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ANTROPOCENTRISMO E ECOPEDAGOGIA - La Salle

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<strong>ANTROPOCENTRISMO</strong> E <strong>ECOPEDAGOGIA</strong><br />

João Inácio Kolling 1<br />

Resumo: Tornou-se elegante falar de ecologia e desenvolvimento sustentável. Corre-se,<br />

todavia, o risco de transformar e triturar o tema com falácias grandiloqüentes que mais ajudam<br />

a encobrir a continuação dos desequilíbrios na civilização e na relação humana com o planeta,<br />

do que a resolvê-los. Sem mudanças na cultura antropocêntrica, as almejadas inovações<br />

capazes de re-equilibrar a vida no planeta Terra, certamente terão avanços insignificantes e<br />

muito aquém do necessário. Aprender uma nova forma de relação humana, mesmo que possa<br />

entusiasmar somente pequenas parcelas humanas, é, além disso, um processo lento e penoso,<br />

mas, é capaz de fermentar algo novo para a sociedade. Por isso, mais do que entusiasmo pelo<br />

desenvolvimento sustentável, convém pensar em caminhos ecopedagógicos que sejam capazes<br />

de salvar a civilização, pois é nela que fervilha e eclode uma obsessiva voracidade consumista, a<br />

tal ponto, que faz o planeta Terra emitir graves sinais de morte.<br />

Palavras-chave: Antropocentrismo. Ecopedagogia. Desenvolvimentismo. Pedagogia<br />

ambiental. Educação planetária.<br />

Introdução<br />

A acuidade de muitos pensadores vem apontando, há algumas décadas, a inviabilidade da<br />

forma consumista e predatória da sociedade ocidental para o equilíbrio dos eco-sistemas e das<br />

condições de vida humana no planeta Terra. Hoje, esta questão começa a ser vista, não<br />

somente como séria ameaça a muitas espécies de vida e, dentre elas, a humana, mas também<br />

como ameaça à vida da própria Terra.<br />

1 Especialista em Psicopedagogia, Mestre em Antropologia e Doutor em Filosofia e Ciências da Educação, é<br />

professor na Faculdade <strong>La</strong> <strong>Salle</strong> de Lucas do Rio Verde – MT. Endereço eletrônico: João@unilasallelucas.edu.br;<br />

joaoik@bol.com.br


Nossa ponderação sobre Antropocentrismo e Ecopedagogia focaliza um aspecto<br />

geralmente ausente das conversas e textos que se ocupam com discussões sobre<br />

desenvolvimento sustentável. Suspeitamos que, sob o atual quadro cultural antropocêntrico,<br />

este assunto, se encontra deslocado do foco e, por isso, requer educação para outro modelo<br />

cultural, tanto em vista da salvação da civilização humana, quanto dos eco-sistemas do planeta.<br />

Moacir Cadotti se constitui num clássico brasileiro e num pioneiro a alertar sobre a<br />

importância de uma ecopedagogia. A razão da nossa abordagem deste rico tema é a de lhe<br />

relacionar um importante aspecto filosófico cultural – o antropocentrismo - que se encontra no<br />

substrato de toda a degradação das relações humanas e com o planeta, e que,<br />

impreterivelmente, necessita ser substituído por outro modelo cultural a ser delineado. A<br />

ecopedagogia poderá constituir-se num eficaz itinerário educador para levar à criação de outros<br />

e novos valores que possam reger o futuro da ação humana com a multifacetária efervescência<br />

de vida no planeta Terra, bem como, a própria vida deste planeta.<br />

Nossa metodologia é de modesta inquirição filosófica sobre textos que abordam o tema, e<br />

deseja evidenciar que alguns sinais alentadores já podem ser vislumbrados para que ainda se<br />

continue a sonhar com dias melhores, pois, a produção de energia que não resulta da<br />

combustão fóssil, a produção de alimentos menos envenenados, e a capacidade de se viver de<br />

forma mais sóbria e parcimoniosa, além da crescente capacidade solidária e de partilha,<br />

indicam a direção do caminho para relações civilizatórias mais responsáveis, fruitivas e<br />

integradas com a multiplicidade dos sistemas de vida em nosso planeta.<br />

Como o antigo mito de Hércules, necessita-se descobrir, com outras pessoas, meios para<br />

que os gases, que hoje matam e restringem o fôlego dos que desejam continuar vivos, possam<br />

ser reduzidos através da liberação das águas de dois rios distantes, o da razão e o do<br />

sentimento, a fim de que um único canal integrador destas águas seja capaz de transformar o<br />

gás letal em fermento transformador do húmus poluidor em fonte de novas potencialidades de<br />

vida.


1. Os conceitos<br />

O Antropocentrismo teve início no século VI a.C., quando os gregos deixaram de procurar<br />

explicações metafísicas e espirituais para o entendimento do mundo e passaram a desenvolver<br />

interpretações racionais a respeito do que interferia na vida humana. Antropocentrismo é, pois,<br />

um conceito filosófico que estabelece o homem como o centro referencial do mundo e do<br />

universo. A palavra “antropos + kentron” significa que o universo é pensado pela sua relação<br />

com o ser humano. Trata-se, por conseguinte, de uma interpretação que estabelece a<br />

humanidade como centro de todas as coisas do universo.<br />

Em nosso contexto moderno, o antropocentrismo é constituído por doutrinas ou<br />

perspectivas intelectuais que relativizam todas as outras formas de vida para salientar a<br />

primazia da capacidade humana, sobretudo a do avanço técnico e científico.<br />

Numa forma pejorativa, o antropocentrismo é visto como fruto da subordinação de tudo o<br />

que existe, à hegemonia dos seres humanos, donde resultaria a evidente degradação do<br />

ambiente e a desvalorização das outras espécies de vida no planeta e a do próprio planeta. A<br />

origem desta leitura estaria na religião, especialmente a bíblica e na forma como foi<br />

interpretada na Idade Média, pelo cristianismo, porquanto estaria dando um suporte para<br />

justificar que o ser humano deve dominar as criaturas e tudo o que existe neste mundo. Sabe-<br />

se, porém, que esta forma de interpretação foi muito mais teocêntrica do que antropocêntrica,<br />

porque Deus era considerado o centro de tudo e não a condição humana. O que mesmo<br />

prevaleceu a partir da leitura religiosa referida, foi uma formação de etnocentrismo europeu e<br />

que veio a estabelecer-se como hegemônico sobre outras etnias e lugares.<br />

A Ecopedagogia desloca a centralidade do ser humano, como as pedagogias clássicas<br />

fizeram nos últimos anos, com vistas a destacar a consciência planetária e, também, para<br />

apontar o rumo de uma civilização planetária, pois, enquanto grupos humanos se proclamam<br />

superiores aos demais, os riscos de guerras, de genocídios e de destruições, serão constantes.<br />

Por isso, a ecopedagogia aponta para o equilíbrio entre os seres humanos e a natureza, com


vistas a uma relação sustentável e edificante. Não se trata apenas de boa relação humana com o<br />

meio ambiente, mas, e, principalmente, de mudar as relações humanas e sociais. Assim<br />

também, mais do que mera preocupação ecológica, a ecopedagogia aponta para uma dimensão<br />

integral a fim de que, planeta e seres humanos, não sejam constituídos em duas realidades<br />

separadas. A integração também necessita ser mental para apontar melhores níveis de respeito<br />

entre as pessoas e precisa ser aberta ao novo modo, mais respeitoso na convivência com<br />

culturas e formas sociais discriminadas. Nesta antevisão para outro perfil de sociedade:<br />

A ecopedagogia constitui-se uma proposta pedagógica fundada na crítica da<br />

modernidade e na superação dos padrões de consumo exacerbados e irresponsáveis,<br />

oferecendo estratégias, propostas e meios para a realização de uma educação como<br />

um todo. Propõe-se a despertar as pessoas para o olhar integrado, desenvolvendo<br />

uma nova forma de ser e estar no mundo, dando sentido para cada ato, ao seu<br />

cotidiano, construindo assim, uma vivência harmoniosa com todas as formas de vida.<br />

Nesse sentido, poderá constituir uma possibilidade de educação para sociedades<br />

responsáveis e sensíveis aos problemas sócio-ambientais”. 2<br />

A atual forma como muitos seres humanos buscam sentido, com coisas e para as coisas na<br />

lida cotidiana, revela-se altamente “anti-vida-humana”, pois a maior parte da humanidade,<br />

como a maior parte das outras formas de vida existentes no planeta Terra, não são levados a<br />

sério. 3 Não se trata, por conseguinte, de mais uma pedagogia, mas, de educar para uma<br />

civilização sustentável do ponto de vista ecológico, que implica em radicais mudanças na<br />

economia, na sociedade e na cultura.<br />

Segundo Moacir Gadotti, a ecopedagogia não significa apenas formar cidadãos e homens,<br />

como a Paidéia grega pensava, mas, significa formar seres humanos capazes de viver na<br />

diversidade e na complexidade da natureza humana e, com a própria Terra, que também é ser<br />

vivo: “precisamos de uma ‘Pedagogia da Terra’ como um grande capítulo da Pedagogia do<br />

Oprimido. Uma Pedagogia que tem como suporte o Paradigma Terra que considera este planeta<br />

2 SANTANA, Joseana Moura e LIMA, Carlos César Uchoa. A inserção dos princípios da ecopedagogia no currículo<br />

escolar: uma proposta de educação para a sustentabilidade. Disponível em :<br />

http://www.uepg.br/seminariointernacional/age<br />

3 GADOTTI, Moacir. Ecopedagogia, Pedagogia da Terra, Pedagogia da Sustentabilidade, Educação Pedagógica<br />

Ambiental e Educação para a Cidadania Planetária. Disponível em:<br />

http://www.paulofreire.org/pub/CrpafAcervo000137


como uma única comunidade, una e diversa”. 4 Em razão disto, Gadotti levanta a suspeita de<br />

que, para educar, um jardim poderia ser mais adequado do que uma sala de aula.<br />

2. Como relacionar Antropocentrismo e Ecopedagogia?<br />

Antropocentrismo e Ecopedagogia apresentam concepções que podem ser comparadas a<br />

dois rios caudalosos e de altas potencialidades, mas que seguem por rumos e com fluxos<br />

independentes. Constituem áreas de difícil aproximação, em decorrência dos desejos humanos,<br />

que tendem a enquadrar tudo quanto os encanta, e, tudo quanto os atrai para a lógica dos seus<br />

interesses.<br />

A aproximação requer uma tarefa quase sobre-humana e necessita de muito mais tempo<br />

do que o desejado. Aproximar antropocentrismo e ecopedagogia nos remete a uma difícil<br />

tarefa, similar à de Hércules, da mitologia grega.<br />

Hércules foi submetido a tarefas humilhantes e para além de suas capacidades pela deusa<br />

Hera, - porque ela tinha ciúmes dele, uma vez que era forte e bonito, e, pior ainda, filho de<br />

Zeus, seu marido, com uma mulher humana. Vítima deste olhar invejoso, Hércules foi<br />

incumbido pela deusa, entre as muitas outras tarefas extremamente árduas, para limpar os<br />

estábulos do rei Áugias. Este poderoso rei, para demonstrar e exibir seu poder, foi adquirindo<br />

tantos cavalos, a tal ponto que o esterco acumulado, ao longo de trinta anos, produziu um gás<br />

que matava as pessoas da redondeza.<br />

Hércules, ao chegar lá, desmaiou com o efeito do gás, mas ao recobrar os sentidos,<br />

lembrou-se que a tarefa teria que ser efetuada num dia! Contra todas as evidências, começou a<br />

escavar uma valeta para juntar as águas dos dois rios. Passou muito do prazo previsto, mas,<br />

quando as águas dos rios Peneu e Alfeu formaram uma só torrente, entraram na planície e<br />

espalharam todo o esterco. O esterco se transformou em húmus, e esvanecidos os gases, o<br />

povo que se refugiou em outros lugares pôde novamente voltar à região.<br />

4 Idem, p. 2


O antropocentrismo é constituído por uma tendência cultural, particularmente acentuada<br />

nos últimos séculos, de colocar o ser humano como centro de todas as coisas. Antes, por longos<br />

séculos, o pensamento religioso centralizou Deus como o centro de tudo. Se a atenção<br />

antropocêntrica tivesse dado primazia de centralidade de todos os seres humanos do planeta, o<br />

efeito certamente não teria chegado a ser tão devastador na repercussão do planeta Terra.<br />

Distintamente do mito de Hércules, os sonhos modernos dos “Áugias” já não se interessam<br />

por cavalos, mas muito mais por petróleo e seus derivados e por dinheiro resultante de<br />

produção e consumo. Por isso afetaram intensamente o ambiente de tal forma que as águas das<br />

chuvas já não conseguem evitar um efeito estufa resultante das ambições.<br />

Hoje, já não é um vale que produz gases de morte, mas é o planeta Terra que está em risco<br />

de vida, devido ao desequilíbrio dos lixos tóxicos, e, a perda de sentido diante destes gases,<br />

pode inviabilizar o futuro da vida humana. Segundo Moacir Gadotti,<br />

Vivemos em uma era de extremismo. Pela primeira vez na história da humanidade,<br />

não por efeito de armas nucleares, mas pelo descontrole da produção industrial (o<br />

veneno radioativo Plutônio 239 tem um tempo de degradação de 24 mil anos)<br />

podemos destruir toda a vida do planeta. Passamos do modo de produção para o<br />

modo de destruição. 5<br />

Bem sabemos que a ambição de parte do gênero humano não cria apenas os graves<br />

problemas sociais, econômicos e culturais, mas tem aumentado altamente a capacidade de<br />

destruição do planeta. Já não é o ciúme de uma deusa que impõe árduas tarefas ao<br />

desempenho humano, mas, é a ambição sem limites dos próprios seres humanos que lhes<br />

cobra sangue, músculos, ossos e forças sobre-humanas.<br />

O cenário está dado: globalização provocada pelo avanço da revolução tecnológica,<br />

caracterizada pela internacionalização da produção e pela expansão dos fluxos<br />

financeiros; regionalização caracterizada pela formação de blocos econômicos;<br />

fragmentação que divide globalizadores e globalizados, centro e periferia, os que<br />

morrem de fome e os que morrem pelo consumo excessivo de alimentos, rivalidades<br />

regionais, confrontos políticos, étnicos, confessionais, terrorismo. 6<br />

5 GADOTTI, Moacir. Pedagogia da Terra: ecopedagogia e educação sustentável. Disponível em:<br />

http://www.antroposmoderno.com<br />

6 Idem, ibidem.


Poderíamos perguntar-nos porque, afinal, os seres humanos vivem tanta obstinação e<br />

simultânea falta de responsabilidade na destruição do planeta? Em primeiro lugar, os seres<br />

humanos sempre foram insatisfeitos e desejosos de mundos melhores. Por isso, ao contrário<br />

dos demais seres vivos do planeta e da própria vida do planeta, os humanos, no desejo de algo<br />

melhor e mais gratificante, devastam mais do que as outras formas de vida. Nesta voracidade,<br />

os seres humanos também se “des-humanizam”, e, sorrateiramente, dissuadem suas relações<br />

predatórias pela justificação de crescimento econômico, abastecimento dos anseios de<br />

consumo, de reservas, de conforto e de fartura. Assim, tornam-se predadores muito mais<br />

perversos do que todos os outros animais chamados de predadores.<br />

O antropocentrismo também cria processos psíquicos que separam o interior e o exterior,<br />

tanto em relação ao corpo, quanto na relação com o resto das coisas. Este centralismo dos seres<br />

humanos gera deste modo, um processo continuado e sempre mais largo de descarte, porque<br />

tudo o que está para além do corpo, possui menos valor. Assim, a vida dos demais seres vivos,<br />

vale pouco ou nada, caso não sirva ao “eu” e ao corpo. Desenvolve-se nisso o moderno mito de<br />

que os seres humanos são os únicos e legítimos donos de tudo quanto existe no planeta e,<br />

ainda, que já se constituíram, por direito, donos dos pretensos bens que possam ser<br />

descobertos em outros planetas do universo. Como Millos Stringuini enfatiza:<br />

...Todas as atividades humanas até hoje desenvolvidas, tais como economia, as<br />

ciências, a psicanálise, o comércio, a indústria estão decisivamente influenciadas em<br />

suas entranhas pela metáfora antropocêntrica, desde o chamado período do homo<br />

sapiens ou hoje, “homo fabris”, consumidor por vício hedonista. 7<br />

Ao lado das verdadeiras maravilhas desenvolvidas sob o prisma antropocêntrico, quer nas<br />

artes cênicas, no cinema, na inteligência, na cultura, na tecnologia, na comunicação e em tantos<br />

outros campos, persistiu, contudo, uma ambígua obsessão que implicou em tragédias, tais<br />

como guerras, genocídios, toxicomanias, e, destruição ambiental. Tudo isso decorre do modelo<br />

social e econômico, visto como um sistema linear e que, por isso mesmo, precisa crescer<br />

continuamente e gerar gradual aumento de consumo. Para tanto, explora-se à exaustão todo o<br />

recurso natural do planeta, o que provoca muito resíduo, excesso de lixo e o evidente<br />

esgotamento dos recursos do planeta.<br />

7 STRINGUINI, Millos, A. A Metáfora Antropocêntrica: o agir humano atual e o meio ambiente. Disponível em:<br />

http://www.portadomeioambiente.org.br


Tratar de ecologia e de sustentabilidade do planeta dentro dos parâmetros do<br />

antropocentrismo implica, por isso, mais em sonhos de futuro do que em efetivas realidades<br />

presentes que possam remeter para perspectivas mais otimistas em torno da vida. No entanto,<br />

se persistimos no quadro dos atuais conceitos antropológicos, podemos repetir de forma sutil o<br />

que os antigos fenícios fizeram para assegurar boas relações com o deus Molloch. Todos os dias,<br />

vidas humanas eram sacrificadas em nome das ambições do poder e do dinheiro. Os fenícios<br />

empreendiam guerras, tanto para saquear, quanto para manterem reservas de prisioneiros, fato<br />

que gerou o conceito dos fármacos, pois, constituíam elementos disponíveis para serem<br />

sacrificados, pelo menos um a cada dia, a fim de aplacar a ira de Molloch e manter boas<br />

relações com ele. Da noção de fármaco resultou nosso modo de ser das Farmácias, onde se<br />

encontram disponíveis os “remédios” para eliminar ou disfarçar os males. Ironicamente, em<br />

nossos dias, algo similar ao antigo significado se repete e, para os grandes interesses<br />

capitalistas, não importam as mortes de milhares de “fármacos”, e nem o desequilíbrio dos eco-<br />

sistemas do planeta. O que importa, é que o progresso linear não pare, pois, a busca de<br />

felicidade, que pequena parcela dos seres humanos prioriza para locupletar seus desejos de<br />

crescimento, leva à automática necessidade de eliminação ou desaparecimento de outros seres<br />

humanos.<br />

Quando o mercado, sob os auspícios do antropocentrismo, reclama modernização contínua<br />

e obsessiva em torno dos índices de crescimento, necessariamente vidas humanas terão que ser<br />

relativizadas e deixadas à própria sorte. A volição hedonista tampouco consegue pensar a<br />

natureza numa perspectiva mais digna do que a de desfrutar belos lugares para férias e eco-<br />

turismo. Reina entre os seres humanos um equívoco de pretensões que os leva a desejar uma<br />

equiparação com o criador, na pretensão de viver a imortalidade, a eterna juventude, a<br />

ilimitada potência sexual e a indústria da vaidade que, para produzir os necessários cosméticos<br />

para condecorar os ilimitados desejos, é um dos fatores de degradação de muitos elementos da<br />

natureza, como eliminação de espécies de plantas, exauridas pela extração predatória para<br />

abastecer indústrias farmacêuticas, de perfumes e de cremes rejuvenecedores e restauradores.<br />

Está ali um indício de que:<br />

Os paradigmas clássicos, fundados na visão industrialista predatória, antropocêntrica e<br />

desenvolvimentista, estão se esgotando, não dando conta de explicar o momento


presente e de responder às necessidades futuras... O globalismo é, essencialmente,<br />

insustentável”. 8<br />

Como já são perceptíveis sérios indícios da insustentabilidade do planeta em decorrência<br />

do antropocentrismo, é de se esperar que, de fato, apareçam urgentes e necessários<br />

procedimentos educacionais, tanto de educação social, quanto de bom eco-relacionamento.<br />

3. Ecopedagogia como educação para a cidadania Planetária<br />

Os atuais currículos escolares são os primeiros a necessitar de revisão e de reorientação,<br />

a fim de que cada comunidade local possa pensar o que, simultaneamente, é global. Implica<br />

também em substituir um dos grandes referenciais que fundamentou a escolarização durante<br />

muitos séculos, que é o de transmitir a cultura para as gerações novas. Agora, tanto as gerações<br />

portadoras da cultura, quanto culturas emergentes, precisam alinhar-se em torno de uma nova<br />

concepção do planeta Terra, para que se viabilize a noção de que constitui uma única morada.<br />

Isto requer evidentemente uma consciência sócio-ambiental que ainda se encontra pouco<br />

expressa na vida social. Segundo Gadotti:<br />

Educar para cidadania planetária pressupõe esse entendimento da nossa vida no<br />

planeta onde precisamos viver permanentes e complexas relações entre nós mesmos e<br />

outras formas de vida, numa simbiose onde nós, seres humanos, incorporamo-nos a<br />

um outro ser, que também está vivo, que nos acolhe e nos mantém vivos e se mantém<br />

vivo”. 9<br />

Em razão disto, Gadotti sustenta que Ecopedagogia deve ser mais do que uma Pedagogia de<br />

Desenvolvimento Sustentável, pois deve envolver eco-educação, que é mais ampla do que<br />

educação ambiental. Por outro lado, não se torna suficiente uma relação saudável com o meio<br />

ambiente, mas, faz-se necessário uma educação que envolva o sentido mais profundo do que se<br />

faz cotidianamente. 10<br />

8 GADOTTI, Moacir. A Ecopedagogia como pedagogia apropriada ao processo da Carta da Terra. Disponível em:<br />

http://www.ufmt.br/revista/arquivo/rev21/moacir<br />

9 Em http://www.paulofreire.org/pub/CrpfAcervo000137 , p. 2<br />

10 Idem, ibidem.


Terá que recuperar-se algo que os nossos antepassados já souberam viver melhor, isto é,<br />

viver de forma mais simples, com maior sintonia com a natureza, com mais consciência<br />

planetária e com mais quietude advinda da paz interior. Portanto, precisa-se repensar e rever a<br />

cultura que sustenta o atual modo de ser. É possível produzir alimentos mais saudáveis; é<br />

possível usar menos venenos na agricultura e que significa menos degradação de águas, solos e<br />

biodiversidades; é possível repensar os hábitos de degustação e de consumo de alimentos<br />

industrializados com excesso de conservantes, corantes e calorias; é possível superar a noção<br />

consumista de que tudo pode ser adquirido e substituído.<br />

Epílogo<br />

Enfim, resta crer e apostar que a mesma humanidade que foi capaz de gerar esta profunda<br />

crise sócio-ambiental, é também capaz de se transcender pela educação, tanto para reparar os<br />

estragos, quanto para gerar relações mais respeitosas e integradas com o meio ambiente<br />

através de uma cidadania planetária.<br />

Para tal inovação, presume-se ainda como necessária a substituição do obstinado ecologismo<br />

elitista e meramente idealizado, por um ecologismo crítico e efetivo, capaz de abrir crescente<br />

espaço para que todos os seres possam constituir, neste planeta, o desejado cosmos.<br />

Não bastam extremadas formas de proteção a certos animais de estimação, enquanto,<br />

paralelamente, nada se faz para evitar que seres morram por razões estúpidas de simples<br />

negação do seu direito de viver. Para tanto, precisam mudar os modelos econômicos e mentais,<br />

pois, ecopedagogia não se coaduna com a continuidade da queima de combustíveis fósseis,<br />

procedimento que além de aumentar a temperatura do planeta, aumenta o nível dos oceanos e<br />

inviabiliza as condições de vida humana no planeta.<br />

Na ambição de boa parte dos seres humanos, quais “Reis Áugias” de nossos dias, o efeito dos<br />

gases do esterco tende a entrar pelo o nariz de quem já é vítima da ambição. Infelizmente, não<br />

são os maiores predadores que se constituem nas maiores vítimas, ou, fármacos para serem<br />

imolados no altar dos grandes projetos desenvolvimentistas. Tampouco os estonteados pelos<br />

gases, sobretudo, os das drogas e vícios degradantes, são agentes diretos do desequilíbrio do<br />

clima, mas, se constituem em vítimas ilibadas para os agrados de Molloch do sistema<br />

capitalista, que continua cada dia mais obsessivo e obstinado por sangue de vítimas humanas.


Na verdade, nem tudo constitui indício e iminência de sacrifício e morte: já se clareiam bons<br />

indícios de que fontes renováveis de energia, como a eólica, a solar e a térmica são até<br />

favoráveis para o aumento de postos de trabalho. Uma aposta em novas fontes de energia<br />

permite vislumbrar que ainda podem acontecer dias melhores para a vida do planeta Terra e<br />

seus seres vivos agregados.<br />

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ciudadania ambiental a partir de um taller de extensión universitária sobre cambio climático,<br />

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GADOTTI, Moacir. Ecopedagogia, Pedagogia da terra, Pedagogia da Sustentabilidade, Educação<br />

Ambiental e Educação para a Cidadania Planetária. Disponível em:<br />

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http://www.antroposmoderno.com<br />

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Disponível em: http://www.ufmt.br/revista/arquivo/rev21/moacir<br />

________________.Ecopedagogia e educação para a sustentabilidade. Disponível em:<br />

http://www.biologia.ufrj.br/ereb-se/artihgos/ecopedagogia<br />

HANSEN, Karla. O que é ecopedagogia? Disponível em:<br />

http://www.educacaopublica.rj.gov.br/biblioteca


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currículo escolar: uma proposta de educação para a sustentabilidade. Disponível em:<br />

http://www.uepg.br/seminariointernacional/age<br />

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SADY, Jean Michel. Ecologie: anthropocentrisme l’humanite em peril. Disponível em:<br />

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da educação. IN: REVISTA BRASILEIRA DE AGROECOLOGIA, v.2, nº1, fev 2007, p.576-579.<br />

http://www.pt.wikipedia.org/wiki/Antropocentrismo

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