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Matadores de aluguel: códigos e mediações. na rota - Revista de ...

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subterfúgios e com diversas armadilhas. Esta consciência<br />

me colocou numa posição muito instigante,<br />

metodologicamente, que era a da dúvida e a da incerteza.<br />

Neste sentido, os passos dados foram mais<br />

comedidos e mais cautelosos. Isto po<strong>de</strong> ter prejudicado,<br />

impedido ou limitado gran<strong>de</strong>s vôos. Por outro<br />

lado, a reflexivida<strong>de</strong>, o pensar pesquisando, nos<br />

trouxe com toda clareza, os limites da neutralida<strong>de</strong><br />

e do distanciamento <strong>na</strong>s pesquisas sociológicas. As<br />

verda<strong>de</strong>s ficaram, cada vez mais, no campo do relativismo<br />

e o ato <strong>de</strong> pesquisar mais estimulante, com<br />

menos cânones.<br />

Desvendando o “sistema <strong>de</strong> pistolagem”<br />

Quando se fala <strong>de</strong> pistolagem ou, mais especificamente,<br />

<strong>de</strong> pistoleiros, as pessoas sabem ou pensam<br />

que sabem sobre o assunto <strong>de</strong> que se está tratando.<br />

O pistoleiro seria qualquer “bandido” ou um<br />

homicida que praticou um assassi<strong>na</strong>to, tendo como<br />

arma uma “pistola”. Neste sentido, a pistolagem seria<br />

o coletivo <strong>de</strong> bandidos que cometem assassi<strong>na</strong>tos<br />

usando “pistola”. 4<br />

Penetrando um pouco mais neste tipo <strong>de</strong><br />

homicídio, existe um sistema composto por partes<br />

coor<strong>de</strong><strong>na</strong>das entre si, que concorrem para alcançar<br />

certos resultados, mediados por um conjunto <strong>de</strong> <strong>códigos</strong><br />

e valores sociais.<br />

O crime <strong>de</strong> pistolagem configura-se a partir<br />

da existência do autor material e do autor intelectual,<br />

<strong>na</strong> execução do assassi<strong>na</strong>to. Em outras palavras,<br />

o que diferencia o crime <strong>de</strong> pistolagem dos outros<br />

crimes é a presença <strong>de</strong> dois perso<strong>na</strong>gens: o executor<br />

<strong>de</strong> uma ação nomeada <strong>de</strong> “serviço” ou “trabalho”, e<br />

um segundo, o mandante.<br />

A contratação <strong>de</strong> um pistoleiro tanto po<strong>de</strong><br />

ser realizada, diretamente, pelo mandante do crime,<br />

como po<strong>de</strong> ser mediada por um terceiro. Atualmente,<br />

a contratação <strong>de</strong> um “serviço” ou “trabalho” é<br />

feita, geralmente, por um intermediário, conhecido<br />

como o “corretor da morte”. A presença <strong>de</strong>sse intermediário<br />

representa a institucio<strong>na</strong>lização <strong>de</strong> um<br />

sindicato do crime, com hierarquia e diferenciação<br />

<strong>de</strong> papéis. A existência do “corretor da morte” possibilita<br />

o anonimato do autor intelectual do crime,<br />

46 <strong>Revista</strong> <strong>de</strong> CiênCias soCiais v. 37 n. 1 2006<br />

como também uma “profissio<strong>na</strong>lização” crescente<br />

do pistoleiro.<br />

No fi<strong>na</strong>l do século XIX e começo do século<br />

XX, os executores <strong>de</strong> “serviços” eram conhecidos<br />

por “capangas” ou “jagunços”. Estes ganharam notorieda<strong>de</strong><br />

pelos “trabalhos” executados, a mando<br />

dos gran<strong>de</strong>s proprietários <strong>de</strong> terra, com objetivo <strong>de</strong><br />

resolver litígios entre famílias e “questões” com camponeses.<br />

Os capangas ou jagunços conseguiam sobreviver<br />

às custas <strong>de</strong> violências, garantidos pela<br />

proteção que resultava do po<strong>de</strong>r dos proprietários<br />

<strong>de</strong> terra. Mantinha-se uma impunida<strong>de</strong> para os “homens<br />

fora da lei”, que lhes permitia circularem, normalmente,<br />

<strong>de</strong>ntro das proprieda<strong>de</strong>s rurais e <strong>na</strong>s suas<br />

redon<strong>de</strong>zas.<br />

Nas últimas décadas do século XX, ganha <strong>de</strong>staque,<br />

novamente, a atuação <strong>de</strong> pistoleiros, principalmente,<br />

<strong>na</strong>s resoluções <strong>de</strong> conflitos agrários e disputas<br />

pela representação política. Não se trata mais<br />

<strong>de</strong> jagunços ou capangas. Os pistoleiros, atualmente,<br />

mantêm um distanciamento das ativida<strong>de</strong>s agrícolas,<br />

como também suas carreiras vão se firmando<br />

<strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> contornos menos pessoais, esten<strong>de</strong>ndo-se<br />

a outros estados ou regiões do país.<br />

Se ocorreram profundas mudanças <strong>na</strong>s características<br />

socioeconômicas dos pistoleiros, ao longo<br />

dos anos, a impunida<strong>de</strong> <strong>de</strong>stes e a proteção <strong>de</strong> fortes<br />

grupos econômicos mantêm a continuida<strong>de</strong> do fenômeno.<br />

A profissio<strong>na</strong>lização do pistoleiro é, atualmente,<br />

uma das suas principais características. Ele<br />

se afasta das ativida<strong>de</strong>s econômicas, principalmente<br />

agrícolas, além <strong>de</strong> per<strong>de</strong>r os vínculos com um patrão.<br />

Assim, as ativida<strong>de</strong>s do pistoleiro passam a ser<br />

gerenciadas no interior do sistema <strong>de</strong> pistolagem,<br />

<strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> uma re<strong>de</strong> que ultrapassa os limites <strong>de</strong> uma<br />

proprieda<strong>de</strong> rural, <strong>de</strong> um estado e, mesmo, <strong>de</strong> uma<br />

região. Ele passa, gradativamente, a <strong>de</strong>svincular-se<br />

<strong>de</strong> outras ativida<strong>de</strong>s, sendo comandado, preferencialmente,<br />

por “serviços ilegais”.<br />

As contratações <strong>de</strong> “serviços” são interestaduais<br />

ou inter-regio<strong>na</strong>is, o que exige um <strong>de</strong>slocamento<br />

constante do pistoleiro. Isto possibilita maior segu-

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