16.04.2013 Views

figurações do feminino em frei luís de sousa de almeida garrett

figurações do feminino em frei luís de sousa de almeida garrett

figurações do feminino em frei luís de sousa de almeida garrett

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

FIGURAÇÕES DO FEMININO EM FREI LUÍS DE SOUSA DE ALMEIDA GARRETT<br />

<strong>de</strong> mulher, no texto confundida com o pânico vivi<strong>do</strong> por D. Madalena ao entrar no<br />

palácio <strong>de</strong> D. João <strong>de</strong> Portugal, como fica evi<strong>de</strong>nte no relato <strong>de</strong> Maria:<br />

“Minha mãe, que me trazia pela mão, põe <strong>de</strong> repente os olhos nele e dá um grito,<br />

oh meu Deus!...ficou tão perdida <strong>de</strong> susto, ou não sei <strong>de</strong> quê, que me ia cain<strong>do</strong> <strong>em</strong><br />

cima. Pergunto-lhe o que é; não me respon<strong>de</strong>u: arrebata da tocha, e leva-me com<br />

uma força...com uma pressa a correr por essas casas, que parecia que vinha alguma<br />

coisa má atrás <strong>de</strong> nós. – Ficou naquele esta<strong>do</strong> <strong>em</strong> que a t<strong>em</strong>os visto há oito dias, e<br />

não lhe quis falar mais <strong>em</strong> tal.” (II acto, cena I)<br />

“Aquele esta<strong>do</strong>”, o perdida “não sei <strong>de</strong> quê” são fórmulas vagas para representar<br />

um <strong>de</strong>scontrolo físico e <strong>em</strong>ocional que v<strong>em</strong> justificar mais uma vez a inferiorida<strong>de</strong><br />

natural da mulher <strong>em</strong> relação ao hom<strong>em</strong>, neste caso <strong>em</strong> relação a D. Manuel <strong>de</strong><br />

Sousa Coutinho, “um português às direitas”, <strong>de</strong> qu<strong>em</strong> T<strong>em</strong>o Pais dirá, após o gesto<br />

heróico <strong>de</strong> incendiar a sua própria casa: “aquilo é um hom<strong>em</strong>”.<br />

Nenhuma acção, nenhuma linha <strong>do</strong> texto resgatará D. Madalena <strong>do</strong> <strong>de</strong>stino<br />

traça<strong>do</strong>, <strong>de</strong>stino que existe, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a primeira fala, latente na comparação com Inês <strong>de</strong><br />

Castro (apesar <strong>de</strong> D. Madalena não viver <strong>em</strong> idêntico “engano d’alma le<strong>do</strong> e cego” o<br />

que torna menos trágico, mas talvez mais dramático o seu <strong>de</strong>stino). Creio, todavia,<br />

que a sua morte simbólica manifesta uma estratégia textual cara aos românticos no<br />

senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> confirmar a perda <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> da mulher que ousou seguir o impulso<br />

da paixão, cujo corpo (e criá-lo <strong>em</strong> cena constitui <strong>de</strong>safio <strong>de</strong> monta para qualquer<br />

actriz...) talvez tenha <strong>de</strong>nuncia<strong>do</strong> essa paixão fora <strong>do</strong> seu “esta<strong>do</strong>” e da sua “condição”.<br />

Manuel <strong>de</strong> Sousa Coutinho <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r chamar-lhe “minha mulher”, já que,<br />

<strong>de</strong>sfeito o casal, D. Madalena per<strong>de</strong>u o vínculo ao matrimónio. É como se o “meu<br />

senhor D. João <strong>de</strong> Portugal”, dito a Telmo, nunca tivesse <strong>de</strong>ixa<strong>do</strong> <strong>de</strong> vigorar. Ficamos<br />

então a saber que a mulher per<strong>de</strong> a sua i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> fora da relação com o hom<strong>em</strong>, seja<br />

este o pai ou o mari<strong>do</strong>.<br />

De D. Joana <strong>de</strong> Castro a Sóror Joana<br />

E, justamente por isso, o texto oferece, a par <strong>do</strong> “engano <strong>de</strong> alma le<strong>do</strong> e cego”<br />

<strong>de</strong> Inês <strong>de</strong> Castro com que D. Madalena alimenta a esperança numa felicida<strong>de</strong> completa,<br />

o <strong>de</strong>sengano da con<strong>de</strong>ssa <strong>do</strong> Vimioso que é ex<strong>em</strong>plo <strong>de</strong> abdicação total das coisas <strong>do</strong><br />

mun<strong>do</strong> e <strong>de</strong> si própria. O seu retrato será composto pelos discursos cruza<strong>do</strong>s <strong>de</strong><br />

várias personagens e <strong>de</strong>sse mo<strong>do</strong> se revelará o que cada uma nele coloca, que formas<br />

tomará essa mulher que mu<strong>do</strong>u <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> ao mudar <strong>de</strong> nome. Para D. Madalena,<br />

42 DISCURSOS. SÉRIE: ESTUDOS PORTUGUESES E COMPARADOS<br />

© Universida<strong>de</strong> Aberta

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!