complexo e entidia<br />

que o mundo é feito dessa complexidade;<br />

e que precisa viver com<br />

ela, uma vez que é a coisa mais natural<br />

que existe.<br />

Viver com a complexidade, se não<br />

me engano, tem a ver também com a<br />

tolerância. Eu não poderia dizer uma<br />

coisa como “graças a Deus sou italiano,<br />

ou frances, ou chines?”, apren-<br />

di a conhecer um pouco o mundo da língua no Vice-Consulado de For-<br />

através dessa minha relação pessoal taleza-CE. Sua conversa e explanações<br />

e quase carnal, enfi m, apenas com a eram ótimas. A seu convite, me ma-<br />

Itália.<br />

triculei no curso de língua italiana e,<br />

Como é certo, hoje é a língua surpreso, descobri que apesar de<br />

italiana que me dá de comer, aca- tanto tempo eu negar e omitir minha<br />

bei me tornando professor de língua origem italiana, ela foi mais forte e<br />

e literatura italianas. – Obrigado apaixonante. Dedicava-me horas a<br />

por ter-me dado oportunidade de estudar, a ler, a assistir programas<br />

dizer estas pequenas coisas . – Sau- da RAI..., procurando entender o que<br />

dações, Michel Guéneau.” pai, meus avós, apesar de tudo o que<br />

Se voltamos à nossa história e sofreram, tinham orgulho em confes-<br />

olhamos o mundo, podemos dizer que sar-se italianos. Pesquisei minhas<br />

somos italianos de sangue, mas todos origens, signifi cado de nome, sobre-<br />

podem ser italianos de cultura. O nome..., estudei a região de meus<br />

sentir a Itália e os italianos, de forma antepassados. Nunca fui à Itália,<br />

envolvente e feliz, fará com que haja porque julgo que, embora me consi-<br />

muito mais italianos de cultura, que dere descendente e fale o italiano,<br />

italianos de sangue. No Brasil, hoje, acredito que somos considerados<br />

quem não tem, na sua parentela, em “persona non grata”. Tenho os do-<br />

linha direta ou colateral, um italiano cumentos para obter dupla cidadania,<br />

ou uma italiana? Somos, pois, parte porém me pergunto: para quê?<br />

da Italianidade no Mundo.<br />

“Vivo bem, numa cidade mara-<br />

<br />

vilhosa, gozo de boas amizades. Vejo<br />

Helvio Tadeu Gilioli, de Forta- descendentes brigando, reclamando,<br />

leza-CE, sentiu-se socialmente dis- tentando obter cidadania italiana, sem<br />

criminado por sua ascendência ita- nem conhecer seu país, suas virtudes,<br />

liana. Mas, em família,viveu intesos seu povo e sua cultura. Italianos que<br />

hábitos, costumes, falar, pensar e crer aqui vieram e acabaram fi cando,<br />

de contagiante italianidade. Diz:: daqui não querem mais sair. Se os<br />

“Sou descendente de italianos, italianos que vieram e que vêm para<br />

meu bisnonno chegou da Emilia Ro- cá não querem voltar, por que eu<br />

magna em 1881. Só voltou à Itália haveria de ir para lá?<br />

para buscar a família. Não conheci “Tenho a identidade italiana,<br />

meu nono, que faleceu quando meu não há como negar. Vejo que mui-<br />

pai tinha 13 anos, mas deixou muitas tas atitudes, gestos, maneiras e, até<br />

histórias que consegui reunir junto a sentimentos, foram transferidas de<br />

seus amigos de caçada, de trabalho geração a geração. Mas negar que<br />

em fazendas de café... “Quando per- sou brasileiro, para querer ser<br />

guntavam se eu era descendente de italiano, não, isso não passa de<br />

italianos, eu respondia que eu era recordações do espírito.”<br />

brasileiro, meu avó sim era italiano. Realmente, somos brasileiros<br />

Mas isto me causava desconforto, pois porque aqui nasemos, sob o signo do<br />

em São Caetano do Sul-SP, onde jus solis. Somos italianos, porque<br />

nasci, a maioria era de italianos ou herdamos o direito de sangue, jus<br />

descendentes. Pensava que se meu sanguinis. Mais precisamente, somos<br />

bisnono e nono foram obrigados a brasileiros de origem italiana . Quan-<br />

sair de sua terra natal, sofreram disdo nossos antepassados aqui aporcriminação<br />

por diferença de idioma taram, tornaram-se herdeiros, e nós<br />

e cultura, a Itália não merecia meu lhes sucedemos, da cultura brasilei-<br />

respeito e, menos ainda, que eu fosse ra, fazendo-se ítalo-brasileiros. E nós,<br />

reconhecido como descendente de herdeiros de sua herança, nascemos<br />

italianos.<br />

brasileiros de origem italiana, ou<br />

O tempo passou e, após muitas brasilerios ítalos. O Brasil é a parte<br />

andanças pelo Brasil, conheci um da Itália no mundo que estamos aju-<br />

“maestro” italiano, que dava aulas dando a construir. <br />

Foto DePeron

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