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Os Silêncios de Eça

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palavra, <strong>de</strong> resto, reduzida àquela breve informação 4 ; o que se lhe segue são as “notas<br />

<strong>de</strong>sor<strong>de</strong>nadas e bizarras” que ocupam todo o resto do folhetim, como se o jovem <strong>Eça</strong><br />

permanecesse refugiado sob a ocultação <strong>de</strong> um texto apresentado como <strong>de</strong> autoria<br />

alheia. Uma autoria alheia que, assim, acaba por funcionar como factor <strong>de</strong> silenciamento.<br />

A isto seguem-se parcerias, estratagemas vários e mais mistificações: em 1867,<br />

no Distrito <strong>de</strong> Évora, cenário <strong>de</strong> experiências fundadoras <strong>de</strong> <strong>de</strong>sdobramento, que mais<br />

tar<strong>de</strong> hão-<strong>de</strong> dar frutos saborosos; nas páginas da Revolução <strong>de</strong> Setembro e d’O Primeiro<br />

<strong>de</strong> Janeiro, em 1869, quando, com as cumplicida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Batalha Reis e Antero <strong>de</strong><br />

Quental, emerge o primeiro Fradique Men<strong>de</strong>s, tentativa <strong>de</strong> alterida<strong>de</strong> agora mais<br />

consistente do que a daquele jornalista que no Distrito <strong>de</strong> Évora assinava com as iniciais<br />

A.Z. as correspondências do Reino; em 1870, nova parceria e nova mistificação, <strong>de</strong>sta<br />

vez com Ramalho Ortigão, nas páginas do Diário <strong>de</strong> Notícias, quando se publicam as<br />

cartas que, ainda nesse ano, originam a publicação <strong>de</strong> um romance epistolar chamado O<br />

Mistério da Estrada <strong>de</strong> Sintra: é esse o primeiro a que <strong>Eça</strong> dá o seu nome <strong>de</strong> autor, mas<br />

não ainda <strong>de</strong> forma inteiramente individualizada, do mesmo modo que a autoria d’As<br />

Farpas, em 1871-72, é ainda compartida; e no que às responsabilida<strong>de</strong>s autorais diz<br />

respeito, a <strong>de</strong>strinça só acontece com a publicação dos dois volumes <strong>de</strong> Uma Campanha<br />

Alegre, em 1890-91, o que não impe<strong>de</strong> <strong>Eça</strong> <strong>de</strong> ce<strong>de</strong>r à tentação do silenciamento,<br />

traduzido na supressão <strong>de</strong> textos d’As Farpas originais.<br />

Tarda muito, então, em aparecer um autor <strong>de</strong> livros literários chamado <strong>Eça</strong> <strong>de</strong><br />

Queirós: só em 1876 isso ocorre, quando se publica a segunda versão d’O Crime do<br />

Padre Amaro. É caso para dizer, que, aos 31 anos e comparado com outros, <strong>Eça</strong> não era<br />

talvez, em livro, um autor serôdio; mas para quem tanto tinha já escrito não se po<strong>de</strong> dizer<br />

que fosse cedo para aparecer nessa condição. Por <strong>de</strong>trás da <strong>de</strong>mora estava o que tenho<br />

vindo a sugerir: uma quase inelutável tendência para a ocultação, mesmo para o silêncio,<br />

ambas evi<strong>de</strong>nciando uma espécie <strong>de</strong> retracção <strong>de</strong> uma adiada capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> afirmação<br />

autoral. E contudo, essa afirmação autoral era quase obrigatória em quem viveu as<br />

solidarieda<strong>de</strong>s geracionais e as vinculações i<strong>de</strong>ológicas que são conhecidas e que quase<br />

impunham maior ousadia e <strong>de</strong>senvoltura autoral.<br />

É certo que, imediatamente antes da versão <strong>de</strong> 1876, <strong>Eça</strong> publicara (mais certo<br />

seria talvez dizer que fora publicada) uma primeira versão d’O Crime do Padre Amaro.

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