Páginas - ed. 91 - Todas - Arquidiocese de Florianópolis
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14-<br />
Junho 2004<br />
RETALHOS DO COTIDIANO<br />
Fome<br />
O que sobrou da comida do<br />
cachorro é aproveitado pelos<br />
pardais, numa convivência pacífica.<br />
Na calçada, uns restos <strong>de</strong><br />
pão seco são aproveitados por<br />
formigas que não param <strong>de</strong> ir e<br />
vir. Lá na frente, a gaivota sobrevoa<br />
o mar, espreita e, com agilida<strong>de</strong><br />
espantosa, abiscoita o peixe<br />
do seu almoço. Sob as folhas<br />
da árvore, o passarinho se<br />
<strong>de</strong>licia com as pequeninas bagas<br />
que encontra. O beija-flor vai<br />
e volta velozmente, na sua insaciável<br />
busca <strong>de</strong> vida. A borboleta<br />
voa alegre e colore o espaço.<br />
As árvores crescem. E dão<br />
sombra, e oferecem frutos. Toda<br />
a natureza está viva e bonita.<br />
Quem já viu uma gaivota morrer<br />
<strong>de</strong> fome? Ou teve notícia <strong>de</strong> uma formiga<br />
que não encontrasse alimento?<br />
Ou <strong>de</strong> um beija-flor que não localizasse<br />
o que sugar?<br />
Só os homens morrem <strong>de</strong> fome.<br />
Só os homens. Por quê?<br />
Repetição<br />
Há ocasiões em que, escutando<br />
um CD, tenho vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> repetir muitas<br />
vezes uma música que me agrada.<br />
Mas, normalmente <strong>de</strong>ixo correr.<br />
E não poucas vezes me surpreendo<br />
ao <strong>de</strong>scobrir, numa faixa que segue,<br />
a beleza até então escondida. Não é<br />
assim também na vida? Às vezes,<br />
queremos ficar repetindo a rotina do<br />
dia-a-dia, que sufoca. O bom Deus<br />
nos p<strong>ed</strong>e para sairmos da praia e<br />
avançarmos para águas mais profundas.<br />
Aí, só aí encontraremos a alegria<br />
que nos renova, a paz que vem<br />
do Alto, as forças para ir adiante. É, a<br />
vida é um CD com muitas faixas!<br />
Balão<br />
É mais fácil estourar o balão com<br />
um espinho <strong>de</strong> laranjeira do que<br />
enchê-lo.<br />
Encher o balão é dizer uma palavra<br />
<strong>de</strong> consolo, dar um elogio que<br />
eleva, alegrar-se com os que se alegram<br />
e chorar com os que choram.<br />
Esvaziá-lo é calar a palavra que <strong>de</strong>veria<br />
ter sido dita, é com a palavra<br />
construir o inferno em vez <strong>de</strong> plantar<br />
o céu. Santo Agostinho afirmava:<br />
“Para o alto, ó Deus, ergueis quem<br />
encheis <strong>de</strong> vós. E como não sou<br />
cheio <strong>de</strong> vós, sou pesado a mim<br />
mesmo”. Põe-me tu no alto, Senhor,<br />
e ajuda-me a pôr no alto, junto <strong>de</strong> ti,<br />
os que passarem por minha vida!<br />
Carlos Martendal<br />
Foto/JA<br />
Coragem<br />
Nada dá mais coragem que o<br />
amor.<br />
Anestesia<br />
Ela nos faz adormecer profundamente<br />
e nos torna insensíveis. Será<br />
que estamos fazendo o papel <strong>de</strong><br />
anestesista, adormecendo nosso coração,<br />
que não mais se compa<strong>de</strong>ce<br />
do próximo? adormecendo nossos<br />
braços, que não mais se abrem para<br />
acolher até aqueles que vivem<br />
conosco? diminuindo nossa ternura,<br />
nossa simplicida<strong>de</strong>? Livrai-nos, Senhor,<br />
<strong>de</strong>ssas anestesias que nos afastam<br />
<strong>de</strong> vós e nos afastam dos irmãos.<br />
Escola<br />
Ah, Mãe, como precisamos freqüentar<br />
tua escola! Para sair dali formados<br />
<strong>de</strong> modo a ser agradáveis a<br />
teu querido Filho e então, sim, vivermos<br />
a vida como convém!<br />
Palavra<br />
“Naquele tempo a palavra do Senhor<br />
era rara”, lemos no 1º livro <strong>de</strong><br />
Samuel (3,1). Hoje ela é abundante:<br />
é só abrir a Bíblia, uma revista católica,<br />
um jornal como este. E eu, Senhor,<br />
a aproveito tão pouco, diferentemente<br />
<strong>de</strong> Samuel, que “não <strong>de</strong>ixava<br />
cair por terra nenhuma <strong>de</strong> tuas<br />
palavras” (1Sm 3,19). Senhor, ajudame<br />
a acolher tua palavra, a amá-la,<br />
a colocá-la em prática.<br />
Para ser o que queres que eu<br />
seja!<br />
Nascido no dia 11 <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 1952,<br />
em Barro Branco, São P<strong>ed</strong>ro <strong>de</strong> Alcântara,<br />
Pe. João Francisco Salm não sabe quando<br />
teve <strong>de</strong>spertado o interesse por seguir<br />
a vida religiosa. “Certamente o ambiente<br />
religioso da comunida<strong>de</strong> e da família, a<br />
acolhida que era dada ao padre, a presença<br />
<strong>de</strong> seminaristas nas férias”, d<strong>ed</strong>uz.<br />
Quarto filho <strong>de</strong> cinco irmãos, em uma família<br />
<strong>de</strong> agricultores, aos 12 anos foi para<br />
o seminário, fazendo o Pré-Seminário em<br />
Antônio Carlos. Em 30 <strong>de</strong> junho <strong>de</strong> 1979<br />
foi or<strong>de</strong>nado padre com outros dois colegas<br />
no Santuário <strong>de</strong> Azambuja.<br />
Atualmente Pe. Salm é reitor do Seminário<br />
Teológico Convívio Emaús e coor<strong>de</strong>nador<br />
Arquidiocesano da Pastoral<br />
Vocacional. É sobre a vocação e os seus<br />
25 anos <strong>de</strong> presbítero que ele fala nesta<br />
entrevista ao Jornal da <strong>Arquidiocese</strong>.<br />
Jornal da <strong>Arquidiocese</strong> - Em 30 <strong>de</strong><br />
junho, o senhor estará completando 25<br />
anos <strong>de</strong> padre. Como é ter d<strong>ed</strong>icado meta<strong>de</strong><br />
da vida à Igreja?<br />
Pe. Salm - Aprendi, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> criança, a<br />
assumir o meu batismo. Tive boa catequese.<br />
Muito me foi ensinado ao longo dos<br />
15 anos <strong>de</strong> seminarista. Mesmo po<strong>de</strong>ndo<br />
escolher um outro caminho, optei por ser<br />
padre. Colocar-me à disposição do Bispo<br />
para ser padre, exigiu <strong>de</strong> mim muitas renúncias<br />
que eu tive <strong>de</strong> atualizar continuamente,<br />
ao longo <strong>de</strong>stes anos. Sinto vonta<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> dizer com São Paulo: “Sei em<br />
quem acr<strong>ed</strong>itei, sei em quem pus minha<br />
confiança”. Portanto, ter-me tornado padre<br />
foi uma resposta a Deus somente. É<br />
muito bom ter chegado até aqui. Que eu<br />
tenha a graça da perseverança até o fim.<br />
Ter d<strong>ed</strong>icado meta<strong>de</strong> da minha vida ao ministério<br />
presbiteral e ter a esperança <strong>de</strong><br />
continuar assim até à morte, é conseqüência<br />
<strong>de</strong> uma iniciativa divina, <strong>de</strong> uma resposta<br />
<strong>de</strong> fé e <strong>de</strong> uma aprovação da Igreja.<br />
Digo muitas vezes a Jesus Cristo, principalmente<br />
nas horas mais difíceis: “Só<br />
mesmo por ti”. Sei que <strong>de</strong>vo tudo a Ele.<br />
Que bom que me tornei padre!<br />
JA - O senhor é <strong>de</strong> uma época em que<br />
eram abundantes as vocações para o ministério<br />
or<strong>de</strong>nado. O que é preciso ser feito<br />
para hoje <strong>de</strong>spertar um maior número<br />
<strong>de</strong> jovens a seguirem o mesmo caminho?<br />
Pe. Salm - Também no tempo em que<br />
fui para o seminário, como nos anos que<br />
se seguiram, havia preocupação com a<br />
“falta <strong>de</strong> vocações”, ou a falta <strong>de</strong> jovens<br />
que se sentissem chamados e tivessem<br />
realmente o <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> ser padres. Portanto,<br />
as “vocações” não eram tão abundantes<br />
assim. É verda<strong>de</strong> que os tempos<br />
mudaram, o mundo mudou e<br />
as pessoas também mudaram.<br />
Há novos e gran<strong>de</strong>s <strong>de</strong>safios,<br />
próprios do nosso tempo.<br />
Entretanto, tenho como<br />
certo que muitos jovens, rapazes<br />
e moças, se tornariam padres,<br />
irmãos, e irmãs se soubessem<br />
do que se trata. Falase<br />
muito pouco e <strong>de</strong> modo<br />
muito pobre <strong>de</strong>sses gran<strong>de</strong>s<br />
i<strong>de</strong>ais <strong>de</strong> vida: <strong>de</strong> seu significado,<br />
<strong>de</strong> sua beleza, <strong>de</strong> sua<br />
verda<strong>de</strong>, <strong>de</strong> sua importância, <strong>de</strong><br />
sua necessida<strong>de</strong>, <strong>de</strong> sua capacida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> preencher o cora-<br />
ção e <strong>de</strong> realizar plenamente<br />
um ser humano, como homem<br />
ou como mulher. “Não se ama<br />
VIDA DO CLERO<br />
Pe. João Francisco Salm: d<strong>ed</strong>icação às vocações<br />
o que não se conhece”. É uma injustiça<br />
que se comete contra os jovens, não lhes<br />
oferecendo esses esclarecimentos. Seremos<br />
responsabilizados por isso.<br />
JA - Pe. Salm, quando se fala em Pastoral<br />
Vocacional, faz-se associação im<strong>ed</strong>iata<br />
com o tornar-se padre ou freira. É<br />
este o trabalho da Pastoral Vocacional?<br />
Pe. Salm - Associar a Pastoral<br />
Vocacional (como Serviço <strong>de</strong> Verda<strong>de</strong>ira<br />
Animação Vocacional) somente à vocação<br />
dos padres e das irmãs, é um r<strong>ed</strong>ucionismo<br />
inaceitável, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> tudo o que o Concílio<br />
Vaticano II trouxe. Seria uma r<strong>ed</strong>ução<br />
da gran<strong>de</strong>za <strong>de</strong>ssas vocações e <strong>de</strong> toda a<br />
temática vocacional na Igreja. Entendamos<br />
bem: isso não quer dizer que <strong>de</strong>vamos diminuir<br />
a importância <strong>de</strong>ssas vocações ou<br />
relaxar o esforço em promovê-las. Antes o<br />
contrário: para que aumente o número e<br />
melhore a qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> quem se candidata<br />
a ser padre ou irmã, é necessário que tenhamos<br />
comunida<strong>de</strong>s vivas e abertas a todas<br />
as vocações e ministérios, ótimas famílias,<br />
catequese <strong>de</strong> primeira qualida<strong>de</strong> em<br />
todos os níveis, a pastoral <strong>de</strong> conjunto funcionando<br />
<strong>de</strong> verda<strong>de</strong>.<br />
JA - Como reitor <strong>de</strong> Seminário e coor<strong>de</strong>nador<br />
da Pastoral Vocacional, como o<br />
senhor vê o trabalho da Pastoral Vocacional<br />
na <strong>Arquidiocese</strong>?<br />
Pe. Salm - Já se fez bastante em<br />
tempos passados e recentes. Também<br />
há muitas pessoas verda<strong>de</strong>iramente entusiasmadas<br />
e empenhadas. Impressiona<br />
como os leigos e leigas se empolgam<br />
quando passam a enten<strong>de</strong>r o tema das<br />
vocações e em que consiste a animação<br />
vocacional. Tenho a impressão <strong>de</strong> que<br />
especialmente nós padres, diáconos, irmãs,<br />
temos que rever com muita humilda<strong>de</strong><br />
e coragem nosso modo <strong>de</strong> enten<strong>de</strong>r<br />
e assumir a causa vocacional: nosso<br />
modo <strong>de</strong> viver a própria vocação, nosso<br />
ativismo, nossa eclesiologia, nosso planejamento<br />
pastoral que não contempla o<br />
serviço da animação vocacional, nossa<br />
espiritualida<strong>de</strong>, nossa visão <strong>de</strong> futuro, o<br />
modo como enten<strong>de</strong>mos a missão da<br />
Igreja no mundo, nosso individualismo na<br />
“promoção das vocações à vida<br />
presbiteral e consagrada”. Ou trabalhamos<br />
juntos, <strong>de</strong> forma organizada, inteligente<br />
e evangélica pelas vocações para<br />
a Igreja, fazendo das nossas comunida<strong>de</strong>s<br />
canteiros vocacionais, ou afundamos<br />
na areia mov<strong>ed</strong>iça <strong>de</strong> um cristianismo<br />
adoecido e esclerosado, mesmo que às<br />
vezes com aparência <strong>de</strong> “coisa nova”, a<br />
serviço <strong>de</strong> nossa auto-ilusão.<br />
Divulgação/JA<br />
Pe. Salm, nascido em uma família simples <strong>de</strong> agricultores,<br />
sentiu c<strong>ed</strong>o o <strong>de</strong>spertar para a vocação presbiteral