10.04.2013 Views

O Jogo (conto) publicado em Histórias do Rio Negro - Revista de ...

O Jogo (conto) publicado em Histórias do Rio Negro - Revista de ...

O Jogo (conto) publicado em Histórias do Rio Negro - Revista de ...

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

mal pari<strong>do</strong>s que nada mais tinham a fazer <strong>do</strong> que ficar ali ao sol, vigian<strong>do</strong> o mun<strong>do</strong>.<br />

Um dia brigavam entre si, era ciúme, outro dia, irmana<strong>do</strong>s nessa <strong>de</strong>sesperança <strong>de</strong><br />

velho, acabavam por se abraçar, um sabia da agrura <strong>do</strong> outro, o que lhe <strong>do</strong>ía na alma<br />

e chorava nos ossos. Seu Antenor era o í<strong>do</strong>lo, não perdia uma, era zaz trás o velho<br />

tinha cabeça, louvavam-lhe os bons olhos, a m<strong>em</strong>ória privilegiada, as mãos rápidas <strong>em</strong><br />

colocar a pedra certa, o tino para acuar adversário. Quan<strong>do</strong> algum <strong>de</strong>sconheci<strong>do</strong><br />

aparecia e se atrevia a <strong>de</strong>safiar o velho eles se cutucavam, se juntavam <strong>em</strong> risinhos e<br />

olhares cúmplices tangen<strong>do</strong> o <strong>de</strong>sinfeliz para o oitizeiro gran<strong>de</strong> e lá esperavam Seu<br />

Antenor. Era uma sentada só. No silêncio até voar <strong>de</strong> besouro se ouvia, o hom<strong>em</strong> se<br />

concentrava, olhava firme para o <strong>de</strong>safiante e lia nele escrito na cara a pedra<br />

guardada, o segre<strong>do</strong> escondi<strong>do</strong>. E não dava outra, <strong>em</strong> menos <strong>de</strong> <strong>de</strong>z minutos, coroa<strong>do</strong><br />

pelos aplausos da sua corte <strong>de</strong>s<strong>de</strong>ntada, ganhava a partida, s<strong>em</strong> lero n<strong>em</strong> meio termo.<br />

Aí se ufanava! Era importante! Sob aplausos discutia as jogadas, levava palmadinhas<br />

nas costas, parabéns, impava <strong>de</strong> orgulho. Nessa hora ele crescia, virava gente, tinha<br />

nome e sobrenome Antenor da Silva, se <strong>de</strong>stacava, era gran<strong>de</strong>, campeão. Naquele<br />

batalhão <strong>de</strong> <strong>de</strong>svali<strong>do</strong> ele era o rei, recolhia os louros e respingava sua importância <strong>em</strong><br />

to<strong>do</strong>s eles que se sentiam como foss<strong>em</strong> reinventa<strong>do</strong>s.<br />

A alegria ia esparraman<strong>do</strong> até se aproximar a hora <strong>de</strong> Teresa chegar <strong>em</strong> casa.<br />

Então Antenor arr<strong>em</strong>etia para o apartamento que estava cansa<strong>do</strong> da cantilena se ela o<br />

encontrasse por ali. On<strong>de</strong> já se viu um velho nessa ida<strong>de</strong> passar o dia vadian<strong>do</strong>,<br />

meti<strong>do</strong> com essa gentinha que não t<strong>em</strong> on<strong>de</strong> cair morta? Ele que se <strong>de</strong>sse ao respeito<br />

que ela não estava ali para passar vergonha, Dona Arminda se soubesse disso sentava<br />

na cova e haveria <strong>de</strong> sofrer e chorar, tinha si<strong>do</strong> uma mulher séria a vida toda e não<br />

estava agora para o mari<strong>do</strong> se comportar assim. A praça era lugar <strong>de</strong> vadio, <strong>de</strong> gente<br />

amalucada que não tinha para on<strong>de</strong> ir e n<strong>em</strong> sabia <strong>de</strong> on<strong>de</strong> vinha. Um ban<strong>do</strong> <strong>de</strong> s<strong>em</strong><br />

eira n<strong>em</strong> beira, nada a fazer nessa vida. Pai <strong>de</strong>la não era para isso, ele que achasse<br />

serviço, limpasse alguma coisa, fosse passear na beira <strong>do</strong> rio, fizesse umas amiza<strong>de</strong>s<br />

<strong>de</strong>centes, a casa estava cheia <strong>de</strong> revista, a televisão, porque ele não se acomodava?<br />

Antenor ia diminuin<strong>do</strong> na ca<strong>de</strong>ira até se transformar <strong>em</strong> pó <strong>de</strong> traque. Duas ou três<br />

vezes ela achou a caixa <strong>de</strong> <strong>do</strong>minó <strong>do</strong> pai e <strong>de</strong>u fim rapidinho. Ele n<strong>em</strong> suspirou que<br />

sabia que ia ser pior, abaixava a cabeça cala<strong>do</strong>, fechava-se como caramujo, que ela<br />

nunca ia enten<strong>de</strong>r mesmo. Sentavam-se no sofá e lá iam os <strong>do</strong>is, ela ven<strong>do</strong> as novelas<br />

ele cabecean<strong>do</strong> <strong>de</strong> sono.<br />

96

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!