Fernão Lopes, Crónica de D. João I – “Do alvoroço que foi na ...
Fernão Lopes, Crónica de D. João I – “Do alvoroço que foi na ...
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<strong>de</strong>sejando cada um ser o primeiro; e perguntando uns aos outros <strong>que</strong>m<br />
matava o Mestre, não faltava <strong>que</strong>m respon<strong>de</strong>sse <strong>que</strong> o matava o con<strong>de</strong><br />
<strong>João</strong> Fer<strong>na</strong>n<strong>de</strong>s, a mando da rainha.<br />
Narrador (2): e por vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> Deus, todos feitos dum coração com vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> o<br />
vingar, como foram às portas do Paço <strong>que</strong> eram já serradas (…),<br />
começaram a dizer:<br />
Povo:<br />
Uns: on<strong>de</strong> matam o Mestre?<br />
Outros: <strong>que</strong> é do Mestre?<br />
Uns: <strong>que</strong>m serrou estas portas?<br />
Narrador (3): ali eram ouvidos brados <strong>de</strong> <strong>de</strong>svairadas maneiras. Tais I havia <strong>que</strong><br />
certificavam <strong>que</strong> o Mestre era morto, pois as portas estavam serradas,<br />
dizendo <strong>que</strong> as britassem para entrar lá <strong>de</strong>ntro, e ver o <strong>que</strong> era feito do<br />
Mestre, ou <strong>que</strong> coisa era a<strong>que</strong>la.<br />
Narrador (4): dali bradavam por lenha e lume para porem no fogo aos paços, e <strong>que</strong>imar<br />
o traidor e a aleivosa. Outros se ficavam pedindo escadas para subir<br />
acima, para verem o <strong>que</strong> era feito do Mestre; e em tudo isto era o arruído<br />
tão gran<strong>de</strong> <strong>que</strong> se não entendiam uns com os outros, nem <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>vam<br />
coisa alguma.<br />
Narrador (5): <strong>de</strong> cima não faltava <strong>que</strong>m dissesse <strong>que</strong> o Mestre era vivo, e o con<strong>de</strong> <strong>João</strong><br />
Fer<strong>na</strong>n<strong>de</strong>s morto; mas nisso não <strong>que</strong>ria nenhum crer, dizendo:<br />
Povo: pois se vivo é, mostrai-no-lo e vê-lo-emos!<br />
Narrador (1): então os do Mestre vendo tão gran<strong>de</strong> <strong>alvoroço</strong> como este, (…), disseram<br />
<strong>que</strong> fosse sua mercê <strong>de</strong> se mostrar à<strong>que</strong>las gentes, pois <strong>de</strong> outra maneira<br />
po<strong>de</strong>riam <strong>que</strong>brar as portas, ou pôr-lhes fogo.<br />
Narrador (2): ali se mostrou então o Mestre a uma gran<strong>de</strong> janela <strong>que</strong> vinha sobre a rua<br />
on<strong>de</strong> estava Álvaro Pais e as gentes e disse:<br />
Mestre: amigos, pacificai-vos, cá eu vivo e são sou, a Deus graças!<br />
Narrador (3): e (…) conhecendo-o todos claramente, houveram gran<strong>de</strong> prazer quando<br />
o viram, e diziam uns contra os outros:<br />
Povo:<br />
Uns: oh! Que mal fez! Pois <strong>que</strong> matou o traidor do con<strong>de</strong>, <strong>que</strong> não matou logo a<br />
aleivosa com ele!<br />
Outros: cre<strong>de</strong>s em Deus, ainda lhe há-<strong>de</strong> vir algum mal por ela!<br />
Uns: olhai e ve<strong>de</strong>, <strong>que</strong> malda<strong>de</strong> tão gran<strong>de</strong>! Mandaram-no chamar on<strong>de</strong> ia já <strong>de</strong> seu<br />
caminho, para o matarem aqui por traição!<br />
Outros: oh! Aleivosa! Já nos matou um senhor, e agora nos <strong>que</strong>ria matar outro!<br />
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