de Pedro Américo - Association des Revues Plurielles
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Este cavalo, sem dúvida, foi pintado tendo como mo<strong>de</strong>lo<br />
a fotografia ao lado. A ilusão <strong>de</strong> movimento “para <strong>de</strong>ntro”<br />
do quadro criava uma imagen realista fora do padrões<br />
i<strong>de</strong>alistas da acacemia.<br />
Marey, ao fixar o <strong>de</strong>slocamento<br />
ainda hoje impressionante <strong>de</strong> uma<br />
forma no espaço, abria caminho<br />
para uma futura arte abstrata, notadamente<br />
nos movimentos artísticos<br />
iniciais bem conhecidos dos cubistas,<br />
futuristas e dadaístas.<br />
Pelas datas, evi<strong>de</strong>ntemente, <strong>Pedro</strong><br />
Américo não viu estas fotografias<br />
enquanto pintava a Batalha do<br />
Avahí, entre 1875 e 1876. Mas o<br />
pintor, por suas fortes preocupações<br />
em representar o movimento, <strong>de</strong>veria<br />
ter conhecimento <strong>de</strong>stas experiências<br />
fotográficas <strong>de</strong> Muybridge<br />
através <strong>de</strong> escritos anteriores. É possível<br />
pensar que a acentuação exagerada<br />
nos <strong>de</strong>talhes do movimento real,<br />
pintados por <strong>Pedro</strong> Américo, fosse<br />
<strong>de</strong>vido à divulgação das experiências<br />
das fotos <strong>de</strong> Muybridge e <strong>de</strong><br />
Marey <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1873, o que estimulou<br />
ainda mais tanto os pintores <strong>de</strong><br />
Panoramas, como também os pintores<br />
<strong>de</strong> história como Meissonier e<br />
<strong>Pedro</strong> Américo a capricharem nos<br />
símbolos do movimento 4 .<br />
Sabe-se também<br />
da notícia publicada<br />
em Paris, por Gaston<br />
Tissandier no periódico<br />
La Nature, <strong>de</strong><br />
1874, um ano antes<br />
<strong>de</strong> <strong>Pedro</strong> Américo<br />
começar a pintar a<br />
Batalha do Avahí e<br />
<strong>de</strong> Meissonier terminar<br />
a Batalha <strong>de</strong><br />
Friedland. Sem ter<br />
acesso às fotos <strong>de</strong><br />
Muybridge, <strong>Pedro</strong><br />
Américo teria sido<br />
estimulado pelas<br />
informações escritas e<br />
usado as fotos estáticas,<br />
compradas em<br />
Florença e em Paris,<br />
para servirem <strong>de</strong><br />
ai<strong>de</strong>s-mémoire para<br />
pintar o movimentado<br />
painel. Já os pintores<br />
<strong>de</strong> Panoramas, como os<br />
Philippoteaux, buscavam<br />
tornar essas<br />
evidências fotográficas<br />
ainda mais espetaculares,<br />
nas exibições das<br />
imensas rotundas, com<br />
a cobrança <strong>de</strong> ingressos<br />
aberto ao público.<br />
A “visão total” dos panoramas e<br />
o “golpe-<strong>de</strong>-vista” da fotografia<br />
instantânea<br />
Esse clima cultural reforçava os<br />
objetivos <strong>de</strong> <strong>Pedro</strong> Américo em<br />
captar o instante fugaz <strong>de</strong> um corpo<br />
em movimento, e que a máquina<br />
fotográfica se aproximava por registrar<br />
com todo o realismo. Na<br />
Batalha do Avahí, essa obsessão<br />
em fixar uma imagem pictórica<br />
como se captada em um “golpe-<strong>de</strong>vista”<br />
fotográfico, atingiu o clímax<br />
em vários pontos da composição.<br />
Destacaremos apenas um <strong>de</strong>les,<br />
que consi<strong>de</strong>ramos notável. Trata-se<br />
do cavalo pintado a partir <strong>de</strong> uma<br />
fotografia, localizado à esquerda na<br />
cena on<strong>de</strong> se encontra o General<br />
Osório. Esta fotografia pertencia à<br />
coleção do pintor, possivelmente<br />
adquirida a partir <strong>de</strong> março <strong>de</strong> 1875,<br />
conforme data escrita a bico-<strong>de</strong>pena<br />
no verso <strong>de</strong> uma das fotos <strong>de</strong><br />
A. Hautmann, em Florença 5 . É uma<br />
fotografia curiosa <strong>de</strong> um cavalo<br />
branco, <strong>de</strong> costas, sem ser possível<br />
divisar-lhe a cabeça. A sua cauda,<br />
tendo feito um movimento muito<br />
rápido, tornou impossível a fixação<br />
<strong>de</strong>sse movimento pela fotografia,<br />
dando ao cavalo estranho aspecto<br />
como se não tivesse cauda,<br />
mostrando bem os <strong>de</strong>talhes anatómicos<br />
(fig. 1).<br />
A transposição para a pintura<br />
acentuou a estranheza <strong>de</strong>sse<br />
escorço absolutamente original na<br />
representação <strong>de</strong> cavalos. A fotografia,<br />
servindo como referência<br />
para a memória, possibilitou a<br />
<strong>Pedro</strong> Américo pintar na Batalha<br />
do Avahí, não o cavalo estático, mas<br />
a suspensão <strong>de</strong> um instante em que<br />
todo o peso do animal estava<br />
flutuando com as quatro patas no<br />
ar, antes <strong>de</strong> voltar a tocar o chão.<br />
O extraordinário movimento do<br />
cavalo, pintado a partir da inusitada<br />
e estranha fotografia, criava uma<br />
imagem fora dos padrões i<strong>de</strong>alistas<br />
da aca<strong>de</strong>mia. É claro que esta<br />
imagem podia alinhar-se ao<br />
mosaico da Batalha <strong>de</strong> Alexandre<br />
em Pompéia, ou ao mo<strong>de</strong>lo cultural<br />
francês na representação dos<br />
cavalos pintados nos painéis <strong>de</strong><br />
Paul Delaroche, Horace Vernet ou<br />
Adolphe Yvon em Versalhes, pintores<br />
que também se apropriaram <strong>de</strong><br />
fotografias e eram bem conhecidos<br />
pelo pintor brasileiro. O que é<br />
inegável é que o uso da fotografia<br />
realista como mo<strong>de</strong>lo para pintar,<br />
dava ênfase a <strong>de</strong>talhes do movimento<br />
real, modificando a representação<br />
ventre-à-terre como vistos<br />
na pintura <strong>de</strong> Géricault.<br />
Foi tão gritante essa novida<strong>de</strong><br />
na época que um crítico <strong>de</strong> pseudônimo<br />
Nullius, escrevia em um dos<br />
principais jornais do Rio <strong>de</strong> Janeiro,<br />
a Gazeta <strong>de</strong> Notícias <strong>de</strong> 1877,<br />
atacando as mudanças mo<strong>de</strong>rnas<br />
da pintura. Acusava <strong>Pedro</strong> Américo<br />
<strong>de</strong> ter usado o expediente <strong>de</strong> pintar<br />
o cavalo com o seu movimento<br />
natural, dando a aparência <strong>de</strong> realmente<br />
estar no ar, apenas com o<br />
objetivo <strong>de</strong> surpreen<strong>de</strong>r o público.<br />
O crítico con<strong>de</strong>nava o fato <strong>de</strong> <strong>Pedro</strong><br />
Américo procurar ostentar na<br />
pintura os novos recursos artísticos<br />
com a ...beleza real [da fotografia] e<br />
38 LATITUDES n° 23 - avril 2005