Brasil, 10 anos depois: identidade e história pela TV - Unirevista
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<strong>Brasil</strong>, <strong>10</strong> <strong>anos</strong> <strong>depois</strong>: <strong>identidade</strong> e <strong>história</strong> <strong>pela</strong> <strong>TV</strong><br />
Denise Tavares<br />
é construída. Assim, a linguagem do audiovisual se constrói a partir dos equipamentos disponíveis, da<br />
manipulação destes equipamentos que se expressam no que chamamos “estilo” e, claro, a partir das mídias<br />
em que a produção será veiculada. Neste sentido, não se pode ignorar, por exemplo, a relação de distância,<br />
de profundidade de campo, tão diferentes entre cinema e vídeo. Não se pode ignorar, também, os padrões<br />
de resolução da <strong>TV</strong> tão distantes, ainda – em que se considere os avanços do digital – da película. Estas e<br />
outras diferenças técnicas não são desprezíveis, em especial quando localizamos o Cinema Direto como o<br />
estilo que domina a produção documentária dos <strong>anos</strong> 1960 e 1970 no <strong>Brasil</strong> – o que significa incluir Paulo Gil<br />
Soares e a gama de cineastas que participou da primeira fase do Globo Repórter. Ora, o Cinema Direto,<br />
entre outros pontos, inscreve-se em um dos eixos da realização documentarista que sempre inquietou os<br />
cineastas: a mediação da câmera na captação da realidade.<br />
Esta inquietação dos cineastas que assumem o Cinema Direto como estratégia estilística na produção de<br />
documentários, rompendo, entre outras escolas, com a tradição da escola documentarista inglesa marcada<br />
<strong>pela</strong> produção teórica e fílmica de Grierson e, também, questionando os procedimentos de encenação<br />
reverenciados até então pelos cineastas, especialmente após Flaherty e seu Nanook do Norte, no entanto,<br />
não está presente no campo do jornalismo, cuja base de existência é justamente esta relação “direta” com a<br />
realidade. Assim, enquanto os documentaristas discutem as estratégias éticas da abordagem, recuperam<br />
Vertov e o seu “capturar a vida como ela é”, problematizam a “voz” no documentário, enfim, buscam<br />
circular desde os processos de produção à linguagem, o jornalismo não problematiza esta questão, já que<br />
define-se, a priori, como não intervencionista.<br />
Tal postura do jornalismo explica-se facilmente já que é a entrevista que garante, na quase totalidade, a<br />
produção de notícia, de reportagem. Sem a relação direta com a fonte, não há, praticamente, nenhuma<br />
matéria jornalística. Se tal afirmação pode parecer extremamente simplista, vale lembrar Chronique d´um<br />
été, de Jean Rouch e Edgar Morin, realizado em 1960, destacado como um dos marcos de descobertas<br />
potenciais ao documentário cinematográfico, entre outros motivos, por incorporar um procedimento até<br />
então não visto em produções do gênero: instalar uma personagem que faz perguntas diretas a pessoas<br />
aleatórias que circulam numa determinada rua de Paris.<br />
Tal “descoberta”, por assim dizer, que fascinou os documentaristas e que está presente, ainda, nas reflexões<br />
que envolvem a produção do cinema documentário – que chega, inclusive, a questionar sua própria<br />
existência, como Fernão Ramos faz em artigo intitulado O que é documentário? 6 – é assumida hoje, sem<br />
qualquer dificuldade, nas reportagens audiovisuais: cabe ao repórter entrevistar e interpretar, de forma<br />
resumida, sua investigação. E o espectador absorve ou não esta “verdade da realidade”, pautado por suas<br />
referências muito mais em relação ao canal que a veicula ou ao programa que a enquadra. Ou seja, se a<br />
produção cinematográfica documentária problematizou as interferências da câmera, da equipe de filmagem,<br />
da encenação ao logo da trajetória do documentário, criando escolas-referências e pontos de inflexão, o<br />
telejornalismo fixou-se muito mais na discussão em torno da mídia, localizando seu poder de penetração e<br />
personagens aparecem para mim (leitor/espectador) por meio do texto, do filme, da peça. (XAVIER, Ismail in PELLEGRINI,<br />
Tânia - et ali: 2003, p. 65).<br />
6 In Ramos, Fernão e Catani, Afrânio (orgs), Estudos de Cinema SOCINE 2000, Porto Alegre, Editora Sulina, 2001, p.<br />
192/207.<br />
UNIrevista - Vol. 1, n° 3 : (julho 2006)<br />
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