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Pelas tramas de uma cidade migrante (Joinville, 1980-2010)

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fotografia ampliada <strong>de</strong> um grupo musical germânico joinvilense e num<br />

velho bandoneon protegido por <strong>uma</strong> redoma acrílica que lhe imprimia<br />

o status <strong>de</strong> relíquia. Tocos <strong>de</strong> árvore, instrumentos agrícolas, vasos<br />

com orquí<strong>de</strong>as e mobiliários antigos preenchiam os cantos e espaços<br />

livres. Tive a impressão <strong>de</strong> que, diferentemente dos outros estan<strong>de</strong>s<br />

étnicos, o alemão apresentava, como nenhum outro, objetos dados a<br />

ler a história da cida<strong>de</strong>.<br />

Não havia naquele momento nenhum recepcionista preparado<br />

para satisfazer as possíveis indagações dos visitantes, mas aquela<br />

espécie <strong>de</strong> coleção, fruto <strong>de</strong> empréstimos <strong>de</strong> joinvilenses <strong>de</strong> origem<br />

alemã, enviava mensagens e transmitia sinais que iam além da sua<br />

materialida<strong>de</strong>, insinuando <strong>uma</strong> já conhecida hegemonia histórica. Os<br />

objetos apresentavam-se como sendo naturalmente <strong>de</strong>cantados <strong>de</strong><br />

<strong>uma</strong> trajetória, a qual todos os joinvilenses estavam acost<strong>uma</strong>dos a<br />

reverenciar 37 e, ao mesmo tempo, explicar.<br />

A propalada tradição alemã sempre se ancorou no passado<br />

da imigração germânica da cida<strong>de</strong>. Por seu intermédio, explicaramse<br />

o progresso, a industrialização, a or<strong>de</strong>m, a disciplina, a limpeza<br />

e a riqueza cultural, elementos recorrentes em alg<strong>uma</strong>s narrativas<br />

históricas. Conforme escreveu, em 1986, o historiador joinvilense<br />

Apolinário Ternes, o i<strong>migrante</strong> do século XIX é consi<strong>de</strong>rado “um<br />

vencedor”, pois “mesmo enfrentando situações insólitas” sua força física<br />

e moral venceu “a natureza inóspita, as doenças, a falta absoluta <strong>de</strong><br />

quase tudo” 38 . Isso graças ao seu “perfil psico-social”: “os alemães que<br />

para cá vieram, [...], pertencem à Alemanha mansa e pacífica, dotados<br />

<strong>de</strong> espírito superiormente refinado e, por isto mesmo, culturalmente<br />

evoluídos” 39 . Disso resultou a criação das primeiras socieda<strong>de</strong>s culturais,<br />

os bons costumes, a organização e a disciplina tão característica <strong>de</strong>sses<br />

i<strong>migrante</strong>s 40 . <strong>Joinville</strong> seria, portanto, tributária aos seus antepassados,<br />

pois graças a eles po<strong>de</strong>ria se orgulhar <strong>de</strong> seus adjetivos laudatórios.<br />

Para a realização da festa, entretanto, o Sr. Wilmar <strong>de</strong> Souza<br />

<strong>de</strong>stacou em sua entrevista o <strong>de</strong>sinteresse dos representantes da etnia<br />

37 Como nos lembra Krzysztof Pomian, os objetos <strong>de</strong> <strong>uma</strong> “coleção participam no intercâmbio<br />

que une o mundo visível ao invisível”. POMIAN, Krzysztof. Coleção. In: ENCICLOPÉDIA<br />

Einaudi: Memória/História. v. I. Porto: Imprensa Nacional; Casa da Moeda, 1994. p. 66.<br />

38 TERNES, Apolinário. História econômica <strong>de</strong> <strong>Joinville</strong>. <strong>Joinville</strong>: <strong>Joinville</strong>: Meyer, Meyer, 1986. p. 25.<br />

39 Id. Ibid. p. 30.<br />

40 A esse respeito ver também TERNES, Apolinário. História <strong>de</strong> <strong>Joinville</strong>: <strong>uma</strong> abordagem<br />

crítica. <strong>Joinville</strong>: Meyer, 1981, especialmente o capítulo intitulado “O período <strong>de</strong> adaptação<br />

– a construção do <strong>de</strong>stino”.

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