Corrente nº 34 – ago/2012 - WIZO Brasil
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história<br />
AO vIsItARMOs ALGuNs ENGENHOs Ou O quE dELEs<br />
REstOu tEMOs O sENtIMENtO dE “OuvIR” O EcO<br />
dOs PAssOs dE PEssOAs quE ALI vIvERAM sEus<br />
cOtIdIANOs E suAs PRátIcAs RELIGIOsAs<br />
como religião e como cultura. Estilo de vida, competências<br />
lingüísticas, crenças, hábitos alimentares,<br />
ritos, jeitos de viver, de morar, rezar, sepultar seus<br />
mortos, condenados como heresias pela ordem política<br />
e religiosa estabelecida representavam a forma<br />
preservada de um ethos que garantia a continuidade<br />
do grupo na história.<br />
Por isso, valorizamos os conteúdos dos registros<br />
de denúncias na obra Primeira Visitação às Partes<br />
do <strong>Brasil</strong>. Denunciações e Confissões de Pernambuco<br />
1593-1595 cujos conteúdos historiam os fatos político-religiosos<br />
que regulavam o cotidiano da América<br />
Portuguesa. Nelas revelava-se que as práticas<br />
judaizantes eram realizadas no espaço privado do<br />
lar, dos engenhos e da vila, onde viviam os denunciados.<br />
Esta realidade vem sendo apreendida com<br />
técnicas da análise dos discursos dos entrevistados<br />
escolhidos para a pesquisa cotejando-se com as<br />
denúncias inquisitoriais. Assim, nas entrevistas realizadas<br />
com os “novos personagens” que formam<br />
uma nova/antiga categoria de judaísmo é que é<br />
conhecida a simbolização que compõe a imagem,<br />
os traços, enfim, a essência cultural singular do<br />
grupo. Devemos lembrar os elementos preservados<br />
na cadeia de comunicação entre os judeus<br />
sefardim e a população com quem conviviam, na<br />
circunstância de não poderem ser expostos com<br />
seus conteúdos originais. Os “não ditos” ficavam no<br />
mundo da reserva mental, portanto fora do discurso<br />
explícito. Talvez por isso, os costumes foram tão<br />
enfatizados pelos seus portadores gerando o que<br />
alguns estudiosos chamam de “marranidade” ou<br />
“marranismo”.<br />
Ao visitarmos alguns engenhos ou o que deles<br />
restou temos o sentimento de “ouvir” o eco dos<br />
passos de pessoas que ali viveram seus cotidianos<br />
e suas práticas religiosas. Impossível não pensar<br />
na inquietação de um suceder de dias que oscilava<br />
entre a hostilidade ou o afrouxamento da vigilância<br />
e as estratégias para preservação do que hoje chamamos<br />
cidadania.<br />
Estes fatos são importantes para compreendermos<br />
a dimensão cultural das raízes judaicas nesta<br />
parte do <strong>Brasil</strong> cuja ressonância alcança nossos<br />
dias com a emergência de novas identidades<br />
apoiadas em antigas heranças de um judaísmo<br />
exportado compulsoriamente da Península Ibérica<br />
para o <strong>Brasil</strong>.<br />
Tânia Neumann Kaufman é Doutora em História, Mestre em Antropologia<br />
e graduada em Ciências Sociais. Presidente do Arquivo Histórico<br />
Judaico de Pernambuco. Coordenadora do Núcleo de Pesquisa e de<br />
Ações Educativas do Museu Sin<strong>ago</strong>ga Kahal Zur Israel<br />
No interior do<br />
centro cultural<br />
judaico de<br />
Pernambuco<br />
encontram-se<br />
o Memorial Zur<br />
Israel e o salão<br />
de orações<br />
reconstruído da<br />
sin<strong>ago</strong>ga Kahal<br />
Zur Israel<br />
Fotos: Acervo do Arquivo Histórico Judaico de Pernambuco/Fritz Simons<br />
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