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122 2002 - Fundação Biblioteca Nacional

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Inglaterra e, de quebra, o homem moderno. Os italianos teriam em Dante, Petrarca<br />

e Boccaccio os paladinos daqueles “vulgares ilustres”. 24 E assim, cada país cons -<br />

truiria sua tradição, inventando seu passado literário, como ficaria muito claro<br />

com o projeto do romantismo brasileiro.<br />

A CENSURA E O INFERNO MODERNOS<br />

18<br />

Há de se ressaltar que apenas uma parte relativamente pequena dos textos clássicos<br />

foi beneficiada com tradução nos “vulgares ilustres”. Ainda hoje, século XXI,<br />

boa parte daquelas obras não está traduzida em mais de um dos idiomas hegemônicos,<br />

criando condições para a permanência de graves vícios na transmissão do<br />

que seria o texto original antigo, como se verá adiante.<br />

Mesmo entre aqueles capazes de ler o latim, a censura se fazia presente por<br />

estratégias variadas e sutis. Dentre elas, uma das mais complexas foi engendrada<br />

nas grandes edições clássicas dos séculos XVI e XVII. Naquele período as res -<br />

trições para editar os textos greco-romanos na íntegra quase não são observadas,<br />

porém os textos dos autores greco-latinos vinham acompanhados sempre por co -<br />

men tários sistemáticos dos grandes eruditos da Igreja, atualizando cada trecho,<br />

em alguns casos cada frase ou expressão. Uma contribuição que se justificaria<br />

como facilitadora da leitura, ilustrando o leitor, porém se constituía, ao mesmo<br />

tempo, num meio de controlar fortemente a recepção dos conteúdos pelos leitores,<br />

não deixando margem para interpretações mais livres. Uma estratégia que não<br />

esconde as fortes influências da pedagogia de Quintiliano.<br />

As propostas deste pedagogo latino estão igualmente presentes na forma como<br />

editores de diferentes épocas lidam com as obras de autores importantes. O tratamento<br />

recebido pelo texto de Horácio é exemplar. O cantor do nacionalismo,<br />

da amizade e da filosofia, o incensado teórico da arte poética, é também autor<br />

de versos que expõem desejos e paixões humanas, carnalidade e animalidade das<br />

mulheres e a decadência dos corpos de velhas dissolutas. E faz isso numa lingua -<br />

gem direta e sem subterfúgios. Como publicar um texto deste quilate, ou me -<br />

lhor, como deixar de publicar o grande autor, cujo nome faz significar literatura,<br />

poesia e cânone?<br />

A solução dada por Manoel de Carvalho, em 1633, editor da obra do poeta<br />

“para uso dos estudantes” portugueses, foi o expurgo direto dos trechos imperti -<br />

nentes. Solução não muito diferente do tratamento editorial oferecido às traduções<br />

modernas da obra horaciana. Num trabalho de comparação detalhado, Bélkior<br />

demonstra que o texto do poeta está censurado em diferentes edições e idiomas,<br />

An. Bibl. Nac., Rio de Janeiro, <strong>122</strong>

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