Páginas - ed. 115 - agosto 06.p65 - Arquidiocese de Florianópolis
Páginas - ed. 115 - agosto 06.p65 - Arquidiocese de Florianópolis
Páginas - ed. 115 - agosto 06.p65 - Arquidiocese de Florianópolis
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
6<br />
- Agosto <strong>de</strong> 2006<br />
Conhecendo as cartas <strong>de</strong> São Paulo (29)<br />
Aos Hebreus (1-2): A Palavra Definitiva<br />
Começando a ler a “carta aos<br />
hebreus”, impressiona-nos a sole<br />
nida<strong>de</strong> dos seus quatro versículos<br />
iniciais, uma das passagens certamente<br />
mais profundas do Novo Testamento. O<br />
primeiro versículo é uma síntese brevíssima<br />
<strong>de</strong> toda a Escritura, da convicção <strong>de</strong> que<br />
Deus se revela, se revelou, falou, ao seu<br />
povo: Muitas vezes e <strong>de</strong> muitos modos,<br />
Deus falou outrora a nossos pais, pelos<br />
profetas (1,1). Agora, nestes dias, que são<br />
os últimos, falou-nos por meio do Filho, a<br />
quem constituiu her<strong>de</strong>iro <strong>de</strong> todas as coisas<br />
e pelo qual também criou o universo<br />
(1,2). O “Filho”, portanto, a seguir i<strong>de</strong>ntificado<br />
com Jesus, é a Palavra <strong>de</strong>finitiva do<br />
Pai. Ele é “a Palavra”, como também o<br />
afirma o início do quarto evangelho (Jo 1,1),<br />
é o resplendor da glória <strong>de</strong> Deus, a expressão<br />
do seu ser (1,3). Sendo Ele assim,<br />
“expressão” do Pai e sua Palavra eterna,<br />
tudo o que se po<strong>de</strong>ria e se <strong>de</strong>veria dizer<br />
<strong>de</strong> Deus está dito nele e por Ele. Não<br />
há outro Mestre nem outro Salvador. Só<br />
Ele “tem palavras <strong>de</strong> vida eterna” (Jo 6,68),<br />
é por Ele que Deus nos falou (1,2), foi Ele<br />
quem realizou a purificação dos pecados<br />
e, elevado acima dos anjos, assentou-se<br />
à direita da majesta<strong>de</strong> divina (1,3b-4). Com<br />
esta solene afirmação <strong>de</strong> fé cristológica<br />
começa o autor, que tem coisas importantes<br />
e profundas a nos dizer.<br />
Carta? <strong>de</strong> Paulo? “aos hebreus”?<br />
Sabe-se que as cartas <strong>de</strong> São Paulo<br />
foram colecionadas praticamente por or<strong>de</strong>m<br />
<strong>de</strong> tamanho, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a maior <strong>de</strong>las,<br />
que é a carta aos romanos, primeira da<br />
série, até a penúltima, a menor <strong>de</strong> todas,<br />
a carta a Filêmon. A última, que, por esse<br />
critério, <strong>de</strong>veria ser a menor <strong>de</strong> todas, é<br />
novamente uma carta extensa, com o<br />
mesmo número <strong>de</strong> capítulos que a segunda<br />
carta aos coríntios: é a chamada<br />
“carta aos hebreus”, com treze capítulos.<br />
Por que, então, os colecionadores, ou <strong>ed</strong>itores,<br />
das cartas paulinas, a <strong>de</strong>ixaram<br />
para o fim, dando-lhe um tratamento especial?<br />
É porque perceberam uma série<br />
<strong>de</strong> características próprias <strong>de</strong>sta “carta”,<br />
que não encontramos nas outras. Em primeiro<br />
lugar, ela não se apresenta como<br />
sendo escrita pelo próprio Paulo. Aliás,<br />
nem “carta” é: ela é mais uma homilia do<br />
que “carta”. Seu início é diferente do das<br />
outras cartas do Apóstolo, que sempre<br />
Maior que os anjos<br />
Partindo da reverência que seus irmãos<br />
na fé tributavam aos anjos, o autor começa<br />
argumentando, com textos da Escritura,<br />
para convencê-los da superiorida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Jesus,<br />
tão acima dos anjos quanto o nome<br />
que herdou supera o <strong>de</strong>les (1,4). Nessa<br />
argumentação, falando a bons conhec<strong>ed</strong>ores<br />
da Bíblia, o autor aplica a Jesus certos<br />
textos, lidos segundo a convicção cristã<br />
BÍBLIA<br />
começam com o seu nome e o nome da<br />
comunida<strong>de</strong> ou da pessoa a quem ele<br />
escreve. Mesmo no final, nos quatro<br />
versículos mais “epistolares” (13,22-25),<br />
o autor não se i<strong>de</strong>ntifica como sendo<br />
Paulo – embora fale <strong>de</strong> Timóteo – nem<br />
diz <strong>de</strong> on<strong>de</strong> nem para on<strong>de</strong> escreve. Além<br />
disso, os comentaristas dizem que o<br />
estilo é bem diferente do das outras cartas,<br />
embora seu autor insista igualmente,<br />
como Paulo, na fé e na graça, bem<br />
como na superação da antiga Aliança e<br />
<strong>de</strong> suas instituições. O fato é que na<br />
liturgia não se diz mais, como antigamente,<br />
“leitura da carta <strong>de</strong> São Paulo aos<br />
hebreus”, mas simplesmente, “leitura da<br />
carta aos hebreus”. E esses “hebreus”,<br />
quem são? São ju<strong>de</strong>us, sim, mas já cristãos<br />
e, como ex-ju<strong>de</strong>us, certamente familiarizados<br />
com o culto e o sacerdócio<br />
<strong>de</strong> Israel tais como estão <strong>de</strong>scritos no<br />
Primeiro Testamento. Não sabemos, porém,<br />
on<strong>de</strong> moravam. Seriam os ju<strong>de</strong>us<br />
<strong>de</strong> Roma? ou os <strong>de</strong> Alexandria? ou a comunida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> Jerusalém? O fato é que o<br />
autor, que talvez esteja “na Itália” (cf<br />
13,24), é também convertido do judaísmo,<br />
e quer <strong>de</strong>monstrar que nós, cristãos,<br />
temos um sacerdócio e sacrifício melhores:<br />
Jesus Cristo, oferecendo-se a si<br />
mesmo, instaurou a Nova Aliança, <strong>de</strong>finitivamente<br />
superando toda a “economia”<br />
sacrificial da Antiga.<br />
Conteúdo geral e estrutura<br />
A carta é toda uma leitura alegórica,<br />
interpretativa, do Antigo Testamento. O que<br />
os leitores conhecem – o culto judaico –<br />
serve para explicar o que eles ainda não<br />
compreen<strong>de</strong>m bem: o papel único e <strong>de</strong>finitivo<br />
da salvação que Cristo nos oferece,<br />
pela prática e a entrega <strong>de</strong> sua vida. O<br />
assunto não é, portanto, o sacrifício e sacerdócio<br />
judaicos em si, mas a vida e obra<br />
<strong>de</strong> Jesus que os realiza e supera. A alegoria<br />
parte da semelhança para a diferença.<br />
Há semelhança entre os sacrifícios do<br />
Templo e o sacrifício <strong>de</strong> Jesus. A diferença<br />
é que Jesus não é simplesmente a vítima<br />
<strong>de</strong> um sacrifício cruento, mas alguém<br />
que voluntariamente se entrega até a morte,<br />
por amor. Porque viveu e morreu assim,<br />
Ele substitui os antigos sacrifícios<br />
<strong>de</strong> reconciliação e ensina-nos a fazer da<br />
vida o verda<strong>de</strong>iro sacrifício. A estrutura da<br />
“carta” po<strong>de</strong> ser a seguinte:<br />
do cumprimento, nele, das profecias. E<br />
começa <strong>de</strong>monstrando que a nenhum anjo<br />
Deus falou como fala ao Messias, por<br />
exemplo, no Sl 2,7: Tu és meu Filho, eu<br />
hoje te gerei. Da mesma forma, no Sl 110,1:<br />
Senta-te à minha direita, até que eu ponha<br />
teus inimigos como apoio sob os teus pés.<br />
Atenção à Palavra<br />
Tendo falado dos anjos, o autor recor-<br />
da o respeito que se tem pela Lei, transmitida<br />
por eles, junto com Moisés (cf Gl<br />
3,19). E argumenta: Se assim reverenciamos<br />
a Lei, tanto mais <strong>de</strong>vemos estar<br />
atentos (2,1) à Palavra <strong>de</strong> salvação, no<br />
início promulgada pelo Senhor, e <strong>de</strong>pois<br />
confirmada no meio <strong>de</strong> nós por aqueles<br />
que a tinham ouvido (2,3). E continua:<br />
Deus confirmou o testemunho <strong>de</strong>les com<br />
sinais, prodígios e milagres, m<strong>ed</strong>iante os<br />
dons do Espírito Santo (2,4).<br />
A humilhação que salva<br />
Começando a entrar no seu tema, o<br />
autor cita novamente um Salmo: é o Sl<br />
8,7-8, sobre o ser humano, feito pouco<br />
menor que os anjos, mas a quem todas<br />
as coisas foram submetidas. Aplicandoo<br />
a Jesus, o homem por excelência, o<br />
autor afirma que ainda não vemos que<br />
tudo lhe esteja submetido (2,8), o que à<br />
primeira vista contradiz à sua supereminência<br />
divina, afirmada no início da<br />
carta. Aqui, porém, o autor ressalta a<br />
natureza humana <strong>de</strong> Jesus, na qual ele<br />
sofreu a humilhação da morte, suportando-a<br />
em favor <strong>de</strong> cada um <strong>de</strong> nós (2,9).<br />
De fato, para conduzir muitos filhos à glória,<br />
Deus fez com que Jesus iniciasse a<br />
nossa salvação por sua palavra e a levasse<br />
a bom termo por sua morte, prova<br />
e revelação do seu amor fiel. Esta “salvação”,<br />
o autor a exprime como “santificação”<br />
(2,11), termo caro ao judaísmo,<br />
1) Por que nos impressiona o início<br />
da carta aos hebreus? 2) Trata-se, realmente,<br />
<strong>de</strong> uma “carta”? <strong>de</strong> Paulo? aos<br />
“hebreus”? 3) Qual a semelhança, e<br />
diferença, entre os sacrifícios do Tem-<br />
Para refletir:<br />
Divulgação/JA<br />
equivalendo à “purificação” que, por meio<br />
<strong>de</strong> sacrifícios e abluções rituais, tornava<br />
os oferentes dignos <strong>de</strong> se aproximarem<br />
do Deus santo. Nesse sentido é que Jesus<br />
é o nosso “santificador” e nós somos<br />
os “santificados” (2,11).<br />
Irmão entre irmãos<br />
Citando agora o Sl 22,23, o autor afirma<br />
que Jesus não se envergonha <strong>de</strong> chamar-nos<br />
irmãos (2,11), tendo em comum<br />
conosco a carne e o sangue (2,14). Foi<br />
com essa condição humana, fruto da sua<br />
encarnação, que Ele pô<strong>de</strong> nos libertar, <strong>de</strong>struindo,<br />
com sua morte por amor, o protagonista<br />
do mal. Dessa maneira Ele libertou<br />
os que, por m<strong>ed</strong>o da morte, passavam<br />
a vida toda sujeitos à escravidão (2,15). De<br />
fato, Ele, que não veio em auxílio <strong>de</strong> anjos,<br />
mas da humana <strong>de</strong>scendência <strong>de</strong> Abraão,<br />
fez-se em tudo semelhante a nós, seus<br />
irmãos, e se tornou o nosso sumo sacerdote<br />
misericordioso e digno <strong>de</strong> confiança<br />
(2,16-17). Com esta última afirmação, o<br />
autor se reportava à convicção do judaísmo<br />
<strong>de</strong> que cabia ao sumo sacerdote, presidindo<br />
os sacrifícios, o encargo da<br />
“santificação” e reconciliação do povo com<br />
Deus. Ora, ninguém mais nem melhor do<br />
que Jesus, tendo ele próprio sofrido ao ser<br />
provado (2,18), realizou isso.<br />
Pe. Ney Brasil Pereira<br />
Professor <strong>de</strong> Exegese Bíblica no ITESC<br />
plo e o sacrifício <strong>de</strong> Jesus? 4) Em que<br />
sentido Jesus é o nosso “santificador”<br />
e nós somos os “santificados”? 5) Como<br />
Jesus realizou <strong>de</strong> maneira suprema o<br />
que cabia ao sumo sacerdote?<br />
Faça como Luiz Carlos Pires Senna, <strong>de</strong> <strong>Florianópolis</strong>, escreva para o Jornal<br />
da <strong>Arquidiocese</strong>, responda as questões <strong>de</strong>sta página e participe do sorteio<br />
<strong>de</strong> uma Bíblia, doada por CRUZ ARTE SACRA - Livros e Objetos Religiosos<br />
Católicos (48-9983-4592). Jornal da <strong>Arquidiocese</strong>: rua Esteves Júnior, 447 -<br />
Centro - <strong>Florianópolis</strong>-SC, 88015-530, ou pelo e-mail: jornal@arquifloripa.org.br