Formação de Professores: a parceria escola ... - Unirevista
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UNIrevista - Vol. 1, n° 2: (abril 2006) ISSN 1809-4651<br />
Resumo<br />
<strong>Formação</strong> <strong>de</strong> <strong>Professores</strong>: a <strong>parceria</strong> <strong>escola</strong>-<br />
universida<strong>de</strong> e os estágios <strong>de</strong> ensino<br />
Dimair <strong>de</strong> Souza França<br />
Doutora em Educação<br />
dimairsf@terra.com.br<br />
Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Mato Grosso do Sul, MS.<br />
Este texto tem como objetivo apresentar algumas reflexões acerca da formação prática <strong>de</strong> futuros professores, a<br />
partir da realização do estágio <strong>de</strong> ensino na <strong>escola</strong> <strong>de</strong> educação básica. O estágio tem se constituído em uma<br />
ativida<strong>de</strong> que se efetiva mediante a inserção no espaço educacional e no contato com os professores que se<br />
dispõem a receber, acompanhar e orientar os futuros professores no processo <strong>de</strong> aprendizagem da docência,<br />
envolvendo assim, as duas instituições. Por isso, é preciso que ambas participem ativamente <strong>de</strong> sua elaboração e<br />
compartilhem as <strong>de</strong>cisões que são tomadas continuamente durante a realização do estágio <strong>de</strong> ensino, visando a<br />
construção coletiva da proposta <strong>de</strong> estágio e a efetivação das ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>la <strong>de</strong>correntes na <strong>escola</strong>. Pensar na<br />
possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> construção <strong>de</strong> <strong>parceria</strong>s universida<strong>de</strong>-<strong>escola</strong> implica, necessariamente, uma maior compreensão<br />
por parte dos profissionais, tanto da <strong>escola</strong> quanto da instituição formadora, acerca <strong>de</strong> seu papel <strong>de</strong> agentes<br />
formadores, da mesma forma que requer compromisso ético e competência no <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong>ssa tarefa, para<br />
que seja possível estabelecer novos parâmetros para a produção <strong>de</strong> práticas comprometidas com uma formação<br />
qualitativamente melhor para os professores.<br />
Palavras-chave: Estágios <strong>de</strong> ensino // <strong>Formação</strong> <strong>de</strong> professores // Parceria <strong>escola</strong>-universida<strong>de</strong><br />
Introdução<br />
O presente texto tem como objetivo apresentar algumas reflexões acerca da temática da formação prática<br />
<strong>de</strong> futuros professores, a partir da realização do estágio <strong>de</strong> ensino na <strong>escola</strong> <strong>de</strong> educação básica.<br />
O estágio tem se constituído em uma ativida<strong>de</strong> que se efetiva mediante a inserção no espaço educacional e<br />
no contato com os professores em exercício que se dispõem a receber, acompanhar e orientar os futuros<br />
professores no processo <strong>de</strong> aprendizagem da docência.<br />
Entretanto, muitas críticas têm sido formuladas à <strong>escola</strong> e, conseqüentemente, aos profissionais do ensino<br />
básico, caracterizando um <strong>de</strong>sgastante processo <strong>de</strong> culpabilização dos professores e da <strong>escola</strong> pelos maus<br />
resultados educacionais. Contudo, os futuros professores necessitam, freqüentemente, entrar em contato<br />
com a realida<strong>de</strong> educacional através do contato com esses profissionais, nas <strong>escola</strong>s campo <strong>de</strong> estágio, para<br />
que possam, sob a orientação <strong>de</strong>stes, <strong>de</strong>sempenhar as ativida<strong>de</strong>s inerentes à docência num processo <strong>de</strong><br />
aprendizagem ainda durante sua preparação formal.<br />
A ação que cada professor em exercício <strong>de</strong>ve <strong>de</strong>sempenhar na ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> orientação aos futuros<br />
professores é, <strong>de</strong>sse ponto <strong>de</strong> vista, uma ação importante e necessária, que não po<strong>de</strong> ser relegada ao<br />
segundo plano, dada sua especificida<strong>de</strong> no contexto da formação dos futuros profissionais.<br />
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<strong>Formação</strong> <strong>de</strong> <strong>Professores</strong>: a <strong>parceria</strong> <strong>escola</strong>-universida<strong>de</strong> e os estágios <strong>de</strong> ensino.<br />
Dimair <strong>de</strong> Souza França<br />
Nesse sentido, o presente trabalho apresenta algumas reflexões acerca <strong>de</strong>ssa prática no sentido <strong>de</strong><br />
contribuir com essa discussão, sinalizando que a atribuição <strong>de</strong> mais uma responsabilida<strong>de</strong> aos professores<br />
da <strong>escola</strong> básica sem a revisão das condições <strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong>sses profissionais po<strong>de</strong> se caracterizar num<br />
retrocesso, haja vista a ampliação da carga horária dos estágios <strong>de</strong> ensino e a ausência <strong>de</strong> medidas que<br />
privilegiem a construção <strong>de</strong> <strong>parceria</strong>s entre a universida<strong>de</strong> e as <strong>escola</strong>s para que tal proposta se efetive <strong>de</strong><br />
forma competente e séria.<br />
O lugar do estágio na <strong>escola</strong> <strong>de</strong> educação básica<br />
Inicialmente, é importante assinalar que o estágio, como um dos componentes da formação prática do<br />
futuro professor, por si só, não forma o professor. No entanto, o seu cumprimento é uma das condições para<br />
que o futuro professor possa obter a sua licença para o exercício da docência.<br />
E a experiência que se tem realizado ao longo dos anos mostra que parece não haver, até o presente<br />
momento, mecanismos a<strong>de</strong>quados que possam propiciar ao futuro professor o contato com a situação <strong>de</strong><br />
ensino. O estágio foi, até bem pouco tempo, o único espaço <strong>de</strong> vivência da situação <strong>de</strong> ensino, resumindo-se<br />
a uma rápida incursão nas salas <strong>de</strong> aulas, tornando-se essa aprendizagem restrita à carga horária estipulada<br />
para esse fim na sua estrutura curricular. Por sua vez, o contato com os professores da <strong>escola</strong> básica tem<br />
sido o eixo principal <strong>de</strong>ssa ativida<strong>de</strong> e a referência para as aprendizagens do futuro professor, embora a<br />
<strong>escola</strong> e seus professores sejam submetidos, continuamente, a um processo <strong>de</strong> crítica generalizada.<br />
Mas, se a formação prática do futuro professor é importante e necessária, acima <strong>de</strong> tudo é preciso acreditar<br />
que os profissionais que ali estão têm algo a oferecer, sim, para os futuros professores. Sem isso, não teria<br />
razão <strong>de</strong> ser. Por que <strong>de</strong>slocar os alunos para a <strong>escola</strong> básica se esse processo nada viesse a acrescentar à<br />
sua formação? Por que interferir na rotina da sala, gerando transtornos e interrupções nas aulas se elas<br />
nada pu<strong>de</strong>ssem dizer para os alunos? Parece imprescindível, então, buscar alguns argumentos que<br />
justificariam essa prática adotada pelos cursos <strong>de</strong> formação <strong>de</strong> professores.<br />
E o primeiro <strong>de</strong>les refere-se à necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ssa vivência compartilhada para o processo <strong>de</strong> aprendizagem<br />
docente, ou seja, a aprendizagem se faz na relação estabelecida com os futuros pares, mediante a aquisição<br />
da experiência da prática social, favorecendo a significação da ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ser professor mediante a<br />
apropriação, pelo futuro professor, dos conhecimentos socialmente elaborados sobre o fazer docente.<br />
Ainda, se a formação prática do futuro professor é uma prerrogativa do curso <strong>de</strong> formação, ela também o é<br />
para as <strong>escola</strong>s <strong>de</strong> uma maneira geral. Há uma estreita relação entre a formação e a atuação, extensiva aos<br />
professores e aos futuros professores, que sinaliza para o caráter <strong>de</strong> complementarida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ambas: não é<br />
possível formar um professor sem que o mesmo tenha tido contato com a sua futura profissão da mesma<br />
forma que é impossível, ou <strong>de</strong>veria ser, ingressar na profissão sem que tenha passado por um processo<br />
formativo qualificado. Essa <strong>de</strong>pendência mútua parece não estar muito evi<strong>de</strong>nte na discussão acerca da<br />
formação prática dos professores, embora <strong>de</strong>va ser vista como uma questão que parece ser fundamental<br />
para a compreensão do processo formativo a que todo professor <strong>de</strong>ve se submeter.<br />
Parece ser importante, também, priorizar essa vivência nas <strong>escola</strong>s e não em espaços artificialmente<br />
preparados para esse fim. O contato com a realida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ensino, como o próprio tema enseja, requer essa<br />
dose <strong>de</strong> realismo e concretu<strong>de</strong> não apenas no que diz respeito à sala <strong>de</strong> aula, mas, principalmente, à <strong>escola</strong><br />
como um todo. A <strong>escola</strong> não se reduz ao ensino na sala <strong>de</strong> aula. Ela precisa ser vista como uma comunida<strong>de</strong><br />
que comporta diferentes atores, assume variados papéis e cumpre uma função específica que é concretizar o<br />
processo <strong>de</strong> ensino-aprendizagem das novas gerações. Nesse caso, o futuro professor precisa tomar contato<br />
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com as ativida<strong>de</strong>s que se <strong>de</strong>senvolvem para além da sala <strong>de</strong> aula, no contato com a direção e coor<strong>de</strong>nação<br />
pedagógica, na comunicação com os pais, na interação com os alunos <strong>de</strong> uma maneira geral. Ou seja, o<br />
aluno estagiário precisa viver a <strong>escola</strong> em toda a sua amplitu<strong>de</strong>, agora não mais como aluno, mas, sim,<br />
direcionando seu olhar como futuro professor para que possa compreen<strong>de</strong>r e situar-se nesse contexto<br />
educativo <strong>de</strong> forma a <strong>de</strong>monstrar competência profissional e compromisso ético para com a sua futura<br />
profissão.<br />
É certo, contudo, que essa é uma tarefa árdua. Tarefa essa que não po<strong>de</strong> ser pretensiosa a ponto <strong>de</strong><br />
acreditar-se acabada ao final <strong>de</strong> quatro anos. Por isso, é preciso que sejam reconhecidas as necessida<strong>de</strong>s<br />
formativas do futuro professor. É preciso, também, que o processo formativo torne-se capaz <strong>de</strong> cumprir seu<br />
papel <strong>de</strong> inseri-lo na carreira profissional e <strong>de</strong> gerar uma aprendizagem sobre o ser professor que dê conta,<br />
ao menos inicialmente, das diferentes dimensões do fazer docente.<br />
Mas, antes <strong>de</strong> tudo, é preciso tornar claro os novos papéis que se atribuem ao professor da <strong>escola</strong> básica no<br />
encaminhamento <strong>de</strong>ssa ativida<strong>de</strong> no interior da <strong>escola</strong>. A própria indicação <strong>de</strong> “professor tutor” feita pelo<br />
Parecer CNE/CP nº 09 (Brasil, 2001) remete para uma questão central nessa discussão que é a utilização<br />
<strong>de</strong>sse conceito em nossa realida<strong>de</strong>. Essa é uma expressão bastante utilizada na literatura internacional<br />
sobre os estágios <strong>de</strong> ensino e atribui aos professores uma função que parece estar bastante evi<strong>de</strong>nte para<br />
esses profissionais, o que não é o caso em nossa realida<strong>de</strong>.<br />
Conforme assinala Terrazzan (2003, p. 70), é preciso conceituar <strong>de</strong> forma clara e consensual os novos<br />
papéis que se atribuem ao professor da <strong>escola</strong> básica, entre eles o <strong>de</strong> atuar na unida<strong>de</strong> <strong>escola</strong>r como um<br />
“tutor local” dos estagiários em formação inicial, que serão seus futuros pares. Concordando com este autor,<br />
a idéia <strong>de</strong>fendida aqui é a <strong>de</strong> que a <strong>escola</strong> é um importante espaço on<strong>de</strong> os futuros professores po<strong>de</strong>m se<br />
aproximar <strong>de</strong> seu objeto <strong>de</strong> trabalho que é o ensino. Igualmente, os professores que recebem esses<br />
estagiários têm uma tarefa específica que é contribuir com o processo formativo a que se submetem esses<br />
alunos quando <strong>de</strong> sua imersão na <strong>escola</strong> para conhecer o processo <strong>de</strong> ensino e <strong>de</strong> aprendizagem que aí<br />
ocorre.<br />
Antes, é preciso evi<strong>de</strong>nciar a relação que os professores em exercício estabelecem com a ação <strong>de</strong> orientação<br />
dos estágios. Que papel os professores se atribuem nessa situação? Quais os limites <strong>de</strong>ssa responsabilização?<br />
E, principalmente, é preciso estabelecer regras claras para que os professores possam efetivamente <strong>de</strong>dicar<br />
parte <strong>de</strong> seu tempo <strong>de</strong> trabalho à orientação e acompanhamento das tarefas docentes dos futuros<br />
professores no espaço <strong>escola</strong>r sem que, com isso, sejam prejudicadas as horas <strong>de</strong> efetivo trabalho junto aos<br />
alunos da educação básica.<br />
Entretanto, transferir à <strong>escola</strong> maior responsabilida<strong>de</strong> na formação <strong>de</strong> professores sem que as relações entre<br />
as <strong>escola</strong>s e a universida<strong>de</strong> sejam <strong>de</strong> fato estabelecidas, sem dar atenção às questões que afetam<br />
diretamente a qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ssa formação como, por exemplo, a disponibilida<strong>de</strong> do professor em exercício<br />
para aten<strong>de</strong>r os futuros professores, a preparação <strong>de</strong>sses profissionais para <strong>de</strong>sempenhar mais uma tarefa,<br />
o mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> “tutoria” a ser constituído, entre outros, configuram uma dificulda<strong>de</strong> a mais a ser enfrentada<br />
nesse processo formativo.<br />
Por isso, é importante reafirmar que a <strong>escola</strong> e os professores <strong>de</strong> educação básica têm uma tarefa<br />
importante e necessária, embora nem sempre seja compreendida assim. Ou seja, os professores que aí<br />
trabalham <strong>de</strong>sempenham um papel formativo importante, juntamente com a instituição formadora, embora<br />
a complexida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ssa tarefa não tenha sido analisada até agora. O que se preten<strong>de</strong>, portanto, é trazer à<br />
discussão essa questão que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> há muito tempo tem sido silenciada, mas que nunca <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> existir ou<br />
<strong>de</strong> se efetivar a <strong>de</strong>speito <strong>de</strong> todas as mazelas e limitações que a mesma sofre em sua execução.<br />
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Dimair <strong>de</strong> Souza França<br />
Muitos estudos já indicavam (Almeida, 1994; Freitas, 1996; Perdigão e Mello, 1995; Piconez, 1994; Pimenta,<br />
1994; entre outros), ainda nos anos <strong>de</strong> 1990, a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> mudança no processo formativo sinalizando,<br />
entre outras coisas, que a aproximação com a realida<strong>de</strong> <strong>escola</strong>r <strong>de</strong>veria ocorrer <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início do curso <strong>de</strong><br />
formação <strong>de</strong> professores tendo em vista a superação do tecnicismo que se refletia na separação entre teoria<br />
e prática. Nesse sentido, a ampliação e a articulação das ativida<strong>de</strong>s práticas eram apontadas como<br />
possibilida<strong>de</strong>s para a formação do professor.<br />
Estamos, evi<strong>de</strong>ntemente, presenciando uma mudança que, apesar <strong>de</strong> não aten<strong>de</strong>r às reivindicações feitas<br />
pelos movimentos organizados <strong>de</strong> educadores e da socieda<strong>de</strong> em toda a sua amplitu<strong>de</strong>, produziu uma<br />
necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> discutir os rumos que essa medida po<strong>de</strong>rá tomar <strong>de</strong> agora em diante. É, portanto, nesse<br />
espaço que essa discussão se situa. Que rumos serão dados a essa ativida<strong>de</strong> no contexto da formação dos<br />
professores? Que papel está reservado aos professores da <strong>escola</strong> básica?<br />
Essas questões indicam, <strong>de</strong> maneira clara, a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> aprofundar a discussão tendo como referência a<br />
atuação dos professores em exercício que recebem, acompanham e orientam essa ativida<strong>de</strong> na <strong>escola</strong><br />
básica. São esses profissionais que, em última instância, foram e continuam sendo conclamados a assumir a<br />
responsabilida<strong>de</strong> pela formação dos futuros professores, no sentido <strong>de</strong> favorecer as primeiras aprendizagens<br />
sobre o processo ensino-aprendizagem e enfrentando, muitas vezes, <strong>de</strong>safios e limitações na realização<br />
<strong>de</strong>ssa tarefa.<br />
Como são esses profissionais que continuarão recebendo os alunos estagiários para iniciá-los em suas<br />
primeiras experiências com o ensino, <strong>de</strong>sempenhando para isso uma tarefa importante e necessária na<br />
formação dos futuros professores, a <strong>de</strong>speito <strong>de</strong> todas as críticas recebidas, é preciso conceituar seu papel<br />
enquanto “professores tutores”, evi<strong>de</strong>nciando que, para além das críticas, essa é uma prática que faz e se<br />
refaz continuamente, num processo permanente <strong>de</strong> aprendizagem e <strong>de</strong>senvolvimento profissional.<br />
A ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> orientação dos estágios <strong>de</strong> ensino e o professor tutor.<br />
Assumir a tarefa <strong>de</strong> orientação aos alunos estagiários (professor tutor), conforme as indicações das<br />
diretrizes <strong>de</strong> formação dos professores, não é uma tarefa simples. É preciso ir muito além e <strong>de</strong>limitar com<br />
mais clareza que tarefas são esperadas <strong>de</strong>sse profissional e em quais condições elas são possíveis <strong>de</strong> serem<br />
realizadas.<br />
Esta é, na verda<strong>de</strong>, uma questão que precisa ser aprofundada nas discussões sobre essa temática, pois que<br />
compreen<strong>de</strong> uma abrangência muito maior em relação à preparação prática dos futuros professores. A<br />
mediação que se faz entre o conhecimento teórico-prático e a prática docente propriamente <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> - e<br />
supõe - uma tarefa específica que é inerente a esses profissionais. Sem a participação efetiva dos<br />
professores, corre-se o risco <strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar aos alunos estagiários, apenas, a tarefa <strong>de</strong> estabelecer as relações e<br />
conexões entre o conhecimento e a sua futura prática profissional.<br />
Há que se ressaltar, portanto, a aproximação à prática docente como uma tarefa que precisa ser direcionada<br />
para o conhecimento do processo <strong>de</strong> ensino que aí ocorre, buscando conhecer suas dimensões e<br />
necessida<strong>de</strong>s, pois conforme aponta Marcelo Garcia (1999), essa etapa <strong>de</strong>ve favorecer a compreensão da<br />
<strong>escola</strong> como um organismo em <strong>de</strong>senvolvimento (caracterizada por uma <strong>de</strong>terminada cultura, clima<br />
organizacional, estrutura <strong>de</strong> funcionamento), levar à compreensão dos problemas <strong>de</strong> ensino como<br />
problemas curriculares (planificação, níveis <strong>de</strong> interpretação do currículo pelos professores, contato com<br />
materiais curriculares e com inovações), enfatizar a observação do ensino (articulação entre o ensino e o<br />
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projeto curricular, fixando-se na análise do ensino em oposição à análise do professor), além <strong>de</strong> se constituir<br />
em um momento <strong>de</strong> socialização (apren<strong>de</strong>r a se comportar como professores).<br />
Desse ponto <strong>de</strong> vista, essa ativida<strong>de</strong> é essencial e precisa ser realizada continuamente, pois que a<br />
aprendizagem da docência se faz na interação entre professores e futuros professores, num processo<br />
permanente <strong>de</strong> conhecimento e reconhecimento do fazer docente, em que ambos partilham formas <strong>de</strong> ser e<br />
<strong>de</strong> estar na profissão, construídas no dia-a-dia da sala <strong>de</strong> aula e no contato direto com os alunos em seu<br />
processo <strong>de</strong> aprendizagem.<br />
Entretanto, em que consiste a ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> orientação dos estágios <strong>de</strong> ensino? Os professores da <strong>escola</strong><br />
básica se apóiam em uma vaga noção do que seja o estágio, tendo como referência a sua vivência como<br />
estagiário. Na maioria das vezes, enten<strong>de</strong>m que o estágio requer a sua colaboração para com o aluno<br />
estagiário, abrindo as portas <strong>de</strong> sua sala <strong>de</strong> aula e reproduzindo situações que acredita serem válidas para a<br />
aprendizagem profissional, porque foi assim na sua prática.<br />
Normalmente, o professor em exercício se encarrega <strong>de</strong> “<strong>de</strong>finir”, ele próprio, o que <strong>de</strong>ve ou não ser feito, o<br />
como fazê-lo e, principalmente, <strong>de</strong>terminar o rumo que essa prática <strong>de</strong>verá seguir. Porém, durante o tempo<br />
que os alunos estagiários permanecem em suas salas, muitas vezes eles não saem da condição <strong>de</strong><br />
“observadores” (França, 2005).<br />
Essa situação parece caracterizar, por um lado, as concepções dos docentes que vêem o<br />
estágio como observação <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>los (Monteiro, 2000), como tem sido até bem pouco tempo, quando se<br />
dispõem a <strong>de</strong>sempenhar a tarefa <strong>de</strong> orientação sem, contudo, provocar interrupção ou transtornos em sua<br />
prática docente. Por outro lado, po<strong>de</strong> também estar sinalizando para a questão da disponibilida<strong>de</strong> (<strong>de</strong> tempo,<br />
<strong>de</strong> espaço, conhecimento disponível, entre outros) para inserir o futuro professor nas primeiras experiências<br />
com o ensino.<br />
Sendo assim, é preciso abordar a questão da responsabilida<strong>de</strong> formativa do “professor tutor”. Essa questão,<br />
especialmente, não tem sido muito discutida em nossa realida<strong>de</strong>. Os professores que recebem os alunos<br />
estagiários não têm muita clareza sobre o que fazer com esses alunos. Talvez porque <strong>de</strong>sconheçam tal<br />
responsabilida<strong>de</strong>. Talvez porque não se dispõem a realizar tal tarefa, por se constituir em uma tarefa a mais<br />
na sua tão <strong>de</strong>svalorizada função docente.<br />
Isso porque, mais do que consentir que o futuro professor permaneça observando a aula e o trabalho do<br />
professor, é preciso <strong>de</strong>monstrar disposição para introduzir esse estagiário nas ativida<strong>de</strong>s que lhes são<br />
próprias. Significa aceitar e querer ensinar algo que já domina e que faz e refaz constantemente. Significa,<br />
também, abrir portas, mostrar caminhos, dialogar, superar os erros, compartilhar os acertos...<br />
E essa tarefa não é tão simples quanto possa parecer. É preciso abrir mão <strong>de</strong> uma rotina estabelecida para<br />
construir novas práticas que incluam os novos aprendizes do ofício. Construir toma o sentido <strong>de</strong> superação<br />
das práticas estabelecidas em função da necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> significar para o futuro professor esse saber fazer<br />
docente e, ao mesmo tempo, re-significar para si próprio um ato que se faz e se refaz continuamente.<br />
É um contínuo, em que o conhecimento se faz experiência e a experiência se faz conhecimento, mediado<br />
pelo trabalho docente. É o professor que constrói a sua práxis e o futuro professor que apreen<strong>de</strong> o<br />
significado <strong>de</strong>ssa práxis do professor que está no exercício da prática profissional, para tomá-la como<br />
referência para a construção <strong>de</strong> sua prática, ainda que provisória.<br />
É nesse espaço que a formação prática precisa ser redimensionada, visando aten<strong>de</strong>r às necessida<strong>de</strong>s<br />
formativas dos futuros professores, num contexto <strong>de</strong> mudança permanente em que não cabe mais a<br />
fragmentação e a parcelarização das ativida<strong>de</strong>s docentes. Como assinala Azzi (1999), o trabalho docente é<br />
um trabalho inteiro e é como tal que precisa ser compreendido pelos futuros professores bem como pelos<br />
profissionais responsáveis por essa formação.<br />
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<strong>Formação</strong> <strong>de</strong> <strong>Professores</strong>: a <strong>parceria</strong> <strong>escola</strong>-universida<strong>de</strong> e os estágios <strong>de</strong> ensino.<br />
Dimair <strong>de</strong> Souza França<br />
Contudo, é inegável que a visão que se tem sobre essa prática, tanto no curso <strong>de</strong> formação como no espaço<br />
<strong>escola</strong>r, tem contribuído, às vezes negativamente, para a construção <strong>de</strong> uma proposta alternativa <strong>de</strong> estágio.<br />
Por isso, é importante retomar, ainda que superficialmente, a discussão sobre essa temática no sentido <strong>de</strong><br />
evi<strong>de</strong>nciar os limites e <strong>de</strong>safios impostos a essa ativida<strong>de</strong>, mas, principalmente, as possibilida<strong>de</strong>s e avanços<br />
<strong>de</strong>sta no processo <strong>de</strong> constituição da docência pelos futuros professores mediante a construção <strong>de</strong> <strong>parceria</strong>s<br />
<strong>escola</strong>-universida<strong>de</strong>.<br />
A possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> construção <strong>de</strong> <strong>parceria</strong>s <strong>escola</strong>-universida<strong>de</strong><br />
Pensar na possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> construção <strong>de</strong> <strong>parceria</strong>s universida<strong>de</strong>-<strong>escola</strong> implica, necessariamente, uma<br />
maior compreensão por parte dos profissionais, tanto da <strong>escola</strong> quanto da instituição formadora, acerca <strong>de</strong><br />
seu papel <strong>de</strong> agentes formadores, da mesma forma que requer compromisso ético e competência no<br />
<strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong>ssa tarefa, pois é preciso avançar na compreensão <strong>de</strong>ssa ativida<strong>de</strong> para que seja<br />
possível estabelecer novos parâmetros para a produção <strong>de</strong> práticas comprometidas com uma formação<br />
qualitativamente melhor para todos os professores.<br />
Esse é um aspecto que está implicado diretamente nas <strong>de</strong>cisões que são tomadas continuamente durante a<br />
realização do estágio <strong>de</strong> ensino. Decisões que passam pela construção coletiva da proposta <strong>de</strong> estágio e pela<br />
efetivação das ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>la <strong>de</strong>correntes na <strong>escola</strong>. Por ser uma ativida<strong>de</strong> que envolve as duas instituições,<br />
é preciso que ambas participem ativamente <strong>de</strong> sua elaboração. Assim sendo, não cabem nesse processo<br />
nem o <strong>de</strong>sconhecimento <strong>de</strong> tarefas e, tampouco, a ausência <strong>de</strong> atribuições específicas para os profissionais<br />
que irão se responsabilizar diretamente pelo processo <strong>de</strong> orientação.<br />
Essa tarefa envolve também a <strong>escola</strong>. Esta carrega consigo a responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> oferecer condições para<br />
que os futuros professores possam interagir com a situação <strong>de</strong> ensino e, principalmente, possam apropriar-<br />
se <strong>de</strong> um saber-fazer advindo da experiência coletiva dos professores. Por isso, a <strong>escola</strong> <strong>de</strong>ve ser vista em<br />
sua tarefa formativa, ou seja, <strong>de</strong>ve propiciar condições para que os futuros professores possam<br />
compreen<strong>de</strong>r sua função social em meio a tantas outras ativida<strong>de</strong>s que lhe são <strong>de</strong>signadas cotidianamente.<br />
Para que tais ativida<strong>de</strong>s possam se efetivar, é necessário que se estabeleça <strong>parceria</strong> entre a universida<strong>de</strong> e<br />
a <strong>escola</strong>, visando, principalmente, a construção <strong>de</strong> propostas que promovam a qualida<strong>de</strong> da formação e<br />
atuação docente. Essa indicação <strong>de</strong>manda uma maior abertura por parte <strong>de</strong> ambas as instituições no sentido<br />
<strong>de</strong> propiciar uma ação colaborativa que <strong>de</strong>fina as bases para a realização dos estágios <strong>de</strong> ensino. Estes não<br />
po<strong>de</strong>m ser pensados apenas no âmbito da universida<strong>de</strong>.<br />
É preciso que a <strong>escola</strong> e, principalmente, os professores em exercício, possam e saibam dizer quais as<br />
necessida<strong>de</strong>s postas pela realida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ensino e que elementos concorrem para a sua consecução tendo em<br />
vista a aprendizagem dos futuros professores. Tal medida <strong>de</strong>ve vir acompanhada <strong>de</strong> outra ainda mais<br />
importante, ou seja, o conhecimento das reais condições <strong>de</strong> trabalho dos professores (salário, tempo<br />
disponível, salas superlotadas, <strong>de</strong>svalorização profissional, críticas exacerbadas dos estagiários) que atuam<br />
na <strong>escola</strong> <strong>de</strong> educação básica e <strong>de</strong> como essas condições afetam diretamente o trabalho docente.<br />
Aqui é preciso retomar a questão do papel reservado à <strong>escola</strong> e ao professor nesse processo. Parece ser<br />
essa a questão <strong>de</strong> fundo. Fávero (1993), ainda no final dos anos <strong>de</strong> 1980 e início <strong>de</strong> 1990, fazia referência<br />
ao estágio como um verda<strong>de</strong>iro “nó górdio”, mostrando o <strong>de</strong>scompasso entre o discurso que afirmava ser o<br />
estágio o elemento <strong>de</strong> integração entre teoria e prática, mas que na realida<strong>de</strong> continuava sendo o<br />
“mecanismo <strong>de</strong> ajuste” na <strong>de</strong>fasagem entre elementos teóricos e trabalhos práticos. Acrescente-se a esse<br />
problema um outro ainda maior – a <strong>de</strong>speito <strong>de</strong> todos os outros já há muito <strong>de</strong>nunciados – que é a<br />
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<strong>Formação</strong> <strong>de</strong> <strong>Professores</strong>: a <strong>parceria</strong> <strong>escola</strong>-universida<strong>de</strong> e os estágios <strong>de</strong> ensino.<br />
Dimair <strong>de</strong> Souza França<br />
responsabilização da <strong>escola</strong> pela formação prática dos futuros professores sem que a mesma tenha tido<br />
oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> discutir essa questão <strong>de</strong> forma abrangente e, conseqüentemente, o <strong>de</strong>sconhecimento por<br />
parte dos profissionais da <strong>escola</strong> <strong>de</strong> sua responsabilida<strong>de</strong> formativa. Esse parece ser o “nó” do estágio<br />
atualmente.<br />
Isso porque, até então, o professor da <strong>escola</strong> básica não teve uma participação efetiva nesse processo. Seu<br />
papel sempre se restringiu em ce<strong>de</strong>r o espaço da sua sala <strong>de</strong> aula para os estagiários, para que ali<br />
pu<strong>de</strong>ssem fazer suas observações e dar sua aula <strong>de</strong> regência, em cumprimento às exigências do curso <strong>de</strong><br />
formação.<br />
Agora lhe é solicitado “compartilhar o processo formativo dos futuros professores” mediante<br />
as mudanças introduzidas na formação <strong>de</strong> professores através das reformas em curso na realida<strong>de</strong><br />
educacional brasileira, sem que ao menos tenha sido ouvido nesse processo. São medidas adotadas <strong>de</strong><br />
“cima para baixo” e que caem exatamente nas mãos dos professores da <strong>escola</strong> básica sem maiores<br />
esclarecimentos a respeito.<br />
Por isso, mais do que “aceitar”, seria preciso “querer” ensinar aos futuros professores como<br />
lidar com o ensino <strong>de</strong>s<strong>de</strong> as primeiras inserções na sala <strong>de</strong> aula. Seria preciso, também, criar mecanismos<br />
que permitissem a esses profissionais <strong>de</strong>stinar um tempo <strong>de</strong> sua ativida<strong>de</strong> profissional para essa tarefa<br />
particularmente importante para a formação prática dos futuros professores.<br />
Essa idéia <strong>de</strong> aplicação, tributária do tecnicismo, que fragmenta o trabalho do professor, acaba<br />
fragmentando também a prática <strong>de</strong> estágio em etapas estanques que não permitem aos futuros professores<br />
compreen<strong>de</strong>r as dimensões do processo <strong>de</strong> ensinar, reduzindo essa prática, quase sempre, a tarefas<br />
<strong>de</strong>scontextualizadas que geram freqüentemente muitas críticas à <strong>escola</strong>, aos professores, ao ensino e ao<br />
trabalho docente.<br />
No que se refere ao papel do professor supervisor <strong>de</strong> estágio, é preciso ter muito cuidado e discernimento<br />
quanto ao alcance <strong>de</strong>ssa tarefa. A tarefa <strong>de</strong> supervisão <strong>de</strong> estágio não po<strong>de</strong> colidir com a atuação do<br />
professor em exercício em seu campo próprio <strong>de</strong> trabalho: a sala <strong>de</strong> aula da <strong>escola</strong> básica. É o professor da<br />
sala que está capacitado a atuar nesse espaço, é ele quem domina os conhecimentos necessários ao bom<br />
andamento do ensino na sua sala <strong>de</strong> aula, é ele quem conhece cada criança que tem sob sua<br />
responsabilida<strong>de</strong> e a quem <strong>de</strong>ve fazer apren<strong>de</strong>r.<br />
A tarefa <strong>de</strong> supervisão dos estágios <strong>de</strong> ensino precisa, então, estar restrita ao espaço que lhe é próprio, qual<br />
seja, o <strong>de</strong> orientar e encaminhar os futuros professores para a prática <strong>de</strong> ensino a fim <strong>de</strong> que se efetive o<br />
contato com a realida<strong>de</strong> da <strong>escola</strong> e da sala <strong>de</strong> aula e possa, <strong>de</strong> fato, vir a conhecer esse espaço <strong>de</strong> atuação<br />
<strong>de</strong> forma direta e realista. E, principalmente, <strong>de</strong> colaborar com o processo <strong>de</strong> re-elaboração dos saberes<br />
inerentes à docência dos futuros professores no sentido <strong>de</strong> mediar esse processo <strong>de</strong> apropriação dos<br />
conhecimentos produzidos historicamente, a partir da inserção na <strong>escola</strong> básica para aí conhecer a realida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> ensino.<br />
E a partir daí, coor<strong>de</strong>nar suas ações, dando aos futuros professores o suporte necessário para que tenham<br />
conhecimento e condições <strong>de</strong> interagir com os professores em exercício, com os alunos, com a comunida<strong>de</strong>,<br />
com os pais, enfim, com a <strong>escola</strong>, e possam, <strong>de</strong> fato, <strong>de</strong>sempenhar, sob orientação e acompanhamento do<br />
professor da sala, as ativida<strong>de</strong>s inerentes ao ensino <strong>de</strong> forma a cumprir a<strong>de</strong>quadamente a finalida<strong>de</strong> do<br />
estágio que é a aprendizagem da docência.<br />
Aos professores tutores cabem a outra parte <strong>de</strong>ssa tarefa: a inserção do futuro professor na realida<strong>de</strong> da<br />
sala <strong>de</strong> aula, permitindo que exerça, sob sua orientação, progressivamente, o ato <strong>de</strong> ensinar em suas<br />
variadas dimensões ou facetas: coor<strong>de</strong>nar a sala, gerir o tempo <strong>de</strong> aprendizagem, gerir a matéria, etc. Essa<br />
tarefa, específica do professor tutor, não po<strong>de</strong> ser realizada pelos professores supervisores <strong>de</strong> estágio, no<br />
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<strong>Formação</strong> <strong>de</strong> <strong>Professores</strong>: a <strong>parceria</strong> <strong>escola</strong>-universida<strong>de</strong> e os estágios <strong>de</strong> ensino.<br />
Dimair <strong>de</strong> Souza França<br />
espaço da sala <strong>de</strong> aula <strong>de</strong>sse último, passando por cima <strong>de</strong> sua autorida<strong>de</strong> e <strong>de</strong> sua autonomia, como<br />
professor responsável por esse espaço. É preciso reconhecer esses limites e atuar conjuntamente, pois, a<br />
situação inversa também não ocorreria.<br />
Reconhecer os espaços <strong>de</strong> atuação e buscar atuar coletivamente na preparação dos futuros professores<br />
parece ser, até esse momento, a postura a<strong>de</strong>quada a ser tomada por ambos nesse processo. É preciso<br />
reconhecer as tarefas específicas, mas, acima <strong>de</strong> tudo, é importante compartilhar as responsabilida<strong>de</strong>s no<br />
limite mesmo <strong>de</strong> intervenção <strong>de</strong> cada um, criando assim uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong> relações que possa efetivamente dar a<br />
sustentação necessária aos futuros professores nesses primeiros passos rumo a sua preparação profissional.<br />
Algumas consi<strong>de</strong>rações...<br />
É a partir <strong>de</strong>ssas consi<strong>de</strong>rações que o presente trabalho procura enfatizar a importância da tarefa<br />
<strong>de</strong>sempenhada pelos professores em exercício bem como a necessida<strong>de</strong> premente <strong>de</strong> construção <strong>de</strong><br />
<strong>parceria</strong>s <strong>escola</strong>-universida<strong>de</strong> para que possa efetivamente atribuir maiores responsabilida<strong>de</strong>s aos<br />
profissionais da <strong>escola</strong> <strong>de</strong> educação básica num contexto <strong>de</strong> responsabilização coletiva pelo processo<br />
formativo dos futuros professores.<br />
Conforme assinala Guarnieri (2004), ainda que não seja uma prática recente das <strong>escola</strong>s receber estagiários,<br />
quando a universida<strong>de</strong> entra em contato com as mesmas, nota-se que os vínculos entre instituição<br />
formadora e <strong>escola</strong>s ainda se mostram frágeis para viabilizar uma proposta <strong>de</strong> formação prática que<br />
pretenda envolver as instituições <strong>de</strong> ensino fundamental como colaboradoras na formação inicial dos<br />
professores.<br />
A necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> os professores em exercício compreen<strong>de</strong>r a importância <strong>de</strong> sua participação nesse<br />
processo, porque só eles po<strong>de</strong>m favorecer essa aprendizagem, parece ser uma questão que até agora não<br />
tem sido muito evi<strong>de</strong>nte. Por isso, é importante fortalecer esses laços mediante tais <strong>parceria</strong>s no sentido <strong>de</strong><br />
garantir à <strong>escola</strong> e aos professores <strong>de</strong> educação básica um espaço efetivo <strong>de</strong> participação nesse processo,<br />
pois tal formação supõe esse contato <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os primeiros anos da formação inicial.<br />
E também, a importância <strong>de</strong> se conquistar espaço na carga horária <strong>de</strong>sses profissionais para que possam, <strong>de</strong><br />
fato, <strong>de</strong>sempenhar essa função reconhecidamente e possam ter garantias <strong>de</strong> que esta não será apenas mais<br />
uma tarefa junto a tantas outras que <strong>de</strong>sempenham sem qualquer remuneração ou reconhecimento. É<br />
preciso criar um mecanismo que garanta a todos os professores dispostos a exercer essa tarefa o tempo e<br />
as condições mínimas para que possam, efetivamente, orientar os futuros professores nesses primeiros<br />
contatos com a docência.<br />
Seria a institucionalização do papel do “professor tutor” nas <strong>escola</strong>s <strong>de</strong> educação básica para aten<strong>de</strong>r aos<br />
alunos estagiários e para prestar-lhes um acompanhamento pormenorizado nesse processo. Isso po<strong>de</strong>ria ser<br />
feito através <strong>de</strong> convênios que viessem garantir uma bolsa <strong>de</strong> estudo para que esses professores pu<strong>de</strong>ssem<br />
ter tempo disponível para se manterem atualizados e integrados à instituição formadora, qualificando-se e<br />
requalificando-se continuamente para exercer a tarefa <strong>de</strong> orientação dos futuros professores no espaço da<br />
<strong>escola</strong> básica. Durante esse contato permanente <strong>de</strong>veria haver um aprofundamento das relações entre os<br />
profissionais envolvidos com a preparação profissional dos futuros professores no sentido da <strong>de</strong>finição <strong>de</strong><br />
propostas conjuntas que pu<strong>de</strong>ssem aten<strong>de</strong>r amplamente suas necessida<strong>de</strong>s formativas nesse contato com a<br />
<strong>escola</strong> básica.<br />
Um fórum <strong>de</strong> discussão permanente em que alunos estagiários, professores tutores e professores<br />
supervisores <strong>de</strong> estágio estivessem continuamente revendo as condições <strong>de</strong> realização do estágio e <strong>de</strong><br />
atuação do futuro professor, além <strong>de</strong> um espaço <strong>de</strong> reflexão coletiva em que os estagiários pu<strong>de</strong>ssem<br />
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contribuir com a <strong>escola</strong> propondo o estudo permanente <strong>de</strong> questões ligadas ao ensino e à educação, sob<br />
orientação estreita dos professores da instituição formadora.<br />
Somente esse reconhecimento ao trabalho efetivado pelos professores tutores po<strong>de</strong>rá garantir que bons e<br />
experientes professores abram, <strong>de</strong> fato, as portas <strong>de</strong> suas salas <strong>de</strong> aula e queiram, antes mesmo <strong>de</strong> aceitar<br />
alunos em suas salas <strong>de</strong> aula, orientar e ensinar esses futuros profissionais, acompanhando-os em suas<br />
inserções pela docência, <strong>de</strong> forma que possam efetivamente constituir-se professores competentes e<br />
compromissados com a realida<strong>de</strong> das <strong>escola</strong>s <strong>de</strong> educação básica.<br />
Cabe, nesse momento, indicar a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> aprofundamento <strong>de</strong>ssa temática mediante a abordagem <strong>de</strong><br />
questões que dizem respeito à atuação dos professores tutores: Como se dá a preparação formal <strong>de</strong>sses<br />
profissionais? Quem são? Qual a sua formação? Que conhecimentos dominam sobre o processo <strong>de</strong><br />
orientação dos estágios <strong>de</strong> ensino?<br />
E, ainda, é preciso reconhecer a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> envolvimento dos futuros professores com a efetivação dos<br />
estágios <strong>de</strong> ensino, pois sem esse envolvimento tais ativida<strong>de</strong>s servirão apenas para cumprir os rituais<br />
impostos pelo curso <strong>de</strong> formação <strong>de</strong> professores, não guardando nenhuma relação com o processo <strong>de</strong><br />
apren<strong>de</strong>r a ensinar.<br />
Nesse caso, é preciso consi<strong>de</strong>rar a disponibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> tempo dos alunos estagiários para o cumprimento das<br />
ativida<strong>de</strong>s relacionadas com o estágio, a disposição para realizar todas as solicitações pertinentes ao curso e,<br />
também, a manifestação <strong>de</strong> interesse por parte <strong>de</strong>sses futuros professores em realizar as ativida<strong>de</strong>s<br />
<strong>de</strong>signadas para esse fim.<br />
A possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> construção e/ou fortalecimento das <strong>parceria</strong>s entre <strong>escola</strong>s e universida<strong>de</strong> precisa ser<br />
colocada em primeiro plano quando a questão é a formação prática dos futuros professores, pois<br />
in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> todas as limitações e dificulda<strong>de</strong>s i<strong>de</strong>ntificadas na realização dos estágios <strong>de</strong> ensino,<br />
não se po<strong>de</strong> esquecer que os futuros professores continuam a<strong>de</strong>ntrando o espaço <strong>escola</strong>r para efetivar o<br />
cumprimento <strong>de</strong>sta prática, entrando em contato com os professores em exercício e com a sala <strong>de</strong> aula, sem<br />
que haja, efetivamente, a adoção <strong>de</strong> medidas que possam garantir a qualida<strong>de</strong> e a continuida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ssa<br />
prática, ficando expostos, muitas vezes, a um processo ina<strong>de</strong>quado e pouco estruturado <strong>de</strong> orientação e<br />
acompanhamento da aprendizagem profissional.<br />
Por outro lado, a aprendizagem docente propiciada pelos estágios <strong>de</strong> ensino no contexto da <strong>escola</strong> <strong>de</strong><br />
educação básica é uma temática recorrente. Isso porque os professores em exercício são portadores <strong>de</strong> um<br />
conhecimento sobre o fazer docente que expressa a síntese <strong>de</strong> um saber pedagógico (Azzi, 1999) e que<br />
possibilita a interpretação do trabalho docente, po<strong>de</strong>ndo servir <strong>de</strong> referência nas aprendizagens dos futuros<br />
professores. Nessa relação, há algo a ser aprendido/ensinado, indicando que o espaço dos estágios <strong>de</strong><br />
ensino po<strong>de</strong> se constituir em uma via <strong>de</strong> mão dupla na construção das <strong>parceria</strong>s <strong>escola</strong>-universida<strong>de</strong>.<br />
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