08.05.2013 Views

Cartas - Revista Metrópole

Cartas - Revista Metrópole

Cartas - Revista Metrópole

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

32<br />

nha bem em dado momento, né? O César<br />

Maia e a Tutu, filha do Jânio, disseram:<br />

“Ah, aquilo foi roubado”. Naquela época<br />

havia muita fraude mesmo, mas nunca<br />

entrei nesse detalhe. O César dizia, sei lá,<br />

“caiu muito o número de votos brancos e<br />

nulos, não pode ser”. Enfim, eu acho que<br />

eu perdi porque eu perdi, porque não tive<br />

competência para enfrentar o Jânio, porque<br />

ele era uma façanha. Não tinha experiência<br />

melhor do que perder pro Jânio<br />

Quadros. Eu até tive uma operação<br />

de apendicite ou sei lá o quê e o Brizola<br />

veio me ver e me disse uma coisa que<br />

me impressionou bastante: “Olha, você<br />

sabe que eu perdi a eleição pra prefeito<br />

em Porto Alegre... A melhor coisa na<br />

vida de um político é perder uma eleição.<br />

Porque senão você pensa que vai<br />

ganhar sempre e tal.” É consolo para os<br />

derrotados, mas a derrota é uma experiência<br />

também importante, não é?<br />

RM – É verdade.<br />

– O Hélio Jaguaribe, que é meu amigo,<br />

foi na minha casa e disse: “Você não pode<br />

deixar a política, você tem que ser candidato<br />

a deputado, porque senador você<br />

não vai conseguir, é muito arriscado”. E<br />

eu achava mesmo isso. Eu tinha sido senador,<br />

eu tinha sido eleito, ou melhor, eu<br />

tinha substituído o Montoro quando ele<br />

foi ser governador, eu virei senador, perdi<br />

a eleição de prefeito... Minhas chances<br />

seriam pequenas. Até que vi as pesquisas,<br />

e eu disparava nas pesquisas para senador.<br />

Porque o eleitorado sempre faz uma justiça<br />

distributiva. Se perdeu em um, agora<br />

vou dar uma chance. É uma coisa meio<br />

psicológica assim. Tive seis milhões de<br />

votos, eu tinha um comitê só, não tinha<br />

dinheiro. Mário teve um pouco mais que<br />

eu, mas Mário tinha uma máquina imensa<br />

e ganhamos os dois a eleição. Aí, assim,<br />

perdi para prefeito e no ano seguinte virei<br />

senador com meus próprios votos.<br />

RM – Itamar Franco gosta<br />

muito de dizer que foi ele quem<br />

elegeu o senhor presidente da<br />

República com o Plano Real.<br />

– O Plano Real me elegeu,<br />

mas não foi Itamar que me elegeu<br />

(risos). Eu que sustentei o<br />

governo do Itamar com o Plano<br />

Real. Eu gosto do Itamar.<br />

O Itamar é difícil, né?<br />

RM – Muito difícil.<br />

– Mas isso é uma coisa contra<br />

os fatos. Se o Itamar não tivesse<br />

me nomeado ministro, eu<br />

não teria feito o Plano Real. Se<br />

o Itamar não tivesse me apoiado,<br />

eu não teria feito o Plano<br />

Real. Então, dá a César o que<br />

é de César. Mas, é... Eu ganhei<br />

por causa do Plano Real.<br />

RM – No fim do governo de<br />

Fernando Collor se dizia que o senhor desejava<br />

muito um apoio do PSDB para sustentar<br />

o governo Collor. Foi verdade isso?<br />

– Não. Eu estava na Europa, na Rússia,<br />

quando comecei a receber telefonemas<br />

dizendo que o Jorge Bornhausen,<br />

que era Chefe da Casa Civil, queria<br />

falar comigo. Eu estava na Rússia, naquela<br />

época era difícil falar no telefone<br />

lá, aí não falei. Fui pra Roma, fui para<br />

Bolonha, que eu tinha uma reunião na<br />

“Eu acho que perdi porque perdi, porque<br />

não tive competência para enfrentar o<br />

Jânio, que era uma façanha”<br />

Universidade de Bolonha, e de lá eu falei<br />

com o Serra que dizia “olha, quero que<br />

você seja ministro e tal”. Cheguei aqui e<br />

estava Pimenta da Veiga me esperando,<br />

muito interessado que nós abríssemos as<br />

conversações com o governo. O PSDB<br />

tinha tomado uma decisão de não falar.<br />

Eu e Montoro fomos contra essa decisão<br />

e ganhamos. Havia uma reunião na casa<br />

do Sérgio Machado, que hoje é presidente<br />

da Petrobras Distribuidora. Uma reunião<br />

grande, com a direção do Partido e<br />

decidiram que eu e o Tarso iríamos falar<br />

com o Collor. Fomos. O Collor sempre<br />

me tratou bem, o conheci quando era<br />

deputado. Logo que foi eleito, o Collor<br />

mandou Carlos Chiarelli ir lá em casa<br />

dizer que gostaria que eu fosse Ministro<br />

do Exterior. Eu disse: “Não, eu apoiei o<br />

Lula no segundo turno, não teria cabimento”.<br />

Aí dessa segunda vez, ele disse:<br />

“Fernando, você precisa me ajudar a<br />

convencer o Tarso a aceitar o ministério”.<br />

Aí, ele me chamava de Fernando,<br />

eu também chamava ele de Fernando, eu<br />

disse: “Fernando, a gente veio aqui pra<br />

isso, a gente veio aqui pra te ouvir”. Já<br />

estava feito o governo. Eles queriam o<br />

PSDB para enfeite do bolo. Eu no Exterior<br />

e Tarso no Minas e Energia. Aí<br />

eu disse: “Olha Fernando, o Tarso tem<br />

razão, a gente não pode aceitar”. Aí ele<br />

disse “ah, mas eu queria vocês aqui, que<br />

a gente pudesse falar com franqueza”,<br />

aquela coisa. O Collor é muito bem<br />

apessoado, muito convincente e não<br />

havia aquela onda toda. PC ainda não<br />

estava no ar, ninguém sabia disso. Mas<br />

não foi por isso. Eu disse: “Nós não podemos<br />

fazer isso. A gente veio aqui saber<br />

o que você está pensando, voltamos<br />

e dizemos que somos ministros? Isso aí<br />

vai ficar feio”. Saímos eu e o Tarso dali.<br />

No carro eu falei assim: “Olha Tarso, se<br />

você quiser, tudo bem, eu não quero, eu<br />

não vou”. E ele disse que também não<br />

ia. E por que não ir? Porque ele não discutiu<br />

nada, do que ia fazer, da política.<br />

Estava tudo montado, porque estava tudo<br />

acertado, ele simplesmente queria a gente<br />

ali. Telefonei pro Mário Covas e disse<br />

“Mário, venha para a reunião porque vai<br />

ser uma decisão” e contei. Aí o Mário foi<br />

na televisão, ele já ia na televisão, e disse<br />

que não aceitaria nunca. Então todo<br />

mundo disse que o Mário não deixou que<br />

eu fosse. Não, não foi isso. Aí chegamos,<br />

o Mário foi e houve uma tremenda briga<br />

entre o Mário e, pasmem, Ciro Gomes.<br />

Porque o Ciro queria porque queria que<br />

nós fôssemos.<br />

RM – Agora, já na sua presidência,<br />

qual foi o papel de Luís Eduardo Magalhães?<br />

Parece que o senhor teve grande<br />

afeto por ele.<br />

– Era uma pessoa competente e cumpridora.<br />

O Luís Eduardo era um dos<br />

poucos políticos brasileiros que era liberal.<br />

Eu não sou, sou social-democrata.<br />

Mas ele era conseqüentemente liberal.<br />

Na visão da economia, em tudo ele agia<br />

como liberal. E ele comandava a câmera,<br />

tinha poder sobre a câmera. Eu e ele<br />

sempre nos entendemos muito bem. Eu<br />

gostava muito do Luís Eduardo e acho<br />

que ele sempre era verdadeiro. O Luís<br />

ajudou muito. Ele tomava decisões, enfrentava<br />

e tinha uma relação muito direta<br />

comigo.<br />

RM – E Antonio Carlos Magalhães?<br />

– Antonio Carlos era uma coisa mais<br />

complexa. Porque Antonio Carlos é capaz<br />

daquilo que o Lula é: ter amor e<br />

ódio, não é? E de alternar com relação<br />

à mesma pessoa, a depender do momento.<br />

Foi assim comigo o tempo todo. Ele<br />

tinha um pouco de ciúme da relação minha<br />

com o Luís...<br />

RM – É verdade.<br />

– Luís segurava Antonio Carlos com<br />

mais ímpeto. Depois que o Luís morreu,<br />

apesar daquele primeiro movimento, no<br />

dia em que ele voltou a Brasília, quando<br />

foi muito receptivo comigo, ele começou<br />

a agir comigo de uma forma bastan-<br />

te complicada. Ninguém fez maior oposição<br />

ao meu governo do que ele. O Lula<br />

não fazia oposição a mim naquele tempo.<br />

O PT fazia, mas o Lula não, não tinha<br />

nem força pra fazer. O Antonio Carlos<br />

tinha e realmente manobrou muito<br />

e tal. Morreu com paixão por mim de<br />

novo. Mas Antonio Carlos era isso, você<br />

conheceu bem Antonio Carlos. Então, a<br />

relação era sempre difícil. Ajudou e atrapalhou,<br />

dependendo do momento.<br />

RM – Eu trabalhei com ele 14 anos e<br />

tivemos uma relação de amor e ódio também.<br />

Foi um inimigo meu terrível.<br />

– Com todo mundo ele era assim. Ele<br />

não foi o inimigo estável. Agora, uma pessoa<br />

de grande inteligência política. Sabia<br />

definir o adversário. Tinha capacidade cênica<br />

e capacidade de dizer o que o jornalista<br />

gosta, de dar informação, era inteligente.<br />

Não era um homem de cultura, não<br />

era um homem de formação, mas muito<br />

inteligente. Quando queria agradar, agradava<br />

como ninguém. Acho que ele tem<br />

um mérito: conheço pouco a Bahia, mas<br />

acho que ele tinha amor pela Bahia. E outro<br />

mérito dele também: ele costumava só<br />

indicar pessoas competentes. Ele buscava<br />

uma coisa muito difícil que é subordinação<br />

e competência. É difícil, né?<br />

RM – (risos) É isso mesmo! Presidente,<br />

Angelo Sá, em entrevista que ele me deu,<br />

ele disse o seguinte: o Banco Econômico,<br />

ele reconhece que estava numa situação<br />

extremamente difícil. Ele tentou vender<br />

o Banco Econômico ao Bamerindus. Na<br />

época, o dono do Bamerindus era seu ministro<br />

da Agricultura, Andrade Vieira. E<br />

Maurício Schulman era o presidente do<br />

Bamerindus. Estava tudo certo para isso<br />

quando ele, Angelo Sá, acha que houve<br />

a interferência de José Serra e de Sérgio<br />

Mota porque não queriam que houvesse<br />

o crescimento do PTB de Andrade Vieira<br />

junto com o PFL de Antonio Carlos Magalhães,<br />

já que Ângelo era de certa forma<br />

ligado a Antonio Carlos Magalhães e que<br />

isso teria sido a razão política para o fato<br />

de o Banco Econômico ter sido, inclusive,<br />

o único banco que foi decretada a intervenção<br />

e que deixou de funcionar, porque<br />

o Nacional no dia seguinte funcionou, outros<br />

bancos mudaram de dono, mas continuaram<br />

funcionando...<br />

– Se eu me recordo, não houve qualquer<br />

palavra nem de Serra nem de Sérgio<br />

Motta nessa matéria. Essa matéria foi<br />

“Quando a gente<br />

perde a eleição,<br />

a culpa é de quem<br />

perdeu”<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Metrópole</strong> - junho de 2008<br />

33

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!