Professor Jair Eduardo Santana - Revista do TCE
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REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAIS<br />
Edição Especial — ano XXVIII<br />
EnTREvisTa<br />
PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA<br />
O<br />
entrevista<strong>do</strong> da Edição Especial da <strong>Revista</strong> <strong>do</strong> <strong>TCE</strong>, ano XXVIII, é <strong>Jair</strong> <strong>Eduar<strong>do</strong></strong><br />
<strong>Santana</strong>. Nasci<strong>do</strong> em São Paulo, obteve o título de mestre em Direito <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> pela<br />
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP), em 1992, com dissertação<br />
intitulada “Competências legislativas municipais”, sob a orientação <strong>do</strong> <strong>Professor</strong><br />
Celso Ribeiro Bastos. Juiz de Direito de entrância especial na Circunscrição Judiciária de Belo<br />
Horizonte é, ainda, <strong>Professor</strong> da Escola Judicial Desembarga<strong>do</strong>r Edésio Fernandes, <strong>do</strong> Tribunal<br />
de Justiça <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de Minas Gerais e de cursos de pós-graduação. Palestrante e conferencista<br />
em diversos Esta<strong>do</strong>s brasileiros, nosso entrevista<strong>do</strong> possui diversas obras e artigos publica<strong>do</strong>s em<br />
revistas especializadas, demonstran<strong>do</strong> profun<strong>do</strong> conhecimento <strong>do</strong> Direito Público, sobretu<strong>do</strong>,<br />
licitações, agentes políticos e concursos públicos. E foi exatamente este último tema, concursos<br />
públicos, o foco da entrevista com o <strong>Professor</strong> cujas respostas aos questionamentos formula<strong>do</strong>s<br />
e reflexões lançam luzes sobre pontos polêmicos desta seara.<br />
ARqUIVO PESSOAL<br />
REVISTA DO <strong>TCE</strong> — Qual a visão de Vossa<br />
Excelência sobre o papel <strong>do</strong> Judiciário<br />
na concretização <strong>do</strong>s dispositivos<br />
constitucionais que regem a realização de<br />
concursos públicos?<br />
PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA —<br />
Precisa ficar bem esclareci<strong>do</strong> que as regras<br />
constitucionais relativas ao concurso público se<br />
materializam no senti<strong>do</strong> de bem instrumentalizar<br />
o Poder Público para a consecução das suas<br />
atividades finalísticas e acessórias.<br />
Por outras palavras, os elementos orgânicos<br />
governamentais se corporificam, via de regra,<br />
em estruturas físicas nas quais se alocam bens<br />
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Edição Especial — ano XXVIII<br />
e outros meios para a prática das funções que lhe são próprias. Estou<br />
falan<strong>do</strong> da materialização de um poder, como se diz em linguagem<br />
corrente. E, para exemplificar, cito um tribunal de justiça. Esse poder<br />
(ou função judicial) assume forma real por meio de prédios, pessoas<br />
e outros instrumentos que, juntos, cumprem a missão de julgar; além<br />
de outras, constitucionalmente previstas.<br />
Pensemos que a engrenagem toda não funcionaria se essas estruturas<br />
não contassem com o elemento humano. Calha repetir o que sempre<br />
faço questão de evidenciar: a tão buscada eficiência da Administração<br />
Pública está, antes de tu<strong>do</strong>, nas pessoas que a integram e não apenas<br />
nas outras dimensões orgânicas <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>.<br />
Consideran<strong>do</strong> esse ponto de vista, tenho comigo que o tema concurso<br />
público é, assim, extremamente sensível e importante para o nosso<br />
setor já que dele dependem, em grande parte, os resulta<strong>do</strong>s que<br />
serão produzi<strong>do</strong>s para a sociedade.<br />
REVISTA DO <strong>TCE</strong> — Consideran<strong>do</strong> o aumento, nos últimos anos, das<br />
políticas afirmativas para a inclusão de minorias, como Vossa Excelência<br />
analisa a utilização da chamada discriminação lícita em concursos<br />
públicos? Vossa Excelência reconhece distorções nessa política de<br />
inclusão que possam redundar numa discriminação inversa?<br />
PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA — A matriz constitucional<br />
aplicável aos concursos públicos imanta o secular princípio isonômico,<br />
não obstante a redação <strong>do</strong> inciso I (art. 37, CF/88) referenciar, na<br />
parte primeira, a questão da acessibilidade irrestrita.<br />
quan<strong>do</strong> se pretende, assim, favorecer desfavoreci<strong>do</strong>s, minorias<br />
ou alguma categoria específica de pessoas, dan<strong>do</strong>-lhes tratamento<br />
diferencia<strong>do</strong>, há sempre o risco de se transitar em zona proibida ou<br />
aparentemente vedada.<br />
Lembro-me de um caso que ficou famoso, ocorri<strong>do</strong> em Santa Catarina,<br />
onde o Poder Público criou cotas para afrodescendentes em concurso<br />
para provimento de cargos de auxiliar administrativo. Em situações<br />
assim, o Judiciário é chama<strong>do</strong> para controlar eventuais desbordamentos<br />
dessas políticas públicas de inclusão e, como é espera<strong>do</strong>, discute-<br />
4<br />
“[...] a tão buscada<br />
eficiência da<br />
Administração<br />
Pública está,<br />
antes de tu<strong>do</strong>,<br />
nas pessoas que<br />
a integram e<br />
não apenas nas<br />
outras dimensões<br />
orgânicas <strong>do</strong><br />
Esta<strong>do</strong>.”
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Edição Especial — ano XXVIII<br />
se essa possibilidade contrastada com a proibição de discriminação<br />
racial (que é um outro valor prestigia<strong>do</strong> na Constituição Federal).<br />
Mas o sistema legal permite a discriminação e, nesse caso, ela é lícita.<br />
Para que assim seja, no entanto, o fator desiguala<strong>do</strong>r (ou discrímen)<br />
há de ser tolera<strong>do</strong> pela Constituição Federal.<br />
Enfim, definir com precisão qual seja o conteú<strong>do</strong> jurídico da isonomia<br />
é a grande e tormentosa questão.<br />
REVISTA DO <strong>TCE</strong> — Vossa Excelência acredita na possibilidade de<br />
mitigação da previsão legal de que, para o acesso a determina<strong>do</strong>s<br />
cargos, o candidato deva apresentar ficha de antecedentes criminais?<br />
Por exemplo, o fato de um candidato ter cumpri<strong>do</strong> pena por crime de<br />
menor potencial ofensivo e outro que tenha cumpri<strong>do</strong> pena por crime<br />
de roubo, ambos deveriam ser reprova<strong>do</strong>s em prova de capacitação<br />
moral, comumente exigida nos concurso de ingresso às academias<br />
de polícia? E qual é o seu o posicionamento em face das figuras<br />
despenaliza<strong>do</strong>ras para esses casos, como a suspensão condicional <strong>do</strong><br />
processo, transação penal, na qual nunca se chegará a um juízo de<br />
certeza sobre a materialidade, autoria e culpabilidade?<br />
PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA — A pergunta é quase um<br />
turbilhão que agita e funde diversos valores, sob dimensões plurais.<br />
Talvez por isso seja muito instigante. Mas separemos as coisas. Começo<br />
lembran<strong>do</strong> que o concurso público se realiza em prol da coletividade.<br />
Ele existe, em resumo, para suprir as demandas <strong>do</strong> Poder Público<br />
mediante a materialização instrumental de recursos humanos dentro<br />
da Administração. É a forma mais adequada para captação da força<br />
de trabalho <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>.<br />
De outra parte, to<strong>do</strong>s sabemos que a Administração Pública está guiada<br />
por vetores intransponíveis, dentre eles a moralidade administrativa.<br />
quan<strong>do</strong> se pensa, assim, em investigação social e bons antecedentes<br />
de candidatos a cargos públicos, o que se está fazen<strong>do</strong>? Enten<strong>do</strong><br />
que, no caso, estamos buscan<strong>do</strong> a densificação daquela moralidade<br />
administrativa que é exigida pela Constituição Federal. E não tenho<br />
dúvida da preponderância necessária <strong>do</strong> coletivo sobre o individual.<br />
4<br />
“Começo<br />
lembran<strong>do</strong> que o<br />
concurso público<br />
se realiza em prol<br />
da coletividade.<br />
[...] É a forma mais<br />
adequada para<br />
captação da força<br />
de trabalho <strong>do</strong><br />
Esta<strong>do</strong>.”<br />
Entrevista<br />
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O administra<strong>do</strong>r tem que atuar com muita cautela na aferição desse<br />
quesito para não ferir direitos individuais. E nesse passo é perfeitamente<br />
legítimo ao Poder Judiciário, no exercício de suas competências<br />
constitucionais, exercer o controle da razoabilidade <strong>do</strong>s motivos<br />
declina<strong>do</strong>s pela Administração Pública para excluir o candidato de<br />
concurso público, por reputá-lo desmerece<strong>do</strong>r de confiança.<br />
De qualquer forma, a austeridade desmedida da Administração Pública<br />
e os frequentes equívocos cometi<strong>do</strong>s em detrimento a candidatos são<br />
abranda<strong>do</strong>s pelo Judiciário no dia a dia.<br />
Não se pode deixar de lembrar que no sistema brasileiro punitivo há<br />
institutos que tratam da reabilitação <strong>do</strong> condena<strong>do</strong>, da presunção da<br />
inocência, e de outros tantos que integram uma região impenetrável<br />
pelo Poder Público. O próprio sistema punitivo não tem mais, como<br />
tinha no passa<strong>do</strong> próximo, apenas caráter retributivo. Hoje, fala-se<br />
muito em reinserção, ressocialização e em temas afins.<br />
Nesse contexto há de se equalizar as diretrizes <strong>do</strong> sistema punitivo<br />
com aquelas existentes para o concurso público porque inegavelmente<br />
há pontos convergentes.<br />
Ou seja, o casuísmo e as especificidades de uma dada situação de<br />
fato é que ditarão as normas de incidência e a resolução concreta.<br />
REVISTA DO <strong>TCE</strong> — Em sede de concursos públicos, seria cabível o<br />
princípio <strong>do</strong> non reformatio in pejus, especialmente nos casos em<br />
que o candidato avia recurso em face de nota obtida em questão<br />
discursiva? Em caso afirmativo, como conciliar esse princípio<br />
com a finalidade precípua <strong>do</strong>s concursos, que é justamente<br />
selecionar aqueles candidatos que obtenham melhor desempenho<br />
nas avaliações? E como Vossa Excelência enxerga a atuação <strong>do</strong><br />
Judiciário nessa seara?<br />
PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA — Penso que o norte da avaliação<br />
numa prova discursiva esteja parametriza<strong>do</strong> por alguns princípios que<br />
aqui já relatei; princípios constitucionais que subordinam o atuar da<br />
Administração Pública e que sobrepairam ao interesse particular.<br />
4<br />
“[...] há de se<br />
equalizar as<br />
diretrizes <strong>do</strong><br />
sistema punitivo<br />
com aquelas<br />
existentes para<br />
o concurso<br />
público porque<br />
inegavelmente<br />
há pontos<br />
convergentes.”
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Edição Especial — ano XXVIII<br />
A reformatio in pejus talvez demande explicação. Haven<strong>do</strong> um<br />
recurso (e nem pensemos apenas na esfera judicial) <strong>do</strong> candidato,<br />
a autoridade competente (que poderia até ser da instância judicial)<br />
reforma a situação anterior desfavoravelmente ao candidato. A<br />
questão é saber se esse fenômeno poderia acontecer em concursos<br />
públicos em detrimento de algum candidato.<br />
Imagino que o instituto tem aplicação obrigatória no caso. Exatamente<br />
em razão <strong>do</strong>s princípios que são carrega<strong>do</strong>s pelo tema. Porém, há de<br />
se excepcionar eventual previsão normativa em contrário.<br />
Recorde-se que a Lei n. 9.784/99 estabelece que não cabe reformatio<br />
in pejus na revisão de processos de que resultem sanções. Mas esse<br />
parece não ser o caso <strong>do</strong> recurso de prova discursiva.<br />
REVISTA DO <strong>TCE</strong> — Qual o fundamento para que nos concursos das<br />
chamadas carreiras jurídicas, como a Magistratura e o Ministério Público,<br />
exija-se <strong>do</strong> candidato, no ato da inscrição definitiva, a comprovação de<br />
três anos de atividade jurídica? Tal exigência, extraída das alterações<br />
promovidas pela Emenda Constitucional n. 45/2004, não confrontaria<br />
com o princípio da ampla acessibilidade aos cargos públicos e com o fato<br />
de que, em verdade, a experiência serve ao exercício <strong>do</strong> cargo, sen<strong>do</strong><br />
inócuo exigir-se tal requisito na inscrição definitiva, quan<strong>do</strong> sequer há<br />
certeza de que o candidato será de fato aprova<strong>do</strong>?<br />
PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA — Não vejo qualquer<br />
inconsistência entre a previsão constitucional e os fluxos<br />
procedimentais que dela derivam para que se exija <strong>do</strong> candidato a<br />
experiência anterior em atividade jurídica.<br />
Nesse ponto específico, confesso-me contamina<strong>do</strong> por pensamento<br />
particular e enten<strong>do</strong> indispensável que haja conjugação bem afinada<br />
dessa experiência anterior com o fator idade mínima. Acho até bem<br />
flexíveis as normas vigentes.<br />
Permito-me resgatar uma ideia própria que externei num <strong>do</strong>s meus<br />
livros, 1 a propósito desse enfoque. Eu escrevi que a atividade de<br />
realização <strong>do</strong> Direito há que somar diversos saberes; é imprescindível<br />
1 SANTANA, <strong>Jair</strong> <strong>Eduar<strong>do</strong></strong>. Direito, justiça e espiritualidade. Belo Horizonte: Inédita, 2000.<br />
4<br />
“[...] a atividade<br />
de realização <strong>do</strong><br />
Direito há que<br />
somar diversos<br />
saberes; é<br />
imprescindível<br />
que o opera<strong>do</strong>r<br />
jurídico esteja<br />
consciente de que<br />
vive, em toda a<br />
materialização<br />
jurídica, uma<br />
dinamização<br />
emocional [...]<br />
A compreensão<br />
desses elementos<br />
é necessária para<br />
que se consiga uma<br />
justiça que não<br />
está nos códigos e<br />
que nem mesmo<br />
integra a grade<br />
curricular das casas<br />
de ensino.”<br />
Entrevista<br />
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que o opera<strong>do</strong>r jurídico esteja consciente de que vive, em toda a<br />
materialização jurídica, uma dinamização emocional relacionada<br />
com me<strong>do</strong>s, ódios, competição, amor, defesa e demais sentimentos<br />
humanos. A compreensão desses elementos é necessária para que<br />
se consiga uma justiça que não está nos códigos e que nem mesmo<br />
integra a grade curricular das casas de ensino.<br />
No particular caso <strong>do</strong> julga<strong>do</strong>r, recor<strong>do</strong> que a decisão neutra é um grande<br />
mito. Simplesmente porque o processo de julgar (decidir) é realiza<strong>do</strong><br />
por alguém que é naturalmente sensível, emotivo e até intuitivo.<br />
Muitos atributos relaciona<strong>do</strong>s a isso tu<strong>do</strong> que eu disse não são<br />
facilmente encontráveis nos muito jovens e inexperientes.<br />
REVISTA DO <strong>TCE</strong> — Muitas críticas apontam para a pouca idade<br />
de juízes e promotores, em especial quan<strong>do</strong> cotejada com a<br />
importância e o rol das atividades a serem desempenhadas nos<br />
referi<strong>do</strong>s cargos. Vossa Excelência entende que, nesses casos,<br />
seria justificável, juridicamente, a fixação de uma idade mínima<br />
para o desempenho dessas funções?<br />
PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA — Acabei avançan<strong>do</strong> um pouco<br />
sobre isso na resposta anterior. E parece ter fica<strong>do</strong> claro que eu<br />
enten<strong>do</strong> indispensável a maturidade para o exercício dessas tão nobres<br />
funções. Enten<strong>do</strong>, assim, procedentes tais críticas e indispensável a<br />
fixação de idade mínima.<br />
Aproveito para decantar mais essa ideia e dizer que o fator idade<br />
se atrela à bagagem de cada indivíduo, revelan<strong>do</strong> a sua própria<br />
experiência. É temeroso para a sociedade se o julga<strong>do</strong>r (no caso de<br />
concursos para a Judicatura), por inexperiência, não souber distinguir<br />
o Direito da Justiça. Esta não se confunde com aquele, embora se<br />
relacionem estreitamente.<br />
A compreensão <strong>do</strong> Direito, no particular caso, perpassa pelo<br />
autoconhecimento de quem é aplica<strong>do</strong>r das regras; o Direito não se<br />
resume a um conjunto de normas que, somadas e confrontadas, dão a<br />
solução para um caso concreto. quem se esquece da noção <strong>do</strong> justo,<br />
desdenha o fato e o valor, fixan<strong>do</strong>-se puramente na regra jurídica.<br />
4<br />
“É temeroso para<br />
a sociedade se o<br />
julga<strong>do</strong>r (no caso<br />
de concursos para<br />
a Judicatura), por<br />
inexperiência, não<br />
souber distinguir<br />
o Direito da<br />
Justiça. Esta não<br />
se confunde com<br />
aquele, embora<br />
se relacionem<br />
estreitamente.”
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Edição Especial — ano XXVIII<br />
Enfim, há certos saberes que estão associa<strong>do</strong>s à maturidade. É o que<br />
penso há mais de duas décadas.<br />
Se não for impertinente mencionar, esse é outro aspecto que já me<br />
levou a publicar um outro trabalho escrito denomina<strong>do</strong> Limites da<br />
decisão judicial na colmatação de lacunas — perspectiva social da<br />
atividade judicante. 2<br />
REVISTA DO <strong>TCE</strong> — Vossa Excelência acredita ser veda<strong>do</strong> o controle<br />
judicial <strong>do</strong> perfil psicológico exigi<strong>do</strong> pela Administração para avaliar<br />
candidatos em exame psicoténico? Nesse contexto, na opinião de<br />
Vossa Excelência, qual seria a melhor forma de se tornar os exames<br />
psicotécnicos mais objetivos?<br />
PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA — Falan<strong>do</strong> em gênero,<br />
recordemos que o concurso público visa aparelhar o Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> ponto<br />
de vista humano e instrumental. O sujeito é que, após um determina<strong>do</strong><br />
certame, assume porção (maior ou menor) <strong>do</strong> poder político estatal<br />
para realizar os fins públicos.<br />
Esse relacionamento entre o sujeito e o Esta<strong>do</strong> (no aspecto <strong>do</strong><br />
exercício <strong>do</strong> poder) é algo que há séculos fascina o ser humano. A<br />
história da humanidade está permeada por exemplos de que não<br />
temos uma relação muito pacífica com o poder político.<br />
Por isso não é irracional aferir-se o equilíbrio emocional <strong>do</strong> candidato<br />
e outros aspectos relativos ao psicotécnico. Porém, o Poder<br />
Judiciário não tem tolera<strong>do</strong> procedimentos arbitrários, subjetivos<br />
e sem suporte legal.<br />
Nesse contexto, a melhor maneira de objetivar tais exames é tornar as<br />
suas regras mais transparentes; e prévias, para conhecimento geral.<br />
Não é raro discutir-se em juízo regras de concursos públicos que entendem<br />
que o resulta<strong>do</strong> <strong>do</strong> psicotécnico não é passível de recurso (revisão).<br />
REVISTA DO <strong>TCE</strong> — Qual o posicionamento de Vossa Excelência<br />
sobre os chama<strong>do</strong>s cadastros de reserva, consideran<strong>do</strong> a nova<br />
2 SANTANA, J. E. Limites da decisão judicial na colmatação de lacunas — perspectiva social da<br />
atividade judicante. Belo Horizonte: Inédita, 1998.<br />
4<br />
“[...] não é<br />
irracional aferirse<br />
o equilíbrio<br />
emocional <strong>do</strong><br />
candidato e<br />
outros aspectos<br />
relativos ao<br />
psicotécnico. [...]<br />
Nesse contexto,<br />
a melhor maneira<br />
de objetivar tais<br />
exames é tornar<br />
as suas regras mais<br />
transparentes;<br />
e prévias, para<br />
conhecimento<br />
geral.”<br />
Entrevista<br />
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orientação jurisprudencial no senti<strong>do</strong> de que os candidatos,<br />
aprova<strong>do</strong>s dentro <strong>do</strong> número de vagas ofertadas, têm direito<br />
à nomeação no prazo de validade <strong>do</strong> concurso, e não mera<br />
expectativa de direito? E os concursos que preveem prazo<br />
de validade extremamente exíguo, também seriam passíveis<br />
de questionamento ao fundamento de que funcionam como<br />
subterfúgio a essa orientação jurisprudencial? Vossa Excelência<br />
teria alguma sugestão para o controle dessas situações?<br />
PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA — Esse tema é tormentoso. No<br />
passa<strong>do</strong> recente, o candidato aprova<strong>do</strong> mantinha a expectativa de<br />
nomeação até a expiração <strong>do</strong> prazo de validade <strong>do</strong> concurso. Havia<br />
uma nefasta dependência para a materialização <strong>do</strong> direito <strong>do</strong> candidato<br />
que, com a evolução da jurisprudência, se consoli<strong>do</strong>u no senti<strong>do</strong> que<br />
se há concurso, há vaga e, consequentemente, direito à nomeação.<br />
O cadastro de reserva acaba se transforman<strong>do</strong>, na realidade,<br />
num meio termo entre a situação antiga e o entendimento mais<br />
vanguardeiro. Mas não se poderá, por certo, tolerar que o expediente<br />
se transforme numa fórmula para driblar os propósitos <strong>do</strong> concurso<br />
ou os interesses <strong>do</strong> candidato.<br />
Nesse ponto, acho muito importante que to<strong>do</strong>s os órgãos de<br />
controle — destaco os Tribunais de Contas, o Judiciário, o Ministério<br />
Público (sem prejuízo <strong>do</strong> controle social) — estejam mais atentos<br />
à etapa interna <strong>do</strong>s concursos. Ali é que devem estar estampadas,<br />
justificadas e motivadas todas as ações que foram desencadeadas<br />
em relação ao certame.<br />
A etapa interna revelará toda a demanda da Administração Pública,<br />
em torno da necessidade de certa força de trabalho, a justificar<br />
a instauração <strong>do</strong> certame, explicitará motivadamente todas as<br />
circunstâncias que assim devam ser feitas, além de mostrar que a<br />
decisão de gasto (aumento da despesa) estará suportada pelo poder<br />
de gasto (compatibilidade e adequação orçamentária).<br />
REVISTA DO <strong>TCE</strong> — A Constituição Federal prevê que os cargos,<br />
empregos e funções públicas são acessíveis aos estrangeiros, na<br />
4<br />
“[...] acho muito<br />
importante que<br />
to<strong>do</strong>s os órgãos<br />
de controle —<br />
destaco os Tribunais<br />
de Contas, o<br />
Judiciário, o<br />
Ministério Público<br />
(sem prejuízo <strong>do</strong><br />
controle social)<br />
— estejam mais<br />
atentos à etapa<br />
interna <strong>do</strong>s<br />
concursos.”
REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAIS<br />
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forma da lei. Consideran<strong>do</strong> que se trata de norma de eficácia<br />
limitada, que o Estatuto <strong>do</strong> Estrangeiro não versa sobre a matéria<br />
e que não há norma geral da União sobre concursos públicos, para<br />
Vossa Excelência, de quem seria a competência para regular a<br />
matéria? Edital de concurso poderia dispor nesse senti<strong>do</strong>?<br />
PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA — Sim, concor<strong>do</strong> que a norma<br />
constitucional não tenha autoaplicabilidade e seja dependente da edição<br />
de regra subalterna. Ou seja, está dito na CF/88 que a acessibilidade de<br />
estrangeiros aos cargos demanda regulação em lei formal.<br />
Enten<strong>do</strong> que todas as esferas de governo (União, Esta<strong>do</strong>s,<br />
Municípios...) tenham competência legislativa para dispor sobre a<br />
matéria específica, não haven<strong>do</strong> reserva para a pessoa política central<br />
(União). Estou dizen<strong>do</strong> que o tema não está contempla<strong>do</strong> no art. 23<br />
da CF/88, embora haja conexões por ali. Tenho para mim que o tema<br />
é tipicamente de Direito Administrativo (legislação de pessoal), mas<br />
há que se ter cuida<strong>do</strong> para não invadir os assuntos <strong>do</strong> art. 23 da<br />
CF/88, que pertencem exclusivamente à União.<br />
Se não houver lei formal disciplinan<strong>do</strong> o assunto, não há como o<br />
edital tratar disso.<br />
REVISTA DO <strong>TCE</strong> — Qual o seu posicionamento sobre a possibilidade<br />
de controle, pelos Tribunais de Contas, <strong>do</strong>s editais de concurso<br />
público, consideran<strong>do</strong> que os atos de admissão de pessoal estão<br />
sujeitos à atuação das Cortes de Contas?<br />
PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA — Do ponto de vista constitucional,<br />
é perfeitamente possível esse controle prévio. Pelo que sei, há norma<br />
estadual mineira obrigan<strong>do</strong> o exame prévio, pela Corte de Contas, <strong>do</strong><br />
certame deflagra<strong>do</strong> (concurso). Isso não só aprimora o concurso como<br />
valoriza o caráter pedagógico da atuação <strong>do</strong> controle externo. Analisar<br />
tão somente o edital <strong>do</strong> concurso é medida boa; avaliar toda a etapa<br />
interna, incluin<strong>do</strong> o edital, seria ótimo.<br />
De qualquer sorte, essa pergunta é um verdadeiro presente para<br />
a sociedade porque permite destacar a importância <strong>do</strong> concurso<br />
(enquanto mecanismo de arregimentação de pessoal no setor público)<br />
4<br />
“Analisar tão<br />
somente o edital <strong>do</strong><br />
concurso é medida<br />
boa; avaliar toda<br />
a etapa interna,<br />
incluin<strong>do</strong> o edital,<br />
seria ótimo.”<br />
Entrevista<br />
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REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAIS<br />
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e o imenso trabalho que possui a Corte de Contas para zelar pela<br />
eficácia dessa medida, em sua latitude mais ampla.<br />
E quan<strong>do</strong> digo isso, não estou me reportan<strong>do</strong> apenas a aspectos relativos<br />
à legalidade, moralidade, eficiência, etc., embuti<strong>do</strong>s nos concursos. O<br />
papel da Corte de Contas, no caso, é por demais transcendente.<br />
Sei <strong>do</strong> esforço da própria Corte de Contas para realizar esse mister.<br />
Espero haja sempre vontade na Casa e recursos disponíveis para uma<br />
atuação incisiva sobre essa demanda. Os benefícios são imediatos e<br />
os ganhos sociais infinitos.<br />
REVISTA DO <strong>TCE</strong> — Muitas pessoas alegam que a estrutura que<br />
envolve a admissão de pessoal, mediante concurso público, protege<br />
servi<strong>do</strong>res improdutivos, mesmo após a implantação <strong>do</strong> procedimento<br />
de avaliação periódica, o que contraria os princípios <strong>do</strong> interesse<br />
público e da eficiência. Para Vossa Excelência, o que pode ser<br />
feito para que a estabilidade não se torne um manto protetor aos<br />
maus servi<strong>do</strong>res? Como transformar a avaliação periódica em um<br />
instrumento eficaz na observância de princípios constitucionais?<br />
PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA — O recrutamento de pessoal por<br />
concurso público é feito para atender os interesses da Administração<br />
(e da sociedade), como já dissemos aqui. Não teria senti<strong>do</strong> um grande<br />
acautelamento no momento de ingresso, em diversos senti<strong>do</strong>s, e um<br />
desdenho qualitativo em momento posterior.<br />
A estabilidade adquirida após o estágio probatório não impede<br />
a contínua avaliação <strong>do</strong> servi<strong>do</strong>r. Essa avaliação, legalmente<br />
recomendada aliás, deve ser efetiva; ela tem que sair <strong>do</strong> formalismo<br />
genérico para ganhar ares de realidade concreta.<br />
Nunca acreditei, no entanto, que esse ingrediente (a avaliação pura<br />
e simples) pudesse surtir efeitos automáticos. Sempre defendi que a<br />
questão da avaliação funcional estivesse atrelada ao cumprimento de<br />
metas, apresentação de resulta<strong>do</strong>s e, sobretu<strong>do</strong>, ganhos (gratificação<br />
ou equivalente) de produtividade. Haveria mais interesse tanto <strong>do</strong><br />
avalia<strong>do</strong>r quanto <strong>do</strong> avalia<strong>do</strong>. Não seria interessante pensarmos mais<br />
nesse aspecto?<br />
4<br />
“Sempre defendi<br />
que a questão da<br />
avaliação funcional<br />
estivesse atrelada<br />
ao cumprimento<br />
de metas,<br />
apresentação<br />
de resulta<strong>do</strong>s e,<br />
sobretu<strong>do</strong>, ganhos<br />
(gratificação ou<br />
equivalente) de<br />
produtividade.<br />
Haveria mais<br />
interesse tanto <strong>do</strong><br />
avalia<strong>do</strong>r quanto <strong>do</strong><br />
avalia<strong>do</strong>.”
REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAIS<br />
Edição Especial — ano XXVIII<br />
REVISTA DO <strong>TCE</strong> — A Resolução n. 80 <strong>do</strong> CNJ declarou a vacância<br />
<strong>do</strong>s serviços notariais e de registro ocupa<strong>do</strong>s em desacor<strong>do</strong> com<br />
as normas constitucionais e determinou a realização de concursos<br />
públicos para o preenchimento das vagas. Todavia, muitos Esta<strong>do</strong>s<br />
ficaram inertes em relação à citada determinação. Para Vossa<br />
Excelência, quais medidas podem ser tomadas para a efetivação<br />
desta Resolução?<br />
PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA — O CNJ está mostran<strong>do</strong> que a<br />
reforma trazida pela Emenda Constitucional n. 45 era mesmo necessária.<br />
É claro que haverá ainda muitas idas e vindas em relação ao controle<br />
e atuação <strong>do</strong> Conselho Nacional, o que se justifica pela própria pouca<br />
idade desse mesmo Conselho (o CNJ, ainda muito novo).<br />
De qualquer mo<strong>do</strong>, em breve estarão vazios os espaços hoje ocupa<strong>do</strong>s<br />
irregularmente. E onde houver descumprimento da Resolução n. 80/CNJ,<br />
surge a possibilidade de responsabilização da autoridade competente.<br />
Objetivamente, o CNJ tem diversos canais de comunicação<br />
para deflagrar procedimentos visan<strong>do</strong> ver cumpridas as suas<br />
determinações.<br />
A propósito, lembro que o ato normativo que rege a espécie é uma<br />
Resolução; não se trata de simples recomendação.<br />
REVISTA DO <strong>TCE</strong> — O Presidente <strong>do</strong> TCU, Ministro Ubiratan Aguiar, em<br />
entrevista concedida a esta <strong>Revista</strong>, abor<strong>do</strong>u a questão da relação<br />
entre o Poder Judiciário e os Tribunais de Contas. Sustentou a<br />
necessidade de maior integração, mediante a construção de pontes<br />
institucionais. Como Vossa Excelência enxerga essa questão?<br />
PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA — Ouso ir além da proposta<br />
feita pelo nobre Ministro Ubiratan Aguiar.<br />
Há tempos propago a necessidade de criação de círculos institucionais<br />
concêntricos.<br />
As minhas pesquisas científicas e acadêmicas me propiciaram<br />
concluir que as funções governativas devem estar, todas, alinhadas<br />
4<br />
“O CNJ está<br />
mostran<strong>do</strong> que a<br />
reforma trazida<br />
pela Emenda<br />
Constitucional<br />
n. 45 era mesmo<br />
necessária.”<br />
Entrevista<br />
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REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAIS<br />
Edição Especial — ano XXVIII<br />
e relacionadas, atuan<strong>do</strong> não apenas em sinergia, mas sobretu<strong>do</strong> de<br />
forma sincrônica e sistêmica.<br />
Nos meus sugeri<strong>do</strong>s círculos concêntricos, como sugere a visualização<br />
hipotética semelhante a uma rosácea, haverá setores reserva<strong>do</strong>s e<br />
setores comuns para as estruturas orgânicas e entidades constitucionais<br />
de destaque.<br />
O curioso, em minhas experiências, é que quanto mais aprofun<strong>do</strong><br />
a pesquisa localizo mais setores compartilha<strong>do</strong>s <strong>do</strong> que setores<br />
reserva<strong>do</strong>s. Isso me mostra que o alinhamento estratégico das funções<br />
governativas é mesmo uma necessidade inadiável.<br />
Desde sempre me incomo<strong>do</strong>u a sobreposição de funções e de gastos<br />
públicos, sem o controle <strong>do</strong>s respectivos custos, diante de metas<br />
opacas ou inexistentes. Ou seja, esse debate deveria ser aprofunda<strong>do</strong> e<br />
poderia ter início a partir das discussões <strong>do</strong>s planos orçamentários.<br />
REVISTA DO <strong>TCE</strong> — No julgamento <strong>do</strong> Agravo Regimental no Recurso<br />
Extraordinário 598.759, DJ 27/10/2009, o acórdão consignou que<br />
“o Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento de que, em<br />
situações excepcionais, é possível a remarcação de prova física,<br />
em atendimento ao princípio da isonomia”. Comente o afirma<strong>do</strong>.<br />
PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA — O público talvez nem imagine<br />
o quanto chega ao Judiciário envolven<strong>do</strong> o assunto prova física em<br />
concursos públicos. Há situações das mais interessantes.<br />
A situação posta na decisão mencionada é bem simples e de facílima<br />
compreensão.<br />
A Administração Pública declarou inapta uma concursanda que nem<br />
mesmo se submeteu a avaliação física exigida para a espécie. E ela não<br />
fez a dita prova de aptidão em razão de ter da<strong>do</strong> à luz na época <strong>do</strong> exame.<br />
Faltou bom senso ao administra<strong>do</strong>r. Pensemos em termos práticos. Como<br />
a concursanda, logo após o parto, poderia realizar uma prova física?<br />
E se estivesse a concursanda em final de gestação? Pensemos no 8o mês de gravidez. Alguém submeteria essa grávida a um teste de<br />
4<br />
“As minhas<br />
pesquisas científicas<br />
e acadêmicas<br />
me propiciaram<br />
concluir que<br />
as funções<br />
governativas<br />
devem estar,<br />
todas, alinhadas<br />
e relacionadas,<br />
atuan<strong>do</strong> não apenas<br />
em sinergia, mas,<br />
sobretu<strong>do</strong>, de<br />
forma sincrônica e<br />
sistêmica.”
REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAIS<br />
Edição Especial — ano XXVIII<br />
esforço físico (corrida, flexões, exercícios ab<strong>do</strong>minais, rastejamento,<br />
escaladas, etc.)? Chega a ser engraça<strong>do</strong>...<br />
É óbvio que o teste teria que ser remarca<strong>do</strong>. E assim foi decidi<strong>do</strong> pela<br />
Justiça que homenageou a isonomia, mais uma vez.<br />
REVISTA DO <strong>TCE</strong> — Quan<strong>do</strong> da realização de concursos públicos, muito se<br />
discute a respeito da cobrança de taxas de inscrição. Qual a opinião de<br />
Vossa Excelência sobre esse tema? Ainda tratan<strong>do</strong> de taxas de inscrição,<br />
como Vossa Excelência enxerga a previsão contida na Lei Estadual n.<br />
13.392, de 07/12/1999, segun<strong>do</strong> a qual a isenção da taxa de inscrição<br />
<strong>do</strong> concurso público somente será concedida aos desemprega<strong>do</strong>s,<br />
mediante comprovação por meio da Carteira de Trabalho?<br />
PROFESSOR JAIR EDUARDO SANTANA — A realização de um concurso<br />
público envolve uma enorme gama de providências e nem sempre a<br />
Administração Pública tem condições de, sozinha, arcar com toda<br />
essa demanda. Ou seja, sempre há geração de gastos e, não raro, a<br />
contratação de terceiros para se desincumbir da tarefa.<br />
Esse cenário agita diversos apontamentos.<br />
A cobrança de taxa de inscrição pode ser medida necessária a suprir<br />
os enormes custos deriva<strong>do</strong>s <strong>do</strong> certame. A etapa interna <strong>do</strong> concurso<br />
(à qual já me referi) irá mostrar a magnitude desse universo. E já<br />
anunciará não apenas a legalidade da medida (cobrança) quanto a<br />
solução encontrada para tratar <strong>do</strong> tema. Como cobrar, quanto cobrar,<br />
de quem cobrar, o que fazer com a receita, como tratar o déficit<br />
de ingressos, se houver, dentre outros tantos, são to<strong>do</strong>s temas que<br />
devem ser visualiza<strong>do</strong>s previamente pela Administração responsável<br />
por realizar o certame.<br />
Isso tu<strong>do</strong> para não se falar <strong>do</strong> processo de escolha da empresa ou<br />
entidade que realizará o certame (contratação direta? licitação?<br />
nesse caso, pregão?). Devemos estar atentos a esse importante<br />
aspecto porque muito se pode discutir sobre isso.<br />
O fato é que a realização <strong>do</strong> concurso tem um determina<strong>do</strong> custo (que<br />
representará para a Administração um determina<strong>do</strong> gasto ou despesa).<br />
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“Alguém<br />
submeteria essa<br />
grávida a um<br />
teste de esforço<br />
físico (corrida,<br />
flexões, exercícios<br />
ab<strong>do</strong>minais,<br />
rastejamento,<br />
escaladas, etc.)?<br />
[...] É óbvio que<br />
o teste teria que<br />
ser remarca<strong>do</strong>. E<br />
assim foi decidi<strong>do</strong><br />
pela Justiça que<br />
homenageou a<br />
isonomia, mais uma<br />
vez.”<br />
Entrevista<br />
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REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAIS<br />
Edição Especial — ano XXVIII<br />
A receita advinda <strong>do</strong> certame não deveria ser estimada para gerar<br />
lucro, mas tão somente estabelecida para suportar as respectivas<br />
despesas. Registro que os valores das taxas têm regime público e<br />
devem ser direciona<strong>do</strong>s ao Tesouro; jamais poderiam ser objeto de<br />
ajuste de risco com entidades promotoras e executoras de concursos<br />
públicos. Permitir trânsito desses recursos por contas particulares<br />
(privadas) não é boa medida.<br />
Enfim, tive oportunidade de publicar artigo que enfrenta essas<br />
questões complexas. Se for de interesse, ele está publica<strong>do</strong> em<br />
revistas especializadas e disponível em meu site pessoal. 3<br />
Acho que a Lei n. 13.392, de Minas Gerais, é sábia ao instituir a<br />
isenção para quem não pode custear a inscrição. O edital deve bem<br />
disciplinar a operacionalização <strong>do</strong> tema para não gerar inconsistências<br />
e criar ambiente para que o direito seja de fato exerci<strong>do</strong>. A norma<br />
não posta em mão única para favorecer apenas o candidato. Ela<br />
favorece também os interesses da Administração. É regra de mão<br />
dupla, portanto.<br />
3 artigos>direito administrativo>Licitação>. Empresa Promotora de<br />
Concursos Públicos. Contratação Direta. Regime Jurídico da Taxa de Inscrição. Considerações.<br />
4<br />
“[...] a realização<br />
<strong>do</strong> concurso tem<br />
um determina<strong>do</strong><br />
custo (que<br />
representará para<br />
a Administração<br />
um determina<strong>do</strong><br />
gasto ou despesa).<br />
A receita advinda<br />
<strong>do</strong> certame<br />
não deveria ser<br />
estimada para<br />
gerar lucro, mas<br />
tão somente<br />
estabelecida<br />
para suportar<br />
as respectivas<br />
despesas.”<br />
Por: Carolina Pagani<br />
Passos, Cláudia<br />
Costa de Araújo,<br />
Leonar<strong>do</strong> de Araújo<br />
Ferraz, Luciana<br />
Menicucci de<br />
Miranda Procópio<br />
e Maria Tereza<br />
Valadares Costa