Views
2 years ago

COMUNICAÇÕES 241 - Joana Mendonça: a arte de cultivar ideias

  • Text
  • Wwwapdcpt
  • Realidade
  • Nova
  • Mercado
  • Digital
  • Tecnologia
  • Dados
  • Ainda
  • Forma
  • Portugal
  • Empresas

management

management sidade de Londres), foi um dos investigadores que se debruçou sobre o tema e acabou convencido. Em agosto, lançou o livro “Friday is the New Saturday”, onde afirma que “uma semana de trabalho de quatro dias” não só “poderá salvar a economia” como “é uma melhor forma de organizar a economia no século XXI”. 48 Embora não tenha sido discutida em campanha eleitoral, a semana dos quatro dias foi equacionada pelo Partido Socialista no programa que levou a votos dia 30 de janeiro. Ao prometer nesse documento a “ponderação da aplicabilidadedessa experiência “em diferentes setores”, logo os representantes das associações patronais reagiram. E não foi para apoiar a ideia. A verdade é que este cenário não surgiu do nada. Sobretudo depois da pandemia, houve vários países que ensaiaram a medida. No ano passado, Espanha considerou a implementação da semana das 32 horas para favorecer a criação de emprego, numa fase em que o seu mercado de trabalho estava seriamente abalado pela pandemia. Também a Escócia decidiu testar a semana das 32 horas, inspirada em exemplos como o da Nova Zelândia, que abraçou com a bênção da própria primeira-ministra, Jacinta Arden, a realização de “pilotos” nesse âmbito. Houve iniciativas similares noutras geografias, mas o exemplo que mais impressionou a comunidade internacional foi o da Islândia. Aqui, não foi a pandemia que inspirou a adoção da semana dos quatro dias, já que a experiência teve início em 2015 e se desenrolou até 2019. Pioneira na matéria, a Islândia envolveu cerca de 1% da sua força de trabalho na iniciativa. Durante quatro anos cerca de 2.500 trabalhadores cumpriram um horário que não excedeu as 36 horas semanais, podendo ser concentrado em quatro dias, sem redução salarial. Este ensaio foi conduzido pelo governo islandês na capital do País, Reykjavik, e os resultados analisados pela Associação pela Sustentabilidade e Democracia da Islândia e pelo grupo Autonomy. Concluiu-se que durante este período não houve qualquer quebra na produtividade e que o stress dos trabalhadores diminuiu, assim como o risco de burnout. O sucesso foi de tal forma esmagador que, a partir de 2019, a redução de horários começou a ser negociada pelos sindicatos de forma generalizada. Atualmente, abrange cerca de 86% dos trabalhadores islandeses do setor público. A maior experiência de redução da jornada laboral que até hoje foi feita tem sido objeto de estudo em universidades, consultoras e grandes corporações. Pedro Gomes, economista e professor em Birkbeck (Univer- EM PORTUGAL, SERÁ VIÁVEL? Por cá, esta perspetiva está longe de ser consensual. João Vieira Lopes, líder da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), veio a público afirmar que “não é previsível que os baixos níveis de produtividade consigam absorver um cenário desses nos próximos anos, tendo em conta a estrutura empresarial portuguesa”. Faz, porém, uma ressalva para “os setores de alta tecnologia e algumas tipologias de empresas”, onde, admite, o caminho para este modelo poderá ser feito. A sua opinião coincide, em traços gerais, com a dos outros representantes das confederações patronais. António Saraiva, presidente da CIP – Confederação Empresarial de Portugal, chegou mesmo a criticar esta iniciativa do PS, por considerar não ser este o momento para levantar semelhante questão. Assume, em contrapartida, que o tema é importante, pois “a qualidade de vida é um fator que influencia a produtividade”, mas alerta para as dificuldades da aplicação deste modelo, “que implicaria uma mudança estrutural”. Desta forma, entende que o tema exige reflexão, não podendo ser adotado precipitadamente. Os argumentos do líder da Associação Empresarial de Portugal são semelhantes. Luís Miguel Ribeiro diz que a adoção da semana dos quatro dias acarreta “uma alteração profunda na forma como a economia e a sociedade estão organizadas”. Por isso, numa altura “em que do ponto de vista económico ainda não conseguimos alcançar os níveis da pré-pandemia, este não é o momento para se iniciar tal discussão”. Estas opiniões não surpreendem o advogado Tiago Piló, um dos coordenadores da área laboral da VdA – Vieira de Almeida & Associados: “No nosso país a força de trabalho ainda se caracteriza muito pela quantidade e não pela qualidade. E isso vê-se quer ao nível da força de trabalho propriamente dita, quer ao nível das chefias, que ainda estão muito agarradas à quantidade de trabalho que recebem das suas equipas e menos ligadas à qualidade. Daí que muito dificilmente, nos próximos tempos, a redução das horas de trabalho semanais se vá tornar uma medida generalizada em Portugal”, afirma. A polémica que se gerou em torno da adoção das 35 horas de trabalho pela Função Pública demonstra, a seu ver, que por enquanto, em Portugal, “este modelo

Para Tiago Piló, advogado da VdA, a polémica que se gerou em torno das 35 horas de trabalho na Função Pública demonstra que por enquanto em Portugal “o modelo da semana dos quatro dias é de muito difícil generalização” não serve e que é de muito difícil generalização”. Também advogada na VdA, Mariana Pinto Ramos chama a atenção para as questões que a redução da carga horária laboral levanta, nomeadamente ao nível das remunerações: “A primeira pergunta que se vai fazer é se haverá ajustes salariais com a adoção da semana dos quatro dias, pois à partida o salário está pensado para as 40 horas semanais”. Para que este problema não se coloque, a alternativa é concentrar as 40h em quatro dias, mas será compensador fazer jornadas de trabalho de 10 a 12 horas? Tiago Piló duvida que o trabalho concentrado tenha como resultado a mesma produtividade: “Não foi por acaso”, argumenta, “que se generalizou a semana das 40h de trabalho. É que está provado que ao fim de 8h o nosso bioritmo cai drasticamente”. Dúvidas à parte, a verdade é que a legislação portuguesa já permite grande multiplicidade de soluções, sublinha Mariana Pinto Ramos: “Existe a figura do horário concentrado, assim como o regime de adaptabilidade e ainda o banco de horas grupal, além do part-time. Havendo consenso entre empresas e trabalhadores, qualquer uma destas fórmulas pode ser usada para que a semana de quatro dias seja possível”. O facto de a pandemia ter forçado a que as empresas saíssem da sua zona de conforto promoveu a discussão sobre novas formas de trabalhar. Comum a quase todas está o fator flexibilidade, algo que se descobriu ser valioso tanto para trabalhadores, como para empregadores. Do lado da força de trabalho estão, naturalmente, as facilidades de conciliação entre as responsabilidades profissionais e a vida familiar, mas para quem contrata os horários flexíveis podem ser um importante fator de retenção de talento e de reputação. Mariana Pinto Ramos tem notado que “algumas empresas já revelam preocupação em tomar medidas para combater o burnout e contribuir para a redução da pegada ecológica, através da adoção do teletrabalho”, cujo impacto na redução dos movimentos diários pendulares dos seus funcionários é inquestionável. Esta sensibilidade levou vários clientes a sondar a VdA, assim que veio a público o tema da implementação da semana dos quatro dias. O que querem saber? Sobretudo se “esta é uma medida que pode ser aplicada transversalmente dentro da organização, ou se será necessário procurar o acordo pessoa a pessoa”, esclarece Tiago Piló. ENSAIOS BEM-SUCEDIDOS Por coincidência ou talvez não, após o PS ter abordado pela primeira vez, em maio, o tema da semana dos quatro dias, houve várias empresas que decidiram testar o modelo em Portugal. A Feedzai foi uma delas. Alegando que o seu CEO sempre encorajou as equipas a experimentarem coisas novas e diferentes, em agosto passado avançaram para esta fórmula nos vários escritórios que têm espalhados pelo mundo. Dalia Turner, a VP of People do unicórnio português, foi quem partilhou nos media o resultado da experiência: “O serviço aos clientes foi mantido, nada caiu por terra, todos os objetivos 49

REVISTA COMUNICAÇÕES

UPDATE

© APDC. Todos os direitos reservados. Contactos - Tel: 213 129 670 | Email: geral@apdc.pt