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novo modelo geológico orienta a escolha de terrenos e o tratamento ...

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GEOTECNIA AMBIENTAL<br />

NOVO MODELO GEOLÓGICO<br />

ORIENTA A ESCOLHA DE TERRENOS<br />

E O TRATAMENTO DE FUNDAçõES<br />

pARA EMpREENDIMENTOS NA<br />

REGIÃO DE CAJAMAR<br />

<strong>novo</strong> <strong>mo<strong>de</strong>lo</strong> <strong>geológico</strong> para a explicação dos fenômenos cársticos (vazios subterrâneos)<br />

na região <strong>de</strong> cajamar, em São Paulo, abre a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> mapeamentos geotécnicos<br />

preventivos e <strong>de</strong> sucesso no <strong>tratamento</strong> por injeção <strong>de</strong> caldas <strong>de</strong> cimento.<br />

o famoso “Buraco <strong>de</strong> Cajamar”, colapso ocorrido em agosto <strong>de</strong> 1986<br />

Geólogo Álvaro rodrigues dos santos<br />

santosalvaro@uol.com.br<br />

São razoavelmente, mas não suficientemente, conhecidos<br />

da engenharia paulista os graves problemas <strong>geológico</strong>geotécnicos<br />

advindos <strong>de</strong> feições cársticas – vazios, bolsões<br />

<strong>de</strong> solos muito moles e outras <strong>de</strong>scontinuida<strong>de</strong>s promovidos<br />

por dissolução da rocha calcária – nos <strong>terrenos</strong> metamórficos<br />

presentes no município <strong>de</strong> Cajamar, em São Paulo,<br />

e região próxima.<br />

os dois casos mais emblemáticos <strong>de</strong>ssa tipologia <strong>de</strong> problemas<br />

foram o famoso “Buraco <strong>de</strong> Cajamar”, afundamento<br />

<strong>de</strong> gran<strong>de</strong> expressão ocorrido em 1986 no bairro <strong>de</strong> lavrinhas,<br />

e o comprometimento das fundações da mo<strong>de</strong>rna<br />

fábrica da Natura, no ano <strong>de</strong> 1999.<br />

• FUNDAÇÕES & OBRAS GEOTÉCNICAS<br />

o principal fenômeno cárstico <strong>de</strong> interesse da engenharia<br />

é o afundamento, brusco ou lento, <strong>de</strong> <strong>terrenos</strong>. esses<br />

afundamentos, que po<strong>de</strong>m <strong>de</strong>struir por completo edificações<br />

<strong>de</strong> superfície, colocando em risco patrimônios e vidas<br />

humanas, po<strong>de</strong>m ter várias etiologias, com <strong>de</strong>staque para<br />

colapsos <strong>de</strong> teto <strong>de</strong> caverna (que po<strong>de</strong> estar a <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong><br />

metros <strong>de</strong> profundida<strong>de</strong>) e colapso do horizonte <strong>de</strong> solos<br />

sobreposto a vazios existentes no próprio interior do pacote<br />

total <strong>de</strong> solos <strong>de</strong> alteração <strong>de</strong> rocha (solos saprolíticos).<br />

o moDelo antigo e o noVo<br />

A partir dos estudos realizados pelo IPT a propósito do<br />

Buraco <strong>de</strong> Cajamar, adotou-se generalizadamente a hipótese<br />

pela qual os vazios encontrados na cobertura <strong>de</strong> solo<br />

(normalmente <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> metros <strong>de</strong> espessura) seriam originados<br />

da migração <strong>de</strong> solo para o interior <strong>de</strong> cavida<strong>de</strong>s<br />

cársticas do maciço calcário são.<br />

os <strong>novo</strong>s estudos que têm sido levados a efeito na região<br />

<strong>de</strong> Cajamar, com a realização <strong>de</strong> inúmeras sondagens diretas<br />

e indiretas em apoio a investigações <strong>geológico</strong>-geotécnicas<br />

para a instalação <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s empreendimentos,<br />

um melhor conhecimento das peculiarida<strong>de</strong>s fisiográficas<br />

do município e municípios vizinhos, numerosas consultas<br />

<strong>de</strong> dados <strong>de</strong> sondagens para empreendimentos vários na<br />

região, exame das pedreiras <strong>de</strong> calcário ativas e abandonadas,<br />

entrevistas sobre eventuais problemas <strong>de</strong> abatimentos<br />

<strong>de</strong> terreno e um melhor entendimento dos processos <strong>geológico</strong>s<br />

pretéritos <strong>de</strong> metamorfização ocorridos no Protero


zóico Superior (ida<strong>de</strong>s entre 600 milhões<br />

a 1 bilhão <strong>de</strong> anos), conduziram<br />

ao questionamento da valida<strong>de</strong> do<br />

<strong>mo<strong>de</strong>lo</strong> até então proposto, levando<br />

a proposta um <strong>novo</strong> <strong>mo<strong>de</strong>lo</strong> <strong>geológico</strong>-fenomenológico,<br />

o que traz consequências<br />

diretas para a abordagem<br />

técnica do problema.<br />

o <strong>novo</strong> <strong>mo<strong>de</strong>lo</strong> <strong>geológico</strong> apoia-se<br />

na hipótese <strong>de</strong> um comportamento<br />

físico diferenciado dos variados estratos<br />

sedimentares frente aos esforços<br />

metamorfizantes <strong>de</strong> compressão<br />

ocorridos no Proterozóico Superior. o<br />

banco calcário inferior, constituindo<br />

uma camada rochosa mais espessa<br />

e mais competente que as camadas<br />

superiores, teria oferecido uma maior<br />

resistência a esses esforços <strong>de</strong> compressão,<br />

o que a levou a dobrar-se<br />

menos que seus estratos superiores<br />

(veja Mo<strong>de</strong>lo Geológico).<br />

No âmbito <strong>de</strong>sse cenário <strong>geológico</strong>,<br />

especialmente na conformação <strong>de</strong> anticlinais<br />

(área formada pela crista das<br />

dobras), a base dos estratos superiores<br />

por certo teria sido “arrastada” sobre<br />

a camada calcária inferior durante<br />

os esforços <strong>de</strong> compressão/dobramento,<br />

em um processo semelhante<br />

a um nappe <strong>de</strong> charriage (superfície<br />

<strong>de</strong> arrastamento). esse fenômeno explica<br />

a situação geológica singular da<br />

zona <strong>de</strong> interface entre o pacote <strong>de</strong><br />

solo saprolítico (normalmente com<br />

30 a 60 metros <strong>de</strong> profundida<strong>de</strong> na<br />

região), com rocha calcária sã. essa<br />

zona <strong>de</strong> interface, com espessura média<br />

<strong>de</strong> 3 a 5 metros, exibe uma feição<br />

brechói<strong>de</strong> heterogênea, irregular e<br />

complexa, ou seja, uma composição<br />

e uma aparência física totalmente diversa<br />

do pacote alterado superior <strong>de</strong><br />

estratos metamorfizados e a rocha<br />

metacalcária sã inferior.<br />

É justamente nessa zona brechói<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> interface, adicionalmente muito<br />

exposta a variações do nível d’água,<br />

que têm origem e se situam as feições<br />

cársticas, bolsões <strong>de</strong> vazios ou solos<br />

muito moles, geotecnicamente preocupantes<br />

para a construção civil.<br />

De outra parte, os vales atuais em<br />

sua maior parte coincidiriam com<br />

anticlinais <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s dobras metamórficas,<br />

situação em que, como se<br />

sabe (Geomorfologia estrutural), há<br />

o aparecimento <strong>de</strong> fraturas apicais <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>scompressão que potencializam a<br />

ação dos processos intempéricos e<br />

erosivos, fazendo com que, paradoxalmente,<br />

uma parte alta <strong>de</strong> uma dobra<br />

venha no futuro a geomorfologicamente<br />

correspon<strong>de</strong>r a um vale.<br />

os calcários na região são naturalmente<br />

margosos e/ou quartzozos.<br />

Assim, <strong>de</strong> sua dissolução química<br />

restam resíduos <strong>de</strong> “impurezas” que<br />

chegam a preencher totalmente, em<br />

menor condição <strong>de</strong> <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong>, os<br />

bolsões calcários então dissolvidos.<br />

essa seria a origem do material que<br />

resolvemos apelidar <strong>de</strong> “pó <strong>de</strong> café”,<br />

um resíduo siltoso <strong>de</strong> um bolsão<br />

calcário dissolvido. Isso justificaria o<br />

fato <strong>de</strong>sse “pó <strong>de</strong> café” constituir-se<br />

em um verda<strong>de</strong>iro “marcador” para<br />

áreas <strong>de</strong>ssa zona <strong>de</strong> interface que<br />

<strong>de</strong>vam significar maiores preocupações<br />

geotécnicas.<br />

concluSão<br />

os problemas cársticos da região <strong>de</strong><br />

Cajamar têm origem exclusivamente<br />

na zona brechói<strong>de</strong> <strong>de</strong> interface entre o<br />

pacote <strong>de</strong> solos <strong>de</strong> alteração e o substrato<br />

calcário são. Segundo esse <strong>mo<strong>de</strong>lo</strong>,<br />

os colapsos têm sua maior pos-<br />

sibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> acontecer quando esses<br />

bolsões vazios ou preenchidos com<br />

solos muito moles encontram-se mais<br />

próximos à superfície do terreno, ou<br />

por sua própria evolução natural, ou<br />

por intervenções <strong>de</strong> terraplenagens.<br />

Segundo o histórico local <strong>de</strong> colapsos,<br />

a exploração <strong>de</strong> água subterrânea por<br />

poços profundos tem agido como o<br />

principal fator indutor e <strong>de</strong>flagrador<br />

<strong>de</strong>sses abatimentos <strong>de</strong> terreno.<br />

Decorrências práticas do <strong>novo</strong> <strong>mo<strong>de</strong>lo</strong><br />

<strong>geológico</strong><br />

1.<br />

2.<br />

Como as feições cársticas estão<br />

associadas a anticlinais <strong>de</strong> dobras,<br />

que traduzem-se no relevo atual<br />

por fundos <strong>de</strong> vale e áreas baixas,<br />

fica possível, através <strong>de</strong> uma boa<br />

caracterização geológica e geomorfológica<br />

da região, concluir-se<br />

sobre as áreas <strong>de</strong> maior ou menor<br />

probabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ocorrência <strong>de</strong><br />

feições cársticas. esse fato permitirá<br />

a produção <strong>de</strong> Cartas Geotécnicas<br />

especificamente dirigidas ao<br />

risco <strong>de</strong> abatimentos cársticos, o<br />

que, por sua vez, possibilitará aos<br />

empreen<strong>de</strong>dores públicos e privados<br />

melhor <strong>de</strong>cidir a localização <strong>de</strong><br />

seus empreendimentos ou provi<strong>de</strong>nciar<br />

os serviços <strong>de</strong> investigação<br />

consolidação geotécnica que se<br />

mostrem porventura necessários.<br />

Pelo fato dos vazios apresentaremse<br />

circunscritos e as profundida<strong>de</strong>s<br />

FUNDAÇÕES & OBRAS GEOTÉCNICAS •


Concepção do reservatório <strong>de</strong> <strong>de</strong>scarga<br />

• FUNDAÇÕES & OBRAS GEOTÉCNICAS<br />

Zona da interface brechói<strong>de</strong><br />

mostrando materiais argilosos<br />

claros e avermelhados e bolsões<br />

com material pulverulento (“pó <strong>de</strong><br />

café”) originário da dissolução <strong>de</strong><br />

núcleos calcários


notar a verticalida<strong>de</strong> dos estratos metamórficos revelando a intensida<strong>de</strong> do dobramento. a algumas<br />

<strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> metros <strong>de</strong> profundida<strong>de</strong> encontra-se a banco pouco dobrado <strong>de</strong> rocha calcária sã. na foto,<br />

a parte superior <strong>de</strong> coroamento correspon<strong>de</strong> a aterro compactado<br />

relativamente baixas (algumas<br />

poucas <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> metros) a injeção<br />

<strong>de</strong> calda <strong>de</strong> cimento (ou material<br />

similar) coloca-se como um<br />

expediente indicado e confiável<br />

para a consolidação geotécnica<br />

<strong>de</strong> <strong>terrenos</strong> a serem ocupados por<br />

algum empreendimento. o que<br />

não aconteceria se esses vazios<br />

estivessem se conectando com<br />

uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong> vazios cársticos internos<br />

ao maciço rochoso, quando<br />

então, pelos gran<strong>de</strong>s volumes<br />

<strong>de</strong> calda <strong>de</strong> cimento que seriam<br />

consumidos na injeção e pela<br />

gran<strong>de</strong> extensão e erraticida<strong>de</strong> da<br />

re<strong>de</strong> <strong>de</strong> vazios do maciço, ficaria<br />

praticamente impossível ter-se o<br />

<strong>de</strong>vido controle dos resultados do<br />

<strong>tratamento</strong> executado.<br />

outro aspecto importante a se consi<strong>de</strong>rar<br />

é que o objetivo do <strong>tratamento</strong><br />

por injeções <strong>de</strong> cimento não está na<br />

conformação <strong>de</strong> um substrato rígido<br />

por cimentação, mas na interrupção<br />

da possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> evolução <strong>de</strong> vazios<br />

cársticos em direção à superfície<br />

do terreno. Nesse caso, é sempre<br />

bom consi<strong>de</strong>rar que o <strong>tratamento</strong> por<br />

injeções <strong>de</strong> cimento compõe apenas<br />

uma das medidas <strong>de</strong> engenharia <strong>de</strong>stinadas<br />

a dar estabilida<strong>de</strong> aos empreendimentos.<br />

A opção por fundações<br />

rasas (estacas hélice) e a não operação<br />

<strong>de</strong> poços profundos <strong>de</strong> extração<br />

<strong>de</strong> água subterrânea integram esse<br />

“pacote” estabilizador.<br />

autor<br />

Álvaro Rodrigues dos Santos é ex-diretor<br />

<strong>de</strong> Planejamento e Gestão do IPT e<br />

ex-diretor da Divisão <strong>de</strong> Geologia. Autor<br />

dos livros “Geologia <strong>de</strong> engenharia:<br />

Conceitos, Método e Prática”, “A Gran<strong>de</strong><br />

Barreira da Serra do Mar”, “Cubatão”<br />

e “Diálogos Geológicos”, é também<br />

consultor em Geologia <strong>de</strong> engenharia,<br />

Geotecnia e Meio Ambiente e membro<br />

do Conselho <strong>de</strong> Desenvolvimento das<br />

Cida<strong>de</strong>s da FeCoMÉRCIo.<br />

FUNDAÇÕES & OBRAS GEOTÉCNICAS •

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