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Faculdade 7 de Setembro Disciplina de ... - Artigo Científico

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<strong>Faculda<strong>de</strong></strong> 7 <strong>de</strong> <strong>Setembro</strong><br />

<strong>Disciplina</strong> <strong>de</strong> Publicida<strong>de</strong> e Propaganda<br />

Monografia<br />

A Mudança na condição feminina através do cinema.<br />

Geórgia Ferreira Lopes Cavalcanti<br />

Fortaleza, 30 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 2011.


<strong>Faculda<strong>de</strong></strong> 7 <strong>de</strong> <strong>Setembro</strong><br />

<strong>Disciplina</strong> <strong>de</strong> Publicida<strong>de</strong> e Propaganda<br />

Geórgia Ferreira Lopes Cavalcanti<br />

Projeto <strong>de</strong> Monografia a ser apresentado à <strong>Disciplina</strong> <strong>de</strong> Publicida<strong>de</strong><br />

e Propaganda da <strong>Faculda<strong>de</strong></strong> 7 <strong>de</strong> <strong>Setembro</strong>, <strong>de</strong>senvolvido sob a<br />

orientação do Professor Tiago Seixas.<br />

Fortaleza, 30 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 2011.<br />

2


Banca Examinadora<br />

_____________________________________________________<br />

(Tiago Seixas)<br />

_____________________________________________________<br />

(Ana Paula Rabelo)<br />

_____________________________________________________<br />

(Jari Vieira)<br />

3


AGRADECIMENTOS<br />

Mais uma etapa que completo em minha vida, o fim da vida acadêmica e o início da vida<br />

profissional. Ao olhar para trás, muitas recordações. Altos e baixos, risos e preocupações, brinca<strong>de</strong>iras e<br />

trabalhos, amigos e colegas, e principalmente muito aprendizado. Por isso, quero agra<strong>de</strong>cer, não só quem<br />

me ajudou nessa monografia, mais compartilhar minha felicida<strong>de</strong> com todos que conviveram comigo<br />

durante todos esses anos <strong>de</strong> colégio e faculda<strong>de</strong>.<br />

A vida acadêmica é um caminho longo e difícil, como muitas etapas das nossas vidas. Mas com<br />

disposição, ajuda, companheirismo e amiza<strong>de</strong>, se torna muito mais fácil.<br />

E é por esse motivo que gostaria muito <strong>de</strong> agra<strong>de</strong>cer: a minha faculda<strong>de</strong>, a Fa7, por se tornar<br />

por quatro anos minha segunda casa; aos meus colegas, que fizeram das aulas uma maneira divertida <strong>de</strong><br />

apren<strong>de</strong>r; aos meus amigos, dos quais eu sempre pu<strong>de</strong> contar em todos os momentos; e os meus<br />

professores fantásticos, que levarei comigo sempre na memória. Especialmente ao Professor Tiago Seixas<br />

que me ajudou muito na construção <strong>de</strong>sse trabalho <strong>de</strong> conclusão e teve que me aguentar toda semana<br />

pedindo a correção dos capítulos.<br />

Agra<strong>de</strong>ço também, aos meus melhores amigos que estão comigo em todas as ocasiões,<br />

compartilhando alegria, tristezas e fazendo tudo ser divertido. Especialmente minha amiga do coração,<br />

Denise, que me proporciona risadas todos os dias com nossos telefonemas intermináveis.<br />

E principalmente, agra<strong>de</strong>ço aqueles que me ajudaram na construção da minha educação, moral,<br />

valores e tudo que represento hoje, minha família. Em especial, meus amados pais, que acreditaram em<br />

mim e investiram na minha formação. Que esse trabalho seja mais uma prova <strong>de</strong> que vocês são os<br />

melhores pais que eu po<strong>de</strong>ria ter, porque cumpriram a missão <strong>de</strong> criar uma menina e transformá-la em<br />

mulher, sempre com muito amor.<br />

Obrigada.<br />

4


RESUMO<br />

Essa monografia, tem o objetivo principal <strong>de</strong> analisar o comportamento das socieda<strong>de</strong>s<br />

com relação a mulher através dos filmes, já que o cinema reflete a socieda<strong>de</strong> no qual está<br />

inserido. Usaremos, para tanto, as i<strong>de</strong>ologias feministas que nasceram durante a década <strong>de</strong> 70 e<br />

que ajudaram na igualda<strong>de</strong> <strong>de</strong> direitos entre os sexos e na construção dos valores<br />

contemporâneos. E análise <strong>de</strong> filmes para ajudar na exemplificação das teorias. Com o intuito <strong>de</strong><br />

prolongar o estudo do tema, com os estudantes <strong>de</strong> comunicação e relações humanas.<br />

5


Sumário<br />

Introdução ....................................................................................................................................................... 7<br />

Capítulo 1 – A representação do feminino na história das socieda<strong>de</strong>s .................................................................. 14<br />

1.1 Civilizações Antigas ........................................................................................................................... 15<br />

1.2 Começo do Feminismo na fase Pré-Capitalista até os dias atuais. ............................................................ 19<br />

2. História do cinema ............................................................................................................................ 23<br />

2.1 Cinema Hollywoodiano .................................................................................................................. 25<br />

2.2 Cinema Bollywoodiano .................................................................................................................. 28<br />

2. 3 Cinema Iraniano ................................................................................................................................ 31<br />

Capítulo 2 – Teorias do olhar .......................................................................................................................... 35<br />

Introdução ................................................................................................................................................. 35<br />

1. O feminino como o sujeito do cinema ................................................................................................. 36<br />

2.1 O olhar masculino ................................................................................................................................ 43<br />

2.2 O olhar feminino ........................................................................................................................... 44<br />

3 Pré-análise fílmica <strong>de</strong> Ann Kaplan ...................................................................................................... 47<br />

3.1 A dama das Camélias ........................................................................................................................... 47<br />

3.2 A Vênus Loira .............................................................................................................................. 50<br />

3.3 A dama <strong>de</strong> Xangai ............................................................................................................................... 52<br />

Capítulo 3 – Análise dos filmes escolhidos........................................................................................................ 56<br />

Introdução ................................................................................................................................................. 56<br />

1. My Fair Lady .................................................................................................................................... 56<br />

2. A Caminho <strong>de</strong> Kandahar .................................................................................................................... 65<br />

3. Jodhaa Akbar ................................................................................................................................... 69<br />

Conclusão ................................................................................................................................................. 74<br />

Referências Bibliograficas ........................................................................................................................... 76<br />

6


Introdução<br />

O presente trabalho preten<strong>de</strong> discutir a evolução da mulher perante a socieda<strong>de</strong>. Quando<br />

procuramos enten<strong>de</strong>r essa evolução, <strong>de</strong>vemos olhar para o começo da socieda<strong>de</strong> até os dias <strong>de</strong><br />

hoje. Até aqui, o papel da mulher já foi <strong>de</strong>sumano, temido, admirado, objetivado entre outras<br />

formas. Mas meu objetivo é mostrar <strong>de</strong> que maneira esses papeis foram retratados para a<br />

socieda<strong>de</strong> através do cinema.<br />

De fato, há várias correntes na construção das mulheres como objeto sexual<br />

ou objeto do “olhar masculino”, discussão que gerou amplos <strong>de</strong>bates na<br />

literatura feminista. Todavia, hoje, <strong>de</strong>ntre os tópicos mais comuns,<br />

encontramos “figuras híbridas” como as “mulheres mo<strong>de</strong>rnas”, Estas novas<br />

representações <strong>de</strong> mulheres combinam elementos convencionais da<br />

feminilida<strong>de</strong> com outros mais igualitários; estes geralmente calcados em<br />

mulheres brancas e <strong>de</strong> “classe A e B” que participam ativamente do universo<br />

profissional, mas não abandonam as responsabilida<strong>de</strong>s tradicionalistas do lar.<br />

(FONFOCA, 2009, p. 3)<br />

Vamos analisar que a partir da década <strong>de</strong> 20, no momento em que os filmes<br />

Hollywoodianos foram sendo produzidos, as mulheres nunca tinham o papel <strong>de</strong> narrativa da<br />

história e eram tratadas como objeto do voyeurismo masculino. E que isso só chegou a ser<br />

objeto <strong>de</strong> estudo, após a segunda revolução feminina.<br />

E a partir daí, respon<strong>de</strong>r <strong>de</strong> que formas nós mulheres conseguimos contornar questões<br />

como o machismo, preconceito e <strong>de</strong>scriminação. Como John Berger citou em seu estudo no<br />

7


livro/seriado da BBC, Ways of Seeing, no capítulo 1. “Her<strong>de</strong>iras da tradição do olhar estabelecida<br />

nos alvores da socieda<strong>de</strong> burguesa mo<strong>de</strong>rna, em que os homens <strong>de</strong>finiam e propagavam as<br />

convenções da representação feminina, as imagens que povoam as ruas e os outros espaços<br />

públicos (e privados) da vida contemporânea conduziriam para uma leitura da mulher como um<br />

não sujeito.” (1972)<br />

Este trabalho procurará exemplificar os temas discutidos com alguns filmes, que serão<br />

analisados semioticamente. Para exemplo geral, po<strong>de</strong>mos citar dois filmes da produtora Disney<br />

que mostram em épocas diferentes, duas personagens mulheres com papeis opostos. Em 1937,<br />

temos a primeira, chamada “Snow White” ou Branca <strong>de</strong> Neve, baseada na dançarina Marge<br />

Champion, em que vemos uma mulher fraca, que precisa ser constantemente protegida, in<strong>de</strong>fesa<br />

e a espera <strong>de</strong> salvação. Em seguida, mais recente, temos o novo filme Secretariat (2010), que<br />

nos conta a história <strong>de</strong> Penny Chenery, interpretada por Diane Lane. Aqui, vemos a mulher<br />

<strong>de</strong>terminada, forte, lutadora e não submissa às opiniões do marido.<br />

Procuraremos abranger culturas diferentes, como a cultura indiana, americana e a<br />

iraniana. Retratando, portanto a distinção da maneira que a mulher é vista no oriente. Por<br />

estarem fora do cinema Hollywoodiano que é, na maioria das vezes, um cinema do mundo<br />

fantástico, contendo histórias surreais, esses três tipos <strong>de</strong> cultura, vão produzir filmes críticos,<br />

que falam sobre seu povo e sua forma <strong>de</strong> viver. Nesse assunto são levantadas questões <strong>de</strong><br />

comportamento da socieda<strong>de</strong>, com o papel da mulher. Para tanto <strong>de</strong>vemos olhar a formação<br />

histórica <strong>de</strong> dominação do homem também no oriente.<br />

No contexto histórico, as mulheres oci<strong>de</strong>ntais e orientais ocupam espaços diferentes do<br />

homem e continuam sendo vistas como um ser doméstico e também como objeto sexual. Alguns<br />

8


autores consi<strong>de</strong>ram esse fato como tendo uma explicação biológica que surgiu no período<br />

paleolítico. Eles acreditam que <strong>de</strong>vido a maior força física do homem ele se achava superior a<br />

mulher. Bem como na diferenciação da cultura/social, os conhecimentos eram influenciados por<br />

essa distinção dos sexos. (CITELI, 2001, s/p.)<br />

Nesse sentido o <strong>de</strong>terminismo biológico seria o <strong>de</strong>finidor das <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s<br />

entre mulheres e homens, tendo a medicina e as ciências biológicas como<br />

importante aliada que, durante muito tempo, subsidiava as normas sociais<br />

quanto às relações <strong>de</strong> gênero. (VIANA, RIDENTI, 1998, p. 97)<br />

No Brasil, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a colonização, o papel da mulher passa por funções <strong>de</strong>gradantes e até<br />

<strong>de</strong>sumanas. Talvez, até os dias <strong>de</strong> hoje, o inconsciente das mulheres estejam atrelados às i<strong>de</strong>ias<br />

passadas por gerações. Segundo Del Priore, (2001), abafar a sexualida<strong>de</strong> feminina seria o<br />

objetivo <strong>de</strong> Leis do Estado, da Igreja e dos próprios pais que não queriam ameaçar o equilíbrio<br />

doméstico e a segurança social.<br />

Depois na mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>, como explica Coutinho (1994) essa i<strong>de</strong>ia foi substituída pelo<br />

conceito <strong>de</strong> família propagada pela burguesia mo<strong>de</strong>rna que é marcado pela Revolução<br />

Sentimental do século XVIII, em que o romantismo será usado como mecanismo <strong>de</strong> dominação<br />

cultural que oculta à opressão vivida pela mulher.<br />

Um exemplo perceptível disso é que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> muito cedo nas famílias há a educação<br />

diferenciada entre os sexos. Enquanto os meninos são encorajados a apren<strong>de</strong>r a serem fortes,<br />

corajosos e frios, as meninas são estimuladas a serem frágeis, inseguras e emocionais. Como<br />

9


consequência, as características valorizadas no mundo do trabalho (como racionalida<strong>de</strong>,<br />

pensamento lógico, interesses profissionais e políticos) passam a ser vistas como parte da<br />

i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> masculina, indo contra a sensibilida<strong>de</strong>, fragilida<strong>de</strong> e intuição <strong>de</strong>finidoras da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong><br />

feminina. Por isso, durante muito tempo foram os homens que garantiram a conquista da vida<br />

pública.<br />

O que po<strong>de</strong>mos observar ainda é que apesar das mudanças femininas em relação a sua<br />

carreira profissional, a essência materna, mudou muito pouco a sua <strong>de</strong>finição da mulher, a ela só<br />

foi acrescentado um novo papel. Isso nós leva a crer que os movimentos feministas, não<br />

mudaram as características antigas das mulheres, mas sim, adicionaram novas para ganharem<br />

mais espaço na vida pública.<br />

No oriente, no entanto, a cultura ainda é um fator muito forte que as impe<strong>de</strong> <strong>de</strong> viver<br />

livres. Há locais no oriente, que não permitem que mulheres tirem a carteira <strong>de</strong> motorista, ou que<br />

se por uma fatalida<strong>de</strong> ela venha a se tornar viúva, não possa ter outras relações além <strong>de</strong> ficar <strong>de</strong><br />

luto pelo marido. Nas capitais urbanas, esse problema já consegue ser amenizado, mais nas<br />

cida<strong>de</strong>s restantes a gran<strong>de</strong> população feminina ainda sofre com preconceitos.<br />

Todas essas transformações, portanto, possuem duas aplicações no cinema. Por um lado,<br />

um papel ou personagem influenciará as mentalida<strong>de</strong>s da socieda<strong>de</strong> contemporânea. Por outro, a<br />

própria socieda<strong>de</strong> será transportada para a telona, permitindo a construção dos personagens.<br />

O cinema é um espelho da socieda<strong>de</strong> que o produz. Mas a forma como o filme reflete<br />

essa socieda<strong>de</strong> não é direta, pois ele é um produto <strong>de</strong> uma coletivida<strong>de</strong> que procura ressaltar<br />

suas qualida<strong>de</strong>s e escon<strong>de</strong>r seus <strong>de</strong>feitos.<br />

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No cinema, esses conceitos <strong>de</strong> diferenciação dos sexos também são perceptíveis. No<br />

Hollywoodiano, na sua gran<strong>de</strong> maioria dos filmes em que vemos uma representação fictícia, por<br />

serem muito fantasiosos em que Bruschi e Me<strong>de</strong>iros (2003) falam que há a reprodução <strong>de</strong> um<br />

modus vivandi com a finalida<strong>de</strong> apenas <strong>de</strong> ven<strong>de</strong>r. On<strong>de</strong> cabe a mulher basicamente dois papeis<br />

principais. O <strong>de</strong> mãe prestativa, boa esposa, frágil e <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte ou <strong>de</strong> símbolos sexuais que<br />

transformam as atrizes em ícones <strong>de</strong> beleza.<br />

Po<strong>de</strong>mos citar exemplos <strong>de</strong> filmes famoso, colocados na lista <strong>de</strong> maiores filme <strong>de</strong> todos<br />

os tempos divulgados em 2006, pelo American Film Institute (AFI). Mary Poppins (1964), The<br />

Sound of Music (1965), My Fair Lady (1964), The King and I (1956), Grease (1978). Todos eles<br />

com protagonistas que possuem características maternas, frágeis e <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes da figura<br />

masculina. Nessa mesma lista, po<strong>de</strong>mos citar, também exemplos <strong>de</strong> personagens que se<br />

tornaram símbolos sexuais, como Cabaret (1972), Gentlemen Prefer Blon<strong>de</strong>s (1953) e Moulin<br />

Rouge (2001).<br />

No oriente, porém, nos <strong>de</strong>paramos com um dilema: como se mo<strong>de</strong>rniza povos com fortes<br />

tradições <strong>de</strong> milênios? As mo<strong>de</strong>rnas i<strong>de</strong>ologias oci<strong>de</strong>ntais se <strong>de</strong>frontam com a realida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sses<br />

países, que se veem em duas situações, a <strong>de</strong> se mo<strong>de</strong>rnizar ou ficar para trás.<br />

O cinema Iraniano possui um caráter artístico crítico e político, que mostra o cotidiano<br />

vivido por seu povo. Apesar <strong>de</strong> o cinema ser uma forma <strong>de</strong> expressão tão controlada pelas leis<br />

que governam a República Islâmica do Irã, ele é um meio <strong>de</strong> nos fazer refletir sobre o Islam e o<br />

modo <strong>de</strong> vida dos muçulmanos.<br />

Po<strong>de</strong>mos citar exemplos <strong>de</strong> filmes, que <strong>de</strong>monstram a vida social <strong>de</strong>ssas mulheres. São<br />

eles: “A maçã”, “A caminho <strong>de</strong> Kandahar” e “O círculo”. Filmes que contam histórias reais <strong>de</strong><br />

11


submissão das mulheres pelos seus maridos e até seus próprios filhos, mostrando a falta <strong>de</strong><br />

força do gênero feminino, sendo <strong>de</strong>srespeitas mesmo por outras mulheres críticas. Um país que<br />

não permite a locomoção <strong>de</strong>las se não tiverem maridos, a obrigação <strong>de</strong> usar a burca ou o véu e<br />

que incentiva a rejeição da família e do po<strong>de</strong>r público. Outra característica importante <strong>de</strong>ssas<br />

produções é que elas usam a arte para fazer questionamentos da socieda<strong>de</strong>.<br />

Já a índia produz mais filmes por ano que qualquer outro país e os filmes indianos fogem<br />

totalmente do padrão oci<strong>de</strong>ntal. Sendo consi<strong>de</strong>rados, por nós brasileiros, extensos (com em<br />

média 3 horas <strong>de</strong> duração) e melodramáticos, que mostram inúmeras apresentações <strong>de</strong> danças e<br />

músicas. Fugindo também da realida<strong>de</strong> do próprio país, on<strong>de</strong> tudo é colorido e o amor sempre<br />

vence. O erotismo passa longe das telas, sem nem cogitar beijos, apesar <strong>de</strong> alguns filmes mais<br />

mo<strong>de</strong>rnos utilizarem o beijo para censuras adultas. Mesmo que na realida<strong>de</strong> as atrizes sejam<br />

difamadas e repudiadas pela família.<br />

Em Bollywood, a Índia é um paraíso. Nunca é mostrada a realida<strong>de</strong> social a não ser por<br />

raros filmes que são rodados para fora. Como por exemplo: Slumdog Millionaire. Mahesh Bhatt,<br />

um dos mais famosos e bem sucedidos cineastas da Índia disse:<br />

Bollywood é parte daquilo que nossa cultura se tornou. Estamos mentindo<br />

para nós mesmos o tempo todo... Meu amigo U. G. Krishnamurti diz que<br />

não existe outra realida<strong>de</strong> a não ser aquela que você vive todos os dias.<br />

(BHATT, 2003, s.p.)<br />

12


Como é clara a intenção <strong>de</strong> cópia do cinema Hollywoodiano, vemos problemas parecidos<br />

em vislumbrar um mundo irreal. On<strong>de</strong> as mulheres são vista com os mesmo problemas <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>pendência do homem ou <strong>de</strong> se tornarem objeto sexual, contando ainda com todos os<br />

preconceitos da cultura.<br />

Po<strong>de</strong>mos citar filmes como: Saawariya (2007), Bunty aur babli (2005), Jodah Akabar<br />

(2008) e Monsoon Wedding (2001). Filmes que mostram as mulheres sempre impecáveis, até na<br />

hora <strong>de</strong> dormir para sempre ficarem bonitas para seus maridos. Ou então, a história da solidão<br />

eterna da mulher que espera seu amado abandonando o resto <strong>de</strong> sua vida em função <strong>de</strong>le. Ou a<br />

famosa história do casamento forçado, para não prejudicar a família.<br />

13


Capítulo 1 – A representação do feminino na história das socieda<strong>de</strong>s<br />

Ao fazer as pesquisas essenciais para esse trabalho sobre o estudo da mulher na nossa<br />

socieda<strong>de</strong> contemporânea, tanto oci<strong>de</strong>ntal como oriental, que vai ser à base dos nossos estudos,<br />

fomos pesquisar a fundo sobre o papel <strong>de</strong>las em diferentes épocas. Buscando enten<strong>de</strong>r <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />

quando a mulher foi sendo menosprezada pela socieda<strong>de</strong>. E o porque <strong>de</strong>la não ser tratada <strong>de</strong><br />

forma semelhante ao homem. Vemos isso até em nossos livros <strong>de</strong> história, on<strong>de</strong> a figura<br />

feminina ou é pouco citada ou inexistente. E é por isso que vamos traçar uma cronologia<br />

histórica <strong>de</strong> diversas culturas, já que para falarmos <strong>de</strong> etnias específicas <strong>de</strong>vemos ir além, pois a<br />

nossa formação atual foi originada <strong>de</strong> várias guerras e miscigenações <strong>de</strong> povos.<br />

Muitas i<strong>de</strong>ias sobre o assunto têm sido discorridas, assim como<br />

variadas e diversificadas concepções construídas, redimensionadas e,<br />

apesar disso, há ainda questionamentos sobre a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se<br />

falar <strong>de</strong> uma história efetivamente feminina na Antiguida<strong>de</strong> (DUBY,<br />

PERROT, 1991, p. 7)<br />

Essa incerteza é <strong>de</strong>vido à escassez <strong>de</strong> fontes documentais que retratam a figura feminina.<br />

A historiadora Michele Perrot (1991) afirma: “há uma carência <strong>de</strong> pistas no domínio das fontes<br />

com as quais se nutre preferencialmente o historiador, <strong>de</strong>vido à <strong>de</strong>ficiência dos registros<br />

primários”.<br />

De acordo com Margareth Rago, durante muito tempo a história foi escrita sob a visão<br />

masculina restringindo nosso material e mostrando o sexo masculino como um sujeito universal. A<br />

14


figura da mulher pouco aparece em nossa história, Rago cita SAFFIOTI (1969): “todo discurso<br />

sobre temas clássicos como a abolição da escravatura, a imigração européia para o Brasil, a<br />

industrialização, ou o movimento operário, evocava imagens da participação <strong>de</strong> homens robustos,<br />

brancos ou negros, e jamais <strong>de</strong> mulheres capazes <strong>de</strong> merecerem uma maior atenção”.<br />

1.1 Civilizações Antigas<br />

A socieda<strong>de</strong> humana é histórica e muda conforme os <strong>de</strong>senvolvimentos da produção e <strong>de</strong><br />

sua evolução. Assim, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o período paleolítico começamos a <strong>de</strong>finir diferentes papeis entre<br />

homens e mulheres. Já havia a divisão sexual do trabalho marcada pelas diferenciações<br />

fisiológicas do sexo. A mulher cuidava dos filhos e <strong>de</strong> tarefas domésticas <strong>de</strong>vido a sua<br />

capacida<strong>de</strong> reprodutora, bem como a parte da agricultura e da criação <strong>de</strong> animais. À medida que<br />

essa população humana ia crescendo, começaram a surgir os clãs, as tribos ou al<strong>de</strong>ias, que<br />

po<strong>de</strong>riam ser nôma<strong>de</strong>s ou se<strong>de</strong>ntárias, dando origem as diversas culturas.<br />

É provável que a explicação biológica que teorizou sobre a<br />

incapacida<strong>de</strong> racional e profissional da mulher, teria sua origem no<br />

período paleolítico em que o vigor físico do homem favorecia a caça e<br />

a estrutura da mulher era mais apropriada para a criação dos filhos e<br />

coleta <strong>de</strong> alimentos. (MELO, 2001, s/p)<br />

15


Como disse André Álvares em seu texto (A mulher e o Cristianismo, um passeio pela<br />

história), mais ou menos em 3000 a.C., para ser mais preciso, na antiguida<strong>de</strong>, começaram a<br />

surgir as primeiras civilizações. Que ainda não exploravam o po<strong>de</strong>r feminino. Nessa época a<br />

mulher não possuía nenhum direito e era vista <strong>de</strong> uma forma completamente negativa, sendo<br />

muitas vezes tratada como escrava, concubina ou submissa ao marido.<br />

Nos textos utópicos <strong>de</strong> Platão, célebre filósofo grego, agra<strong>de</strong>cia aos <strong>de</strong>uses por ter<br />

nascido grego, livre e homem. Mesmo a Grécia tão dotada como <strong>de</strong>mocrática não concedia<br />

plenos direitos as mulheres. Elas eram tratadas como escravas, <strong>de</strong>senvolviam apenas trabalhos<br />

manuais <strong>de</strong>svalorizados pelo homem. Outras ativida<strong>de</strong>s como filosofia, políticas ou artes só<br />

podiam ser realizadas por homens, excluindo as mulheres do mundo pensante, privando-as do<br />

conhecimento e da opinião.<br />

Nas famosas histórias Ilíada e a Odisseia, contam-se façanhas <strong>de</strong> Aquiles e Ulisses,<br />

cujos personagens são homens, mesmo as mulheres dos contos não sendo tão ativas, elas<br />

aparecem, como prêmios (hedna), símbolos sexuais, mães, esposas ou amas.<br />

Essa atitu<strong>de</strong> é a confirmação <strong>de</strong> uma herança que predominou durante toda a era clássica, em<br />

que o homem era guerreiro e a mulher geradora <strong>de</strong> filhos. “Aliás, contar a história do mundo<br />

grego resume-se em parte a isso mesmo: homens que contam para homens uma história que<br />

tem como únicos protagonistas os homens.” (MOSSÉ, op. cit., p. 156) A mulher grega se casava<br />

em tono dos 15 anos com um homem que não se casava antes dos 30. Muito fértil, elas<br />

passavam a maior parte do tempo procriando, que era a maior causa <strong>de</strong> mortalida<strong>de</strong> da Grécia.<br />

Roma era uma das socieda<strong>de</strong>s que hoje utilizamos o termo “machista”, não restam<br />

dúvidas <strong>de</strong> que ela se centrava na figura do homem. Numa visão geral, era o homem o chefe da<br />

16


família, que exercia uma ativida<strong>de</strong> pública e na vida política (assembleias e senado). A mulher,<br />

ao contrário, era a dona <strong>de</strong> casa e cujo po<strong>de</strong>r se restringia a proprieda<strong>de</strong>. Elas eram proibidas<br />

até <strong>de</strong> apren<strong>de</strong>r a ler e até ouvir sobre política e religião. Por isso, seu papel era <strong>de</strong>finido como<br />

inferior. Nessa civilização, se utilizava o código paterfamilias, on<strong>de</strong> o homem tinha todo o po<strong>de</strong>r<br />

sobre as mulheres, os filhos, os servos e os escravos. Um dos primeiros relatos <strong>de</strong> manifesto<br />

feminino, foi em 195 a. C. Devido ao privilégio masculino do transporte público. As mulheres<br />

reclamaram no senado e receberam a seguinte carta do atual senador Marco Pórcio Catão:<br />

Lembrem-se do gran<strong>de</strong> trabalho que temos tido para manter nossas<br />

mulheres tranquilas e para refrear-lhes a licenciosida<strong>de</strong>, o que foi possível<br />

enquanto as leis nos ajudarem. Imagine o que se suce<strong>de</strong>rá, daqui por<br />

diante, se as tais leis forem revogadas e se as mulheres se puserem,<br />

legalmente consi<strong>de</strong>rando, em pé <strong>de</strong> igualda<strong>de</strong> com os homens! Os<br />

senhores sabem como são as mulheres: façam-nas suas iguais e,<br />

imediatamente elas quererão subir ás suas costas para governá-los.<br />

(CATÃO apud ALVES e PITANGUY, 1985, p.15)<br />

Muitas pessoas conhecem Cleópatra, uma mulher egípcia muito além do seu tempo, que<br />

governou o Egito e lutou contra o império romano. Mais em geral, o Egito tratava as mulheres <strong>de</strong><br />

forma semelhante às outras civilizações. Elas só se tornavam rainhas do lar na ausência do<br />

marido e trabalhavam na agricultura, no artesanato e nos trabalhos domésticos. As <strong>de</strong> classe<br />

mais alta tinham um prestígio maior, e possuíam até escravas pessoais.<br />

A Mesopotâmia é conhecida por seus famosos códigos e leis. E é por isso que essa<br />

civilização se torna tão distinta das outras. Aqui, as mulheres se encontravam favoráveis nas leis,<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> que fossem casadas. O casamento estava muito ligado a manutenção da casa, dos<br />

17


cuidados dos filhos e do marido. Algumas mulheres se distinguiam pela atuação no mundo dos<br />

negócios, pois possuíam certa in<strong>de</strong>pendência jurídica. Algumas até possuíam sua própria<br />

proprieda<strong>de</strong>. Assim como nos trabalho dos templos, pois possuíam igual liberda<strong>de</strong> religiosa.<br />

As mulheres sejam submissas aos seus maridos, como ao Senhor,<br />

pois o marido é cabeça da mulher, como Cristo é cabeça da<br />

Igreja... E como a Igreja está sujeita a Cristo, assim também as<br />

mulheres se <strong>de</strong>vem submeter em tudo aos seus maridos. (Carta<br />

<strong>de</strong> Paulo aos Efésios, V, 21-24)<br />

Na Ida<strong>de</strong> Média, ainda encontramos uma socieda<strong>de</strong> que <strong>de</strong>staca o masculino. Mais<br />

começamos a <strong>de</strong>stacar um pouco o papel da mulher, porque nessa época, o casamento e a<br />

família se tornavam fundamentais para que as pessoas tivessem o prestígio e convivessem bem<br />

em socieda<strong>de</strong>. Precisava-se manter uma boa reputação.<br />

Junto aos senhores, as casas eram partilhadas, <strong>de</strong> um lado a ala dos homens, aberta a<br />

convidados e fartas <strong>de</strong> comida e do outro a ala das mulheres, fechada e discreta, on<strong>de</strong> único<br />

homem permitido a entrar era o senhor feudal. Já os camponeses, não tinham nenhuma chance<br />

<strong>de</strong> entrar na alta socieda<strong>de</strong>, já que, nobres não se casavam com camponeses, somente com<br />

outros nobres. O casamento se tornava muitas vezes uma aliança entre famílias. On<strong>de</strong> as filhas<br />

dos senhores feudais eram prometidas e obrigadas a outros senhores dando continuida<strong>de</strong> ao<br />

sistema feudal. Nessa socieda<strong>de</strong> a mulher não tinha voz. Mas po<strong>de</strong>mos consi<strong>de</strong>rar essa época,<br />

<strong>de</strong>ntre as civilizações antigas, a época em que a mulher teve mais direitos garantidos por lei, já<br />

que o homem era afastado da socieda<strong>de</strong> nos períodos <strong>de</strong> guerra. Cabendo no papel da mulher<br />

18


os negócios da família, como dona da casa, tendo que apren<strong>de</strong>r contabilida<strong>de</strong> e legislação. Já na<br />

parte <strong>de</strong> educação, mesmo sendo minoria, existiam mulheres que se formaram em cursos como<br />

direito e medicina.<br />

Nessa época po<strong>de</strong>mos encontrar a obra da autora francesa Christine <strong>de</strong> Pisan, A cida<strong>de</strong><br />

das Mulheres, com seu discurso consciente sobre a <strong>de</strong>fesa dos direitos das mulheres e <strong>de</strong><br />

igualda<strong>de</strong> entre os sexos. Sua luta era <strong>de</strong> dar às meninas a mesma educação dada aos meninos.<br />

Mais na frente, encontramos o livro “Em <strong>de</strong>fesa dos direitos da mulher” <strong>de</strong> Mary Wollstonecraft (É<br />

consi<strong>de</strong>rada como pioneira do feminismo mo<strong>de</strong>rno), é uma das poucas obras escritas antes do<br />

século XIX, que retrata a posição da mulher na elite social. A autora acreditava que ambos os<br />

sexos contribuíam para a situação feminina e tomou como verda<strong>de</strong> que as mulheres tinham<br />

gran<strong>de</strong> po<strong>de</strong>r sobre os homens.<br />

Sendo assim, po<strong>de</strong>mos perceber a importância <strong>de</strong> analisarmos a mulher na socieda<strong>de</strong><br />

contemporânea, <strong>de</strong>vido ao escasso material que temos do passado. Principalmente <strong>de</strong><br />

estudarmos o papel <strong>de</strong>las nas culturas em que elas ainda não têm <strong>de</strong>staque. Para que não<br />

cometamos os mesmos erros das civilizações anteriores.<br />

1.2 Começo do Feminismo na fase Pré-Capitalista até os dias atuais.<br />

Na fase pré-capitalista, começamos a ver mudanças mais notáveis em relação as<br />

mulheres e sua saída <strong>de</strong> casa para o trabalho. No texto, O papel da mulher na socieda<strong>de</strong> ao<br />

longo da história, <strong>de</strong> Karla Adriana Martins Bessa, encontramos a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que apesar da sua<br />

19


função reprodutora, a mulher tenha favorecido sua subordinação ao homem, sendo consi<strong>de</strong>rada<br />

mais frágil e incapaz <strong>de</strong> assumir direções <strong>de</strong> chefia. O homem por sua vez, sempre associado à<br />

i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> autorida<strong>de</strong> <strong>de</strong>vido a sua força física fez com que surgisse assim, a socieda<strong>de</strong> patriarcal<br />

(em que a figura do pai, como homem, tem total autorida<strong>de</strong> na família e com isso na socieda<strong>de</strong> ).<br />

Essa socieda<strong>de</strong> prevaleceu por muito tempo, mesmo na era industrial on<strong>de</strong> as mulheres<br />

iniciam sua vida profissional nas fábricas e por tanto, fora <strong>de</strong> casa. No século XVIII e XIX o<br />

abandono do lar pelas mães que trabalhavam nas fábricas levou a uma gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>sestruturação<br />

dos laços familiares. Nas fases <strong>de</strong> ampliação da produção a mão <strong>de</strong> obra feminina era utilizada<br />

junto da masculina, mesmo sendo mais barata. Em algumas situações <strong>de</strong> crise, as mulheres<br />

substituíam os homens por terem salários menores. Sendo essa questão motivos <strong>de</strong> lutas entre<br />

os gêneros.<br />

Na fase <strong>de</strong> implantação do capitalismo, o gigantesco arsenal mecânico,<br />

<strong>de</strong>stinado a eliminar trabalho humano, absorve imensas quantida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> força<br />

<strong>de</strong> trabalho: <strong>de</strong> homens, mulheres e crianças. O processo <strong>de</strong> acumulação do<br />

capital, nesta fase, não apenas elimina menos trabalho do que a máquina<br />

está apta a fazê-lo; elimina, por vezes, o trabalho do chefe da família não<br />

porque haja a nova socieda<strong>de</strong> subvertida a hierarquia familial, mas porque a<br />

tradição <strong>de</strong> submissão da mulher a tornou um ser fraco do ponto <strong>de</strong> vista das<br />

reivindicações sociais e, portanto, mais passível <strong>de</strong> exploração (SAFFIOTI,<br />

1976, p.38).<br />

E é nessa situação <strong>de</strong> preconceito dos sexos que a mulher inicia sua vida fora <strong>de</strong> casa e<br />

um pouco mais longe da i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> geradora <strong>de</strong> filhos e dona do lar. Assim, nasce a luta das<br />

mulheres por melhores condições <strong>de</strong> trabalho.<br />

20


Dificulda<strong>de</strong>s foram surgindo com o tempo, por exemplo, como cuidar dos filhos e<br />

trabalhar ao mesmo tempo. Começaram, portanto, a reivindicar por escolas, creches e pelo<br />

direito da maternida<strong>de</strong>.<br />

Após 1940 cresceu a força do trabalho feminino no mercado <strong>de</strong> trabalho e as mulheres<br />

começaram uma luta organizada para garantir seus direitos. Essa luta ficou conhecida como<br />

feminismo. E o que é o feminismo? Feminismo é uma teoria social, uma filosofia e um<br />

movimento político, formado por uma reunião <strong>de</strong> mulheres que critica uma socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong>sigual<br />

para os sexos. E que promove os direitos e interesses das mulheres. As principais questões<br />

abordadas são: a posição da mulher na socieda<strong>de</strong>, violência sexual, violência doméstica,<br />

igualda<strong>de</strong> salarial, discriminação, pornografia e patriarcalismo.<br />

As mulheres que participavam <strong>de</strong>sse movimento sofriam muitos preconceitos por homens<br />

e por outras mulheres além <strong>de</strong> serem mal vistas na socieda<strong>de</strong>.<br />

No Brasil, foi por volta <strong>de</strong> 1970 que a mulher ingressou <strong>de</strong> forma acentuada no mercado<br />

<strong>de</strong> trabalho, como ainda vemos em ativida<strong>de</strong>s específicas. Como foi dito no extenso trabalho da<br />

senhora Mara Brandão <strong>de</strong> Castro em sua tese, Mulheres no mercado formal <strong>de</strong> trabalho e<br />

educação e questão <strong>de</strong> gênero Normalmente em serviços, como professoras, enfermeiras,<br />

aten<strong>de</strong>ntes, empregadas entre outros. E somente uma pequena parcela nas ativida<strong>de</strong>s industriais<br />

e na agricultura.<br />

Po<strong>de</strong>mos montar uma pequena cronologia dos fatos que ocorreram durante o movimento<br />

feminista: Em 1970 surgem os movimentos feministas no Brasil. Na década <strong>de</strong> 80 nasce a CUT<br />

(Central única dos trabalhadores - uma organização sindical brasileira <strong>de</strong> massas com o<br />

compromisso <strong>de</strong> <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r os interesses dos trabalhadores). Em 88 com a Constituição Fe<strong>de</strong>ral a<br />

21


mulher conquistou a igualda<strong>de</strong> jurídica, o homem <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> ser o chefe da família e a mulher<br />

passou a ser consi<strong>de</strong>rada um ser tão capaz quanto o homem.<br />

De acordo com Joan Scott, professora <strong>de</strong> Ciências Sociais no Instituto <strong>de</strong> Estudos<br />

Avançados em Princeton, historiadora e militante feminista norte-americana, foi somente na<br />

década <strong>de</strong> 80 que as mulheres começam a entrar na história, as integrantes do movimento<br />

feminista reclamavam por heroínas que <strong>de</strong>monstrassem seu papel na socieda<strong>de</strong>. E foi somente<br />

com esse movimento que elas passaram a serem inclusas realmente no espaço público <strong>de</strong><br />

trabalho.<br />

Para a historiadora o caminho que se estava seguindo, ou seja, o <strong>de</strong><br />

mostrar novas informações sobre as mulheres no passado, pensando que<br />

com isso ia <strong>de</strong> certo modo “equilibrar a balança”, não estava ajudando<br />

neste projeto, tendo em vista, não modificar a importância atribuída às<br />

ativida<strong>de</strong>s femininas, mas, pelo contrário, o que se estava fazendo era<br />

colocá-las como em separado, estava dando a elas um lugar marginal em<br />

relação aos temas masculinos dominantes e universais (SCOTT, 1994, p.<br />

14).<br />

Scott, também menciona que há um dilema na construção da língua portuguesa. Que o<br />

termo universal usado para se referir ao humano é “homem” e que o termo mulher encontrado no<br />

dicionário é discriminatório. Para ela, a mulher esta construída no masculino. “... reivindicar a<br />

importância das mulheres na história significa necessariamente ir contra as <strong>de</strong>finições <strong>de</strong> história<br />

e seus agentes já estabelecidos como verda<strong>de</strong>iros ou pelo menos como reflexões acuradas sobre<br />

o que aconteceu (...) no passado”.<br />

22


Com o surgimento do feminismo, começam a surgir pensadores e críticos que fazem<br />

questionamentos que começam a por a mulher como um ser <strong>de</strong> direitos iguais ao do homem.<br />

Assim, como no em outros trabalhos, no cinema a mulher também inicia sua jornada, como atriz,<br />

diretora, roteirista entre outros. E é por isso que po<strong>de</strong>mos dar entrada no nosso próximo tópico<br />

on<strong>de</strong> falaremos um pouco sobre as culturas dos respectivos cinemas para em seguida continuar<br />

nosso estudo da mulher vista perante as lentes da câmera.<br />

2. História do cinema<br />

A história do cinema começa no começo do século XX, quando ainda não era<br />

reconhecido como o cinema que conhecemos hoje, mais eram eventos que tinha a predominância<br />

<strong>de</strong> imagens em movimento. Espetáculos <strong>de</strong> lanterna mágica, teatro popular, os nickelo<strong>de</strong>ons,<br />

todos eles tinham aparelhos que projetavam filmes <strong>de</strong> curiosida<strong>de</strong> cultural para várias pessoas.<br />

De acordo com Fernando Mascarello, em sua famosa obra “A história do cinema Mundial”, <strong>de</strong><br />

1895 a 1915, os 20 primeiros anos do começo do cinema, essas foram as principais formas <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>screver o início <strong>de</strong> tudo.<br />

A história do cinema faz parte <strong>de</strong> uma história mais ampla, que engloba não<br />

apenas a história das práticas <strong>de</strong> projeção <strong>de</strong> imagens, mas também a dos<br />

divertimentos populares, dos instrumentos óticos e das pesquisas com<br />

imagens fotográficas. Os filmes são uma continuação na tradição das<br />

projeções das lanternas mágicas, nas quais, já <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o século XVII, um<br />

apresentador mostrava ao público imagens coloridas projetadas numa tela,<br />

através do foco <strong>de</strong> luz gerado pela chama <strong>de</strong> querosene, com<br />

acompanhamento <strong>de</strong> vozes, música e efeitos sonoros. (MASCARELLO, 2006,<br />

p. 16)<br />

23


Os primeiros filmes eram atrações autônomas que eram passadas em diferentes locais e<br />

se encaixavam em qualquer contexto. Eram, em sua gran<strong>de</strong> maioria, compostos por uma única<br />

tomada e quase nunca possuíam uma narrativa. Esses 20 primeiros anos foram consi<strong>de</strong>rados <strong>de</strong><br />

pouco interesse para a história do cinema, pois foram <strong>de</strong>sastrosas tentativas <strong>de</strong> chegar a um<br />

filme narrativo.<br />

Noel Burch (1987), <strong>de</strong>screveu o que consi<strong>de</strong>rava serem traços <strong>de</strong> uma representação <strong>de</strong><br />

filme primitiva: composição frontal e não centralizada dos planos, posicionamento da câmera<br />

distante da situação filmada, falta <strong>de</strong> linearida<strong>de</strong> e personagens pouco <strong>de</strong>senvolvidos. Os planos<br />

abertos e cheios <strong>de</strong> <strong>de</strong>talhes, povoados por muitas pessoas e várias ações simultâneas, são a<br />

marca <strong>de</strong>sse cinema antigo, em que se diferencia bastante em relação ao cinema que<br />

conhecemos hoje. Nas palavras <strong>de</strong> Bruch: Em contraste com o "modo <strong>de</strong> representação<br />

institucional" típico <strong>de</strong> Hollywood, o modo <strong>de</strong> representação primitivo <strong>de</strong>nunciava a linguagem do<br />

cinema como um produto histórico e não necessariamente natural.<br />

Os filmes teriam aos poucos superado suas limitações iniciais e se<br />

transformado em arte ao encontrar os princípios específicos <strong>de</strong> sua linguagem,<br />

ligados ao manejo da montagem como elemento fundamental da narrativa.<br />

Historiadores como Georges Sadoul, Lewis Jacobs e Jean Mitry, apesar da<br />

elevada erudição e do <strong>de</strong>talhamento <strong>de</strong> suas análises, privilegiaram esse<br />

ponto <strong>de</strong> vista evolutivo, enten<strong>de</strong>ndo os trabalhos dos "pioneiros" do cinema<br />

como experimentações que os levariam aos "verda<strong>de</strong>iros" princípios da<br />

linguagem cinematográfica. (MASCARELLO, 2006, p. 21)<br />

24


Para o historiador Tom Gunning (2000), o cinema começa a a se dirigir ao espectador<br />

quando começa a era do “cinema <strong>de</strong> atrações’’. Inspirado na obra teatral <strong>de</strong> Sergei Eisenstein na<br />

década <strong>de</strong> 20, Gunning propõe que o cinema não tinha a habilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> contar histórias, mais sim<br />

<strong>de</strong> chamar a atenção, espantar e maravilhar o espectador. Agora, usando <strong>de</strong> novas habilida<strong>de</strong>s<br />

como, imagens panorâmicas, travelings ou close-ups, criando um espetáculo visual para quem<br />

assiste. Daí, a partir <strong>de</strong> 1907, os filmes começam a se utilizar <strong>de</strong> narrativas, e construções <strong>de</strong><br />

enredo que irão capturar mais ainda a atenção <strong>de</strong> quem assiste ao filme, pois agora irão se<br />

envolver emocionalmente com os personagens.<br />

Como essa nova época do cinema coincidiu com a era da revolução industrial, os<br />

produtores buscavam conquistar o público <strong>de</strong> todas as classes para conseguir lucros. O que fez,<br />

com que o cinema se tornar um evento popular. Como afirma Mascarelo (2006) quando diz que<br />

a indústria do cinema queria assentar sua ativida<strong>de</strong> sobre sólidas bases econômicas, precisando<br />

aumentar o preço dos ingressos, para tal tinha que atrair as classes médias, transformando o<br />

cinema no divertimento <strong>de</strong> todas as classes sociais.<br />

2.1 Cinema Hollywoodiano<br />

Ainda seguindo a obra <strong>de</strong> Fernando Mascarello, que também fala sobre o início do<br />

cinema americano, iremos expor o gênero Western, que significa oci<strong>de</strong>ntal. Esse foi o gênero<br />

mais famoso da época, com seus filmes <strong>de</strong> cowboys e faroeste, que aparecem na virada do<br />

século XIX para o século XX. Se Hollywood tornou-se a mais respeitosa indústria do cinema<br />

25


mundial, foi graças ao seu começo com esse gênero. Mascarello afirma, que esse o Western<br />

teve influência cinematográfica em vários países, observados em filmes <strong>de</strong> samurais japoneses,<br />

cangaceiros brasileiros, indianos, entre outros. Abusando da criativida<strong>de</strong> que a ficção permite,<br />

esse cinema criou movimentos históricos, imaginárias geografias, figuras míticas que vivem em<br />

um mundo violento e que buscam o equilíbrio do universo.<br />

Mitos são histórias criadas a partir da história <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong> que,<br />

repetidas ao longo do tempo, adquiriram o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> simbolizar a i<strong>de</strong>ologia<br />

daquela socieda<strong>de</strong> e <strong>de</strong> dramatizar sua consciência moral. (SLOTKIN, 1998,<br />

p.5)<br />

Como estamos falando sobre mulheres e o cinema, é importante lembrar que nesse<br />

gênero surgiram as famosas “donzelas em perigo”. Mulheres extremamente frágeis que eram<br />

normalmente raptadas por índios e que esperavam pelo seu herói, sem que lhe fossem atribuídos<br />

nenhum tipo <strong>de</strong> habilida<strong>de</strong>. Geralmente eram mulheres muito bonitas e nunca pensantes. Como<br />

Slotkin (1998, p. 206) dizia, a estrutura <strong>de</strong>ssas narrativas consistia em "um indivíduo,<br />

geralmente uma mulher, suportando passivamente os golpes do mal, esperando ser resgatado<br />

pela graça <strong>de</strong> Deus por um homem branco. Assim, surgia a mulher branca como símbolo dos<br />

valores cristãos, a repressão sexual, o casamento monogâmico heterossexual, “A mulher<br />

re<strong>de</strong>ntora”: Casta, dócil, compreensiva e confiável.<br />

Quando, em fim, o gênero começa a se popularizar, <strong>de</strong> acordo com o crítico Thomas<br />

Schatz (1981), existe uma forte preocupação em mostrar uma parte documental e histórica dos<br />

26


Estados Unidos. Os filmes citados por ele são: Os ban<strong>de</strong>irantes (1923), <strong>de</strong> James Cruze, O<br />

cavalo <strong>de</strong> ferro (1924),<br />

<strong>de</strong> John Ford, e O gran<strong>de</strong> roubo do trem (1903), <strong>de</strong> Edwin S. Porter. Estamos gradativamente<br />

saindo da mitologia e entrando na função histórica do gênero. Isso ocorreu <strong>de</strong>vido ao fato <strong>de</strong> que<br />

houve muitos acontecimentos históricos no país durante essa época (Depressão <strong>de</strong> 30, miséria,<br />

guerra fria, <strong>de</strong>senvolvimento tecnológico), o que fez com que a população mudasse em<br />

consequência os espectadores. Os personagens também tiveram <strong>de</strong> se a<strong>de</strong>quar a nova fase Até<br />

hoje ainda encontramos muitos traços <strong>de</strong> patriotismo entre os filmes <strong>de</strong> Hollywood.<br />

É nesse trecho da história do Western que vemos uma mudança importante na<br />

transformação da heroína. Agora ela é vista como um símbolo sexual, em que se torna motivo <strong>de</strong><br />

disputas entre os homens ou parceira <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s heróis.<br />

Agora uma heroína mais autoconfiante, mais atlética e mais sexy. É criada<br />

até mesmo a figura da cowgirl em The singing cowgirl (1939), dirigido por<br />

Samuel Diege e estrelado por Dorothy Page. Nos filmes "B" (filmes <strong>de</strong> baixa<br />

produção), o triângulo amoroso com dois homens que disputam o interesse da<br />

heroína torna-se um clichê. Os Westerns musicais aumentaram a participação<br />

da mocinha, tornando-a mais uma parceira do que a costumeira protagonista<br />

recatada e obediente. (MASCARELLO, 2006, p. 28)<br />

Agora, com os Estados Unidos organizados no trabalho das linhas <strong>de</strong> montagem, e<br />

diminuído a figura do homem macho e individualista surge um novo personagem: o gângster.<br />

Como o próprio Mascarello comenta, a “honra entre os ladrões” passa a ser preferível para a<br />

nova socieda<strong>de</strong>. Heróis fora-da-lei entram no gênero para enfraquecer o Westener clássico.<br />

Incluem Sete homens e um <strong>de</strong>stino (John Sturges, 1960), Os profissionais (Richard Brooks, 1966),<br />

27


Meu ódio será tua herança (Sam Peckinpah, 1969), Butch Cassidy (George Roy Hill, 1969), Os<br />

cowboys (Mark Ry<strong>de</strong>ll, 1972) e Duelo <strong>de</strong> gigantes (Arthur Penn, 1976), são exemplos <strong>de</strong> filmes<br />

com essa perspectiva.<br />

Após 1970, tudo muda para o cinema Hollywoodiano. Com a introdução do capitalismo,<br />

as novas tendências e as conquistas da minoria, temos o fim do gênero Western, quebrando <strong>de</strong><br />

vez seus mitos e valores dos quais ele surgiu. Po<strong>de</strong>mos citar o exemplo do filme O pequeno<br />

gran<strong>de</strong> homem (1970), <strong>de</strong> Arthur Penn on<strong>de</strong> os índios, antes apresentados como vilões da história,<br />

agora são aclamados. Ou então, o filme Os imperdoáveis (1992), <strong>de</strong> Clint Eastwood, que conta a<br />

história <strong>de</strong> dois cowboys que matam mulheres. É então, o fim do gênero clássico e o começo do<br />

contemporâneo que conhecemos atualmente.<br />

2.2 Cinema Bollywoodiano<br />

Assim como, na América, temos outro gran<strong>de</strong> produtor <strong>de</strong> filmes na índia. Consi<strong>de</strong>rando<br />

seu tamanho a Índia é o segundo país mais populoso do mundo e possui uma tradição cultural<br />

<strong>de</strong> 5000 anos muito forte que se mantém até hoje Além <strong>de</strong> seus vários grupos culturais e várias<br />

religiões locais e a gran<strong>de</strong> quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> línguas existentes no país. Como Amartya Sen,<br />

economista indiano, ganhador do prêmio Nobel em 1998 em seu livro Quality of Life, disse:<br />

Não é fácil pensar que num país on<strong>de</strong> se tem tantas linguagens e literaturas<br />

promissoras a dificulda<strong>de</strong> central é a da <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>m das diferenças religiosas, e<br />

aqui temos outra questão única. A gran<strong>de</strong> maioria dos indianos po<strong>de</strong> ser<br />

Hindu, mas temos mais <strong>de</strong> cem milhões <strong>de</strong> Muçulmanos... Nós temos mais<br />

28


Sikhs que qualquer outro país, mais Jains também, assim como Parses; A<br />

índia tem tido Cristãos por mais <strong>de</strong> quinze mil anos.. e enquanto o número <strong>de</strong><br />

budistas hoje possa ser pequeno, nossa religião mãe é o Budismo. Eu não<br />

acredito que possa haver um país com tanta diversida<strong>de</strong> religiosa quanto o<br />

nosso. (SEM, 1993, p 39)<br />

Com toda essa diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pessoas e culturas, o cinema indiano iniciou sua carreira<br />

precisamente em 1930 (com o cinema sonoro), como muitos outros cinemas que respondiam a<br />

contextos sociais e mudanças culturais. É nessa época que a Índia é muito afetada com a gran<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>pressão, pela segunda guerra mundial, pela sua in<strong>de</strong>pendência e pela violência <strong>de</strong> sua partição.<br />

Os filmes anteriores a está época eram sem som e em preto e branco.<br />

O cinema indiano, como a maioria dos outros cinemas, tem evoluído ao longo<br />

do tempo, respon<strong>de</strong>ndo a vários contextos sociais, cultural e <strong>de</strong>safios políticos.<br />

A fim <strong>de</strong> compreen<strong>de</strong>r a especificida<strong>de</strong> do cinema indiano, seus traços<br />

distintivos e conceitos privilegiados, temos <strong>de</strong> examinar as forças que<br />

moldaram filmes indianos e as mudanças no tema e estilo ao longo dos nove<br />

décadas <strong>de</strong> sua existência. (K. GOKULSING, 1998, p.13)<br />

O responsável pela criação do primeiro filme mudo indiano foi Dadasaheb Phalke, um<br />

homem <strong>de</strong> vários talentos que tinha carreira como pintor, fotógrafo, escritor e mágico. Seu<br />

primeiro filme for Rja Harishchandra <strong>de</strong> 1913, que veio <strong>de</strong> inspiração dos irmãos Lumiere que<br />

introduziram o cinema mudo em Bombaim em 1896.<br />

A primeira exposição <strong>de</strong> imagens em movimento que a Índia recebeu foi<br />

quando os irmãos Lumiere revelaram seis curtas-metragens sem sons, em 07<br />

<strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 1896, no Hotel Watson em Bombaim. A primeira exposição <strong>de</strong><br />

celuloi<strong>de</strong> em uma câmera por um indiano e sua consequente triagem se <strong>de</strong>u<br />

29


em 1899, quando Save Dada exibiu dois curtas-metragens projetados em um<br />

kinetoscope. Com o início <strong>de</strong> século tumultuado, com o país passando por<br />

reformas sociais e políticas, uma nova forma <strong>de</strong> entretenimento se formou na<br />

Índia – O cinema. (Shaheen Darr, 2008, s/p)<br />

Ainda <strong>de</strong> acordo com Shaheen Darr (2008), o gran<strong>de</strong> marco da história veio com o<br />

nascimento dos filmes sonoros na índia que fez com que essa indústria <strong>de</strong>sse um salto na<br />

produção <strong>de</strong> filmes. O primeiro foi Alam Ara (1931). Com muitas falas, músicas e danças que<br />

revolucionaram todos os históricos <strong>de</strong> filmes anteriores e criaram uma característica <strong>de</strong> filmes<br />

indianos, os melodramas.<br />

Para melhorar ainda mais a qualida<strong>de</strong> da produção dos filmes, surgem na década <strong>de</strong> 50<br />

os primeiros filmes a cores. Como o autor chama: a era dourada (Gol<strong>de</strong>n Age). Shaheen Darr<br />

disse: Indian cinema had its gol<strong>de</strong>n age from the 1950s to 1960s, at a time when budgets were<br />

generally lower and directors were encouraged to be inventive rather than play safe. Influential<br />

directors like Mehboob Khan, K Asif, Raj Kapoor, Guru Dutt and Bimal Roy all brought something<br />

new to cinema.<br />

Em 1970, Índia começa a combinar todos os gêneros em um só filme, com canções e<br />

danças que se tornam a parte principal dos filmes. Que nos leva a um estilo que se encontra até<br />

os dias atuais. “Em um filme <strong>de</strong> Bollywood, encontramos uma mistura e combinações <strong>de</strong> estilos<br />

que po<strong>de</strong> ser traduzido como um herói lutando contra o vilão e na mesma cena salvando a<br />

donzela e 40 dançarinos, dançando ao seu redor.” (Shaheen Darr, 2008)<br />

Em 2000, com a globalização, Bollywood se tornou popular ao redor do mundo, o que<br />

fez com que seu mercado <strong>de</strong> filmes crescesse tanto na Índia quanto no exterior (cerca <strong>de</strong> 900<br />

30


filmes por ano) e que suas qualida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> produções melhorassem muito. Filmes como Devdas,<br />

Kal Ho Naa Ho, Veer-Zaara, Dhoom 2, Khabi Alvida Naa Kehna e Om Shanti são exemplos <strong>de</strong><br />

sucessos <strong>de</strong> bilheterias.<br />

2. 3 Cinema Iraniano<br />

O Irã, ainda não é um país muito mo<strong>de</strong>rno, pois ainda vive muito preso aos seus<br />

costumes e seu cinema não é tão diferente. Eles produzem em média cerca <strong>de</strong> 100 filmes por<br />

ano. Mesmo sofrendo problemas políticos, econômicos, religiosos e <strong>de</strong> censura interna numa<br />

socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> valores rígidos. Seu principal marco são os filmes que parecem documentários,<br />

on<strong>de</strong> se mistura a ficção com a realida<strong>de</strong>. O historiador Marcos Kahtalian, se questiona em sua<br />

tese Cinema Fundamentalista: O cinema Iraniano após a revolução islâmica, em que diz: “... <strong>de</strong><br />

que modo um dos países mais fechados, mais <strong>de</strong>sconhecidos do mundo, é capaz <strong>de</strong> em 20<br />

anos produzirem uma das cinematografias mundiais mais originais e internacionalmente<br />

reconhecidas?<br />

O autor começa explicando que o cinema iraniano se enquadra no que se vem<br />

chamando <strong>de</strong> terceiro cinema. Ele cita que o terceiro cinema é um texto empregado pela crítica<br />

cinematográfica inglesa e americana <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a década <strong>de</strong> 80 e “que busca nos mostrar um cinema<br />

<strong>de</strong> terceiro mundo que se opõe ao imperialismo e a opressão <strong>de</strong> classes, em todas as suas<br />

ramificações e manifestações”. A autora chamada Barbara Horlow, em sua obra Resistance<br />

Literature, explica com suas palavras o que é o terceiro mundo:<br />

O termo Terceiro Mundo começou a ser utilizado por <strong>de</strong>mógrafos e geógrafos<br />

franceses nos anos 50 como a outra peça no quebra-cabeças do mundo<br />

pós- Segunda Guerra Mundial, em relação a um Primeiro Mundo capitalista e<br />

31


oci<strong>de</strong>ntal e um Segundo Mundo socialista. Nesta época, talvez com o valor <strong>de</strong><br />

eufemismo, ele substitui a i<strong>de</strong>ia mais difusa, menos organizada e mais<br />

traumática <strong>de</strong> "países pobres". A partir das lutas <strong>de</strong> in<strong>de</strong>pendência das<br />

colônias europeias na África e na Ásia, o termo adquire certo prestígio. A<br />

unida<strong>de</strong> pretendida por ele traz, pois, em seu bojo, uma dimensão<br />

revolucionária. A dimensão <strong>de</strong> relevar as diferenças em prol <strong>de</strong> um i<strong>de</strong>al<br />

libertário legitimaria então a noção <strong>de</strong> Terceiro Mundo. Na conferência <strong>de</strong><br />

Bandung, em 1955, o termo teve a sua primeira expressão política oficial,<br />

quando se reuniram todas as nações "não-alinhadas" – ou seja, nem ao<br />

Primeiro Mundo, nem ao Segundo. (HARLOW,1987, s/p)<br />

A história do cinema Iraniano, que vamos acompanhar do livro Iranian cinema a political<br />

history (2006), <strong>de</strong> Hamid Reza Sard, começa em 1900 quando Xá Mozaffar al-Din, viajando pela<br />

Europa adquire um cinematógrafo que era projetado somente para os grupos <strong>de</strong> elite e para a<br />

corte real. É somente da década <strong>de</strong> 30 a 70 que o cinema atinge a massa da população iraniana.<br />

O primeiro filme documentado é A garota da Tribo Lor (1933), uma imitação das ficções<br />

produzidas na Turquia e no Egito. Mais foi somente em 1969 com o lançamento do filme A vaca,<br />

que esse cinema ganha seu gênero mais notável o Motafävet (cinema diferente), que impôs o<br />

estilo realista em filmes <strong>de</strong> produção iraniana. O escritor Eric Egan comenta sobre esse gênero,<br />

em seu livro The films of Makhmalbaf :<br />

Esses filmes foram importantes no sentido em que <strong>de</strong>safiaram o formulado e<br />

indulgente escapismo do cinema iraniano comercial. Aumentaram o perfil do<br />

cinema iraniano no estrangeiro, e procuraram <strong>de</strong>senvolver novas e<br />

experimentais formas ao buscar se engajar criticamente e explorar as<br />

realida<strong>de</strong>s sociais, políticas e culturais do passado e do presente iraniano.<br />

(EGAN, 2005: 32)<br />

32


Com a revolução islâmica o país muda em 1979 e junto <strong>de</strong>le o cinema iraniano. O Xá<br />

Reza Pahlevi é <strong>de</strong>posto, seu processo <strong>de</strong> oci<strong>de</strong>ntalização é banido e os islâmicos assumem o<br />

po<strong>de</strong>r com o seu lí<strong>de</strong>r Aiatolá Khomeini. Esses novos lí<strong>de</strong>res contestam que os filmes até então<br />

produzidos no Irã eram contra os valores religiosos <strong>de</strong>vido à contaminação com os valores<br />

oci<strong>de</strong>ntais.<br />

Num primeiro momento, houve a <strong>de</strong>struição <strong>de</strong> algumas salas <strong>de</strong> exibição e a<br />

censura recaiu tanto sobre os filmes estrangeiros quanto sobre os filmes<br />

nacionais. Mas não fazia parte dos planos do novo regime acabar com o<br />

cinema, e sim usá-lo a seu favor. Khomeini apoiou o seu <strong>de</strong>senvolvimento<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> que alinhado aos interesses da nascente república islâmica. A i<strong>de</strong>ia era<br />

usar o cinema como instrumento i<strong>de</strong>ológico para combater a oci<strong>de</strong>ntalização<br />

da socieda<strong>de</strong> iraniana e contribuir para sua islamização. (PEREIRA, Silvia,<br />

2009, p. 51)<br />

Então, o cinema revolucionário imposto pelo ministério procurava a qualquer custo um<br />

estilo que fugisse dos padrões oci<strong>de</strong>ntais ou dos filmes <strong>de</strong> Hollywood. E assim nasce, o cinema<br />

<strong>de</strong> liberda<strong>de</strong> intelectual que procuravam inspirar os espectadores a seguir o Islamismo e propagá-<br />

lo. Como Sard comenta: Esse cinema objetivava dizer a verda<strong>de</strong>, buscar outra linguagem capaz<br />

<strong>de</strong> enviar uma mensagem social ao espectador. O trabalho do cinema revolucionário não <strong>de</strong>veria<br />

limitar-se a uma <strong>de</strong>núncia negativa, nem apelar para a reflexão; ele <strong>de</strong>ve ser uma convocação<br />

para a ação. (SARD, 2006 : 173)<br />

Com o início da década <strong>de</strong> 90, o país se vê obrigado a mudar os rumos tomados<br />

anteriormente <strong>de</strong>vido a pouca aceitação dos seus filmes no exterior. O filme O gosto <strong>de</strong> Cereja,<br />

33


<strong>de</strong> Abbas Kiarostami (1997), ganhador do prêmio palma <strong>de</strong> ouro no Festival <strong>de</strong> Cannes, vem<br />

mudar essa realida<strong>de</strong>. O Irã passa a se ver <strong>de</strong>ntro do mercado <strong>de</strong> filmes <strong>de</strong> novo com o estilo e<br />

características que conhecemos hoje. Segundo Egan, os cineastas da época buscavam<br />

representar o real e a preocupação com a posição do indivíduo na socieda<strong>de</strong>.<br />

34


Capítulo 2 – Teorias do olhar<br />

Introdução<br />

Esse capítulo preten<strong>de</strong> analisar <strong>de</strong>finitivamente como a mulher vem sendo retratada no<br />

cinema. Iremos, portanto, abordar o cinema Hollywoodiano, para que possamos enten<strong>de</strong>r e<br />

exemplificar os estudos dados pelos teóricos feministas. Em gran<strong>de</strong> maioria vamos nos basear<br />

pelo livro “ A mulher e o cinema” da célebre escritora Ann Kaplan, pioneira nos estudos das<br />

mulheres no cinema e da produção cinematográfica feminista.<br />

No livro, a autora divi<strong>de</strong> sua pesquisa em duas partes. Primeiro, como ela cita, fará o<br />

uso da metodologia psicanalítica e a análise semiótica dos filmes escolhidos, para revelar <strong>de</strong> que<br />

modo o olhar masculino dominante relega a mulher. E em seguida dará suas próprias conclusões<br />

em relação ao mundo não cinematográfico.<br />

Des<strong>de</strong> os primeiros movimentos <strong>de</strong> libertação feminina, as mulheres procuraram estudar a<br />

representação da sexualida<strong>de</strong> feminina nas artes. E essa teoria surgiu <strong>de</strong> preocupações na<br />

reavaliação <strong>de</strong> sua própria cultura. Uma das primeiras críticas feministas (Sexual Politics/Política<br />

Sexual, <strong>de</strong> Kate Millett, 1970) abordava uma imagem sociológica, como disse Ann Kaplan,<br />

examinando entre os trabalhos imaginativos, os papéis sexuais ocupados pela mulher. Avaliando-<br />

os como positivos ou negativos. E em seguida a análise influenciada pelos psicanalistas para a<br />

produção da arte. Para a autora é, portanto, <strong>de</strong> extrema importância essa psicanálise como<br />

ferramenta para que possamos <strong>de</strong>svendar os segredos da nossa socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong>ntro do patriarcado.<br />

35


As formas <strong>de</strong> pensar sobre a imagem, a sociologia e a semiologia, correspon<strong>de</strong>m nesse<br />

contexto a abordagens da crítica feminista. A sociologia se implica no estudo das pessoas na<br />

socieda<strong>de</strong>, o que elas aparentam ser, no caso feminino, nas figuras <strong>de</strong> mãe, donas <strong>de</strong> casa, o<br />

convívio social e etc. Já a semiologia, se refere à ciência dos signos. O que realmente querem<br />

dizer por <strong>de</strong> trás da metáfora. Ela aplicada no cinema, explica como o filme se comunica <strong>de</strong>ntro<br />

do patriarcalismo (<strong>de</strong>sejo, sexualida<strong>de</strong>, perigo etc.). Ou seja, para Ann Kaplan a mulher no<br />

cinema é mostrada como uma conotação, um mito que é representado para o homem e não o<br />

que realmente é.<br />

1. O feminino como o sujeito do cinema<br />

Seu discurso (seus significados, como ela po<strong>de</strong>ria produzi-los) é suprimido<br />

em favor <strong>de</strong> um discurso estruturado pelo patriarcado no qual sua verda<strong>de</strong>ira<br />

significação foi substituída por conotações que servem às necessida<strong>de</strong>s do<br />

patriarcado. Por exemplo, a frase “Uma mulher está se <strong>de</strong>spindo”, ou a<br />

imagem <strong>de</strong> uma mulher que se <strong>de</strong>spe, não po<strong>de</strong> permanecer ao nível<br />

<strong>de</strong>notativo da informação factual, é imediatamente elevada ao nível conotativo<br />

– sua sexualida<strong>de</strong>, sua <strong>de</strong>sejabilida<strong>de</strong>, sua nu<strong>de</strong>z, sendo objetificada para a<br />

gratificação do macho. (KAPLAN, 1995, p. 38)<br />

Robert Stam (2003), afirma que vários teóricos dos anos 70 ficaram impressionados com<br />

o caráter psíquico que a “impressão da realida<strong>de</strong>” trazia nas telas do cinema. Jacques Aumont et.<br />

Al. (1995) <strong>de</strong>staca que o espectador po<strong>de</strong> ser “preso” rapidamente por alguma sequência do filme<br />

sem ter nenhuma relação com o personagem ou com seu papel na narrativa. Nessa estrutura,<br />

tanto o homem como a mulher po<strong>de</strong>m se i<strong>de</strong>ntificar na situação imediata do filme, não por<br />

aspectos psicológicos, mais na narrativa <strong>de</strong>senvolvida.<br />

36


... basta o espaço narrativo <strong>de</strong> uma sequência ou <strong>de</strong> uma cena para que<br />

o espectador nele encontre o seu lugar; basta que nessa cena se<br />

inscreva uma re<strong>de</strong> estruturada <strong>de</strong> relações, uma situação. A partir <strong>de</strong><br />

então, pouco importa o espectador ainda não conhecer os personagens:<br />

nessa estrutura racional, que imita uma relação intersubjetiva qualquer, o<br />

espectador vai imediatamente <strong>de</strong>tectar um certo número <strong>de</strong> lugares,<br />

dispostos em uma certa or<strong>de</strong>m, <strong>de</strong> uma certa maneira, o que é a<br />

condição necessária e suficiente para qualquer i<strong>de</strong>ntificação( AUMONT et.<br />

al. 1995, p.269)<br />

Para Jean-Louis Braudy (apud STAM, 2003) o encaminhamento da Semiologia do<br />

Cinema rumo à psicanálise, ne década <strong>de</strong> 70, abriu espaço para uma crítica da utilização do<br />

cinema, como instrumento <strong>de</strong> dominação. As revistas francesas Cahiers <strong>de</strong> Cinema e Cinethique,<br />

<strong>de</strong>senvolveram um movimento <strong>de</strong> crítica ao cinema narrativo, objetivando encontrar em<br />

profundida<strong>de</strong> os mecanismos <strong>de</strong> "ilusão <strong>de</strong> realida<strong>de</strong>" presentes no "aparelho <strong>de</strong> base" (câmera,<br />

projetor, sala-escura). Os autores criticam o Realismo, ao consi<strong>de</strong>rar que o mundo não é pleno<br />

<strong>de</strong> sentido, que o homem não é capaz <strong>de</strong> capturar o sentido do mundo, e, que a linguagem só é<br />

capaz <strong>de</strong> expressar valores <strong>de</strong> quem a expressa.<br />

Não po<strong>de</strong>mos <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> citar “a teoria do espelho” proposta por Lacan. Muito utilizada por<br />

teóricos do cinema, que diz que o sujeito se i<strong>de</strong>ntifica com sua figura não real (no espelho),<br />

através da unida<strong>de</strong> corporal, quando sua i<strong>de</strong>ntificação pela sexualida<strong>de</strong> ainda não foi<br />

<strong>de</strong>senvolvida (ocorre em crianças entre 6 a 18 meses), colocando a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma relação<br />

dupla entre o sujeito e o objeto.<br />

37


...seu objetivo é fornecer uma teoria genética do “eu” <strong>de</strong>finida como a<br />

reflexão que [...] trata a relação do sujeito com seu próprio corpo em termos<br />

<strong>de</strong> sua i<strong>de</strong>ntificação com uma imagem, que é a relação psíquica par<br />

excellence [...] o estádio do espelho está bem longe <strong>de</strong> apenas conotar um<br />

fenômeno que se apresenta no <strong>de</strong>senvolvimento da criança. Ele ilustra o<br />

caráter <strong>de</strong> conflito da relação dual.” (p. 15). Dessa forma, o estágio do<br />

espelho acaba por <strong>de</strong>finir algo que não se refere nem a um simples estágio,<br />

nem somente à experiência do espelho, pois o que está em jogo no final das<br />

contas é o advento da alterida<strong>de</strong> (LACAN, 1951, p. 2).<br />

Voltando a Aumont et. al. (1995) é através <strong>de</strong>ssa imagem do semelhante, do modo<br />

imaginário que o ser irá construir toda sua i<strong>de</strong>ntificação. Todo ser humano, homem ou mulher,<br />

tem gran<strong>de</strong>s percepções visuais e auditivas, assim como também uma recepção passiva ou<br />

narcísica. A análise psicanalítica po<strong>de</strong> ter oprimido a mulher no sentido <strong>de</strong> ter feito aceitarmos<br />

uma posição contrária do que é ser um sujeito e ter autonomia. Se esse é o caso, <strong>de</strong>vemos<br />

tomar conhecimento <strong>de</strong> como a psicanálise funciona para reprimir o que po<strong>de</strong>ríamos ser.<br />

A utilização <strong>de</strong>sse estudo para <strong>de</strong>sconstruir os filmes <strong>de</strong> Hollywood, nos possibilita ver os<br />

mitos patriarcais, como por exemplo, os melodramas. Que Kaplan cita, como sendo um gênero<br />

específico, <strong>de</strong>stinado para mulheres, que funcionam para mostrar as limitações que a família<br />

capitalista impõe ao feminino. Como exemplo, na questão da educação diferenciada e a mulher<br />

aceitar tal fato como natural e inevitável. As relações <strong>de</strong> amor ilícito (mãe e filho, marido e<br />

esposa e etc.) que formam o melodrama, que é um gênero totalmente excluído dos filmes<br />

dominantes <strong>de</strong> Hollywood, os filmes <strong>de</strong> gângster e faroeste.<br />

A autora ainda cita Peter Brooks (1976) e seu livro Melodramatic Imagination, que fala<br />

que mesmo os filmes <strong>de</strong> gângster e faroeste visão produzir funções <strong>de</strong> tragédias. Porém ele diz<br />

38


que atualmente vivemos em um período em que “a produção <strong>de</strong> mitos é pessoal e individual” e,<br />

portanto cada gênero constitui sua própria forma <strong>de</strong> ver esse drama. Mesmo que para Brooks<br />

para ser consi<strong>de</strong>rado o melodrama, é essencial que tenhamos uma “or<strong>de</strong>m social a ser purgada,<br />

um conjunto <strong>de</strong> imperativos éticos que é preciso elucidar”.<br />

Mesmo sabendo que os filmes constituem melodramas, é importante para os filmes <strong>de</strong><br />

Hollywood que as mulheres fiquem excluídas dos papéis principais na maioria dos gêneros<br />

cinematográficos e só venham a ter <strong>de</strong>staque nos melodramas familiares. Laura Mulvey ( cineasta<br />

e crítica inglesa que escreveu o livro “Notes on Sirk and Melodrama”, 1976) também vê o<br />

melodrama como concernente as questões edipianas. Para ela o melodrama é antes <strong>de</strong> tudo uma<br />

forma feminina que corrige os gêneros que <strong>de</strong>stacam a ação masculina.<br />

O melodrama familiar é importante por explorar emoções recônditas,<br />

amarguradas e <strong>de</strong>silusões bem conhecidas das mulheres... O simples<br />

reconhecimento tem uma importância estética. Há uma confusa satisfação em<br />

testemunhar a maneira como a diferença sexual no patriarcado está carregada,<br />

explosiva, irrompendo dramaticamente em violência em sua própria seara<br />

específica que é a família. (Mulvey, 1976, p.54)<br />

Então, para explicar o porquê que as mulheres se sentem atraídas pelo melodrama,<br />

Kaplan comenta sobre as características da crise edipiana da menina. Citando, portanto, Jacques<br />

Lacan (psicanalista francês), vemos que a menina é obrigada a afastar-se da fase ilusória com a<br />

Mãe quando ainda é pequena e entrar no mundo simbólico que envolve sujeito e objeto. Nesse<br />

lugar <strong>de</strong> objeto ela se transforma no <strong>de</strong>sejo masculino, aparecendo <strong>de</strong> modo passivo. Assim, seu<br />

prazer sexual só é construído em torno <strong>de</strong> sua objetificação.<br />

39


O olhar intrinsecamente prazeroso em seu formato, po<strong>de</strong> se tornar ameaçador<br />

em conteúdo e é a mulher, <strong>de</strong>ntro do contexto da representação e imagens<br />

fílmica, que cristaliza esse paradoxo. É o lugar do olhar e a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

variar e o expor , que <strong>de</strong>fine o cinema. Ele se divi<strong>de</strong> nos filmes entre o polo<br />

ativo (masculino) e o passivo (feminino). O <strong>de</strong>terminante olhar masculino<br />

projeta sua fantasia na figura feminina que por sua vez é objetivada e<br />

caracterizada no cinema. ( COSTA, Maria Helena, 2008, p.4)<br />

Em seu artigo Visual Pleasure and Narrative Cinema (1975), Laura Mulvey entedia as<br />

mulheres como inseridas em uma or<strong>de</strong>m falocêntria (Falo, ao qual Lacan também se refere é<br />

quem <strong>de</strong>tém o po<strong>de</strong>r. Em sua época, quem <strong>de</strong>tinha o falo era o homem, já que a socieda<strong>de</strong> se<br />

encontrava no po<strong>de</strong>r das mãos masculinas) Para ela, os filmes Hollywoodianos (principalmente os<br />

produzidos entre 1930 e 1950) juntaram o prazer visual e o erótico <strong>de</strong>ntro da linguagem do<br />

patriarcalismo. Desenvolvendo o enfoque nos dramas humanos, no corpo humano e em sua<br />

forma, incitando a curiosida<strong>de</strong> e o fascínio em olhar para a tela e pensar no real.<br />

Discute-se, portanto, dois conceitos freudianos: o voyeurismo e o fetichismo. Essa<br />

<strong>de</strong>sor<strong>de</strong>m sexual que consistem na observação das pessoas em situações íntimas sem que<br />

soubessem que estavam sendo observadas e a atração compulsiva por certa parte do corpo,<br />

objetos ou peças <strong>de</strong> vestuário. Esses conceitos são usados para explicar como a mulher é<br />

representada em sua imagem fílmica e sua relação com o observador.<br />

40


A imagem da mulher nos filmes, principalmente naqueles do cinema clássico<br />

Hollywoodiano, é o objeto indutor do voyeurismo e também um fetiche.<br />

(Mulvey, 1976, s/p)<br />

A passivida<strong>de</strong> das fantasias femininas é reforçada pela maneira como as mulheres são<br />

posicionadas nos filmes. Ann Kaplan nos apresenta em seu livro um ensaio chamado “The<br />

woman´s film: possession and adress” <strong>de</strong> Mary Ann Doane (1984), que constrói uma espectadora<br />

feminina que se faz obrigada a participar <strong>de</strong> uma fantasia masoquista. A diretora do ensaio<br />

ressalta que o corpo feminino é a sexualida<strong>de</strong> que fornece o objeto erótico para o expectador<br />

masculino. Nos filmes melodramáticos (ou para mulheres) o olhar <strong>de</strong>ve ser <strong>de</strong>serotizado, mais<br />

quando isso é feito não temos o apelo erótico em corpo nenhum. Ou seja, o prazer é recusado,<br />

na i<strong>de</strong>ntificação imaginária, o que para o homem seria a fase do espelho.<br />

Os heróis masculinos i<strong>de</strong>alizados da tela <strong>de</strong>volvem ao espectador<br />

masculino seu ego mais perfeito espelhado, junto com uma sensação <strong>de</strong><br />

domínio e controle. Para a mulher, ao contrário, são dadas apenas figuras<br />

vitimadas e impotentes que, longe <strong>de</strong> serem perfeitas, ainda reforçam um<br />

sentimento básico preexistente <strong>de</strong> inutilida<strong>de</strong>. (KAPLAN, 1995, p.50)<br />

Portanto, po<strong>de</strong>mos dizer que a mulher é codificada nos filmes num sistema visual e<br />

erótico como objeto sexual que é admirado pelo <strong>de</strong>sejo masculino. Para Maria Helena Braga<br />

Costa (2008), a mulher no cinema tem funcionado <strong>de</strong> três formas: 1 – o olhar da câmera na<br />

situação que está sendo filmada (chamada <strong>de</strong> evento pós-fílmico); 2 – o olhar do homem <strong>de</strong>ntro<br />

41


da narrativa, como objeto erótico do filme; 3 – como objeto <strong>de</strong> contemplação fora <strong>de</strong>le (para o<br />

espectador).<br />

A mulher é inserida na cultura patriarcal como o “outro” e é posicionada<br />

numa or<strong>de</strong>m simbólica, na qual o homem po<strong>de</strong> viver suas fantasias e<br />

obsessões através do comando linguístico, impondo-o à imagem<br />

silenciosa da mulher que permanece fixa em seu lugar <strong>de</strong> sustentáculo<br />

mais não <strong>de</strong> produtor <strong>de</strong> significado” (MULVEY, 1985, p.305)<br />

A mulher funciona como reguladora <strong>de</strong> tensões entre os dois olhares, masculino e<br />

feminino, que mais a frente irei explicar mais <strong>de</strong>talhadamente. Os filmes geralmente começam<br />

com a mulher sendo apresentada a serviço do olhar, um objeto sexual, como vimos. É uma<br />

imagem glamorosa, elegante e sensual, que vai se per<strong>de</strong>ndo ao longo da narrativa a partir do<br />

momento que a personagem se apaixona pelo protagonista. Ao se tornar proprieda<strong>de</strong> do homem,<br />

consequentemente ela <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> frequentar os lugares <strong>de</strong> antes, começa a se vestir <strong>de</strong> uma forma<br />

diferente, e per<strong>de</strong> suas qualida<strong>de</strong>s (glamour e elegância). Ou seja, se torna reprimida ao seu<br />

companheiro. Alimentando o gosto das duas visões.<br />

...na fantasia masculina, “a sexualida<strong>de</strong> permanece na superfície” e o<br />

homem “conserva seu próprio papel e sua gratificação no contexto do<br />

cenário. O “eu” da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> permanece”. Mas a fantasia feminina<br />

primeiro <strong>de</strong>serotiza <strong>de</strong>pois, “exige que a mulher assuma a posição <strong>de</strong><br />

espectadora, excluída da ação”. Assim, a menina dá um jeito, como<br />

diz Freud, <strong>de</strong> “escapar das exigências do lado erótico <strong>de</strong> sua vida<br />

como um todo”. (KAPLAN, 1995, p.50)<br />

42


2.1 O olhar masculino<br />

Enten<strong>de</strong>mos que a mulher é objetivada e vista como <strong>de</strong>sejo sexual masculino. Mas qual<br />

é a visão do homem em relação a esse conceito? Nessa i<strong>de</strong>ologia, o homem real não consegue<br />

se vir ou se colocar na posição <strong>de</strong> objeto sexual. Portanto, nos filmes os personagens que são<br />

homens relutam em olhar o seu semelhante como objeto sexual. O que ocorre é que ele controla<br />

a fantasia fílmica e também se coloca como representante do po<strong>de</strong>r se pondo no lugar da<br />

“imagem” com qual o espectador se i<strong>de</strong>ntifica. I<strong>de</strong>ntificando-se com o protagonista masculino do<br />

filme. Transforma seu ego i<strong>de</strong>al no personagem que está na tela <strong>de</strong> maneira que o po<strong>de</strong>r do<br />

protagonista exercido <strong>de</strong>ntro da narrativa passa a se assemelhar com seu próprio po<strong>de</strong>r sexual.<br />

A presença social <strong>de</strong> um homem está sempre relacionada a promessa <strong>de</strong><br />

po<strong>de</strong>r que ele encarna, seja econômico, sexual, moral, físico ou<br />

temperamental. Esse po<strong>de</strong>r é exterior ao próprio homem, po<strong>de</strong>ndo, inclusive,<br />

ser fabricado. O importante é que ele possa aparentar um po<strong>de</strong>r que exerce<br />

sobre outros. (RIBEIRO, 2006, p. 35)<br />

Ann Kaplan (1995), volta aos conceitos freudianos básicos para mostrar a visão<br />

masculina. Para ela, o voyeurismo e o fetichismo são mecanismos que o cinema usa para<br />

construir essa visão e os espectadores, pela a crítica, são consi<strong>de</strong>rados voyeurs. “Pelo mesmo<br />

motivo que leva os garotinhos a espiarem pelo buraco da fechadura, para conseguirem<br />

gratificação sexual ao pensar nessas ativida<strong>de</strong>s entra em ação quando o homem já adulto assiste<br />

a filmes”.<br />

43


As atitu<strong>de</strong>s aparentemente contraditórias <strong>de</strong> glorificação e <strong>de</strong>preciação<br />

apontadas por Horney, não passam <strong>de</strong> um reflexo da necessida<strong>de</strong> urgente <strong>de</strong><br />

aniquilar o pavor que a mulher inspira. No cinema, os mecanismos gêmeos,<br />

fetichismo e voyeurismo, representam duas maneiras <strong>de</strong> lidar com o pavor....<br />

o voyeurismo constrói a beleza física do objeto, enquanto o fetichismo implica<br />

no prazer que vem do controle do domínio ou do castigo da mulher por ser<br />

castrada. (KAPLAN, apud MULEY, 1995, p.55)<br />

Os psicanalistas afirmam, portanto, que in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> qual seja o motivo, medo da<br />

castração (Freud) ou a tentativa <strong>de</strong> negar a existência do órgão genital feminino (Horney) – “Os<br />

homens estão empenhados em encontrar o pênis na mulher”. O que Kaplan também cita é que<br />

as críticas <strong>de</strong> cinema feministas viram “esse” fenômeno como o fetichismo. A câmera fetichiza a<br />

forma menina, atribuindo-lhe um falo a fim <strong>de</strong> disfarçar a ameaça que a mulher constitui a figura<br />

masculina. Ou seja, o homem transforma a figura representativa num fetiche para torná-la menos<br />

ameaçadora.<br />

2.2 O olhar feminino<br />

Como estávamos discutindo antes, a teoria <strong>de</strong> vários escritores e psicanalistas é <strong>de</strong> que<br />

a mulher é mostrada nos filmes com uma intenção <strong>de</strong> aparecer sexualmente para o homem e se<br />

<strong>de</strong>ixar capturar numa atitu<strong>de</strong> passiva. O homem, portanto se projeta no personagem principal<br />

ativo e sente prazer como se fosse o seu “eu” real. E as mulheres se projetam em quê?<br />

44


De acordo com Lacan (1976) e sua teoria edipiana feminina, a mulher não se submete a<br />

mesma visão <strong>de</strong> querer se colocar no lugar do personagem, como o homem faz. Isso porque, ela<br />

já quebra sua unida<strong>de</strong> ilusória na fase pré-lingüística, quando põe culpa na sua mãe por não<br />

possuir o falo. E segue adiante sempre buscando a atenção do gênero masculino. Portanto,<br />

nessa posição, a mulher só po<strong>de</strong> ter seu prazer sexual com sua própria objetificação.<br />

Na prática, esse masoquismo raramente resulta em algo além <strong>de</strong> uma<br />

tendência da mulher para ser passiva nas relações sexuais; mas na esfera do<br />

mito, o masoquismo é sempre proeminente. Po<strong>de</strong>ríamos dizer que ao se<br />

projetar fantasiosamente no erótico, a mulher se coloca ou como <strong>de</strong>positária<br />

passiva do <strong>de</strong>sejo masculino, ou, afastando-se como espectadora <strong>de</strong> uma<br />

outra mulher que é <strong>de</strong>positária passiva <strong>de</strong> <strong>de</strong>sejos masculinos e <strong>de</strong> atos<br />

sexuais. (KAPLAN, 1995, p.48)<br />

Ann Kaplan, cita Nancy Friday, uma autora pioneira <strong>de</strong> falar sobre a liberda<strong>de</strong> sexual<br />

feminina. Ela diz que em seus livros a autora afirma que nas narrativas as quais as mulheres cria<br />

situações para seu próprio prazer sexual, ou algo é feito a ela, ou ela é feita <strong>de</strong> objeto sexual<br />

masculino. Frequentemente a prazer no anonimato, ou num homem <strong>de</strong>sconhecido, dificilmente a<br />

mulher inicia a ativida<strong>de</strong> sexual. E em quase todas as fantasias é obe<strong>de</strong>cido o mo<strong>de</strong>lo domínio-<br />

submissão, com a mulher na segunda posição.<br />

É bem verda<strong>de</strong> que se formos atrás das pesquisas <strong>de</strong> fantasias lésbica, vamos nos<br />

<strong>de</strong>parar com mulheres que ocupam ambas posições. A mulher que sonha em dominar a outra,<br />

45


forçando ao sexo, quanto a <strong>de</strong> ser dominada. Ou seja, ela também po<strong>de</strong> ocupar a posição <strong>de</strong><br />

personagem ativo.<br />

As fantasias lésbicas sugerem que a posição feminina ou não é tão monolítica<br />

quanto os críticos costumavam afirmar ou que a mulher ocupa a posição<br />

“masculina” quando se torna dominante. Qualquer que seja o caso, o<br />

predomínio é do mo<strong>de</strong>lo domínio-submissão como um excitante sexual.<br />

(KAPLAN, 1995, p.48)<br />

A autora continua dando exemplos dos livro <strong>de</strong> Nancy Friday, quando ela fala que os<br />

homens também tem fantasias <strong>de</strong> serem possuídos por mulheres agressivas, como empregadas,<br />

enfermeiras, professoras entre outras. Ou seja, o que Ann Kaplan tenta concluir em seu livro A<br />

mulher e o cinema, é que o sistema é <strong>de</strong> domínio-submissão. Não importando se o personagem<br />

ativo se o homem ou a mulher. Mas a partir das décadas <strong>de</strong> 70 e 80, alguns filmes começam a<br />

mudar o mo<strong>de</strong>lo do ativo masculino para o feminino, mesmo que discretamente. São filmes como<br />

Os embalos <strong>de</strong> sábado a noite, O cowboy do asfalto, Vivendo cada momento. Que trazem as<br />

telas os “galãs” como objeto do olhar feminino.<br />

Mas é significativo que todos esses filmes, quando o homem <strong>de</strong>ixa o papel<br />

tradicional, em que controla a ação e assume o <strong>de</strong> objeto sexual, a mulher<br />

adota o papel “masculino” <strong>de</strong> dono do olhar e iniciador da ação. Quase<br />

sempre per<strong>de</strong>ndo, ao fazê-lo, as características femininas tradicionais – não<br />

aquelas <strong>de</strong> sedução, mas antes as <strong>de</strong> bonda<strong>de</strong>, humanida<strong>de</strong>, maternida<strong>de</strong>.<br />

(KAPLAN, 1995, p. 51)<br />

46


Ainda citando o artigo <strong>de</strong> Maria Helena Braga, sobre os estudos <strong>de</strong> Kaplan, nessa nova<br />

fase em que os papéis se invertem, a mulher é caracterizada por três tipos, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a primeira<br />

fase do cinema, até os dias atuais. São esses tipos: 1) A mulher cúmplice, que renuncia seus<br />

sentimentos pelo do homem e é muito frágil, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte. 2) A mulher resistente, que surge no<br />

século XX, que entrar no mercado <strong>de</strong> trabalho e tem i<strong>de</strong>ais igualitários. 3) E a mulher pós-<br />

mo<strong>de</strong>rna, que encontrou seu espaço na socieda<strong>de</strong>, conquistou sua liberda<strong>de</strong> e não se importa<br />

com conceitos antigos ligados a mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>, como sexo antes do casamento, homossexualismo,<br />

gravi<strong>de</strong>z in vitro e etc. Essas características serão muito importantes para nosso estudo porque<br />

vamos usá-las nas personagens da análise fílmica do capítulo três.<br />

3 Pré-análise fílmica <strong>de</strong> Ann Kaplan<br />

Para continuar com a compreensão da sua teoria, a professora <strong>de</strong> estudos femininos no<br />

cinema, Ann Kaplan, passa para uma outra fase <strong>de</strong> ensinamento, que é através <strong>de</strong> exemplos<br />

fílmicos. Para tanto, iremos discutir três filmes hollywoodianos que a autora analisou, cujas<br />

personagens representarão posicionamentos femininos <strong>de</strong>ntro da narrativa. Sem esquecer <strong>de</strong><br />

analisar também os períodos históricos ou <strong>de</strong> formação do filme, que po<strong>de</strong>rão influenciar na<br />

representação feminina. Os filmes escolhidos foram: A dama das camélias (1936) – Diretor<br />

George Cukor; A Vênus loura (1932) – Von Sternberg; A dama <strong>de</strong> Xangai (1946) – Orson Welles.<br />

3.1 A dama das Camélias<br />

47


Nessa análise, a autora começa explicando que esse filme po<strong>de</strong> perfeitamente ser usado<br />

para <strong>de</strong>monstrar como a mulher foi relegada ao silêncio do po<strong>de</strong>r controlador masculino. Primeiro<br />

por ser um melodrama baseado em um clássico <strong>de</strong> Alexandre Dumas, La Dame aux camélias<br />

1849. Segundo porque temos aqui a apresentação <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> relacionamentos antigos entre<br />

o homem e a mulher, i<strong>de</strong>ias sobre a família, conflitos <strong>de</strong> classes e uma i<strong>de</strong>ologia burguesa que<br />

montam a fase <strong>de</strong> romantismo dominado pelo melodrama.<br />

Há, portanto, aspectos particulares <strong>de</strong>sse período romântico que a peça<br />

focaliza (a vida boêmia da Paris <strong>de</strong> 1850) que é historicamente importante<br />

para <strong>de</strong>terminar um certo momento quando, como resultado da revolução<br />

industrial, as socieda<strong>de</strong>s oci<strong>de</strong>ntais estavam num estado <strong>de</strong> transição que<br />

inevitavelmente perturbava os tradicionais papéis sexuais. A dicotomia virgem-<br />

prostituta (evi<strong>de</strong>nte nas representações oci<strong>de</strong>ntais da mulher <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os tempos<br />

antigos) tomava então a forma que dominou o melodrama clássico. (KAPLAN,<br />

1995, p.60)<br />

O filme foi feito na década <strong>de</strong> 30 e tinha a intenção <strong>de</strong> entreter o público, fazendo com<br />

que se esquecessem da <strong>de</strong>pressão social da época. Nascia, então, um melodrama que abusava<br />

<strong>de</strong> sentimentalismo entre Greta Garbo e Robert Taylor. A propaganda do filme dizia: “Seu<br />

coração baterá mais forte à medida que for dominado pelo excitamento; suas emoções voarão <strong>de</strong><br />

volta a Paris.” As críticas, por sua vez, estava completa <strong>de</strong> referências <strong>de</strong> mulheres chorando na<br />

plateia. Foi um avanço feito no cinema por ter abordado um tema que na época era muito<br />

impróprio, a cortesã. Como Stephen S. Stanton (1957) coloca:<br />

48


Em 1852, as cortesãs mesmo na França, não eram aceitas pela classe média.<br />

Foi um empreendimento audacioso mostrar no palco uma cortesã que fora<br />

uma celebrida<strong>de</strong> pública e ainda faze-la ser capaz <strong>de</strong> amar<br />

<strong>de</strong>sinteressadamente. (STANTON, 1957, p.31)<br />

O que é <strong>de</strong> se admirar no filme escolhido pela autora, é que além <strong>de</strong> tudo, ele narra a<br />

história pela visão <strong>de</strong> Marguerite Gautier (a cortesã), ao contrário da posição do herói. Mas não<br />

<strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser uma representação do patriarcalismo, já que o <strong>de</strong>sejo feminino sempre é sacrificado.<br />

Marguerite é exigida a abandonar <strong>de</strong> sua felicida<strong>de</strong> por propósitos masculinos. Em seu<br />

personagem, sem o barão ela não po<strong>de</strong>ria se sustentar sozinha e com seu amor, Armand, ela<br />

não po<strong>de</strong>ria se casar, porque o nome da família do homem estaria manchado para sempre.<br />

Ao contrário do que é mostrado no papel feminino, temos menção a boemia para o papel<br />

masculino. Homens <strong>de</strong> elite, que vão ao cabaré normalmente. Viviam sem mulher e sem filhos,<br />

mesmo que não tivessem dinheiro eles se mostram aventureiros, o que Kaplan chama <strong>de</strong> “um rito<br />

<strong>de</strong> passagem”, uma fase normal para eles, que ainda irão ter uma vida bem-sucedida.<br />

Outro coisa importante que é mostrado no filme é o fato da personagem principal, ou<br />

qualquer outra personagem feminina não saber escrever corretamente. Essas mulheres não tinha<br />

a educação necessária para conseguir bons casamentos, daí eram levadas a prostituição.<br />

O filme trás o enredo da cortesã que tem que escolher entre o amor e o dinheiro. Pela<br />

primeira vez encontra o amor <strong>de</strong> um jovem (Armand) que não po<strong>de</strong> sustentar a vida que ela<br />

levava, mas promete o amor eterno. E do outro lado está o Barão, que oferece muito dinheiro<br />

para que ela vá morar com ele na Rússia. Por ela ter essa profissão seu amor se torna<br />

49


impossível. E quando ela opta pelo o amor, os problemas começam a aparecer. O pai <strong>de</strong><br />

Armand, um banqueiro, vai ter uma conversa com ela para que ela o abandone, já que o nome<br />

da família está em jogo. Por amor, ela ce<strong>de</strong> aos pedidos do banqueiro e vai embora da vida <strong>de</strong><br />

seu amado. Ou seja, o sistema patriarcal vence <strong>de</strong> qualquer forma, já que mesmo tendo se<br />

passado anos e Armand tendo voltado para Marguerite, ela morre no final e os dois não ficam<br />

juntos.<br />

3.2 A Vênus Loira<br />

Dá mesma década do filme anterior, esse filme vem se tratar <strong>de</strong> um clássico pela visão<br />

do diretor Von Sternberg. Kaplan afirma que Stenberg era o oposto <strong>de</strong> Cukor em relação a<br />

sensibilida<strong>de</strong>. Enquanto Cukor era sensível com a personagem principal, o novo diretor assumia<br />

totalmente sua personagem e a domina, mostrando total <strong>de</strong>sinteresse pelos <strong>de</strong>sejos <strong>de</strong> sua<br />

heroína.<br />

O filme começa quando Helen Faraday, (Marlene Dietrich) nadando com suas amigas na<br />

Alemanha, encontra Edward Faraday (Herbert Marshall), eles se apaixonam instantaneamente e<br />

se casam, indo morar em Nova York. Os problemas começam quando Edward contrai um doença<br />

radioativa <strong>de</strong>vido ao seu trabalho e o único médico que po<strong>de</strong> curá-lo fica na Alemanha. Como a<br />

família não tem dinheiro, Helen <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> trabalhar novamente com o que ela trabalhava antes <strong>de</strong> se<br />

casar. E arranja um emprego <strong>de</strong> cantora. Em seu primeiro dia ela consegue o dinheiro necessário,<br />

seu marido o aceita e viaja. Enquanto Helen se apaixona por um espectador dos seus shows<br />

chamado Nick Townsend (Cary Grant), que <strong>de</strong>u o dinheiro a Helen e chama-a para morar com<br />

50


ele em sua luxuosa casa. Na ausência do marido, Helen aceita a oferta <strong>de</strong> Nick e leva consigo<br />

seu filho.<br />

Esse filme não se trata <strong>de</strong> um melodrama, portanto, é dirigido ao espectador masculino,<br />

que ver a mulher <strong>de</strong> um modo que sua única arma é o seu po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> sedução. Nos filmes <strong>de</strong><br />

Stenberg, a mulher enquanto ser sexual, é socialmente reprimida para que o homem possa<br />

permanecer no centro do filme, apesar <strong>de</strong>le enfocar a mulher.<br />

A mulher como signo, então, torna-se o pseudocentro do discurso fílmico. A<br />

verda<strong>de</strong>ira oposição proposta pelo signo é masculino/não-masculino, que<br />

Stenberg estabelece por seu uso <strong>de</strong> roupas masculinas envolvendo a imagem<br />

<strong>de</strong> Diertich. Essa mascarada indica a ausência do homem, ausência<br />

simultaneamente negada e recuperada pelo homem. A imagem da mulher se<br />

torna meramente a marca da exclusão e repressão da mulher.(JOHNSTON,<br />

1975, p.115)<br />

Quando o marido retorna <strong>de</strong> viajem não encontra a mulher e o filho em casa e sai a<br />

procurá-los. Em uma cena Helen é surpreendida pelo marido e conta a verda<strong>de</strong> <strong>de</strong> seu caso,<br />

mais diz que está disposta a voltar, se essa for a vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong>le. O marido, então, a rejeita e<br />

exige seu filho <strong>de</strong> volta. Sem opções, Helen, para não per<strong>de</strong>r a guarda do filho, foge com ele e<br />

começa a se prostituir, já que não tem como trabalhar. Por um bom tempo Helen consegue<br />

escapar da polícia e dos <strong>de</strong>tetives, até que um dia ela se entrega e começa a viver uma vida <strong>de</strong><br />

miséria. Ela <strong>de</strong>ixa todo seu dinheiro num abrigo para mulheres com a promessa <strong>de</strong> que irá voltar<br />

a sua carreira. Muito rapidamente o filme passa da miséria da personagem para sua fama on<strong>de</strong><br />

ela se apresenta em trajes masculinos e é muito aplaudida pelo público. Lá ela encontra Nick<br />

novamente e se casa com ele. Quando o casal vai visitar o menino Johnny, filho <strong>de</strong> Helen, o pai<br />

51


não <strong>de</strong>ixa e recusa qualquer oferta <strong>de</strong> dinheiro que Nick oferece. Logo <strong>de</strong>pois Edward concorda<br />

que a mãe vá visitar seu filho e eles se reconciliam no final.<br />

Concluindo o pensamento e a crítica <strong>de</strong> Claire Johnston aos filmes do diretor Stenberg, o<br />

que ela retrata é que enquanto a mulher é vaidosa e se arruma para ser apresentada e<br />

observada, ela per<strong>de</strong> sua força e fica volúvel nas mãos masculinas. Mas no momento em que<br />

Helen se veste com roupas masculinas, ela <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser uma “ameaça sexual” para os homens e<br />

ganha o respeito das mulheres se tornando uma igual.<br />

Stenberg, ao final do filme, garante a vitória do sistema patriarcal. Pois faz com que a<br />

protagonista perca e se arrependa <strong>de</strong> toda a força que ela conseguiu durante o filme, na hora em<br />

que ela vai visitar seu filho. Helen chega em casa com traços da “mulher pecadora” com roupas<br />

extravagantes e acompanhada do Nick, seu amante. Porém, a medida que ela se aproxima <strong>de</strong><br />

seu ex-marido e <strong>de</strong> principalmente <strong>de</strong> seu filho, ela vai ganhando traços <strong>de</strong> personalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />

arrependimento. Ela esquece <strong>de</strong> tudo e começa a falar com seu filho como se nada tivesse<br />

acontecido e vai dar banho na criança. É o momento que Nick sai <strong>de</strong> cena e o antigo casal se<br />

reconcilia, passando a mensagem <strong>de</strong> que a protagonista, em seu papel, errou em trair, quebrou<br />

o sistema <strong>de</strong> família da socieda<strong>de</strong> e <strong>de</strong>sobe<strong>de</strong>ceu o marido e por isso per<strong>de</strong>u a guarda da<br />

criança e seu “bom” marido termina como vítima. E assim, temos mais um filme em que o<br />

sistema patriarcal vence novamente e on<strong>de</strong> é mostrado o lado mais fraco da mulher como objeto<br />

e seus não direitos na socieda<strong>de</strong>, como no caso da guarda <strong>de</strong> seu próprio filho.<br />

3.3 A dama <strong>de</strong> Xangai<br />

52


Esse filme noir, foi feito em 1946 pelo diretor Orson Welles, que também é o<br />

protagonista. Não se trata <strong>de</strong> um melodrama, portanto, é constituído para o público masculino. Ao<br />

contrário dos outros filmes analisados por Kaplan, A dama <strong>de</strong> Xangai não tem uma mulher como<br />

a visão principal do filme, apesar <strong>de</strong> que todo o enredo gire em torno <strong>de</strong> Elsa (Rita Hayworth).<br />

Ele é narrado e vivido por Michael O’Hara (Orson Welles).<br />

Não se trata <strong>de</strong> um filme progressista, já que <strong>de</strong> acordo com as teorias feministas, a<br />

mulher “in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte” na visão do patriarcalismo, só tem duas opções: trabalhar como artista em<br />

clubes noturnos ou viver à custa <strong>de</strong> um homem.<br />

Qualquer tratamento potencialmente progressista da mulher é severamente<br />

limitado pelas alternativas do casamento e da maternida<strong>de</strong>... ela é<br />

constantemente submetida as avaliações e julgamentos morais do investigador<br />

cuja narração po<strong>de</strong> moldar nossa percepção. É uma convergência <strong>de</strong> uma<br />

série <strong>de</strong> contradições, pois os filmes ao mesmo tempo que <strong>de</strong>safiam a<br />

hegemonia i<strong>de</strong>ológica da família, no final colocam a mulher num lugar<br />

opressivo e proscrito. (GLEDHILL, 1977, p.35)<br />

O filme começa sendo narrado por Welles, <strong>de</strong>clarando sua tolice em prosseguir atraído<br />

por Elsa. O filme, então, vai narrar, passo a passo, o crescente envolvimento dos dois para no<br />

final ele ser enganado e traído por ela. O que o filme realmente representa é o herói em busca<br />

da verda<strong>de</strong>, enquanto Elsa representa a cilada que distrai o personagem principal. Como muitas<br />

vezes em filmes noirs, o homem é <strong>de</strong>struído porque não po<strong>de</strong> resistir a sedução da mulher,<br />

nesse caso, o <strong>de</strong>senvolvimento do filme restaura a or<strong>de</strong>m da mulher sexual e manipuladora.<br />

53


Em A dama <strong>de</strong> Xangai, é possível que apenas a espectadora feminina possa ser capaz<br />

<strong>de</strong> perceber a ambiguida<strong>de</strong> da personagem Elsa. Já que no começo da narração o seguinte fato<br />

é sugerido, quando Welles diz: “Quando começo a bancar o bobo, não há nada que me faça<br />

parar. Se soubesse como isso ia acabar, jamais teria começado. Mas <strong>de</strong>pois que a vi, fiquei fora<br />

<strong>de</strong> mim por um bom tempo.” Isso acontece porque o espectador masculino encontra dificulda<strong>de</strong><br />

em ocupar outra posição que não fosse a <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificação com Michael quando vê pela primeira<br />

vez o rosto da atriz. De acordo com Muley, no momento que ele vê Elsa ele regri<strong>de</strong> para um<br />

território imaginário em uma unida<strong>de</strong> ilusória com a Mãe.<br />

Importante que este ensaio é o fato <strong>de</strong> que é uma imagem que constitui a<br />

matriz do imaginário, <strong>de</strong> reconhecimento/falso reconhecimento e i<strong>de</strong>ntificação,<br />

e daí da primeira articulação do ego, da subjetivida<strong>de</strong>. Este é um momento<br />

em que a antiga fascinação com o olhar (para o rosto da mãe, se choca com<br />

as primeiras noções <strong>de</strong> autoconsciência. (MULEY, 1975, p.10)<br />

Para a espectadora feminina, entretanto, a figura da atriz fica ambígua <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início. Pelo fato<br />

<strong>de</strong> já saber que algo está errado, essa espectadora não acredita nas lágrimas <strong>de</strong> Elsa e nem tão<br />

pouco é cativada por sua beleza.<br />

Arthur Bannister (Everett Sloane), é uma famoso advogado criminalista casado com Elsa.<br />

Sua aparecia é feia, ele tem pernas aleijadas e é visivelmente incapaz <strong>de</strong> satisfazer os <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong><br />

sua esposa. Para tanto, ele contrata um <strong>de</strong>tetive chamado Broom, (que fica disfarçado <strong>de</strong><br />

cozinheiro) para que ela permaneça fiel, mais ele acaba se apaixonando pela beleza <strong>de</strong> Elsa.<br />

Além do que aparece outro personagem chamado George Grisby (Glenn An<strong>de</strong>rs), que é sócio do<br />

54


senhor Bannister, ele também é apaixonado em segredo por Elsa. Grisby, assim como seu sócio<br />

aparentam ser meio loucos e seu mundo é cruel, <strong>de</strong>formado e sujo.<br />

Elsa está, portanto, posicionada como objeto <strong>de</strong> olhar <strong>de</strong> 4 homens que tentam possuí-la<br />

através do olhar, tentam controlar sua sexualida<strong>de</strong> e reprimir seu discurso. Mais no filme ela se<br />

recusa a ser dominada e usa da sua beleza para obter favores. É importante lembrar que Elsa é<br />

posicionada <strong>de</strong> uma forma que suas únicas possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> resistência são negativas. Como<br />

Kaplan afirma, “a mulher que se submete à lei paterna é a que é moralmente admirável.”<br />

Portanto, a resistência, quando vista do ponto masculino torna a mulher maléfica. Devido ao<br />

sistema machista em que se encontra, a personagem tem que ser punida aos “códigos”<br />

estabelecidos para as mulheres e avisando ao público masculino o perigo que a mulher bela e<br />

sedutora po<strong>de</strong>m oferecer.<br />

Contudo, A dama <strong>de</strong> Xangai apresenta uma análise complexa da visão feminina,<br />

<strong>de</strong>smistificando o mito da mulher bela, pura e inocente que ficou marcada por muito tempo na<br />

cabeça masculina <strong>de</strong>vido a fusão com a Mãe. O que <strong>de</strong>u espaço a redução da ameaça da<br />

diferença sexual.<br />

55


Capítulo 3 – Análise dos filmes escolhidos<br />

Introdução<br />

Assim como fez Ann Kaplan no livro em que estamos estudando, esse capítulo será a<br />

análise dos filmes pela visão semiótica, que traduzirá a maneira como são vistas as personagens<br />

femininas. A autora utiliza, como vimos, <strong>de</strong> filmes antigos para nossa época. Filmes em preto e<br />

branco e <strong>de</strong> um período anterior a explosão do feminismo.<br />

Esse capítulo, portanto, irá buscar o contrário do que foi analisado anteriormente.<br />

Usaremos filmes mais recentes, com exceção do filme My fair lady, que irão mostrar as principais<br />

mudanças que ocorreram da visão feminina, tanto pela personagem, tanto pelo espectador, seja<br />

ele homem ou mulher.<br />

Não esquecendo da importante análise cultural dos filmes Indianos e Iranianos que vão<br />

ser estudados com base nas teorias feministas que fizemos do cinema Hollywoodiano.<br />

Serão analisados cinco filmes: My fair lady (1964) - George Cukor; Ágora (2009) -<br />

Alejandro Amenábar; Secretariat (2010) - Randall Wallace; Jodha Akbar (2008) - Ashutosh<br />

Gowariker; Kandahar (2001) - Mohsen Makhmalbaf.<br />

1. My Fair Lady<br />

Nossa primeira análise será do filme My fair lady (Minha Bela Dama), lançado em 1964<br />

pelo diretor George Cukor, o mesmo estudado anteriormente em a Dama das Camélias. O elenco<br />

56


conta com participações <strong>de</strong> Audrey Hepburn (Bonequinha <strong>de</strong> Luxo e Sabrina), Rex Harrison,<br />

Stanley Holloway, Wilfrid Hy<strong>de</strong>-White.<br />

Como <strong>de</strong> costume, vemos os filmes do diretor Cukor como sendo melosos e sentimentais,<br />

e esse não é diferente. Temos, portanto um melodrama musical, que foi baseado na peça da<br />

Brodway, Pygmalion (1912), <strong>de</strong> Bernard Shaw. Para o escritor da peça Shaw, Pygmalion foi uma<br />

obra que procurava expressar diferentes propósitos. Como por exemplo o progresso da<br />

humanida<strong>de</strong>, revoluções, críticas sociais, língua e principalmente o movimento feminista (o autor<br />

fez parte dos primeiros movimentos feministas da época). O que se vê <strong>de</strong> forma resumida na<br />

releitura do filme, já que pesava a sombra dos melodramas populares do século XIX e o diretor<br />

tinha que usar <strong>de</strong>talhes dramáticos e personagens expressivos, como se po<strong>de</strong> observar na voz<br />

exagerada <strong>de</strong> Eliza Dollitle.<br />

O filme começa mostrando o contraste entre a riqueza e a pobreza nas ruas <strong>de</strong> Londres<br />

(um dos propósitos do escritor Shaw). Mostram os luxuosos teatros, com pessoas bem vestidas e<br />

transportes na rua em paralelo as feiras pobres, com ven<strong>de</strong>dores espalhados por todo o cenário.<br />

Um <strong>de</strong>sses ven<strong>de</strong>dores é Eliza Doolitle, mal vestida e ven<strong>de</strong>ndo flores ela começa a falar <strong>de</strong> uma<br />

maneira errada e muito alto, mostrando sua falta <strong>de</strong> educação. Seus agudos incomodam o<br />

espectador e todos os personagens da cena, mais ela insiste em ven<strong>de</strong>r flores para ganhar<br />

alguns trocados. Quando ela começa uma confusão ainda maior por <strong>de</strong>scobrir que um senhor<br />

está anotando todas as palavras que ela fala, logo pensa que ele é um policial que vai pren<strong>de</strong>-la.<br />

Acontece que ele se trata <strong>de</strong> um professor e estudante (Henry Higgins) <strong>de</strong> fonéticas e conhece<br />

através dos sons que as pessoas emitem <strong>de</strong> on<strong>de</strong> elas nasceram. Todos ficam maravilhados com<br />

57


essa habilida<strong>de</strong>. Na mesma cena, o professor se encontra com um amigo, o Coronel Pickering,<br />

que estuda o alfabeto indiano. Imediatamente o Coronel fica hospedado na casa <strong>de</strong> Higgins.<br />

A cena muda e agora vemos uma música cantada por Doolitle em que ela sonha em<br />

morar numa casa e ter um marido (começamos a notar os primeiros atos do sistema patriarcal<br />

aqui). Ela por ser jovem e bonita é cercada por homens <strong>de</strong> todas as ida<strong>de</strong>s que oferecem rosas<br />

e uma dança. Essa música traz uma letra que diz: “Não seria adorável? Muitos chocolates para<br />

eu comer, muitos carvões para eu cozinhar... a cabeça <strong>de</strong> alguém no meu colo, suave e doce<br />

como ele só e ainda cui<strong>de</strong> <strong>de</strong> mim, Não seria adorável?” Notavelmente a personagem começa a<br />

se mostrar <strong>de</strong> uma forma disfarçada que ela é <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte, que precisa <strong>de</strong> um homem e que vai<br />

cozinhar para ele. Apesar da época que o filme foi lançado o avanço que tivemos das<br />

personagens mulheres com relação ao feminismo, ainda foi mínimo. As peças <strong>de</strong> teatro e o<br />

próprio filme, foi consi<strong>de</strong>rado como feminista na época. Mais em comparação com o avanço que<br />

temos atualmente, esse filme mostra somente o início da transformação <strong>de</strong>ssas personagens.<br />

A cena muda novamente e agora nos é apresentado o pai <strong>de</strong> Eliza, o Senhor Alfie<br />

Doolitle. Morador <strong>de</strong> rua como sua filha, Alfie é um personagem extremamente machista que<br />

gasta todo o dinheiro que ganha em jogos e bebidas e não se interessa por sua família. No<br />

contexto, ele está a espera <strong>de</strong> sua filha para que ela dê algum dinheiro a ele, mesmo sendo<br />

exposto no filme que a ela, ele nunca <strong>de</strong>u nada exceto a vida. E ainda diz: “Ela tem toda a<br />

maldita Londres para ven<strong>de</strong>r flores. Dei isso a ela também, <strong>de</strong>pois sumi e <strong>de</strong>ixei que<br />

aproveitasse, se isso não vale meia coroa <strong>de</strong> vez em quando, vou tirar meu cinto e dar nela.” O<br />

<strong>de</strong>scuido com a família, as criticas sociais são temas muito mostrados pelo diretor Cukor. Para<br />

58


tanto, ele usou <strong>de</strong>sse personagem para apresentar a hipocrisia da moral daqueles que se<br />

preocupam apenas em subir na hierarquia social.<br />

Quando Alfie Doolitle consegue ganhar o dinheiro que tanto queria <strong>de</strong> sua filha, ela<br />

começa a pensar nas palavras do Professor Higgins, dizendo que ela não será ninguém enquanto<br />

ven<strong>de</strong>r flores nas ruas e que ele po<strong>de</strong>ria educá-la e transformá-la em uma dama. Aqui,<br />

encontramos a pequena mudança que o filme nos mostra em relação ao feminismo, que foi a<br />

iniciativa <strong>de</strong> Eliza querem mudar <strong>de</strong> vida, encontrar um emprego. Para tanto, ela vai em busca<br />

das promessas do Professor que a trata com muito <strong>de</strong>sprezo. Mas ele aceita a proposta com a<br />

ajuda <strong>de</strong> seu amigo Pickering, que o incentiva e o faz encarar o ato como um <strong>de</strong>safio a si próprio.<br />

Ele então conce<strong>de</strong> que Eliza more em sua casa até ela se tornar uma dama. Ela com medo das<br />

atitu<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Higgins ameaça a ir embora. O professor temendo que a mendiga saísse, oferece<br />

chocolates a ela, o que vai servir <strong>de</strong> motivo para que ela fique. Ou seja, comprada por meros<br />

chocolates, ele <strong>de</strong>monstra que ela está completamente sobre o controle <strong>de</strong> pessoas mais ricas.<br />

A cena seguinte mostra um curioso diálogo entre o Coronel e o Professor a respeito das<br />

mulheres. O Coronel preocupado com o tratamento <strong>de</strong> Higgins com Eliza, começa a se<br />

responsabilizar por ela e pe<strong>de</strong> que nenhuma vantagem seja tirada da pobre garota. Ele em tom<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>boche começa a cantar uma das musicas do musical em que insulta as mulheres <strong>de</strong> várias<br />

maneiras. De acordo com ele as mulheres são controladoras, gostam <strong>de</strong> mandar, só falam <strong>de</strong><br />

amor e que ele nunca <strong>de</strong>ixaria uma mulher entra em sua vida. Como ele mesmo diz: “Deixe os<br />

outros homens darem os nós em volta <strong>de</strong> seus pescoços, eu preferiria uma nova edição da Santa<br />

Inquisição do que ter uma mulher na minha vida”. Uma cena clara da existência do sistema, em<br />

59


que insiste na individualida<strong>de</strong> masculina, sua in<strong>de</strong>pendência, <strong>de</strong> que não precisa da<br />

personalida<strong>de</strong> feminina. Isso nos lembra as cenas e o contexto do filme A Vênus loira, analisado<br />

anteriormente, quando Edward Faraday <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> viver in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> sua mulher, ganhando seu<br />

sustento e criando seu filho sozinho.<br />

Alfred Doolitle ao saber da notícia que sua filha está morando com um rico professor,<br />

como todo oportunista, vai ao seu encontro para conseguir algum dinheiro. Ao perceber suas<br />

intenções, Higgins pe<strong>de</strong> para que Alfred leve sua filha embora. Com medo <strong>de</strong> não receber nada,<br />

ele chantageia o professor dizendo que o mesmo se aproveitou <strong>de</strong> sua filha. E acaba pedindo 5<br />

libras por sua filha sabendo que suas intenções eram honradas, pois se não fosse, ele a<br />

ven<strong>de</strong>ria por 50 libras. Os dois senhores revoltados com a situação, perguntam a este homem se<br />

ele tem alguma moral. E ele respon<strong>de</strong> com a mesma sincerida<strong>de</strong> <strong>de</strong> antes, on<strong>de</strong> afirma que não<br />

preten<strong>de</strong> ser um trabalhador e acha que <strong>de</strong>ve ganhar algum dinheiro para que os senhores<br />

possam fazer o que quiserem com sua filha. O Professor Higgins se diverte com a situação e até<br />

brinca que se ele ensinasse Alfred a educação que possuía, ele com certeza seria um bom<br />

político. Mais uma crítica social feita pelo diretor do filme.<br />

Em seguida, começa a incansável tarefa <strong>de</strong> fazer com que Eliza aprenda a falar<br />

corretamente, o que durará umas seis cenas, em que ela é humilhada em todas suas tentativas.<br />

Em uma <strong>de</strong>las, Higgins pe<strong>de</strong> para que Eliza leia um poema, falando incorretamente o Coronel<br />

cita: “Talvez o poema seja difícil para a garota, porque não experimenta algo como A Coruja e o<br />

Gatinho?”<br />

60


No cenário escuro e silencioso, do que seria uma madrugada e exaustos <strong>de</strong> tantas<br />

tentativas fracassadas, o diretor começa a nos mostrar outras faces dos personagens principais.<br />

Higgins, com seu discurso encorajador <strong>de</strong> que Eliza irá conseguir pronunciar as palavras, usado<br />

pela primeira vez, convence o espectador <strong>de</strong> que há algum sentimento nesse homem tão<br />

rabugento. E em seguida, é mostrado o pálido rosto <strong>de</strong> Eliza, que visivelmente está espantada<br />

com o ato e que também, pela primeira vez, começa a <strong>de</strong>scobrir seus sentimentos por seu<br />

professor. Ela, portanto, retorna ao seu estado anterior, <strong>de</strong> mulher frágil, apaixonada e<br />

<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte do homem, do qual ela tinha se livrado por um curto período. Devido a sua mudança<br />

ela consegue até mesmo pronunciar as palavras corretamente, o que faz com que todos fiquem<br />

alegres e <strong>de</strong>spreocupados com o que irá ocorrer futuramente.<br />

Com o esperado acontecimento, Higgins <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> levar Eliza para uma corrida <strong>de</strong> cavalos,<br />

ou seja, em público, para analisar seu comportamento diante das pessoas e observar se eles<br />

percebem que ela uma mendiga. Cukor cria a cena da corrida <strong>de</strong> cavalos mais teatral possível.<br />

Todos vestes roupas elegantes, em preto, branco e cinza, com num baile. As mulheres com<br />

chapelões <strong>de</strong> penas e os homens com seus fraques. Para dar <strong>de</strong>staque na multidão, o diretor<br />

usa para Higgins o mesmo terno com <strong>de</strong> terra que ele usa em quase todo o filme. E Eliza com<br />

um vestido cheio <strong>de</strong> <strong>de</strong>talhes um chapéu enorme, uma guarda-sol e uma bolsa. O que torna a<br />

cena uma das mais engraçadas do filme, é que ninguém <strong>de</strong>sconfia do segredo <strong>de</strong> Eliza, mesmo<br />

que ela cometa erros falando sobre sua vida e sua família anterior até que ela não se contém e<br />

fala um palavrão durante a corrida.<br />

61


Para terminar a aposta Higgins <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> levá-la a embaixada mesmo que contrariando a<br />

todos. E mais uma vez, sem lugar para opinião, Eliza realiza os <strong>de</strong>sejos <strong>de</strong> seu professor. Um<br />

fato interessante <strong>de</strong> se analisar é a mudança no comportamento <strong>de</strong> Eliza. Des<strong>de</strong> o momento em<br />

que se viu apaixonada ela não expressa mais nenhuma opinião durante o filme quando está perto<br />

<strong>de</strong> Higgins e fala bem menos do que falava antes. E assim, a cena é cortada e <strong>de</strong> imediato<br />

aparece a noite <strong>de</strong> gala. O nervosismo <strong>de</strong> Higgins e seu discurso com o Coronel, mostra um<br />

homem completamente apaixonado, mas que não se expõe <strong>de</strong> forma alguma.<br />

Eliza, agora vira completamente a mulher objeto, digna <strong>de</strong> todas as atenções masculinas.<br />

No momento em que <strong>de</strong>sce as escada, po<strong>de</strong>mos notar a ênfase que o diretor preten<strong>de</strong> dar a ela.<br />

Eliza aparece sozinha, com um vestido branco que se <strong>de</strong>staca no meio <strong>de</strong> objetos escuros e<br />

vários a<strong>de</strong>reços brilhosos para chamar a atenção. Ela <strong>de</strong>sce calmamente esperando a reação dos<br />

senhores na sala, só fala quando alguém se dirige a ela e fica imensamente feliz quando o<br />

homem por quem está apaixonado lhe oferece o braço para que caminhem juntos. Na festa da<br />

embaixada não é diferente, ela é consi<strong>de</strong>rada a dama mais bonita da festa até mesmo para a<br />

rainha e o príncipe que a convida para dançar. Absolutamente Soberbo, diziam eles da noite em<br />

que Higgins se vangloriava por ter ganho a aposta. A cena seguinte a festa da embaixada foi<br />

uma total injustiça contra Eliza, que não recebeu nenhum mérito por suas aparições e sua nova<br />

elegância. Cantaram a noite toda, como o professor tinha conseguido seu maior triunfo enquanto,<br />

no fundo do cenário se encontrava, rebaixada, Eliza, que aparece infeliz e não emite nenhum tipo<br />

<strong>de</strong> som. Longe <strong>de</strong> ser a mulher que era no começo do filme.<br />

62


Quando acabam as comemorações e todos vão dormir as luzes do cenário baixam, para<br />

criar uma cena <strong>de</strong> drama, e Eliza começa a chorar <strong>de</strong>sesperadamente, como quem tivesse<br />

prendido toda sua mágoa até aquele momento. Higgins atrás <strong>de</strong> seus chinelos, volta a sala e<br />

encontra com a chorosa mulher. Ela <strong>de</strong>scontando agora sua raiva atira os chinelos no professor e<br />

aproveita para falar tudo o que ela não falou durante o tempo em que obe<strong>de</strong>cia seu amado. Aqui,<br />

neste ponto do filme, o diretor não nos <strong>de</strong>ixa saber o real motivo <strong>de</strong> porque tantas queixas <strong>de</strong><br />

Eliza. Po<strong>de</strong>ria ser porque ela estava se sentindo injustiçada por não ganhar nenhum mérito na<br />

aposta, po<strong>de</strong>ria ser pela falta <strong>de</strong> afeto do Senhor Higgins em relação a ela ou mesmo porque<br />

agora ela não saberia para on<strong>de</strong> ir, ou po<strong>de</strong> até mesmo ser todas essas coisas que estavam<br />

presas na personagem e que ela soltou tudo <strong>de</strong> uma vez. E num tom <strong>de</strong> cinismo, Higgins,<br />

continua rejeitando-a e humilhando-a e ainda oferece a ela um chocolate, como fez da primeira<br />

vez, e ele continua insinuando que ela <strong>de</strong>veria casar, pois “as vezes” chega a ser uma mulher<br />

atraente. Revoltada com a situação Eliza diz, firmemente: “Eu vendia flores e não a mim<br />

mesma!” Mas o professor não quebrando o sistema insiste em que ela possa se casar com<br />

alguém que sua mãe escolha, ou até mesmo possa pedir ao Coronel que lhe dê algum dinheiro<br />

para que ela possa montar sua loja <strong>de</strong> flores. O que <strong>de</strong> qualquer forma, mostra da <strong>de</strong>pendência<br />

da mulher pelo homem.<br />

Desistindo <strong>de</strong> tentar ganhar a afeição <strong>de</strong> seu amado, Eliza Doolitle se mostra uma nova<br />

mulher, <strong>de</strong>terminada, forte e <strong>de</strong>cidida no momento em que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> seus direitos, já que ele<br />

<strong>de</strong>ixou claro que ela não teria mais utilida<strong>de</strong> pra ele. Ela pergunta se as roupas que as foram<br />

dadas pertencem a ela ou a quem pagou, numa forma <strong>de</strong> dizer que ela irá embora e só levará o<br />

que lhe pertence <strong>de</strong> fato. E ainda retruca o cinismo do Professor quando fala que entre os dois<br />

63


nunca po<strong>de</strong>rá existir nenhum tipo <strong>de</strong> sentimento. Só assim, Higgins permite mostrar por pouco<br />

tempo, o quanto está sentido e o quando a ama.<br />

As cenas seguintes se passam quando Eliza foge da casa on<strong>de</strong> estava morando e tenta<br />

tirar as confusões <strong>de</strong> sua mente. Ela procura <strong>de</strong>sesperadamente por seus amigos antigos, que<br />

nem a reconhecem mas. Ela se conforma, portanto, que se tornou uma nova pessoa, uma nova<br />

mulher. Enquanto, Higgins procura loucamente por Eliza, inconformado com a fuga, num dos<br />

diálogos do filme ele diz: “ Eu quero achá-la, ela me pertence. Paguei cinco libras por ela.”<br />

Fazendo qualquer coisa para achá-la, ligando até mesmo para a polícia acusando-a <strong>de</strong> ladra,<br />

tudo para que ela fosse achada. E mesmo assim ele não fala que está apaixonado por ela,<br />

mesmo que seus atos <strong>de</strong>ixem claro. Após essa discursão, começa um interminável<br />

questionamento do Professor <strong>de</strong> como as mulheres não po<strong>de</strong>m ser como os homens. Em que<br />

mais uma vez, ele ridiculariza e rebaixa as mulheres e elogiam a personalida<strong>de</strong> masculina.<br />

Eliza aparece na casa da mãe do professor, uma mulher que vai enten<strong>de</strong>r todos os<br />

problemas que ela está passando. Quando Higgins vai visitar sua mãe, se <strong>de</strong>para com Eliza que<br />

o trata do mesmo jeito do qual ele sempre a tratou, como se ele não existisse. Em seu discurso<br />

ela resume <strong>de</strong>sta forma: “ Só aprendi boas maneiras com o Coronel Pickering. Foi ele que me<br />

mostrou o que sentia e pensava sobre mim como se eu fosse algo melhor do que uma simples<br />

florista. A diferença entre uma dama e uma florista não é como se comportam, mais como são<br />

tratadas. Sempre serei uma florista para o Professor Higgins, porque ele sempre me tratou com<br />

uma florista. Mas sei que serei sempre uma dama para o Coronel Pickering, porque ele sempre<br />

me tratou como uma dama.<br />

64


Com palavras fortes e uma personalida<strong>de</strong> mudada, Eliza <strong>de</strong>ixa claro que po<strong>de</strong>rá viver<br />

sem seu professor. Ele totalmente <strong>de</strong>sarmado <strong>de</strong> palavras, começa a se gabar que conseguiu<br />

fazer uma maravilhoso trabalho <strong>de</strong> mudança nela. Mas o final do filme <strong>de</strong>ixa a <strong>de</strong>sejar pelo fato<br />

<strong>de</strong> que vemos o patriarcalismo vencer mais uma vez. Eliza, se mostra fraca e volta a casa do<br />

professor, para ter a mesma vida <strong>de</strong> humilhação e falta <strong>de</strong> reconhecimento. O que nos prova que<br />

nessa época o feminismo ainda estava engatinhando perto do que se tem <strong>de</strong> conquistas no<br />

século XXI.<br />

2. A Caminho <strong>de</strong> Kandahar<br />

O próximo filme a ser analisado, é do Iraniano Mohsen Makhmalbaf. Que faz<br />

uma mistura entre drama e documentário, para mostrar com realida<strong>de</strong> as dificulda<strong>de</strong>s enfrentadas<br />

pelos seres que moram na região. Sua gravação foi feita em 2001, pouco tempo antes dos<br />

atentados terroristas aos Estados Unidos. Ou seja, A Caminho <strong>de</strong> Kandahar mostra um momento<br />

anterior ao que vemos hoje em dia, mas a <strong>de</strong>vastação continua no Afeganistão. Não há alimentos,<br />

escolas, saú<strong>de</strong> ou liberda<strong>de</strong>. O filme conta com o elenco: Niloufar Pazira, Hassan Tantai e Sadou<br />

Teymouri.<br />

Como característica do cinema iraniano, encontramos em seus filmes a realida<strong>de</strong> do país<br />

através da câmera. A história é tão realista que até a própria atriz viveu um drama parecido com<br />

o do que o filme narra. O filme conta a história <strong>de</strong> Nafas (Niloufar Pazira), uma jornalista afegã<br />

refugiada no Canadá, que tenta retornar ao Afeganistão, para impedir o suicídio da irmã mais<br />

nova.<br />

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O diretor, contudo, fez uma gran<strong>de</strong> obra que retrata também um pouco da cultura local e<br />

propósitos sociais. Po<strong>de</strong>mos encontrar críticas sobre as diferentes etnias do país, sobre as minas<br />

terrestres que mutilam adultos e jovens, a questão do <strong>de</strong>serto e seu difícil estilo <strong>de</strong> vida e<br />

principalmente críticas em relação como as mulheres são tratadas.<br />

O filme começa mostrando o gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>serto e a jornalista narrando sua história em um<br />

gravador para que se algo <strong>de</strong>r errado, ela ter tudo registrado. Já percebemos que sua jornada<br />

não será fácil, quando ela diz que recebeu notícias <strong>de</strong> que a situação no Afeganistão piorou com<br />

a chegada dos talibãs ao po<strong>de</strong>r. Foram fechadas as escolas para meninas, excluíram as<br />

mulheres da vida pública e que era quase impossível ter alguma esperança <strong>de</strong> sair daquele país.<br />

Sua irmã, escreve uma carta contando os fatos e marcando o dia <strong>de</strong> sua morte para o dia do<br />

último eclipse do século XX.<br />

A cena seguinte é <strong>de</strong> chocar o espectador quando próteses <strong>de</strong> pernas são jogadas do<br />

helicóptero nas tendas da cruz vermelha. Os homens aleijados tentam correr apoiados em<br />

muletas, para conseguir alguma prótese, que como o filme mostra, alguns esperam a mais <strong>de</strong> um<br />

ano. E logo <strong>de</strong>pois, são mostradas várias meninas que foram obrigadas a sair da escola e mudar<br />

<strong>de</strong> país, mesmo sabendo que não po<strong>de</strong>rão voltar, o guia pe<strong>de</strong> para que elas não percam as<br />

esperanças.<br />

Outro fato que é muito lembrado pelo diretor Makhmalbaf são as crianças. Ele nos faz<br />

lembrar que um país que não cuida nem do seu futuro, suas crianças não tem consi<strong>de</strong>ração por<br />

mais ninguém. Elas são gran<strong>de</strong>s vítimas da violência local e da guerras. Como nos é mostrado<br />

nas bonecas minadas, são minas disfarçadas <strong>de</strong> bonecas que estão escondidas nas areias do<br />

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<strong>de</strong>serto e que mutilam ou matam inúmeros seres humanos. Os meninos, no entanto, são<br />

obrigados a estudarem o alcorão se quiserem permanecer na escola e terem o que comer.<br />

Muitas armas carregadas são dadas as esses meninos para que aprendam <strong>de</strong>s<strong>de</strong> cedo como<br />

utilizá-las. O filme diz que os registros dos órgãos internacionais dizem que a cada cinco minutos<br />

uma pessoa morre no Afeganistão, vítimas das guerras contra os russos, <strong>de</strong> disputas políticas e<br />

internas e da posse <strong>de</strong> governos radicais.<br />

Para entrar <strong>de</strong> novo no país do qual conseguiu sair, Nafa tem que fingir fazer parte das<br />

famílias que estão retornando ao Afeganistão. E é aí que ela se <strong>de</strong>para com as mulheres <strong>de</strong>ssas<br />

famílias que usam burcas que as cobrem dos pés a cabeça (são chamadas <strong>de</strong> cabeças negras).<br />

Como Nafas narra: “Não sei se é o atual governo que obrigam as mulheres a usarem burcas, ou<br />

se é a cultura afegã obrigando o governo a mantê-las cobertas.” Percebemos, portanto, que as<br />

mulheres do país são <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>radas socialmente, mesmo sendo equivalente a meta<strong>de</strong> do total<br />

<strong>de</strong> habitantes na região. Mesmo assim, com tudo o que é mostrado sobre as mulheres o diretor<br />

consegue mostrar o lado <strong>de</strong>las <strong>de</strong> vaida<strong>de</strong>, nas cenas em que estão pintando as unhas e<br />

colocando bijuterias pra elas mesmas se sentirem bonitas. E não como nos outros filmes em que<br />

a mulher se torna o objeto <strong>de</strong> adoração masculina através das câmeras.<br />

Ao longo do filme as tristes realida<strong>de</strong>s vão aparecendo. A família com a qual Nafa estava<br />

viajando foi roubada e eles tiveram que caminhar no <strong>de</strong>serto, logo <strong>de</strong>pois a personagem é<br />

obrigada a ir a Kandahar sozinha. Ninguém aceita ser seu guia, já que se trata <strong>de</strong> uma mulher e<br />

ela só consegue um menino que a acompanha em troca <strong>de</strong> 50 dólares. O cenário é <strong>de</strong> assustar,<br />

com pessoas mortas, labirintos <strong>de</strong> areia e nenhuma alimentação ou água, um pequeno poço <strong>de</strong><br />

67


água suja é o que eles tem para beber e lavar roupas. O que nos leva a outro assunto muito<br />

abordado pelo diretor: a fome.<br />

Nos é apresentado um suposto médico afro-americano que não concluiu a faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

medicina, mais para aquele país seus conhecimentos são suficientes para aten<strong>de</strong>r aquela<br />

população. Quase sempre ele aten<strong>de</strong> seus pacientes que estão se queixando <strong>de</strong> dor na barriga,<br />

que o médico logo percebe que é por falta <strong>de</strong> alimentação. De um país tão <strong>de</strong>vastado que não<br />

sabe nem reconhecer a fome. O pior <strong>de</strong> tudo é que pelo fato do médico ser do sexo masculino,<br />

as mulheres que vão procurar ajuda não po<strong>de</strong>m sem examinadas. A consulta acontece por <strong>de</strong>trás<br />

<strong>de</strong> um tecido com um furo. Elas não po<strong>de</strong>m sequer falar com ele, usando crianças como<br />

intermediários.<br />

Quando Nafas acha que está doente pela água suja, ela resolve ir ao médico que a<br />

examina e a ajuda dando alguns remédios contra vermes. Ele logo percebe que a mulher não é<br />

como as outras pergunta a sua história, bem como conta a <strong>de</strong>le. Sabendo que ela precisa chegar<br />

em Kandahar ele se dispõe a leva-la até uma tenda da cruz vermelha para ver se conseguem<br />

ajuda. Infelizmente, com as incertezas do caminho, ninguém tem coragem <strong>de</strong> ir ao local e mais<br />

uma vez Nafas se encontra sem esperança. O filme nos mostra um longo diálogo ente ela e o<br />

médico sobre a falta <strong>de</strong> esperança naquele país, principalmente das mulheres que vivem cobertas<br />

sem nenhuma forma <strong>de</strong> expressão.<br />

Para conseguir chegar em seu <strong>de</strong>stino, Nafas avista um bando <strong>de</strong> mulheres que estão<br />

indo a um casamento e entra no grupo para se disfarçar. Acontece que muitos homens também<br />

se disfarçam para conseguir sair do país e portanto existem o que eles chamam <strong>de</strong> patrulha, que<br />

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serve para revistar essas pessoas. Ela tem o azar <strong>de</strong> ser revistada por essa patrulha, outras<br />

mulheres. Outras mulheres, que a partir <strong>de</strong> seu próprio relato, servindo <strong>de</strong> mecanismo <strong>de</strong> controle<br />

da própria mulher ao sistema comandado por homens.<br />

O filme termina sem final, mais fica claro ao espectador a impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> salvar a<br />

irmã. A falta <strong>de</strong> esperança daquelas pessoas e a condição <strong>de</strong>sumana a qual vivem. E<br />

principalmente da figura da mulher num país que adota políticas radicais on<strong>de</strong> elas vivem a<br />

margem da socieda<strong>de</strong>, excluídas, usadas somente para a procriação. Sem estudos e isoladas<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> criança, o governo as transformou em inúteis domésticas, on<strong>de</strong> não é permitido nem<br />

mesmo andar na frente ou ao lado <strong>de</strong> seus maridos.<br />

3. Jodhaa Akbar<br />

Do famoso diretor indiano Ashutosh Gowariker, Jodhaa Akbar, é um filme épico <strong>de</strong><br />

romance que no ano <strong>de</strong> 2008 foi sucesso <strong>de</strong> bilheteria e arrecadou mais <strong>de</strong> <strong>de</strong>z milhões <strong>de</strong><br />

dólares. O filme conta com um gran<strong>de</strong> elenco <strong>de</strong> atores reconhecidos na Índia, incluindo os<br />

mundialmente famosos Hrithik Roshan e Aishwarya Rai. Como em todo bom filme indiano<br />

encontramos características únicas que o diferencia <strong>de</strong> todos os outros cinemas mundiais. Sua<br />

duração é <strong>de</strong> três horas e meia <strong>de</strong> um longa-metragem cheio <strong>de</strong> cenários grandiosos. Músicas e<br />

danças <strong>de</strong> pren<strong>de</strong>r a atenção do espectador e um figurino extremamente colorido.<br />

Jodhaa Akbar, tem como o principal tema o dilema do casamento arranjado para os<br />

indianos. (Uma situação triste, que por tradição, a população da Índia ainda passa, por motivos<br />

<strong>de</strong> negócios ou preservação da família) E com isso, se abrange outros temas: <strong>de</strong> religião,<br />

69


guerras, honra entre outros. Baseado em uma história real, o diretor transforma o filme em um<br />

romance épico com cenas <strong>de</strong> batalhas, políticas e intrigas.<br />

O melhor dos filmes <strong>de</strong> Bollywood é que em sua gran<strong>de</strong> maioria, eles são consi<strong>de</strong>rados<br />

melodramas (com músicas, danças e histórias <strong>de</strong> amor), mais não são restritos somente ao<br />

público feminino, já que os filmes indianos fazem sucesso com toda a população do país.<br />

E para completarmos a nossa análise fílmica, esse sucesso <strong>de</strong> Bollywood, mais recente,<br />

vem para mostrarmos o começo da queda da filmagem do sistema patriarcal, mesmo numa<br />

socieda<strong>de</strong> com tantos tabus culturais e religiosos como a da índia. Não chega a ser um filme<br />

feminista, com direitos iguais ao do homem, até porque retrata uma época antiga, pois sua<br />

história se passa no século XVI. Mas mostra um enorme avanço da figura da mulher com a<br />

personagem principal, a princesa Jodhaa Bai.<br />

A narração começa contando a história da Índia e dos pioneiros imperadores que<br />

firmaram territórios na região. Os primeiros povos foram os Mughals, que tiveram o Imperador<br />

Mohammad Akbar como o primeiro a nascer em solo indiano. E os rajputs, que viviam na<br />

província <strong>de</strong> Amer e tinham a princesa Jodhaa como her<strong>de</strong>ira. No ano <strong>de</strong> 1555 começa uma<br />

guerra <strong>de</strong> território entre os Mughals (com o príncipe Akbar) e a província que dominava a região.<br />

Os Mughals vencem e passam anos tentando unir todo os povos que viviam na Índia, com<br />

propostas <strong>de</strong> paz ou <strong>de</strong> guerras. Guerras muito bem retratadas no filme com soldados <strong>de</strong><br />

armaduras, cerca <strong>de</strong> 1000 figurantes, 80 elefantes, 100 cavalos e 55 camelos. Cenas que<br />

garantiram um espetáculo que ren<strong>de</strong>ram prémios ao diretor.<br />

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Mas a história do casal só começa quando o imperador Bharmal, pai da princesa Jodhaa,<br />

aceita a proposta <strong>de</strong> Akbar, com a condição <strong>de</strong> que ele case com sua filha, para que o reino <strong>de</strong><br />

Amber fique protegido. Jodhaa <strong>de</strong>s<strong>de</strong> sua aparição no filme, é apresentada como uma mulher<br />

forte, que tem pensamentos racionais e luta pelo que <strong>de</strong>seja. Como exemplo, temos sua primeira<br />

cena on<strong>de</strong> é mostrada uma luta <strong>de</strong> espadas com seu primo Sujamal, <strong>de</strong> igual para igual ela o<br />

<strong>de</strong>rrota e ainda o ensina a não se distrair em frente ao inimigo. Mostrando, portanto, sua força e<br />

inteligência, a personagem principal do filme vai <strong>de</strong>senvolvendo uma personalida<strong>de</strong> diferente das<br />

mulheres analisadas nos outros filmes.<br />

Outra gran<strong>de</strong> diferença, que nos leva conclusão <strong>de</strong> que não estamos lidando com um filme<br />

machista é o homem se tornando pela primeira vez, em nossa análise, o objeto <strong>de</strong> <strong>de</strong>sejo<br />

feminino. O personagem do imperador Akbar é o ator Hrithik Roshan, consi<strong>de</strong>rado um homem<br />

muito bonito, que durante o filme é usado pelo diretor para capturar a atenção das espectadoras<br />

por sua beleza e pelo seu físico. É explicito a intenção do diretor em cenas como a da captura<br />

do elefante e o treinamento da espada pelo qual o personagem passa.<br />

Entretanto, os conflitos da história se iniciam pelo fato <strong>de</strong> que o imperador é da religião<br />

mulçumana e a princesa é da religião Hindu. Para haver um casamento e os dois se unirem, a<br />

princesa, por ser mulher, teria que acatar a religião do marido. O que o imperador via como uma<br />

oportunida<strong>de</strong> para unir ainda mais as províncias distintas, a princesa via como uma ofensa, um<br />

sacrifício <strong>de</strong> sua felicida<strong>de</strong>. Para tanto, respeitando a <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong> seu pai e agindo racionalmente<br />

como uma princesa ela <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> ir ao encontro <strong>de</strong> seu futuro marido para impor algumas condições<br />

para que o casamento seja realizado. Mesmo não vendo com bons olhos, o imperador respeita e<br />

71


vai ao seu encontro. Lá, ela impõe que por nenhuma circunstância será convertida e que <strong>de</strong>ntro<br />

<strong>de</strong> seu palácio tenha um templo com seus <strong>de</strong>uses hindus. Incapacitado <strong>de</strong> vê-la por vários<br />

tecidos que o separam, o imperador <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> aceitar suas condições. Ou seja, vemos aqui que a<br />

mulher conseguiu seu objetivo, usando <strong>de</strong> sua coragem e inteligência, e em nenhum momento <strong>de</strong><br />

seu físico.<br />

Com uma produção digna do cinema Bollywoodiano, o casamento entre os dois é realizado.<br />

E assim, se dá início a um longo período <strong>de</strong> aceitação da princesa pelo seu marido. Como foi um<br />

casamento arranjado, em que nenhum dos dois se conhecia, a princesa mais uma vez mostra<br />

sua personalida<strong>de</strong> forte e nega a consumação do casamento. O imperador, entretanto, respeita<br />

suas <strong>de</strong>cisões e começa a aceitar que terá <strong>de</strong> conquistar sua mulher, um <strong>de</strong>safio que mostra ao<br />

longo do filme, ao espectador, a paixão <strong>de</strong>le por Jodhaa.<br />

Há uma cena em que os governantes estão reunidos para discutir questões da província e a<br />

voz <strong>de</strong> Jodhaa rezando, ecoa por todo palácio. O que faz com que seu marido a siga hipnotizado,<br />

como a voz <strong>de</strong> uma sereia. Se mostrando perdidamente apaixonado ele vê o rosto <strong>de</strong> sua<br />

esposa pela primeira vez. Nota-se nesse entrelace <strong>de</strong> cena que agora a beleza toda está voltada<br />

para o rosto <strong>de</strong> Jodhaa, uma luz forte a ilumina, como se estivéssemos a olhando pela visão do<br />

Imperador.<br />

Com o passar da narrativa, Jodhaa vai se mostrando mais encantada por seu marido. Não<br />

por sua riqueza ou po<strong>de</strong>r, mais pelo respeito e pela forma que ele a trata. Ela continua a manter<br />

seus costumes e tradições, o que <strong>de</strong>sagrada muitos mulçumanos no palácio e faz com que eles<br />

armem situações complicadas para <strong>de</strong>rruba-la. Passando por todas as dificulda<strong>de</strong>s com sua forte<br />

72


personalida<strong>de</strong> e i<strong>de</strong>ais, Jodhaa transmite ao seu marido que para governar bem tem que<br />

conquistar não apenas reinos ou povos, mais acima <strong>de</strong> tudo, o coração <strong>de</strong> seus súditos, da<br />

mesma maneira <strong>de</strong>la.<br />

Jodhaa Akbar, tem, portanto, a exposição <strong>de</strong> uma história <strong>de</strong> amor que encanta muitos<br />

espectadores visualmente. Belas cenas <strong>de</strong> batalhas e lições valiosas <strong>de</strong> tolerância religiosa e <strong>de</strong><br />

etnia. E principalmente, o respeito da condição feminina, <strong>de</strong> suas i<strong>de</strong>ias e tradições. Claro que o<br />

filme, como a maioria dos <strong>de</strong> Bollywood são visto como um mundo <strong>de</strong> sonhos em que tudo é<br />

perfeito e não é retratado a realida<strong>de</strong> da Índia, como é feito nos filmes Iranianos. Mais é um<br />

avanço importante para a visão do espectador em relação a mulher, por não a tornar um mero<br />

objeto sexual.<br />

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Conclusão<br />

Po<strong>de</strong>mos concluir que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> as civilizações antigas, houve uma predominância masculina no<br />

po<strong>de</strong>r, inibindo a participação da mulher na vida ativa da socieda<strong>de</strong>. Obrigando-a a viver em<br />

função <strong>de</strong> sua família. O que <strong>de</strong>nominamos ao longo do texto <strong>de</strong> patriarcalismo. E esse modo <strong>de</strong><br />

vida só começou a mudar com a revolução industrial e com as primeiras críticas feministas dos<br />

anos 70. On<strong>de</strong> a mulher inicia sua vida profissional, fora do lar e vai lutar por seus direitos <strong>de</strong><br />

igualda<strong>de</strong> sexual.<br />

Des<strong>de</strong> quando surgiu, o cinema vem a ser um dos modos <strong>de</strong> como nos foi transmitido essa<br />

visualização <strong>de</strong> mudanças femininas, já que se trata <strong>de</strong> um meio <strong>de</strong> comunicação popular. Como<br />

vimos os filmes produzidos narram histórias com personagens que refletem a socieda<strong>de</strong> da época<br />

em que foram filmados. E que, <strong>de</strong> acordo com a psicanálise, esses personagens são, por<br />

diversas vezes, misturados e fantasiados na mente humana com pessoas reais. Como nos é<br />

explicado na fase do espelho da teoria <strong>de</strong> Jacques Lacan. On<strong>de</strong> ainda criança, sem a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong><br />

sexual <strong>de</strong>finida, vemos a imagem projetada no espelho e criamos uma realida<strong>de</strong> para ela. O que<br />

nos leva, nos filmes, a nos projetarmos como o sujeito da ação, ou como o objeto.<br />

O que acontece é que durante muito tempo, por estar em posse do sistema patriarcal, as<br />

mulheres em todos os filmes, eram consi<strong>de</strong>radas objeto do <strong>de</strong>sejo masculino. Muito explicado na<br />

teoria <strong>de</strong> Freud com o voyeurismo e o fetichismo, on<strong>de</strong> elas <strong>de</strong>ixam ser observadas e agem <strong>de</strong><br />

maneira passiva encontrando, <strong>de</strong>sse modo, sua excitação. Mas vemos a quebra <strong>de</strong>ssa teoria da<br />

mulher objeto, quando nos <strong>de</strong>paramos com o pensamento lésbico, em que a mulher também tem<br />

a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> dominar.<br />

74


Portanto, a mulher ou o homem po<strong>de</strong>m se projetar e encontrar seu <strong>de</strong>sejo sexual nos dois<br />

modos, o <strong>de</strong> sujeito ou objeto. O que só po<strong>de</strong>mos concluir quando notamos a profundida<strong>de</strong> que o<br />

sistema está inserido na socieda<strong>de</strong>. E enten<strong>de</strong>mos que se voltássemos as relações básicas entre<br />

mãe e filho, <strong>de</strong> acordo com a psicanálise, iremos <strong>de</strong>scobrir que o feminino foi reprimido, pelo<br />

controle patriarcal, por medo do homem pela mulher.<br />

Com os estudos dos filmes, <strong>de</strong>scobrimos que estes, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte da época ou do contexto,<br />

sempre <strong>de</strong>monstram o mesmo sistema <strong>de</strong> domínio-submissão, sem importar qual dos sexos é o<br />

personagem ativo.<br />

Nos filmes <strong>de</strong> Hollywood, já encontramos, mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> submissão masculina. Pelo fato <strong>de</strong><br />

que a mulher já ganhou um espaço consi<strong>de</strong>rável na socieda<strong>de</strong> americana. O que ainda não<br />

vemos em culturas mais oprimidas e antigas, como as orientais ( Indiano e Iraniano ) que aqui<br />

foram mostradas.<br />

Concluindo, em fim, que a gran<strong>de</strong> peça que inutilizará o sistema do patriarcado que ainda<br />

conhecemos, é o feminismo. E enquanto seus i<strong>de</strong>ais não quebrarem as barreiras dos costumes e<br />

culturas antigas, não iremos encontrar filmes com outra visão, além da mulher objeto.<br />

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