Hipercortisolismo e puberdade - Pediatria (São Paulo)

Hipercortisolismo e puberdade
Damiani D
Cartas ao Editor Letters to the Editor Cartas al Editor
Pediatria (São Paulo) 2002;24(3/4):143-44
Hipercortisolismo e puberdade: precoce ou atrasada?*
Hypercortisolisme and puberty: early or delayed?
Hipercortisolismo y puberdad: precoz o atrasada?
As doenças que levam a hipercortisolismo são relativamente incomuns na criança e no adolescente
1 , porém é freqüente esta condição pelo uso de corticóides exógenos. Os corticosteróides
atuam amplamente no organismo, afetando o metabolismo de carboidratos, proteínas e lipídeos e,
salvo em situações em que seus efeitos benéficos ficam bem determinados, é o tipo de medicação
a ser evitada. Apesar de seu poderoso efeito antiinflamatório que propicia resultados clínicos espetaculares,
por outro, sua gama de efeitos colaterais faz com que seja recomendável uma terapêutica
alternativa, menos problemática, sempre que possível.
A síndrome de Cushing caracteriza-se por hipercortisolismo que dá ao paciente um aspecto
fenotípico característico, com obesidade centrípeta, estrias vinhosas, hipertensão arterial e grave
retardo de crescimento, quando ocorre em crianças e adolescentes. Adicionalmente, há uma progressiva
desmineralização óssea e, por vezes, comprometimento intenso da coluna vertebral que
leva a compressões de raízes nervosas, com dor muito intensa.
O hipercortisolismo sempre atrasa a puberdade, seja qual for sua etiologia. Então, como coadunar
hipercortisolismo e puberdade precoce no caso relatado em Pediatria (São Paulo)* ora em análise?
A supra-renal pode, em algumas doenças, como os tumores e displasias macro e micronodulares,
produzir concomitantemente glicocorticóides e hormônios sexuais, estes últimos responsáveis pelos
eventos puberais. Foi o que ocorreu nesta displasia nodular pigmentária. De modo geral, há produção
de hormônios virilizantes, originando puberdade precoce isossexual no menino e heterossexual
na menina. São extremamente raros os tumores adrenais feminizantes.
No histórico do paciente em foco há um diagnóstico, prévio, de puberdade precoce heterossexual.
Naquele momento isto não estava caracterizado, uma vez que a puberdade precoce heterossexual
na menina deveria apresentar aumento clitoriano, o mais importante sinal de virilização.
Havia tão somente um aumento de mamas e de pêlos pubianos, aspectos isossexuais na menina.
Quando observamos apenas aumento de pêlos pubianos, não podemos falar em puberdade
heterossexual, já que este aumento faz parte de uma puberdade feminina normal.
*Parte do parecer autorizado do relator, referente ao artigo de Maia et al., publicado neste número à p.137-42.
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Desta forma, não podemos, no trabalho de Maia et al., publicado neste número, caracterizar
uma puberdade heterossexual, embora a dosagem de testosterona estivesse aumentada. A
síndrome de Cushing teve causa extremamente infreqüente, podendo ser isolada ou fazer parte
do complexo de Carney (síndrome neoplásica autossômica dominante com mixomas, lentigines
e PPNAD) 2 . Em algumas situações, o quadro de Cushing não dependente de ACTH é cíclico,
com períodos de remissão completa e outros em que o hipercortisolismo se manifesta. Sua
patogênese não está estabelecida, mas sugere-se um defeito no cromossomo 16 3 .
A importância do reconhecimento, por parte do pediatra, de quadros compatíveis com
hipercortisolismo fica clara no sentido de que o diagnóstico precoce, em muitas situações, como
nos tumores adrenais, pode mudar o prognóstico de longo prazo. Em casos menos críticos evitam-se,
ao se combater o hipercortisolismo, as graves seqüelas decorrentes dos níveis extremamente
elevados deste esteróide.
Referências
1. Robyn JA, Koch CA, Montalto J, Yong A, Warne GL, Batch JA. Cushing’s syndrome in childhood and
adolescence. J Paediatr Child Health 1997;33:522-7.
2. Koch CA, Bornstein SR, Chrousos GP, Stratakis CA. Primary pigmented nodular adrenocortical dysplasia
(PPNAD) within the scope of Carney complex as the etiology of Cushing syndrome. Med Klin
2000;95:224-30.
3. Kohler G, Anding K, Bohm N. Primary pigmented nodular adrenocortical dysplasia. Pathol Res Pract
198;194:201-4.
Prof. Dr. Durval Damiani
Unidade de Endocrinologia do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade
de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil