Concepções do Trabalhador de Enfermagem sobre Drogas - UERJ
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Artigo <strong>de</strong> Pesquisa<br />
Original Research<br />
Artículo <strong>de</strong> Investigación<br />
[...] é tão normal que não percebo a medicação que<br />
faço uso como droga [...]. (E8)<br />
O álcool é uma das drogas mais conhecidas, e talvez<br />
a mais popular, juntamente com a nicotina, apesar<br />
<strong>de</strong> muitas vezes não serem reconhecidas como tais. A<br />
Organização Mundial <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> consi<strong>de</strong>ra o alcoolismo<br />
como uma das <strong>do</strong>enças que mais matam no mun<strong>do</strong> 11 .<br />
[...] eu às vezes bebo, mas não é to<strong>do</strong> dia, mas também não<br />
faz mal à saú<strong>de</strong>, pois droga mesmo eu não uso [...]. (E9)<br />
[...] eu quan<strong>do</strong> estou muito cansa<strong>do</strong> ao sair <strong>do</strong> trabalho,<br />
para diminuir a tensão, tomo umas cervejinhas e tu<strong>do</strong> volta<br />
ao normal. Mas droga mesmo, eu não faço uso. (E31)<br />
Na realida<strong>de</strong>, as instituições também <strong>de</strong>veriam<br />
preocupar-se em trazer para discussão o uso das drogas<br />
consi<strong>de</strong>radas lícitas, como o álcool, fumo e alguns<br />
medicamentos, a fim <strong>de</strong> estimular a manutenção da<br />
saú<strong>de</strong> <strong>de</strong>sses trabalha<strong>do</strong>res. Deve-se reforçar e incentivar<br />
a participação <strong>de</strong>les no programa <strong>de</strong> promoção<br />
da saú<strong>de</strong> e prevenção <strong>de</strong> <strong>do</strong>enças, através <strong>de</strong> estratégias<br />
<strong>de</strong> sensibilização e conscientização, incentivan<strong>do</strong><br />
ativida<strong>de</strong>s que melhorem sua qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida.<br />
[...] eu bebo apenas quan<strong>do</strong> saio <strong>do</strong> plantão, mas droga<br />
eu não uso [...]. (E12)<br />
Questão Ética e Legal<br />
Outra situação apontada nas falas é a questão<br />
ética e legal <strong>do</strong> uso <strong>de</strong> drogas por profissional <strong>de</strong> enfermagem.<br />
Mesmo ciente <strong>de</strong> possíveis danos à sua saú<strong>de</strong><br />
e ao <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> suas ativida<strong>de</strong>s, eles as<br />
percebem como:<br />
[...] o uso po<strong>de</strong> ser legal através <strong>de</strong> prescrição médica e<br />
ilegal sem prescrição. (E4)<br />
[...] o uso é uma questão ética e legal <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong><br />
<strong>do</strong> profissional, mas mesmo assim ele continua usan<strong>do</strong><br />
[...] (E11)<br />
A falta <strong>de</strong> cumprimento <strong>de</strong> pressupostos legais<br />
e a própria legislação relacionada ao consumo <strong>de</strong> drogas,<br />
frente à socieda<strong>de</strong> liberal, favorecem o uso e abuso<br />
<strong>de</strong> drogas, tornan<strong>do</strong>-se fatores <strong>de</strong> risco 13 .<br />
Isto vem ratificar que o conhecimento <strong>sobre</strong> o<br />
assunto, por si só, não é capaz <strong>de</strong> mudar o comportamento<br />
das pessoas.<br />
<strong>Concepções</strong> <strong>do</strong> Uso e Atitu<strong>de</strong>s<br />
As concepções <strong>sobre</strong> o uso <strong>de</strong> medicamentos,<br />
conforme os <strong>de</strong>poimentos obti<strong>do</strong>s, <strong>de</strong>monstram que<br />
os profissionais a<strong>do</strong>tam critérios <strong>de</strong> similitu<strong>de</strong> entre<br />
o organismo <strong>do</strong> cliente e o seu próprio organismo<br />
para fazerem uso <strong>de</strong> medicamentos, bem como os utilizam<br />
sem avaliação e prescrição médica. Essas concepções<br />
e atitu<strong>de</strong>s colocam os trabalha<strong>do</strong>res em situação<br />
<strong>de</strong> risco pessoal com forte tendência a interferir<br />
no <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> suas ativida<strong>de</strong>s profissionais.<br />
[...] se o paciente usa e melhora, porque eu não posso<br />
também utilizar [...]. (E40)<br />
Martins ERC, Zeitoune RCG, Francisco MTR, Spin<strong>do</strong>la T, Marta CB<br />
[...] se for preciso eu utilizo, o paciente po<strong>de</strong>, por que eu<br />
não posso? (E35)<br />
Essa compreensão revela uma susceptibilida<strong>de</strong><br />
<strong>do</strong> profissional ao uso irrestrito <strong>de</strong> medicamentos<br />
diante das dificulda<strong>de</strong>s enfrentadas no cotidiano. É<br />
uma maneira <strong>de</strong>formada <strong>de</strong> estabelecer a relação da<br />
necessida<strong>de</strong> pessoal com a legalida<strong>de</strong> 13 .<br />
Uso <strong>de</strong> <strong>Drogas</strong> como Solução para os<br />
Problemas<br />
Nessa perspectiva, nota-se que, <strong>de</strong> um la<strong>do</strong>, há<br />
o fluxo <strong>do</strong> <strong>de</strong>slocamento <strong>de</strong> experiências familiares<br />
para o mun<strong>do</strong> <strong>do</strong> trabalho por conta <strong>de</strong> uma subjetivida<strong>de</strong>;<br />
e <strong>de</strong> outro, a corrente que transporta, para a<br />
vida familiar, <strong>de</strong>terminações <strong>do</strong> trabalho.<br />
[...] são tantos problemas familiares, tantos problemas<br />
no trabalho, que quem sabe se a droga não é a solução<br />
[...]. (E9)<br />
[...] eu tenho tantos problemas em casa, que só uma<br />
bebida para aliviar [...]. (E14)<br />
Conceber o uso <strong>de</strong> drogas, como solução para<br />
alívio <strong>do</strong>s problemas existentes no âmbito familiar e<br />
<strong>do</strong> trabalho, parece constituir-se uma banalização <strong>do</strong><br />
uso <strong>de</strong> substâncias psicoativas, pois se sabe que seus<br />
efeitos são prejudiciais à saú<strong>de</strong>, à família, ao trabalho<br />
e a socieda<strong>de</strong> como um to<strong>do</strong>.<br />
Num primeiro momento, há <strong>de</strong> se pensar sob o<br />
âmbito <strong>do</strong> indivíduo, das necessida<strong>de</strong>s humanas, para<br />
a manutenção da saú<strong>de</strong> e da integrida<strong>de</strong> física e<br />
psicossocial. Então, a droga po<strong>de</strong> ser uma estratégia<br />
<strong>de</strong> fuga para as dificulda<strong>de</strong>s vivenciadas, <strong>de</strong>correntes<br />
<strong>de</strong> diversos fatores.<br />
A Contradição<br />
Fica claro que o profissional traz consigo um<br />
conhecimento <strong>sobre</strong> a droga e seus riscos, no contexto<br />
<strong>de</strong> sua história individual, social, cultural, psicológico,<br />
econômico e religioso, entre outros. Mas po<strong>de</strong>se<br />
notar a contradição em saber <strong>do</strong>s riscos para os<br />
outros e não para si.<br />
[...] acho que ninguém <strong>de</strong>veria usar, se as pessoas tivessem<br />
consciência <strong>do</strong> mal que faz [...]. (E18)<br />
[...] droga faz mal à saú<strong>de</strong> e às vezes é um mal necessário<br />
[...]. (E10)<br />
A socieda<strong>de</strong> tem passa<strong>do</strong> por muitas modificações<br />
nos últimos anos e isso se <strong>de</strong>ve a um conjunto<br />
amplo <strong>de</strong> variáveis como: o <strong>de</strong>semprego, o <strong>de</strong>srespeito<br />
<strong>do</strong> po<strong>de</strong>r público; a globalização; os valores<br />
que estão sen<strong>do</strong> modifica<strong>do</strong>s num ritmo acelera<strong>do</strong>,<br />
sem permitir acomodação equilibrada <strong>do</strong>s pensamentos,<br />
idéias, ações e atitu<strong>de</strong>s. E todas essas variáveis<br />
po<strong>de</strong>m contribuir para mudar o perfil <strong>do</strong>s indivíduos.<br />
Rev. enferm. <strong>UERJ</strong>, Rio <strong>de</strong> Janeiro, 2009 jul/set; 17(3):368-72. • p.371