A Poética e a Métrica Clássicas: um estudo do hexâmetro ... - Unesp
A Poética e a Métrica Clássicas: um estudo do hexâmetro ... - Unesp
A Poética e a Métrica Clássicas: um estudo do hexâmetro ... - Unesp
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
A tradução <strong>do</strong> Liber Secundus de Mário Vitorino, assim como as traduções das outras<br />
partes da obra <strong>do</strong> mesmo autor e de outros postula<strong>do</strong>s de <strong>do</strong>utrinas métricas da Antiguidade,<br />
vêm preencher <strong>um</strong>a lacuna existente entre tais textos e os <strong>estu<strong>do</strong></strong>s modernos, que, em geral,<br />
privilegiam análises de cunho retórico e literário tratan<strong>do</strong> com desdém as questões métricas.<br />
O que se obtém como resulta<strong>do</strong> é <strong>um</strong> córpus de autores antigos que trabalharam com questões<br />
de escrita, fonética, fonologia, e métrica, sobretu<strong>do</strong> <strong>do</strong> latim, sen<strong>do</strong> traduzi<strong>do</strong>s para o<br />
vernáculo, até onde se pôde constatar, pela primeira vez.<br />
DISCUSSÕES<br />
O advento das recitationes em Roma, leituras públicas de peças de oratória e de<br />
poemas de caráter eleva<strong>do</strong>, é <strong>um</strong> <strong>do</strong>s fatores que evidenciama importância <strong>do</strong>s sons<br />
articula<strong>do</strong>s da fala para o efeito estético <strong>do</strong> discurso.<br />
No entanto, existe também o fator <strong>do</strong> som e da pronúncia <strong>do</strong> latim, que, dada a fortuna<br />
e situação histórica <strong>do</strong> idioma, só se pode, hoje, estudar e descrever de maneira<br />
metalingüística, recorren<strong>do</strong>-se aos textos remanescentes de autores antigos que falaram sobre<br />
esse assunto, como se vê, por exemplo, em Cícero, Orator, III, XI, 40:<br />
Para falar <strong>um</strong> bom latim, não basta cuidarmos apenas seja de dizer aquelas expressões<br />
que ninguém, com justiça, repreenderia, seja de respeitá-las quanto aos casos, tempos,<br />
gêneros e número, de mo<strong>do</strong> que nada, conflitante, fique confuso ou com senti<strong>do</strong><br />
contraditório, mas é preciso também modular a pronúncia, a respiração e o próprio som<br />
da voz.<br />
Mesmo saben<strong>do</strong> que Cícero, no excerto acima, se refere à oratória, matéria de seu<br />
interesse, é possível dizer que a citação se aplica facilmente à poesia. Como diz Mário<br />
Vitorino, autor com o qual se está trabalhan<strong>do</strong> nessa pesquisa:<br />
Non n<strong>um</strong>quam haec observatio praetermittitur. Sed qui fuerint eius modi versus, neque<br />
son<strong>um</strong> neque gratiam habebunt et prosae orationi similes audientur.<br />
Sempre se deixa passar essa observação: mas os versos que forem desse mo<strong>do</strong> [que<br />
terminassem em anapestos], nem som, nem graça teriam e seriam ouvi<strong>do</strong>s como o<br />
discurso da prosa. 1<br />
É possível entrever que o <strong>estu<strong>do</strong></strong> da métrica propicia <strong>um</strong>a dimensão inédita da poesia<br />
antiga, porque pode fazer enxergar efeitos de expressão não privilegia<strong>do</strong>s nem aborda<strong>do</strong>s, em<br />
geral, por muitos <strong>do</strong>s <strong>estu<strong>do</strong></strong>s modernos. A isso, ou seja, <strong>um</strong>a forma de <strong>estu<strong>do</strong></strong> <strong>do</strong>s poemas que<br />
1 Mário Vitorino, Liber Secundus <strong>do</strong>s Artis grammaticae Libri III, p. 70. To<strong>do</strong>s excertos de Vitorino aqui cita<strong>do</strong>s<br />
foram traduzi<strong>do</strong>s pela pesquisa<strong>do</strong>ra iniciante e revistos pelo orienta<strong>do</strong>r da pesquisa.<br />
Anais XXIII SEC, Araraquara, p. 321-329, 2008<br />
324