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A INTERVENÇÃO DO ESTADO NO PODER FAMILIAR - pucrs

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FABIANE QUEIROZ MACHA<strong>DO</strong> CARRION<br />

A <strong>INTERVENÇÃO</strong> <strong>DO</strong> ESTA<strong>DO</strong> <strong>NO</strong> <strong>PODER</strong> <strong>FAMILIAR</strong><br />

Este trabalho tem por escopo realizar uma análise das formas de<br />

Intervenção do Estado no Poder Familiar. Para que se obtenha uma melhor<br />

compreensão acerca do tema, o presente assunto será abordado sob três enfoques:<br />

primeiramente será analisada a origem da família, sua evolução histórica e a<br />

concepção da mesma nos tempos modernos. Em um segundo momento ocorrerá a<br />

análise do poder familiar, bem como a transformação que ocorreu neste instituto no<br />

decorrer dos anos, e a sua concepção na atualidade. Após esta análise da família e<br />

do poder familiar, serão analisados os tipos de intervenções existentes no<br />

ordenamento jurídico brasileiro que permitem que o Estado, ente público, atue de<br />

forma significativa na família e mais propriamente no poder familiar, esfera privada.<br />

Nesse mesmo enfoque ocorrerá uma análise jurisprudencial, visando à forma que a<br />

intervenção estatal é aplicada na atualidade. O estudo sobre a Intervenção do<br />

Estado no poder familiar é uma contribuição para um melhor entendimento deste<br />

tema pouco abordado durante a graduação.<br />

familiar.<br />

Palavras-Chave: Família. Poder Familiar. Intervenção Estatal no poder<br />

1. INTRODUÇÃO<br />

A família vem passando, no transcorrer dos séculos, por significativas<br />

transformações em sua constituição, função e finalidade. No entanto, é de saber<br />

notório que em determinadas situações o Estado necessita intervir nas relações<br />

familiares, principalmente quando existem menores envolvidos nos conflitos<br />

cotidianos, objetivando, dessa forma criar uma estabilidade social e, principalmente,<br />

impedir que o menor cresça em um ambiente desestruturado.<br />

7


Em virtude deste fato, o presente trabalho visa abordar, sem qualquer<br />

intenção de esgotamento acerca do assunto, quais as formas de intervenção estatal<br />

existente no poder familiar nos dias de hoje. O primeiro capítulo versará sobre a<br />

família. Em um primeiro momento será abordada uma breve evolução histórica da<br />

família, desde o seu conhecimento até os dias atuais. Em seguida a preocupação é<br />

explanar a atual concepção da família, bem como os tipos de família existentes nos<br />

dias de hoje.<br />

Adiante, no segundo capítulo, será tratado o tema poder familiar, na qual<br />

ocorrerá uma análise sobre a sua evolução no decorrer da história. Após, será<br />

exposta a nova concepção do poder familiar, com o pensamento de diversos<br />

autores, podendo ser citada Denise Dano Comel e Washington de Barros Monteiro.<br />

Por fim, será abordado o exercício do poder familiar hoje, bem como os sujeitos que<br />

dele fazem parte.<br />

Por derradeiro, o terceiro capítulo, se propõe a abordar a intervenção do<br />

estado na família. Inicia com a intervenção do estado na família, abrangendo, nesse<br />

caso, todos os entes que dela fazem parte. Será analisada a denominada Doutrina<br />

da Proteção integral, adotado pela nossa Carta Magna de modo a apresentar seu<br />

surgimento e suas características. A seguir, serão apontadas as formas de<br />

intervenção do estado no poder familiar existentes, denominadas extinção, perda e<br />

suspensão do poder familiar. Por fim, concluí-se o trabalho analisando, mediante a<br />

exposição de casos jurisprudenciais, a forma em que estas intervenções estão<br />

expostas em nosso sistema.<br />

2. <strong>DO</strong> <strong>PODER</strong> <strong>FAMILIAR</strong><br />

No decorrer da vida, mais especificamente no início, todo o ser humano<br />

necessita de alguém para a sua criação e educação durante a infância e a<br />

adolescência, amparando-o e cuidando de seus interesses. Naturalmente a pessoa<br />

8


mais indicada para realizar esta tarefa são os pais, e em sua falta, adulto que possa<br />

desempenhá-la. 1<br />

O poder familiar consta, no ordenamento jurídico, como direitos e<br />

responsabilidades envolvidas na relação entre pais e filhos, resultado de uma<br />

necessidade natural, no entanto esta concepção sofreu, e permanece sofrendo<br />

modificações, sendo denominado inicialmente como pater famílias, 2 possuindo o pai<br />

poder absoluto sobre a família, escravos e agregados. 3 Fatores como a<br />

industrialização, o avanço das telecomunicações e a globalização, foram<br />

fundamentais para realçar no pátrio poder os deveres dos pais para com a sua prole,<br />

da mesma forma fortalecer a situação da mulher na sociedade e no núcleo familiar.<br />

Modificação importante, diz respeito à igualdade entre pai e mãe no<br />

exercício do poder familiar, princípio constitucional, previsto no artigo 5º da Carta<br />

Magna de 1988 e, posteriormente, adotado no Código Civil elaborado em 2002.<br />

Diante desta mudança surge novo conceito de pátrio poder, adquirindo nova<br />

nomenclatura, passando a ser conhecido como poder familiar, com novo conceito e<br />

características.<br />

Washington de Barros Monteiro define o poder familiar na atualidade: “O<br />

poder familiar pode ser conceituado como o conjunto de obrigações, a cargo dos<br />

pais, o tocante à pessoa e bens dos filhos menores. Por natureza, é indelegável”. 4<br />

Em suma, o poder familiar é o poder que os pais tem perante seus filhos,<br />

devendo zelar e proteger estes até que alcancem a maioridade e adquiram a devida<br />

responsabilidade civil. Modificou-se de forma significativa no transcorrer dos anos, e<br />

ainda está em fase de transição. Em decorrência destas transformações viu-se a<br />

importância do estudo deste instituto, que repercute em todas as searas do mundo<br />

jurídico, modificando a situação do quadro familiar.<br />

1 GOMES, Orlando. Direito de Família. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000. p. 389.<br />

2 Pater famílias. Literalmente "pai da família". Disponível em:<br />

. Acesso em: 14<br />

fev. 2011.<br />

3 GOMES, loc. cit.<br />

4 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil. Atualizado por Regina Beatriz<br />

Tavares da Silva. 37. ed. Saraiva. 2004. v. 2. p. 348.<br />

9


2.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA <strong>DO</strong> <strong>PODER</strong> <strong>FAMILIAR</strong><br />

Portugal sofreu grande influência do poder paternal implantado em Roma,<br />

dentre estas características que integravam o poder familiar existia a conotação<br />

eminentemente religiosa, na qual o pater famílias, exercia controle sobre a casa e os<br />

filhos sendo o mesmo compelido à mãe em raras situações. O pater estava<br />

incumbido de conduzir a religião doméstica do lar familiar, mantendo unido e sólido o<br />

grupo como célula importante do Estado. 5<br />

O poder não alcançava os filhos naturais 6 e os espúrios, 7 fazendo parte do<br />

domínio do pater potestas apenas os legitimados 8 e legítimos. 9 Os deveres do pai<br />

para com seus filhos era fornecer educação, proporcionar profissão de acordo com<br />

as condições financeiras apresentadas, bem como castigar-lhes moderadamente,<br />

quando entendia necessário.Não conseguindo controlar seus filhos era dever do pai<br />

encaminhar a prole ao magistrado de polícia para direcioná-los à cadeia por tempo<br />

considerado razoável, assim como obrigá-los a seu próprio sustento. 10<br />

No âmbito pessoal, o pai dispunha do enérgico jus vitae et necis, no qual<br />

cabia proceder contra os que pervertessem ou concordassem para isso, abandonar<br />

o filho recém nascido (jus exponendi), exigir seus serviços quando entendia<br />

necessário, sem pagar salário, salvo se prometido, vendê-los (ius vendendi), durante<br />

um prazo de até cinco (5) anos recuperando, passado este período, a potestade. A<br />

5 VE<strong>NO</strong>SA, Silvio de Salvo. Direito de família VI. 6. ed. 2006. p. 318.<br />

6 Filhos naturais: filhos havidos de uniões concubinárias. Disponível em:<br />

. Acesso em: 14<br />

fev. 2011.<br />

7 Filhos espúrios: filhos havidos fora do casamento. Disponível em:<br />

. Acesso em: 14<br />

fev. 2011.<br />

8 Filhos legitimados: São legitimados quando, concebidos por pessoas não casadas, que<br />

posteriormente ao nascimento, convolam as justas núpcias. Disponível em:<br />

. Acesso em: 14<br />

fev. 2011.<br />

9 Filhos legítimos: Procriados na vigência do casamento. Disponível em:<br />

. Acesso em: 14<br />

fev. 2011.<br />

10 COMEL, Denise Damo. Do Poder Familiar. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 24.<br />

10


venda da prole, pelo pater, era considerada espécie momentânea de suspensão do<br />

poder familiar, na qual o filho, durante período antecipadamente combinado, não<br />

estava sobre o poder de seu potestas. 11<br />

A extinção do pátrio poder ocorria pela morte do pai ou do filho, pelo<br />

banimento, pelo casamento do filho, pela emancipação do mesmo e pelo exercício<br />

de cargos públicos. Em sendo o filho maior de 21 anos a extinção ocorria pela<br />

colação de grau acadêmico, mediante entrada do pai ou do filho em religião<br />

reprovada, por abandono ou maus ensinamentos dos pais para com os filhos, pela<br />

investidura de ordem sacros maiores, pela exposição do pai para com seu filho, bem<br />

como por sentença transitada em julgado nos casos em que o pai era compelido a<br />

emancipar o filho. 12 Com o cristianismo como religião oficial de inúmeras nações<br />

surge incompatibilidade das leis com as normas que o cristianismo pregava<br />

principalmente no que tange à vida, proibindo a venda, morte ou entrega do filho a<br />

um credor.<br />

Enfim, o pai era quem detinha total poder sobre a prole, sendo o mesmo<br />

compelido à mãe em situações bem específicas. Com o passar dos tempos as leis<br />

adquiriram menor rigorosidade e o poder familiar assumiu caráter mais protetivo,<br />

regulando de forma específica o bem estar do menor e os cuidados com a família. 13<br />

2.1.1 Código Civil de 1916 e o Pátrio Poder<br />

Sob a égide da Constituição da República de 1891, que assegurava a<br />

democracia à liberdade e a igualdade perante a lei, através de uma sociedade<br />

basicamente rural, a família caracterizou-se como entidade patriarcal, hierarquizada,<br />

matrimonializada e patrimonializada. 14 O homem permaneceu como comandante do<br />

poder familiar, representando todos os que da família faziam parte. Primazia ou<br />

11 COMEL, loc. cit.<br />

12 COMEL, loc. cit.<br />

13 RIZZAR<strong>DO</strong>, Arnaldo. Direito de Família. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008. p. 609.<br />

14 COMEL, Denise Damo. Do Poder Familiar. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 26.<br />

11


investidura que se exaltava, além do mais, no fato de a mulher com o casamento ser<br />

tida como relativamente incapaz, submissa ao poder marital.<br />

Autores justificaram o ato de a mulher ser vista perante a sociedade como<br />

um ser inferior ao homem, argumentando que a mesma não era detentora de igual<br />

poder, vez que este não poderia se dividir em dois entes familiares, dentre eles<br />

Lafayette Rodrigues Pereira que relatou: “não poderia a sociedade conjugal<br />

substituir regularmente se o poder de dirigir a família reger-lhe os bens não<br />

estivesse concentrado em um só dos cônjuges”. 15<br />

Vozes surgiram contrapondo estas idéias e modificando a concepção de<br />

família, que não mais tinha por base o pensamento de que o homem era superior a<br />

mulher, partindo da premissa de que ambos eram iguais em direitos e deveres para<br />

com seus filhos, Clóvis Beviláquia comentou acerca deste assunto: “apesar da<br />

preeminência concedida ao marido, os dois cônjuges se acham no mesmo plano<br />

jurídico, e não exerce o homem autoridade sobre a mulher”. 16<br />

Não obstante, ao contrair casamento a mulher perdia o direito à livre<br />

administração de seus bens, não podendo exercer uma profissão sem a autorização<br />

do marido. Dentre estas outras limitações suficientes para colocá-la em um patamar,<br />

no mínimo, de inferioridade e dependência do cônjuge varão, participando de forma<br />

subsidiária da vida de sua prole perduravam na sociedade.<br />

Apesar de toda a evidência da legislação, no entanto partindo do<br />

pressuposto que no âmbito das relações paterno-filiais os imperativos de amor e<br />

solidariedade prevalecem sobre os dispositivos legais a doutrina abre espaço à<br />

mulher, possibilitando que a mesma torne-se reconhecida na criação dos filhos. È de<br />

se salientar que esta exercia o papel de educadora, participando ativamente na<br />

criação dos filhos, ainda que não houvesse respaldo legal.<br />

Mudança ocorreu, também, no que tange à existência dos filhos, de modo a<br />

ser conferida proteção a todos os filhos havidos dentro, ou fora do casamento, ainda<br />

15 COMEL, loc. cit.<br />

16 COMEL, Denise Damo. Do Poder Familiar. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 27.<br />

12


que fossem reconhecidos apenas os filhos havidos na vigência do matrimônio,<br />

denominados legítimos. Os filhos ilegítimos permaneciam, quando possível, sobre o<br />

pátrio poder materno.<br />

Destarte quanto ao patrimônio da prole, os pais eram responsáveis por<br />

exercer a administração e o usufruto dos bens, salvo restrições. Em se tratando de<br />

extinção do pátrio poder, ocorria com a morte dos pais, ou do filho, pela adoção,<br />

emancipação ou ainda, pela maioridade, alcançada quando o filho completasse 21<br />

anos.<br />

A Lei nº 4.121 de 27.08.1962, designada Estatuto da Mulher Casada<br />

modificou conceitos e concepções importantes da época, permitindo que tanto a<br />

mulher, quanto o homem adquirissem titularidade frente ao pátrio poder. Entretanto,<br />

em casos de divergência a palavra do marido vigorava. 17 Esta lei inseriu modificações<br />

no ordenamento jurídico, como o artigo 380, do Código Civil de 1916, dispositivo que<br />

atribuiu a titularidade do pátrio poder ao homem e à mulher, conjuntamente. Outra<br />

alteração ocorreu no texto do artigo 393, 18 que estabeleceu que a viúva, ao contrair<br />

novo casamento, mantinha o pátrio poder referente aos filhos do matrimônio<br />

anterior, antigamente ela perdia o direito sobre os seus filhos.<br />

Em suma, no decorrer dos tempos a mulher adquire espaço na sociedade,<br />

se igualando ao homem, no que tange aos cuidados com a prole. Porém, para que<br />

isso fosse possível enfrentou preconceito existente na época, que argumentavam<br />

que a mulher era mais fraca, menos inteligente e capaz que o homem na<br />

administração da prole.<br />

17 COMEL, Denise Damo. Do Poder Familiar. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 33.<br />

18 Código Civil 1916, art. 393: “A mãe que contrai novas núpcias não perde, quanto aos filhos de<br />

leito anterior, os direitos do pátrio poder, exercendo-os sem qualquer interferência do marido”.<br />

13


2.1.2 Lei do Divórcio, Reforma Constitucional e Criação do Estatuto da Criança<br />

e do Adolescente<br />

Posteriormente a elaboração da Lei nº 4.121 de 27.08.1962, denominada<br />

Estatuto da Mulher Casada surge nova Legislação, conhecida como Lei do Divórcio,<br />

nº 6.515 de 1977. Esta foi promulgada com o objetivo de estabelecer critérios legais<br />

de regularizar a situação dos filhos menores, conseqüentemente submetidos ao<br />

pátrio poder, os quais passariam a viver fora do convívio simultâneo dos pais.<br />

Seu maior objetivo foi regular a situação dos filhos submetidos ao pátrio<br />

poder, que viveriam fora do convívio simultâneo dos pais que, mediante separação<br />

judicial morariam apenas com um destes pais. A guarda era discutida judicialmente,<br />

e não de forma amigável e através de consenso como era nos casos de separação<br />

consensual. 19<br />

A separação consensual decorre de um acordo sobre a guarda dos filhos,<br />

não havendo necessidade de impasse maior. Nestes casos permanecia o disposto<br />

no Código Civil de 1916, de modo que ambos os pais decidem em conjunto sobre a<br />

guarda dos filhos. Em havendo separação litigiosa e anulação de casamento, três<br />

possibilidades foram previstas: a primeira defendia que guarda dos filhos pertencia<br />

ao cônjuge inocente, no caso de culpa de um destes. Todavia este pensamento<br />

recebeu críticas. Limongi França fundamentou que a guarda dos filhos não se<br />

relaciona, necessariamente, com a natureza ou com os motivos da separação<br />

judicial, na medida em que atribuir a guarda a outro é impor penalidade ao outro à<br />

custa dos filhos. 20<br />

A segunda possibilidade prevista no caso de separação litigiosa era a<br />

separação com culpa de ambos os cônjuges, optando o legislador que o filho<br />

19 Ibidem, p. 36.<br />

20 Ibidem, p. 37.<br />

14


permanecesse sob guarda da mãe, salvo nos casos de o juiz entendia prejudicar o<br />

menor. No terceiro e último caso é analisada a possibilidade dos filhos não<br />

permanecerem nem com o pai e nem com a mãe, ficando temporariamente com<br />

alguém idôneo da família. 21<br />

Nas hipóteses de rompimento da vida em comum, estabelecia que os filhos<br />

ficariam com o cônjuge com quem estavam ao tempo da ruptura, denotando a<br />

intenção do legislador em preservar a situação familiar estabelecida anteriormente<br />

pelo casal. Nos casos de enfermidade mental grave, a prole ficaria sobre os<br />

cuidados do cônjuge que apresenta melhores condições de assumir a guarda e a<br />

educação. Há, no entanto, o artigo 13 que prevê a possibilidade de, em casos<br />

externos, o magistrado determinar regra diversa da prevista na legislação, utilizando<br />

de seu poder de discricionariedade, prevendo o melhor para a criança e o<br />

adolescente. 22<br />

Com o advento da Constituição, promulgada em 1988, houve uma reforma<br />

radical no Direito de Família, modificando mais de cem dispositivos, entre leis<br />

esparsas e artigos previstos no Código de 1916, sendo reconhecida como entidade<br />

familiar, além do casamento, a união estável e a comunidade formada por qualquer<br />

dos pais ou descendentes. A distinção com relação aos filhos foi totalmente<br />

descartada, possuindo todos os mesmos direitos e qualificações, sem nenhuma<br />

distinção. Foi estabelecida uma maior proteção aos interesses do menor, levando-se<br />

em conta as condições e as necessidades que o mesmo possui.<br />

O princípio da igualdade na família consagrou-se, da mesma forma que o<br />

princípio da dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado, instituindo<br />

um novo modelo jurídico de família, considerando o Código Civil de 1916 uma<br />

legislação residual. 23 Não possuindo legislação vigente nestes casos, o critério que<br />

21 COMEL, Denise Damo. Do Poder Familiar. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 37.<br />

22 LDi, art. 13: “Se houver motivos graves, poderá o juiz, em qualquer caso, a bem dos filhos,<br />

regular por maneira diferente da estabelecida nos artigos anteriores a situação deles com os<br />

pais”.<br />

23 COMEL, op. cit., p. 41.<br />

15


passa a ser utilizado é o disposto no artigo 4 da LICC, 24 ao qual utiliza a analogia, os<br />

costumes e os princípios gerais do direito.<br />

O Estatuto da Criança e do Adolescente entrou em vigência no ano de<br />

2000, no qual seu artigo 21 25 prevê acerca do pátrio poder, reafirmando a igualdade<br />

entre o homem e a mulher, prevista na Constituição, coibindo quaisquer<br />

discriminações, privilégios e distinções entre eles, consolidando a idéia de que tanto<br />

o pai quanto a mãe compõem o pátrio poder. Fortifica a idéia de que todo e qualquer<br />

menor tem direito ao pátrio poder. Carlos Alberto Bittar Filho analisou as mudanças<br />

que ocorreram no pátrio poder, concluindo que de tão profunda que haviam sido as<br />

modificações não podia acreditar que tratava acerca do mesmo assunto. 26<br />

Enfim, com a Constituição Federal de 1988 surgiram lacunas na legislação,<br />

no que tange a igualdade entre o homem e a mulher no exercício do poder familiar.<br />

O Estatuto solucionou parte das lacunas existentes, de forma a regular a situação<br />

dos filhos quando os pais já não habitavam mais o mesmo lar, em virtude de<br />

separação judicial, consensual, doença mental grave ou o simples rompimento da<br />

vida em comum, acompanhando as mudanças que surgiram em relação ao pátrio<br />

poder. No entanto, novas mudanças ainda estavam por vir com o advento do Código<br />

Civil de 2002 e com as mudanças nele previstas.<br />

2.1.3 Código Civil de 2002<br />

Após longo período de discussões, e adaptações, em virtude das lacunas<br />

expostas é promulgada a Lei nº 10.406, que instituiu o Código Civil. 27 A modificação<br />

ocorreu em virtude da expressão pátrio dar idéia de que o homem detinha o poder<br />

sobre os filhos, fato este superado. Diretrizes foram analisadas, buscando a<br />

24<br />

LICC, art 4º: “Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os<br />

costumes e os princípios gerais do direito”.<br />

25<br />

Art. 21: “O pátrio poder será exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na<br />

forma que dispuser a legislação civil, assegurando a qualquer deles o direito de, em caso de<br />

discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a solução da divergência”,<br />

26<br />

27<br />

Ibidem, p. 48.<br />

COMEL, Denise Damo. Do Poder Familiar. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 48.<br />

16


preservação, sempre que possível, não somente em reconhecimento aos seus<br />

méritos intrínsecos, como também pelo grande acervo doutrinário e jurisprudencial<br />

que em razão dele se constituiu.<br />

O filho não reconhecido pelo pai, mediante disposto no artigo 1633, ficará<br />

sobre poder exclusivo da mãe, em caso de não reconhecimento, ou incapacidade da<br />

mesma em exercer o poder, nomear-se-á tutor ao menor. O exercício do poder<br />

familiar tem previsão no artigo 1634, que estabelece sete hipóteses de competência.<br />

No que tange ao instituto do poder familiar, não houve muitas modificações,<br />

com relação ao Código de 1916, tendo alguns juristas inclusive atribuídos severas<br />

críticas a esta timidez. Eduardo de Oliveira Leite argumenta: “Lamentavelmente, a<br />

grande oportunidade oferecida pela feitura de um novo código, não foi devidamente<br />

explorada pelo legislador atual”. e continua: “ A leitura da parte referente à filiação,<br />

inexplicavelmente, mantém incólume a estrutura patriarcal, própria do início do<br />

século, na qual todos os membros da família, e em especial os filhos, gravitam em<br />

torno da figura paterna”. 28<br />

Enfim, o Código de 2002 modificou o texto da lei, no entanto, mantendo-se<br />

mais fiel ao Código de 1916 do que o esperado. É necessário cautela, pois os<br />

princípios e valores que regem o poder familiar e o pátrio poder são diversos, tendo<br />

o poder familiar passado por uma reformulação nos valores sociais, havendo uma<br />

evolução de conceitos de um poder para outro.<br />

2.2 O <strong>PODER</strong> <strong>FAMILIAR</strong> NA ATUALIDADE E SEU EXERCÍCIO<br />

De objeto de direito, o filho tornou-se sujeito de direito. Essa inversão<br />

ensejou a modificação do conteúdo do poder familiar, em face do interesse social<br />

que o envolve. Não se trata do exercício de uma autoridade, mas de encargo<br />

imposto por lei aos pais; o poder que é exercido pelos genitores, mas que serve ao<br />

28 LEITE, Eduardo de Oliveira. Direito Civil Aplicado. Revista dos Tribunais. São Paulo: Revista<br />

dos Tribunais, 2005. 5 v. p. 278-9.<br />

17


interesse do filho. Este encargo ou munus, diz respeito à intervenção na vida e nos<br />

bens dos filhos, o dever dos pais para com sua prole, até que estes alcancem a<br />

maioridade civil, ou sejam emancipados. 29<br />

Além do munus há um acompanhamento, uma proteção que os pais<br />

fornecem aos seus filhos para um adequado desenvolvimento da prole. 30 Na<br />

concepção de Sílvio Rodrigues poder familiar: “É o conjunto de direitos e deveres<br />

atribuídos aos pais, em relação à pessoa e aos bens dos filhos não emancipados,<br />

tendo em vista a proteção destes”. 31 Arnaldo Rizzardo aborda o significado de poder<br />

familiar como sendo:<br />

Se trata de uma conduta dos pais relativamente aos filhos, de um<br />

acompanhamento para conseguir a abertura dos mesmos, que se<br />

processará progressivamente, à medida que evoluem na idade e no<br />

desenvolvimento físico e mental, de modo a dirigi-los a alcançarem sua<br />

própria capacidade para se dirigirem e administrarem seus bens. 32<br />

A expressão poder familiar sofreu críticas, Silvio Rodrigues explicita que a<br />

nomenclatura não é a mais adequada, devido ao fato de dar ênfase a expressão<br />

poder, vez que não se coaduna com sua extensão e compreensão. 33 Para outros,<br />

como José Antônio de Paula Santos Neto, todavia, poder exprimirá a subordinação<br />

dos filhos em relação aos pais, que mesmo no Direito atual, não deixou de existir,<br />

sendo pressuposto para que os genitores possam exercer na plenitude a sua função<br />

educativa e protetiva. 34 Carlos Roberto Gonçalves argumenta que a nomenclatura<br />

adequada seria a adotada por alguns países conhecida como instituto de autoridade<br />

parental. 35<br />

O poder familiar apresenta características como a indisponibilidade, vez que<br />

o pai não pode indispor do filho quando quiser; a indivisibilidade no caso de pais<br />

29<br />

RIZZAR<strong>DO</strong>, Arnaldo. Direito de Família. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008. p. 609.<br />

30<br />

31<br />

RIZZAR<strong>DO</strong>, loc. cit.<br />

RIZZAR<strong>DO</strong>, loc. cit.<br />

32<br />

33<br />

RIZZAR<strong>DO</strong>, loc. cit.<br />

FONSECA, Antonio Cezar Lima da. O Código Civil e o Novo Direito de Família. Porto Alegre:<br />

Livraria do Advogado, 2004. p. 124.<br />

34<br />

35<br />

FONSECA, loc. cit.<br />

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de Família. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 108.<br />

18


separados divide-se as incumbências, não seu exercício; a imprescritibilidade, pois<br />

dele não decai o direito dos genitores pelo fato de deixarem de exercitá-lo, somente<br />

podem perdê-lo os pais na forma da lei; a irrenunciabilidade, por não reconhecer aos<br />

pais o direito de renunciar do poder familiar em proveito próprio, ou mediante<br />

conveniências.<br />

Importante diferenciar titularidade e exercício. A titularidade é a prerrogativa<br />

em si, conjunto e deveres à eles inerentes. O exercício é a realização da titularidade,<br />

que ocorre em aspecto ativo e prático, que traduz na participação e nas decisões da<br />

vida do filho. Exercer o poder familiar é participar de forma ativa na vida dos filhos<br />

menores, desenvolvendo as funções concebidas por lei ao titular desse direito.<br />

Em virtude de o menor não ter capacidade de gerir seus bens são<br />

representados, até os 16 anos, ou assistidos, com idade entre 16 e 18 por seus<br />

genitores, mediante exposto no artigo o 1689 do Código 36 , que revela dever do pai e<br />

da mãe em administrar e o usufruir dos bens pertencente aos filhos menores.<br />

Os pais podem dispor do usufruto legal dos bens dos filhos, não podendo se<br />

apropriar de todos os rendimentos da prole, apenas o necessário para às despesas<br />

comuns da família. Não há previsão legal prevendo a prestação de contas ao filho<br />

da administração dos seus bens. No caso da administração legal dos bens, não há a<br />

necessidade de caução ou qualquer outra modalidade de garantia. Cabe, no<br />

entanto, ao progenitor, responder por culpa grave a algum dano causado a este. 37<br />

O imóvel do menor não será vendido por preço inferior ao da avaliação, a<br />

exceção de casos de venda de bens do menor colocado sob tutela. O valor imposto<br />

para a realização da venda será o valor estipulado mediante autorização judicial.<br />

Tratando-se da necessidade de realização de qualquer destes exercícios, é<br />

necessária prévia autorização judicial, desde que comprovada necessidade ou<br />

conveniência de alienação ou oneração do bem com relação ao menor. 38<br />

36 Art. 1.689. O pai e a mãe, enquanto no exercício do poder familiar: I - são usufrutuários dos bens<br />

dos filhos; II - têm a administração dos bens dos filhos menores sob sua autoridade.<br />

37 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil. Atualizado por Regina Beatriz<br />

Tavares da Silva. 37. ed. São Paulo: Saraiva, 2004. v. 2. p. 354.<br />

38 VE<strong>NO</strong>SA, Silvio de Salvo. Direito Civil. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2006. v. 6. p. 329.<br />

19


As hipóteses de exclusão estão previstas no artigo 1693, do Código são:<br />

bens deixados ou doados ao filho sob a condição de não serem administrados pelos<br />

pais, e os bens que aos filhos couberem na herança, quando os pais forem<br />

excluídos da sucessão. Os valores recebidos e os bens adquiridos pelo filho são<br />

bens reservados, ou seja, o que perceber no desempenho de atividade laboral não<br />

se sujeita à administração do genitor. 39 Da mesma forma não podem administrar os<br />

bens que couberem aos filhos por herança se no testamento o testamentário vetá-<br />

los, ou seja, excluí-los da sucessão. 40<br />

Em suma, o ordenamento jurídico prevê os deveres dos pais para com sua<br />

prole, devendo administrar e zelar pelos seus interesses. Aos genitores é<br />

proporcionada uma flexibilidade no cumprimento destas obrigações, existindo<br />

vedações, principalmente na esfera patrimonial, da qual encontram impedidos de<br />

vender, hipotecar ou gravar de ônus real os imóveis do filho, nem contrair, em nome<br />

deles, obrigações que ultrapassam limites concernidos pela lei. Dentre as<br />

obrigações impostas, o que não consta mas deve ser levado em consideração é o<br />

afeto e o carinho, fundamentais ao bom convívio da relação paterno-filial.<br />

3. <strong>INTERVENÇÃO</strong> ESTATAL <strong>NO</strong> <strong>PODER</strong> <strong>FAMILIAR</strong><br />

3.1 <strong>INTERVENÇÃO</strong> <strong>DO</strong> ESTA<strong>DO</strong> NA FAMÍLIA<br />

O Estado é legítimo para adentrar o recesso familiar, com a perspectiva de<br />

defender os menores que o habitam. Assim, fiscaliza o adimplemento de tal encargo,<br />

podendo suspender ou até excluir o poder familiar. 41 É perceptível a intervenção do<br />

Estado nas relações paterno-filiais, de início, ao fato de a família ter modificado sua<br />

39<br />

DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 5. ed. Porto Alegre: Revista dos<br />

Tribunais, 2009. p. 392.<br />

40<br />

VE<strong>NO</strong>SA, Silvio de Salvo. Direito Civil. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2006. v. 6. p. 331.<br />

41<br />

DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 5. ed. Porto Alegre: Revista dos<br />

Tribunais, 2009. p. 392.<br />

20


função de ser unidade de direção, passando a tornar-se pluralidade de existências,<br />

com que admite uma ingerência na intimidade doméstica, necessária ao processo<br />

de politização da família, especialmente em relação ao governo da mesma. 42<br />

Não deve haver confusão entre o dever da família para com seu filho e o<br />

dever do estado no controle dessa relação. O Código, em seu artigo 1513, retrata<br />

que é defeso de qualquer pessoa de direito público ou privado interferir na<br />

comunhão da vida instituída pela família, cabendo aos pais o controle sobre a família<br />

e os filhos devendo agir de forma digna e moral, ao Estado incumbe-se formular e<br />

executar a política de atendimento aos direitos da criança e do adolescente, em<br />

parceria com a sociedade, controlando a esfera negativa da atuação dos pais, tendo<br />

responsabilidade para agir quando os genitores não cumprem o disposto em lei.<br />

A suspensão, extinção e a destituição do poder familiar constituem sanções<br />

aplicadas aos genitores pela infração dos deveres inerentes ao poder familiar, ainda<br />

que não sirvam como pena ao pai faltoso. O intuito não é punitivo, visando preservar<br />

o interesse da prole, afastando-a de influências nocivas. Em face das seqüelas que<br />

a perda do poder familiar gera, deve somente ser decretada a perda, extinção ou<br />

destituição do poder familiar quando sua mantença coloca em perigo a segurança ou<br />

a dignidade do filho. 43<br />

Em suma, no poder familiar deve-se ter por base duas premissas<br />

fundamentais: a primeira é o aspecto afetivo da relação paterno-filial, e a segunda é<br />

a vigilância do Estado sobre tais relações, adquirindo a liberdade de impor sanções<br />

quando cabíveis. Estas, embora pareçam antagônicas, são complementares a boa e<br />

plena realização das funções do poder familiar. 44<br />

42<br />

COMEL, Denise Damo. Do Poder Familiar. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 90.<br />

43<br />

DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 5. ed. Porto Alegre: Revista dos<br />

Tribunais, 2009. p. 392.<br />

44<br />

COMEL, Denise Damo. Do Poder Familiar. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 92.<br />

21


3.3 DA PERDA, SUSPENSÃO E EXTINÇÃO <strong>DO</strong> <strong>PODER</strong> <strong>FAMILIAR</strong><br />

3.3.1 Suspensão e Modificação do Poder Familiar<br />

A suspensão e a modificação do poder familiar dizem respeito a restrições<br />

no exercício da função paterna que podem referir-se à sua totalidade, esvaziando,<br />

relativamente, qualquer dos pais, ou a ambos, todo o conteúdo de poderes e<br />

deveres que tenham com relação ao filho, como também parte dele, atingindo certas<br />

e determinadas faculdades, sempre em consideração às circunstâncias particulares<br />

da relação com o filho e aos motivos que levaram a assim proceder. De acordo com<br />

a concepção de Denise Damo Comel suspensão é:<br />

Consiste numa restrição imposta judicialmente àquele que exerce o poder<br />

familiar e que vier ou abusar de sua função e prejuízo do filho, ou a estar<br />

impedido temporariamente de exercê-la, pela qual se retira parcela de sua<br />

autoridade. 45<br />

A suspensão é decretada sempre que os pais descumprem<br />

injustificadamente, os deveres e obrigações, que a lei os incumbe. Das formas de<br />

perda do poder familiar é considerada menos grave, sendo a única que admite o<br />

fenômeno da reversão, sendo cancelada sempre que a convivência familiar atender<br />

ao interesse dos filhos. 46 A suspensão ocorrerá, também, em casos de interdição ou<br />

ausência de um dos genitores. O código Civil, em seu artigo 1637 47 expõe os casos<br />

de suspensão. Esta deverá ser considerada no interesse da convivência familiar,<br />

devendo ser adotada pelo juiz somente quando outra medida não possa produzir o<br />

efeito desejado, no interesse da segurança do menor e de seus haveres, persistindo,<br />

45<br />

COMEL, Denise Damo. Do Poder Familiar. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 262.<br />

46<br />

DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 5. ed. Porto Alegre: Revista dos<br />

Tribunais, 2009. p. 393.<br />

47<br />

Art. 1637. Se o pai, ou a mãe, abusar de sua autoridade, faltando aos deveres a eles inerentes<br />

ou arruinando os bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo algum parente, ou o Ministério<br />

Público, adotar a medida que lhe pareça reclamada pela segurança do menor e seus haveres,<br />

até suspendendo o poder familiar, quando convenha. Parágrafo único. Suspende-se igualmente<br />

o exercício do poder familiar ao pai ou à mãe condenados por sentença irrecorrível, em virtude<br />

de crime cuja pena exceda a dois anos de prisão.<br />

22


porém, o interesse da sociedade em tentar reconduzir o pai faltoso ao cumprimento<br />

dos deveres.<br />

Na suspensão do poder familiar estão agregadas quatro hipóteses cabíveis:<br />

o descumprimento do dever inerentes aos pais, a ruína dos bens dos filhos, o risco à<br />

segurança do filho e a condenação cujo crime a pena exceda 2 anos. Nestes casos<br />

há notório abuso do poder familiar, enquanto no último, em que a pessoa que<br />

exercita o poder familiar é detida não há possibilidade do genitor cuidar e zelar pelo<br />

filho.<br />

A suspensão é medida facultativa, o magistrado pode deixar de aplicá-la, de<br />

modo a ser decretada com referência a um único filho ou a todos, abrangendo<br />

apenas algumas prerrogativas do poder familiar, como exemplo a má gestão dos<br />

bens do menor afasta o genitor da administração deste, permanecendo com os<br />

demais encargos que lhe são impostos. Pode ser condicionada, de modo que o juiz<br />

obtém um compromisso dos pais a respeito do seu comportamento com relação ao<br />

filho. 48<br />

O artigo 24 do Estatuto Criança e do Adolescente, prevê que a suspensão é<br />

decretada mediante decisão judicial, em procedimento contraditório, assegurando as<br />

partes a ampla defesa. A autoridade judiciária competente será o juiz da Vara da<br />

Infância e da Juventude, ou o Juiz de Família, analisando a situação de risco. Os<br />

legítimos para ingressar com o procedimento são o Ministério Público, ajuizar de<br />

ofício ou provocado por algum interessado ou pelo Conselho Tutelar, e qualquer<br />

parente ou quem tenha legítimo interesse. A medida será decretada mediante<br />

sentença judicial, com as devidas formalidades a ela inerentes.<br />

A medida que suspende o poder familiar ocorre de forma total ou parcial;<br />

Quando há a presença de pai ou mãe na administração do poder familiar a<br />

suspensão é tida como parcial, possibilitando ao outro genitor, que não teve seu<br />

poder familiar suspenso, permanecer exercendo o mesmo. Quando há apenas um<br />

dos genitores, e este perde o poder familiar será nomeado tutor. Nos denominados<br />

48 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 5. ed. Porto Alegre: Revista dos<br />

Tribunais, 2009. p. 393.<br />

23


casos de suspensão total, o pai e a mãe são privados do exercício do poder familiar,<br />

devendo ser nomeado tutor.<br />

É apresentada, na legislação, a possibilidade de revisão da suspensão na<br />

medida em que os requisitos que levaram a concedê-la tornam-se extintos. Este<br />

retorno do poder familiar pode ser total, exercendo completo poder ou parcial com<br />

restrições determinadas pelo juiz. Não há previsão legal acerca do tempo que a<br />

suspensão deve perdurar, cabendo magistrado, que na qualidade de condutor do<br />

procedimento, ao analisar os fatos em concreto, resguardando o interesse do menor,<br />

estabelecerá prazo razoável. 49<br />

No que tange ao conteúdo da norma, a mesma não se refere a qualquer<br />

abuso, mas ao abuso qualificado, que enseja a intervenção judicial. O abuso<br />

qualificado é o que implica a falta destes deveres inerentes às funções paternas ou<br />

em ruína aos bens dos filhos o que não deixa de ser também falta aos deveres<br />

paternos, à medida que é função dos pais administrar o bem dos filhos.<br />

Em havendo interdição ou ausência de um, ou de ambos os pais, haverá a<br />

suspensão do poder familiar. Esta hipótese não está prevista de forma expressa no<br />

ordenamento jurídico, mas são citadas com freqüência pela doutrina considerada<br />

especializada. Na interdição, a suspensão ocorre quando o interditado não tem<br />

capacidade para reger sua pessoa e seus bens, conseqüentemente não poderá<br />

controlar a prole. A ausência, parte do pressuposto da impossibilidade de um pai ter<br />

o pleno exercício do poder familiar quando não estiver fisicamente disponível para a<br />

realização das obrigações que lhe são impostas mediante legislação vigente.<br />

Na ausência ocorre devido ao fato de que o desaparecimento do genitor<br />

impede o absoluto exercício do poder familiar, na medida que para exercê-lo<br />

imprescindível é a presença física de um adulto. Em se tratado de doença mórbida,<br />

com perda da consciência, ainda que não judicialmente interditado, ocorre a<br />

suspensão do poder familiar. A mesma é interposta em virtude do caráter indefinido.<br />

49 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 5. ed. Porto Alegre: Revista dos<br />

Tribunais, 2009. p. 393.<br />

24


Em suma, a suspensão ou modificação do poder familiar devem ser<br />

consideradas no interesse da convivência familiar, adotada pelo juiz apenas quando<br />

outra medida não produza efeito desejado, no interesse da segurança do menor e<br />

de seus haveres, mas persistindo, de qualquer forma, o interesse da segurança do<br />

menor e o interesse da sociedade em tentar reconduzir o pai faltoso ao cumprimento<br />

dos deveres.<br />

3.3.1.1 Condenação por Sentença Irrecorrível<br />

A lei exige que, no artigo 1637, submete a suspensão do poder familiar<br />

aquele que possui sentença criminal definitiva, com pena privativa de liberdade<br />

superior a 2 (dois) anos. No judiciário, pai ou mãe que são condenados e não<br />

possuem aptidão para exercerem o poder familiar, pois não terão contato diário com<br />

os filhos, impossibilitando os cuidados que os mesmos necessitam. 50<br />

A doutrina anterior ao Código Civil interpretava, via de regra, que a<br />

suspensão, do então denominado pátrio poder em virtude de sentença penal<br />

condenatória era entendida como uma conseqüência necessária da sentença<br />

criminal, que ocorria de pleno direito, ainda que a sentença nada mencionasse a<br />

respeito. Reputava-se cabível diante de toda e qualquer condenação criminal,<br />

independentemente da natureza do delito ou da conduta incriminada. Concluía-se<br />

não haver que se perquirir da culpa do pai condenado, conferindo a norma o caráter<br />

objetivo, quer dizer, apenas a existência do fato condenação criminal em face de um<br />

dos pais para preencher o requisito da suspensão do pátrio poder. 51<br />

Hoje a norma exige nova interpretação e é analisado caso a caso, em<br />

virtude de não haver relação com o poder familiar o fato de um pai ser condenado,<br />

por exemplo, por crime de administração pública, não o impede de ter capacidade<br />

de exercer o poder familiar, zelando e cuidando da prole. A destituição do poder<br />

familiar não é objeto da ação penal, de modo que sobre tal fato não serão<br />

50 COMEL, Denise Damo. Do Poder Familiar. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 273.<br />

51 COMEL, loc. cit.<br />

25


observados os princípios do contraditório e da ampla defesa, sendo caso de afronta<br />

à norma constitucional caso a destituição fosse levada em conta.<br />

Em suma, analisa o caso em concreto, visando o interesse em benefício do<br />

menor. Em diversos casos expostos no artigo 1637 a pena pode ser cumprida em<br />

regime aberto, igual ou inferior a quatro anos, além de outros benefícios legais como<br />

a substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direito ou a<br />

suspensão condicional da pena, o que possibilita o pai ou a mãe a dar continuidade<br />

ao poder familiar, zelando pela prole.<br />

3.3.2 Perda do Poder Familiar<br />

Conhecida como a sanção mais grave, imposta aos pais que faltam com<br />

deveres em relação aos filhos, desviando-se ostensivamente da finalidade imposta a<br />

instituição, ocasionando a destituição de toda e qualquer prerrogativa com relação<br />

ao filho. Adquire caráter personalíssimo, surtindo efeito apenas aquele contra o qual<br />

a medida for decretada.<br />

Do mesmo modo que a suspensão, a perda do poder familiar poderá ocorrer<br />

em qualquer situação de descumprimento injustificado dos deveres. 52 Sua previsão<br />

legal encontra-se no artigo 1638 53 do Código Civil, na qual as hipóteses previstas<br />

são consideradas exaustivas, não permitindo interpretação extensiva.<br />

O castigo imoderado é previsto como causa, gerando polêmica,<br />

principalmente no que tange a concepção da palavra imoderado. O pai que age de<br />

modo a castigar o filho imoderadamente demonstra não possuir condições pessoais<br />

de exercer a função a ele imposta, configurando a caracterização de crime de maus<br />

tratos nos termos do artigo 136 do Código Penal.<br />

52 COMEL, Denise Damo. Do Poder Familiar. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 286.<br />

53 Art. 1.638. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que:I - castigar<br />

imoderadamente o filho;II - deixar o filho em abandono;III - praticar atos contrários à moral e aos<br />

bons costumes;IV - incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente.<br />

26


No caso do abandono dos filhos, fatos devem ser levados em consideração:<br />

se este pai ou mãe abandonou os filhos por não ter condições financeiras é de se<br />

analisar que este poder deva ser suspenso, e não extinto. Nestes casos, mesmo que<br />

não tenha mais os pais contato com seu filho, é necessário processo de destituição<br />

do poder familiar. O abandono da criança e do jovem, de quem se tenha<br />

responsabilidade, ocasiona infração da lei, e caracteriza o cometimento de um delito,<br />

previsto no sistema penal brasileiro, como casos de abandono material (com<br />

previsão no art. 244, CP), abandono intelectual (previsto no art. 245, CP) e de<br />

abandono moral (art. 247, CP).<br />

A prática de atos contrários à moral e aos bons costumes é aferida<br />

objetivamente, incluindo as condutas que o direito considera ilícitas, e considerada<br />

situação de perda do poder familiar. O genitor, sendo este educador do filho, deve<br />

servir de exemplo, agindo de forma honesta e retida, condição fundamental para a<br />

boa educação da prole.<br />

Aquele que pratica atos ilegais, afrontando os bons costumes e a moral não<br />

está apto para criar um filho, fornecendo-lhe tudo que deste é de direito, sendo<br />

considerado relevante motivo para a perda do poder familiar. O pai que comete<br />

reiteradas faltas que ensejam suspensão e modificação do poder familiar também<br />

está sujeito a perda deste. Porém, não se pode subtrair a possibilidade do<br />

magistrado, ao analisar o caso em questão, decidir pela exoneração por fatos que<br />

considere incompatíveis com o poder familiar, não se podendo falar em abuso de<br />

autoridade. 54<br />

No caso de condenação por crime doloso cometido contra o filho possui<br />

previsão no artigo 92, do Código Penal, necessário nestes casos que haja previsão<br />

de aplicação da pena de reclusão, sendo a medida decretada pelo magistrado<br />

criminal que motivará a sua decisium. Na perda do poder familiar não há<br />

restabelecimento de laços, mesmo que o genitor obtenha a reabilitação criminal, em<br />

virtude desta impossibilidade em reaver o exercício do poder familiar e a titularidade<br />

do mesmo deve ser analisado de forma minuciosa o enquadramento, solicitando o<br />

54 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 5. ed. Porto Alegre: Revista dos<br />

Tribunais, 2009. p. 395.<br />

27


exame de requisitos objetivos e subjetivos do fato criminoso e da pessoa do<br />

condenado.<br />

Enfim, a perda do poder familiar é considerada a sanção mais grave, na<br />

medida em que não admite reaver a titularidade e o exercício deste poder por pai<br />

que o perdeu mediante ação de destituição do poder familiar. Em decorrência da<br />

gravidade deste instituto analisa-se detalhadamente os aspectos ocorridos na<br />

ocasião e a medida mais adequada que deverá ser imposta.<br />

3.3.2.1 Destituição do Poder Familiar<br />

Podem ser sujeitos destituídos do poder familiar ambos, ou um dos<br />

cônjuges, dependendo da situação enquadrada, analisando o melhor para o menor.<br />

Natural seria viver com os pais e irmãos biológicos, porém há casos em que esta<br />

convivência torna-se impossível e a alternativa é destituir os mesmos do poder<br />

familiar, impedindo o menor de conviver com os genitores.<br />

Uma vez interposta a ação de perda e de suspensão do poder familiar, o pai<br />

ou a mãe envolvidos, ou ambos, dependendo do caso em concreto, têm o amplo<br />

direito à defesa, sendo nomeado um defensor dativo para defendê-los, caso não<br />

possam fazer às suas expensas. A sentença que decretar a perda ou a suspensão<br />

do poder familiar é averbada no registro de nascimento do menor, conforme artigo<br />

164, 55 do Estatuto da Criança e do Adolescente.<br />

Decretada a suspensão do poder familiar, os genitores perdem todos os<br />

direitos em relação ao filho, em casos graves, poderá haver decisão em caráter<br />

liminar por parte do Juiz para decretar a suspensão do poder familiar, deferindo-se a<br />

guarda provisória a terceiro, até a sentença, conforme previsão do artigo 157, 56 do<br />

55 Art. 164. Na destituição da tutela, observar-se-á o procedimento para a remoção de tutor<br />

previsto na lei processual civil e, no que couber, o disposto na seção anterior.<br />

56 Art. 157. Havendo motivo grave, poderá a autoridade judiciária, ouvido o Ministério Público,<br />

decretar a suspensão do poder familiar, liminar ou incidentalmente, até o julgamento definitivo da<br />

causa, ficando a criança ou adolescente confiado a pessoa.<br />

28


Estatuto da Criança e do Adolescente. A decisão que decreta a perda do poder<br />

familiar é irrevogável.<br />

Tem legitimidade ativa Ministério Público ou quem tenha legítimo interesse<br />

jurídico, moral ou econômico (artigo 155 Estatuto da Criança e do Adolescente),<br />

como, por exemplo, guardião pretendente de tutela ou adoção, tem legítimo<br />

interesse para propor ação de destituição do poder familiar. O rito é o contraditório<br />

previsto no artigo 24 do Estatuto da Criança e do Adolescente.<br />

Os recursos no procedimento de destituição de poder familiar, em face da<br />

relevância das questões, são processados com prioridade absoluta, sendo<br />

imediatamente distribuídos, ficando vedado que aguardem, em qualquer situação,<br />

oportuna distribuição e serão colocados em mesa para julgamento sem revisão e<br />

com parecer urgente do Ministério Público (artigo 199-C, Estatuto da Criança e do<br />

Adolescente).<br />

A sentença tem natureza constitutiva negativa, extinguindo a relação jurídica<br />

entre o pai e o filho com caráter definitivo, de modo a ser registrada à margem do<br />

registro de nascimento do menor. Tem sido admitida, na jurisprudência, a cumulação<br />

da ação de destituição e de adoção. Durante a tramitação da demanda de<br />

destituição, as crianças permanecem em abrigos, ou são colocadas em famílias<br />

substitutas.<br />

Enfim, a perda do poder familiar acarreta a perda da titularidade deste poder,<br />

que passa a ser de um terceiro, ou do pai que não sofreu nenhum tipo de medida.<br />

Deve ser solucionada mediante ação judicial que tramita no juizado da infância e da<br />

juventude, ou da vara de família, dependendo da situação encontrada. A sentença<br />

que acarreta a destituição adquire natureza constitutiva negativa, constando na<br />

certidão a destituição deste. Por este motivo devem ser analisadas caso a caso as<br />

situações previstas de forma expressa no artigo 1638 do Código Civil.<br />

29


3.4 EXTINÇÃO <strong>DO</strong> <strong>PODER</strong> <strong>FAMILIAR</strong><br />

A extinção do poder familiar é considerada a medida mais simples,<br />

verificável por razões decorrentes da própria natureza, independentemente da<br />

vontade dos pais, ou não concorrendo eles para os eventos que a determinam. È<br />

considerada um fim em si mesmo, a interrupção definitiva do poder familiar.<br />

Desta forma as hipóteses de enquadramento da extinção do poder familiar<br />

estão previstas de forma taxativa no ordenamento jurídico, sendo dificilmente<br />

encontradas em situações que não previstas em Lei. 57 Possui previsão no artigo<br />

1635, 58 do Código Civil, que prevê 5 (cinco) hipóteses de extinção do poder familiar;<br />

pela morte dos pais, pela adoção, pela emancipação, pela maioridade, bem como<br />

por decisão judicial.<br />

Há duas formas de causas de extinção do poder familiar, absolutas e<br />

relativas, as primeiras implicam causas de extinção propriamente dita, enquanto as<br />

relativas são causas de perda e suspensão do poder familiar. A extinção do poder<br />

familiar é considerada forma isenta de qualquer punição, na medida em que não é<br />

motivada por falta aos deveres paternos ou descumprimento. 59<br />

Conceituou-a Carlos Alberto Bittar Filho, como “ cessação definitiva do<br />

poder, ditada por fenômenos naturais ou jurídicos, elencados pela lei”. Sendo uma<br />

função atribuída aos pais para a proteção e no interesse do menor, é de se esperar<br />

que em determinado momento se acabe, rompendo-se terminantemente o vínculo<br />

jurídico entre o pai e o filho. 60 Uma vez operada a extinção, não haverá mais<br />

autoridade alguma dos pais sobre o filho, não existindo, qualquer poder residual aos<br />

pais em relação à função paterna.<br />

57 RIZZAR<strong>DO</strong>, Arnaldo. Direito de Família. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008. p. 616.<br />

58 Art. 1635. Extingue-se o poder familiar:I – pela morte dos pais ou do filho;II – pela emancipação,<br />

nos termos do art. 5º, parágrafo único;III – pela maioridade;IV - pela adoção;V – por decisão<br />

judicial, na forma do artigo. 1638.<br />

59 COMEL, Denise Damo. Do Poder Familiar. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 298.<br />

60 COMEL, loc. cit.<br />

30


A morte dos pais é motivo de extinção do poder familiar, pois através da<br />

morte destes tem-se um fim da existência da pessoa, o desaparecimento do sujeito<br />

ativo, impossibilitando o mantimento do vínculo entre pai e filho. Porém, na medida<br />

que um dos pais ainda existir persistirá o poder familiar íntegro na sua pessoa. A<br />

morte do filho, da mesma forma, é motivo da extinção do poder familiar, em virtude<br />

do fim da existência da pessoa do filho<br />

A emancipação do filho menor ocorre mediante instrumento público. Uma<br />

vez concedida a emancipação, por ato de vontade dos pais, ou de um deles na falta<br />

de outro, torna-se maior o filho, tornando-se responsável pelos atos da vida civil. A<br />

maioridade civil ocorre aos 18 anos, e através dela adquire-se o direito aos atos<br />

civis. Com a maioridade civil extingue-se o poder familiar, ficando o pai desobrigado<br />

do encargo, ainda que o fato não deva fazer desaparecer, nem mesmo diminuir a<br />

intensidade do interesse do pai pelo filho, por seu futuro, por sua felicidade nem faça<br />

desaparecer o respeito e o apreço que este filho tenha pelos pais.<br />

A decisão judicial que decreta a perda do poder familiar está prevista no<br />

Código Civil, em seu artigo 1635, como forma de extinção do mesmo. Porém esta<br />

colocação não foi muito bem aceita pelos doutrinadores, Denise Damo Comel ao<br />

tratar deste instituto revela: “Embora se perceba que a intenção do legislador foi<br />

tentar harmonizar a disciplina da perda do poder familiar com a da extinção, a<br />

solução não parece ter sido a melhor.” 61<br />

A medida que ocasiona confusão institui-se no entendimento da extinção se<br />

dar tão somente pela decisão judicial ipso jure, ou se, além disso, é necessário outro<br />

pronunciamento judicial que a reconheça. Ao analisar o texto da lei do de forma<br />

genérica a extinção automaticamente se dá com a decisão que proporciona a perda<br />

deste poder. Não fosse assim estar-se-ia a exigir dos pronunciamentos judiciais<br />

diversos, um que versasse sob a perda e outro sobre a extinção o que se mostra<br />

incabível na situação em tela.<br />

61 COMEL, Denise Damo. Do Poder Familiar. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 308.<br />

31


Em suma, a extinção deve ser a última opção apresentada, podendo ser<br />

concedida apenas nos casos em que realmente será melhor para filho se afastar<br />

deste poder, não vendo possibilidade de melhora no quadro apresentado pelo antigo<br />

representante do poder familiar. No que tange à competência, é Justiça da Infância e<br />

da Juventude quem lida com as ações de destituição do poder familiar, previsão na<br />

Lei 8069/90, o Estatuto da Criança e do Adolescente artigo 93. 62<br />

4 CONCLUSÃO<br />

Como visto no decorrer da pesquisa, o presente trabalho versou sobre as<br />

formas de intervenção do estado no poder familiar. Procurou-se analisar de forma<br />

sintética as formas mais importantes de intervenção do Estado no poder familiar.<br />

Para uma maior compreensão, abordou-se no primeiro capítulo o tema da família, de<br />

modo a especificar o instituto, que sofreu significativas transformações em virtude da<br />

revolução industrial e da mudança de pensamento da sociedade existente na época.<br />

Foi analisada a nova concepção de família na sociedade atual, e suas<br />

principais características, na qual a mulher passou a ter igualdade perante o homem,<br />

podendo administrar o lar de forma independente, bem como adquirido espaço no<br />

mercado de trabalho. No transcorrer dos tempos a família foi se expandindo,<br />

passando a existir inúmeras formas delas, como as famílias monoparetais e<br />

homossexuais.<br />

O Segundo capítulo tratou do tema do poder familiar, para que após uma<br />

maior compreensão do significado de família e das mudanças que esta sofreu, fosse<br />

possível uma maior compreensão acerca do instituto do poder familiar e o que ele<br />

realmente significa em nossa sociedade. Preocupou este capítulo em demonstrar<br />

com clareza as mudanças que ocorreram, desde a época em que o pai, também<br />

62 Art. 93. As entidades que mantenham programa de acolhimento institucional poderão, em<br />

caráter excepcional e de urgência, acolher crianças e adolescentes sem prévia determinação da<br />

autoridade competente, fazendo comunicação do fato em até 24 (vinte e quatro) horas ao Juiz da<br />

Infância e da Juventude, sob pena de responsabilidade. (Redação dada pela Lei nº 12.010, de<br />

2009) Vigência.<br />

32


conhecido como pater administrava de forma totalitária o lar, sendo ele responsável<br />

pelo sustento e pela religião da família até os dias de hoje em que o pátrio poder<br />

ficou denominado como poder familiar, nomenclatura adotada no Código<br />

promulgado em 2002.<br />

Após a análise histórica, foi abordada também a nova interpretação do poder<br />

familiar e o significado que ele tem nos dias atuais para todas as famílias, sendo ele<br />

administrado em igual intensidade pelo pai e pela mãe. Foram exibidas modificações<br />

que ocorreram desde o Estatuto da Mulher casada, em que a mulher passou a ter<br />

uma maior importância e a ser vista de forma mais positiva como representante dos<br />

cuidados com a prole até o advento do Código Civil de 2002 que introduziu a<br />

nomenclatura poder familiar modificando um pouco a idéia de que apenas o homem<br />

detinha poder sobre os filhos menores.<br />

O terceiro e último capítulo discorre acerca das formas de intervenção do<br />

estado no poder familiar, tendo como as principais formas existentes a suspensão, a<br />

extinção e a perda do poder familiar. Estas ocorrem quando o poder familiar está<br />

ameaçado ou abalado em virtude de alguma atitude errônea causada por quem<br />

exerce o poder familiar, e como já abordado na presente pesquisa, o poder familiar<br />

pensa, em primeiro plano, no bem estar do menor. Para fortificar e obter uma maior<br />

compreensão das formas de intervenção do estado no poder familiar, e de como as<br />

mesmas são implantadas nos dias de hoje, procurou-se jurisprudências de modo a<br />

visualizar a matéria em casos práticos.<br />

Enfim, através do estudo desenvolvido, pode-se entender que em diversos<br />

casos em que envolvem o poder familiar, e que este se encontra abalado,<br />

decorrente de uma má administração dos pais em exercer o papel que a eles é<br />

imposto no ordenamento jurídico, o estado deve intervir. Esta intervenção ocorre<br />

como forma de controlar o papel dos pais, bem como solucionar os problemas<br />

ocasionados pela falta de poder familiar.<br />

33


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