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brinquedos, brincadeiras e jogos na literatura lobatiana

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UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA<br />

“JÚLIO DE MESQUITA FILHO”<br />

Faculdade de Ciências - Campus Bauru<br />

Licenciatura em Pedagogia<br />

PÂMELA JACQUELINE DE SOUZA CAMARGO<br />

BRINQUEDOS, BRINCADEIRAS E JOGOS NA<br />

LITERATURA LOBATIANA<br />

BAURU<br />

2008


UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA<br />

“JÚLIO DE MESQUITA FILHO”<br />

Faculdade de Ciências - Campus Bauru<br />

Licenciatura em Pedagogia<br />

PÂMELA JACQUELINE DE SOUZA CAMARGO<br />

BRINQUEDOS, BRINCADEIRAS E JOGOS NA<br />

LITERATURA LOBATIANA<br />

Trabalho de Conclusão de Curso<br />

apresentado como exigência parcial para a<br />

Conclusão do Curso de Licenciatura Ple<strong>na</strong><br />

em Pedagogia da Faculdade de Ciências –<br />

UNESP Campus Bauru sob a orientação da<br />

Profa. Dra. Maria do Carmo Monteiro<br />

Kobayashi.<br />

BAURU<br />

2008<br />

1


PÂMELA JACQUELINE DE SOUZA CAMARGO<br />

BRINQUEDOS, BRINCADEIRAS E JOGOS NA LITERATURA<br />

LOBATIANA<br />

Comissão julgadora<br />

FOLHA DE APROVAÇÃO<br />

Trabalho de Conclusão de Curso para obtenção do grau de graduada em<br />

Pedagogia<br />

Profª. Dra. Maria do Carmo Monteiro Kobayashi<br />

_____________________________________<br />

Orientadora<br />

Profª. Dra. Rosa Maria Manzoni<br />

______________________________________<br />

UNESP/Bauru<br />

1ª. Exami<strong>na</strong>dor<br />

Profª. Ms. Hele<strong>na</strong> Aparecida Gica Arantes<br />

_________________________________<br />

USC/ Bauru<br />

2ª. Exami<strong>na</strong>dor<br />

2


Grandes poetas raramente fazem tijolo sem palha.<br />

Eles amontoam todas as coisas excedentes<br />

que podem pedir, tomar de empréstimo ou roubar<br />

de seus predecessores e contemporâneos<br />

e acendem sua luz própria no topo da montanha.<br />

3<br />

Borges


Dedico este trabalho ao meu<br />

esposo, Everton, e aos meus pais,<br />

Cássio e Heloisa, por terem me<br />

incentivado a vencer todos os<br />

obstáculos desta longa caminhada e<br />

por terem acreditado no meu sonho.<br />

4


AGRADECIMENTOS<br />

“Uma amizade verdadeira é o ingrediente de<br />

sentimentos felizes e das lembranças importantes<br />

que marcaram a nossa vida”.<br />

5<br />

(A. D.)<br />

Nos quatro anos em que estive <strong>na</strong> graduação passei por muitas dificuldades,<br />

principalmente neste último ano. Nessa experiência, muitas lágrimas, aflições, risos,<br />

felicidades e alegrias acompanharam-me.<br />

Neste caminho trilhado, muitas pessoas apoiaram-me com gestos, que<br />

expressaram amizade, carinho, amor, compreensão..., e foram esses pequenos<br />

gestos, essas peque<strong>na</strong>s palavras, que me fortaleceram para continuar a caminhada.<br />

Acredito que a todo caminho precisamos de uma força maior, que nos<br />

impulsio<strong>na</strong> e não nos deixa desfalecer jamais. E esta força veio do alto, de um Amor<br />

Supremo, capaz de superar qualquer barreira. Obrigada, Senhor, por ilumi<strong>na</strong>r a<br />

minha vida, me sustentar e por me amar tanto, assim !<br />

E nesta caminhada, quero também agradecer...<br />

...ao meu esposo, Everton, por ter me ajudado em toda minha trajetória universitária<br />

e, principalmente, nesses últimos meses. E o mais importante, por ser compreensivo,<br />

paciente, companheiro em todos os momentos de alegria, tristeza, angústia e<br />

ansiedade... Foi com ele que desabafei, chorei, lamentei meu cansaço, meu<br />

sofrimento, minhas limitações e foram as suas palavras de carinho e de<br />

compreensão que me acalentaram.<br />

...aos meus pais, Cássio e Heloisa, verdadeiros e eternos amigos, tenho muito a<br />

agradecer por tudo o que vocês têm feito e fizeram por mim. Agradeço por acreditar<br />

no meu sonho e me encorajarem para torná-lo realidade.<br />

...à minha irmã, Naiara, a minha cunhada Kelly, a minha sogra Marilda e a minha<br />

amiga Aruane, por terem me ajudado, de infinitas formas, nos momentos em que<br />

muito precisei.


...às amigas: Aline, Bel, Karlinha, Mari e a Polly, por, simplesmente, serem AMIGAS.<br />

Foi muito bom passar quatro anos ao lado delas, o elo que conquistamos <strong>na</strong><br />

faculdade levarei por toda vida. Obrigada a todas por entrarem <strong>na</strong> minha vida e me<br />

deixarem entrar <strong>na</strong> delas.<br />

...a todos os colegas de sala, por passarmos momentos de muita aflição, mas<br />

também de muita descontração. Obrigada por todos os momentos que<br />

compartilhamos !!!<br />

...a minha orientadora Maria do Carmo Kobayashi, por ter sido muito paciente,<br />

compreensiva, por ter respeitado os meus limites, e por todas as contribuições dadas<br />

as quais ajudaram-me nessa empreitada.<br />

...aos membros da banca, Profa. Rosa Maria e Profa. Hele<strong>na</strong>, por terem aceitado o<br />

convite, podendo, assim ,ajudar-me.<br />

...a todos os professores da UNESP com quem tive contato. Sou grata por todo<br />

ensi<strong>na</strong>mento compartilhado.<br />

E a todas as pessoas que, direta ou indiretamente, ajudaram-me durante toda essa<br />

caminhada.<br />

6


Um sítio onde tudo pode acontecer e onde tudo se pode<br />

saber, pois não há o que Do<strong>na</strong> Benta ignore, não há o que<br />

Tia Nastácia não esteja disposta a fazer, não há lugar no<br />

mundo inteiro (da Lua ao Reino das Águas Claras) onde<br />

Narizinho e Pedrinho não tenham vontade de ir... E não<br />

tenham ido! Onde vivem o Burro Falante – um filósofo<br />

conselheiro, o Marquês de Rabicó – um porco capaz de<br />

tudo comer (mesmo o mais importante dos documentos),<br />

graças à sua gulodice insaciável -, o pacato rinoceronte<br />

Quindim... Sem contar o Visconde de Sabugosa – um<br />

sábio sabugo de milho -, e a fantástica boneca Emília.<br />

7<br />

Abramovich


CAMARGO, PÂMELA J.S. Brinquedos, Brincadeiras e Jogos <strong>na</strong> Literatura<br />

Lobatia<strong>na</strong>. Bauru, 2008. 80f. Trabalho de Conclusão de Curso (Licenciatura<br />

Ple<strong>na</strong> em Pedagogia) – Faculdade de Ciências, Campus de Bauru, Universidade<br />

Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”.<br />

RESUMO<br />

Os <strong>brinquedos</strong>, as <strong>brincadeiras</strong>, os <strong>jogos</strong> e as obras de <strong>literatura</strong> infantil são próprios<br />

da infância. Monteiro Lobato foi um divisor de águas <strong>na</strong> <strong>literatura</strong> infantil brasileira,<br />

por inovar esse gênero criando, assim, histórias realmente desti<strong>na</strong>das às crianças,<br />

cativando seu leitor mirim. Neste trabalho, temos como objetivo identificar os<br />

<strong>brinquedos</strong>, as <strong>brincadeiras</strong> e os <strong>jogos</strong> presentes em três obras de Monteiro Lobato:<br />

“Rei<strong>na</strong>ções de Narizinho”, “Caçadas de Pedrinho” e “O Picapau Amarelo”.<br />

Inicialmente, foi feito um breve estudo sobre a história da infância, posteriormente,<br />

ocupamo-nos com a definição e potencialização dos <strong>brinquedos</strong>, das <strong>brincadeiras</strong> e<br />

dos <strong>jogos</strong>. Em seguida, descrevemos o percurso da <strong>literatura</strong> Infantil, da vida e das<br />

obras de Monteiro Lobato. Para fi<strong>na</strong>lizarmos o trabalho, realizamos um estudo<br />

empírico das obras desse estimado autor para que, futuramente, docentes e<br />

profissio<strong>na</strong>is da educação possam utilizar dessa pesquisa para trabalhar com<br />

crianças, fazendo essa ponte dialética entre a Literatura Infantil Lobatia<strong>na</strong> e sua<br />

ludicidade. Ao término dessa pesquisa, podemos afirmar que muitos foram os<br />

<strong>brinquedos</strong>, as <strong>brincadeiras</strong> e os <strong>jogos</strong> encontrados.<br />

Palavras-chave: Ludicidade, Monteiro Lobato, Literatura Infantil e Infância.<br />

8


SUMÁRIO<br />

INTRODUÇÃO 12<br />

CAPÍTULO 1<br />

Os <strong>brinquedos</strong>, as <strong>brincadeiras</strong>, os <strong>jogos</strong> e o desenvolvimento da criança 15<br />

1.1 Breve história da evolução do conceito de infância 15<br />

1.2 O brincar e a brincadeira: o prazer de aprender 17<br />

1.3 Brinquedos: veículo para o imaginário e o lazer 21<br />

1.4 O Jogo: expressão espiritual e social da criança <strong>na</strong> representação<br />

da realidade 23<br />

1.5 O problema da definição 27<br />

CAPÍTULO 2<br />

Monteiro Lobato e Literatura Infantil: prazer e emoção 30<br />

2.1 A Literatura Infantil e a formação da consciência do leitor mirim 30<br />

2.2 Monteiro Lobato: Vida e Obra 36<br />

CAPÍTULO 3.<br />

Rei<strong>na</strong>ções de Narizinho, Caçadas de Pedrinho e O Picapau Amarelo:<br />

onde estão os <strong>brinquedos</strong>, as <strong>brincadeiras</strong> e os <strong>jogos</strong>? 43<br />

3.1 Apresentação das obras a serem a<strong>na</strong>lisadas e dos perso<strong>na</strong>gens do Sítio 43<br />

3.2 Análise das obras selecio<strong>na</strong>das 47<br />

3.2.1 Rei<strong>na</strong>ções de Narizinho 47<br />

3.2.2 Caçadas de Pedrinho 60<br />

3.2.3 O Picapau Amarelo 66<br />

CONSIDERAÇÕES FINAIS 71<br />

REFERÊNCIAS 75<br />

9


LISTA DE TABELAS<br />

Tabela 1 – Cronologia de Monteiro Lobato 39<br />

Tabela 2 – Rei<strong>na</strong>ções de Narizinho 59<br />

Tabela 3 – Caçadas de Pedrinho 65<br />

Tabela 4 – O Picapau Amarelo 70<br />

10


LISTA DE FIGURAS<br />

Figura 1 – Capa do Livro Rei<strong>na</strong>ções de Narizinho 48<br />

Figura 2 – Capa do Livro Caçadas de Pedrinho 60<br />

Figura 3 – Capa do Livro O Picapau Amarelo 66<br />

11


INTRODUÇÃO<br />

As propostas educacio<strong>na</strong>is apontam para a importância, nos anos iniciais de<br />

escolarização, da utilização dos recursos lúdicos como forma de desenvolvimento<br />

pessoal e social da criança. A linguagem cultural própria da criança é o lúdico e é por<br />

meio desse elemento que a criança se comunica tor<strong>na</strong>ndo-se um agente<br />

transformador, obtendo uma aprendizagem significativa, favorecendo a sua<br />

preparação para a vida, assimilando a cultura do meio em que vive, adaptando-se às<br />

condições que o mundo lhe oferece e aprendendo a competir, cooperar e a conviver<br />

como um ser social. Para Huizinga (1980) o elemento lúdico está <strong>na</strong> base do<br />

surgimento e desenvolvimento da civilização.<br />

Para além do lúdico, há o mundo fantástico das histórias, que podem ser<br />

vistas e vividas <strong>na</strong> Literatura Infantil, as quais podem alimentar a imagi<strong>na</strong>ção da<br />

criança. Held (1985) enfatiza que a criança, para se desenvolver de maneira<br />

equilibrada, harmoniosa, tem necessidade do sonho e do imaginário.<br />

A produção cultural para a infância segue os moldes da produção para os<br />

adultos. Mesmo assim, as histórias d’O Sítio do Picapau Amarelo continuam<br />

encantando gerações. Frente a isso, buscou-se conhecer, por meio deste estudo,<br />

quais eram os <strong>brinquedos</strong>, as <strong>brincadeiras</strong> e os <strong>jogos</strong> presentes em três obras<br />

lobatia<strong>na</strong>s: “O Picapau Amarelo”, “Rei<strong>na</strong>ções de Narizinho” e “As Caçadas de<br />

Pedrinho”. Esse escritor ficou conhecido pelo conjunto educativo, instigante e<br />

divertido de seus livros de Literatura Infantil, que totalizam aproximadamente metade<br />

de sua produção literária, marcando gerações e introduzindo milhares de criança no<br />

universo literário. Lajolo (1982) afirma que, <strong>na</strong> obra infantil, encontra-se “o melhor<br />

Lobato”.<br />

É, praticamente, unânime a valorização literária da obra infantil lobatia<strong>na</strong><br />

pelos críticos das últimas décadas. Sandroni (1987), por exemplo, afirma que Lobato,<br />

com seu primeiro livro infantil, i<strong>na</strong>ugura o que se convencionou chamar de fase<br />

literária da Literatura Infantil para crianças e jovens. Essa afirmação é completada<br />

por Penteado (1997) quando esse autor ressalta que, ao longo das últimas nove<br />

décadas, Lobato vem influindo, de forma marcante, <strong>na</strong> formação de inúmeros<br />

brasileiros que têm acesso a suas obras.<br />

Lobato foi um guerreiro e pioneiro <strong>na</strong> Literatura Infantil. Mesmo que, muitas<br />

vezes, mal compreendido, mereceu e merece admiração irrestrita. A genialidade e a<br />

12


singularidade de Lobato, consistem no fato de esse autor mostrar o maravilhoso<br />

como possível de ser vivido por qualquer pessoa, com a mistura do mundo<br />

imaginário e a realidade concreta. Ele mostra, no mundo cotidiano, a possibilidade<br />

de acontecer aventuras maravilhosas.<br />

A escolha pela obra lobatia<strong>na</strong> deve-se às dificuldades em encontrar trabalhos<br />

que relatem sobre a ludicidade em suas obras, pois sabemos o quão fasci<strong>na</strong>nte é o<br />

universo da Literatura Infantil do maior escritor infantil brasileiro. Nesse mirante, o<br />

objeto desta pesquisa é estudar a ludicidade presente em três obras de Monteiro<br />

Lobato.<br />

Desta maneira, acreditamos que os assuntos que serão abordados<br />

contribuirão para engendrar novos trabalhos científicos neste campo de pesquisa.<br />

Desta forma, a importância da pesquisa se justifica pela contribuição pessoal,<br />

científica e social que ela propiciará.<br />

Outro caminho que nos parece possível, implica a formação dos profissio<strong>na</strong>is<br />

que atuam <strong>na</strong> área da educação, pois entendemos que, a partir dos princípios<br />

expostos neste trabalho, não somente os professores, mas, principalmente, os<br />

alunos deles se beneficiarão.<br />

Assim, a questão central da pesquisa é a busca, <strong>na</strong>s obras lobatia<strong>na</strong>s da<br />

cultura lúdica, que é antes de tudo um conjunto de procedimentos que permite tor<strong>na</strong>r<br />

o jogo possível. De acordo com Brougère (1997) a cultura lúdica é composta de certo<br />

número de esquemas que permitem iniciar a brincadeira, já que se trata de produzir<br />

uma realidade diferente daquela da vida cotidia<strong>na</strong>. Por meio do estudo realizado,<br />

notou-se que não existem dados sobre esse fato <strong>na</strong>s áreas envolvidas em nossa<br />

pesquisa, o que fez surgir a seguinte questão: Se existem, quais os <strong>brinquedos</strong>, as<br />

<strong>brincadeiras</strong> e os <strong>jogos</strong> que aparecem <strong>na</strong>s obras de Lobato?<br />

Nesse caminhar, temos como objetivo geral da pesquisa inventariar, em três<br />

obras de Monteiro Lobato (O Picapau Amarelo, Rei<strong>na</strong>ções de Narizinho e As<br />

Caçadas de Pedrinho), os <strong>brinquedos</strong>, as <strong>brincadeiras</strong> e os <strong>jogos</strong> que aparecem com<br />

os perso<strong>na</strong>gens dessas obras.<br />

Como objetivos específicos da pesquisa, temos:<br />

• identificar e descrever as teorias que explicam a relação entre<br />

ludicidade e desenvolvimento infantil;<br />

13


• reconstituir o desenvolvimento da Literatura Infantil, focando sua<br />

importância no desenvolvimento holístico da criança;<br />

• destacar as contribuições de Monteiro Lobato para a <strong>literatura</strong> Infantil;<br />

• investigar <strong>na</strong>s obras: O Picapau Amarelo, Rei<strong>na</strong>ções de <strong>na</strong>rizinho e As<br />

Caçadas de Pedrinho, os <strong>brinquedos</strong>, as <strong>brincadeiras</strong> e os <strong>jogos</strong><br />

apresentados no Sítio do Picapau Amarelo.<br />

Assim, optamos por realizar um estudo de caso que, segundo Gil (1999), é<br />

caracterizado pelo estudo profundo e exaustivo de um ou de poucos objetos, de<br />

maneira a permitir o seu conhecimento amplo e detalhado. Trata-se de um estudo de<br />

caso porque faremos um estudo empírico que investiga um fenômeno atual dentro<br />

do seu contexto de realidade, quando as fronteiras entre fenômeno e o contexto não<br />

são claramente definidas e no qual são utilizadas várias fontes de evidência.<br />

Utilizamos como objeto de pesquisa as obras impressas e eletrônicas que<br />

falam de ludicidade (<strong>brinquedos</strong>, <strong>brincadeiras</strong> e <strong>jogos</strong>), <strong>literatura</strong> infantil e a obra<br />

infantil lobatia<strong>na</strong>. Assim configurou-se em um estudo de levantamento de referencial<br />

bibliográfico impresso e eletrônico.<br />

Na primeira parte do nosso trabalho, fizemos uma viagem à história da<br />

infância, para desvendarmos o surgimento e a valorização da infância. Em seguida,<br />

fizemos um estudo sobre a importância e a definição dos <strong>jogos</strong>, dos <strong>brinquedos</strong> e<br />

das <strong>brincadeiras</strong>. Na segunda parte do trabalho, delineamos o caminho da Literatura<br />

Infantil e sua influência para a criança. Dando seqüência a essa etapa, descrevemos<br />

a vida e obra de Monteiro Lobato. A última parte do trabalho se dá pela análise e a<br />

descrição dos <strong>jogos</strong>, brincadeira e <strong>brinquedos</strong> presentes <strong>na</strong>s três obras de Monteiro<br />

Lobato (Rei<strong>na</strong>ções de Narizinho, Caçadas de Pedrinho e O Picapau Amarelo).<br />

.<br />

14


CAPÍTULO 1 OS BRINQUEDOS, AS BRINCADEIRAS, OS JOGOS E O<br />

DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA.<br />

“A criança joga e brinca dentro da mais perfeita<br />

seriedade, que a justo título podemos considerar<br />

sagrada. Mas sabe perfeitamente que o que está<br />

fazendo é um jogo.”<br />

15<br />

Huizinga<br />

Há muito tempo, estudiosos e pesquisadores advertem sobre a importância dos<br />

<strong>jogos</strong>, dos <strong>brinquedos</strong> e das <strong>brincadeiras</strong> para o desenvolvimento da criança. E<br />

cada vez mais o crescimento de estudos nesta área se alarga de maneira<br />

extraordinária.<br />

Definir <strong>brinquedos</strong>, <strong>brincadeiras</strong> e <strong>jogos</strong> não é tarefa fácil. Mas antes se faz<br />

necessário entendermos um pouco sobre a história da infância, pois esses três<br />

conteúdos fazem parte da infância.<br />

1.1 Breve história da evolução do conceito de infância<br />

Do século XII ao XVII foi um período de grandes transformações históricas, a<br />

infância tomou diferentes conotações em todos os aspectos sociais, culturais,<br />

políticos e econômicos, de acordo com cada período histórico. A criança era vista<br />

como substituível, como ser produtivo que tinha uma função utilitária para a<br />

sociedade, pois, a partir dos sete anos de idade, era inserida <strong>na</strong> vida adulta e<br />

tor<strong>na</strong>va-se útil <strong>na</strong> economia familiar, realizando tarefas, imitando seus pais e suas<br />

mães, acompanhado-os em seus ofícios, cumprindo, assim, seu papel perante a<br />

coletividade.<br />

Neste período, Áries (1981, p. 36), descreve que<br />

[...] a primeira idade é a infância que planta os dentes, e essa idade<br />

começa quando <strong>na</strong>sce e dura até os sete anos, e nessa idade aquilo que<br />

<strong>na</strong>sce é chamado de enfant (criança), que quer dizer não falante, pois<br />

nessa idade a pessoa não pode falar bem nem formar perfeitamente suas<br />

palavras [...] .


Assim, a história da criança contada por Áries (1981) destaca que as crianças<br />

foram tratadas como adultos em miniatura: <strong>na</strong> sua maneira de se vestir, <strong>na</strong><br />

participação ativa em reuniões, festas e danças, “[...] no mundo das fórmulas<br />

românticas, e até o fim do século XIII, não existem crianças caracterizadas por uma<br />

expressão particular, e sim homens de tamanho reduzido [...]” (ÁRIES, 1981, p. 51).<br />

O sentimento de infância inexistia, ou seja, não se tinha consciência dessa<br />

fase distinta e particular do ciclo vital. Dessa forma, as crianças eram submetidas e<br />

preparadas para suas funções dentro da organização social. O desenvolvimento das<br />

suas capacidades se dá a partir das relações que mantêm com os mais velhos.<br />

Portanto, percebe-se uma distância da idade adulta e da infância em perspectiva<br />

cronológica e de desenvolvimento biológico, pois a infância é retratada pelas<br />

afinidades que o adulto estabelece com a criança.<br />

Nesse contexto, as mudanças com relação ao cuidado com a criança, só vêm<br />

ocorrer mais tarde, no século XVII, com a interferência dos poderes públicos e com a<br />

preocupação da Igreja em não aceitar passivamente o infanticídio, antes<br />

secretamente tolerado.<br />

Assim, foi nesse contexto moral que a educação das crianças foi inspirada,<br />

por meio do posicio<strong>na</strong>mento de moralistas e educadores e, principalmente, com o<br />

surgimento da família nuclear gerada dentro dos padrões da cúria: o modelo de<br />

família conservadora, símbolo da continuidade parental e patriarcal que marca a<br />

relação pai, mãe e criança.<br />

Kramer (1982) ressalta que a preocupação da família com a educação da<br />

criança proporcionou a ocorrência de mudanças, a criança que exercia um papel<br />

produtivo direto, como um adulto, passa a ser alguém que precisa ser cuidada,<br />

escolarizada e preparada para uma atuação futura.<br />

É somente a partir do fi<strong>na</strong>l do século XVII que a criança passou a ser<br />

valorizada, surgindo, assim, medidas para garantir sua sobrevivência. As condições<br />

de higiene foram melhoradas e a preocupação com a saúde das crianças levaram os<br />

pais a não mais aceitarem perder seus filhos com <strong>na</strong>turalidade, e os que perdiam,<br />

aceitavam como sendo a vontade de Deus, segundo a orientação religiosa da época.<br />

Com a evolução <strong>na</strong>s relações sociais que se estabelecem <strong>na</strong> Idade Moder<strong>na</strong>,<br />

a criança passa a ter um papel central <strong>na</strong>s preocupações da família e da sociedade.<br />

A nova percepção e organização social fortaleceram os laços entre adultos e<br />

crianças, pais e filhos. A partir deste momento, a criança começa a ser vista como<br />

16


indivíduo social, <strong>na</strong> coletividade, e a família tem grande preocupação com sua saúde<br />

e sua educação.<br />

[...] aparecem também as primeiras instituições educacio<strong>na</strong>is, permitindo a<br />

concepção de que os adultos compreenderam a particularidade da infância e<br />

a importância tanto moral como social e metódica das crianças em<br />

instituições especiais, adaptadas a essas fi<strong>na</strong>lidades [...] (ARIÈS,1981, p.<br />

193).<br />

A partir desse breve resgate da história da infância, retomemos, então, os três<br />

conteúdos, objetos deste capítulo: <strong>brinquedos</strong>, brincadeira e <strong>jogos</strong>.<br />

1.2 O Brincar e a brincadeira: o prazer de aprender<br />

Brincar é uma atividade universal, encontrada nos vários grupos humanos, em<br />

diferentes períodos históricos e no decorrer do desenvolvimento econômico.<br />

Evidentemente, as várias modalidades lúdicas não existem em todas as épocas e<br />

também não permanecem imutáveis através dos tempos. Embora o brincar tenha<br />

feito parte do cotidiano infantil, nem sempre lhe foi dada a devida importância.<br />

Partindo-se de uma perspectiva histórica, desde a Antiguidade as crianças<br />

participavam de diversas <strong>brincadeiras</strong> como forma de diversão e recreação<br />

(WAJSKOP, 1995). Desde a pré-história tem se evidenciado, por meio de vestígios<br />

de <strong>brinquedos</strong> infantis, em várias culturas, e a presença de atividades lúdicas. No<br />

Egito e <strong>na</strong> Grécia, o lúdico também estava presente no dia-a-dia dos adultos, tendo<br />

em vista que era a família que educava os filhos ensi<strong>na</strong>ndo ofícios da arte.<br />

Como toda atividade huma<strong>na</strong>, o brincar se constitui <strong>na</strong> interação de vários<br />

fatores que marcam determi<strong>na</strong>do momento histórico sendo transformado pela própria<br />

ação dos indivíduos e por suas produções cultural e tecnológica. Os <strong>jogos</strong> e as<br />

<strong>brincadeiras</strong> são, assim, transformados continuamente.<br />

Sabe-se que o brincar, desde os tempos remotos, se faz presente <strong>na</strong> vida das<br />

pessoas, mas ganha ênfase e destaque entre psicólogos, estudiosos e pedagogos<br />

somente no inicio do século XVII e meados do século XIX. Brincar é uma atividade<br />

que surge da espontaneidade e da situação que se vivência. Vinhoti (2007), afirma<br />

17


que, para alguns povos, como os indíge<strong>na</strong>s, por exemplo, o ato de uma criança atirar<br />

com o arco e flecha não passa de um trei<strong>na</strong>mento para sua sobrevivência; já para<br />

outros, não passa de uma brincadeira ou um esporte. Para a criança, no entanto, o<br />

ato de brincar vai muito além. Segundo Froebel (1912 apud KISHIMOTO,2002) a<br />

brincadeira é importante para o desenvolvimento da criança, especialmente nos<br />

primeiros anos, ou melhor, desde o seu <strong>na</strong>scimento, quando suas primeiras<br />

<strong>brincadeiras</strong> são as de descobrir o seu próprio corpo. Brincando o bebê se descobre.<br />

Antes de brincar com qualquer tipo de objeto, o bebê brinca consigo mesmo.<br />

Neste estágio de desenvolvimento a criança vai crescendo como um ser<br />

humano que sabe usar seu corpo, seus sentidos, seus membros meramente<br />

por motivo de seu uso ou prática, mas não por busca de resultados [...]. Ela<br />

é totalmente indiferente a isso, ou melhor, ela não tem idéia sobre o<br />

significado disso. Por tal razão a criança neste estágio começa a brincar com<br />

seu membros – mãos, dedos, lábios, línguas, pés, bem como a expressões<br />

dos olhos e face. (FROEBEL, 1912, apud KISHIMOTO, 2002, p. 48).<br />

Depois de brincar com seu próprio corpo, a criança, com o passar do tempo,<br />

busca objetos ao seu redor para que possam dar suporte a sua brincadeira. Temos<br />

os móbiles e chocalhos, como exemplo.<br />

A criança, ao brincar, cria sua própria realidade de acordo com seus próprios<br />

desejos, sua própria fantasia. Agora é ela (a criança) quem comanda a história. E é<br />

nesta dinâmica criativa que Freud (1920) reconhece uma possibilidade de recriação<br />

para o difícil contato com o princípio da realidade.<br />

O brincar é um parceiro de suma importância, isto porque a capacidade de<br />

brincar amplia para todos (crianças, jovens e adultos) novas formas de compreender<br />

o mundo em que vivem por meio do uso de um contexto de faz-de-conta. A<br />

brincadeira é uma forma privilegiada de aprendizagem, por meio da qual as crianças<br />

expressam sua visão de mundo e descobrem a como lidar com situações do<br />

cotidiano. A capacidade de brincar é um si<strong>na</strong>l de saúde mental da criança. Portanto,<br />

ao contrário do que se imagi<strong>na</strong>, as <strong>brincadeiras</strong> não são inconseqüentes.<br />

Segundo Piaget (1978), o brincar é algo <strong>na</strong>tural e indispensável para o<br />

desenvolvimento integral da criança. Para Kishimoto (1999), a brincadeira vem a ser<br />

a concretização de regras e a criança brinca para domi<strong>na</strong>r angústias e controlar<br />

impulsos, assimilando, assim, as emoções e sensações, tirando as provas do eu. A<br />

18


mesma autora complementa que as <strong>brincadeiras</strong> satisfazem os desejos das<br />

crianças, desenvolvem habilidades, ampliam conhecimentos, além de estabelecerem<br />

contatos sociais e levar a criança a compreender melhor o meio em que vive.<br />

Para Froebel (1992 apud KISHIMOTO 2002), brincar é a fase mais importante<br />

da infância, é por meio da brincadeira que a criança representa suas necessidades<br />

inter<strong>na</strong>.<br />

[...] a brincadeira é a atividade espiritual mais pura do homem neste estágio<br />

e, ao mesmo tempo, típica da vida huma<strong>na</strong> enquanto um todo- da vida<br />

<strong>na</strong>tural inter<strong>na</strong> no homem e de todas as coisas. Ela dá alegria, liberdade,<br />

contentamento, descanso externo e interno, paz no mundo [...]. A criança<br />

que brinca sempre, com determi<strong>na</strong>ção auto-ativa, perseverando,<br />

esquecendo sua fadiga física, pode certamente tor<strong>na</strong>r-se um homem<br />

determi<strong>na</strong>do, capaz de auto-sacrificio para a promoção do seu bem e dos<br />

outros [...]. Como sempre indicamos, o brincar em qualquer tempo não é<br />

trivial, é altamente sério e de profunda significação. (FROEBEL, 1912, apud<br />

KISHIMOTO, 2002, p. 68)<br />

A brincadeira, para esse autor, é postulada como uma ação metafórica, livre e<br />

espontânea da criança. Aponta no brincar, características como atividades<br />

representativas, prazer, autodetermi<strong>na</strong>ção, valorização do processo de brincar,<br />

seriedade do brincar, expressão de necessidades e tendências inter<strong>na</strong>s.<br />

Bruner (1978) afirma que a brincadeira proporcio<strong>na</strong> à criança o aprender a<br />

solucio<strong>na</strong>r problemas. Nas <strong>brincadeiras</strong>, as crianças têm inúmeras oportunidades de<br />

explorar seu potencial e, quando necessário, com peque<strong>na</strong> supervisão do adulto,<br />

solucio<strong>na</strong>m problemas. Esse autor entende supervisão como um sistema de trocas<br />

interativas. O supervisor procede <strong>na</strong> orientação conforme as necessidades das<br />

crianças, a fim de engajá-lo <strong>na</strong> a ação da resolução de problemas.<br />

De acordo com Winnicott (1975), o brincar facilita o crescimento e, em<br />

conseqüência, promove a saúde. O brincar também contribui para a aprendizagem<br />

da linguagem. Para ser capaz de falar sobre o mundo, a criança precisa saber<br />

brincar com o mundo, tendo oportunidades de brincar com a linguagem e o<br />

pensamento.<br />

A brincadeira pode ser caracterizada, segundo Bomtempo (1987), como uma<br />

atividade ou uma ação própria da criança, voluntária, espontânea, delimitada no<br />

tempo e no espaço, prazerosa, constituída por reforçadores positivos intrínsecos.<br />

19


Para Cunha (1994) várias são as formas de se brincar, como o brincar sozinho;<br />

brincar de faz-de-conta, brincar com outras pessoas; brincar em grupo; brincar<br />

correndo, saltando, jogando bola; brincar experimentando e desenvolvendo<br />

habilidades; brincar inventando; brincar aprendendo; brincar jogando e competindo.<br />

As situações imaginárias, de acordo com Vygotsky (1984), estimulam a<br />

inteligência e desenvolvem a criatividade da criança. Esta é uma forma de brincar<br />

mais fundamental para um desenvolvimento infantil saudável, razão pela qual o “fazde-conta”<br />

infantil deve ser tratado e subsidiado com seriedade.<br />

Dentre as <strong>brincadeiras</strong> realizadas pelas crianças, <strong>na</strong> faixa etária dos três aos<br />

sete anos, o faz-de-conta é a que mais desperta o interesse e tem sido estudada em<br />

detalhes. Alguns pesquisadores que trabalham com as teorias do desenvolvimento<br />

cognitivo, dentre eles Oliveira (1996), destacam a importância do faz-de-conta como<br />

uma atividade complexa e constituinte da criança.<br />

Piaget (1978, p. 76), face ao desenvolvimento do pensamento infantil, afirma<br />

que a brincadeira de faz-de-conta:<br />

[...] está intimamente ligada ao símbolo, uma vez que por meio dele, a<br />

criança representa ações, pessoas ou objetos, pois estes trazem como<br />

temática para essa brincadeira o seu cotidiano (contexto familiar e escolar)<br />

de uma forma diferente de brincar com assuntos fictícios, contos de fadas ou<br />

perso<strong>na</strong>gens de televisão.<br />

Neste sentido, ele diz que o pensamento da criança peque<strong>na</strong> não é<br />

suficientemente preciso e maleável para comunicar um conjunto de idéias, então, o<br />

símbolo assume a função de mediador, dando oportunidade à criança de expressar<br />

seu pensamento.<br />

Na teoria piagetia<strong>na</strong>, a brincadeira não recebe uma conceituação específica.<br />

Em síntese, Piaget (1978) adota o uso metafórico vigente <strong>na</strong> época, da brincadeira<br />

como conduta livre, espontânea, que a criança expressa sua vontade e pelo prazer<br />

que lhe dá. Para o autor, ao manifestar a conduta lúdica, a criança demonstra o nível<br />

de seus estágios cognitivos e constrói conhecimentos.<br />

Por meio de uma brincadeira a criança revela seus traumas e conflitos. As<br />

crianças trazem no pensamento, <strong>na</strong>s emoções ou <strong>na</strong> forma de brincar a maneira<br />

como foram olhadas e percebidas pelos outros. Ao brincar, a criança não se situa só<br />

20


no momento presente; mas também, no seu passado e no seu futuro. É<br />

simbolizando, falando e representando os conteúdos que a perturbaram que ela<br />

pode nomear e conhecer melhor as situações, idéias, pessoas e coisas.<br />

Existem muitas funções no ato de brincar, e elas se manifestam nos diferentes<br />

tipos de <strong>brinquedos</strong> e <strong>brincadeiras</strong>. Por isto, não existe uma maneira certa ou errada<br />

de brincar, mas ape<strong>na</strong>s a necessidade de tempo, espaço e materiais adequados<br />

para cada faixa etária.<br />

Aludindo ao principal conceito da teoria de Vygotsky (1989), que é o de Zo<strong>na</strong><br />

de Desenvolvimento Proximal, que ele define como a diferença entre o<br />

desenvolvimento atual da criança e o nível que atinge quando resolve problemas<br />

com auxílio, o que leva à conseqüência de que as crianças podem fazer mais do que<br />

conseguiriam fazer por si sós.<br />

Para Vygotsky (apud Wajskop,1999), a brincadeira cria para as crianças uma<br />

Zo<strong>na</strong> de Desenvolvimento Proximal que não é outra coisa senão a distância entre o<br />

nível atual de desenvolvimento, determi<strong>na</strong>do pela capacidade de resolver<br />

independentemente um problema, e o nível de desenvolvimento potencial,<br />

determi<strong>na</strong>do através da resolução de um problema, sob a orientação de um adulto,<br />

ou de um companheiro mais capaz.<br />

De acordo com Vygotsky, segundo Negrine (2002), o brincar cria uma “zo<strong>na</strong> de<br />

desenvolvimento proximal”, a qual prevê que a criança supere diariamente sua<br />

condição real, uma vez que o brincar é considerado em si só uma fonte de<br />

desenvolvimento. Nos seus estudos, afirma que o indivíduo amadurece porque é<br />

capaz de aprender, ao contrário do que pensa a maioria dos psicólogos<br />

contemporâneos. Para ele, entre o biológico e o meio não existem fronteiras,<br />

considerando o segundo como impulsio<strong>na</strong>dor.<br />

1.3 Brinquedos: veículo para o imaginário e o lazer<br />

Vygotsky (1989) afirma que:<br />

21


[...] é enorme a influência do brinquedo no desenvolvimento de uma criança.<br />

É no brinquedo que a criança aprende a agir numa esfera cognitiva, ao invés<br />

de numa esfera visual exter<strong>na</strong>, dependendo das motivações e tendências<br />

inter<strong>na</strong>s, e não por incentivos fornecidos por objetos externos. (VYGOTSKY,<br />

1989, p. 109).<br />

Kishimoto (1999) acredita que o brinquedo é o objeto de suporte da brincadeira,<br />

qualquer que seja sua <strong>na</strong>tureza. Ressalta também que o brinquedo tem uma<br />

dimensão material, cultural e técnica. É o estimulante material para fazer fluir o<br />

imaginário infantil, tendo relação estreita com o nível de seu desenvolvimento.<br />

Brinquedos são diversos objetos, tanto instrumentais quanto fantasiosos, que<br />

intervêm no desenvolvimento da criança, voltado única e especialmente para o lazer.<br />

Qualquer objeto <strong>na</strong> mão de uma criança pode se tor<strong>na</strong>r um brinquedo. Para<br />

Winnicott (1975) esses objetos são transicio<strong>na</strong>is porque não podemos dizer de que<br />

lado eles se situam <strong>na</strong> dialética reduzida, e encar<strong>na</strong>da, da aluci<strong>na</strong>ção e do objeto<br />

real. Já para Lacan (1995, p. 34) são objetos imaginários.<br />

Todos os objetos de <strong>jogos</strong> da criança são objetos transicio<strong>na</strong>is. Os<br />

<strong>brinquedos</strong>, falando propriamente, a criança não precisa que lhe sejam<br />

dados, já que cria a partir de tudo o que lhe cai <strong>na</strong>s mãos. São objetos<br />

transicio<strong>na</strong>is. A propósito destes, não é preciso perguntar se são mais<br />

subjetivos ou maus objetivos- eles são de outra <strong>na</strong>tureza. Mesmo que o<br />

sr.Winnicott não ultrapasse os limites chamando-os assim, nós vamos<br />

chama-los, simplesmente de imaginários.<br />

Os <strong>brinquedos</strong> ajudam no desenvolvimento da vida social da criança,<br />

especialmente aqueles usados em <strong>jogos</strong> cooperativos. Eles são de vital importância<br />

para o desenvolvimento e a educação da criança por propiciar o desenvolimento<br />

simbólico, estimular sua imagi<strong>na</strong>ção, sua capacidade de raciocínio e sua autoestima<br />

Segundo Benjamin (1984), quando a criança brinca, além de conjugar materiais<br />

heterogêneos (pedra, areia, madeira e papel), ela faz construções sofisticadas da<br />

realidade e desenvolve seu potencial criativo, transforma a função dos objetos para<br />

atender seus desejos. Assim, um pedaço de madeira pode virar um cavalo; com<br />

areia, ela faz bolos, doces para sua festa de aniversário imaginária; e, ainda,<br />

cadeiras se transformam em trem, em que ela tem a função de conduto, imitando o<br />

adulto .<br />

22


[...] a criança quer puxar alguma coisa, tor<strong>na</strong>-se cavalo, quer brincar com<br />

areia e tor<strong>na</strong>-se padeiro, quer esconder-se, tor<strong>na</strong>-se ladrão ou guarda e<br />

alguns instrumentos do brincar arcaico desprezam toda a máscara<br />

imaginária (<strong>na</strong> época, possivelmente vinculados a rituais): a bola, o arco, a<br />

roda de pe<strong>na</strong>s e o papagaio, autênticos <strong>brinquedos</strong>, tanto mais autênticos<br />

quanto menos o parecem ao adulto. (BENJAMIN, 1984, p. 76-77).<br />

Aberastury (1992) afirma que Freud identificou uma das razões pelas quais o<br />

brinquedo é terapêutico porque a criança passa por muitos momentos difíceis, e o<br />

brinquedo a ajuda a controlar imagi<strong>na</strong>riamente essas situações. Assim :<br />

[...] O brinquedo possui muitas características dos objetos reais, mas pelo<br />

seu tamanho, pelo fato de que a criança exerce domínio sobre ele,<br />

transforma-se num instrumento para o domínio de situações penosas,<br />

difíceis, traumáticas que se engendram <strong>na</strong>s relações com objetos reais.<br />

Além disso, o brinquedo é substituível e permite que a criança repita à<br />

vontade situações prazenteiras e dolorosas que, entretanto, ela por si<br />

mesma não pode reproduzir no mundo real. Ao brincar, a criança desloca<br />

para o exterior os seus medos, angústias e problemas internos, domi<strong>na</strong>ndoos<br />

por meio da ação. (ABERASTURY, 1992, p. 11).<br />

1.4 O jogo: expressão espiritual e social da criança <strong>na</strong> representação da<br />

realidade.<br />

O histórico do jogo infantil tem como base fundamental toda experiência lúdica<br />

da criança, e quando aqui falamos em jogo nos referimos a toda atividade recreativa<br />

que a criança utiliza para brincar.<br />

Segundo Brougère (1995 apud KISHIMOTO 2002), o jogo é, também, uma<br />

forma de socialização que prepara a criança para ocupar um lugar <strong>na</strong> sociedade<br />

adulta. Nos <strong>jogos</strong> estão presentes a sociabilidade, a negociação e o surgimento do<br />

espírito de equipe. O jogo livre oferece à criança a oportunidade inicial e a mais<br />

importante para atrever-se a pensar, a falar e a ser ela mesma.<br />

Huizinga (1980), por exemplo, ao estudar os <strong>jogos</strong> como elemento da cultura,<br />

afirma ser impossível termos a exata definição do jogo, apesar deste fazer parte da<br />

vida. Adverte que os conceitos de jogo não devem se confundir com os pensamentos<br />

utilizados para expressar a estrutura da vida espiritual e social, pois, se assim for,<br />

23


deveremos nos limitar a descrever suas principais características, ao invés da<br />

preocupação em tentar defini-lo. Em suas palavras:<br />

O jogo é uma função da vida, mas não é passível de definição exata em<br />

termos lógicos, biológicos ou estéticos. O conceito de jogo deve<br />

permanecer distinto de todas as outras formas de pensamento através das<br />

quais exprimimos a estrutura da vida espiritual e social. Teremos, portanto,<br />

de limitarmos a descrever suas principais características. (HUIZINGA, 1980,<br />

p. 10).<br />

Piaget (1998), também contribui com o estudo do jogo. Ele acredita que o jogo<br />

é essencial <strong>na</strong> vida da criança. De início tem-se o jogo de exercício que é aquele em<br />

que a criança repete uma determi<strong>na</strong>da situação por puro prazer, por ter apreciado<br />

seus efeitos, já os <strong>jogos</strong> simbólicos satisfazem a necessidade da criança de não<br />

somente relembrar mentalmente o acontecido, mas de executar a representação.<br />

Quando observamos o brincar das crianças, podemos notar a relação da<br />

brincadeira com a sua realidade, bem como as suas emoções. Bomtempo (2001)<br />

acrescenta que, no jogo simbólico, as crianças constroem uma ponte entre a<br />

realidade e a fantasia.<br />

Acompanhando os estudos de Piaget (1998), podemos verificar que o jogo<br />

constitui-se em expressão e condição para o desenvolvimento infantil, já que as<br />

crianças, quando jogam assimilam e podem transformar a realidade. De acordo com<br />

esse autor, a criança pode reagir pelo jogo contra um medo ou realizar pelo jogo o<br />

que não atreveria a fazer <strong>na</strong> realidade tor<strong>na</strong>ndo-se este, então, catártico. Para ele,<br />

<strong>na</strong> presença de situações penosas e desagradáveis, a criança pode apresentar um<br />

tipo de jogo simbólico caracterizado de combi<strong>na</strong>ções liquidantes em que a criança<br />

procura reviver a situação mediante transposições simbólicas.<br />

Piaget (1978) classifica o desenvolvimento da criança em vários estágios, e<br />

falando em jogo, separa as fases em que a criança ape<strong>na</strong>s realiza o exercício (jogo<br />

sensório-motor), sendo substituído pelo jogo de símbolo e este, por sua vez, pelo<br />

jogo de regras. O autor classifica os <strong>jogos</strong> numa ordem evolutiva e o<br />

desenvolvimento da criança, quanto ao que se refere à capacidade mental, também<br />

é classificado em etapas.<br />

Piaget (1978), ao realizar a criação de seu método clínico, elabora a proposta<br />

de estágios de construção do pensamento. O segundo período de desenvolvimento<br />

24


da inteligência da criança, o Pré-Operatório, destaca o jogo simbólico como uma das<br />

características marcantes desse período. Para ele, o jogo simbólico tem a<br />

compensação como uma das caracterizações, ou seja, por meio do jogo simbólico a<br />

criança pode tor<strong>na</strong>r real algo que não é possível em sua realidade, tal como sonhos<br />

e desejos. Assim, <strong>na</strong> criança, a imagi<strong>na</strong>ção criadora, surge em forma de jogo,<br />

instrumento primeiro de pensamento no enfrentamento da realidade.<br />

Tratando-se dos estágios gerais da atividade representativa para Piaget<br />

(1978), há três formas de pensamento representativo que são: a imitação, jogo<br />

simbólico e a representação cognitiva. Piaget caracteriza os <strong>jogos</strong> em três grandes<br />

tipos de estruturas: <strong>jogos</strong> de exercício, simbólico e de regras. O jogo de exercício,<br />

que ocorre entre 0 a 2 anos, é, portanto, o primeiro a aparecer e o que caracteriza o<br />

desenvolvimento pré-verbal, a partir o qual tem-se início o jogo simbólico. O jogo<br />

simbólico, então , compreende o período entre 2 a 6 ano. Neste, o símbolo implica a<br />

representação de um objeto ausente, (o jogo de faz de conta), visto ser comparação<br />

entre um elemento dado e outro imagi<strong>na</strong>do. A terceira grande categoria é o jogo de<br />

regras. Ao invés do símbolo o jogo de regras supõe, necessariamente, relações<br />

sociais ou interindividuais e se inicia a partir dos sete anos. A regra é imposta pelo<br />

grupo, de tal sorte que sua violação representa uma falta.<br />

Em sua teoria do desenvolvimento cognitivo, Vygotsky (1984) também faz<br />

referência à imitação da realidade, porém, o mais importante é a imagi<strong>na</strong>ção da<br />

criança. Para esse autor a regra é a imagi<strong>na</strong>ção. Ao brincar, a criança cria uma<br />

situação imaginária, com regras próprias. Vygotsky (1984) considera que toda<br />

brincadeira ou jogo tem símbolo (imaginário) e regra. Inicialmente, as regras podem<br />

não estar explícitas, com a evolução da brincadeira, estas passam a ser claras.<br />

Vygotsky (1984) estabelece uma relação estreita entre o jogo e a<br />

aprendizagem, atribuindo-lhe uma grande importância. Para que possamos melhor<br />

compreender essa importância é necessário que recordemos algumas idéias de sua<br />

teoria do desenvolvimento cognitivo. A principal é que o desenvolvimento cognitivo<br />

resulta da interação entre a criança e as pessoas com quem mantém contatos<br />

regulares. Esse autor considera que o desenvolvimento ocorre ao longo da vida e<br />

que as funções psicológicas superiores são construídas ao longo dela.<br />

Na visão sócio-histórica de Vygotsky (1989) o jogo é uma atividade específica<br />

da infância em que a criança recria a realidade usando sistemas simbólicos. Essa é<br />

25


uma atividade com contexto cultural e social. É uma atividade huma<strong>na</strong> criadora, <strong>na</strong><br />

qual a imagi<strong>na</strong>ção, fantasia e realidade interagem <strong>na</strong> produção de novas<br />

possibilidades de interpretação, de expressão e de ação pelas crianças, assim como<br />

de novas formas de construir relações sociais com outras pessoas.<br />

Segundo Negrine (1994), os autores Vygotsky e Piaget diferem numa<br />

questão. Para o primeiro, o jogo evolui do jogo de regras ocultas ao jogo de regras<br />

manifestas; já para o segundo, a evolução se dá do símbolo para o jogo de regras.<br />

Na visão de Negrine (1994), o comportamento da criança, no jogo, assim<br />

como o significado simbólico do mesmo, não depende do local onde ela joga, a<br />

criança não depende de outra para jogar; mesmo que esteja sozinha, ela pode jogar<br />

simbolicamente. O fator cultural evidenciado nos <strong>jogos</strong> é outro ponto divergente entre<br />

os autores. Negrine (1994) acredita que o meio em que a criança vive exerce<br />

influência no conteúdo do jogo, a criança tem a capacidade de assumir uma<br />

variedade de papéis e isso pode ocorrer mesmo num curto período de tempo.<br />

Negrine (1994, p. 29) destaca que “ [...] para Wallon o jogo se confunde muito<br />

com toda atividade global da criança, [...] o jogo para as crianças é expansão, e<br />

nesse sentido se opõe à atividade ‘séria’ que é o trabalho” .<br />

O jogo para Campagne (1989 apud KISHIMOTO 1992), difere entre o jogo<br />

com a função lúdica e o jogo com a função educativa.<br />

O jogo com sua função lúdica de propiciar diversão, prazer e mesmo<br />

desprazer ao ser escolhido de forma voluntária e o jogo com sua função<br />

educativa, aquele que ensi<strong>na</strong>, complementando o saber, o conhecimento e a<br />

descoberta do mundo pela criança. (CAMPAGNE 1989, apud KISHIMOTO,<br />

1992, p. 28).<br />

De acordo com Kishimoto (1999), a criança evolui com o jogo e o jogo da<br />

criança vai evoluindo paralelamente ao seu desenvolvimento, ou melhor, integrado<br />

ao seu desenvolvimento. Independente de época, cultura e classe social, os <strong>jogos</strong> e<br />

os <strong>brinquedos</strong> fazem parte da vida da criança, pois elas vivem num mundo de<br />

fantasia, de encantamento, de alegria, de sonhos, onde realidade e faz-de-conta se<br />

confundem.<br />

Esses autores citados anteriormente tem uma certa proximidade em suas<br />

referências teóricas, mas como também são profissio<strong>na</strong>is de diversas áreas e<br />

utilizam de suportes teóricos de sua área de origem – o que, de certa forma,<br />

26


enriquece e pluraliza as concepções acerca do tema – aparecem também diferenças.<br />

Acreditamos ser importante mostrar essa pluralidade de olhares sobre o tema, pois<br />

temos encontrado algumas coletâneas, em que os autores produzem seus textos a<br />

partir de uma referência comum, mas que, pelo fato de os artigos serem produzidos<br />

individualmente, acabam tor<strong>na</strong>ndo-se repetitivos e, muitas vezes, apresentam uma<br />

superposição de conceitos e citações.<br />

1.5 O problema da definição<br />

Friedmann (1996, p. 12), abrange os conceitos de jogo, brinquedo e<br />

brincadeira e define-os em atividade lúdica. Nas palavras da autora:<br />

Brincadeira refere-se, basicamente, à ação de brincar, ao comportamento<br />

espontâneo que resulta de uma atividade não-estruturada; jogo é<br />

compreendido como uma brincadeira que envolve regras; brinquedo é<br />

utilizado para desig<strong>na</strong>r o sentido de objeto de brincar; atividade lúdica<br />

abrange, de forma mais ampla, os conceitos anteriores.<br />

No entanto, Kishimoto (1999), não concorda que a palavra lúdico seja utilizada<br />

como sinônimo de jogo, brinquedo e brincadeira. Ela concorda com a definição de<br />

brinquedo dada por Friedmann (1996), mas difere das demais. Nas palavras de<br />

Kishimoto (1999, p. 7)<br />

[...] brinquedo será entendido sempre como objeto, suporte de brincadeira,<br />

brincadeira como a descrição de uma conduta estruturada, com regras e<br />

jogo infantil para desig<strong>na</strong>r tanto o objeto e as regras do jogo da criança<br />

(brinquedo e brincadeira). Dar-se-á preferência ao emprego do termo jogo,<br />

quando se referir a uma descrição de uma ação lúdica envolvendo situações<br />

estruturadas pelo próprio tipo de material como no xadrez, trilha e domino.<br />

Os <strong>brinquedos</strong> podem ser utilizados de diferentes maneiras pela própria<br />

criança, mas <strong>jogos</strong> como o xadrez (tabuleiros, peças) trazem regras<br />

estruturadas exter<strong>na</strong>s que definem situação lúdica.<br />

Diante a diversidade de conceitos, para indicar o envolvimento da criança com<br />

o brinquedo e em suas situações de brincadeira, elegemos o termo “lúdico” como<br />

vocábulo que serve de sinônimo dos termos “jogo” e “brincadeira”.<br />

27


Assim, afirmamos que tanto o jogo quanto a brincadeira e o brinquedo podem<br />

ser englobados em um universo maior, chamado de atividades lúdicas. Não somos<br />

adeptos de uma rigidez de conceitos, pois no brincar e no jogar, quanto mais papéis<br />

a criança puder desempenhar, mais ampliará sua expressividade, entendida como<br />

uma totalidade.<br />

As palavras de Brougère (1997, p. 13-14) podem nos ajudar a compreender<br />

melhor a idéia de brinquedo, jogo e brincadeira.<br />

O brinquedo trata-se, antes de tudo, de um objeto que a criança manipula<br />

livremente, sem estar condicio<strong>na</strong>do às regras ou a princípios de utilização de<br />

outra <strong>na</strong>tureza. O brinquedo é um objeto infantil e falar em brinquedo para<br />

um adulto tor<strong>na</strong>-se, sempre, um motivo de zombaria, de ligação com a<br />

infância. O jogo, ao contrário, pode ser desti<strong>na</strong>do tanto à criança quanto ao<br />

adulto: ele não é restrito a uma faixa etária. Os objetos lúdicos dos adultos<br />

são chamados exclusivamente de <strong>jogos</strong>, definindo-se, assim pela sua função<br />

lúdica [...]. A brincadeira escapa a qualquer função precisa e é, sem dúvida,<br />

esse fato que a definiu, tradicio<strong>na</strong>lmente, em torno das idéias de gratuidade<br />

e até de futilidade. E, <strong>na</strong> verdade, o que caracteriza a brincadeira é que ela<br />

pode fabricar seus objetos, em especial, desviando de seu uso habitual os<br />

objetos que cercam a criança; além do mais é uma atividade livre, que não<br />

pode ser delimitada.<br />

No Brasil, termos como “brinquedo”, “brincadeira” e “jogo” ainda são<br />

empregados de forma indistinta. Enfim, cada contexto social constrói uma imagem<br />

de jogo conforme seus valores e modo de vida, que expressa por meio da<br />

linguagem.<br />

Assim, se falamos de brincar com palavras e idéias, o lúdico, segundo Dohme<br />

(2004), se manifesta nos <strong>jogos</strong>, <strong>na</strong>s histórias, <strong>na</strong>s dramatizações, <strong>na</strong>s músicas,<br />

danças e canções.<br />

Acompanhando os estudos de Friedmann (2006), podemos verificar através<br />

de um panorama os estudos, as tendências, as práticas surgidas <strong>na</strong>s últimas<br />

décadas e as sugestões de temas e práticas imprescindíveis de serem<br />

empreendidas tanto no âmbito acadêmico quanto no cotidiano do brincar. Entre eles<br />

se encontra a pesquisa de textos literários de autores <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>is que retratam o<br />

brincar.<br />

Vivemos no século XXI, com a tecnologia e a ciência caminhando juntas, o<br />

homem galgou passos que nunca ousou imagi<strong>na</strong>r, mas algo ainda é muito parecido<br />

com o que ocorre há muitos e muitos séculos - o fascínio da criança pelo brincar e<br />

pelas histórias.<br />

28


Se fizermos uma análise evolutiva dos estudos desenvolvidos sobre a<br />

atividade lúdica ao longo da história, observaremos quantas áreas abordam esse<br />

universo da ludicidade em pesquisas sobre <strong>jogos</strong>, <strong>brinquedos</strong> e <strong>brincadeiras</strong>, bem<br />

como o ato de brincar.<br />

29


CAPÍTULO 2 MONTEIRO LOBATO E A LITERATURA INFANTIL: PRAZER E<br />

EMOÇÃO<br />

Ler histórias para crianças, sempre, sempre... É<br />

poder sorrir, rir, gargalhar com as situações<br />

vividas pelas perso<strong>na</strong>gens, com a idéia do conto<br />

ou com o jeito de escrever dum autor e, então,<br />

poder ser um pouco cúmplice desse momento de<br />

humor, de brincadeira, de divertimento...<br />

2.1 A <strong>literatura</strong> infantil e a formação da consciência do leitor mirim<br />

30<br />

Fanny Abramovich<br />

A Literatura Infantil constitui-se como gênero durante o século XVIII, época<br />

em que as mudanças <strong>na</strong> estrutura da sociedade desencadearam repercussões no<br />

âmbito artístico. É a partir desse século que a criança passa a ser considerada um<br />

ser diferente do adulto, com características próprias, necessitando de uma educação<br />

especial que a preparasse para a vida adulta. Além disso, a ascensão da família<br />

burguesa e a reorganização da escola, fatos pertinentes ao mesmo século,<br />

colaboraram com o novo enfoque <strong>na</strong> formação infantil. Por um lado, a criança se<br />

tornou o centro das preocupações familiares, por outro, existia a necessidade de<br />

socializar a criança, preparando-a para exercer as funções do mundo adulto, dando<br />

à escola um caráter universal <strong>na</strong> sociedade burguesa.<br />

De acordo com Zilberman (2003), foi nesse contexto que apareceram os<br />

primeiros livros infantis, pois, antes disso, não havia infância, entendida como um<br />

espaço separado do mundo adulto: as crianças faziam parte dos mesmos processos<br />

<strong>na</strong>turais da existência dos mais velhos.<br />

A história da Literatura Infantil é relativamente recente. Os primeiros livros<br />

para crianças foram produzidos ao fi<strong>na</strong>l do século XVII e durante o século XVIII, com<br />

o surgimento de uma sociedade burguesa e a decadência do feudalismo. Antes<br />

dessa época, não se escrevia para elas porque não existia a “infância”, como vimos<br />

no capitulo anterior. Em suas palavras, Zilberman (2003, p. 15) relata um pouquinho<br />

dessa fase:


Antes disso não se escrevia para elas, porque não existia a “infância”. Hoje,<br />

a afirmação pode surpreender; todavia, a concepção de uma faixa etária<br />

diferenciada, com interesses próprios e necessitando de uma formação<br />

específica, só aconteceu em meio a Idade Moder<strong>na</strong>. A mudança se deveu a<br />

outro acontecimento da época: a emergência de uma nova noção de<br />

família, centrada não mais em amplas relações de parentesco, mas num<br />

núcleo unicelular, preocupado em manter sua privacidade (impedindo a<br />

intervenção dos parentes em seus negócios internos) e estimular o afeto<br />

entre seus membros.<br />

Encontramos num passado remoto uma <strong>literatura</strong> i<strong>na</strong>ugural, <strong>na</strong>scida no<br />

domínio do mito, da lenda, do maravilhoso, e impreg<strong>na</strong>da de valores e padrões<br />

sociais que o indivíduo deveria incorporar no seu comportamento.<br />

Essa <strong>literatura</strong> primordial era utilizada como forma de transmissão de valores<br />

de <strong>na</strong>tureza social, ética, política, artística, econômica, religiosa entre outros. As<br />

histórias infantis surgiram dessa <strong>literatura</strong> simbólica, desti<strong>na</strong>das ao público adulto,<br />

que, por meio de um processo misterioso, se transformou em <strong>literatura</strong> para<br />

crianças. É a identidade entre o popular e o infantil que desencadeou o processo de<br />

transformação. Tanto o homem rudimentar quanto a criança manifestam uma<br />

necessidade de conhecer historicamente a realidade que estão situados. Conhecem<br />

a realidade por meio do sensível, do emotivo e da intuição. Absorvendo fatos e<br />

fenômenos físicos e sociais por intermédio do “pensamento mágico” e não por meio<br />

da racio<strong>na</strong>lidade científica. Segundo Coelho (2002 p. 44), se atentarmos para a<br />

<strong>na</strong>tureza dessa <strong>literatura</strong> veremos :<br />

[...] que sua matéria pertence à área do maravilhoso, da fábula, dos mitos<br />

ou das lendas, cuja linguagem metafórica se comunica facilmente com o<br />

pensamento mágico, <strong>na</strong>tural nos seres intelectualmente maduros, Em<br />

última análise, esse maravilhoso concretizado em metáforas, símbolos,<br />

alegorias [...] é o mediador, por excelência, dos valores a serem<br />

eventualmente assimilados pelos ouvintes ou leitores, para além do puro<br />

prazer que sua linguagem possa transmitir [...].<br />

O ato de contar e ouvir histórias faz parte da <strong>na</strong>tureza do ser humano. As<br />

histórias representam um conforto para a ansiedade e a necessidade de<br />

compreensão do universo e da existência. Os povos primitivos buscavam entender a<br />

vida e, por meio do pensamento mágico e de suas vivências, criavam suas<br />

<strong>na</strong>rrativas. As lendas, os mitos, as histórias folclóricas e as fábulas criaram um<br />

mundo de <strong>na</strong>rrativas que são testemunhos da paixão huma<strong>na</strong> pela <strong>na</strong>rrativa, desde<br />

31


sempre. A criança se abastece desse “imaginismo primitivo” <strong>na</strong> construção de sua<br />

identidade.<br />

As histórias, que antes eram para “contar e ouvir”, passaram a ser escritas, e<br />

também a serem histórias para “ler e escrever” e, ainda mais, histórias para<br />

“estudar”. A separação da criança e do adulto, que ocorreu por volta do século XVIII,<br />

e a divisão das classes sociais levaram a sociedade a se preocupar com a educação<br />

das crianças.<br />

Foi nessa época que houve, no Brasil, uma divisão de classes. A venda de<br />

livros, nesse período, proliferou, pois, com o crescimento da classe média, aumentou<br />

também o número de consumidores de livros e, conseqüentemente, o nível de<br />

escolaridade, mais ainda havia muita gente fora das escolas.<br />

Com o anseio de alfabetização de massas, a Literatura encontra <strong>na</strong> criança<br />

uma fiel consumidora. No entanto, uma porcentagem significativa de livros que<br />

circula pelo mercado editorial acaba não se enquadrando, ou seja, produções<br />

autoritárias que não atendem às necessidade das crianças e que deixam<br />

transparecer o modo como o adulto quer que seu desti<strong>na</strong>tário se comporte e<br />

interprete o mundo. Essa falta de livros infantis brasileiros que atendessem às<br />

necessidades das crianças leitoras, foi constatada por Vieira (1999).<br />

Para mudar o quadro do Brasil, um país subdesenvolvido, necessário foi<br />

mudar a estratégia. Toda a atenção que estava no ensino superior volta-se para a<br />

educação básica; a ação pedagógica volta a privilegiar o livro como elemento<br />

importante para o crescimento do país.<br />

É, justamente, nesse momento que a Literatura Infantil ganha espaço: uma<br />

<strong>literatura</strong> desti<strong>na</strong>da ao leitor mirim. Do ponto de vista da educação, segundo<br />

Cadermartori (1994, p. 15), “[...] observa-se uma união de esforços de educadores<br />

dos diferentes níveis de ensino, do ensino básico à universidade, no sentido de<br />

promover a leitura para resgatar faltas do nosso sistema de educação”.<br />

O mercado apresenta uma enorme diversificação de livros para criança, mas<br />

sem apresentarem traços que caracterizem a Literatura Infantil. De acordo com<br />

Cadermartori (1994, p. 18):<br />

Há no mercado, muita gratuidade e produções que não vão além do lugar<br />

comum estético e ideológico. O inegável vínculo da Literatura infantil com a<br />

educação não deve conduzir a que se pense que o texto para criança<br />

passou do esquecimento para o papel de subsidiário da educação formal.<br />

32


Sua <strong>na</strong>tureza literária já o coloca além dos objetivos pedagógicos<br />

comprometidos com a legitimação das instituições, costumes e crenças que<br />

a geração adulta que legar à infantil.<br />

Para a autora, é por meio desses e outros fatores que se pode avaliar o lugar<br />

que a Literatura Infantil ocupa no Brasil, e sua relação com o processo de<br />

democratização o qual passa o país, uma vez que se liga com a preocupação de<br />

formar gerações capazes de obter pensamentos críticos e de superar os limites das<br />

experiências já adquiridas.<br />

A palavra “<strong>literatura</strong>” é intransitiva e, independente do adjetivo que receba, é<br />

arte e deleite. Sendo assim, o termo infantil associado à <strong>literatura</strong> não significa que<br />

ela tenha sido feita necessariamente para crianças. Na verdade, a <strong>literatura</strong> infantil<br />

acaba sendo aquela que corresponde, de alguma forma, aos anseios do leitor e que<br />

se identifique com ele. A autêntica <strong>literatura</strong> infantil não deve ser feita<br />

essencialmente com intenção pedagógica, didática ou para incentivar hábito de<br />

leitura. Este tipo de texto deve ser produzido pela criança que há em cada um de<br />

nós.<br />

No caminho percorrido em busca de uma <strong>literatura</strong> adequada para a infância<br />

foram feitas adaptações dos clássicos e do folclore e houve a apropriação dos<br />

contos de fada, inicialmente não voltados especificamente para a criança. Perrault, e<br />

depois os irmãos Grimm, colecio<strong>na</strong>dores dessas histórias folclóricas, estão ligados à<br />

gênese da Literatura Infantil. Em cada país, além dessa <strong>literatura</strong> considerada<br />

universal, surgem novas obras, como as de H. C. Andersen, Lewis Carroll, Mark<br />

Twain , Charles Dickens, entre outros.<br />

No Brasil, a Literatura Infantil tem início com obras pedagógicas, adaptadas<br />

de produções portuguesas, mostrando a dependência típica das colônias. Essa fase<br />

embrionária da Literatura Infantil brasileira é representada principalmente por Alexi<strong>na</strong><br />

de Magalhães Pinto, Júlia Lopes de Almeida, Carlos Jansen, Alberto Figueiredo<br />

Pimentel, Coelho Neto, Olavo Bilac e Tales de Andrade (ZILBERMAN, 2003).<br />

Mas, a verdadeira Literatura Infantil Brasileira tem início com Monteiro Lobato,<br />

o principal traço de diferenciação da obra deste autor é que suas histórias<br />

interessam às crianças, captam sua atenção e as divertem. A inovação é realizada<br />

por Lobato em dois planos, <strong>na</strong> retórica e <strong>na</strong> ideologia. No primeiro, teve o cuidado de<br />

despir a língua de qualquer rebuscamento para efeito literário e, no segundo plano,<br />

33


leva o seu leitor a ver a realidade com conceitos próprios, buscando seu senso<br />

crítico. O conjunto de sua obra apresenta problemas sociais, políticos econômicos e<br />

culturais que, por meio das especulações e discussões dos perso<strong>na</strong>gens, são<br />

abordados criticamente. A visão crítica da brasilidade faz parte do seu compromisso<br />

com a verdade assumida perante o leitor.<br />

Coelho (1995) apresenta uma possível divisão histórica da Literatura Infantil<br />

Brasileira , dividindo-a em três momentos fundamentais:<br />

I. Os precursores ou o período pré-lobatiano<br />

II. A Literatura Infantil moder<strong>na</strong> ou o período lobatiano<br />

III. A <strong>literatura</strong> infantil pós-moder<strong>na</strong> ou período pós-lobatiano<br />

Essa divisão mostra-nos como Lobato é referência para caracterizar os<br />

períodos da formação da <strong>literatura</strong> infantil brasileira e sua fundamental importância<br />

nesse gênero, tor<strong>na</strong>ndo-se um marco <strong>na</strong> produção <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l. Com sua obra criativa e<br />

respeitadora das características do mundo da criança, Lobato sempre teve em mente<br />

a formação de seu leitor. Em sua linguagem simples, cria um lugar de encontro com<br />

o leitor, o Sítio do Picapau Amarelo, onde moram perso<strong>na</strong>gens <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>is, aparecem<br />

perso<strong>na</strong>gens encantados e mitológicos e ainda faz das crianças seus heróis.<br />

Em Lajolo e Zilberman (1983) há um consenso quanto à relevância da escrita<br />

lobatia<strong>na</strong>, como um inquestionável marco no campo literário, gerador de um novo<br />

paradigma que conduziria a produção infantil a uma acepção mais ampla.<br />

A <strong>literatura</strong> infantil tem ainda muito a oferecer à criança se exami<strong>na</strong>da em<br />

relação a sua construção propriamente literária. Zilbermann (2003) assi<strong>na</strong>la uma<br />

importante particularidade artística do gênero: o fato de não conhecer fronteiras.<br />

Se a criança se vê privada de um meio interior para a experimentação do<br />

mundo, ela vai necessitar de um suporte fora de si que lhe dê apoio. É este o lugar<br />

que a <strong>literatura</strong> infantil preenche de modo especial, porque ela lida com dois<br />

elementos que são especialmente adequados para a compreensão do real: a história<br />

e a linguagem.<br />

A criança que, desde muito cedo, entra em contato com a obra literária escrita<br />

terá uma compreensão maior de si e do outro. Terá a oportunidade de desenvolver<br />

34


seu potencial criativo e ampliar os horizontes da cultura e do conhecimento,<br />

percebendo o mundo e a realidade que a cerca. Para Bettelheim (1996, p. 20):<br />

Enquanto diverte a criança, o conto de fadas a esclarece sobre si mesma,<br />

e favorece o desenvolvimento de sua perso<strong>na</strong>lidade. Oferece significado<br />

em tantos níveis diferentes, e enriquece a existência da criança de tantos<br />

modos que nenhum livro pode fazer justiça à multidão e diversidade de<br />

contribuições que esses contos dão à vida da criança.<br />

Na concepção de Aguiar & Bordini (1993, p. 14),<br />

A obra literária pode ser entendida como uma tomada de consciência do<br />

mundo concreto que se caracteriza pelo sentido humano dado a esse<br />

mundo pelo autor. Assim, não é um mero reflexo <strong>na</strong> mente, que se traduz<br />

em palavras, mas o resultado de uma interação ao mesmo tempo receptiva<br />

e criadora. Essa interação se processa através da mediação da linguagem<br />

verbal, escrita ou falada [...].<br />

Concordando com essas autoras, Cademartori (1994, p. 23) afirma que:<br />

[...] a <strong>literatura</strong> infantil se configura não só como instrumento de formação<br />

conceitual, mas também de emancipação da manipulação da sociedade.<br />

Se a dependência infantil e a ausência de um padrão i<strong>na</strong>to de<br />

comportamento são questões que se interpenetram, configurando a<br />

posição da criança <strong>na</strong> relação com o adulto, a <strong>literatura</strong> surge como um<br />

meio de superação da dependência e da carência por possibilitar a<br />

reformulação de conceitos e a autonomia do pensamento.<br />

Literatura Infantil é algo muito importante <strong>na</strong> formação de vários aspectos da<br />

criança, cognitivo, afetivo, psicológico e social. Assim, para Abramovich (1983), é<br />

necessário saber o que contar e como contar, é preciso reavivar a criança existente<br />

em cada adulto, saborear o que vai dizer, se divertir e se emocio<strong>na</strong>r com que vai<br />

contar.<br />

Ouvir e ler histórias é entrar em um mundo encantador, cheio ou não de<br />

mistérios e surpresas, mas sempre muito interessante, curioso, que diverte e ensi<strong>na</strong>.<br />

É <strong>na</strong> relação lúdica e prazerosa da criança com a obra literária que temos uma das<br />

possibilidades de formarmos o leitor. É <strong>na</strong> exploração da fantasia e da imagi<strong>na</strong>ção<br />

que se instiga a criatividade e se fortalece a interação entre texto e leitor.<br />

35


Para Coelho (2002), a Literatura é uma arte e, como tal, as relações de<br />

vivência que se estabelecem entre ela e o indivíduo são fundamentais para que este<br />

alcance sua formação integral, a consciência do eu mais o outro e mais o mundo, em<br />

harmonia dinâmica. Como arte, a Literatura Infantil provoca sensações, dá prazer,<br />

diverte, mas, acima de tudo, modifica a consciência de mundo do seu leitor,<br />

possibilita o brincar com as palavras e as idéias.<br />

Uma história traz consigo inúmeras possibilidades de aprendizagem. O<br />

estabelecimento de relações entre os comportamentos dos perso<strong>na</strong>gens da história<br />

e os comportamentos das próprias crianças em nossa sociedade possibilita ao<br />

professor desenvolver os múltiplos aspectos educativos da <strong>literatura</strong> infantil.<br />

Portanto, a conquista do pequeno leitor se dá por meio da relação prazerosa com o<br />

livro infantil, no qual, sonho, fantasia e imagi<strong>na</strong>ção se misturam numa realidade<br />

única, e o levam a vivenciar as emoções em parceria com os perso<strong>na</strong>gens da<br />

história, introduzindo assim situações da realidade.<br />

2.2 Monteiro Lobato: vida e obra<br />

É ouvindo histórias que se pode sentir (também) emoções importantes,<br />

como a tristeza, a raiva, a irritação, o bem-estar, o medo, a alegria, o<br />

pavor, a insegurança, a tranqüilidade, e tantas outras mais, e viver<br />

profundamente tudo o que as <strong>na</strong>rrativas provocam em quem as ouve - com<br />

toda a amplitude, significância e verdade que cada uma delas fez (ou não)<br />

brotar ... Pois é ouvir, sentir e enxergar com os olhos do imaginário!<br />

(ABRAMOVICH, 1995, p. 17).<br />

José Bento Monteiro Lobato <strong>na</strong>sceu <strong>na</strong> cidade de Taubaté, no estado de São<br />

Paulo, no dia 18 de abril de 1882. Filho de José Bento Marcondes Lobato e Olímpia<br />

Augusto Lobato. Recebeu o nome de José Re<strong>na</strong>to Monteiro Lobato e, por decisão<br />

própria, modificou, mais tarde, para José Bento Monteiro Lobato, desejando usar<br />

bengala, que era do seu pai, gravada com as iniciais J.B.M.L.<br />

Lobato tinha duas irmãs menores, Ester e Judite. Foram criados em um sítio e<br />

brincavam sempre juntos. Seus <strong>brinquedos</strong> eram feitos de sabugos de milho,<br />

chuchu, mamão verde, etc. Essa fase da vida de Lobato serviria posteriormente<br />

como cenário de inspiração para suas obras.<br />

36


Monteiro Lobato adorava os livros de seu avô materno, o Visconde de<br />

Tremembé. Sua mãe o alfabetizou, teve, depois, um professor particular e aos sete<br />

anos entrou num colégio. Leu tudo o que havia para crianças em língua portuguesa.<br />

Aos quinze anos, perde seu pai, vítima de congestão pulmo<strong>na</strong>r e, aos dezesseis,sua<br />

mãe.<br />

Entrou para a Faculdade de Direito, aos dezoito anos, por imposição do avô,<br />

pois preferia a Escola de Belas-Artes. Era anticonvencio<strong>na</strong>l por excelência; dizia<br />

sempre o que pensava, agradasse ou não. Defendia a sua verdade com unhas e<br />

dentes, contra tudo e todos, quaisquer que fossem as conseqüências. Envolveu-se<br />

com metalurgia e petróleo. Por ser um contestador e guerreiro foi até parar <strong>na</strong><br />

cadeia.<br />

Monteiro Lobato (1972) diplomou-se Bacharel em Direito no ano de 1904 e ,<br />

em maio de 1907 foi nomeado promotor <strong>na</strong> cidade de Areias. Casou-se, no ano<br />

seguinte, com Maria Pureza da Natividade (Purezinha), com quem teve os filhos<br />

Edgard, Guilherme, Marta e Rute. Viveu no interior, <strong>na</strong>s cidades peque<strong>na</strong>s, sempre<br />

escrevendo para jor<strong>na</strong>is e revistas: Tribu<strong>na</strong> de Santos, Gazeta de Notícias do Rio e<br />

Fon-Fon, para onde mandava caricaturas e desenhos.<br />

Em 1911, morreu seu avô, o Visconde de Tremembé, e dele herdou a fazenda<br />

Buquira, passando de promotor a fazendeiro. A geada e as dificuldades levaram-no<br />

a vender a fazenda no ano de 1917, transferindo-se para São Paulo. Mas, antes de<br />

vendê-la, nela, escreve sua obra Urupês e cria o perso<strong>na</strong>gem “Jeca Tatu”, um<br />

trabalhador rural paulista abando<strong>na</strong>do pelos poderes públicos pelas suas doenças e<br />

por seu atraso, tor<strong>na</strong>ndo-se um símbolo <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l.<br />

Monteiro Lobato foi o maior escritor de <strong>literatura</strong> infantil brasileira. Foi um<br />

homem extremamente dedicado a causas sociais. Preocupou-se muito com o bemestar<br />

do povo brasileiro. Manifestou sua indig<strong>na</strong>ção contra a falta de saneamento da<br />

época e não legislou em causa particular.<br />

De acordo com Nunes (1986), Monteiro Lobato viveu durante quatro anos em<br />

New York; permaneceu lá de 1927 a 1931. Ficou fasci<strong>na</strong>do por Henry Ford, pela<br />

metalurgia e pelo petróleo. Quando voltou para o Brasil, entregou-se à campanha em<br />

prol de nossas riquezas <strong>na</strong>turais: o ferro e o petróleo. Enviou cartas ao país inteiro,<br />

fez conferências, manifestou-se de inúmeras formas, queria conscientizar o país da<br />

riqueza <strong>na</strong>tural que aqui se escondia. Por causa disso, foi preso, pois não era de<br />

37


interesse do governo de Getúlio Vargas deixar a exploração do petróleo <strong>na</strong>s mãos<br />

dos brasileiros. O referido governo já estava comprometido com as multi<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>is.<br />

Percebe-se que Lobato fora um homem versátil, pois fez política social ,<br />

atirando-se à causa do petróleo e à sua famosa perso<strong>na</strong>gem Jeca Tatu. Mas não<br />

parou por aí; era um homem ambicioso e preocupado em revelar o “verdadeiro<br />

Brasil”. Graças a seu espírito empreendedor e à necessidade de se expressar<br />

livremente, passou do estágio de renomado jor<strong>na</strong>lista para o estágio de “Editor do<br />

Brasil”.<br />

Nunes (1986) relata que em 1924, no bairro do Brás, em São Paulo, Lobato<br />

montou o maior parque gráfico da América Lati<strong>na</strong>, a Companhia Gráfica Editora<br />

Monteiro Lobato SA. Durante o período em que Monteiro Lobato esteve à frente de<br />

sua Companhia Gráfica, muito contribuiu com a publicação de livros brasileiros.<br />

Antes de Lobato ser editor, os livros eram todos impressos em Portugal e a<br />

impressão era precária. Com Lobato editor, a impressão ganhou uma nova feição.<br />

Anos mais tarde é decretada a falência da Companhia Gráfica, que recebe uma nova<br />

administração. Então, é fundada, a Cia. e Editora Nacio<strong>na</strong>l.<br />

Nunes (1986) ressalta que, no ano de 1945, Lobato organizou sua obra<br />

completa para a Editora Brasiliense, que fora fundada em 1943. A organização da<br />

obra de Monteiro Lobato é composta de 32 volumes e traz, <strong>na</strong> 1ª série, a divisão –<br />

Literatura Geral (11 volumes), <strong>na</strong> 2ª série, a divisão se dá com o título – Literatura<br />

Infantil (12 volumes) e, <strong>na</strong> última série, temos: Traduções e Adaptações (9 volumes).<br />

Lobato inicia sua obra para criança em 1921, com o lançamento de A Meni<strong>na</strong><br />

do Nariz Arrebitado, que posteriormente é reestruturado como Rei<strong>na</strong>ções de<br />

Narizinho, onde são <strong>na</strong>rradas as histórias: “Narizinho Arrebitado”,”O Sítio do Picapau<br />

Amarelo”,”O Marquês de Rabicó”,”O casamento de Narizinho”, “As Aventuras do<br />

Príncipe”, “O Gato Felix”, “Cara de Coruja”,” O Irmão de Pinóquio”, “O Circo de<br />

Cavalinhos”, “Pe<strong>na</strong> de Papagaio” e o “O Pó de Pirlimpimpim”.<br />

Por meio das cartas de Lobato para seu amigo Rangel, publicadas em A<br />

Barca de Gleyre, podemos verificar o que Lobato pensa sobre uma de suas obras.<br />

Tenho em composição um livro absolutamente origi<strong>na</strong>l, Rei<strong>na</strong>ções de<br />

Narizinho - consolidação num volume grande dessas aventuras que tenho<br />

publicado por partes, com melhorias, aumentos e unificações num todo<br />

harmônico.Trezentas pagi<strong>na</strong>s ... libro para ler, não para ver, como esses de<br />

papel grosso e mais desenhos do que texto. (LOBATO, 1944 p. 329).<br />

38


Após o sucesso de Rei<strong>na</strong>ções de Narizinho, Lobato (1944) segue com seu<br />

“Rocambole Infantil”, como o próprio escritor descreve suas obras ao seu parceiro<br />

Rangel.<br />

Assim, obras como O Saci (1921),Viagem ao Céu (1932), Caçadas de<br />

Pedrinho (1933), Emília no País da Gramática (1933), Geografia de Do<strong>na</strong> Benta<br />

(1935), Memórias de Emília (1936), O Poço do Visconde (1937), O Picapau Amarelo<br />

(1939), entre várias outras obras, compõem o cenário da Literatura Infantil Lobatia<strong>na</strong>.<br />

Por meio dessa vasta bibliografia, percebe-se que Monteiro Lobato, durante toda sua<br />

existência, sempre esteve ligado, de forma direta ou indireta, ao que houve de mais<br />

importante no universo editorial brasileiro e que suas obras marcaram e marcam<br />

inúmeras crianças brasileiras. A tabela 01 demonstra isso.<br />

Tabela 1: Cronologia de Monteiro Lobato<br />

Ano Lançamento de Livros Episódios da vida<br />

1920<br />

Lançamento de A Meni<strong>na</strong> do Narizinho<br />

Arrebitado, Negrinha e “Os Negros” .<br />

1921 Lançamento de Onda Verde, Narizinho<br />

Arrebitado, O Saci e Fábulas de<br />

Narizinho.<br />

1922 Publicação de Fábulas e O Marquês<br />

de Rabicó.<br />

1923 Publicação de O Macaco que se fez<br />

Homem e Mundo da Lua.<br />

1924 Lançamento de A Caçada da Onça,<br />

JecaTatuzinho e O garimpeiro do Rio<br />

das Garças.<br />

Inscrição para uma vaga <strong>na</strong><br />

Academia Brasileira<br />

de Letras, desistindo, depois<br />

de concorrer.<br />

A editora Monteiro Lobato &<br />

Cia transforma-se<br />

em Companhia Gráfico-Editora<br />

Monteiro<br />

Lobato.<br />

1925 Falência da Companhia<br />

Gráfico-Editora<br />

Monteiro Lobato.<br />

Fundação da Companhia<br />

Editora Nacio<strong>na</strong>l, com<br />

seu sócio Octales Marcondes.<br />

Transfere-se para o Rio de<br />

Janeiro.<br />

39


1926 Publicação de O Presidente Negro.<br />

1927 Publica Mr. Slang e o Brasil e<br />

Aventuras de Hans Staden.<br />

1928 Publica O Noivado de Narizinho, O<br />

Gato Félix, Aventuras do Príncipe e A<br />

Cara de Coruja.<br />

1929 Publica O irmão do Pinocchio e O<br />

Circo de Escavalinho.<br />

1930 Publica Peter Pan e A Pe<strong>na</strong> de<br />

Papagaio<br />

1931 Lançamento de Ferro, O Pó de<br />

Pirlimpimpim e Rei<strong>na</strong>ções de<br />

Narizinho.<br />

1932 Publicação de América e Viagem ao<br />

Céu.<br />

1933 Publica Caçadas de Pedrinho e<br />

História do Mundo para Crianças<br />

1935 Geografia de Do<strong>na</strong> Benta<br />

1936 Memórias de Emília<br />

1937 O Poço do Visconde<br />

1939 O Picapau Amarelo<br />

Concorre a uma vaga <strong>na</strong><br />

Academia Brasileira de<br />

Letras, mas é derrotado<br />

Muda-se para Nova Iorque,<br />

nomeado como<br />

Adido Comercial.<br />

Organiza uma empresa<br />

brasileira para produzir<br />

aço pelo processo Smith.<br />

Perde dinheiro com a quebra<br />

da bolsa de Nova Iorque.<br />

Vende suas ações da<br />

Companhia Editora<br />

Nacio<strong>na</strong>l.<br />

Retor<strong>na</strong> ao Brasil.<br />

Começa o seu interesse pela<br />

extração de petróleo<br />

<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l.<br />

1948 O Brasil perde o grande<br />

escritor de Taubaté<br />

O projeto de Literatura Infantil de Monteiro Lobato era recriar um mundo mais<br />

brasileiro e uma linguagem mais acessível as nossas crianças. Em Conferências,<br />

Artigos e Crônicas (1972), Lobato admite que sua produção conseguira sucesso com<br />

seus pequenos leitores, uma vez que atendiam as necessidades do seu público alvo.<br />

Não possuo a mínima autoridade pedagógica de qualquer gênero, e tudo<br />

quanto sei de educação se resume num arrui<strong>na</strong>ra exceção em favor da<br />

40


egra. Apesar disso escrevi livros que as crianças gostam de ler. E por que<br />

gostam as crianças de ler esses livros? Talvez pelo fato de serem escrito por<br />

elas mesmas através de mim. Como as coitadinhas não sabem escrever,<br />

admito que me pedem eu o faça. Mas não que o faça como quero e sim<br />

como querem elas. (LOBATO, 1972, p. 103).<br />

Por essa razão, Lobato valoriza as crianças e jamais as subestimam, o<br />

escritor do Sítio do Picapau Amarelo tem consciência de que o universo das crianças<br />

é diferente daquele estruturado pela lógica do adulto e, cada vez mais, o autor passa<br />

a estreitar os limites entre o real e o imaginário, consegue, por meio, de textos<br />

claros, concisos, revestidos de di<strong>na</strong>mismo, deleitar o leitor ao mesmo tempo que o<br />

instrui. Em suas palavras Lobato (1972) complementa o motivo de valorizar tanto as<br />

crianças: “Acho a criatura huma<strong>na</strong> muito mais interessante no período infantil do que<br />

depois de idiotamente tor<strong>na</strong>r-se adulta. As crianças acreditam cegamente no que<br />

digo, o adulto sorri com incredulidade”.<br />

Assim, por se destacar em uma <strong>literatura</strong> que atendia às necessidades<br />

infantis, e por criar obras maravilhosas, o nome de Monteiro Lobato se espalhou por<br />

todo o continente.<br />

De acordo com Cavalheiro (apud Coelho, 1991), a <strong>literatura</strong> infantil<br />

praticamente não existia entre nós no período anterior a Lobato.<br />

Abramovich (1983), realizou uma entrevista sobre Monteiro Lobato com<br />

editores, críticos e escritores envolvidos com a <strong>literatura</strong> infantil, entre esses se<br />

destaca a fala de Meserani, ”A Literatura Infantil Brasileira não foi antes e nem<br />

depois de Lobato. É a partir dele”. Abrasileirar a língua, introduzir elementos da<br />

realidade brasileira, buscar o lúdicos e a qualidade estética, fazem parte dos<br />

aspectos de projeto literário de Lobato.<br />

Monteiro Lobato foi um escritor extremamente criativo, não aceitava cópias do<br />

estrangeiro, queria algo dele e, por isso, sempre afirmou: “Quero puxar fila, jamais<br />

segui-la”. De acordo com Cademartori (1994, p. 43):<br />

A <strong>literatura</strong> infantil brasileira inicia sob a égide de um de nossos mais<br />

destacados intelectuais: Monteiro Lobato. Se isso por um lado, prestigiou o<br />

gênero no seu surgimento, por outro, fez com que, após Lobato, por muito<br />

tempo, a <strong>literatura</strong> infantil brasileira vivesse a sombra de seu nome.<br />

Em 4 de julho de 1948, o Brasil perde o grande escritor de Taubaté, vítima de<br />

colapso. Lobato foi um talento que tanto contribuiu com o desenvolvimento de nossa<br />

41


<strong>literatura</strong>. Mas o que ele tinha de essencial, seu espírito jovem, sua coragem, está<br />

vivo no coração de cada criança. Viverá sempre, enquanto estiver presente a palavra<br />

inconfundível de “Emília” (LOBATO, 1972).<br />

Assim, citemos ape<strong>na</strong>s parte do texto dedicado a Lobato em catálogo<br />

produzido pela Fundação Nacio<strong>na</strong>l do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ) para a Feira<br />

Mundial do Livro em Frankfurt (1994), que teve como tema o Brasil. O trecho<br />

reproduzido abaixo sintetiza a posição ocupada pelo escritor <strong>na</strong> esfera dos livros<br />

infantis:<br />

Monteiro Lobato continua sendo o maior escritor para crianças do Brasil. A<br />

quase totalidade dos escritores contemporâneos não tem dúvida em afirmar<br />

que Lobato foi a grande leitura de suas infâncias e a maior influência em<br />

seus trabalhos. A obra lobatia<strong>na</strong> continua a ser estudada, e a conclusão<br />

dos teóricos é que o distanciamento crítico só leva à constatação de sua<br />

permanência. (SERRA, 1994, p. 45).<br />

42


CAPÍTULO 3 REINAÇÕES DE NARIZINHO, CAÇADAS DE PEDRINHO E O<br />

PICAPAU AMARELO, ONDE ESTÃO OS BRINQUEDOS, AS BRINCADEIRAS E<br />

OS JOGOS?<br />

43<br />

“Como era deleitoso, delicioso, lagartear com os<br />

livros de Monteiro Lobato. Era gostosura pura, era<br />

maravilhamento total.”<br />

Abramovich<br />

3.1 Apresentação das obras a serem a<strong>na</strong>lisadas e dos perso<strong>na</strong>gens do Sítio<br />

Rei<strong>na</strong>ções de Narizinho é o primeiro volume de uma série que tem o Sítio do<br />

Picapau Amarelo como referência geográfica para as aventuras dos perso<strong>na</strong>gens<br />

lobatianos, assim como <strong>na</strong>s obras Caçadas de Pedrinho e O Picapau Amarelo. Um<br />

Sítio brasileiríssimo, com um cenário inusitado, onde tudo era possível acontecer e<br />

muitos perso<strong>na</strong>gens encantados eram convidados a aparecer. O Sítio era isolado do<br />

mundo, refugiado em uma civilização ideal, onde todos eram protegidos de tudo, e<br />

havia sempre uma disponibilidade para entrar no jogo do “faz-de-conta”, pois não<br />

havia preocupações com a produção, pois lá ninguém trabalhava, exceto Tia<br />

Nastácia. É nesse Sítio que a fantasia e a realidade se misturam o tempo todo, <strong>na</strong><br />

maior das <strong>brincadeiras</strong> e gostosuras, segundo Abramovich (2005).<br />

Nunes (2000, p. 45) tece alguns comentários sobre o Sítio que tanto encantou<br />

e continua encantando as crianças brasileiras.<br />

Tudo é descrito vivamente e de modo rápido. No Sítio do Picapau Amarelo,<br />

não existe diferença entre realidade e fantasia. A obra infantil de Lobato<br />

caracteriza-se pela vontade de libertação. Moralismo convencio<strong>na</strong>l e<br />

sugestões religiosas foram aí abolidos. Lobato antes de mais <strong>na</strong>da, louva a<br />

vida. Seus livros acreditam <strong>na</strong> inteligência das crianças. Não será difícil<br />

descobrir nesses textos em prosa uma filosofia de vida.<br />

De acordo com Khéde (1986), <strong>na</strong> obra Rei<strong>na</strong>ções de Narizinho, Lobato traz<br />

delineadas as perso<strong>na</strong>gens nucleares de sua obra: Do<strong>na</strong> Benta, Tia Nastácia,<br />

Narizinho, Pedrinho, Emília, Visconde de Sabugosa, Rabicó, Faz-de-Conta e o Burro<br />

Falante.


Já a obra lobatia<strong>na</strong> Caçadas de Pedrinho foi publicada em 1933, sendo uma<br />

reescrita do livro A Caçada da Onça, lançada quase uma década antes, Zilberman<br />

(2005, p. 25) atesta essa afirmação: “As Caçadas de Pedrinho não <strong>na</strong>sceu com esse<br />

nome; foi primeiramente “A Caçada da Onça”, <strong>na</strong>rrativa publicada em 1924. Depois,<br />

Lobato acrescentou à <strong>na</strong>rrativa do rinoceronte Quindim, e o livro aumentou de<br />

tamanho e mudou o título”.<br />

O Picapau Amarelo é terceira obra de Monteiro Lobato que a<strong>na</strong>lisaremos no<br />

decorrer dessa pesquisa, com vinte e oito capítulos fantásticos, vários perso<strong>na</strong>gens<br />

do mundo da fábula estão presentes para compor o enredo desta história juntamente<br />

com toda a turminha do Sítio do Picapau Amarelo. Esses fantásticos perso<strong>na</strong>gens do<br />

mundo das maravilhas, Peter Pan, Capinha Vermelha, Cinderela, Branca de Neve,<br />

Quimera, a Hidra de Ler<strong>na</strong>, Belerofonte, D. Quixote, entre outros, decidem se mudar<br />

para o Sítio do Picapau Amarelo. Eles trazem seus cavalos, castelos e até mares!<br />

Para conseguir acomodar todo mundo, Do<strong>na</strong> Benta comprou todas as terras<br />

próximas ao seu Sítio.<br />

O Sítio de Do<strong>na</strong> Benta foi-se tor<strong>na</strong>ndo famoso tanto no mundo de verdade<br />

como no chamado de mentira. O mundo de mentira, ou Mundo da Fábula, é<br />

como a gente grande costuma chamar a terra e as coisas do País das<br />

Maravilhas, lá onde moram os anões e os gigantes, as fadas e os sacis, os<br />

piratas como o Capitão Gancho, e os anjinhos, como Flor-das-Alturas. Mas o<br />

Mundo da Fábula não é realmente nenhum mundo de mentira, pois o que<br />

existe <strong>na</strong> imagi<strong>na</strong>ção de milhões e milhões de crianças é tão real como as<br />

pági<strong>na</strong>s deste livro. (LOBATO, 1977, p. 7).<br />

Lobato escolhe minuciosamente os perso<strong>na</strong>gens de suas obras, pois temos<br />

aqueles que são humanos, sendo que os adultos são representados por Do<strong>na</strong> Benta<br />

e Tia Nastácia, as crianças são representadas por Narizinho e Pedrinho, temos<br />

também perso<strong>na</strong>gens como Emília e Visconde que são <strong>brinquedos</strong> e representam o<br />

maravilhoso. Para encerrar essa diversidade de perso<strong>na</strong>gens, temos os animais que<br />

falam.<br />

Os perso<strong>na</strong>gens nucleares presentes <strong>na</strong>s três obras são: Do<strong>na</strong> Benta, Tia<br />

Nastácia, Narizinho, Pedrinho, Emília, Visconde e o Marques de Rabicó. Entre uma<br />

obra e outra aparecem novos perso<strong>na</strong>gens como é o caso do Burro Falante <strong>na</strong> obra<br />

Rei<strong>na</strong>ções de Narizinho, o rinoceronte Quindim em Caçadas de Pedrinho. Na<br />

maioria de suas obras, o escritor de Taubaté acrescenta mais uma morador para o<br />

44


Sítio, variando, assim, os perso<strong>na</strong>gens, isso sem falar nos perso<strong>na</strong>gens do mundo<br />

das maravilhas.<br />

Do<strong>na</strong> Benta é uma senhora de mais de sessenta anos que ficava <strong>na</strong> varanda,<br />

com uma cestinha de costura no colo e óculos de ouro <strong>na</strong> ponta do <strong>na</strong>riz. Sua<br />

perso<strong>na</strong>gem representa autoridade, embora seja simples e democrática. Mesmo<br />

muitas vezes duvidando das loucas histórias que a turminha do sítio lhe contava,<br />

acabava entrando <strong>na</strong>s <strong>brincadeiras</strong> de modo <strong>na</strong>tural e divertido. Abramovich (2005,<br />

p. 61) afirma que “[...] a lógica que impera no Sítio não é a do adulto, mas lá o adulto<br />

entra no jogo da criança”.<br />

Do<strong>na</strong> Benta era a mais feliz das vovós porque vive com sua neta, a<br />

encantadora Lúcia, a meni<strong>na</strong> do <strong>na</strong>rizinho arrebitado. Ela tem 7 anos, é more<strong>na</strong>, bem<br />

comportada e gosta de comer pipoca. Narizinho, assim como é conhecida, é muito<br />

apegada aos <strong>brinquedos</strong>, ou melhor, a uma boneca especial, ela não come e nem<br />

bebe sem tê-la ao lado. Elas se divertem muito e aprontam todas. “Todas as tardes,<br />

Lúcia toma a boneca e vai passear à beira d’água, onde se senta <strong>na</strong> raiz de um<br />

velho ingazeiro para dar farelo de pão aos lambaris. ( LOBATO,1979, p. 9)<br />

Emília é uma boneca de pano, que possui os olhos de retrós preto e<br />

sobrancelhas lá em cima, é muito amiga de Narizinho, é irreverente, teimosa,<br />

esperta, criativa, tem autoconfiança, ama desafios e duvida de tudo, dizia<br />

constantemente “ Ou prova ou não acredito” , tinha sempre uma resposta <strong>na</strong> ponta<br />

da língua e suma solução para todo o problema.<br />

Apaixo<strong>na</strong>da pelas obras de Lobato, Belinky, em uma entrevista feita por<br />

Abramovich (1983, p. 31), afirma que :<br />

É Emília, em que pese toda a sua perso<strong>na</strong>lidade Lobatia<strong>na</strong>, por ser boneca<br />

e não gente, pode demonstrar e fazer desfilar imponente todos os “pecados”<br />

infantis: a mal criação, o <strong>na</strong>tural egoísmo, a rebeldia, a birra, a esperteza<br />

marota e até uma certa maldade ingênua – tudo imediatamente esquecido,<br />

sem maiores conseqüências e nem sentimentos de culpa.<br />

Emília é encantadora, com seu jeitinho de ser conquistou e ainda continua a<br />

conquistar muitas pessoas. Abramovich (1983, p.31) declara ser Emília sua<br />

perso<strong>na</strong>gem favorita e, com entusiasmo, descreve:<br />

45


[...] a boneca falante do Sítio do Picapau Amarelo, a magistral e<br />

incomparável criação de Monteiro Lobato. Irreverente, crítica, debocha de<br />

tudo [...]. Capaz de encontrar uma explicação da maior lógica para qualquer<br />

coisa que inventa [...]. Descaradíssima, bota a língua pra fora para qualquer<br />

um que resolva afrontar, responde sem hesitação, sem se importar com<br />

cargo ou posição [...] Apronta e faz arzinho de santa. Espertíssima, sempre!<br />

Antes de alguém desconfiar do que está acontecendo, ela já previu todas as<br />

reações/ dificuldades/ próximos passos e toma providências para que tudo<br />

aconteça do jeito que imaginou e que quer.<br />

A boneca Emília foi feita pelas mãos de Tia Nastácia, que é mais uma<br />

moradora do Sítio do Picapau Amarelo, é uma verdadeira sábia <strong>na</strong>s práticas da vida,<br />

mas ignora a ciência e os livros. Tia Nastácia é uma negra de estimação que<br />

carregou Lúcia desde peque<strong>na</strong>. Sua criatividade é percebível quando ela cria a<br />

boneca Emília e o simpático Visconde de Sabugosa, um sabugo intelectual, uma<br />

enciclopédia ambulante, muito educado, era muito amigo da boneca e, por isso, fazia<br />

tudo que ela pedia, mesmo que, para isso, precisava entrar <strong>na</strong>s piores das<br />

confusões.<br />

Do<strong>na</strong> Benta recebia constantemente a visita de seu neto Pedrinho, que<br />

passava alguns dias no Sítio. Um menino de dez anos, amante de aventuras, pois<br />

era corajoso e metido a herói.<br />

Outro perso<strong>na</strong>gem fantástico desse Sítio é o Marquês de Rabicó, um<br />

leitãozinho assim chamado porque possuía um toquinho de cauda, era ruivo e<br />

possuía manchas brancas pelo corpo. Era autêntico, porém, guloso e covarde. No<br />

Sítio do Picapau Amarelo os leitõezinhos não tinham um fi<strong>na</strong>l muito feliz, pois, todas<br />

as vezes em que uma visita chegava, Tia Nastácia fazia um para o jantar. Rabicó<br />

salvou-se porque Narizinho costumava brincar com ele desde bem pequenininho e<br />

acabaram sendo amigos. Então, Narizinho prometeu que não deixaria ninguém<br />

matá-lo. O sonho de Narizinho era casar sua amiga Emília, que sonhava em ser uma<br />

Marquesa, com o Marquês de Rabicó, não demorou muito e Narizinho conseguiu<br />

essa façanha, por meio da história que contou para Emília, dizendo que rabicó era<br />

um príncipe legítimo, mas uma fada má o transformou em um porco e ele ficará<br />

assim até achar um anel mágico escondido <strong>na</strong> barriga de certa minhoca. (LOBATO,<br />

1979)<br />

Em uma de suas aventuras de Rei<strong>na</strong>ções de Narizinho, a turminha do Sítio<br />

trouxe mais um morador para o grupo, o Burro Falante, Do<strong>na</strong> Benta e Tia Nastácia<br />

ficaram realmente admiradas em saber que esse animal realmente falava. Os<br />

moradores do sítio criam mais um grande perso<strong>na</strong>gem o João Faz-de-Conta, um<br />

46


oneco de pau, irmão de “Pinocchio”, feito novamente por Tia Nastácia, é um herói<br />

romântico que perdeu literalmente a cabeça para salvar Narizinho.<br />

Quindim é um perso<strong>na</strong>gem que aparece <strong>na</strong> obra Caçadas de Pedrinho. Ele é<br />

um rinoceronte que fugiu do circo e foi morar no sítio de Do<strong>na</strong> Benta. Foi Emília<br />

quem escolheu o nome Quindim para ele, por que ele é um "doce" de rinoceronte.<br />

Segundo Khéde (1986, p. 55), os perso<strong>na</strong>gens do Sítio do Picapau Amarelo<br />

têm a função:<br />

[...] de possibilitar a identificação do leitor mirim com o texto literário e através<br />

dos processos lúdicos e alegóricos os perso<strong>na</strong>gens estabelecem uma relação<br />

intratextual e intertextual com perso<strong>na</strong>gens de outros livros, i<strong>na</strong>ugurando<br />

valores e formas de viver.<br />

O contraponto entre o real e o irreal é um dos fatores de verossimilhança do<br />

texto das três obras escolhidas. Há situações que surgem dessas estratégias e<br />

outras que são provenientes do faz-de-conta, utilizado por qualquer criança em suas<br />

<strong>brincadeiras</strong>. É em torno da criança que geram as ações do livro.<br />

A<strong>na</strong>lisando e estudando as obras Rei<strong>na</strong>ções de Narizinho, Caçadas de<br />

Pedrinho e O Picapau Amarelo, podemos inventariar algumas <strong>brincadeiras</strong>, <strong>jogos</strong>,<br />

<strong>brinquedos</strong> presentes no decorrer de toda a história. Descreveremos em ordem<br />

cronológica toda ludicidade nelas encontrada.<br />

3.2 Análise das obras selecio<strong>na</strong>das<br />

3.2.1 Rei<strong>na</strong>ções de Narizinho<br />

No dizer de Khéde (1986), Rei<strong>na</strong>ções de Narizinho é uma fantástica obra de<br />

Lobato, <strong>na</strong> qual o mundo do faz-de-conta é o meio encontrado pelo autor para<br />

alcançar a comunicação espontânea e direta com o leitor mirim.<br />

47


Figura 01: Capa do Livro Rei<strong>na</strong>ções de Narizinho<br />

Em poucas palavras, Nunes (2000, p. 23 e 25) resume os perso<strong>na</strong>gens da<br />

obra Rei<strong>na</strong>ções de Narizinho, como:<br />

Na saga Lobatia<strong>na</strong>, Narizinho representa a feminilidade com discrição e<br />

encanto. Pedrinho tem caráter forte e é simpático. Do<strong>na</strong> Benta une o carinho<br />

materno (ser avó é ser mãe duas vezes) a lição de ética e saber. Tia<br />

Nastácia tem sentimentos ingênuos e puros. A boneca Emília constitui o<br />

protesto contínuo, a rebeldia criadora, como próprio Lobato seu inventor [...]<br />

O Marquês de Rabicó é a sujeição aos instintos orgânicos. O Visconde de<br />

sabugosa tem os lados bom e mau da erudição.<br />

No capítulo “Uma Vez”, da obra Rei<strong>na</strong>ções de Narizinho, Narizinho deita-se<br />

<strong>na</strong> grama com a boneca no braço e fica seguindo as nuvens que passeavam pelo<br />

céu, brincando de formar castelos, camelos e objetos. Esse tipo de brincadeira está<br />

caracterizado como brincadeira de imagi<strong>na</strong>ção, faz-de-conta ou jogo simbólico, no<br />

qual a criança tem o poder de transformar um objeto em outro, no caso dessa ce<strong>na</strong>,<br />

uma nuvem em outros objetos.<br />

A <strong>na</strong>tureza do jogo simbólico é imitativa, mas ela é também uma forma de<br />

auto-expressão tendo em vista ape<strong>na</strong>s a si mesmo, não havendo, assim, intenção de<br />

comunicação com os outros. No jogo simbólico, a criança constrói símbolos (que<br />

podem ser únicos) sem constrangimento, invenções que representam qualquer coisa<br />

que ela deseja. Há aqui uma assimilação da realidade ao eu mais do que uma<br />

48


acomodação do eu à realidade. Para Piaget (1975), a função do jogo simbólico é<br />

satisfazer o eu para transformação do que é real <strong>na</strong>quilo que é desejado.<br />

No capítulo “A Pílula Falante”, Emília toma uma pílula falante, mas ainda não<br />

consegue ter o domínio da fala e começa a brincar de trocar as letras formando<br />

outras palavras. Temos, como exemplo, a expressão “Doutor Cara de Coruja” que<br />

corresponde à “Doutor Caramujo”.<br />

Quando Pedrinho vai visitar o Sítio de sua avó, ele vai com a intenção de<br />

brincar com Narizinho, correr pelo sítio, andar pelos pomares, subir <strong>na</strong>s<br />

jabuticabeiras, pescar e aprontar todas as aventuras possíveis e impossíveis. Essas<br />

<strong>brincadeiras</strong> são caracterizadas por Friedmam (2004) como jogo de agilidade,<br />

rapidez e grande desempenho físico, requerem amplos espaços e liberdade de<br />

movimentos.<br />

Ao chegar ao Sítio, Pedrinho traz de presente para sua prima uma boneca<br />

que chora e abre e fecha os olhos, já Emília recebeu de presente um serviço de<br />

cozinha completo (fogãozinho de lata, panelas e até um rolo de folhear massa de<br />

pastel). Tanto Emília quanto Narizinho ficaram muito felizes com os <strong>brinquedos</strong><br />

ganhados.<br />

Conforme já aludido no capítulo 1, para Kishimoto (1999), brinquedo é<br />

compreendido como um “objeto suporte da brincadeira”, ou seja, objetos como<br />

carrinho, piões, bonecas e tantos outros, contribuem muito para uma brincadeira.O<br />

brinquedo é um fator básico no desenvolvimento humano, tor<strong>na</strong>-se uma atividade<br />

que completa a criança em suas necessidades, motivando-as para ação <strong>na</strong> busca da<br />

satisfação de seus desejos. O brinquedo é o que convida a criança a brincar.<br />

Depois de receber Pedrinho e saber das novidades, Do<strong>na</strong> Benta manda as<br />

crianças irem brincar, satisfazendo, assim, o desejo mais esperado. Eles colocam a<br />

conversa em dia e Pedrinho fica maravilhado com a aventura que Emília e Narizinho<br />

tiveram no reino das águas claras e em saber que Emília, agora, estava falando. O<br />

desejo de Pedrinho era que os perso<strong>na</strong>gens fugissem das velhas histórias para<br />

virem ao Sítio combi<strong>na</strong>r outras aventuras, enquanto o desejo de Narizinho era<br />

brincar no Sítio com a meni<strong>na</strong> da Capinha Vermelha ou a Branca de Neve.<br />

O Capítulo “O Noivado de Emília” relata que, uma tarde, Pedrinho zangou-se<br />

muito com Rabicó por ele não saber brincar de noivado. Então, resolveram substituílo,<br />

ou melhor, representá-lo por um vidro azul. A turminha se reuniu mais tarde e<br />

passaram a noite inteira conversando, até que vinha o chá. Chá de mentirinha, com<br />

49


torradas de mentiras. No capítulo seguinte, “O Casamento”, todos os convidados<br />

também iriam comer de mentirinha.<br />

Chegou afi<strong>na</strong>l o grande dia e vieram os grandes doces; seis cocadas, seis<br />

pés-de-moleque e uma rapadura, doces mais que suficientes para uma<br />

festa em que quase todos os convidados iam comer de mentira. Pedrinho<br />

armou a mesa da festa debaixo de uma laranjeira do pomar e botou, em<br />

redor, todos os convidados. Lá estavam Do<strong>na</strong> Benta, Tia Nastácia, vários<br />

conhecidos e parentes, todos representados por pedras, tijolos e pedaço de<br />

pau... Chegou a hora. Vieram vindo os noivos. Emília, de vestido branco e<br />

véu; Rabicó, de cartola faixa de seda em torno do pescoço... Logo depois<br />

veio o padre e os casou. Narizinho abraçou Emília e chorou uma lágrima de<br />

verdade, dando-lhe muitos conselhos. Depois, como a boneca não tinha<br />

dedos, enfiou-lhe no braço um anelzinho seu. Pedrinho fez o mesmo com o<br />

Marquês. (LOBATO, 1979, p. 65 ).<br />

A turminha do Sítio, neste trecho, está brincando de casamento, criando<br />

assim, situações imaginárias em que se comporta como se estivessem agindo no<br />

mundo dos adultos. Enquanto as crianças brincam, seus conhecimentos desse<br />

mundo se ampliam, porque, nesta atividade, elas podem fazer de conta que estão<br />

agindo como os adultos, imagi<strong>na</strong>ndo realizar coisas que os adultos fazem. No jogo<br />

de “faz-de-conta”, a criança experimenta diferentes papéis sociais, funções sociais<br />

generalizadas a partir da observação do mundo dos adultos. Notamos, nesse<br />

capítulo, algumas representações do mundo adulto: o casamento, o vestido de<br />

noiva, a cartola, uma verdadeira brincadeira de faz-de-conta.<br />

A criança peque<strong>na</strong> sente constantemente necessidade de se adaptar ao<br />

mundo social dos adultos, como nos afirma Piaget (1994), cujos interesses e regras<br />

ainda lhe são estranhos, e uma infinidade de objetos, acontecimentos e relação que<br />

elas ainda não compreendem.<br />

A brincadeira é, então, uma atividade que transforma o real, por assimilação<br />

quase pura às necessidades, em razão dos seus interesses afetivos e cognitivos.<br />

Piaget (1978) enfatiza que, <strong>na</strong>s <strong>brincadeiras</strong> de faz-de-conta (jogo simbólico), as<br />

crianças criam símbolos lúdicos que podem funcio<strong>na</strong>r como uma espécie de<br />

linguagem interior, que permite a elas reviver e repensar acontecimentos<br />

interessantes ou impressio<strong>na</strong>ntes.<br />

Essas <strong>brincadeiras</strong> de faz-de-conta, de comer de mentirinha, volta a se repetir<br />

no Capítulo “Os Segredos da Aranha” , quando Emília conta para Do<strong>na</strong> Aranha que<br />

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se acha muito diferente de seu marido Rabicó, pois ele come de verdade e ela de<br />

mentirinha , por brincadeira.<br />

Um dos prazeres de toda meni<strong>na</strong>, quando se brinca de boneca, é poder dar<br />

banho, pentear o cabelo e trocar as roupinhas de sua boneca. Narizinho e Emília<br />

não eram diferentes, Emília sempre está bem arrumada, Tia Nastácia e Narizinho<br />

sempre fazem vestidos para ela.<br />

Nos Capítulos “O Pedido” e “Os Brincos do Marquês”, conta que Pedrinho<br />

estava pescando quando achou uma carta dentro de uma concha, era um pedido de<br />

casamento. Imediatamente, Narizinho aceita o pedido do Príncipe Escamado, depois<br />

dá os últimos retoques no vestido novo da boneca para poderem partir ao Reino das<br />

Águas Claras, Pedrinho coloca <strong>na</strong> orelha de Rabicó dois amendoins com casca para<br />

arrumá-lo. Pedrinho leva também seu bodoque, um antigo brinquedo também usado<br />

como arma primitiva para lançar pedras ou outros pequenos projéteis, é uma espécie<br />

de estilingue, um atirador de projetil em formato de arco, similar ao arco de flecha.<br />

Pedrinho adorava inventar alguma aventura. Um dia, ele resolveu ir ao mato<br />

para cortar varas para confeccio<strong>na</strong>r uma arapuca, uma brincadeira maldosa, mas<br />

para ele não, ape<strong>na</strong>s mais um diversão. Essa idéia de Pedrinho encontra-se no<br />

Capítulo “O Gato Félix”. No Capítulo seguinte, “Entram Todos”, o Sítio recebe a visita<br />

das criaturas do fundo do mar. Tia Nastácia e Do<strong>na</strong> Benta assustam-se com aquelas<br />

criaturas, mas, depois, Do<strong>na</strong> Benta se entusiasma:<br />

Cada um que pulava era um novo berro de Tia Nastácia. Por fim não<br />

agüentou mais: disparou para a cozinha. Do<strong>na</strong> Benta, porém, foi se<br />

acostumando e, dali a pouco, já não estranhava coisa nenhuma. Começou<br />

até a achar graça enorme em tudo aquilo. – Você tem razão, minha filha –<br />

disse ela, por fim. - Esse mundo em que você e Pedrinho vivem é muito<br />

mais interessante que o nosso. (LOBATO, 1979, p. 87).<br />

Nos próximos Capítulos de Rei<strong>na</strong>ções de Narizinho começam uma série de<br />

histórias incríveis e divertidas que são contadas, à noite, para todos os moradores do<br />

Sítio. Primeiro, quem conta a história é o gato Felix. No outro dia é a vez de Emília<br />

contar sua história de rei, príncipe e de uma fada, que, por si<strong>na</strong>l, foi um sucesso.<br />

Enciumado, o Gato Felix briga com Emília e ela diz: “ - Mentiroso! Eu nunca chorei<br />

nem hei de chorar, e muito menos por uma simples brincadeira”. (LOBATO, 1979, p.<br />

112). Para Emília, o fato de contar histórias tor<strong>na</strong>-se uma fantástica brincadeira, <strong>na</strong><br />

qual imagi<strong>na</strong> acontecimentos, se diverte e emocio<strong>na</strong> todos os moradores do Sítio.<br />

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Segundo Abramovich (1995), é por meio de uma história que se podem descobrir<br />

outros lugares, outros tempos, outros jeitos de ser e agir. Depois, é a vez de<br />

Visconde, que conta uma história de investigação.<br />

No Capítulo “Preparativos”, Pedrinho, Emília e Narizinho preparam uma festa<br />

para os amigos do País das Maravilhas. Visconde e Rabicó ajudam também. Os<br />

convidados começaram a chegar <strong>na</strong> festa. Emília ficou maravilhada ao ver Branca<br />

de Neve, que lhe trouxe de presente um espelho mágico e prometeu voltar no Sítio<br />

outras vezes para brincar com Narizinho e Emília. Este episódio encontra-se no<br />

Capítulo “Branca de Neve”.<br />

O Capítulo seguinte, “O Pequeno Polegar”, relata sobre a chegada do<br />

Pequeno Polegar. Emília ficou num assanhamento jamais visto, agarrou o heroizinho<br />

e não soltou mais; levou-o em seu quarto de boneca, para mostrar-lhe a porção de<br />

<strong>brinquedos</strong> que tinha; mostrou-lhe uma coleção de feijões pintadinhos que Tia<br />

Nastácia lhe dera, um pincel de goma-arábica que lhe servia de vassoura e mil<br />

coisas. Polegar gostou de tudo, principalmente, de um pito velho sem canudo, que<br />

Emília acabou lhe dando porque brincaria de esconder. Depois, ficou admirada com<br />

sua bota sete léguas e pediu para que ele deixasse a bota no Sítio, por uma<br />

sema<strong>na</strong>, para que a turminha pudesse brincar o dia inteiro de “estar aqui e estar lá<br />

no mesmo instante”.<br />

Podemos ver o apego de Emília com seus <strong>brinquedos</strong>. Para ela, tudo vira<br />

diversão. Essa boneca espertinha valoriza muito seus <strong>brinquedos</strong>, mesmo sendo<br />

feitos de sucatas. Ela não se importa com isso; é como se fosse o melhor brinquedo<br />

já visto. Prova disto é quando a boneca mostra, com entusiasmo, seus <strong>brinquedos</strong><br />

para o Pequeno Polegar.<br />

A outra atração da festa foi Cinderela e sua varinha de condão. No Capítulo “A<br />

Varinha de Condão”, todos estavam brincando de “virar”, <strong>na</strong> sala do baile, Cinderela<br />

batia com a varinha de condão e virava tudo que lhe pediam. Emília trouxe todos os<br />

seus <strong>brinquedos</strong> para fazer virar em outros <strong>brinquedos</strong> ainda mais bonitos. Depois<br />

sentiu saudades dos <strong>brinquedos</strong> velhos e os fez desvirar novamente. No Capítulo<br />

seguinte, “A Partida”, os perso<strong>na</strong>gens encantados vão embora, mas Aladino esquece<br />

sua lâmpada, Cinderela esquece sua varinha de condão e Gato de Botas esquece<br />

sua bota sete léguas. Emília, Narizinho e Pedrinho ficam muito felizes e planejam<br />

brincar o dia inteiro com os objetos esquecidos, mas Do<strong>na</strong> Carochinha chega para<br />

buscar todos os objetos mágicos, antes que eles pudessem brincar, frustrando,<br />

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assim, os planos da turminha. Qual criança não gostaria de ter uma varinha de<br />

condão e brincar o dia inteiro de transformar objetos e pessoas? Lobato traz, nessa<br />

história, o sonho de toda criança.<br />

A próxima etapa do livro tem como título “Rei<strong>na</strong>ções de Narizinho”, no<br />

Capítulo “O Irmão do Pinocchio” continua a dialética entre histórias, <strong>brinquedos</strong> e<br />

<strong>brincadeiras</strong>. Do<strong>na</strong> Benta compra um livro do “Pinocchio”, Pedrinho ficou louco para<br />

ler o livro, mas Do<strong>na</strong> Benta disse que quem iria ler era ela. “[...] – Só lerei três<br />

capítulos por dia, de modo que o livro dure e nosso prazer se prolongue. A sabedoria<br />

da vida é essa.” (LOBATO, 1979, p. 133).<br />

Depois de ouvir o começo da história, Emília, que sempre foi uma interesseira,<br />

encasquetou de se tor<strong>na</strong>r a boneca mais rica de <strong>brinquedos</strong> do mundo e queria<br />

muito o cavalinho de Pedrinho. Para conseguir isso, teve a idéia de procurar um pau<br />

vivente para fazer um irmão de Pinocchio. Pedrinho gostou tanto da idéia que até<br />

deu seu cavalinho para Emília. Essa boneca de pano era muito ambiciosa, sempre<br />

queria mais <strong>brinquedos</strong>, por isso inventava as mais loucas histórias e aventuras para<br />

adquiri-los.<br />

No capítulo “O Pau vivente”, Pedrinho começa a procurar pelas matas, ao<br />

redor do Sítio, esse tal pau vivente, mas <strong>na</strong>da encontrava. Emília, com medo de que<br />

Pedrinho pegasse de volta seu cavalinho, pediu ajuda a Visconde para que ele<br />

imitasse um gemido de pau mágico. Pedrinho caiu direitinho nessa enga<strong>na</strong>ção,<br />

cortou um pedaço de pau necessário para a fabricação do boneco e ficou tão feliz<br />

que chegou ao Sítio contando para todos. Emília saiu dando risada e foi conversar<br />

com seu cavalinho:<br />

– Pedrinho caiu como um pato e com certeza agora não se lembra mais de<br />

tomar você de mim. Viva ! Viva! Você é meu e bem meu, e tem que brincar<br />

comigo o dia inteiro. Antes de mais <strong>na</strong>da preciso consertar vossa senhoria,<br />

pois onde já se viu um cavalo sem rabo? [...] está ouvindo?. (<br />

LOBATO,1979, p. 136).<br />

No Capítulo “O Concurso” todos queriam que o boneco fosse de um jeito.<br />

Para que todos dessem suas opiniões, Pedrinho fez um concurso de desenho, no<br />

qual o vencedor faria o boneco. Como <strong>na</strong> votação deu empate, pois cada um votou<br />

no seu próprio desenho, resolveram então tirar <strong>na</strong> sorte, Emília foi a vencedora. Esse<br />

episódio mostra o empenho de toda a turma do Sítio em participar da construção de<br />

53


um brinquedo. Quando a criança se empenha <strong>na</strong> transformação de objetos para a<br />

construção de um brinquedo, ela desenvolve sua criatividade, além disso, brincará<br />

com “outros olhos” com aquilo que ela mesmo pôde construir,<br />

No capítulo seguinte, “A Zanga de Emília”, a boneca, depois de advertida por<br />

tentar trapacear no concurso, vai para o seu quarto e começa a colocar seus<br />

vestidos e <strong>brinquedos</strong> em uma caixa de papelão, que lhe servia de mala. Enquanto<br />

fazia isso, dialogava com o Cavalinho e, depois de desabafar, decide não mais ir<br />

embora. Para Emília, seu Cavalinho era mais que um brinquedo; era seu amigo. A<br />

boneca conversa, conta histórias, brinca e também desabafa com seu amigo.<br />

No Capítulo “João Faz de Conta”, Tia Nastácia é a verdadeira vencedora do<br />

concurso. Então, ela se tranca <strong>na</strong> cozinha para fazer o boneco, quando terminou,<br />

mostrou a todos e foi uma decepção geral. Emília deu o nome de João Faz de<br />

Conta,<br />

João Faz de Conta é o melhor nome que acho para este boneco [...] João,<br />

porque ele tem cara de João. E faz de Conta, porque só mesmo fazendo de<br />

conta se pode admirar uma feiúra destas. Faz e Conta, que não é feio. Faz<br />

de Conta que não tem ponta de prego <strong>na</strong>s costas. Faz de conta que [...].<br />

(LOBATO, 1979, p. 141).<br />

Nesse mesmo capítulo, o apego pelo brinquedo é demonstrado por Emília<br />

novamente, pois ela coloca um lindo rabo de pe<strong>na</strong> de galo em seu cavalinho e, com<br />

ele, passava horas, brincando de chicote queimado, esconde-esconde e Bento que<br />

Bento fede. Mas Emília tinha medo que Pedrinho lhe tomasse seu querido<br />

brinquedo.<br />

Enquanto isso todos no Sítio queriam que o boneco João Faz de Conta<br />

vivesse. Mas, já que isso não acontecia, Pedrinho resolveu pegar seu cavalinho de<br />

volta e brigou com Emília, todos tomaram partido de Emília. Pedrinho saiu furioso<br />

pela floresta e foi ao tal tronco gemeu e examinou tudo cuidadosamente; achou,<br />

então, a cartola de Visconde no oco do tronco, Pedrinho logo percebeu a armação<br />

da boneca .<br />

“Miragens” é o Capítulo seguinte, no qual Pedrinho resolve se vingar da<br />

boneca. Já Narizinho queria dar um passeio no pomar com sua amiga, mas esta a<br />

desprezou por causa do cavalinho: ela estava ensi<strong>na</strong>ndo-lhe o ABC, para que ele<br />

54


pudesse ler as histórias. Então, Narizinho resolveu levar o boneco, irmão de<br />

“Pinocchio”.<br />

Narizinho não gostava de passear só, por isso correu os olhos pela sala em<br />

procura de algum outro companheiro. Só viu o triste irmão de Pinocchio, que<br />

Pedrinho havia jogado em cima do armário [...]. Vou levá-lo comigo. Talvez<br />

os ares do ribeirão lhe façam bem [...]. E lá se foi com ele ao pomar, rumo ao<br />

ribeirão, onde havia aquele velho pé de ingá de enorme raízes de fora.<br />

Sentou-se <strong>na</strong> “sua raiz”. De todos os lugares que ela conhecia era aquele o<br />

que ela mais gostava [...] e era ali que costumava pensar <strong>na</strong> vida, resolver<br />

seus problemazinhos e sonhar castelos. O sol ia descambando no horizonte<br />

(“horizonte” era o nome do morro atrás do qual o sol costumava esconderse),<br />

e seus últimos raios vinham brincar de acende e apaga brilhinhos <strong>na</strong><br />

correnteza. (LOBATO, 1979, p. 143-144).<br />

De repente, Narizinho ouviu um bocejo, olhou e viu que era o João Faz de<br />

Conta. Ela ficou maravilhada por essa façanha e por ele ter perdido a cabeça no<br />

ribeirão, por tentar salvar a meni<strong>na</strong> de uma vespa muito má. Narizinho começou a<br />

procurar a cabeça de João, quando viu uma casinha, que era da Capinha Vermelha.<br />

Por sorte, a Capinha Vermelha havia encontrado a cabeça do Faz de Conta, quando<br />

os três estavam conversando, o malvado Barba Azul pulou a cerca da casinha.<br />

Imediatamente Narizinho fechou os olhos bem fortes e reabriu, mas viu que já estava<br />

no pomar do Sítio e que o boneco não falava mais. Nesse episódio, vemos um<br />

exercício simbólico, Narizinho está brincando, ela cria situações imaginárias em que<br />

busca uma satisfação e um prazer no “fazer de conta”, cria um espetáculo oferecido<br />

a si próprio.<br />

No capitulo “O Alfinete”, Narizinho conta tudo que havia acontecido para<br />

Pedrinho, ele ficou confuso, mas a meni<strong>na</strong> esclareceu dizendo que o boneco só vive<br />

quando muda-se de estado (certos momentos a gente começa a ver coisas<br />

maravilhosas que estão ao nosso redor). A meni<strong>na</strong> do <strong>na</strong>riz arrebitado contou<br />

também que descobriu que o alfinete de pombinha da Emília era uma varinha de<br />

condão de uma vespa. Pedrinho ficou muito feliz por saber que o alfinete que estava<br />

com Emília era mágico, logo tratou de adular e comprar a boneca, porque ele sabia<br />

que Emília era fasci<strong>na</strong>da por <strong>brinquedos</strong>:<br />

– Emília – disse ele com a voz mais amável do mundo – vou fazer três<br />

cavalinhos novos pra você, cada qual de uma cor, e uma casinha linda para<br />

você morar, e um fogãozinho para você cozinhar , e um trapézio para você<br />

55


alançar-se, e umas asinhas para você voar , e uma [...]. (LOBATO , 1979,<br />

p. 148).<br />

No Capítulo “Plano de Emília”, Pedrinho estava precisando de um dinheiro<br />

para comprar uma peça de algodãozinho. Emília prometeu arrumar o dinheiro que<br />

faltava se ele desse para ela um carro de rodas de carretel que ele tinha feito;<br />

Pedrinho aceitou. Logo, Emília tratou de sabotar Do<strong>na</strong> Benta, escondeu os óculos<br />

dela e pediu dinheiro para ajudar encontrá-lo. A princípio, Do<strong>na</strong> Benta não aceitou<br />

mandou a boneca ir brincar, mas depois acabou aceitando a ajuda oferecida.<br />

No capítulo “O Circo”, Pedrinho começou construir o Circo, enquanto Emília<br />

brincava com seu carro de carretel:<br />

[...] atrelou nele o cavalo de rabo de pe<strong>na</strong>, botou o dinheiro dentro e disse de<br />

brincadeira: – Agora, Senhor Cavalo, vá correndo ao palácio do Rei e<br />

entregue-lhe esse queijo de prata, que eu mando. Ao palácio do Rei, não; ao<br />

palácio do Príncipe. Ao palácio do Príncipe não; ao palácio do Duque. Ao<br />

palácio do Duque, não; ao palácio do Marquês. Ao palácio do [...].<br />

(LOBATO, 1979, p. 156).<br />

Brincando, a criança ultrapassa fronteiras inter<strong>na</strong>s e exter<strong>na</strong>s, usando como<br />

suporte o brinquedo ou a imagi<strong>na</strong>ção. O brinquedo, sozinho, não dá conta da<br />

complexidade da brincadeira, mas é entendido como possibilidade de oferecer ao<br />

mesmo tempo, suporte e materialidade ao imaginário. Piacentini (2005), destaca que<br />

a brincadeira é das mais ricas e expressivas fontes de cultura <strong>na</strong> infância.<br />

No capítulo seguinte, “O Espetáculo”, Emília apresentou o primeiro número “A<br />

Corrida de Cavalo de Emília”. Mas ela estava muito nervosa e ao entrar com seu<br />

cavalo, no picadeiro do circo, todos bateram palmas, Faz-de-Conta segurou três<br />

arcos para que a boneca pudesse pular, e ela pulou o primeiro, pulou o segundo,<br />

todos aplaudiram. Novamente, quando foi pular o terceiro arco, o rabo do cavalo<br />

enroscou no prego do boneco João Faz de Conta, então o publicou começou a vaiar;<br />

a dar muitas risadas.<br />

Emília não percebeu o desastre, e julgando que as risadas e vaias eram<br />

para ela, parou, vermelhinha como camarão, e botou uma língua de fora de<br />

dois palmos para o público. E recolheu-se furiosa. – Não brinco mais! – disse<br />

lá nos bastidores, arrancando e espatifando o saiote de gaze. – Não sou<br />

palhaço de ninguém. (LOBATO, 1979, p. 162).<br />

56


A próxima atração do circo foi o João Faz de Conta engolindo espadas e<br />

brasas, porém a última queimou seu <strong>na</strong>riz. Mesmo que essa brincadeira não tenha<br />

acabado do jeitinho que a turminha gostaria, emocionou e divertiu todo o público. É<br />

por meio dessa brincadeira que as crianças do Sítio utilizaram o faz-de-conta como<br />

meio de inserção no mundo circense. É o faz-de-conta que possibilita as crianças<br />

aprenderem a agir em função da imagem de uma pessoa, de um perso<strong>na</strong>gem, de<br />

um objeto e de situações que não estão imediatamente presentes e perceptíveis<br />

para elas no momento, mas que evocam emoções, sentimentos e significados<br />

vivenciados em outras circunstâncias. Brincar funcio<strong>na</strong> como um cenário no qual as<br />

crianças tor<strong>na</strong>m-se capazes não só de imitar a vida, como também de transformá-la.<br />

Nos capítulos “A voz” e “Preparativos”, Pedrinho conheceu uma voz<br />

misteriosa que dizia que veio para lhe ensi<strong>na</strong>r se tor<strong>na</strong>r invisível e para lhe levar nos<br />

mundos das maravilhas. Pedrinho corre para contar tudo para Narizinho, que ficou<br />

tão admirada, que correu logo para contar para Emília, que, por sua vez, estava<br />

brincando de esconder com o visconde. Todos decidiram partir para o Mundo das<br />

Maravilhas.<br />

Nesse trecho, podemos ver implicitamente a amizade entre Pedrinho,<br />

Narizinho, Emília e Visconde, pois, quando Pedrinho fica sabendo que poderia se<br />

tor<strong>na</strong>r invisível e conhecer o Mundo das Maravilhas, sai logo contando para seus<br />

amigos, para que todos pudessem participar dessa gostosa aventura.<br />

Nos Capítulos “A Partida” e “O Senhor de La Fontaine”, Pedrinho não gostava<br />

de falar com quem ele não podia ver, por isso, tratou de arrumar um jeitinho de<br />

localizar aquela “voz invisível”. Então, passou um fio de linha, <strong>na</strong> cabeça do menino<br />

e colocou uma pe<strong>na</strong>, assim, o menino invisível passou a ser chamado de Peninha.<br />

Para partir, todos cheiraram o pó mágico de pirlimpimpim. Quando chegaram, as<br />

crianças se maravilharam com o lugar e com as fábulas de La Fontaine, “[...] grande<br />

alegria da meni<strong>na</strong>da. Emília correu a brincar com o carneirinho enquanto os outros<br />

se dirigiam para o lado do Sr. de La Fontaine”. (LOBATO,1979, p. 172).<br />

Podemos ver que Emília ama brincar; sempre arruma uma nova brincadeira;<br />

nunca perde tempo, a cada viagem ou aventura, faz novas amizades. Nem os<br />

animais escapam dessa fantástica boneca de pano.<br />

No capítulo “Esopo”, Peninha apareceu trazendo um famoso fabulista grego, o<br />

Esopo, que se admirou ao ver uma bonequinha que fala.<br />

57


Nos últimos capítulos deste livro, veremos as crianças viajando no mundo da<br />

imagi<strong>na</strong>ção entre pestes, pássaro roca, barão e tantos outros perso<strong>na</strong>gens<br />

fasci<strong>na</strong>ntes do Mundo das Maravilhas. A turminha até encontra um Burro falante e o<br />

leva para o sítio, e ainda convidam Do<strong>na</strong> Benta a participar dessa viagem à terra das<br />

Fábulas. A princípio, ela fica indecisa, mas, depois, aceita. Até os adultos brincam<br />

nos livros de Lobato. Essa história só acaba quando os perso<strong>na</strong>gens retor<strong>na</strong>m para<br />

o Sítio do Picapau Amarelo.<br />

Essas diferentes aventuras ligam-se sempre ao espaço do Sítio e aos<br />

perso<strong>na</strong>gens que o habitam. As perso<strong>na</strong>gens são codificadoras, protagonistas ou<br />

promovedoras de diversas <strong>brincadeiras</strong> e aventuras; constroem histórias, vivem<br />

dentro de outras histórias e também inventam histórias. Todas elas iniciam-se no<br />

Sítio e, mesmo que andem por outros caminhos, países e épocas, voltam a ele.<br />

Essa característica põe em evidência o caráter de aspecto binário da obra<br />

lobatia<strong>na</strong>, sendo o mais importante a dicotomia entre: o plano da ficção ligada ao<br />

real, representada pelo Sítio que sustenta a vivência cotidia<strong>na</strong> e serve de suporte<br />

para a fantasia, e o plano da ficção fantasiosa, representada pelo mundo<br />

maravilhoso das histórias, no qual se pode viver no lúdico e no tempo mítico,fora do<br />

espaço e do tempo concreto.<br />

Os perso<strong>na</strong>gens partem de uma realidade imediata para viverem diferentes<br />

aventuras. Eles se lançam para o mundo das histórias paralelas, para se envolverem<br />

em deliciosas situações lúdicas que envolvem o faz-de-conta, o sonho, a solução<br />

mágica, o pó de pirilimpimpim, <strong>brincadeiras</strong> e diversas situações engraçadas.<br />

O universo lobatiano do Sítio e seus perso<strong>na</strong>gens inspiram-se <strong>na</strong> criança em<br />

suas vivências, suas fantasias, suas aventuras, suas travessuras, seus <strong>jogos</strong>, suas<br />

<strong>brincadeiras</strong> e em seus <strong>brinquedos</strong>. Dessa forma, a criança se identifica com essa e<br />

tantas outras obras de Monteiro Lobato, pois é nesse universo que a criança é livre<br />

para ser criança.<br />

Para ilustrarmos melhor nossos objetivos em Rei<strong>na</strong>ções de Narizinho, fizemos<br />

um breve resumo dos perso<strong>na</strong>gens, dos <strong>brinquedos</strong>, dos <strong>jogos</strong> e <strong>brincadeiras</strong><br />

presente <strong>na</strong> obra :<br />

58


Tabela 2 - Rei<strong>na</strong>ções de Narizinho<br />

Perso<strong>na</strong>gens Brinquedos Jogos e Brincadeiras<br />

• Do<strong>na</strong> Benta<br />

• Tia Nastácia<br />

• Pedrinho<br />

• Narizinho<br />

• Emília<br />

• Visconde<br />

• Marquês de<br />

Rabicó<br />

• Burro Falante<br />

• João Faz de Conta<br />

• Perso<strong>na</strong>gens do<br />

País das Maravilhas<br />

• Emília (Boneca de Pano)<br />

• Visconde<br />

• Marquês de Rabicó<br />

• João Faz de Conta<br />

• Boneca que chora e fecha os<br />

olhos<br />

• Serviço de Cozinha<br />

• Bodoque<br />

• Arapuca<br />

• Coleção de Feijões pintados<br />

• Pincel de goma arábica<br />

• Varinha de condão<br />

• Cavalinho de Pedrinho<br />

• Mala com <strong>brinquedos</strong><br />

• Anel mágico<br />

• Vidro Azul<br />

• Espelho Mágico<br />

• Bota Sete Léguas<br />

• Lâmpada Mágica<br />

• Alfinete de pombinha<br />

• Carro de roda de carretel<br />

• Pó mágico de pirlimpimpim<br />

• Formar desenhos e objetos <strong>na</strong>s<br />

nuvens<br />

• Noivado<br />

• Casamento<br />

• Chicote queimado<br />

• Esconde-esconde<br />

• Bento que bento fede<br />

• Esconder objetos<br />

• Brincar com carneirinho<br />

• Brincadeiras com os adultos<br />

• Brincar de boneca<br />

• Brincar de contar histórias<br />

• Trocar as letras e formar outras<br />

palavras<br />

• Correr<br />

• Pular<br />

• Andar<br />

• Subir em árvores<br />

• Chá de mentirinha com torradas<br />

• Comer de mentirinha<br />

• Brincadeira de “virar”, transformar os<br />

objetos em outros objetos<br />

• Brincar de “estar aqui e estar lá” ao<br />

mesmo tempo<br />

• Concurso de desenho<br />

• Circo<br />

• Corrida de cavalo<br />

• Pular arco<br />

59


3.2.2 Caçadas de Pedrinho<br />

A história inicia com Marquês de Rabicó aventurando-se no capoeirão dos<br />

Taquaruçus, que era um mato em que Do<strong>na</strong> Benta não deixava as crianças irem. Lá<br />

ele encontrou rastros e ouviu miados que suspeitou serem de uma onça. O Marquês<br />

chegou assustado em casa e comunicou sua suposição a Pedrinho. O menino,<br />

acreditando em Rabicó, contou o fato a Narizinho. Esta pensou em contar a Do<strong>na</strong><br />

Benta sobre a descoberta da onça por Rabicó, mas Pedrinho a impediu, pois Do<strong>na</strong><br />

Benta não os deixaria caçarem a onça. Narizinho tentou persuadir Pedrinho a desistir<br />

da idéia, mas ele foi irredutível em seu propósito e disse que partiria para essa<br />

caçada nem que fosse sozinho. Narizinho, vendo a bravura de Pedrinho e não<br />

querendo ficar para trás, aceitou participar da expedição.<br />

Figura 02 – Capa do livro Caçadas de Pedrinho<br />

Então, os dois saíram em busca dos demais companheiros. O primeiro que<br />

encontraram foi Rabicó, este não queria participar da caçada, mas Pedrinho o<br />

obrigou a ir. O segundo que encontraram era Visconde de Sabugosa, que aceitou o<br />

convite com toda a dignidade e nobreza. E, por fim, convidaram Emília, que recebeu<br />

a idéia com palmas, pois, enfim, teriam uma aventura importante: uma caça à onça.<br />

60


Pedrinho levaria uma espingarda que ele mesmo tinha fabricado escondido<br />

de Do<strong>na</strong> Benta, com cano de guarda-chuva e gatilho puxado a elástico.<br />

Estava carregada com pólvora duns pistolões sobrados da última festa de<br />

São Pedro. A arma que Narizinho escolheu foi a faca de cortar pão, como<br />

instrumento mestiço de faca e serrote. O Visconde recebeu um sabre feito<br />

de barril, bastante pontudo, mas da<strong>na</strong>do para entortar [...]. – E Você Emília<br />

que arma leva? – perguntou Narizinho. – Levo o espeto de assar frangos.<br />

Tenho mais fé <strong>na</strong>quele espeto do que <strong>na</strong>s armas de vocês todos. Restava o<br />

Marquês. Como fosse um grande medroso em vez de armas Pedrinho deulhe<br />

arreios. Rabicó iria puxando um canhãozinho feito dum velho tubo de<br />

chaminé, que o menino havia montado sobre as rodas de seu carrinho de<br />

cabrito. (LOBATO, 1994, p. 8).<br />

Quando as crianças criam seus <strong>brinquedos</strong> elas entram no mundo da<br />

fantasia. Freire (1992) relata que: caixas de papelão transformam-se em casa,<br />

pedaços de madeira viram mesas; cadeiras, armários; tampinhas de garrafa<br />

convertem-se em galinhas, pintinhos, chapéus. Não há o que não ganhe vida, nome<br />

e significado <strong>na</strong> atividade incessante do brinquedo e trabalho das crianças <strong>na</strong><br />

primeira infância. Foi exatamente isso que aconteceu com a turminha do Sítio, pois,<br />

um cano de guarda-chuva se transformou em uma espingarda; um elástico em<br />

gatilho; a pólvora da festa de São Pedro em bala para a arma; a faca de cortar pão<br />

em um serrote e o espeto de assar frango em arma.<br />

Todos seguiram o rastro da onça, quando a avistaram em uma moita. Esta,<br />

manhosamente, dirigiu-se para o lado dos heróis. Visconde deu o berro de comando<br />

fogo, mas os tiros de Pedrinho e Rabicó foram inúteis. Os heróis tiveram que se<br />

abrigar no alto de uma árvore para se protegerem da onça, que pacientemente<br />

aguardava que eles descessem.<br />

Após um tempo em cima da árvore, Pedrinho percebeu que tinha um pouco<br />

de pólvora no seu bolso, e a jogou nos olhos da onça. Então, todos desceram da<br />

árvore e atacaram a onça com verdadeira fúria, usando suas respectivas armas.<br />

Atacada por todos os lados, a onça morreu. Todos brigaram pelo mérito de tê-la<br />

matado. Porém, o Visconde de Sabugosa disse que o mérito principal era de<br />

Pedrinho, pois se ele não tivesse cegado a onça com a pólvora ninguém a teria<br />

matado.<br />

No capítulo “A volta para Casa”, Pedrinho utiliza cipós para amarrar a onça e<br />

levá-la até o Sítio. Do<strong>na</strong> Benta e Tia Nastácia, ao verem a onça, se assustaram,<br />

mas, ao mesmo tempo, ficaram impressio<strong>na</strong>das com a coragem da turminha.<br />

61


No capítulo seguinte, “Os habitantes da mata se Assustam”, um certo sagüi<br />

contou para toda a floresta a história da onça, cuja informação deixou os animais<br />

muito preocupados, pois pensavam que, se aquelas crianças conseguiram matar a<br />

onça mais feroz, com facilidade, matariam o resto dos animais. Assim, eles se viram<br />

ameaçados e decidiram atacar o Sítio. Então, começa uma grande “guerra” entre a<br />

turminha do Sítio e os animais.<br />

Em “A defesa estratégica”, a boneca mais corajosa do mundo contou todo o<br />

plano dos animais para Pedrinho. O menino teve uma brilhante idéia de fazer per<strong>na</strong>s<br />

de pau bem altas de bambu e ensebá-las. Por meio da idéia de Pedrinho, começou<br />

uma divertida brincadeira. Pedrinho iniciou tentando se equilibrar sobre as per<strong>na</strong>s de<br />

bambus e depois foi a vez de Narizinho, Visconde e Emília. Quando chegou a vez do<br />

Marquês de Rabicó, foi o maior sacrifício para amarrá-lo <strong>na</strong>s per<strong>na</strong>s de pau, pois o<br />

leitãozinho tinha quatro per<strong>na</strong>s.<br />

[...] Tia Nastácia apareceu <strong>na</strong> porta da cozinha para ver o que era e quase<br />

desmaiou de susto vendo o bandinho lá em cima, pernejando<br />

pernilongamente pelo terreiro. – Corra, Sinhá! – gritou para dentro. – venha<br />

ver o “felómeno” que aconteceu com a criançada. Está tudo pernilongo!<br />

Do<strong>na</strong> Benta apareceu <strong>na</strong> janela e assombrou-se da habilidade com que seus<br />

netos corriam e brincavam sobre per<strong>na</strong>s daquele cumprimento, como se<br />

estivessem <strong>na</strong>scido peraltas. (LOBATO, 1994, p. 19).<br />

Sendo a brincadeira atividade essencial <strong>na</strong> infância, faz-se necessário que a<br />

criança tenha a liberdade e o direito de brincar, visto que deve ser concebida como<br />

sujeitos de direitos. Direito à brincadeira, como maior fonte de conhecimento, de<br />

ampliação e qualidade de movimento, sensibilidade e emoção. Isso é apontado <strong>na</strong>s<br />

propostas em educação infantil brasileira, que chamam atenção para a necessidade<br />

do reconhecimento da criança como ser social, produtor de cultura.<br />

As crianças do Sítio brincam com muita liberdade, mesmo que assustem a<br />

princípio, Do<strong>na</strong> Benta e Tia Nastácia; no fi<strong>na</strong>l elas acabam entrando <strong>na</strong> brincadeira.<br />

E é exatamente isso que acontece quando a turminha conta do ataque das onças.<br />

- Mas isto não tem propósito, Pedrinho!- ralhou Do<strong>na</strong> Benta. – Vocês põemme<br />

doida. Onças e logo cin-qüen-ta! [..]. – O remédio, vovó, é a senhora e<br />

Tia Nastácia meterem-se em per<strong>na</strong>s de pau também. Olhe, as suas já estão<br />

ali prontinhas, feitas sob medida e as de Tia Nastácia são aquelas acolás<br />

[...].( LOBATO, 1994, p. 19).<br />

62


No meio dessa diversão os habitantes do Sítio recebem a visita de uma<br />

meni<strong>na</strong> chamada Cléu, que diz ser leitora das aventuras de Narizinho. Todos a<br />

recebem como a famosa Cléu, a meni<strong>na</strong> que falava pelo rádio e, de vez em quando,<br />

escrevia cartas para Narizinho, dando idéias de aventuras.<br />

No capítulo “O assalto das onças”, as onças começam atacar o Sítio, mas<br />

<strong>na</strong>da encontram. Quando estavam indo embora uma cuspidinha de Emília cai bem<br />

no focinho do “onço”, e ele acaba vendo a turminha. Tentaram derrubá-los, não<br />

tendo êxito algum decidiram esperar eles descerem. A boneca de pano tinha umas<br />

gra<strong>na</strong>das de vespas, a turminha estava ansiosa para que ela jogasse, mas, antes, a<br />

espertinha fez algumas exigências: “ - Primeiro: que todos reconheçam que sou mais<br />

esperta e inteligente do bando. Segundo: Que do<strong>na</strong> Benta me dê um regadorzinho<br />

de jardim, dos verdes – de outra cor não quero”. (LOBATO, 1994, p. 24). Emília não<br />

tem jeito mesmo! Até em meio a um ataque de onças ela quer tirar proveito, ama<br />

trocar favores ou idéias por objetos e <strong>brinquedos</strong>.<br />

Emília jogou sua gra<strong>na</strong>da cheia de vespas que espantaram os animais. A<br />

turminha começou a gritar: “- Viva , Viva a rainha das bonecas!” (LOBATO, 1994, p.<br />

24) . Emília novamente tratou de tirar proveito daquela situação.<br />

Prática como era, Emília tratou de aproveitar aquele entusiasmo para ganhar<br />

coisas. Obteve de Do<strong>na</strong> Benta a promessa dum lindo regadorzinho verde; de<br />

Pedrinho apanhou, ali <strong>na</strong> hora, cinco tostões novos; e de <strong>na</strong>rizinho<br />

conseguiu uma mobília de boneca. (LOBATO, 1994, p. 24).<br />

O capítulo “Os negócios da Emília” relata que havia chegado um circo no Rio<br />

de Janeiro, com muitos animais interessantes. Pedrinho queria muito ir ao circo, mas<br />

um rinoceronte havia fugido, mobilizando todo o Brasil. Ninguém sabia o paradeiro<br />

do animal, exceto Emília. A espertinha teve um plano de vender o animal para<br />

Pedrinho, mas, em troca, queria o seu carrinho de cabrito.<br />

Este carrinho de Cabrito constituía o orgulho do menino. Fora presente do<br />

Manuel Carapi<strong>na</strong>, um carpinteiro que passara lá uns dias, reformando o<br />

assoalho da casa. Pedrinho dava mais valor ao carrinho do que a todos os<br />

coches dourados de todos os reis da terra. (LOBATO, 1994, p. 27).<br />

63


Pedrinho não acreditou nessa louca história da boneca e se irritou muito. “–<br />

Basta! – gritou o menino. – Se continuar a amolar-me com essa estória, vou lá no<br />

seu cantinho e quebro todos os seus <strong>brinquedos</strong>”. (LOBATO, 1994, p. 27). Emília,<br />

que valorizava seus <strong>brinquedos</strong>, não queria perdê-los, então tratou de procurar outro<br />

freguês. Mas ninguém queria um rinoceronte, o jeito era tentar vender novamente<br />

para Pedrinho, mas, dessa vez, Emília contou com a ajuda de Cléu, a meni<strong>na</strong> que<br />

apareceu lá no Sítio. Cléu se propôs a ajudar Emília, com a condição de dividir<br />

metade do dinheiro adquirido nessa venda, mas a boneca não queria dinheiro algum;<br />

ape<strong>na</strong>s um brinquedo.<br />

No capítulo “Emília vende o rinoceronte”, as duas da<strong>na</strong>dinhas conseguiram<br />

vender o tal animal para Pedrinho, e foram todos em busca do rinoceronte. Depois<br />

que acharam, levaram-no para o Sítio por meio do pó de pirlimpimpim. Essa é a<br />

maneira que a turminha do Sítio utiliza para sair de situações difíceis, o faz-de-conta.<br />

No último capítulo da obra, “O rinoceronte entra para família”, Emília e<br />

Visconde se divertem com as histórias da África que o animal conta.<br />

Depois se punham os três a brincar de esconde-esconde, de chicote<br />

queimado, de pegador. Emília logo inventou jeito de montar a cavalo no<br />

chifre dele para passear pelo terreiro. O Visconde puxava o monstruoso<br />

paquiderme por uma cordinha atada à orelha [...] – Venha ver Sinhá! A<br />

Emília a cavalo no tal boi de um chifre só e o Visconde puxando ele por uma<br />

cordinha, como se fosse à coisa mais <strong>na</strong>tural do mundo! Credo! [...] Puxa o<br />

boi da África como se estivesse puxando um boizinho de chuchu, daqueles<br />

que Pedrinho costuma fazer. (LOBATO, 1994, p. 40).<br />

As <strong>brincadeiras</strong> com o rinoceronte repetiam-se diariamente, por várias horas.<br />

Além de ficar passeando montada em cima do animal, a boneca mais extrovertida,<br />

inventou novas coisas, como por exemplo, fazê-lo puxar o carrinho de cabrito, com<br />

um passageiro de cada vez, porque não cabiam dois. Narizinho, Pedrinho e Cléu<br />

foram brincar junto com Emília. Um dia, Tia Nastácia não resistiu, foi para o terreiro<br />

ver de perto a brincadeira. Até Do<strong>na</strong> Benta entrou nessa brincadeira.<br />

- Chegou sua vez, Do<strong>na</strong> Benta. Suba! – Disse Cléu. Era um despropósito<br />

aquilo, coisa para desmoralizar a boa velha para o resto da vida. Apesar<br />

disso a tentação foi forte e, como Cléu a ia empurrando, Do<strong>na</strong> Benta de<br />

súbito decidiu-se. Ajuntou a saia e, sem olhar para tia Nastácia (de<br />

vergonha), subiu ao carrinho. – Viva! Viva vovó! Berraram, do alto do<br />

paquiderme, os meninos. Toca, Emília! Puxa, Visconde! ( LOBATO, 1994, p.<br />

41).<br />

64


No meio dessa divertida brincadeira aconteceu uma "atrapalhação”.<br />

Apareceram, no Sítio, dois senhores: um era o dono do circo e o outro seu<br />

advogado. “O rinoceronte reconheceu o Senhor Muller e pendurou o focinho, muito<br />

triste, já sem vontade de brincar” (LOBATO, 1994, p. 42). O dono do circo queria<br />

levar seu animal embora, Emília indignou-se, depois que amansou o rinoceronte e<br />

passava o dia a brincar com ele, não queria devolvê-lo de forma alguma. A boneca<br />

de pano teve uma idéia. Deu um jeitinho de aqueles homens cheirarem uma<br />

pitadinha de pó de pirlimpimpim, então, sumiram no espaço. Todos ficaram muito<br />

felizes com a vitória de Emília.<br />

Para ilustrarmos melhor nossos objetivos em Caçadas de Pedrinho, também<br />

fizemos, dessa obra, um breve resumo dos perso<strong>na</strong>gens, dos <strong>brinquedos</strong>, das<br />

<strong>brincadeiras</strong> e dos <strong>jogos</strong> nela presente:<br />

Tabela 3 – Caçadas de Pedrinho<br />

Perso<strong>na</strong>gens Brinquedos Jogos e Brincadeiras<br />

• Do<strong>na</strong> Benta<br />

• Tia Nastácia<br />

• Pedrinho<br />

• Narizinho<br />

• Emília<br />

• Visconde<br />

• Marquês de<br />

Rabicó<br />

• Rinoceronte<br />

Quindim<br />

• A meni<strong>na</strong> Cléu<br />

• Animais da<br />

floresta<br />

• Emília (Boneca de Pano)<br />

• Visconde<br />

• Marquês de Rabicó<br />

• Armas ( espingardas de cabo<br />

de guarda-chuva, faca de<br />

cortar pão, espeto de assar<br />

frango, etc.)<br />

• Per<strong>na</strong>s de bambu<br />

• Regadorzinho de jardim<br />

• Mobília de boneca<br />

• Carrinho de cabrito<br />

• Boizinho de chuchu<br />

• Caça<br />

• Equilibrar-se em cima das per<strong>na</strong>s de<br />

bambu<br />

• Esconde-esconde<br />

• Chicote queimado<br />

• Pegador<br />

• Voltas com o rinoceronte<br />

• Rinoceronte puxando o carrinho de<br />

cabritos<br />

• Subir <strong>na</strong>s árvores<br />

• Brincadeiras com os adultos<br />

• Faz-de-conta<br />

65


3.2.3 O Picapau Amarelo<br />

O Picapau Amarelo teve uma segunda edição em 1939. Nele, Lobato <strong>na</strong>rra as<br />

aventuras dos perso<strong>na</strong>gens do Sítio do Picapau Amarelo quando lá se instalam os<br />

perso<strong>na</strong>gens do mundo da fábula.<br />

Figura 03 – Capa do Livro O Picapau Amarelo<br />

De forma exemplar, este livro mistura, <strong>na</strong> mitologia brasileira do sítio,<br />

perso<strong>na</strong>gens das mais variadas origens, de perso<strong>na</strong>gens da mitologia grega, como a<br />

Medusa e Netuno, ao literário Dom Quixote e ao moderníssimo Capitão Gancho,<br />

passando pela tradição do conto de fadas com Cinderela e o Pequeno-Polegar, e<br />

pelo oriental Codadade das Mil e Uma Noites.<br />

A história inicia-se com o capítulo “A cartinha de Polegar”, quando o Pequeno<br />

Polegar manda uma carta para Do<strong>na</strong> Benta, dizendo que os habitantes das fábulas<br />

queriam se mudar para o Sítio. Pedrinho ficou muito feliz com os novos habitantes do<br />

Sítio e disparou a fazer projetos de <strong>brincadeiras</strong> com Aladino e o Príncipe Codadade.<br />

Monteiro Lobato cria um universo próprio para a contextualização e<br />

modernização das histórias de tradição e do folclore que considerava importante a<br />

criança conhecer. Para dialogar com essas histórias, cria um mundo mágico, os<br />

66


perso<strong>na</strong>gens partem do Sítio do Picapau Amarelo para o mundo do faz-de-conta e<br />

dialogam com os perso<strong>na</strong>gens da tradição literária.<br />

O escritor de Taubaté detalha, cuidadosamente, todas as ce<strong>na</strong>s dessa obra,<br />

assim, o leitor consegue reviver deliciosas aventuras juntamente com os<br />

perso<strong>na</strong>gens do Sítio, imagi<strong>na</strong>ndo, criando e se divertindo.<br />

Em “O ninho de João de Barro e a Quimera”, Pequeno Polegar queria morar<br />

<strong>na</strong> casinha que o João de Barro havia feito. Então, começou a briga entre os dois. A<br />

turminha logo pensou em alguns meios para resolver aquela situação, a primeira<br />

sugestão era de atirar o bodoque de Pedrinho nos dois “Joões de Barros” e matá-los<br />

para que a casinha ficasse com Polegar, mas Narizinho não concordou porque a<br />

casa fora feita por eles. A segunda sugestão era que Polegar viesse morar <strong>na</strong> casa<br />

do Sítio e deixasse os “Joões de Barros” morando em sua casinha, o jeito para<br />

avisá-los era subir <strong>na</strong> árvore e Visconde foi escolhido para essa missão.<br />

Percebemos que, neste capítulo, Visconde faz de sua missão uma divertida<br />

brincadeira de subir em árvores. Emília também gostava de subir em árvores,<br />

principalmente <strong>na</strong>s jabuticabeiras. Essa brincadeira é típica das crianças que moram<br />

sobretudo <strong>na</strong> zo<strong>na</strong> rural e ajuda no desenvolvimento motor das crianças.<br />

No Capítulo “O Visconde e a Quimera”, Visconde inicia uma brincadeira de<br />

jor<strong>na</strong>lista e começa a investigar o Monstro que está a sua frente, fazendo inúmeras<br />

perguntas. O sábio Visconde acabou ganhando mais um amigo: a Quimera.<br />

No capítulo “Derrota dos Piratas”, Emília, juntamente com a turminha, utiliza o<br />

faz-de-conta para escapar de mais uma de suas aventuras.<br />

A atrapalhação foi tanta que Emília teve de lagar do binóculo para assumir o<br />

comando. Idéias! Venham idéias! Emília dava murrinhos <strong>na</strong> cachola, a ver se<br />

saía alguma boa idéia. No começo não saiu <strong>na</strong>da: depois, um sorriso de<br />

triunfo brilhou-lhe os olhos. – Acalmem-se! Ainda há o “supremo recurso”<br />

[...]. Todos voltaram-se para ela, suspensos. – Fale Emília, fale! –implorou<br />

Do<strong>na</strong> Benta. – Há o “faz-de-conta”! Quando tudo parece perdido, eu recorro<br />

ao “faz-de-conta” e salvo a situação. (LOBATO, 1977, p. 69).<br />

No capítulo “Tia Nastácia e o escudo”, a situação no Sítio não estava <strong>na</strong>da<br />

boa. Do<strong>na</strong> Benta, Nastácia e Narizinho estavam arrumando um jeito de “expulsar” os<br />

heróis de sua casa.<br />

D.Quixote, sem falar em retirar-se, tinha caído no que Emília chamava<br />

“lambança”. Cafezinho a toda hora, redinha de Do<strong>na</strong> Benta, almoço, jantar,<br />

67


cama - e divertimento. Parecia julgar aquela casa como sua ou hotel,<br />

também o herói Belerofonte não falava em ir-se. O caso entrou a procurar<br />

Do<strong>na</strong> Benta. ( LOBATO, 1977, p. 82).<br />

O autor coloca o cafezinho, a alimentação, e o descanso em pé de igualdade<br />

com o divertimento. Dá-se a entender que, para uma pessoa estar bem hospedada a<br />

ponto de não querer mais ir embora, é necessário que os requisitos correspondam<br />

aos do autor citados acima. Fica visível a valorização das <strong>brincadeiras</strong> e dos<br />

divertimentos <strong>na</strong>s obras desse estimado autor.<br />

Emília, no capítulo “O Cruzeiro”, quer muito um arco do cupido para ficar<br />

brincando de acertar “setadas” de amor <strong>na</strong>s pessoas para que elas se apaixonem.<br />

Para isso, teve que trocar o arco pelo bodoque de Pedrinho. Mais tarde, para<br />

devolver o arco e retirar o encanto da flecha que acertou em Tia Nastácia, a<br />

bonequinha de pano recorreu novamente ao “faz-de-conta”.<br />

Do<strong>na</strong> Benta nunca deixou que a turminha desse seu endereço para ninguém,<br />

mas, no capítulo “Os Visitantes”, algumas crianças comandadas por Maria da Lurdes<br />

arrumaram um meio de descobrir onde era o Sítio de Do<strong>na</strong> Benta. Infelizmente,<br />

erraram de época e apareceram justamente quando a turminha do Sítio estava<br />

viajando. O Burro falante recepcionou as crianças que ficaram desapontadas por não<br />

encontrarem a turminha, mas insistiram, então, para, ao menos, conhecerem a casa.<br />

O Burro ficou receoso, mas acabou cedendo ao pedido. Essas crianças ficaram<br />

muito felizes com o consentimento e brincaram muito no Sítio. Andaram no Quindim,<br />

depois do passeio, resolveram brincar de Sítio, eles incorporavam os perso<strong>na</strong>gens<br />

do Sítio;<br />

Foi uma alegria imensa <strong>na</strong> criançada. Eles no Sítio de Do<strong>na</strong> Benta! Que<br />

coisa colossal! [...]. Rãzinha colocou-se no chifre de Quindim, que era o<br />

lugar de Emília. – A Emília agora sou eu, gentarada! Quindim deu várias<br />

voltas pelo pasto com o bando de crianças a fazer o maior dos berreiros em<br />

cima dele. ”Eu sou o Pedrinho” berrava uma. “E eu sou a Narizinho!” –<br />

berrava outra. “E eu sou Do<strong>na</strong> Benta!” – berrava a terceira. “ E eu Tia<br />

Nastácia!”. E eu sou um bolinho”- “ E eu sou o bodoque!”- “E eu sou o pé de<br />

frango de seis dedos!”. (LOBATO, 1977, p. 112).<br />

As crianças gostaram tanto da brincadeira que começaram a ter as reações e<br />

falas de acordo com seus perso<strong>na</strong>gens.<br />

68


- Vamos brincar de “Sítio”! - propôs a Joyce, - Eu sou Do<strong>na</strong> Benta . – Pegou<br />

<strong>na</strong> mão do Gilson e disse, fingindo com a voz de velha: - Ah, Pedrinho que<br />

mão suja a sua! E que é isso amarelo <strong>na</strong> sua cara? Gilson respondeu: - são<br />

bigodes de manga, vovó. Eu sou o Conde dos Bigodes de Manga! – Mentira,<br />

Do<strong>na</strong> benta!- gritou Maria<strong>na</strong>, a fingir de Emília - É que ele não lavou o rosto<br />

hoje. (LOBATO, 1977, p. 112).<br />

As crianças se identificam com os perso<strong>na</strong>gens do Sítio, assim como o leitor<br />

quando lê e prestigia a obra. Podemos notar a presença marcante do simbolismo<br />

durante essa brincadeira alimentando a criatividade das crianças.<br />

O Burro falante se emocio<strong>na</strong> ao ver as crianças brincando, “Gosto de ver as<br />

crianças <strong>na</strong> ple<strong>na</strong> alegria da liberdade, porque fui muito infeliz quando eu era<br />

criança, nunca brinquei” (LOBATO, 1977, p.112). A brincadeira diverte e é<br />

brincando/jogando que a criança descobre e vivencia a realidade de forma<br />

prazerosa; pode experimentar de diferentes maneiras as situações que tenta<br />

compreender, fazendo, refazendo, trocando papéis; inicia o aprendizado e ensaia-se<br />

em regras sociais que vão variando em complexidade à medida que cresce.<br />

Os Visitantes do Sítio não se cansam. Parecem querer gastar toda a sua<br />

energia; brincam de correr atrás de uma pe<strong>na</strong> pensando ser o Peninha; correm pelo<br />

pomar; sobem em cima de árvores de jabuticaba, até <strong>na</strong> hora de comer jabuticaba se<br />

fez brincadeira “tloque-pluf-nhoque”.<br />

As crianças apresentaram para o Burro falante um pequininote;<br />

- Quem é esse xereta?- perguntou o Burro. – Não conhece? Pois é o célebre<br />

“boneco americano”, o Rodrigo. Quer ver? E chamando o pequininote: -<br />

Venha Rodrigo, venha fazer “bonequinho americano” para o Conselheiro ver.<br />

O pelotinho de gente aproximou-se, parou diante do Burro e, enterrando a<br />

cabeça nos ombros, imitou um tal “boneco americano”, que só ele sabia o<br />

que era. O conselheiro achou tanta graça que não conteve um zurro de<br />

gosto, tão bem zurrado que o Rodrigo, num susto, caiu sentado no chão.<br />

(LOBATO, 1977, p. 115).<br />

No capítulo “A Fuga”, as crianças estavam vivendo uma vida de puro sonho,<br />

em <strong>brincadeiras</strong> e mais <strong>brincadeiras</strong>, mas já era hora de voltarem para suas casas,<br />

pois Capitão Gancho havia planejado de roubar o Sítio.<br />

No último capítulo “Falta Um – Ela I”, a turminha do Sítio volta para a casa, a<br />

fim de proteger o Sítio. Quando chegam, o Capitão Gancho já havia se instalado,<br />

mas Pedrinho tem um plano: ao anoitecer, entraria no quarto do Capitão Gancho<br />

(que era de Do<strong>na</strong> Benta) e colocaria um jacaré com um despertador <strong>na</strong> barriga,<br />

69


quando Gancho acordasse ele se assustaria. O plano deu certinho. Quando Gancho<br />

acordou viu o animal, correu como nunca havia corrido.<br />

Tudo deu certo, mas a turminha estava muito triste, pois haviam esquecido Tia<br />

Nastácia no palácio que fora invadido pelos monstros, Pedrinho não se conformou<br />

com a situação, então, começaram os preparativos para irem buscá-la. Emília fechou<br />

com um grito de guerra: “- A Grécia! A Grécia! (LOBATO, 1977, p. 133).<br />

Para ilustrarmos melhor nossos objetivos em Caçadas de Pedrinho, de modo<br />

análogo ao das duas obras precedentes, fizemos um breve resumo dos<br />

perso<strong>na</strong>gens, dos <strong>brinquedos</strong>, das <strong>brincadeiras</strong> e dos <strong>jogos</strong> presente <strong>na</strong> obra :<br />

Tabela 4 – O Picapau Amarelo<br />

Perso<strong>na</strong>gens Brinquedos Jogos e Brincadeiras<br />

• Do<strong>na</strong> Benta<br />

• Tia Nastácia<br />

• Pedrinho<br />

• Narizinho<br />

• Emília<br />

• Visconde<br />

• Marquês de<br />

Rabicó<br />

• Rinoceronte<br />

Quindim<br />

• O Burro falante<br />

• Perso<strong>na</strong>gens do<br />

mundo da fábula<br />

• Crianças da<br />

cidade<br />

• Emília (Boneca de Pano)<br />

• Visconde<br />

• Marquês de Rabicó<br />

• Bodoque<br />

• Binóculo<br />

• Arco e flecha do cupido<br />

• Boneco americano<br />

• Subir <strong>na</strong>s árvores<br />

• Jor<strong>na</strong>lista<br />

• Investigador<br />

• Faz-de-conta<br />

• Dar “setadas” de amor<br />

• Andar em cima do rinoceronte<br />

• Brincar de Sítio<br />

• Incorporar os perso<strong>na</strong>gens do Sítio,<br />

imitá-los<br />

• Brincadeiras orais<br />

• Correr<br />

70


Considerações Fi<strong>na</strong>is<br />

O tema “brincadeira” vem sendo bastante pesquisado, desde o século XVIII em<br />

suas diferentes vertentes. Apesar disso, percebem-se, ainda, que pouco se sabe<br />

sobre os processos envolvidos <strong>na</strong> brincadeira e, principalmente, sobre a inclusão das<br />

atividades lúdicas <strong>na</strong> educação. A maior preocupação, no entanto, não deve ser de<br />

estabelecer um conceito universal e fechado sobre a atividade do brincar, mas<br />

ampliar as pesquisas, buscando preencher as lacu<strong>na</strong>s existentes e, paralelamente,<br />

subsidiar os docentes e interessados no assunto para que possam realizar práticas<br />

educativas mais interessantes, e adequadas aos seus alunos, sobretudo às crianças.<br />

A brincadeira oferece às crianças uma ampla estrutura básica para mudanças<br />

das necessidades e tomada de consciência: ações <strong>na</strong> esfera imagi<strong>na</strong>tiva, criação<br />

das intenções voluntárias, formação de planos da vida real, motivações intrínsecas e<br />

oportunidade de interação com o outro, que, sem dúvida contribuirão para o seu<br />

desenvolvimento.<br />

A brincadeira acontece onde quer que a criança se encontre, independente do<br />

local e independente do seu suporte, pois basta um pequeno estímulo para que sua<br />

imagi<strong>na</strong>ção a leve para um mundo repleto de criatividade e movimento, expressando<br />

o seu interior.<br />

Outro tema que vem sendo explorado é o da <strong>literatura</strong> infantil, pois, formar bons<br />

leitores tem sido uma tarefa desafiadora para os educadores do mundo inteiro. Ler<br />

por ler, mecanicamente, sem preocupar-se com a compreensão do que está lendo,<br />

não desperta no leitor a curiosidade e o interesse por buscar mais saberes. A leitura<br />

tor<strong>na</strong>-se mais eficiente quando os leitores a compreendem, pois, compreendendo,<br />

sentem gosto por ela, despertando o prazer em fazê-lo. Para ser um bom leitor, a<br />

criança precisa conhecer e entrar em contato com a leitura antes mesmo de saber<br />

ler, por meio de histórias contadas, lidas e experimentadas <strong>na</strong> vivência familiar, que<br />

irão despertar o prazer de ler. A leitura é fundamental e indispensável para o<br />

desenvolvimento de qualquer pessoa. Sem ela tor<strong>na</strong>-se mais difícil à aquisição do<br />

conhecimento <strong>na</strong>s mais diversas áreas.<br />

Para nós, o brincar é um instrumento transdiscipli<strong>na</strong>r que atravessa toda e<br />

qualquer prática com crianças, um dos poucos que pode permitir um verdadeiro<br />

diálogo interdiscipli<strong>na</strong>r. É por meio dele que se processa a organização do sujeito,<br />

71


que <strong>na</strong>sce e se desenvolve a linguagem, que se dá o aprendizado e o conhecimento<br />

do mundo. Via privilegiada de expressão e de apreensão da realidade, o brincar<br />

permite o acesso ao simbólico e aos processos de complexificação da vida.<br />

É de fundamental importância trazer o jogo, a brincadeira e o brinquedo para<br />

dentro da sala de aula, como recurso para novas construções de conhecimento, bem<br />

como para avaliar aquilo que já foi conquistado. Assim sendo, nos dedicamos ao<br />

estudo do lúdico <strong>na</strong>s três obras de Monteiro Lobato. Dessa forma, construímos uma<br />

ponte dialética entre o lúdico e a <strong>literatura</strong> infantil.<br />

Ao iniciarmos nossa pesquisa, partimos da seguinte questão: Se existem, quais<br />

são as <strong>brincadeiras</strong>, os <strong>jogos</strong> e os <strong>brinquedos</strong> presentes <strong>na</strong> Literatura Lobatia<strong>na</strong>?<br />

Para respondermos tal questio<strong>na</strong>mento fez se necessário estudarmos sobre o<br />

surgimento da valorização da infância no inicio do século XVII, quando a criança<br />

deixa de ser vista como um adulto em miniatura e passa a ter necessidades próprias,<br />

surgindo, assim, a infância.<br />

Em seguida, descrevemos sobre a grande influência que os <strong>brinquedos</strong>, as<br />

<strong>brincadeiras</strong> e os <strong>jogos</strong> exercem <strong>na</strong> vida da criança, já que é toda permeada pela<br />

brincadeira e pelo fantasiar. É por meio do lúdico que ela experimenta suas novas<br />

habilidades, explora seu potencial, exercita sua imagi<strong>na</strong>ção, sua sociabilidade e sua<br />

criatividade (KISHIMOTO, 2002). O jogo e/ou brincadeira existe antes mesmo da<br />

própria civilização, como relata Huizinga (1980). Entretanto, é difícil defini-lo, devido<br />

às constantes mudanças, ou seja, às relações históricas, culturais e sociais <strong>na</strong>s<br />

quais ele está inserido.<br />

Estudamos também os caminhos percorridos pela <strong>literatura</strong> infantil e sobre<br />

suas contribuições <strong>na</strong> vida das crianças. Encontramos, num passado remoto, uma<br />

<strong>literatura</strong> marcada pelo capitalismo e impreg<strong>na</strong>da de valores morais que os leitores<br />

deveriam incorporar. Foi nesse contexto que Monteiro Lobato observa as<br />

necessidades da criança e resolve escrever para elas, destruindo os preceitos da<br />

época, e introduzindo, para o leitor mirim, histórias fantásticas e deliciosas,<br />

estimulando-os o prazer por meio da leitura.<br />

No decorrer de todo esse caminhar, conseguimos atingir nosso objetivo<br />

inventariando o lúdico presente <strong>na</strong>s três obras estudadas, apresentando os<br />

<strong>brinquedos</strong> como Emília e Visconde, <strong>brincadeiras</strong> de faz-de-conta, pega-pega,<br />

esconde-esconde, jogo de palavras, entre tantas outras <strong>brincadeiras</strong> utilizadas pelos<br />

72


perso<strong>na</strong>gens do Sítio de Do<strong>na</strong> Benta, respondendo, conseqüentemente, o nosso<br />

questio<strong>na</strong>mento.<br />

Diante das informações presentes, neste trabalho, podemos dizer que a<br />

brincadeira pode e deve ser privilegiada no contexto educacio<strong>na</strong>l. A escola, atenta<br />

aos inúmeros benefícios que a brincadeira traz, bem como <strong>na</strong>s possibilidades que<br />

elas criam de se trabalhar diferentes conteúdos em forma lúdica, deve “lutar” sempre<br />

pra que tais atividades sejam privilegiadas e bem aceitas pelas crianças e pelos<br />

adultos responsáveis.<br />

Essa pesquisa foi realizada para que docentes e profissio<strong>na</strong>is da área da<br />

educação utilizem os dados fornecidos <strong>na</strong> escola. Sugerimos que, a partir desta<br />

leitura, cada educador desenvolva e crie atividades adequadas aos seus alunos<br />

potencializando o desenvolvimento de cada um deles. De acordo com Brougère<br />

(1997), o brincar exige uma aprendizagem; sendo assim, o professor terá este papel<br />

fundamental de inserir a criança <strong>na</strong> brincadeira, criando espaços, oportunidades e<br />

interagindo com ela.<br />

Portanto, é imprescindível que os professores compreendam a importância<br />

dos <strong>brinquedos</strong>, das <strong>brincadeiras</strong> e dos <strong>jogos</strong> e suas implicações para organizar o<br />

processo educativo de modo mais positivo, contribuindo para o desenvolvimento das<br />

crianças (PONTES & MAGALHÃES, 2003). Sem esta compreensão, corre-se o risco<br />

de uma prática educativa com equívocos, como, por exemplo, professores<br />

preocupados em desenvolver a brincadeira em sala de aula, objetivando atitudes de<br />

cooperação entre os alunos, mas direcio<strong>na</strong>ndo a atividade para a competição. Ou<br />

ainda, tirando a possibilidade da criança escolher seus <strong>jogos</strong>, <strong>brinquedos</strong> e<br />

<strong>brincadeiras</strong>, quando o professor é o único a escolher e direcio<strong>na</strong>r as ações lúdicas,<br />

sem o auxilio dos seus alunos. Um adulto bem informado e preparado terá condições<br />

de intervir e proporcio<strong>na</strong>r com maior intensidade o desenvolvimento da criança.<br />

Gostaríamos de esclarecer que, não se trata, neste momento, de fi<strong>na</strong>lizarmos<br />

o trabalho, pois temos a certeza de que um estudo nunca se encerra<br />

verdadeiramente, visto que, <strong>na</strong> condição de i<strong>na</strong>cabamento que segundo Freire<br />

(1998), faz parte de nossa condição huma<strong>na</strong>, sempre se estará em busca de novas<br />

etapas a serem vencidas ou superadas. O estudo não se encerra aqui, pois<br />

almejamos outros avanços, uma vez que a “ [...] história é tempo de possibilidade e<br />

não de determinismo”. (FREIRE, 1998, p. 21).<br />

73


Ter estudado Monteiro Lobato proporcionou-nos, por meio de suas obras,<br />

viajar no divertido mundo do faz-de-conta e até viver alguns por alguns dias no Sítio<br />

do Picapau Amarelo. Lobato está indiscutivelmente presente em muitas memórias,<br />

inclusive <strong>na</strong> nossa.<br />

Na infância, não tivemos o prazer de conhecer profundamente as obras desse<br />

estimado autor, ape<strong>na</strong>s superficialmente. Foi <strong>na</strong> maturidade que pudemos desfrutar<br />

do mundo mágico da <strong>literatura</strong> lobatia<strong>na</strong>, e que poderemos mostrar aos nossos<br />

alunos.<br />

Existem milhares de idéias e perguntas que surgiram no decorrer desse<br />

trabalho que nos impulsio<strong>na</strong>ram a continuar a pesquisa, tais como: As crianças de<br />

hoje conhecem Monteiro Lobato? Sabem de sua história, de sua vida de suas obras?<br />

Essas crianças lêem as maravilhosas obras escritas para elas por Lobato? As<br />

crianças da atualidade brincam com as <strong>brincadeiras</strong> utilizadas pelas crianças do Sítio<br />

do Picapau Amarelo? Entre tantas outras ... e outras...e outras.<br />

74


REFÊRENCIAS<br />

ABERASTURY, Arminda. A criança e seus <strong>jogos</strong>. 2ª. Ed. Porto Alegre: Artes<br />

Médicas 1992.<br />

ABRAMOVICH, Fanny. O estranho mundo que se apresenta às crianças. São<br />

Paulo: Summer Editorial, 1983.<br />

______. Literatura infantil: gostosuras e bobices. 5.ed. São Paulo : Scipione,<br />

2005.<br />

AGUIAR, V.T. & BORDINI, M.G. Literatura: a formação do leitor: alter<strong>na</strong>tivas<br />

metodológicas. 2.ed. Porto Alegre : Mercado Aberto, 1993.<br />

ARIÉS, Philippe. História social da criança e da família. Trad. Dora Flaksman.<br />

2.ed. Rio deJaneiro: Livros Técnicos e Científicos, 1981.<br />

BENJAMIN, Walter. Reflexões: a criança, o brinquedo e a educação. São Paulo:<br />

Summus, 1984.<br />

BETTELHEIM, Bruno. A psicanálise dos contos de fadas. 11.ed. Rio de Janeiro :<br />

Paz e Terra, 1996.<br />

BOMTEMPO, Edda. Aprendizagem e brinquedo. In: G.P.Witter e J.F.B. Lomô<strong>na</strong>co<br />

(orgs). Psicologia da Aprendizagem. São Paulo: EPU, 1987<br />

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imaginário. In: KISHIMOTO, Tizuko Morchida (org.). Jogo, brinquedo, brincadeira e<br />

a educação. 5ª ed. São Paulo: Cortez, 2001.<br />

BORGES, José Luis. In: MENDES,Maria dos Prazeres santos: O estético em<br />

diálogo <strong>na</strong> <strong>literatura</strong> infanto-juvenil: Monteiro Lobato, Clarice Lispector, Lygia<br />

75


Boju<strong>na</strong> Nunes. Dissertação do Título de Doutor em Comunicação e Semiótica,<br />

PUC/SP.<br />

BROUGÈRE, Gilles. Brinquedo e cultura. Revisão técnica e versão brasileira<br />

adaptada por Gisela Wajskop . São Paulo: Cortez, 1997<br />

BRUNER, Jerome Suymour. O processo da Educação. Trad.de Lólio Lourenço de<br />

Oliveira 7ed.São Paulo: Nacio<strong>na</strong>l , 1978.<br />

CADEMARTORI, Ligia. O que é <strong>literatura</strong> infantil? 6.ed. São Paulo : Brasiliense,<br />

1994<br />

COELHO, Nelly Novaes. Panorama histórico da <strong>literatura</strong> infantil/juvenil: das<br />

origens indo-européias ao Brasil contemporâneo. São Paulo : Ática, 1991.<br />

______.Dicionário crítico da <strong>literatura</strong> infantil e juvenil brasileira :séculos XIX e<br />

XX. São Paulo : EDUSP, 1995.<br />

______. Literatura Infantil: teoria, análise, didática. São Paulo: Moder<strong>na</strong>, 2002.<br />

CUNHA, Nylse Hele<strong>na</strong> Silva. Brinquedoteca: um mergulho no brincar. São Paulo :<br />

Vetor, 1994.<br />

DOHME, Vânia. Atividades lúdicas <strong>na</strong> educação. O caminho de tijolos amarelos do<br />

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