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a pedof(am)ilia moderna - FÊNIX - Revista de História e Estudos ...

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Fênix – <strong>Revista</strong> <strong>de</strong> <strong>História</strong> e <strong>Estudos</strong> Culturais<br />

Julho/ Agosto/ Setembro <strong>de</strong> 2005 Vol. 2 Ano II nº 3<br />

ISSN: 1807-6971<br />

Disponível em: www.revistafenix.pro.br<br />

Pois bem: horror é o mínimo que sentimos diante do episódio – mas o que<br />

exat<strong>am</strong>ente provoca esse afeto?<br />

Ora, dir-se-ia que não há aí nenhum enigma: a repulsa <strong>de</strong>ve advir daquilo que<br />

entre nós subsiste como a própria condição <strong>de</strong> haver socieda<strong>de</strong>, isto é, a boa e velha<br />

interdição ao incesto e seu prolong<strong>am</strong>ento na forma do tabu da infância.<br />

De minha parte, gostaria, entretanto, <strong>de</strong> problematizar essa resposta tão<br />

imediat<strong>am</strong>ente disponível. Para tanto, um bom começo estaria em trazer à discussão um<br />

elemento levantado por Michel Foucault em Os anormais: o caráter incestuoso e, se<br />

quiserem, <strong>pedof</strong>ílico, da f<strong>am</strong>ília burguesa.<br />

O nascimento da f<strong>am</strong>ília burguesa<br />

Meados do século XVIII: a masturbação passa a ser representada como um<br />

perigo terrível. Ato contínuo, mobiliza uma apaixonada c<strong>am</strong>panha a propósito <strong>de</strong><br />

erradicá-la.<br />

Em todo caso, não se trata <strong>de</strong> um investimento propri<strong>am</strong>ente moralizador: o<br />

<strong>de</strong>stino anunciado aos onanistas não diz respeito à perdição da alma mas ao<br />

esgot<strong>am</strong>ento do corpo, atravessado por múltiplas doenças. Não por acaso, os gran<strong>de</strong>s<br />

capitães <strong>de</strong>ssa cruzada são os médicos.<br />

Na outra ponta, como alvo preferencial da c<strong>am</strong>panha, está a criança – e entre<br />

ela e o médico, figur<strong>am</strong> os pais, a quem é dirigida uma panóplia <strong>de</strong> manuais, mementos<br />

e exortações públicas em que a masturbação surge cada vez mais clar<strong>am</strong>ente como<br />

“uma etiologia difusa, geral, polimorfa” 2 , capaz <strong>de</strong> engendrar qualquer patologia,<br />

mesmo aquelas que se manifest<strong>am</strong> muito tempo <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> o sujeito ter eventualmente<br />

renunciado aos ch<strong>am</strong>ados hábitos solitários.<br />

Foucault ch<strong>am</strong>a a atenção para o fato fund<strong>am</strong>ental <strong>de</strong> que, no discurso dos<br />

médicos da época, não há uma causalida<strong>de</strong> endógena para a masturbação. Isso quer<br />

dizer que, para eles, a origem do onanismo entre as crianças só po<strong>de</strong> estar no exterior,<br />

na forma <strong>de</strong> um aci<strong>de</strong>nte ou – o que é mais importante – por força da incitação voluntária<br />

<strong>de</strong> alguém que se coloca entre “a virtu<strong>de</strong> dos pais e a inocência das crianças”.<br />

Conclusão <strong>de</strong> Foucault:<br />

Toda a c<strong>am</strong>panha contra a masturbação se orienta <strong>de</strong>s<strong>de</strong> cedo, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o<br />

início, po<strong>de</strong>mos dizer, contra a sedução das crianças pelos adultos;<br />

2 FOUCAULT, Michel. Os anormais. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Martins Fontes, 2001, p. 305.<br />

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