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I Encontro <strong>de</strong> Pesquisa<strong>do</strong>res em Comunicação e Música Popular<br />
Tendências e convergências da música na cultura midiática<br />
21 a 23 <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 2009, UFMA, São Luis – MA.<br />
4<br />
Nacional chamavam <strong>de</strong> propaganda subversiva e guerra psicológica contra as instituições<br />
<strong>de</strong>mocráticas e cristãs, acabava por gerar uma lógica da suspeita. Ao incorporar essa lógica,<br />
os milhares <strong>de</strong> agentes envolvi<strong>do</strong>s, fossem funcionários públicos ou <strong>de</strong>latores coopta<strong>do</strong>s,<br />
passavam a ver a esfera da cultura com suspeição a priori, pois o meio artístico seria o local<br />
em que os comunistas e subversivos estariam particularmente infiltra<strong>do</strong>s, procuran<strong>do</strong><br />
fomentar a revolta na socieda<strong>de</strong>.<br />
Em tal conjuntura, o campo da música popular midiática <strong>de</strong>stacava-se como um <strong>do</strong>s<br />
alvos preferi<strong>do</strong>s da vigilância. Conforme as coleções <strong>do</strong> DOPS disponíveis nos Arquivos<br />
Públicos <strong>de</strong> São Paulo e <strong>do</strong> Rio <strong>de</strong> Janeiro, o leque <strong>de</strong> atuação <strong>do</strong>s agentes <strong>do</strong>s órgãos <strong>de</strong><br />
repressão junto ao meio musical foi <strong>de</strong> 1967 a 1982 (NAPOLITANO, 2004).<br />
Para ilustrar este fato <strong>de</strong> nosso passa<strong>do</strong> recente, leiamos um poema <strong>de</strong> 1983, em que<br />
Raul Seixas <strong>de</strong>bocha <strong>do</strong> então agonizante regime militar. “Para o Estadão” (SEIXAS, apud<br />
BUARQUE, 1997) foi <strong>de</strong>dica<strong>do</strong> ao jornal que o poeta consi<strong>de</strong>rava arqui-reacionário.<br />
Está na praça, já chegou<br />
O dicionário <strong>do</strong> censor<br />
Des<strong>de</strong> A até o Z<br />
Tem o que você po<strong>de</strong> ou não po<strong>de</strong> dizer<br />
Antes <strong>de</strong> pôr no papel<br />
O que você pensou<br />
Veja se na sua frase<br />
Tem uma palavra que não po<strong>de</strong><br />
Substitua por uma que po<strong>de</strong><br />
Você não queria assim... mas que jeito?<br />
O dicionário <strong>do</strong> censor<br />
É que <strong>de</strong>ci<strong>de</strong>, não o autor<br />
Um exemplo pra você<br />
Se na página <strong>do</strong> “p”<br />
Não consta a palavra “povo”<br />
Vê se no “o” tem escrito “ovo”<br />
Ovo po<strong>de</strong><br />
Se o senti<strong>do</strong> não couber<br />
Esqueça, risque tu<strong>do</strong>, compositor<br />
Seu <strong>de</strong>ver é <strong>de</strong>corar<br />
As que po<strong>de</strong> musicar<br />
No dicionário da censura<br />
Nem botaram “ditadura”<br />
O poema se apóia em rimas, estabelecen<strong>do</strong> uma sonorida<strong>de</strong> contínua e facilmente<br />
perceptível. A linguagem coloquial, em versos livres, imbuída <strong>de</strong> <strong>de</strong>sbun<strong>de</strong>, marca o texto. O<br />
autor expressa-se sem mediações, <strong>de</strong>nuncian<strong>do</strong> <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> direto e <strong>de</strong>scritivo a opressão da<br />
censura, fazen<strong>do</strong> coro aos engaja<strong>do</strong>s.<br />
Todavia, no início da década <strong>de</strong> 1970, para fugir ao sufoco <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> exceção, o<br />
caminho segui<strong>do</strong> por Raul Seixas não foi o <strong>do</strong> combate direto, como no atípico poema<br />
supracita<strong>do</strong>, mas sim uma união <strong>de</strong> <strong>de</strong>sbun<strong>de</strong> e ataque alegórico, com as canções <strong>de</strong>nuncian<strong>do</strong><br />
o ambiente <strong>de</strong> sufoco <strong>do</strong>s anos <strong>de</strong> chumbo.<br />
A antropóloga Mônica Buarque observa que Raul Seixas, auto<strong>de</strong>nomina<strong>do</strong> “ator”,<br />
assumiu o personagem <strong>de</strong> rebel<strong>de</strong> <strong>do</strong> rock e bufão da mídia para fazer ataques à or<strong>de</strong>m social<br />
vigente sem receber represálias muito maiores que eventuais prisões e sugestões <strong>de</strong> autoexílio,<br />
o que <strong>de</strong> fato ocorreu com o baiano.<br />
Exemplar foi o primeiro show <strong>de</strong> Raul em São Paulo, no Teatro das Nações, em 26 <strong>de</strong><br />
setembro <strong>de</strong> 1973. Na ocasião, o irreverente cantor distribuiu o gibi/manifesto A Fundação <strong>de</strong>