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JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN<br />

Núcleo Interdepartamental de Segurança<br />

Alimentar e Nutricional<br />

2008/2009


JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN<br />

Núcleo Interdepartamental de<br />

Segurança Alimentar e Nutricional<br />

2008/2009<br />

coordenação<br />

José Augusto de A. C. Taddei<br />

Kelly de Jesus Viana<br />

Maria Sylvia de Souza Vitalle


Copyright © 2013 Editora Manole Ltda., por meio de contrato de coedição com a Fundação de Apoio à Universidade Federal de<br />

São Paulo (FAP-<strong>Unifesp</strong>).<br />

logotipos Copyright © Núcleo Interdepartamental de Segurança Alimentar e Nutricional (Nisan)<br />

Copyright © Universidade Federal de São Paulo (<strong>Unifesp</strong>)<br />

Copyright © Fundação de Apoio à <strong>Unifesp</strong> (FAP)<br />

Minha Editora é um selo editorial Manole<br />

editor gestor Walter Luiz Coutinho<br />

editora Karin Gutz Inglez<br />

produção editorial Tamiris Prystaj, Juliana Morais e Cristiana Gonzaga S. Corrêa<br />

projeto gráfico Daniel Justi<br />

diagramação e revisão Departamento Editorial da Editora Manole<br />

capa Departamento de Arte da Editora Manole<br />

imagens da capa <strong>Unifesp</strong> e Stock Exchange<br />

ilustrações André E. Stefanini<br />

dados internacionais de catalogação na publicação (cip)<br />

(câmara brasileira do <strong>livro</strong>, sp, brasil)<br />

Jornadas científicas do NISAN : Núcleo Interdepartamental de Segurança Alimentar e Nutricional 2008/2009/<br />

coordenação José Augusto de A. C. Taddei, Kelly Viana, Maria Sylvia S. Vitalle . -- Barueri, SP : Minha Editora, 2013.<br />

Bibliografia<br />

ISBN 978-85-7868-081-7<br />

1. Alimentação escolar 2. Alimentos - Tabelas de composição 3. Antropometria 4. Educação<br />

5. Hábitos alimentares 6. Nutrição 7. Obesidade <strong>em</strong> crianças e adolescentes 8. Publicidade - Alimentos<br />

9. Segurança alimentar I. Taddei, José Augusto de A. C.. II. Viana, Kelly. III. Vitalle, Maria Sylvia S.<br />

13-02697 CDD-613.2<br />

índices <strong>para</strong> catálogo sist<strong>em</strong>ático:<br />

1. Segurança alimentar e nutricional : Promoção da saúde 613.2<br />

Todos os direitos reservados.<br />

Nenhuma parte deste <strong>livro</strong> poderá ser reproduzida, por qualquer processo, s<strong>em</strong> a permissão expressa dos editores.<br />

É proibida a reprodução por xerox.<br />

A Editora Manole é filiada à ABDR – Associação Brasileira de Direitos Reprográficos.<br />

1 a edição – 2013<br />

Editora Manole Ltda.<br />

Avenida Ceci, 672 – Tamboré<br />

06460-120 – Barueri – SP – Brasil<br />

Tel.: (11) 4196-6000 – Fax: (11) 4196-6021<br />

www.manole.com.br | info@manole.com.br<br />

Impresso no Brasil | Printed in Brazil<br />

Este <strong>livro</strong> cont<strong>em</strong>pla as regras do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, que entrou <strong>em</strong> vigor no Brasil <strong>em</strong> 2009.<br />

São de responsabilidade dos coordenadores e autores as informações contidas nesta obra.


MEMBROS DO NISAN<br />

2008/2009<br />

José Augusto de A. C. Taddei<br />

Coordenador do Núcleo Interdepartamental de Segurança Alimentar e<br />

Nutricional (Nisan). Professor-associado da Disciplina de Nutrologia do<br />

Departamento de Pediatria da Universidade Federal de São Paulo (<strong>Unifesp</strong>).<br />

Myrian Spinola Najas<br />

Vice-coordenadora no Nisan. Professora-assistente da Disciplina Geriatria<br />

e Gerontologia do Departamento de Medicina da <strong>Unifesp</strong>.<br />

Ana Cristina Freitas de Vilhena Abrão<br />

Tesoureira do Nisan. Professora Adjunta da Disciplina Enfermag<strong>em</strong><br />

Obstétrica do Departamento de Enfermag<strong>em</strong> e Coordenadora do Centro<br />

de Incentivo e Apoio ao Aleitamento Materno (Ciaam) da <strong>Unifesp</strong>.<br />

Ana Lúcia Medeiros de Souza<br />

Nutricionista do Setor de Política, Planejamento e Gestão <strong>em</strong> Saúde do<br />

Departamento de Medicina Preventiva da <strong>Unifesp</strong>.<br />

Anita Sachs<br />

Professora Adjunta da Disciplina Nutrição do Departamento de Medicina<br />

Preventiva da <strong>Unifesp</strong>.<br />

Conceição Vieira da Silva<br />

Professora-associada do Departamento de Enfermag<strong>em</strong> da <strong>Unifesp</strong>.


VI<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

Gisela Maria Bernardes Solymos<br />

Diretora de Projetos do Centro de Recuperação e Educação Nutricional<br />

(Cren) – Núcleo Salus Paulista (Salus), órgão supl<strong>em</strong>entar da<br />

<strong>Unifesp</strong>.<br />

Glaura César Pedroso<br />

Médica do Programa Docente-assistencial do Embu (Pida-Embu) da<br />

Disciplina Pediatria Geral e Comunitária do Departamento de Pediatria<br />

da <strong>Unifesp</strong>.<br />

Kelly de Jesus Viana<br />

Secretária do Nisan. Nutricionista. Especialista <strong>em</strong> Saúde, Nutrição e<br />

Alimentação Infantil pela <strong>Unifesp</strong>.<br />

Mauro Batista de Morais<br />

Livre-docente da Disciplina Gastroenterologia Pediátrica do Departamento<br />

de Pediatria da <strong>Unifesp</strong>.<br />

Meide Silva Anção<br />

Professor-associado do Departamento de Informática <strong>em</strong> Saúde e Diretor<br />

do Departamento de Tecnologia da Informação da <strong>Unifesp</strong>.<br />

Nilce Piva Adami<br />

Professora Titular da Disciplina Enfermag<strong>em</strong> de Saúde Pública e Administração<br />

aplicada à Enfermag<strong>em</strong> do Departamento de Enfermag<strong>em</strong> e<br />

Diretora do Departamento de Assuntos Comunitários da <strong>Unifesp</strong>.<br />

Cristina Pereira Gaglianone<br />

Professora Doutora do Centro de Desenvolvimento do Ensino Superior<br />

<strong>em</strong> Saúde (Cedess) e Representante do Curso de Nutrição da <strong>Unifesp</strong> –<br />

Campus Baixada Santista.


MEMBROS DO NISAN<br />

VII<br />

Maria Sylvia de Souza Vitalle<br />

Chefe do Setor de Medicina do Adolescente do Departamento de Pediatria<br />

da Escola Paulista de Medicina (EPM) da <strong>Unifesp</strong>. Professora Permanente<br />

do Programa de Pós-graduação <strong>em</strong> Educação e Saúde na Infância<br />

e Adolescência da <strong>Unifesp</strong>. M<strong>em</strong>bro da International Association<br />

for Adolescent Health (IAAH). Vice-presidente do Departamento de<br />

Adolescência da Sociedade de Pediatria de São Paulo (SPSP).<br />

Sarah Warkentin<br />

Secretária do Nisan. Nutricionista. Mestranda <strong>em</strong> Ciências. Especialista<br />

<strong>em</strong> Saúde, Nutrição e Alimentação Infantil pela <strong>Unifesp</strong>.<br />

EX-MEMBROS DO NISAN<br />

Rosana Fiorini Puccini<br />

Ex-coordenadora Fundadora do Nisan. Professora Titular da Disciplina<br />

Pediatria Geral e Comunitária do Departamento de Pediatria da <strong>Unifesp</strong>.<br />

Lucila Amaral Carneiro Vianna<br />

Ex-vice-coordenadora Fundadora do Nisan. Professora Titular da Disciplina<br />

Enfermag<strong>em</strong> <strong>em</strong> Saúde Pública e Administração Aplicada à Enfermag<strong>em</strong><br />

do Departamento de Enfermag<strong>em</strong> e Chefe de Gabinete da Reitoria<br />

da <strong>Unifesp</strong>.<br />

Eunice Akiyama<br />

Ex-secretária do Nisan. Secretária do Gabinete da Reitoria da <strong>Unifesp</strong>.<br />

Olga Maria Silvério Amancio<br />

Professora Adjunta do Laboratório de Pesquisa da Disciplina Nutrologia<br />

do Departamento de Pediatria da <strong>Unifesp</strong>.


VIII<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

Nildo Alves Batista<br />

Coordenador do Cedess e Coordenador Acadêmico da <strong>Unifesp</strong> – Campus<br />

Baixada Santista.<br />

Sofia Beatriz Machado de Mendonça<br />

Médica Sanitarista, Antropóloga e Coordenadora da Formação de Recursos<br />

Humanos do Projeto Xingu da Unidade de Saúde e Meio Ambiente<br />

do Departamento de Medicina Preventiva da <strong>Unifesp</strong>.<br />

Josefina Aparecida Pellegrini Braga<br />

Professora Adjunta, Doutora e Chefe do Setor de H<strong>em</strong>atologia Pediátrica<br />

do Departamento de Pediatria da Disciplina Especialidades<br />

Pediátricas da <strong>Unifesp</strong>.<br />

Mariana de Novaes Oliveira<br />

Ex-secretária do Nisan.


AUTORES<br />

Anna Helena Pedreira de Freitas<br />

Nutricionista. Especialista <strong>em</strong> Saúde, Nutrição e Alimentação Infantil<br />

pela Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo<br />

(EPM-<strong>Unifesp</strong>). Mestre <strong>em</strong> Ciências pelo Programa de Pós-Graduação<br />

<strong>em</strong> Pediatria e Ciências Aplicadas à Pediatria da EPM-<strong>Unifesp</strong>.<br />

Camila Maria de Melo<br />

Especialista <strong>em</strong> Fisiologia do Exercício pela <strong>Unifesp</strong>. Mestre <strong>em</strong> Ciências<br />

dos Alimentos pela Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade<br />

de São Paulo (FCF/USP).<br />

Claudia Ridel Juzwiak<br />

Professora-adjunta do Curso de Nutrição do Departamento de Ciências<br />

do Movimento Humano da <strong>Unifesp</strong> – Campus Baixada Santista.<br />

Claudio Leone<br />

Professor Titular do Departamento de Saúde Materno-infantil da Faculdade<br />

de Saúde Pública (FSP) da USP. Doutor e Professor Livre-docente<br />

<strong>em</strong> Pediatria Preventiva e Social pelo Departamento de Pediatria da Faculdade<br />

de Medicina da USP.<br />

Clóvis de Barros Filho<br />

Professor Livre-docente da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP.<br />

Eliana Bistriche Giuntini<br />

Doutora <strong>em</strong> Nutrição Humana Aplicada pela USP.


X<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

Elizabete Wenzel de Menezes<br />

Nutricionista. Mestre e Doutora <strong>em</strong> Ciências dos Alimentos pela USP.<br />

Professora-associada do Departamento de Alimentos e Nutrição Experimental<br />

da FCF/USP.<br />

Fernanda Cobayashi<br />

Nutricionista. Especialista <strong>em</strong> Saúde, Nutrição e Alimentação Infantil<br />

pela EPM-<strong>Unifesp</strong>. Doutora <strong>em</strong> Ciências pela <strong>Unifesp</strong>. Pesquisadora<br />

Colaboradora de Nutrição da USP.<br />

Fernando A. B. Colugnati<br />

Pesquisador-associado do Instituto de Pesquisas <strong>em</strong> Tecnologia e Inovação<br />

(IPTI). Pós-doutorando do Departamento de Política Científica<br />

e Tecnológica do Instituto de Geociências da Universidade Estadual de<br />

Campinas (DPCT-IG-Unicamp).<br />

Franco Maria Lajolo<br />

Doutor <strong>em</strong> Ciências dos Alimentos pela USP. Professor Titular do Departamento<br />

de Alimentos e Nutrição Experimental da FCF/USP.<br />

Giovana Longo-Silva<br />

Nutricionista. Especialista <strong>em</strong> Nutrição <strong>em</strong> Saúde Pública pela <strong>Unifesp</strong>.<br />

Mestre <strong>em</strong> Ciências pela <strong>Unifesp</strong>. Doutora <strong>em</strong> Ciências pelo Programa de<br />

Pós-graduação <strong>em</strong> Pediatria e Ciências Aplicadas à Pediatria da<br />

EPM-<strong>Unifesp</strong>.<br />

Glaura César Pedroso<br />

Médica. Pediatra da EPM-<strong>Unifesp</strong>. Doutora <strong>em</strong> Ciências pela <strong>Unifesp</strong>.<br />

M<strong>em</strong>bro do Departamento de Saúde Escolar da Sociedade de Pediatria<br />

de São Paulo (SPSP).


AUTORES<br />

XI<br />

Greisse Viero da Silva Leal<br />

Nutricionista. Mestre <strong>em</strong> Saúde Pública pela FSP/USP. Doutoranda <strong>em</strong><br />

Nutrição <strong>em</strong> Saúde Pública da FSP/USP.<br />

Helio Vannucchi<br />

Professor Titular da Divisão de Nutrologia do Departamento de Clínica<br />

Médica da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP (FMRP/<br />

USP).<br />

João Lopes Guimarães Júnior<br />

Promotor de Justiça do Consumidor do Ministério Público de São Paulo<br />

(MP-SP).<br />

José Augusto de A. C. Taddei (coordenação)<br />

Professor-associado da Disciplina de Nutrologia do Departamento de<br />

Pediatria da <strong>Unifesp</strong>.<br />

Kelly de Jesus Viana (coordenação)<br />

Nutricionista. Especialista <strong>em</strong> Saúde, Nutrição e Alimentação Infantil<br />

pela EPM-<strong>Unifesp</strong>.<br />

Luciana da Silva Sampaio Jorge<br />

Especialista <strong>em</strong> Saúde, Nutrição e Alimentação Infantil pela EPM-<br />

-<strong>Unifesp</strong>. Mestre <strong>em</strong> Ciências, com Área de Concentração <strong>em</strong> Saúde<br />

Coletiva, pela Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. Tutora<br />

da Estratégia Nacional <strong>para</strong> Alimentação Compl<strong>em</strong>entar Saudável<br />

(Enpacs). Nutricionista do Programa Saúde da Criança da Secretaria<br />

de Saúde do Município de Osasco/São Paulo. M<strong>em</strong>bro da International<br />

Baby Food Action Network – Brasil (IBFAN-Brasil).


XII<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

Luciana Rosa de Souza<br />

Doutora <strong>em</strong> Desenvolvimento Econômico pela Unicamp.<br />

Marcos Schaper dos Santos Junior<br />

Médico do Projeto Xingu da Unidade de Saúde e Meio Ambiente do Departamento<br />

de Medicina Preventiva da <strong>Unifesp</strong>.<br />

Maria Sylvia de Souza Vitalle (coordenação)<br />

Chefe do Setor de Medicina do Adolescente do Departamento de Pediatria<br />

da EPM-<strong>Unifesp</strong>. Professora Permanente do Programa de Pós-<br />

-graduação <strong>em</strong> Educação e Saúde na Infância e Adolescência da <strong>Unifesp</strong>.<br />

M<strong>em</strong>bro da International Association for Adolescent Health (IAAH).<br />

Vice-presidente do Departamento de Adolescência da SPSP.<br />

Martin Fabius Alcover de Barros<br />

Consultor e Pesquisador de Ética.<br />

Maysa Helena de Aguiar Toloni<br />

Nutricionista. Especialista <strong>em</strong> Saúde, Nutrição e Alimentação Infantil<br />

pela EPM-<strong>Unifesp</strong>. Mestre <strong>em</strong> Ciências pela <strong>Unifesp</strong>. Doutoranda do<br />

Programa de Pós-graduação <strong>em</strong> Pediatria e Ciências Aplicadas à Pediatria<br />

da EPM-<strong>Unifesp</strong>.<br />

Rita Maria Monteiro Goulart<br />

Nutricionista. Doutora <strong>em</strong> Saúde Pública pela FSP/USP. Docente do<br />

Curso de Graduação <strong>em</strong> Nutrição e do Mestrado <strong>em</strong> Ciências do Envelhecimento<br />

da Universidade São Judas Tadeu (USJT).


AUTORES<br />

XIII<br />

Sandra Maria Lima Ribeiro<br />

Nutricionista. Mestre <strong>em</strong> Ciências dos Alimentos pela FCF/USP. Doutora<br />

<strong>em</strong> Nutrição Humana Aplicada pela USP. Pós-doutora pelo Human<br />

Nutrition Research Center on Aging da Tufts University, Boston. Livre-<br />

-docente pela Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP.<br />

Professora-associada da Disciplina de Nutrição e Envelhecimento do<br />

Curso de Gerontologia da USP.<br />

Sarah Warkentin<br />

Nutricionista. Especialista <strong>em</strong> Saúde, Nutrição e Alimentação Infantil<br />

pela EPM-<strong>Unifesp</strong>. Mestranda <strong>em</strong> Pediatria e Ciências aplicadas à Pediatria<br />

da <strong>Unifesp</strong>. Professora Titular da Disciplina Educação Nutricional<br />

do Departamento de Nutrição da Universidade Paulista (Unip).<br />

Sonia Tucunduva Philippi<br />

Doutora <strong>em</strong> Nutrição <strong>em</strong> Saúde Pública pela FSP/USP. Professora-associada<br />

da Disciplina Dietética e Avaliação do Consumo Alimentar de Populações<br />

do Departamento de Nutrição da FSP/USP.<br />

Walter Belik<br />

Professor Titular do Instituto de Economia e Coordenador do Núcleo de<br />

Estudos e Pesquisas <strong>em</strong> Alimentação (Nepa) da Unicamp.


APRESENTAÇÃO<br />

Esta terceira coletânea apresenta quinze textos que compuseram quatro<br />

jornadas do Núcleo Interdepartamental de Segurança Alimentar e Nutricional<br />

(Nisan) nos anos de 2008 e 2009, seguindo a mesma proposta<br />

de promover a reflexão e a discussão de t<strong>em</strong>as relevantes <strong>para</strong> a Segurança<br />

Alimentar e Nutricional.<br />

Na primeira jornada, são abordados t<strong>em</strong>as relacionados à antropometria,<br />

principal instrumento <strong>para</strong> a vigilância nutricional de populações<br />

com maiores riscos de desvios nutricionais. Nos primeiros três<br />

capítulos, a antropometria é abordada <strong>em</strong> situações de risco biológico,<br />

como na infância, na gravidez e na velhice. Nos capítulos 4 e 5, discute-<br />

-se sobre a antropometria de populações indígenas e quilombolas, dois<br />

grupos que se caracterizam por apresentar maiores riscos socioeconômicos<br />

<strong>para</strong> a insegurança alimentar.<br />

A segunda jornada traz novas abordagens <strong>para</strong> os t<strong>em</strong>as “propaganda<br />

de alimentos e obesidade na infância e na adolescência”, questões<br />

já tratadas no primeiro fascículo dessa coletânea. Os primeiros dois capítulos<br />

descrev<strong>em</strong> ações que procuram educar formadores de opinião


XVI<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

e a população <strong>em</strong> geral <strong>para</strong> a escolha mais consciente de alimentos,<br />

apresentando o Portal Estilo de Vida Saudável e o S<strong>em</strong>áforo Nutricional,<br />

com suas vantagens e limitações. Nos dois capítulos seguintes, são apresentadas<br />

reflexões sobre os efeitos da propaganda de alimentos no consumo<br />

alimentar infantil e sobre regulamentação versus autorregulamentação<br />

da propaganda de alimentos dirigida a crianças e adolescentes.<br />

Na terceira jornada, discute-se a utilização da técnica da gota seca<br />

como avanço tecnológico que facilita o diagnóstico populacional de carências<br />

nutricionais específicas <strong>em</strong> inquéritos nacionais, informação relevante<br />

<strong>para</strong> a segurança alimentar e nutricional. Os outros dois capítulos<br />

que compõ<strong>em</strong> a terceira jornada tratam de t<strong>em</strong>as relacionados às<br />

tabelas de composição de alimentos e ao cálculo informatizado de dietas,<br />

instrumentos indispensáveis na construção de sist<strong>em</strong>as de vigilância<br />

nutricional <strong>para</strong> o país.<br />

Já a quarta jornada, composta pelos três capítulos finais desta coletânea,<br />

trata da alimentação na escola como instrumento de promoção<br />

de saúde e difusão de conhecimentos sobre dietas saudáveis, apresentando<br />

também, <strong>em</strong> uma abordag<strong>em</strong> macroeconômica, as dificuldades<br />

desses programas na América Latina ao longo das últimas décadas.<br />

Profª Drª Eleonora Menicucci de Oliveira<br />

Pró-reitora de Extensão (<strong>Unifesp</strong>)<br />

Profª Drª Conceição Vieira da Silva Ohara<br />

Pró-reitora de Extensão (<strong>Unifesp</strong>)


SUMÁRIO<br />

I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS:<br />

APLICAÇÃO EM DIFERENTES GRUPOS ETÁRIOS/ETNIAS<br />

19 de outubro de 2007<br />

Anfiteatro L<strong>em</strong>os Torres – <strong>Unifesp</strong><br />

Curvas de crescimento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3<br />

Claudio Leone<br />

Antropometria na gravidez . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37<br />

Luciana da Silva Sampaio Jorge<br />

Rita Maria Monteiro Goulart<br />

Avaliação do estado nutricional de idosos: antropometria . . . . . . . . . . . 59<br />

Sandra Maria Lima Ribeiro<br />

Camila Maria de Melo


XVIII<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

Consequências de um encontro: a insegurança alimentar<br />

das populações indígenas brasileiras e a relação de contato com<br />

a sociedade nacional. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79<br />

Marcos Schaper dos Santos Junior<br />

Antropometria de crianças quilombolas de 0 a 5 anos de idade . . . . . . . .99<br />

José Augusto de A. C. Taddei<br />

Fernando A. B. Colugnati<br />

Fernanda Cobayashi<br />

II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE NA<br />

INFÂNCIA E NA ADOLESCÊNCIA<br />

26 de março de 2008<br />

Teatro Marcos Lindenberg – <strong>Unifesp</strong><br />

A epid<strong>em</strong>ia da obesidade e a publicidade de alimentos . . . . . . . . . . . . 111<br />

José Augusto de A. C. Taddei<br />

Giovana Longo-Silva<br />

Maysa Helena de Aguiar Toloni<br />

Portal Estilo de Vida Saudável: uma ferramenta <strong>para</strong> o controle<br />

das doenças crônicas não transmissíveis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 129<br />

Kelly de Jesus Viana<br />

Sarah Warkentin<br />

Anna Helena Pedreira de Freitas<br />

José Augusto de A. C. Taddei<br />

A mídia e a alimentação infantil . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 139<br />

Clóvis de Barros Filho<br />

Martin Fabius Alcover de Barros


SUMÁRIO<br />

XIX<br />

Regulamentação versus autorregulamentação . . . . . . . . . . . . . . . . . 155<br />

João Lopes Guimarães Júnior<br />

I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO DE ALIMENTOS E<br />

CÁLCULO INFORMATIZADO DE DIETAS<br />

29 de outubro de 2008<br />

Teatro Marcos Lindenberg – <strong>Unifesp</strong><br />

Determinação do nível de h<strong>em</strong>oglobina utilizando a técnica da<br />

gota seca <strong>em</strong> papel de filtro – Pesquisa Nacional de D<strong>em</strong>ografia e Saúde<br />

(PNDS, 2006) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 163<br />

Helio Vannucchi<br />

Tabela Brasileira de Composição de Alimentos da Universidade de São Paulo<br />

(TBCA-USP) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 169<br />

Eliana Bistriche Giuntini<br />

Elizabete Wenzel de Menezes<br />

Franco Maria Lajolo<br />

Virtual Nutri Plus: programa <strong>para</strong> apoio às decisões nutricionais . . . . . . 197<br />

Sonia Tucunduva Philippi<br />

Greisse Viero da Silva Leal<br />

I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA E SEGURANÇA<br />

ALIMENTAR E NUTRICIONAL<br />

27 de outubro de 2009<br />

Teatro Marcos Lindenberg – <strong>Unifesp</strong><br />

A alimentação escolar como oportunidade de promoção da saúde . . . . . 209<br />

Glaura César Pedroso


XX<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

Educação alimentar e nutricional na escola . . . . . . . . . . . . . . . . . . 219<br />

Claudia Ridel Juzwiak<br />

Programas de alimentação escolar: instrumentos de promoção<br />

da segurança alimentar e nutricional na América Latina. . . . . . . . . . . 239<br />

Walter Belik<br />

Luciana Rosa de Souza<br />

Os <strong>PDF</strong>s dos volumes anteriores estão disponíveis no site do NISAN-<strong>Unifesp</strong>:<br />

http://www.unifesp.br/nucleos/nisan/index.php


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA<br />

E SUAS BASES CONCEITUAIS:<br />

APLICAÇÃO EM DIFERENTES<br />

GRUPOS ETÁRIOS/ETNIAS<br />

19 de outubro de 2007<br />

Anfiteatro L<strong>em</strong>os Torres – <strong>Unifesp</strong>


CURVAS DE CRESCIMENTO<br />

Claudio Leone<br />

INTRODUÇÃO<br />

Curvas de crescimento é a denominação habitualmente dada aos gráficos<br />

de crescimento físico de crianças e adolescentes que são utilizados<br />

na rotina assistencial dos serviços de saúde que normalmente atend<strong>em</strong><br />

a clientes dessas faixas etárias. As curvas nada mais são do que a representação<br />

gráfica das variações de medidas corporais (peso, estatura,<br />

circunferência craniana, índice de massa corporal [IMC], entre outras)<br />

tidas como normais e que são habitualmente observadas entre os indivíduos<br />

saudáveis de mesmo sexo e idade. Além disso, os gráficos descrev<strong>em</strong>,<br />

também especificamente <strong>para</strong> cada sexo, a tendência de evolução<br />

desses parâmetros antropométricos ao longo do t<strong>em</strong>po, isto é, <strong>em</strong> função<br />

da idade. 1<br />

FINALIDADE DAS CURVAS DE CRESCIMENTO<br />

Os gráficos de crescimento são utilizados no atendimento de crianças e<br />

adolescentes com algumas finalidades básicas:


4<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

• analisar a normalidade ou não de seu processo de crescimento;<br />

• contribuir <strong>para</strong> o diagnóstico de seu estado nutricional;<br />

• acompanhar sua evolução.<br />

Para tanto, as medidas de peso, estatura, etc. da criança ou do adolescente<br />

são com<strong>para</strong>das às de seus pares, <strong>para</strong> verificar <strong>em</strong> que posição<br />

suas medidas se situam <strong>em</strong> relação à faixa de variação de valores admitidos<br />

como normais <strong>para</strong> seu grupo de sexo e idade.<br />

Após inicialmente localizar sua posição no gráfico, passa-se a<br />

acompanhar sua evolução com a idade <strong>para</strong> verificar se segue a tendência<br />

de crescimento das crianças de porte físico s<strong>em</strong>elhante ou se dela se<br />

afasta, <strong>para</strong> mais ou <strong>para</strong> menos, indicando uma velocidade de crescimento<br />

superior ou inferior à do grupo. 1<br />

Sendo o crescimento um processo determinado por um amplo leque<br />

de fatores, entre os quais se destaca por sua importância a nutrição,<br />

eventuais alterações dos parâmetros antropométricos ou do processo de<br />

crescimento acabam sendo informações úteis <strong>para</strong> a elaboração de diagnósticos<br />

de desvios nutricionais que, eventualmente, pod<strong>em</strong> vir a ocorrer.<br />

ELABORAÇÃO DOS GRÁFICOS DE CRESCIMENTO<br />

O conhecimento prévio de como são (ou foram) elaboradas as curvas de<br />

crescimento é um ponto importante <strong>para</strong> que a interpretação dos resultados<br />

obtidos nas avaliações de parâmetros antropométricos possa ser<br />

feita de maneira adequada. 2<br />

Os gráficos de crescimento são (ou deveriam ser) elaborados a partir<br />

de estudos de levantamento de dados de amostras de grupos populacionais.<br />

Geralmente, as amostras utilizadas são representativas de populações<br />

específicas, como cidades, regiões e países, cujos resultados<br />

não pod<strong>em</strong> ser generalizados de maneira indiscriminada.<br />

Em algumas situações, não raras, por limitações de recursos ou por<br />

dificuldades operacionais intransponíveis, os pesquisadores acabam<br />

tendo de recorrer a uma amostra de conveniência. Esse tipo de amostra,


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

5<br />

possível de ser obtida naquelas circunstâncias, geralmente representa<br />

apenas e exclusivamente o próprio grupo de indivíduos avaliado, mas<br />

pode ser utilizado como referencial. Entretanto, deve-se ter <strong>em</strong> mente<br />

que sua utilização de maneira mais generalizada precisa ser feita com<br />

cuidado, pois pode produzir algumas distorções importantes no momento<br />

de avaliar uma criança ou um adolescente proveniente de outra<br />

população.<br />

Abstraindo da questão da amostra, as pesquisas de crescimento<br />

que se destinam à elaboração de curvas referenciais pod<strong>em</strong> ser realizadas<br />

na forma de estudos longitudinais ou transversais. Os estudos longitudinais<br />

acompanham o mesmo grupo de crianças (que se mantêm saudável)<br />

do nascimento até os 20 anos de idade, reavaliando suas medidas<br />

corporais após intervalos de t<strong>em</strong>po preestabelecidos.<br />

Por acompanhar s<strong>em</strong>pre a mesma amostra de indivíduos, os estudos<br />

resultam <strong>em</strong> curvas de crescimento bastante homogêneas, inclusive<br />

com uma dispersão menos ampla de valores ao redor das denominadas<br />

medidas de tendência central, como a média ou a mediana. Como consequência,<br />

os estudos longitudinais avaliam b<strong>em</strong> a velocidade de crescimento,<br />

mas reflet<strong>em</strong> menos a variabilidade populacional dos parâmetros<br />

antropométricos <strong>em</strong> cada idade, pois, durante o acompanhamento,<br />

as características de vida e de ambiente tend<strong>em</strong> a ser mais constantes<br />

ou a sofrer mudanças bastante s<strong>em</strong>elhantes entre os sujeitos que compõ<strong>em</strong><br />

a amostra.<br />

O maior inconveniente dos estudos longitudinais é o longo t<strong>em</strong>po<br />

de seguimento necessário <strong>para</strong> produzir a curva de crescimento completa.<br />

Além de gerar um custo muito elevado, esse tipo de estudo predispõe<br />

a um número relativamente elevado de perdas e abandonos do<br />

seguimento, com possíveis repercussões negativas sobre os resultados<br />

finais, cuja magnitude n<strong>em</strong> s<strong>em</strong>pre pode ser avaliada.<br />

Por sua vez, os estudos transversais são realizados de maneira<br />

a medir <strong>em</strong> um sist<strong>em</strong>a do tipo mutirão, como se fosse tudo <strong>em</strong> um<br />

mesmo dia, um grande número de amostras de indivíduos saudáveis,


6<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

agrupados por sexo e idade. Assim, diferent<strong>em</strong>ente do longitudinal, o<br />

estudo transversal reúne um conjunto de sujeitos diferentes <strong>para</strong> cada<br />

grupo de sexo e idade avaliado. Exatamente por não ser<strong>em</strong> os mesmos<br />

indivíduos mensurados <strong>em</strong> cada amostra, os resultados mostram maior<br />

dispersão de valores ao redor da média, mais compatível com as variações<br />

das características ambientais normalmente existentes. Contudo,<br />

essa menor homogeneidade dos dados realmente observados produz<br />

curvas de tendência de crescimento diferentes das resultantes de estudos<br />

de acompanhamento longitudinal.<br />

Após a coleta, os dados são tratados de maneira s<strong>em</strong>elhante, inclusive<br />

os transversais (como se tivess<strong>em</strong> sido obtidos <strong>em</strong> um estudo longitudinal).<br />

Os valores são submetidos a uma interpolação mat<strong>em</strong>ática<br />

de maneira a desenvolver modelos e equações que permitam estimar os<br />

valores <strong>para</strong> as idades compreendidas no intervalo existente entre dois<br />

momentos (idades) <strong>em</strong> que as medidas foram realizadas.<br />

Finalmente, os gráficos com as curvas de crescimento são elaborados<br />

com os dados obtidos a partir das equações de interpolação. Todos<br />

os valores <strong>para</strong> todas as idades são recalculados de modo a estimar os<br />

valores que melhor se ajust<strong>em</strong> aos realmente observados nas idades <strong>em</strong><br />

que as medidas foram efetuadas.<br />

Esses procedimentos serv<strong>em</strong> também <strong>para</strong> suavizar as irregularidades<br />

produzidas pelas diferenças de variações existentes intra e entre<br />

as amostras de medidas, de modo a produzir curvas bastante regulares<br />

e estáveis, mesmo <strong>para</strong> os estudos transversais.<br />

O objetivo é que as curvas reproduzam com bastante aproximação<br />

a distribuição e a tendência de evolução dos valores das medidas corporais<br />

de indivíduos normais de diferentes portes físicos, desde os mais<br />

miúdos, quase microssômicos, até os maiores <strong>em</strong> cada idade.<br />

Para que os resultados sejam precisos, independent<strong>em</strong>ente de<br />

seu grau de representatividade universal, é preciso que os estudos tenham<br />

muito cuidado com os aspectos ligados à metodologia de mensuração<br />

utilizada. Além de um rigoroso treinamento das equipes de


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

7<br />

mensuradores responsáveis pela coleta de dados <strong>em</strong> campo, é necessário<br />

que os estudos mantenham também constante supervisão e aferições<br />

periódicas das equipes, b<strong>em</strong> como a verificação sist<strong>em</strong>ática da<br />

consistência dos dados coletados. Uma coleta de dados imprecisa, com<br />

medidas não confiáveis, invalida qualquer tentativa de elaborar curvas<br />

referenciais de crescimento.<br />

Cabe salientar, conforme o que já foi considerado nos aspectos relativos<br />

à amostra, que esses estudos resultam <strong>em</strong> um retrato momentâneo<br />

do padrão de crescimento dos indivíduos avaliados, que eventualmente<br />

poderá ser utilizado, não como padrão, mas como referencial de<br />

crescimento com o qual outros indivíduos ou populações poderão ser<br />

com<strong>para</strong>dos.<br />

Após o processamento, os resultados são disponibilizados sob a<br />

forma de gráficos (curvas) de crescimento, mais práticos <strong>para</strong> a utilização<br />

no dia a dia, principalmente na prática clínica, ou na forma de tabelas,<br />

<strong>em</strong> que os valores estimados são apresentados de maneira a permitir<strong>em</strong><br />

uma avaliação mais precisa do crescimento, sendo extr<strong>em</strong>amente<br />

úteis nos casos de avaliação e/ou acompanhamento do tratamento de<br />

doenças específicas do crescimento. 2<br />

PERCENTIS E ESCORES Z<br />

Nos gráficos ou tabelas, os valores pod<strong>em</strong> ser apresentados de duas maneiras<br />

diferentes: classificados <strong>em</strong> percentis ou <strong>em</strong> escores z.<br />

Percentis<br />

A classificação <strong>em</strong> percentis nada mais é do que a representação de maneira<br />

hierarquizada, crescente, inicialmente dos valores observados e,<br />

posteriormente, dos valores estimados mat<strong>em</strong>aticamente.<br />

A Figura 1 ilustra a distribuição do que seria uma amostra real de<br />

dados antropométricos. Se os indivíduos foss<strong>em</strong> alinhados horizontalmente<br />

do menor <strong>para</strong> o maior (peso, estatura, circunferência craniana,<br />

etc.) e os que apresentass<strong>em</strong> valores muito s<strong>em</strong>elhantes foss<strong>em</strong>


8<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

colocados verticalmente um atrás do outro, seria possível obter uma<br />

figura <strong>em</strong> forma de sino, simétrica quanto à distribuição dos valores.<br />

Esse formato da figura é denominado Curva de Gauss ou Curva Normal,<br />

modelo que permite definir os valores daquele parâmetro antropométrico<br />

que delimitam determinadas porcentagens (proporções)<br />

da amostra e que são denominados percentis. Essa distribuição<br />

também pode ser assumida quando se utilizam os valores estimados<br />

mat<strong>em</strong>aticamente.<br />

FIGURA 1 Distribuição de uma amostra de indivíduos saudáveis de mesmo sexo e<br />

idade, hierarquizada por um parâmetro antropométrico, <strong>para</strong> figurar uma possível<br />

distribuição <strong>em</strong> percentis.<br />

Percentis<br />

Tamanho da amostra (n) = 56


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

9<br />

Na Figura 2, observa-se que é possível calcular a média de qualquer<br />

medida corporal entre os dois indivíduos alinhados centralmente e assim<br />

determinar um valor (representado pela linha vertical pontilhada)<br />

que se<strong>para</strong> a amostra <strong>em</strong> dois grupos de igual tamanho, correspondentes<br />

a 50% da amostra cada. Esse valor recebe a denominação de mediana<br />

ou percentil 50 e pode ser calculado <strong>para</strong> qualquer amostra de indivíduos<br />

de mesmo sexo e idade.<br />

FIGURA 2 Distribuição de uma amostra de indivíduos saudáveis de mesmo sexo<br />

e idade, hierarquizada por um parâmetro antropométrico, <strong>para</strong> d<strong>em</strong>onstrar o<br />

posicionamento do percentil 50 do grupo.<br />

Percentis<br />

Percentil 50<br />

n = 56


10<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

Assim, se uma criança, por ex<strong>em</strong>plo, tiver estatura igual a esse valor<br />

do percentil 50, significa que metade das crianças de mesmo sexo e idade<br />

é mais baixa do que ela e que a outra metade t<strong>em</strong> estatura maior.<br />

Na Figura 3, supondo que represente 60 indivíduos de uma amostra<br />

ordenada hierarquicamente pelo peso, observa-se que é possível<br />

determinar o valor que delimita os seis indivíduos mais pesados<br />

(10% da amostra), no extr<strong>em</strong>o direito da figura, ou os três mais magros<br />

(5% da amostra), no extr<strong>em</strong>o esquerdo da figura. Esses são os valores,<br />

calculados a partir da amostra, correspondentes aos percentis 90 e 5,<br />

respectivamente.<br />

FIGURA 3 Distribuição de uma amostra de indivíduos saudáveis de mesmo sexo<br />

e idade, hierarquizada por um parâmetro antropométrico, <strong>para</strong> d<strong>em</strong>onstrar o<br />

posicionamento dos percentis 5 e 90, além da mediana do grupo.<br />

Percentis<br />

Percentil 5 Percentil 50<br />

Percentil 90<br />

n = 56


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

11<br />

Deve-se salientar que, desse modo, é possível determinar quantos<br />

pontos de corte for<strong>em</strong> necessários, como o ponto que se<strong>para</strong> os 15%<br />

mais baixos (percentil 15), os 25% mais altos (percentil 75), os 5% mais<br />

gordos (percentil 95) ou, ainda, os 3% mais magros (percentil 3), e assim<br />

por diante. A classificação <strong>em</strong> percentis, intuitivamente, traz consigo a<br />

noção de risco, pois, como se observa pela Figura 3, quanto mais próximo<br />

dos extr<strong>em</strong>os da distribuição for o valor observado <strong>em</strong> uma criança<br />

ou adolescente, menos frequentes são os indivíduos normais portadores<br />

daquele valor. Está claro que isso não significa que o valor é obrigatoriamente<br />

anormal, mas indica que, apesar de a medida ter probabilidade<br />

de ser normal, esta é pequena.<br />

Escores z<br />

A classificação dos valores observados ou estimados <strong>em</strong> escores z é uma<br />

forma de localizar o quão distante da média (ou da mediana) de seu grupo<br />

de idade e sexo se situa a medida de uma criança. Obviamente, isso<br />

vale <strong>para</strong> qualquer parâmetro antropométrico, seja de peso, de estatura,<br />

de IMC, etc., e seu afastamento da média é medido <strong>em</strong> desvios padrão<br />

acima ou abaixo dela.<br />

Assim como a média ou a mediana representam o valor central de<br />

um conjunto de valores de qualquer ord<strong>em</strong>, antropométricos, inclusive,<br />

pode-se dizer que o desvio padrão representa, <strong>em</strong> termos, a dispersão<br />

desses valores ao redor da média (ou mediana) do grupo. Portanto,<br />

as amostras de dados de crescimento têm médias e medianas, b<strong>em</strong><br />

como desvios padrão distintos e específicos, de acordo com o grupo de<br />

idade e sexo.<br />

A partir da média ou mediana e do desvio padrão, é possível calcular<br />

o escore z de uma criança ou de um adolescente. Para tanto, qualquer<br />

que seja o parâmetro antropométrico considerado, basta subtrair o valor<br />

da média (ou mediana), correspondente a seu grupo de idade e sexo,<br />

do valor que a criança ou o adolescente apresenta. A seguir, divide-se a<br />

diferença (positiva, se a criança for maior do que a média, ou negativa,


12<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

se ela for menor) pelo valor do desvio padrão também específico do grupo.<br />

O Quadro 1 ex<strong>em</strong>plifica o cálculo de um escore z do peso de uma<br />

criança de 5 anos de idade.<br />

QUADRO 1<br />

Ex<strong>em</strong>plo de cálculo de escore z<br />

Sexo: masculino<br />

Idade: 5 anos<br />

Peso: 17 kg<br />

Média de peso deste grupo de idade do sexo masculino: 18,3 kg<br />

Desvio padrão deste grupo de idade do sexo masculino: 2,4 kg<br />

Portanto, o escore z = (17 – 18,3)/2,4 = –1,3/2,4 = 0,54<br />

Embora por analogia com a distribuição por percentis, é facilmente<br />

compreensível que quanto mais afastado da média, <strong>em</strong> escores z, for<br />

um valor antropométrico observado, menor será sua probabilidade de<br />

ser normal. Seu risco é mais difícil de ser intuitivamente percebido do<br />

que quando se utiliza a classificação <strong>em</strong> percentis.<br />

A percepção exata do risco pode d<strong>em</strong>andar cálculos adicionais ou a<br />

avaliação aproximada que se pode obter utilizando uma Curva de Gauss<br />

<strong>em</strong> que percentis e escores z estejam representados, como mostra a Figura<br />

4, na qual a Curva exibe a correspondência entre alguns valores de<br />

escore z e de percentis.<br />

Graficamente, a Curva de Gauss permite, ainda, mesmo que de<br />

maneira aproximada, avaliar a frequência com que determinado escore<br />

z é observado na população, como se pode ver na Figura 5, b<strong>em</strong> como<br />

a proporção da população que se situa acima ou abaixo de determinado<br />

escore z.


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

13<br />

FIGURA 4 Representação gráfica da distribuição de uma amostra de indivíduos<br />

saudáveis de mesmo sexo e idade, hierarquizada por um parâmetro antropométrico,<br />

<strong>para</strong> d<strong>em</strong>onstrar o posicionamento de alguns valores de escore z <strong>em</strong> relação à<br />

média, b<strong>em</strong> como os percentis correspondentes.<br />

Frequência do valor<br />

na população normal<br />

20%<br />

18%<br />

16%<br />

14%<br />

12%<br />

10%<br />

8%<br />

6%<br />

4%<br />

2%<br />

0%<br />

Z: escore z (desvios padrão)<br />

p: percentil correspondente ao escore z<br />

Curva de Gauss<br />

-3 Z -2 Z -1 Z 0 +1 Z +2 Z +3 Z<br />

p0,13 p2,28 p15,8 p50 p84,2 p97,72 p99,87<br />

(mediana)<br />

Nas Figuras 6 e 7, verifica-se que enquanto o escore z de +1 (um desvio<br />

padrão acima da média) e o escore z de -1 (um desvio padrão abaixo<br />

da média) ocorr<strong>em</strong> na população normal com a mesma frequência, eles<br />

delimitam proporções completamente diferentes de indivíduos normais.<br />

Por se tratar de um modelo mat<strong>em</strong>ático, aritmeticamente tratável,<br />

o escore z é melhor do que as classificações <strong>em</strong> percentis <strong>para</strong> ser<br />

utilizado <strong>em</strong> pesquisas cujo objetivo é com<strong>para</strong>r, além de prevalências,


14<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

FIGURA 5 Distribuição de uma amostra de indivíduos saudáveis de mesmo sexo<br />

e idade, hierarquizada por um parâmetro antropométrico, <strong>para</strong> d<strong>em</strong>onstrar a<br />

frequência populacional com que os escores z +1 e - 1 são observados.<br />

Frequência do valor<br />

na população normal<br />

20%<br />

18%<br />

16%<br />

14%<br />

12%<br />

10%<br />

8%<br />

6%<br />

4%<br />

2%<br />

0%<br />

Z: escore z (desvios padrão)<br />

p: percentil correspondente ao escore z<br />

Curva de Gauss<br />

-3 Z -2 Z -1 Z 0 +1 Z +2 Z +3 Z<br />

p0,13 p2,28 p15,8 p50 p84,2 p97,72 p99,87<br />

(mediana)<br />

distribuições de parâmetros antropométricos entre diferentes populações<br />

ou comunidades ou sua evolução <strong>em</strong> uma mesma população ao<br />

longo do t<strong>em</strong>po.<br />

CURVAS DE CRESCIMENTO DA ORGANIZAÇÃO<br />

MUNDIAL DA SAÚDE<br />

Há mais de 50 anos, as curvas de crescimento têm sido utilizadas <strong>para</strong><br />

avaliar rotineiramente o crescimento e o estado nutricional de crianças<br />

e, anos depois, também de adolescentes. Embora algumas dessas curvas<br />

tenham sido criadas <strong>para</strong> avaliar populações de países ou de regiões


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

15<br />

FIGURA 6 Distribuição de uma amostra de indivíduos saudáveis de mesmo sexo<br />

e idade, hierarquizada por um parâmetro antropométrico, <strong>para</strong> d<strong>em</strong>onstrar a<br />

proporção da população que se situa abaixo de escore z +1.<br />

Frequência do valor<br />

na população normal<br />

20%<br />

18%<br />

16%<br />

14%<br />

12%<br />

10%<br />

8%<br />

6%<br />

4%<br />

2%<br />

0%<br />

Z: escore z (desvios padrão)<br />

p: percentil correspondente ao escore z<br />

Curva de Gauss<br />

-3 Z -2 Z -1 Z 0 +1 Z +2 Z +3 Z<br />

p0,13 p2,28 p15,8 p50 p84,2 p97,72 p99,87<br />

(mediana)<br />

específicas, profissionais de outros países também passaram a utilizá-<br />

-las, já que não contavam com dados de suas próprias populações.<br />

O referencial provavelmente mais famoso e internacionalmente<br />

muito utilizado é o das denominadas Curvas de Tanner, publicadas <strong>em</strong><br />

1966 3,4 , que tinham como base dados de crescimento de crianças e adolescentes<br />

ingleses. Posteriormente, surgiram outras curvas, como a do<br />

National Center for Health Statistics (NCHS), dos Estados Unidos, a<br />

qual, desde 1977 5 , quando foi criada, passou a ser muito utilizada internacionalmente,<br />

principalmente <strong>para</strong> crianças de até 5 anos de idade,<br />

até por recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS). Nessa<br />

ocasião, a OMS recomendava que países que não tivess<strong>em</strong> curvas de sua


16<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

FIGURA 7 Distribuição de uma amostra de indivíduos saudáveis de mesmo sexo<br />

e idade, hierarquizada por um parâmetro antropométrico, <strong>para</strong> d<strong>em</strong>onstrar a<br />

proporção da população que se situa abaixo de escore z -1.<br />

Frequência do valor<br />

na população normal<br />

20%<br />

18%<br />

16%<br />

14%<br />

12%<br />

10%<br />

8%<br />

6%<br />

4%<br />

Curva de Gauss<br />

2%<br />

0%<br />

-3 Z -2 Z -1 Z 0 +1 Z +2 Z +3 Z<br />

p0,13 p2,28 p15,8 p50 p84,2 p97,78 p99,87<br />

Z: escore z (desvios padrão)<br />

(mediana)<br />

p: percentil correspondente ao escore z<br />

própria população utilizass<strong>em</strong> as do NCHS, <strong>em</strong> função da grande carga<br />

de trabalho e dos altos custos que a realização de um referencial próprio<br />

d<strong>em</strong>andaria, particularmente aos países <strong>em</strong> desenvolvimento. Nessa<br />

época, a OMS começou a reunir Comitês de Peritos <strong>para</strong> que criass<strong>em</strong><br />

critérios que permitiriam a utilização das curvas <strong>em</strong> diferentes países.<br />

Mais ou menos na mesma época, no Brasil, foi realizado um estudo sobre<br />

o crescimento de crianças e adolescentes da cidade de Santo André/SP<br />

que, após alguns anos, foi apresentado sob a forma gráfica de curvas<br />

de crescimento. Essas curvas, denominadas Curvas de Crescimento de<br />

Santo André Classe IV, eram <strong>em</strong>basadas nos dados das crianças e dos


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

17<br />

adolescentes de maior nível socioeconômico daquela cidade e tiveram<br />

ampla utilização no meio médico, particularmente entre os pediatras.<br />

Também na década de 1970, surgiu a Curva Cubana de Crescimento,<br />

que foi realizada <strong>em</strong> uma amostra representativa de crianças e adolescentes<br />

cubanos, com os melhores cuidados metodológicos possíveis<br />

na época, sob a coordenação do professor Jordan, de Cuba, e com a assessoria<br />

do professor Tanner, de Londres. Entretanto, a curva cubana<br />

acabou não extravasando os limites de seu próprio país, apesar, inclusive,<br />

dos esforços do próprio Tanner, obviamente como decorrência dos<br />

probl<strong>em</strong>as políticos que Cuba enfrentou naqueles anos.<br />

Em 2000, <strong>em</strong> decorrência de probl<strong>em</strong>as que vinham sendo relatados<br />

com frequência quando da utilização da Curva do NCHS, o Center<br />

for Diseases Control (CDC) lançou um novo conjunto de tabelas e gráficos<br />

de crescimento. 6 Essas novas curvas, denominadas CDC 2000, na<br />

verdade correspond<strong>em</strong> ao aproveitamento de dados das curvas anteriores<br />

do NCHS (1977), mas substituindo os valores das crianças de menores<br />

idades pelos de uma nova amostra de crianças de baixa idade, mais recente<br />

e mais representativa da população do país como um todo. 7,8<br />

Como novidade, ao lado das curvas habituais de peso, comprimento<br />

ou estatura, circunferência craniana e do braço, o CDC acrescentou<br />

uma curva de IMC <strong>para</strong> indivíduos de 2 a 19 anos de idade. Além das tabelas<br />

e dos respectivos gráficos, o CDC também disponibilizou, <strong>para</strong> uso<br />

livre, um programa que permite realizar a classificação de parâmetros<br />

antropométricos, tanto individualmente quanto <strong>em</strong> grupos de crianças<br />

e/ou adolescentes. Esse programa está disponível como um dos módulos,<br />

denominado Nutrition, do programa Epi Info, versão 3.5.1, ainda<br />

distribuído gratuitamente pelo CDC (wwwn.cdc.gov/epiinfo/script/<br />

translations.aspx) <strong>em</strong> diversas línguas, inclusive português.<br />

A curva do CDC continua sendo utilizada até hoje por muitos profissionais,<br />

incluindo pesquisadores, principalmente nos Estados Unidos.


18<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

CURVAS DE CRESCIMENTO DA OMS: 2006 E 2007<br />

Um conjunto de peritos convocados pela própria OMS conseguiu d<strong>em</strong>onstrar<br />

<strong>para</strong> a Organização, no início da década de 1990, que um grupo<br />

significativo de crianças vinha apresentando, no primeiro ano de<br />

vida, uma tendência de crescimento muito diferente da representada<br />

nas curvas do NCHS, até então recomendadas pela própria OMS. Tratava-se<br />

de dados de grupos de crianças saudáveis recebendo aleitamento<br />

materno de maneira adequada, cujo crescimento vinha sendo acompanhado<br />

por pesquisadores de diversos centros de investigação, todos<br />

de reconhecida competência no campo do crescimento humano. 9<br />

Esses dados de crescimento convenceram a direção e os d<strong>em</strong>ais<br />

funcionários da OMS quanto à necessidade de se mobilizar<strong>em</strong> recursos<br />

próprios e também outras fontes que viabilizass<strong>em</strong> a realização de<br />

um novo estudo de crescimento. As pr<strong>em</strong>issas do estudo incluíam a obtenção<br />

de uma amostra multicêntrica internacional, a utilização de metodologias<br />

e instrumentos atualizados, a realização de um treinamento<br />

e uma supervisão muito cuidadosos do pessoal encarregado da coleta<br />

dos dados e a revisão do modelo utilizado no processamento e análise<br />

dos dados.<br />

As amostras dos diversos centros deveriam atender a um padrão<br />

adequado, de acordo com o preconizado pela OMS, de aleitamento materno,<br />

além de ser<strong>em</strong> compostas por crianças saudáveis de ambientes<br />

e estratos socioeconômicos suficientes <strong>para</strong> permitir que houvesse um<br />

padrão de crescimento otimizado.<br />

Metodologicamente, decidiu-se por um estudo misto: com uma primeira<br />

parte longitudinal que acompanhasse crianças de 0 a 24 meses de<br />

vida, realizando mensurações a intervalos próximos, adequados à grande<br />

intensidade e rapidez que a evolução do crescimento t<strong>em</strong> nessa idade,<br />

e uma segunda parte transversal, com grupos de idade distribuídos <strong>em</strong><br />

intervalos de 3 meses, entre 18 e 60 meses de idade, que foram avaliados.


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

19<br />

Em relação ao aleitamento materno, a decisão foi de que todas as<br />

crianças do estudo longitudinal deveriam ter recebido aleitamento materno<br />

exclusivo ou preferencial até os 4 meses de idade. Após esse período,<br />

o aleitamento materno deveria ser mantido pelo menos até 1 ano de<br />

vida. Entretanto, <strong>para</strong> a parte transversal do estudo, exigiu-se apenas que<br />

todas as crianças incluídas nas amostras tivess<strong>em</strong> recebido no mínimo 3<br />

meses de aleitamento materno. Certamente, <strong>em</strong> ambas as partes do estudo,<br />

contou-se com uma dieta adequada compl<strong>em</strong>entando o aleitamento<br />

ou iniciada após o início do desmame.<br />

Como detalhe a mais, <strong>para</strong> ser<strong>em</strong> incluídas na amostra, as crianças<br />

deveriam ser filhas de mães não fumantes, <strong>em</strong> decorrência das conhecidas<br />

consequências que esse hábito materno t<strong>em</strong> sobre o crescimento<br />

da criança.<br />

O objetivo da OMS era produzir um referencial de crescimento<br />

adequado metodologicamente, que pudesse servir internacionalmente<br />

<strong>para</strong> avaliar e acompanhar o crescimento de crianças de 0 a 5 anos de<br />

idade, período da vida <strong>em</strong> que a criança apresenta sua maior vulnerabilidade<br />

diante de agravos de qualquer ord<strong>em</strong>. Simultaneamente, a OMS<br />

também decidiu realizar o estudo de marcos de desenvolvimento neuropsicomotor<br />

das crianças até 1 ano de idade, de maneira a confeccionar<br />

um referencial que permitisse o acompanhamento também de seu desenvolvimento<br />

na rotina de atendimento que essas crianças receb<strong>em</strong> na<br />

base do sist<strong>em</strong>a de saúde.<br />

Visando a uma racionalização dos elevados custos que um estudo<br />

desse porte d<strong>em</strong>andaria, a OMS selecionou <strong>para</strong> participar do estudo<br />

centros que, de acordo com seus critérios, já apresentavam experiência<br />

prévia na realização de pesquisas de campo, preferencialmente envolvendo<br />

o acompanhamento de crianças. Os grupos escolhidos <strong>para</strong> integrar<br />

a amostra foram os das seguintes cidades: Pelotas (RS, Brasil), Acra<br />

(Gana), Nova Déli (Índia), Davis (Califórnia, Estados Unidos), Mascate<br />

(Omã) e Oslo (Noruega).


20<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

No estudo longitudinal foram processados e analisados todos os<br />

dados, até os da idade de 24 meses, <strong>para</strong> realizar a estimativa de valores<br />

de crescimento apenas até os 18 meses, objetivando garantir melhor<br />

ajuste dos valores estimados com os valores reais e, ao mesmo t<strong>em</strong>po,<br />

obter maior suavização das curvas. Nesse processo, todas as crianças<br />

cujo peso <strong>para</strong> estatura estava acima de escores z +3 ou abaixo de -3 foram<br />

eliminadas da amostra.<br />

Após essa etapa, foi feita uma interpolação com os valores da parte<br />

transversal do estudo <strong>para</strong> gerar as tabelas e os gráficos finais do referencial.<br />

Na amostra da parte transversal do estudo, durante o processamento<br />

dos dados, foram eliminadas todas as crianças de 2 a 5 anos que<br />

se situavam acima de +2 desvios padrão, somente acima, o que significa<br />

provocar um <strong>em</strong>agrecimento das curvas de percentis ou de escore z da<br />

porção superior do gráfico de referência.<br />

A pesquisa <strong>em</strong> si, considerando as fases de campo e análise, durou<br />

6 anos. A OMS tornou públicos os resultados <strong>em</strong> 2006, liberando os direitos<br />

autorais <strong>para</strong> a livre utilização, enquanto a equipe que coordenou<br />

a realização do estudo concordou com a internacionalização de sua utilização<br />

como referencial de crescimento e desenvolvimento. 10,11<br />

Inicialmente, na ocasião do lançamento das curvas, denominadas<br />

Curvas de Crescimento OMS 2006, foram disponibilizadas as tabelas e<br />

os gráficos, por sexo, até a idade de 60 meses, de comprimento ou estatura,<br />

peso, IMC, circunferência br<strong>aqui</strong>al, circunferência craniana, dobra<br />

tricipital e dobra subescapular acompanhada dos gráficos de peso por<br />

comprimento ou por estatura, <strong>para</strong> ambos os sexos, e do referencial dos<br />

marcos de desenvolvimento.<br />

Pouco t<strong>em</strong>po depois, a OMS disponibilizou também o programa<br />

WHO Anthro <strong>para</strong> efetuar a transformação dos valores observados<br />

<strong>em</strong> percentil ou <strong>em</strong> escore z de crianças dessa faixa etária, individualmente<br />

ou, no caso de estudos populacionais, <strong>em</strong> grupos. Mais recent<strong>em</strong>ente,<br />

também foram divulgadas as tabelas de velocidade de ganho de


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

21<br />

comprimento e de peso por sexo. Todos esses referenciais e o programa<br />

pod<strong>em</strong> ser encontrados no site: http://www.who.int/childgrowth/en/,<br />

sendo sua utilização totalmente livre.<br />

CURVAS DE CRESCIMENTO (OMS, 2007)<br />

Em 2007, a OMS lançou um novo conjunto de tabelas e curvas <strong>para</strong> servir<br />

como referencial de crescimento, agora <strong>para</strong> crianças de 5 a 9 anos<br />

e adolescentes de 10 a 19 anos de idade, que pudesse compl<strong>em</strong>entar as<br />

curvas de 2006.<br />

Na verdade, as Curvas OMS 2007 são uma reconstrução das curvas<br />

de 1977 do NCHS, na época já recomendadas pela OMS. Nesse processo,<br />

os dados de 1977 foram fundidos com os dados das crianças de<br />

18 a 71 meses de idade da amostra utilizada na Curva OMS 2006. Depois<br />

disso, <strong>em</strong>pregando a mesma metodologia estatística de suavização<br />

adotada <strong>para</strong> a confecção das curvas do ano anterior (2006), novos dados<br />

foram estimados <strong>para</strong> as tabelas e os gráficos de referência de crescimento<br />

que foram criados <strong>para</strong> os escolares e os adolescentes.<br />

O objetivo desses procedimentos era obter, particularmente <strong>para</strong> o<br />

IMC, gráficos que, no extr<strong>em</strong>o inferior de idade, tivess<strong>em</strong> uma boa concordância<br />

com os valores das crianças de 59 meses de idade da curva<br />

de 2006, e que, no limite superior, nos adolescentes de 19 anos, os valores<br />

da curva foss<strong>em</strong> s<strong>em</strong>elhantes aos pontos de corte (cut off) propostos<br />

<strong>para</strong> adultos. Para isso, além do que já foi referido, também na confecção<br />

destas curvas foram excluídos os dados do NCHS de crianças e adolescentes<br />

muito pesados, que apresentavam valores extr<strong>em</strong>amente distanciados<br />

da mediana de seu grupo de sexo e idade.<br />

Como resultado, as diferenças de IMC <strong>para</strong> a idade entre as duas<br />

curvas, ao redor dos 5 anos, não ultrapassam 100 g/m 2 , enquanto, aos<br />

19 anos, os valores de escore z +1 de IMC são 0,4 kg/m 2 maiores <strong>para</strong><br />

o sexo masculino do que o ponto de corte de adultos – não há diferença<br />

no f<strong>em</strong>inino. Do mesmo modo, <strong>para</strong> o escore z +2, os valores <strong>para</strong>


22<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

ambos os sexos aos 19 anos foram de 29,7 kg/m 2 , muito próximos dos 30<br />

kg/m 2 definidos como ponto de corte <strong>para</strong> a obesidade <strong>em</strong> adultos. 12,13<br />

Assim, <strong>em</strong> 2007, a OMS lançou <strong>para</strong> livre utilização as tabelas e<br />

curvas de:<br />

• peso <strong>para</strong> idade e sexo, <strong>para</strong> crianças de 5 a 9 anos de idade;<br />

• estatura <strong>para</strong> idade e sexo, de 5 a 19 anos;<br />

• IMC <strong>para</strong> idade e sexo, de 5 a 19 anos.<br />

Não foram criados referenciais <strong>para</strong> outros parâmetros antropométricos.<br />

Especificamente <strong>para</strong> o peso, o referencial termina aos 10 anos de<br />

idade, pois a variabilidade da medida, <strong>em</strong> decorrência do estágio de desenvolvimento<br />

puberal <strong>em</strong> que o indivíduo se encontra, é muito grande,<br />

o que acarreta grande dificuldade <strong>em</strong> sua interpretação. No entender<br />

dos peritos da OMS, a avaliação da adequação do peso nos adolescentes<br />

é melhor se correlacionada à estatura, exatamente como é o caso do<br />

IMC.<br />

Junto dos gráficos, a OMS disponibilizou também <strong>para</strong> uso livre o<br />

programa WHO Anthro Plus, <strong>para</strong> cálculo de percentil ou escore z desses<br />

três parâmetros, utilizável tanto <strong>em</strong> indivíduos isoladamente quanto<br />

<strong>para</strong> grupos populacionais.<br />

Tabelas, gráficos e programas da OMS 2007 pod<strong>em</strong> ser livr<strong>em</strong>ente<br />

acessados no site: http://www.who.int/growthref/en/.<br />

ANÁLISE CRÍTICA DA UTILIZAÇÃO<br />

DAS CURVAS DA OMS DE 2006 E 2007<br />

Em consequência de todos esses fatos, particularmente no que tange ao<br />

aspecto multirracial da amostra estudada e aos cuidados metodológicos<br />

adotados, as curvas da OMS 2006 e 2007 pod<strong>em</strong> ser consideradas um<br />

bom referencial de crescimento <strong>para</strong> utilização nos países que não possu<strong>em</strong><br />

referenciais próprios.


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

23<br />

As características das crianças e dos adolescentes avaliados permit<strong>em</strong><br />

supor que eles apresentam um bom padrão de crescimento que,<br />

portanto, pode servir como referencial (não como padrão) de crescimento<br />

<strong>para</strong> outras crianças e adolescentes.<br />

A troca de um referencial só pode ser consequência do fato de o<br />

novo descrever outros valores de crescimento, possivelmente considerados<br />

melhores. Entretanto, é preciso algum cuidado no momento <strong>em</strong><br />

que se implanta a utilização de novas curvas de referência, o que obrigatoriamente<br />

implica a reclassificação das crianças quanto a seu diagnóstico<br />

de crescimento e/ou de risco nutricional. Esse fato se reveste de<br />

particular relevância no caso das crianças que estão nos limites superiores<br />

ou inferiores da amplitude de variação aceitável <strong>para</strong> determinado<br />

parâmetro antropométrico, que quase certamente, com a utilização<br />

de novo referencial, poderão deixar de ser normais ou, ao contrário, tornar<strong>em</strong>-se<br />

normais. 14<br />

Para superar essa dificuldade, é necessário analisar criticamente os<br />

diferentes parâmetros antropométricos do novo referencial, particularmente<br />

na sua utilização prática frente a indivíduos que estão <strong>em</strong> diferentes<br />

momentos de crescimento. 8 Nesse sentido, vale a pena iniciar a<br />

análise pela Curva OMS 2006. O primeiro aspecto a se considerar são<br />

os valores de nascimento, que não se aplicam de maneira indiscriminada<br />

a todo e qualquer recém-nascido. Como mostra a Figura 8, mesmo<br />

se tratando de recém-nascidos considerados a termo, deve-se considerar<br />

a idade gestacional.<br />

No caso do IMC, que de certa forma espelha a evolução conjunta<br />

de peso e comprimento segundo a idade gestacional, verifica-se na mesma<br />

Figura 8 que os percentis 50, 3 e 97, estimados a partir de uma amostra<br />

de recém-nascido a termo, com idades gestacionais de 37 a 42 s<strong>em</strong>anas<br />

incompletas, não correspond<strong>em</strong> aos da OMS. Embora possa parecer<br />

óbvio, é preciso ter <strong>em</strong> mente que os valores da OMS não foram calculados<br />

<strong>para</strong> ser<strong>em</strong> avaliados pela idade gestacional. 15


24<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

FIGURA 8 Com<strong>para</strong>ção dos valores de IMC correspondentes aos percentis 3, 50<br />

e 97, estimados a partir de uma amostra de recém-nascidos do Berçário Anexo à<br />

Maternidade do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de<br />

São Paulo, todos a termo, porém com distintas idades gestacionais, com os valores de<br />

IMC dos mesmos percentis propostos pela OMS 2006 <strong>para</strong> recém-nascido.<br />

IMC<br />

17<br />

16<br />

15<br />

p97<br />

14<br />

13<br />

p50<br />

12<br />

11<br />

p3<br />

10<br />

37 38 39 40 41 42<br />

Idade gestacional (s<strong>em</strong>anas)<br />

Brock et al., 2008.<br />

OMS, 2006<br />

Como se observa pela Figura 8, as discrepâncias se modificam conforme<br />

o percentil e a idade gestacional considerada, sendo que os valores<br />

menos diferentes são os das 37 s<strong>em</strong>anas <strong>para</strong> os percentis 3 e 50, e os<br />

das 42 s<strong>em</strong>anas de idade gestacional no caso do percentil 97.<br />

Desse modo, como era de se esperar, entende-se que é impossível,<br />

na prática, com<strong>para</strong>r os parâmetros antropométricos no momento<br />

do nascimento com a curva OMS 2006, mesmo que se trate de um parto<br />

a termo.


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

25<br />

A Figura 9 descreve a evolução dos valores de peso e de comprimento<br />

e estatura correspondentes aos percentis 3, 50 e 97 da Curva<br />

OMS 2006, agora transformados <strong>em</strong> percentis utilizando como referencial<br />

o CDC 2000.<br />

As maiores diferenças correspond<strong>em</strong> ao percentil 50 e são muito<br />

mais amplas <strong>para</strong> a curva do peso. Se ambos os referenciais d<strong>em</strong>onstrass<strong>em</strong><br />

um comportamento s<strong>em</strong>elhante de tendência de crescimento, poderiam<br />

ser observadas diferenças que, no entanto, tenderiam a ser mais<br />

constantes e não variariam tanto conforme a idade.<br />

FIGURA 9 Evolução dos percentis 3, 50 e 97 de peso e comprimento/estatura<br />

até os 5 anos de idade, <strong>em</strong> meninos, com<strong>para</strong>ndo os valores da OMS 2006 com o<br />

referencial do CDC 2000.<br />

Percentil<br />

97<br />

69<br />

50<br />

25<br />

OMS<br />

Peso<br />

Comprimento<br />

3<br />

0 6 12 18 24 30 36 42 48 54 60<br />

Idade (meses)<br />

CDC


26<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

No caso do peso, observa-se que o valor da OMS do percentil 50<br />

no nascimento é muito menor, correspondendo ao percentil 34 do CDC.<br />

A seguir, nos primeiros 3 a 4 meses, o peso (pela OMS) aumenta muito<br />

mais intensamente, com o percentil 50 chegando quase ao percentil 70<br />

do CDC. Daí <strong>em</strong> diante, há uma redução progressiva da velocidade de<br />

ganho de peso <strong>em</strong> relação à curva do CDC, que perdura até os 18 meses,<br />

fazendo que a mediana de peso da curva da OMS acabe correspondendo<br />

ao percentil 25 do CDC.<br />

A partir dos 18 meses, ocorre uma recuperação do ganho de peso<br />

que faz que aos 36 meses o valor do percentil 50 se torne praticamente<br />

idêntico nas duas curvas, o que persiste até os 5 anos.<br />

No caso do comprimento e da estatura, observa-se uma flutuação<br />

de valores de mesma tendência, <strong>em</strong>bora de muito menor amplitude. Especificamente,<br />

o percentil 50 de comprimento e estatura, como mostra<br />

a Figura 9, apesar das flutuações, permanece o t<strong>em</strong>po todo <strong>em</strong> valores<br />

superiores aos do CDC, parecendo indicar que não foi afetado pelas flutuações<br />

observadas no ganho de peso e que, portanto, esse poderia ser<br />

um padrão fisiológico de evolução ponderal. Nos percentis extr<strong>em</strong>os (3<br />

e 97), o comportamento é muito s<strong>em</strong>elhante, <strong>em</strong>bora com variações de<br />

valores de muito menor amplitude.<br />

O comportamento das meninas é praticamente idêntico ao dos<br />

meninos <strong>em</strong> todas as idades, respeitadas as diferenças de valores normalmente<br />

decorrentes do sexo. 16<br />

Quanto à circunferência craniana, o mesmo tipo de com<strong>para</strong>ção<br />

feita <strong>para</strong> peso e estatura mostra um comportamento completamente<br />

diferente entre as duas curvas, com os valores da mediana (escore z 0)<br />

da OMS 2006 s<strong>em</strong>pre bastante inferiores aos do escore z e da curva do<br />

CDC. A maior diferença (0,5 escore z) é a observada ao nascimento, e se<br />

reduz progressivamente até os 8 meses de vida, quando passa a flutuar<br />

<strong>em</strong> valores muito mais próximos do CDC, mas s<strong>em</strong>pre abaixo deste, até<br />

os 24 meses de vida (Figura 10). Além de eventuais aspectos metodológicos,<br />

como tipo de amostra, estudo longitudinal, técnicas de mensuração,<br />

entre outros, não parece haver outra explicação.


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

27<br />

FIGURA 10 Evolução do percentil 50 da circunferência craniana <strong>em</strong> meninas,<br />

com<strong>para</strong>ndo os valores da OMS 2006 com o referencial do CDC 2000.<br />

z +0,5<br />

(p 69,1)<br />

z 0<br />

(p 50)<br />

z -0,5<br />

(p 30,9)<br />

z -1<br />

(p 15,8) 0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22 24<br />

CDC<br />

OMS<br />

Idade (meses)<br />

Quanto à transição entre OMS 2006 e 2007, o que, como citado<br />

anteriormente, foi uma preocupação metodológica dos pesquisadores,<br />

as Figuras 11 e 12 mostram que, de fato, aos 60 meses, o ajuste foi bastante<br />

bom.<br />

Quando se com<strong>para</strong>m valores de crianças brasileiras de creches<br />

públicas e filantrópicas, com idades entre 3,5 e 7 anos in<strong>completo</strong>s,<br />

com essa parte dos dois referenciais, 2006 e 2007, o que se observa<br />

no caso do crescimento <strong>em</strong> estatura (Figura 11) é que muda a tendência<br />

de sua evolução. Inicialmente próxima, mas s<strong>em</strong>pre abaixo do referencial<br />

dos 38 aos 60 meses que, ainda que próxima, passa a ser acima<br />

da mediana entre 60 e 83 meses de idade. Nesse aspecto, o valor central<br />

(percentil 50) e os percentis 5 e 95 têm comportamentos praticamente<br />

idênticos. 17


Estatura (cm)<br />

28<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

FIGURA 11 Evolução da estatura de meninas de 38 a 84 meses de idade, de pré-<br />

-escolas filantrópicas e públicas, com<strong>para</strong>da aos valores das Curvas OMS 2006 e 2007.<br />

140<br />

135<br />

130<br />

125<br />

120<br />

p95<br />

p50<br />

115<br />

110<br />

p5<br />

105<br />

100<br />

95<br />

90<br />

OMS<br />

85<br />

80<br />

36<br />

42 48 54 60 66 72 78 84<br />

Idade (meses)<br />

Leone et al., 2009.<br />

A evolução do crescimento do peso não é igual à da estatura. Nos<br />

percentis 5, 50 e 95, a curva de tendência de ganho de peso dos pré-escolares<br />

está s<strong>em</strong>pre acima do referencial entre 38 e 84 meses de idade. O<br />

que se pode dizer, e que é s<strong>em</strong>elhante ao comportamento da estatura, é<br />

que a partir dos 60 meses a curva das crianças tende a se afastar da do<br />

referencial, <strong>em</strong> direção a valores de percentis mais elevados. No percentil<br />

5, essa tendência se inicia mais tardiamente, enquanto no percentil 95<br />

a diferença de peso se acentua progressivamente logo após os 60 meses,<br />

chegando a uma diferença de 5 kg a mais, entre 83 e 84 meses, <strong>em</strong> relação<br />

ao percentil 95 do referencial.<br />

Essa amostra de pré-escolares, com<strong>para</strong>da às Curvas da OMS, corresponde<br />

a dois estudos de desenho transversal, foi avaliada há mais


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

29<br />

de 5 anos e engloba mais de 2.800 crianças que na ocasião frequentavam<br />

pré-escolas públicas ou filantrópicas. Como consequência, é possível<br />

supor que a diferença de 5 kg observada no percentil 95 seja causada<br />

mais pelo <strong>em</strong>agrecimento realizado na amostra da OMS, decorrente da<br />

não inclusão dos outliers (crianças cujo peso estava muito acima da mediana),<br />

do que exclusivamente da transição nutricional que já se observava<br />

também no Brasil.<br />

O referencial da OMS 2007, <strong>para</strong> escolares e adolescentes, pela<br />

maneira como foi elaborado, praticamente não t<strong>em</strong> diferenças no que<br />

FIGURA 12 Evolução do peso de meninos de 38 a 84 meses de idade, de pré-<br />

-escolas filantrópicas e públicas, com<strong>para</strong>da aos valores das Curvas OMS 2006 e<br />

2007.<br />

35<br />

30<br />

M<br />

p 95<br />

Peso (kg)<br />

25<br />

20<br />

p 50<br />

p 5<br />

15<br />

OMS<br />

10<br />

36<br />

42 48 54 60 66 72 78 84<br />

Idade (meses)<br />

Leone et al., 2009.


30<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

tange à estatura, revelando uma tendência de crescimento quase idêntica<br />

à do CDC. Na Figura 13, observam-se algumas diferenças nos valores<br />

estimados <strong>em</strong> determinadas idades, que, no entanto, <strong>em</strong> valores absolutos<br />

são de pequena monta e não chegam a influenciar significativamente<br />

a utilização que pode ser feita das curvas <strong>para</strong> avaliar e acompanhar o<br />

crescimento de crianças escolares e de adolescentes.<br />

FIGURA 13 Com<strong>para</strong>ção dos valores de crescimento <strong>em</strong> estatura <strong>para</strong> o sexo<br />

f<strong>em</strong>inino, propostos pelas curvas OMS 2007 e CDC 2000 <strong>para</strong> escolares e<br />

adolescentes.<br />

190<br />

180<br />

p 97<br />

Estatura (cm)<br />

170<br />

160<br />

150<br />

140<br />

p 50<br />

p 3<br />

130<br />

120<br />

110<br />

105<br />

6<br />

7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19<br />

Idade (anos)<br />

OMS<br />

CDC/NCHS


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

31<br />

No entanto, quanto à variação do IMC e sua evolução até o início<br />

da idade adulta, as modificações feitas na amostra utilizada <strong>para</strong> os cálculos,<br />

excluindo os outliers mais obesos, resultaram <strong>em</strong> grandes diferenças<br />

nos valores de referência dos percentis mais elevados. A Figura<br />

14 mostra que, <strong>para</strong> o sexo f<strong>em</strong>inino, o valor de IMC do percentil 97 da<br />

curva OMS, <strong>para</strong> os 19 anos, é aproximadamente de 29 kg/m 2 – muito<br />

menor do que o proposto pelo referencial do CDC de 2000, que se<br />

situava praticamente <strong>em</strong> 34 kg/m 2 , uma diferença nada desprezível de<br />

quase 5 kg.<br />

FIGURA 14 Com<strong>para</strong>ção dos valores de crescimento do IMC <strong>para</strong> o sexo f<strong>em</strong>inino,<br />

propostos pelas curvas OMS 2007 e CDC 2000 <strong>para</strong> escolares e adolescentes.<br />

34<br />

32<br />

30<br />

Índice de massa corpórea<br />

28<br />

26<br />

24<br />

22<br />

20<br />

18<br />

p 97<br />

p 50<br />

16<br />

p 3<br />

14<br />

12<br />

6<br />

OMS<br />

CDC/NCHS<br />

7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19<br />

Idade (anos)


32<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

Todas essas características dos referenciais propostos pela OMS <strong>em</strong><br />

2006 e 2007 redundarão <strong>em</strong> alterações nas avaliações, especialmente<br />

de estado nutricional, das crianças e principalmente dos adolescentes.<br />

As modificações ocorridas nos valores limítrofes da curva certamente<br />

resultarão <strong>em</strong> uma maior sensibilidade <strong>para</strong> a detecção de situações de<br />

excesso de peso e, principalmente, de obesidade e de magreza (desnutrição)<br />

ao lado de uma maior especificidade, no caso dos menores de 5 anos,<br />

<strong>para</strong> detecção de baixa estatura.<br />

Embora essas características sejam bastante coerentes com a epid<strong>em</strong>ia<br />

de obesidade 18 e a importante redução da desnutrição que se observa<br />

atualmente no Brasil, é importante ter <strong>em</strong> mente que a adoção<br />

das novas curvas, já preconizada pelo Ministério da Saúde, resultará<br />

<strong>em</strong> duas importantes modificações. A primeira, no plano coletivo, será<br />

uma redução da prevalência de baixa estatura associada a um grande<br />

aumento na prevalência de sobrepeso e, principalmente, de obesidade.<br />

Isso significa que mudanças não desprezíveis dev<strong>em</strong> ocorrer nas políticas<br />

de atenção às crianças e aos adolescentes, de modo a absorver o aumento<br />

de d<strong>em</strong>anda decorrente da maior prevalência de casos com peso<br />

excessivo.<br />

A segunda, no plano individual, será o aumento de casos falsos-positivos<br />

<strong>para</strong> peso excessivo, consequência do aumento da sensibilidade,<br />

o que significa que os profissionais de saúde dev<strong>em</strong> ter mais cuidado na<br />

elaboração do diagnóstico nutricional. Os dados antropométricos nunca<br />

dev<strong>em</strong> ser valorizados <strong>em</strong> d<strong>em</strong>asia de maneira isolada, evitando, assim,<br />

a aposição excessiva de rótulos de “gordo” <strong>em</strong> indivíduos que pod<strong>em</strong><br />

ser normais e, ao mesmo t<strong>em</strong>po, deixando de realizar intervenções<br />

desnecessárias que, além de seu custo, no mínimo, resultam s<strong>em</strong>pre <strong>em</strong><br />

algum desconforto <strong>para</strong> o indivíduo.<br />

Por causa da grande variedade de parâmetros antropométricos<br />

propostos pelas novas curvas da OMS, não é impossível imaginar que<br />

outras distorções e consequências possam vir a ser observadas, o que,<br />

no entanto, só poderá ser detectado a partir de estudos realizados quando<br />

de sua utilização na rotina.


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

33<br />

Como conclusão, cabe salientar que, diante dos cuidados metodológicos<br />

que envolveram a realização da curva de 2006, não há como se<br />

posicionar de maneira absoluta contra sua utilização, particularmente<br />

nos países que não dispõ<strong>em</strong> de referenciais próprios. 19 No campo<br />

da pesquisa científica, também não há por que se opor à sua utilização.<br />

Aliás, a utilização de um mesmo referencial é condição sine qua non<br />

<strong>para</strong> que determinadas com<strong>para</strong>ções de crescimento e de prevalências<br />

possam ser realizadas entre diferentes grupos de indivíduos ou de populações.<br />

Assim, não há razões, no momento presente, <strong>para</strong> não se adotar<br />

um referencial metodologicamente b<strong>em</strong> elaborado e que disponibilize<br />

maior variedade de parâmetros antropométricos.<br />

Finalmente, é importante enfatizar que qualquer referencial pode<br />

ser útil, desde que tenha sido elaborado da maneira mais adequada possível,<br />

que seus defeitos e suas virtudes sejam conhecidos e, ao mesmo<br />

t<strong>em</strong>po, que os resultados sejam interpretados de maneira cuidadosa e<br />

crítica.<br />

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impl<strong>em</strong>entation. Food Nutr Bull 2004; 25(Suppl. 1):S3-S84.<br />

11. Garza C. New growth standards for the 21st century: a prescriptive approach.<br />

Nutr Rev 2006; 64(5)s55-s59.<br />

12. Butte NP, Garza C, de Onis M. Evaluation of the feasibility of international growth<br />

standards for school-aged children and adolescents. J Nutr 2007; 137:153-7.<br />

13. de Onis M, Onyango AW, Borghi E, Siyam A, Nishida C, Siekmann J. Development<br />

of a World Health Organization growth reference for school-aged children<br />

and adolescent. Bull of WHO 2007; 85:660-7.<br />

14. de Onis, Onyango AW, Borghi E, Garza C, Yang H. Comparison of the World<br />

Health Organization child growth (WHO) standards and the National Center<br />

for Health statistics/WHO international growth reference implications for<br />

health programmes. Public Health Nutr 2006; 9(7):943-7.<br />

15. Brock RS, Falcão MC, Leone C. Body mass index values for newborns according<br />

to gestational age. Nutr Hosp 2008; 23(5):487-92.<br />

16. Leone C. Departamento Científico de Nutrologia da SBP. As novas curvas da<br />

Organização Mundial da Saúde propostas <strong>para</strong> crianças de 0 a 5 anos de idade.<br />

Documento Científico. Rio de Janeiro: Sociedade Brasileira de Pediatria.<br />

17. Leone C, Bertoli CJ, Schoeps DO. Novas curvas de crescimento da Organização<br />

Mundial da Saúde: com<strong>para</strong>ção com valores de crescimento de crianças


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

35<br />

pré-escolares das cidades de Taubaté e Santo André, São Paulo. Rev Paul Pediatr<br />

2009; 27(1):40-7.<br />

18. Wang Y, Monteiro CA, Popkin BM. Trends of obesity and underweight in older<br />

children and adolescents in the United States, Brazil, China, and Russia. Am J<br />

Clin Nutr 2002; 75:971-7.<br />

19. World Health Organization. Child growth standards based on length/height,<br />

weight and age. Acta Paediatr 2006; (Suppl.)450:76-85.


ANTROPOMETRIA NA GRAVIDEZ<br />

Luciana da Silva Sampaio Jorge<br />

Rita Maria Monteiro Goulart<br />

INTRODUÇÃO<br />

O processo gravídico é reconhecido como o período de maior vulnerabilidade<br />

biológica do ciclo reprodutivo da mulher, <strong>em</strong> razão das alterações<br />

fisiológicas nele presentes. As mudanças são necessárias <strong>para</strong> regular o<br />

metabolismo materno, promover o crescimento fetal e pre<strong>para</strong>r a mulher<br />

<strong>para</strong> o trabalho de parto, o nascimento e a lactação. 1-3<br />

Para que a gravidez transcorra com segurança, preservando a saúde<br />

da mãe e de seu bebê, são necessários cuidados da própria gestante, do<br />

parceiro, da família e, especialmente, dos profissionais de saúde. 4 A assistência<br />

pré-natal é uma ação básica de saúde da mulher durante a gravidez,<br />

que t<strong>em</strong> como objetivos acolher a gestante desde o início – período<br />

de mudanças físicas e <strong>em</strong>ocionais – e prevenir, diagnosticar e tratar<br />

probl<strong>em</strong>as que possam ocorrer, visando a promover sua saúde e a da<br />

criança. Essa ação deve ser realizada <strong>em</strong> toda a rede pública de saúde do<br />

país. 4,5


38<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

O acompanhamento mensal é fundamental <strong>para</strong> a avaliação do<br />

crescimento fetal e de intercorrências clínicas, prevenindo e minimizando<br />

possíveis danos à saúde das mães e das crianças. Em geral, mulheres<br />

que receb<strong>em</strong> cuidados de pré-natal desde o primeiro trimestre têm<br />

melhores resultados gestacionais. 6<br />

Parte da vulnerabilidade biológica da mulher decorre do fato de<br />

a gestação ser um período anabólico que requer uma quantidade extra<br />

de energia e nutrientes <strong>para</strong> garantir o crescimento e a manutenção<br />

do feto e da placenta, a formação de novos tecidos maternos e a maior<br />

carga de trabalho metabólico e basal. 3 Com o aumento da d<strong>em</strong>anda fetal<br />

de nutrientes, além do aumento na ingestão calórica, os mecanismos<br />

que propiciam o alcance das necessidades nutricionais elevadas<br />

inclu<strong>em</strong> a redução do gasto energético na síntese de lipídios e proteínas<br />

e na estocag<strong>em</strong> de gordura materna, por meio de um aumento na<br />

eficiência metabólica da utilização de energia e/ou uma diminuição das<br />

atividades físicas. 7<br />

Vários fatores estão associados aos resultados obstétricos, como idade<br />

materna, intervalo interpartal, paridade, infecções, atividade física, patologias<br />

(hipertensão e diabetes), estado nutricional, tabagismo, uso excessivo<br />

de álcool, condições socioeconômicas, uso excessivo de cafeína, etc. 4<br />

Entre esses fatores, o estado nutricional materno nesse período t<strong>em</strong> dupla<br />

relevância, pois influi na saúde materna, podendo ser um dos atores<br />

causais de mortalidade materna, complicações na gravidez e no parto<br />

(necessidade de parto cirúrgico) e estado nutricional após o parto, como<br />

também na saúde do concepto, que, <strong>em</strong> razão da dependência da mãe<br />

<strong>para</strong> seu crescimento e desenvolvimento, sofre influência <strong>em</strong> seu peso<br />

ao nascer, pr<strong>em</strong>aturidade, mortalidade e morbidade neonatal. 3,8-11<br />

Engstrom 12 define estado nutricional<br />

[...] No plano individual ou biológico, como resultante do equilíbrio<br />

entre o suprimento de nutrientes (consumo/ingestão alimentar) e<br />

o gasto ou a necessidade energética do organismo. Este se refere à


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

39<br />

utilização dos alimentos pelo organismo <strong>para</strong> suprir suas necessidades<br />

nutricionais; portanto, relaciona-se com o estado de saúde do<br />

indivíduo e com a capacidade do organismo <strong>em</strong> utilizar (absorver,<br />

metabolizar) adequadamente os nutrientes da dieta.<br />

Apesar de existir consenso de que o estado nutricional da gestante é fundamental<br />

<strong>para</strong> sua saúde e do bebê e que, nos países não industrializados,<br />

essas mulheres representam um grupo vulnerável nutricionalmente,<br />

o Brasil está entre os países que não dispõ<strong>em</strong> de estudos nacionais<br />

que d<strong>em</strong>onstr<strong>em</strong> o perfil de estado nutricional de gestantes. 13<br />

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) realizou a<br />

Pesquisa de Orçamentos Familiares de 2002-2003, que avaliou o perfil<br />

nutricional da população brasileira e o padrão de consumo alimentar.<br />

Entre as mulheres adultas, encontrou-se cerca de 5% de desnutrição<br />

e 13% de obesidade. Na faixa de 20 a 24 anos de idade, a prevalência de<br />

desnutrição encontrada foi de 12,2%, e 18,4% de excesso de peso. Na faixa<br />

de 35 a 44 anos, o excesso de peso atingiu cerca de 41%.<br />

A com<strong>para</strong>ção entre os dados dessa pesquisa com as de anos anteriores<br />

encontrou uma tendência ao declínio da prevalência de desnutrição<br />

e aumento do excesso de peso entre as mulheres, com maior aumento<br />

entre mulheres de famílias com rendimento mensal de até meio<br />

salário mínimo per capita. 14 Assim, grande parcela das mulheres adultas<br />

<strong>em</strong> idade fértil de baixo nível socioeconômico está exposta a alterações<br />

nutricionais, principalmente ao excesso de peso, o que as coloca <strong>em</strong> situação<br />

de risco no caso de uma gestação.<br />

Nessa mesma publicação, foi realizada uma avaliação evolutiva do<br />

perfil antropométrico-nutricional entre os dados obtidos no Estudo Nacional<br />

de Despesa Familiar (ENDEF, 1974-1975) com os dados dessa pesquisa.<br />

Os resultados mostraram que ocorreu um declínio contínuo dos<br />

déficits ponderais <strong>em</strong> ambos os sexos: aumentaram contínua e intensamente<br />

as prevalências de excesso de peso e obesidade entre os homens<br />

e o excesso de peso entre as mulheres continuou aumentando apenas na


40<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

região Nordeste, entre famílias com renda mensal de até meio salário<br />

mínimo per capita – nas classes de maior renda, essa prevalência se estabilizou<br />

ou mesmo declinou. 14<br />

Os poucos resultados disponíveis sobre perfil nutricional de gestantes<br />

brasileiras foram produzidos por estudos <strong>em</strong> algumas regiões ou<br />

estados, como o estudo realizado por Pereira 15 , que, avaliando o estado<br />

nutricional de cerca de 20 mil gestantes, de vários municípios do estado<br />

de São Paulo, <strong>em</strong> dia de campanha de vacinação, encontrou 28% de baixo<br />

peso e 38% de sobrepeso/obesidade, com uso do critério de Rosso. 16<br />

Estudo de coorte realizado por Nucci et al. 17 , avaliando o estado nutricional<br />

de 5.564 gestantes usuárias de programa de pré-natal do Sist<strong>em</strong>a<br />

Único de Saúde (SUS), <strong>em</strong> seis capitais brasileiras, entre os anos de<br />

1991 e 1995, identificou 5,7% de baixo peso e 25% de sobrepeso/obesidade,<br />

com uso de índice de massa corporal (IMC) e critério da Organização<br />

Mundial da Saúde (OMS), com IMC menor que 18,5 kg/m 2 como<br />

ponto de corte <strong>para</strong> baixo.<br />

Historicamente, desde o início do século XX, o ganho ponderal foi<br />

relatado como indicador do estado nutricional materno e como possível<br />

preditor do crescimento fetal, <strong>em</strong> virtude de observações de que ganhos<br />

maiores de peso durante a gestação resultavam <strong>em</strong> aumentos na média<br />

de peso ao nascer. A partir desses achados, foram criadas recomendações<br />

acerca do ganho de peso gestacional ideal.<br />

Essas recomendações, ainda voltadas <strong>para</strong> o benefício sobre a saúde<br />

apenas do feto, geraram investigações que descreviam, além das variáveis<br />

fetais (crescimento fetal e peso ao nascer), as variáveis maternas<br />

(peso pré-gestacional, estatura). 2,18 A partir de então, o peso pré-gestacional<br />

foi destacado como um importante parâmetro, estimando-se que,<br />

<strong>para</strong> obter um ótimo crescimento fetal, as gestantes cuja relação do peso<br />

pré-gestacional <strong>para</strong> estatura fosse considerada inadequada necessitariam<br />

de um ganho de peso maior durante a gestação, sustentando a proposta<br />

de aumento de peso diferenciado segundo o estado nutricional<br />

pré-gestacional. 18


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

41<br />

No primeiro trimestre gestacional, o aumento de peso deve-se a alterações<br />

no corpo f<strong>em</strong>inino, que inclu<strong>em</strong> aumento do útero e das mamas,<br />

expansão do volume sanguíneo, líquido amniótico e desenvolvimento da<br />

placenta. No segundo e no terceiro trimestres, o aumento de peso deve-<br />

-se ao acúmulo de reservas nutricionais maternas <strong>para</strong> a lactação e o crescimento<br />

fetal. 18<br />

O baixo peso materno durante a gestação está associado à maior<br />

suscetibilidade a infecções, como as do trato respiratório e urinário,<br />

que pod<strong>em</strong> trazer repercussões desfavoráveis, como an<strong>em</strong>ia e perda de<br />

peso, contribuindo <strong>para</strong> o agravamento de seu estado nutricional. 12 Mulheres<br />

que iniciam a gravidez com baixo peso e/ou apresentam ganho<br />

de peso inadequado têm maior risco de o bebê apresentar retardo de<br />

crescimento intrauterino (RCIU), pr<strong>em</strong>aturidade e baixo peso ao nascer<br />

(BPN). 1<br />

Um dos fatores que têm mais impacto na determinação do peso ao<br />

nascer é o estado nutricional materno pré-gestacional, além do baixo<br />

ganho de peso durante a gravidez. 7,13 No Brasil, de acordo com a Pesquisa<br />

Nacional de D<strong>em</strong>ografia e Saúde de 1996 19 , o BPN ocorreu <strong>em</strong> 10,2%<br />

das crianças, valor s<strong>em</strong>elhante ao da década anterior. 10 O BPN está associado<br />

a diversas condições prejudiciais, e os riscos de mortalidade neonatal<br />

e infantil e de morbidade na infância aumentam à medida que diminui<br />

o peso de nascimento. 7,20<br />

A obesidade durante a gravidez está associada a diabete melito,<br />

pré-eclâmpsia, trabalho de parto pr<strong>em</strong>aturo, h<strong>em</strong>orragias pós-parto,<br />

partos por cesária, infecções, macrossomia fetal, baixos escores de Apgar<br />

e obesidade na infância, indicação de que as consequências são prejudiciais<br />

tanto <strong>para</strong> a mãe como <strong>para</strong> o filho. 1,17,21-24<br />

Allen et al. 25 , <strong>em</strong> estudo que investigou as relações entre a nutrição<br />

e os resultados da gravidez, com dados de gestantes do Egito, México e<br />

Quênia, verificaram que mulheres com IMC pré-gestacional baixo ganhavam<br />

mais peso durante a gestação e perdiam mais peso no período<br />

pós-parto e que o contrário ocorria com as mulheres que apresentavam


42<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

IMC pré-gestacional alto: ganho de peso menor na gestação e perda de<br />

peso menor no pós-parto.<br />

Estudo realizado por School 26 , com o objetivo de examinar a influência<br />

do ganho de peso gestacional na retenção de peso pós-parto e os resultados<br />

da gravidez, verificou que mulheres com ganho de peso excessivo<br />

entre a 20ª e a 30ª s<strong>em</strong>ana de gestação apresentavam maior retenção<br />

de peso pós-parto, que correspondia a cerca de 5 a 7% do peso pré-gestacional<br />

das mulheres.<br />

VIGILÂNCIA NUTRICIONAL DE GESTANTES<br />

A avaliação do estado nutricional e o monitoramento do peso na gestação<br />

são cuidados preconizados pelo Ministério da Saúde 4,27 , por meio<br />

da antropometria. Esse método é recomendado mundialmente, por<br />

ser não invasivo, de baixo custo, exigir pouca tecnologia e ser de fácil<br />

aplicação. 4,7<br />

A avaliação nutricional nesse período diferencia-se pelo fato de dever<br />

refletir não apenas um único indivíduo, mas sim a mulher e, indiretamente,<br />

o crescimento do feto. 7<br />

As medidas antropométricas realizadas no início da gravidez visam<br />

a avaliar o estado nutricional da mulher e predizer como deverá ser<br />

a evolução <strong>para</strong> atender às suas d<strong>em</strong>andas fisiológicas durante a gestação.<br />

As medidas realizadas durante a gestação têm como propósito avaliar<br />

a evolução do ganho de peso e identificar as mulheres que se beneficiariam<br />

com intervenções nutricionais. 7<br />

O Ministério da Saúde 4 preconiza que todas as gestantes dev<strong>em</strong><br />

ter seu estado nutricional avaliado durante a gestação, como parte integrante<br />

da rotina do pré-natal. Nas Unidades Básicas de Saúde e nas Unidades<br />

de Saúde da Família do SUS, a realização e a incorporação da avaliação<br />

nutricional e do monitoramento do ganho de peso das gestantes<br />

na rotina do serviço de atendimento de pré-natal indicam a valorização<br />

do seu estado nutricional como um importante fator que interfere na<br />

saúde da mãe e do bebê. 12,13


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

43<br />

Segundo Engstrom 12 , valorizar o estado nutricional das gestantes<br />

como um dos fatores determinantes de sua saúde e de seu bebê,<br />

b<strong>em</strong> como ter um olhar atento, diferenciado e cuidadoso <strong>para</strong> esses probl<strong>em</strong>as,<br />

observando seu estado nutricional e seu ganho de peso, é ter atitude<br />

de vigilância e promover a vigilância nutricional.<br />

De acordo com a OMS e a Organização Pan-americana de Saúde<br />

(Opas), o Sist<strong>em</strong>a de Vigilância Alimentar e Nutricional (Sisvan) pode<br />

ser definido como<br />

[...] sist<strong>em</strong>a de coleta, processamento e análise contínuos de dados<br />

de uma população, possibilitando um diagnóstico atualizado da situação<br />

nutricional, suas tendências t<strong>em</strong>porais e, também, dos fatores<br />

de sua determinação. Contribui <strong>para</strong> que se conheçam a natureza<br />

e a magnitude dos probl<strong>em</strong>as de nutrição, caracterizando grupos<br />

sociais de risco e dando subsídios <strong>para</strong> a formulação de políticas, estabelecimento<br />

de programas e intervenções. 28,29<br />

No Brasil, <strong>em</strong> 1990, a Vigilância Nutricional foi regulamentada como<br />

campo de atuação do SUS, por meio da Lei Orgânica n. 8080/90, e reconhecida<br />

como atribuição do sist<strong>em</strong>a de saúde. 30 Além disso, a publicação<br />

da Norma Operacional Básica (NOB/96) 31 e da Norma Operacional<br />

de Assistência à Saúde (Noas/01) 32 reforça a responsabilidade municipal<br />

na execução de um Sisvan.<br />

Em 1999, mais um avanço foi dado pelo Ministério da Saúde, ao<br />

instituir a Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN), com<br />

o propósito de estabelecer diretrizes e responsabilidades de diversos<br />

setores na garantia da segurança alimentar e nutricional. A PNAN<br />

preconiza que o Sisvan deve ser realizado prioritariamente com o<br />

grupo materno-infantil e realizar o mapeamento de end<strong>em</strong>ias carenciais,<br />

compreendendo uma descrição contínua e a predição de tendências,<br />

caracterizando áreas geográficas, segmentos sociais e biológicos<br />

de risco. 27


44<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

Dentro do SUS, a Vigilância Nutricional como um sist<strong>em</strong>a contínuo<br />

de coleta, análise e processamento de dados pode colaborar <strong>para</strong><br />

apontar as diferenças do perfil nutricional de uma população de determinada<br />

localidade, a partir de informações obtidas na rotina de atendimento,<br />

com baixo custo e boas condições operacionais, sendo fonte potencial<br />

de informações <strong>para</strong> orientação de condutas individuais, triag<strong>em</strong><br />

<strong>para</strong> programas de intervenção e planejamento de ações coletivas. Pode,<br />

ainda, promover a intersetorialidade na resolução de probl<strong>em</strong>as, apontando<br />

e discutindo com outros setores. 33<br />

HISTÓRICO DOS MÉTODOS DE AVALIAÇÃO<br />

NUTRICIONAL DE GESTANTES<br />

É amplo o debate sobre a escolha de indicadores <strong>para</strong> avaliação nutricional<br />

da gestante. Um estudo multicêntrico realizado <strong>em</strong> 25 grupos de<br />

populações de todo o mundo, <strong>em</strong> colaboração com a OMS, analisou a<br />

antropometria materna e os resultados da gravidez, utilizando dados<br />

de 1959 a 1989, correspondentes a aproximadamente 110.000 mulheres,<br />

cujos dados antropométricos foram repetidos até o final da gravidez.<br />

A OMS 7 , com base nos resultados desse estudo multicêntrico e também<br />

<strong>em</strong> uma revisão de literatura realizada pelo Institute of Medicine<br />

(IOM) e uma publicação da Opas, elaborou recomendações internacionais<br />

sobre a escolha desses indicadores.<br />

O uso de uma combinação de indicadores, como altura materna<br />

e peso durante a gestação, ou IMC pré-gestacional e aumento de peso,<br />

provavelmente proporcionam a alternativa mais eficiente <strong>em</strong> determinadas<br />

situações, como melhor orientar os recursos financeiros, materiais<br />

e humanos. Para os propósitos de vigilância nutricional, um único<br />

indicador seria mais apropriado, <strong>para</strong> facilitar o processo. 7<br />

Atualmente, o IMC, <strong>em</strong>bora não avalie a composição corporal do indivíduo,<br />

t<strong>em</strong> tido sua aplicação fundamentada pela alta correlação que<br />

mantém com a gordura corporal, pelas dificuldades na obtenção de outras<br />

medidas do tecido adiposo, pela facilidade de cálculo, por não necessitar


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

45<br />

de um padrão de referência e por refletir uma estimativa das reservas maternas.<br />

20 Também t<strong>em</strong> tido forte associação com risco de doenças crônicas<br />

não transmissíveis e, por ser o mesmo indicador usado <strong>para</strong> adultos, reduz<br />

a necessidade de capacitação da equipe de saúde <strong>para</strong> uso do método. 34<br />

Várias tentativas têm sido realizadas <strong>para</strong> se encontrar uma solução<br />

científica e operacionalmente satisfatória <strong>para</strong> a avaliação do estado<br />

nutricional da gestante, sendo que nas últimas quatro décadas muitos<br />

esforços têm sido centralizados nos métodos antropométricos como<br />

instrumento de avaliação da condição nutricional da gestante.<br />

Na América Latina, um grupo de especialistas do Instituto de Nutrição<br />

do Centro-América e Panamá (Incap), <strong>em</strong> 1961, elaborou um<br />

modelo gráfico que considerava as diferenças de estatura materna e o<br />

aumento de peso segundo a idade gestacional, d<strong>em</strong>arcando limites inferiores<br />

e superiores de normalidade. Apesar de não considerar o estado<br />

nutricional pré-gestacional e as diferenças que deveriam ser observadas<br />

entre o ganho de peso de mulheres obesas e desnutridas, foi amplamente<br />

utilizado <strong>em</strong> países da América Central. 11<br />

Em 1977, um grupo de pesquisadores <strong>em</strong> São Paulo propôs e testou<br />

uma modificação no modelo gráfico do Incap, utilizando o peso pré-<br />

-gestacional, além do peso durante a gestação, e relacionando-o com o<br />

peso ao nascer do recém-nascido. Verificaram que o peso inicial da gestante<br />

t<strong>em</strong> relação direta com o peso do recém-nascido e que a mulher<br />

deve ser orientada <strong>para</strong> que tenha um ganho adequado de seu peso pré-<br />

-gestacional. 36 Tratava-se, no entanto, de um modelo conceitual definido<br />

por consenso e com pontos de corte estabelecidos por convenção,<br />

s<strong>em</strong> a necessária validação. 11<br />

Rosso 16 propôs uma curva de referência baseada <strong>em</strong> cálculos do<br />

aumento proporcional de peso, supondo que o aumento ponderal total<br />

deveria ser de 20% do peso ideal esperado <strong>para</strong> altura antes da gravidez,<br />

pois esse ganho asseguraria o máximo crescimento do feto. O instrumento<br />

gráfico proposto utilizava o percentual de adequação do peso<br />

esperado <strong>para</strong> altura, conforme a idade gestacional.


46<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

Em 1986, Fescina realizou um estudo no Centro Latinoamericano<br />

de Perinatologia (Clap), no Uruguai, sobre aumento de peso durante a<br />

gravidez, com o objetivo de elaborar uma tabela <strong>para</strong> saber <strong>em</strong> qualquer<br />

momento se o peso está adequado <strong>para</strong> a idade gestacional nas mulheres<br />

que desconhec<strong>em</strong> seu peso pré-gestacional. Os resultados mostraram<br />

um aumento de peso linear da 13ª até a 36ª s<strong>em</strong>ana e um aumento<br />

maior no segundo trimestre. O autor concluiu que esse índice é sensível<br />

e adequado <strong>para</strong> todos os níveis de atenção que acompanh<strong>em</strong> populações<br />

de baixo nível cultural, <strong>em</strong> que o desconhecimento de peso pré-<br />

-gestacional é muito significativo.<br />

No Brasil, <strong>em</strong> 1987, o Ministério da Saúde adotou e recomendou a<br />

Curva de Rosso <strong>para</strong> avaliação e monitoramento do estado nutricional<br />

da gestante na rede pública de saúde, <strong>em</strong> caráter preliminar. 11<br />

O IOM, por intermédio da Acad<strong>em</strong>ia Americana de Ciências (AAC),<br />

elaborou um guia <strong>para</strong> impl<strong>em</strong>entação de um método de avaliação do estado<br />

nutricional materno na prática clínica, com instruções <strong>para</strong> situações<br />

nas quais o peso pré-gestacional é conhecido, propondo a classificação<br />

do estado nutricional pré-gestacional <strong>em</strong> categorias do IMC, definidas<br />

pelo grupo de especialistas por meio da conversão do índice de peso ideal<br />

<strong>para</strong> estatura, com base no padrão de referência do Metropolitan Life<br />

Insurance Company. Os pontos de corte <strong>para</strong> desnutrição e obesidade<br />

equival<strong>em</strong> a 90 e 120% da adequação, respectivamente. Também recomenda<br />

o acompanhamento do ganho ponderal materno, <strong>em</strong> função do<br />

estado nutricional prévio ou de ingresso no pré-natal. 1<br />

Atalah et al. 9 , baseando-se nos dados do Sist<strong>em</strong>a Nacional de Serviços<br />

de Salud (SNSS) do Chile, que d<strong>em</strong>onstram ter havido redução da prevalência<br />

de desnutrição <strong>em</strong> gestantes e aumento significativo de obesidade<br />

entre 1987 e 1993, constataram que a prevalência de gestantes desnutridas<br />

contrastava com a baixa proporção de mulheres desnutridas <strong>em</strong> idade fértil<br />

e que a proporção de baixo peso ao nascer, como indicativo indireto do<br />

estado nutricional materno, estava baixa, e sugeriram que o uso do método<br />

de Rosso <strong>para</strong> avaliação nutricional das gestantes no país poderia estar


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

47<br />

contribuindo <strong>para</strong> superestimar a desnutrição nas gestantes e estimular um<br />

aumento de peso maior que o necessário. Como consequência, isso determinaria<br />

maior gasto do setor de saúde com maior número de consultas e<br />

inscrições <strong>em</strong> programas de supl<strong>em</strong>entação alimentar.<br />

Esses mesmos autores, então, realizaram um estudo <strong>para</strong> avaliar a<br />

concordância de diagnóstico nutricional obtido entre a Curva de Rosso,<br />

a tabela do Departamento de Nutrição da Faculdade de Medicina do<br />

Chile e o IMC no início e no fim da gestação. Verificaram que menos<br />

da metade das gestantes consideradas desnutridas pela Curva de Rosso<br />

na primeira consulta do pré-natal era realmente desnutrida segundo o<br />

IMC, e essa discordância se acentuou ainda mais no final da gravidez. 9<br />

Segundo a OMS 7 , o instrumento proposto por Rosso 16 t<strong>em</strong> validade<br />

discutível, <strong>em</strong> razão do ponto de corte que superestima a desnutrição<br />

entre as gestantes e propõe expectativa não realista de ganho de peso<br />

<strong>para</strong> as gestantes desnutridas.<br />

De acordo com Coelho 11 , o uso extensivo da Curva de Rosso no<br />

Brasil mostrou uma discordância <strong>em</strong> termos epid<strong>em</strong>iológicos entre a situação<br />

nutricional de gestantes e o estado nutricional de mulheres <strong>em</strong><br />

idade reprodutiva, avaliadas por IMC, considerando desnutridas de 35 a<br />

45% das gestantes e 6% das mulheres <strong>em</strong> idade fértil.<br />

Atalah et al. 9 propuseram um novo gráfico de avaliação do estado nutricional<br />

da gestante baseando-se no IMC por idade gestacional, considerando<br />

que o ganho de peso deve ser diferenciado de acordo com o estado<br />

nutricional prévio. Estudo <strong>para</strong> validação do instrumento foi realizado <strong>em</strong><br />

uma coorte de gestantes chilenas, com<strong>para</strong>ndo resultados de IMC com medidas<br />

de composição corporal como pregas cutâneas e perímetro br<strong>aqui</strong>al.<br />

No Brasil, até 2000, o Ministério da Saúde preconizava a utilização da<br />

Curva de Rosso. Nesse mesmo ano, houve reformulação no Cartão da Gestante<br />

e incorporou-se ao Manual de Assistência Pré-natal o modelo da curva<br />

de Clap 35 , que avalia aumento de peso durante a gestação de acordo com<br />

a idade gestacional. 12 Isso resultou <strong>em</strong> controvérsias por parte dos estudiosos,<br />

<strong>em</strong> virtude da pequena casuística do método, de fundamentar-se <strong>em</strong>


48<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

relações corporais de mulheres não gestantes de tabelas de dados da década<br />

de 1950 e da necessidade de informação do peso pré-gestacional. 11<br />

Em 2002, o Ministério da Saúde propôs realizar a avaliação nutricional<br />

inicial, por meio de IMC pré-gestacional, utilizando a classificação<br />

e a recomendação do IOM e o gráfico recomendado pelo Clap, <strong>para</strong><br />

acompanhamento do ganho ponderal. Quando o peso pré-gestacional é<br />

desconhecido, deve-se avaliar e acompanhar o ganho de peso s<strong>em</strong>anal,<br />

utilizando de forma compl<strong>em</strong>entar a tabela de peso esperado <strong>para</strong> a altura<br />

segundo idade gestacional confeccionada pelo Ministério da Saúde,<br />

baseada no gráfico de Atalah. 34<br />

Estudo realizado por Cordelini 20 aplicou e avaliou os métodos<br />

propostos por Atalah et al. 34 e pelo IOM 1 , <strong>em</strong> um serviço público de<br />

pré-natal de baixo risco no município de São Paulo, no qual verificou<br />

que a proposta do IOM d<strong>em</strong>onstrou melhor aplicabilidade na prática<br />

clínica, porém na dependência da acurácia do peso pré-gestacional informado<br />

e com complexidade de preenchimento. O método de Atalah<br />

apresentou melhor aplicabilidade na avaliação do estado nutricional<br />

inicial e facilidade no preenchimento, mas pouca confiabilidade no<br />

acompanhamento individual, sendo mais indicado <strong>para</strong> avaliação de<br />

tendências populacionais.<br />

Abrams et al. 37 , <strong>em</strong> razão da frequente controvérsia no meio científico<br />

acerca de recomendações sobre ganho de peso gestacional e crítica<br />

ao critério recomendado pelo IOM, realizaram estudo de revisão sist<strong>em</strong>ática<br />

de literatura sobre resultados maternos e fetais que segue as<br />

recomendações do IOM de ganho de peso <strong>em</strong> mulheres com peso pré-<br />

-gestacional normal. Concluíram que essas recomendações de ganho de<br />

peso do IOM estão associadas aos melhores resultados <strong>para</strong> mãe e filho.<br />

Atualmente, a maioria dos órgãos científicos internacionais recomenda<br />

o uso do critério proposto pelo IOM 38 , utilizando IMC pré-gestacional e<br />

subsequente ganho de peso por categoria de estado nutricional pré-gestacional,<br />

por reconhecer que essas recomendações representam menor risco<br />

de baixo peso ao nascer e de retenção de peso materno pós-parto. 1,7,39,40


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

49<br />

A gerência de Programas de Saúde da Mulher 41 , da Prefeitura Municipal<br />

do Rio de Janeiro, <strong>em</strong> parceria com o Instituto de Nutrição Annes Dias,<br />

após estudo das alternativas de instrumentos <strong>para</strong> avaliação nutricional<br />

de gestantes e consulta a especialistas, optou por adotar o instrumento<br />

e os critérios desenvolvidos e recomendados pelo IOM 1 combinados aos<br />

instrumentos propostos por Atalah et al. 34 Isso traz como vantagens:<br />

• a utilização do mesmo índice antropométrico;<br />

• ambos utilizam IMC na classificação do estado nutricional prévio e/ou<br />

durante a gestação, independent<strong>em</strong>ente da idade gestacional de ingresso<br />

no pré-natal;<br />

• desnecessidade de conhecer o peso pré-gestacional <strong>para</strong> avaliar o estado<br />

nutricional e recomendar o ganho de peso adequado;<br />

• facilidade de uso e utilidade no acompanhamento clínico.<br />

Além disso, segue a recomendação do Ministério da Saúde de combinar<br />

IMC e aumento de peso durante a gestação e se mostra coerente com a<br />

realidade brasileira de ingresso no pré-natal a partir do segundo trimestre,<br />

na maioria das gestantes.<br />

Em junho de 2004, o Ministério da Saúde publicou um documento<br />

de orientações básicas <strong>para</strong> realização do sist<strong>em</strong>a de Vigilância Alimentar<br />

e Nutricional nos serviços de saúde, por meio do qual recomenda<br />

que as gestantes tenham seu estado nutricional inicial avaliado utilizando<br />

o IMC por idade gestacional na primeira consulta de pré-natal, seguindo<br />

o critério de Atalah et al. 34 Então, <strong>em</strong> função do estado nutricional<br />

avaliado, deve ser estimado seu ganho de peso trimestral e total<br />

esperado até o final da gestação, seguindo o critério do IOM. 42<br />

Em 2006, o Ministério da Saúde publicou um novo Manual Técnico<br />

de Pré-Natal e Puerpério 43 , no qual também recomenda a utilização<br />

desse método combinando o de Atalah e o do IOM <strong>para</strong> avaliação nutricional<br />

da gestante e acompanhamento de seu ganho de peso, o que confirma<br />

a coerência do uso dessa metodologia.


50<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

AVALIAÇÃO NUTRICIONAL DA GESTANTE<br />

E GANHO DE PESO GESTACIONAL<br />

A avaliação e o acompanhamento do estado nutricional da gestante e<br />

o ganho de peso durante a gestação têm como objetivos: identificar as<br />

gestantes <strong>em</strong> risco nutricional (baixo peso, sobrepeso ou obesidade) no<br />

início da gestação, detectar as gestantes com ganho de peso insuficiente<br />

ou excessivo <strong>para</strong> a idade gestacional e realizar orientação adequada<br />

<strong>para</strong> cada caso, com atenção <strong>para</strong> promoção do bom estado nutricional<br />

materno, condições <strong>para</strong> o parto e peso do recém-nascido.<br />

Técnica <strong>para</strong> a tomada de medidas de peso e estatura<br />

O peso deve ser aferido <strong>em</strong> todas as consultas de pré-natal. A estatura da gestante<br />

adulta (idade > 19 anos) deve ser aferida apenas na primeira consulta e<br />

a da gestante adolescente pelo menos trimestralmente. Recomenda-se a utilização<br />

da balança eletrônica ou mecânica, certificando-se se está <strong>em</strong> bom<br />

funcionamento e calibrada. O cuidado com as técnicas de medição e a aferição<br />

regular dos equipamentos garant<strong>em</strong> a qualidade das medidas coletadas.<br />

Os procedimentos <strong>para</strong> a tomada de peso e estatura estão descritos<br />

na publicação Vigilância Alimentar e Nutricional – Sisvan: orientações<br />

básicas <strong>para</strong> a coleta, processamento, análise de dados e informação <strong>em</strong><br />

serviços de saúde do Ministério da Saúde. 46<br />

Orientações <strong>para</strong> o diagnóstico e o acompanhamento<br />

do estado nutricional da gestante<br />

As orientações <strong>para</strong> o diagnóstico e o acompanhamento do estado nutricional<br />

da gestante estão descritas detalhadamente na publicação Vigilância<br />

Alimentar e Nutricional – Sisvan: orientações básicas <strong>para</strong> a coleta,<br />

processamento, análise de dados e informação <strong>em</strong> serviços de saúde,<br />

disponível no site: www.saude.gov.br.<br />

O Ministério da Saúde recomenda a utilização de dois instrumentos:<br />

o critério de classificação do estado nutricional inicial e ganho de<br />

peso conforme IOM e a Curva de Atalah, descritos a seguir.


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

51<br />

Classificação do estado nutricional<br />

O IOM propôs uma avaliação do estado nutricional materno e uma recomendação<br />

de ganho de peso gestacional, na qual as faixas de ganho de peso<br />

indicadas são diferenciadas conforme o IMC pré-gestacional (Tabela 1).<br />

TABELA 1 Ganho de peso recomendado durante a gestação, segundo o estado<br />

nutricional inicial<br />

ESTADO<br />

GANHO DE PESO<br />

GANHO DE PESO (KG)<br />

GANHO DE PESO<br />

NUTRICIONAL<br />

(KG) TOTAL NO<br />

SEMANAL MÉDIO NO<br />

(KG) TOTAL NA<br />

INICIAL (IMC)<br />

1º TRIMESTRE<br />

2º E NO 3º TRIMESTRE<br />

GESTAÇÃO<br />

Baixo peso (BP) 2,3 0,5 12,5 a 18<br />

Adequado (A) 1,6 0,4 11,5 a 16<br />

Sobrepeso (S) 0,9 0,3 7 a 11,5<br />

Obesidade (O) – 0,3 7<br />

Fonte: IOM. 38<br />

Procedimentos <strong>para</strong> classificar o estado nutricional da gestante, segundo<br />

o IOM:<br />

• inicialmente, calcular e interpretar o IMC pré-gestacional;<br />

• calcular o ganho de peso gestacional até a data da consulta e avaliar a adequação,<br />

segundo a faixa de ganho de peso recomendada e a idade gestacional,<br />

<strong>para</strong> as categorias do IMC pré-gestacional;<br />

• estabelecer o ganho de peso s<strong>em</strong>anal e total recomendado até o final da<br />

gestação, segundo a idade gestacional.<br />

Curva de Atalah<br />

Segundo o Ministério da Saúde, a avaliação continuada permite com<strong>para</strong>r<br />

a evolução do ganho de peso durante a gestação de forma a verificar se


52<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

esse ganho está adequado <strong>em</strong> função do estado nutricional da gestante no<br />

início do pré-natal. Para tanto, recomenda-se o uso da Curva de Atalah et<br />

al. 34 , na qual se acompanha a curva de IMC, segundo a s<strong>em</strong>ana gestacional<br />

(ascendente, horizontal, descendente) (Figura 1).<br />

FIGURA 1 Gráfico de acompanhamento nutricional da gestante.<br />

IMC conforme a s<strong>em</strong>ana de gestação<br />

40<br />

40<br />

39,5<br />

39<br />

39,5<br />

39<br />

38,5<br />

38,5<br />

38<br />

38<br />

37,5<br />

37,5<br />

37<br />

37<br />

36,5<br />

O 36,5<br />

36<br />

35,5<br />

35<br />

34,5<br />

34<br />

33,5<br />

33<br />

32,5<br />

36<br />

35,5<br />

35<br />

34,5<br />

34<br />

33,5<br />

33<br />

32,5<br />

32<br />

32<br />

31,5<br />

31,5<br />

31<br />

31<br />

30,5<br />

S 30,5<br />

30<br />

29,5<br />

29<br />

30<br />

29,5<br />

29<br />

28,5<br />

28,5<br />

28<br />

28<br />

27,5<br />

27,5<br />

27<br />

27<br />

26,5<br />

A 26,5<br />

26<br />

25,5<br />

25<br />

24,5<br />

24<br />

23,5<br />

23<br />

26<br />

25,5<br />

25<br />

24,5<br />

24<br />

23,5<br />

23<br />

22,5<br />

22,5<br />

22<br />

22<br />

21,5<br />

21,5<br />

21<br />

21<br />

20,5<br />

BP 20,5<br />

20<br />

19,5<br />

19<br />

18,5<br />

18<br />

17,5<br />

20<br />

19,5<br />

19<br />

18,5<br />

18<br />

17,5<br />

17<br />

17<br />

6 8 10 12 14 16 18 20 22 24 26 28 30 32 34 36 38 40<br />

S<strong>em</strong>ana de gestação<br />

BP Baixo peso<br />

A<br />

Adequado<br />

S<br />

Sobrepeso<br />

O<br />

Obesidade<br />

Fonte: Atalah et al. 34 e Ministério da Saúde. 42


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

53<br />

Deve-se realizar o acompanhamento do estado nutricional utilizando<br />

o gráfico da Figura 1 de IMC por s<strong>em</strong>ana gestacional, que é composto<br />

por um eixo horizontal com os valores de s<strong>em</strong>ana gestacional e<br />

um eixo vertical com os valores de IMC [peso(kg)/altura 2 (m)]. O gráfico<br />

apresenta o desenho de três curvas, que delimitam as quatro faixas <strong>para</strong><br />

classificação do estado nutricional: baixo peso (BP), adequado (A), sobrepeso<br />

(S) e obesidade (O).<br />

CONSIDERAÇÕES FINAIS<br />

Neste capítulo, discutiu-se a importância do estado nutricional durante<br />

a gravidez considerando a saúde da gestante e da criança, a necessidade<br />

de realizar a vigilância do estado nutricional durante a gestação e a evolução<br />

dos critérios <strong>para</strong> o diagnóstico do estado nutricional da gestante.<br />

A avaliação do estado nutricional da gestante fornece informações<br />

importantes <strong>para</strong> a prevenção e o controle de agravos à saúde e à nutrição,<br />

sendo, portando, imprescindível na assistência pré-natal.<br />

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56<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. Brasília,<br />

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I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

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Nacional de Alimentação e Nutrição. Orientações básicas <strong>para</strong> a coleta,<br />

processamento, análise de dados e informações <strong>em</strong> serviços de saúde <strong>para</strong> o Sist<strong>em</strong>a<br />

de Vigilância Alimentar e Nutricional. Brasília, Ministério da Saúde, 2004.<br />

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atenção qualificada e humanizada. Manual Técnico. Brasília: Ministério<br />

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Atenção Qualificada e Humanizada – Manual Técnico. Brasília: Departamento<br />

de Ações Programáticas Estratégicas, 2005.<br />

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serviços de saúde. Brasília: Ministério da Saúde, 2004.


AVALIAÇÃO DO ESTADO NUTRICIONAL<br />

DE IDOSOS: ANTROPOMETRIA<br />

Sandra Maria Lima Ribeiro<br />

Camila Maria de Melo<br />

INTRODUÇÃO<br />

Dados recentes do censo populacional brasileiro 1 apontam, no decorrer<br />

dos anos, um aumento da esperança de vida ao nascer, assim como<br />

do número de indivíduos idosos. Esses dados indicam claramente o envelhecimento<br />

da população, similar ao que t<strong>em</strong> ocorrido nas d<strong>em</strong>ais regiões<br />

do mundo, e despertam a necessidade de se compreender o envelhecimento<br />

sob suas diferentes dimensões. 2 O termo “envelhecimento”<br />

envolve modificações físicas, fisiológicas, metabólicas e psicológicas. É<br />

um processo que ocorre lenta e gradualmente e que varia muito de um<br />

indivíduo <strong>para</strong> outro. 3<br />

Com o envelhecimento, várias funções fisiológicas e metabólicas<br />

são alteradas e acabam por refletir no estado nutricional do indivíduo e,<br />

portanto, <strong>em</strong> sua saúde como um todo. De forma geral, pod<strong>em</strong> ocorrer<br />

alterações na composição corporal, no metabolismo ósseo, na fisiologia<br />

bucal, nos órgãos dos sentidos, nas concentrações de nutrientes no plasma<br />

e nos tecidos, na secreção de enzimas e hormônios, entre outros. 3-6


60<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

Com o passar dos anos, ocorre, nas mucosas do tubo digestivo,<br />

uma diminuição dos movimentos de contração e motilidade, causando,<br />

consequent<strong>em</strong>ente, constipação e prejuízos à absorção intestinal. Ocorre,<br />

ainda, redução das secreções gástricas (hipocloridria), o que pode<br />

colaborar com infecções bacterianas da mucosa, comprometendo os<br />

processos digestivos, especialmente de vitamina B 12<br />

, tiamina e ferro. A<br />

perda dentária e as doenças da gengiva são também comuns, e as cáries<br />

não tratadas pod<strong>em</strong> resultar <strong>em</strong> periodontites. N<strong>em</strong> s<strong>em</strong>pre se consegue<br />

que a utilização de próteses dentárias seja um processo eficiente e,<br />

frequent<strong>em</strong>ente, o indivíduo passa a limitar o consumo de determinados<br />

alimentos. 7,8 Fatores psicológicos, como depressão por perda de entes<br />

queridos ou a institucionalização, pod<strong>em</strong> estar relacionados com a<br />

ingestão de alimentos e, consequent<strong>em</strong>ente, com o estado nutricional.<br />

Todos esses fatores relacionados apontam a necessidade de um<br />

constante monitoramento das condições de saúde do idoso. Para tanto,<br />

e pensando principalmente na prática clínica, a adoção de indicadores,<br />

métodos e técnicas apropriados é de fundamental importância.<br />

Como indicador do estado de saúde, pode-se citar a massa corporal.<br />

Além disso, a análise da composição da massa corporal reflete de forma<br />

importante a maior parte das alterações fisiológicas e metabólicas decorrentes<br />

do processo de envelhecimento. A medida das dimensões corporais,<br />

antropometria, permite o monitoramento do metabolismo de energia<br />

e macronutrientes, apontando, assim, estratégias de intervenção.<br />

Dessa forma, este capítulo pretende apontar as principais alterações<br />

na composição corporal, b<strong>em</strong> como as formas mais apropriadas<br />

<strong>para</strong> avaliação.<br />

MODIFICAÇÕES NA MASSA, NA ESTRUTURA E NA<br />

COMPOSIÇÃO CORPORAL<br />

Todas as modificações metabólicas do envelhecimento resultam, de forma<br />

geral, <strong>em</strong> alterações da massa corporal. Um estudo conduzido junto<br />

à população italiana, o Italian Longitudinal Study on Aging (ILSI),


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

61<br />

apontou que, por volta dos 60 anos de idade, se inicia um processo de<br />

ganho de massa corporal que se inverte com o passar do t<strong>em</strong>po, ou seja,<br />

há uma tendência à diminuição, especialmente a partir de 75 anos. 9 O<br />

Projeto Saúde e B<strong>em</strong>-estar do Idoso (Sabe), estudo multicêntrico realizado<br />

na América Latina, incluindo o Brasil, mostra dados similares ao<br />

estudo italiano, com diminuição <strong>em</strong> variáveis antropométricas nas idades<br />

avançadas. 10,11 São, portanto, dois momentos distintos e que dev<strong>em</strong><br />

ser monitorados. A medida da massa corporal, com a utilização de balanças,<br />

é simples e útil no monitoramento dessas mudanças. Além disso,<br />

no processo de investigação do estado nutricional, é importante questionar<br />

o histórico de peso <strong>para</strong> avaliar perda ou ganho significativo recente.<br />

Ao se avaliar a massa corporal do idoso, deve-se também levar <strong>em</strong><br />

consideração que ele, muitas vezes, se encontra impossibilitado de se<br />

locomover, como é o caso de idosos internados ou institucionalizados.<br />

Balanças adaptadas ao leito ou plataformas de balanças adaptadas à cadeira<br />

de rodas são boas opções, porém bastante caras. Por isso, foram<br />

desenvolvidas fórmulas preditivas <strong>para</strong> essas situações. As fórmulas<br />

propostas por Chumlea et al. 12 são citadas pela Organização Mundial da<br />

Saúde (OMS) 13 e apresentadas na Tabela 1.<br />

TABELA 1 Equações preditivas da estatura e do peso corporal de idosos ou<br />

indivíduos s<strong>em</strong> possibilidade de ser<strong>em</strong> medidos <strong>em</strong> pé<br />

FÓRMULAS PREDITIVAS DA ESTATURA<br />

Sexo Raça Equação (altura = ) R2 Erro-padrão<br />

HOMENS<br />

Não hispânicos<br />

78,31 + (1,94 × altura do joelho) –<br />

0,69 3,74<br />

brancos<br />

(0,14 × idade)<br />

Não hispânicos<br />

79,69 + (1,85 × altura do joelho) –<br />

0,7 3,81<br />

afrodescendentes<br />

(0,14 × idade)<br />

México-americanos 82,77 + (1,83 × altura do joelho) –<br />

0,66 3,69<br />

(0,16 × idade)<br />

(continua)


62<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

(continuação)<br />

MULHERES<br />

Não hispânicas<br />

82,21 + (1,85 × altura do joelho) –<br />

0,64 3,98<br />

brancas<br />

(0,21 × idade)<br />

Não hispânicas<br />

89,58 + (1,61 × altura do joelho) –<br />

0,63 3,83<br />

afrodescendentes<br />

(0,17 × idade)<br />

México-americanas 84,25 + (1,82 × altura do joelho) –<br />

0,65 3,78<br />

(0,26 × idade)<br />

FÓRMULAS PREDITIVAS DO PESO CORPORAL<br />

HOMENS (0,98 × CP) + (1,16 × altura do joelho) + (1,73 × CMB) + (0,37 × DCSE) – 81,69<br />

MULHERES (1,27 × CP) + (0,87 × altura do joelho) + (0,98 × CMB) + (0,4 × DCSE) – 62,35<br />

CP: circunferência da panturrilha; CMB: circunferência muscular do braço; DCSE: dobra cutânea subescapular.<br />

Fonte: Chumlea et al., 1998. 12<br />

Investigando especificamente quais componentes da massa corporal<br />

são alterados, é comum se observar uma redução da massa corporal<br />

magra, a qual é constituída pelas massas musculares esquelética e lisa,<br />

pela massa óssea e também pela água corporal. A perda acelerada de<br />

massa muscular pode, <strong>em</strong> alguns casos, resultar <strong>em</strong> alteração na estrutura<br />

e na composição do músculo esquelético, com infiltração de gordura<br />

e tecido conectivo na massa muscular, o que é denominado sarcopenia.<br />

Essa redução pode ser decorrente de fatores como sedentarismo,<br />

alteração na síntese e secreção de hormônios, má alimentação, estresse<br />

oxidativo, aumento da atividade de citocinas, entre outros. 14,15<br />

A sarcopenia pode resultar <strong>em</strong> diminuição da autonomia, maior risco<br />

de quedas com sequelas e, portanto, menor qualidade de vida. Cabe<br />

destacar que, <strong>em</strong>bora a perda de massa muscular seja um processo normal<br />

do envelhecimento, a sarcopenia deve ser evitada. 16,17 A sarcopenia<br />

consiste, de certa forma, na substituição de massa proteica por gordura


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

63<br />

no músculo; por isso, esse processo pode ser ocultado <strong>em</strong> medidas antropométricas<br />

simples. Apenas diagnósticos por imag<strong>em</strong>, como ressonância<br />

magnética (RM), tomografia computadorizada (TC) ou mesmo<br />

o Dexa (dual-energy X-ray absorptiometry) são capazes de detectar com<br />

precisão a perda e as alterações estruturais na massa magra.<br />

O estabelecimento de medidas antropométricas <strong>para</strong> avaliação do<br />

estado muscular <strong>em</strong> idosos t<strong>em</strong> sido objeto de diferentes estudos. Várias<br />

publicações buscaram estabelecer referências de medidas antropométricas<br />

<strong>para</strong> idosos. Burr e Phillips 18 avaliaram, <strong>em</strong> três áreas do País<br />

de Gales, indivíduos a partir de 75 até mais de 80 anos de idade, incluindo<br />

na amostra indivíduos hospitalizados. Para determinação do estado<br />

nutricional proteico por indicadores antropométricos, os autores optaram<br />

pelas medidas de circunferência muscular do braço e área muscular<br />

do braço. Embora bastante criticado tanto pelo tamanho total da amostra<br />

como pela inclusão de idosos não saudáveis, o estudo foi por muito<br />

t<strong>em</strong>po adotado como referência <strong>para</strong> avaliação de idosos. Outros estudos<br />

buscaram uma referência <strong>para</strong> idosos, principalmente nos Estados<br />

Unidos, mas nenhum era isento de limitações como tamanho da amostra,<br />

etnicidade, representatividade nacional, entre outros. 19-22<br />

Mais recent<strong>em</strong>ente, a partir de dados do National Health and Nutrition<br />

Examination Surveys III (NHANES III), foram avaliados 5.700<br />

indivíduos acima de 60 anos de idade. 23 As Tabelas 2 e 3 apresentam os<br />

dados de índice de massa corporal (IMC), circunferência do braço, dobra<br />

cutânea tricipital e circunferência muscular do braço a partir desse<br />

estudo. Cabe l<strong>em</strong>brar, ainda, que o comitê de especialistas da OMS recomenda<br />

que, <strong>em</strong> países onde não existam estudos locais, os dados do<br />

NHANES III sejam utilizados. 24


64<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

TABELA 2<br />

ou mais<br />

Avaliação da NHANES III (1988-1994) <strong>em</strong> homens de 60 anos de idade<br />

GRUPO<br />

ETÁRIO<br />

IMC<br />

N MÉDIA ±<br />

DP<br />

PERCENTIS SELECIONADOS<br />

P10 P15 P25 P50 P75 P85 P90<br />

60 a 69 1.175 27,3 ± 0,18 21,9 23,1 24,4 27,1 30,0 31,7 32,8<br />

70 a 79 875 26,7 ± 0,21 21,5 22,3 23,8 26,1 29,3 30,7 31,7<br />

> 80 699 25,0 ± 0,22 19,8 21,1 22,4 25,0 27,1 28,7 29,5<br />

CB<br />

60 a 69 1.126 32,8 ± 0,15 28,4 29,2 30,6 32,7 35,2 36,2 37,0<br />

70 a 79 832 31,5 ± 0,17 27,5 28,2 29,3 31,3 33,4 35,1 36,1<br />

> 80 642 29,05 ± 0,19 25,5 26,2 27,3 29,5 31,5 32,6 33,3<br />

DCT<br />

60 a 69 1.122 14,2 ± 0,25 7,7 8,5 10,1 12,7 17,1 20,2 23,1<br />

70 a 79 825 13,4 ± 0,28 7,3 7,9 9,0 12,4 16,0 18,8 20,6<br />

> 80 641 12,0 ± 0,28 6,6 7,6 8,7 11,2 13,8 16,2 18,0<br />

CMB<br />

60 a 69 1.119 28,3 ± 0,13 24,9 25,6 26,7 28,4 30,0 30,9 31,4<br />

70 a 79 824 27,3 ± 0,14 24,4 24,8 25,6 27,2 28,9 30 30,5<br />

> 80 639 25,7 ± 0,16 22,6 23,2 24,0 25,7 27,5 28,2 28,8<br />

IMC: índice de massa corporal; CB: circunferência do braço; DCT: dobra cutânea tricipital; CMB: circunferência<br />

muscular do braço; DP: desvio padrão.<br />

Fonte: adaptada de Kuczmarski et al., 2000. 23


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

65<br />

TABELA 3 Avaliação do NHANES III (1988-1994) <strong>em</strong> mulheres de 60 anos de<br />

idade ou mais<br />

GRUPO<br />

ETÁRIO<br />

N MÉDIA ± DP PERCENTIS SELECIONADOS<br />

P10 P15 P25 P50 P75 P85 P90<br />

IMC<br />

60 a 69 1.172 27,6 ± 0,27 20,9 21,8 23,5 26,6 30,8 33,6 35,7<br />

70 a 79 985 26,9 ± 0,28 20,7 21,4 22,6 25,9 29,9 32,1 34,5<br />

> 80 788 25,2 ± 0,26 19,3 20,3 21,7 25,0 28,4 30,0 31,4<br />

CB<br />

60 a 69 1.122 31,7 ± 0,21 26,2 26,9 28,3 31,2 34,3 36,5 38,3<br />

70 a 79 914 30,5 ± 0,23 25,4 26,1 27,4 30,1 33,1 35,1 36,7<br />

> 80 712 28,5 ± 0,25 23,0 23,8 25,5 28,4 31,5 33,2 34,0<br />

DCT<br />

60 a 69 1.090 24,2 ± 0,37 14,5 15,9 18,2 24,1 29,7 32,9 34,9<br />

70 a 79 902 22,3 ± 0,39 12,5 14 16,4 21,8 27,7 30,6 32,1<br />

> 80 705 18,6 ± 0,42 9,3 11,1 13,1 18,1 23,3 26,4 28,9<br />

CMB<br />

60 a 69 1.090 23,8 ± 0,12 20,6 21,1 21,9 23,5 25,4 26,6 27,4<br />

70 a 79 898 23,4 ± 0,14 20,3 20,8 21,6 23,0 24,8 26,3 27,0<br />

> 80 703 22,7 ± 0,16 19,3 20,0 20,9 22,6 24,5 25,4 26,0<br />

IMC: índice de massa corporal; CB: circunferência do braço; DCT: dobra cutânea tricipital; CMB: circunferência<br />

muscular do braço; DP: desvio padrão.<br />

Fonte: adaptada de Kuczmarski et al., 2000. 23<br />

Considerando-se que a perda de massa muscular se concentra principalmente<br />

<strong>em</strong> m<strong>em</strong>bros inferiores, t<strong>em</strong> havido uma tendência <strong>em</strong> apontar<br />

a circunferência da panturrilha como uma medida antropométrica<br />

sensível da massa muscular. 13 Nesse contexto, Rolland et al. 25 , <strong>em</strong> estudo<br />

realizado na França, com<strong>para</strong>ram as medidas da circunferência da panturrilha<br />

com um diagnóstico por imag<strong>em</strong> (Dexa) <strong>em</strong> 1.458 indivíduos saudáveis<br />

acima de 70 anos de idade, s<strong>em</strong> histórico de fraturas. Os autores


66<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

concluíram que a circunferência da panturrilha, <strong>em</strong>bora não possa ser<br />

usada como diagnóstico da sarcopenia, fornece informações importantes<br />

sobre incapacidades relativas à musculatura e à função física. Esses<br />

mesmos autores apontaram que uma medida de circunferência da panturrilha<br />

menor que 31 cm pode ser relacionada à perda de capacidades.<br />

Em relação à técnica <strong>para</strong> tomada dessa medida, os procedimentos<br />

descritos a seguir costumam ser adotados. Uma proposta é que o avaliado<br />

permaneça sentado <strong>em</strong> uma mesa ou cadeira ou <strong>em</strong> pé, com os pés<br />

se<strong>para</strong>dos cerca de 20 cm um do outro. Ao permanecer sentado <strong>em</strong> uma<br />

cadeira, sua perna direita deve permanecer fixa ao chão, com as pernas<br />

flexionadas <strong>em</strong> 90º. 24 Lohman 26 propõe que a medida seja feita com a<br />

perna solta, não apoiada no solo. Em idosos que não pod<strong>em</strong> se manter<br />

<strong>em</strong> pé ou sentados, a medida deve ser realizada levando-se a perna a uma<br />

flexão de 90º. 27 Em todos os diferentes procedimentos, a medida da circunferência<br />

deve ser tomada na região de maior diâmetro na panturrilha.<br />

Outros autores vêm propondo, como relação importante na análise<br />

da massa corporal magra <strong>em</strong> idosos, o índice de massa magra corporal<br />

(IMMC), que consiste na relação massa magra corporal/estatura. 2 Obisesan<br />

et al. 28 argumentam que, <strong>para</strong> definir sarcopenia, há necessidade de<br />

se discutir a massa magra relativa ao peso corporal, uma vez que a massa<br />

magra absoluta é relacionada à estatura do indivíduo. Uma questão prática<br />

relativa a esse índice é qual seria a melhor maneira de estimar ou medir<br />

a massa magra. Medidas antropométricas possu<strong>em</strong> limitações, porém<br />

métodos mais sofisticados tornam a determinação cara e, portanto, às vezes<br />

inviável.<br />

Da mesma forma que a massa magra, a gordura corporal também<br />

tende a sofrer modificações importantes com o envelhecimento. Além<br />

da possível substituição de massa proteica por massa adiposa, há uma<br />

tendência à diminuição na gordura subcutânea e a um acúmulo na região<br />

abdominal. Sabidamente, o aumento da gordura na região abdominal<br />

está relacionado a comprometimentos à saúde explicados, entre<br />

outros fatores, pelo quadro inflamatório sistêmico gerado. 28-30 Embora


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

67<br />

durante todo o ciclo da vida os homens tenham maior acúmulo de gordura<br />

visceral, com o envelhecimento, esse aspecto praticamente se iguala<br />

entre mulheres e homens, <strong>em</strong> virtude da diminuição dos estrogênios<br />

após a menopausa. 31<br />

Nicklas et al. 32 , a partir de amostra extraída do estudo denominado<br />

The Health, Aging and Body Composition Study, selecionaram 1.387 mulheres<br />

e 1.116 homens, entre 70 e 79 anos de idade, analisando a associação<br />

de infarto do miocárdio com adiposidade total (IMC) e distribuição da gordura<br />

corporal (circunferência da cintura, relação cintura-quadril – RCQ,<br />

tecido adiposo visceral e subcutâneo). Os autores observaram que a gordura<br />

visceral, mesmo <strong>em</strong> indivíduos com menor adiposidade subcutânea,<br />

mostrou maior associação com eventos de infarto do miocárdio e com<br />

mortalidade decorrente disso.<br />

Outro aspecto importante relacionado possivelmente à adiposidade<br />

visceral é a neurodegeneração. O envelhecimento <strong>em</strong> si é considerado<br />

um fator de comprometimento do funcionamento do cérebro por razões<br />

como a diminuição do fluxo sanguíneo e a perda natural de neurônios, o<br />

que pode levar à perda da m<strong>em</strong>ória, da função cognitiva, do equilíbrio,<br />

entre outras. Jagust et al. 29 investigaram se a elevação da gordura visceral<br />

seria associada a mudanças estruturais cerebrais, relacionadas a declínio<br />

cognitivo e d<strong>em</strong>ência.<br />

O estudo foi realizado a partir de uma amostra do Sacramento<br />

Area Latino Study on Aging. Os autores selecionaram 112 indivíduos<br />

de uma amostra de 1.789 idosos e avaliaram RCQ, glic<strong>em</strong>ia e insulina<br />

de jejum, colesterol e pressão arterial de repouso. O volume do<br />

hipocampo e dos h<strong>em</strong>isférios direito e esquerdo do cérebro foram avaliados<br />

por RM. Entre outros resultados, os autores encontraram uma<br />

correlação negativa e significativa entre volume do hipocampo e RCQ<br />

(r = -0,2; p = 0,02). Dessa forma, os autores concluíram que um alto<br />

valor de RCQ pode estar associado a processos neurodegenerativos,<br />

vasculares e metabólicos que afetam as estruturas cerebrais, levando a<br />

declínio cognitivo e d<strong>em</strong>ência.


68<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

É importante destacar que são hipotetizadas inúmeras causas <strong>para</strong><br />

declínio cognitivo e d<strong>em</strong>ência; portanto, a gordura visceral poderia ser<br />

um dos fatores, mas certamente não o único. No que diz respeito aos aspectos<br />

nutricionais, além da gordura corporal, vários estudos têm apontado<br />

que certas deficiências de nutrientes também pod<strong>em</strong> estar relacionadas<br />

com a função cerebral, como as vitaminas C, B 12<br />

, riboflavina,<br />

tiamina, folato, ferro e zinco. 3<br />

A gordura visceral ou central também t<strong>em</strong> sido relacionada com<br />

o grau de funcionalidade e com o nível de atividades físicas. Em uma<br />

amostra representativa na Espanha 33 , entre 2001 a 2003, foram estudados<br />

3.235 idosos não institucionalizados (1.411 homens e 1.824 mulheres).<br />

Avaliaram-se incapacidades por cinco indicadores: mobilidade, agilidade,<br />

restrição das atividades diárias, atividades instrumentais <strong>para</strong> a vida<br />

diária e atividades de autocuidado. As análises foram e repetidas após<br />

2 anos e observou-se que a circunferência do abdome foi preditora da<br />

incapacidade após esse período, levando à conclusão prévia de que evitar<br />

o aumento da gordura visceral é uma maneira de prevenir comprometimentos<br />

das capacidades físicas com a idade.<br />

Os mesmos autores 33 observaram que a associação entre gordura<br />

abdominal e incapacidades é independente do IMC. Esses resultados,<br />

juntamente a vários outros, levantam questões a respeito do IMC como<br />

indicador de risco de doenças crônicas <strong>em</strong> idosos. Os estudos, de forma<br />

geral, têm apontado resultados interessantes. Diferent<strong>em</strong>ente do que<br />

ocorre <strong>em</strong> adultos jovens, <strong>em</strong> idosos, o IMC parece ter menor importância<br />

<strong>em</strong> indicar adiposidade, apontando a maior possibilidade de ser<br />

um bom preditor de risco nutricional. Por sua vez, dados do NHANES<br />

I e II mostram que o IMC se correlaciona mais com a gordura subcutânea<br />

<strong>em</strong> jovens do que <strong>em</strong> idosos, nos quais o IMC parece se correlacionar<br />

melhor com a massa muscular.<br />

Cabrera et al. 34 , analisando pacientes por d<strong>em</strong>anda espontânea <strong>em</strong><br />

ambulatório de geriatria no Rio de Janeiro, realizaram um estudo de seguimento<br />

de 5 anos (575 mulheres com 60 a 94 anos de idade, sendo 109


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

69<br />

maiores que 80 anos). As curvas de sobrevida de Kaplan Méier apontaram<br />

maior t<strong>em</strong>po de vida <strong>para</strong> aqueles indivíduos com maiores valores<br />

de IMC. Resultados idênticos foram encontrados por Landi et al., 35 ao<br />

estudar<strong>em</strong>, <strong>em</strong> Rovereto, norte da Itália, idosos vivendo na comunidade.<br />

Por todas essas razões, a classificação dos valores do IMC não<br />

poderia ser utilizada da mesma forma <strong>para</strong> idosos e jovens. A partir<br />

dos dados coletados no Projeto Sabe 10 , a Organização Pan-americana<br />

de Saúde (Opas) indicou a seguinte classificação: < 23 kg/m 2 = baixo<br />

peso; 23 a 28 kg/m 2 = peso normal; 28 a 30 kg/m 2 = sobrepeso; > 30<br />

kg/m 2 = obesidade.<br />

Por sua vez, a classificação do IMC adotada pelo Sist<strong>em</strong>a de Vigilância<br />

Alimentar e Nutricional (Sisvan) do Ministério da Saúde 36 , classifica<br />

as informações recebidas das Unidades de Saúde a partir da proposta<br />

do Nutrition Screening Iniciative. 5 Os valores são: < 22 = baixo peso;<br />

22 a 27 = eutrofia; > 27 = sobrepeso.<br />

Considerando-se eventos importantes e diferentes que pod<strong>em</strong> ser<br />

analisados a partir das medidas do IMC, da circunferência do abdome<br />

e da circunferência da panturrilha, seria importante a realização dessas<br />

três medidas na prática clínica.<br />

Em relação às variáveis antropométricas, as Tabelas 4 e 5 apresentam<br />

alguns dados referentes ao projeto Sabe, 10 na avaliação do estado<br />

nutricional de idosos por indicadores antropométricos.<br />

TABELA 4<br />

Variáveis, média e percentis de mulheres avaliadas pelo Projeto Sabe<br />

VARIÁVEL N MÉDIA ± DP PERCENTIS<br />

25 50 75<br />

MC (KG) 1.071 62,49 ± 13 54 61 70<br />

ESTATURA<br />

1.066 151,22 ± 6,85 147 151 155<br />

(CM)<br />

IMC (KG/M 2 ) 1.064 27,26 ± 5,2 23,74 26,63 30,36<br />

(continua)


70<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

(continuação)<br />

CC (CM) 1.069 93,97 ± 13,65 85 94 103<br />

CQ (CM) 1.068 103,73 ± 11,26 96 102 111<br />

RCQ 1.068 0,91 0,85 0,9 0,97<br />

CP 1.114 35,36 ± 4,22 33 35 38<br />

DCT 1.101 25,22 ± 8,35 20 25 30,5<br />

CB 1.124 31,02 ± 6,01 28 31 34<br />

CMB 1.101 22,73 ± 2,62 20,92 22,64 24,42<br />

MC: massa corporal; IMC: índice de massa corporal; CC: circunferência da cintura; CQ: circunferência do<br />

quadril; RCQ: relação cintura-quadril; CP: circunferência da panturrilha; DCT: dobra cutânea tricipital; CB:<br />

circunferência do braço; CMB: circunferência muscular do braço; DP: desvio padrão.<br />

Fonte: adaptada de Lebrão e Duarte, 2003. 10<br />

TABELA 5<br />

Variáveis, média e percentis de homens avaliados pelo Projeto Sabe<br />

VARIÁVEL N MÉDIA ± DP PERCENTIS<br />

25 50 75<br />

MC (KG)* 734 67,74 ± 12,74 59 67 75<br />

ESTATURA (CM)* 733 164,40 ± 6,9 160 164 169<br />

IMC (KG/M 2 )* 732 25,00 ± 4,07 22,5 24,91 27,48<br />

CC (CM)* 732 95,20 ± 11,53 88 95,5 103<br />

CQ (CM)* 733 98,88 ± 8,38 94 99 103<br />

RCQ* 732 0,96 0,92 0,96 1,01<br />

CP 766 35,15 ± 3,84 33 35 38<br />

DCT* 726 13,71 ± 5,75 9 13 17<br />

CB* 770 29,16 ± 3,64 27 29 31<br />

CMB* 727 24,71 ± 2,66 22,98 24,86 26,49<br />

MC: massa corporal; IMC: índice de massa corporal; CC: circunferência da cintura; CQ: circunferência do<br />

quadril; RCQ: relação cintura-quadril; CP: circunferência da panturrilha; DCT: dobra cutânea tricipital; CB:<br />

circunferência do braço; CMB: circunferência muscular do braço.<br />

* Diferença significativa entre os sexos, de acordo com o teste t-student.<br />

Fonte: adaptada de Lebrão e Duarte, 2003. 10


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

71<br />

A massa corporal abrange também a massa óssea. É bastante estudada<br />

a perda mineral óssea com o envelhecimento, o que resulta <strong>em</strong><br />

menor densidade óssea. Esta é controlada, resumidamente, por células<br />

responsáveis pela incorporação de cálcio no osso (osteoblastos) e de<br />

células que se responsabilizam pela mobilização de cálcio do osso <strong>para</strong><br />

a circulação sanguínea (osteoclastos). Esses processos são controlados<br />

por uma série de fatores – hormonais, imunológicos, relativos ao estilo<br />

de vida, à idade avançada, à estrutura física pequena, à raça branca, entre<br />

outros. 37<br />

A diminuição da densidade mineral óssea, principalmente <strong>em</strong> mulheres,<br />

é um processo natural e decorre, <strong>em</strong> especial, da cessação da produção<br />

de hormônios esteroides com a menopausa. De forma geral, até<br />

a terceira década de vida, constitui-se o pico da massa óssea corporal e,<br />

a partir daí, t<strong>em</strong> início um lento declínio. De acordo com a OMS 38 osteoporose<br />

significa um valor de 2,5 desvios padrões abaixo da densidade<br />

mineral óssea correspondente ao valor mediano (P50) de uma população<br />

de referência. Valores entre 1 e 2,5 desvios-padrão abaixo da média<br />

são classificados como osteopenia.<br />

Paralelamente ao aparecimento de alterações na densidade mineral<br />

óssea, outro ponto discutido nos aspectos corporais de idosos é a estatura.<br />

Alterações na mineralização de ossos da coluna pod<strong>em</strong> fazê-la perder<br />

a capacidade de manter o corpo ereto, resultando <strong>em</strong> diminuição da<br />

estatura com a idade. Independent<strong>em</strong>ente das alterações na postura ereta,<br />

estudos populacionais relatam diminuição na estatura com a idade,<br />

mas há controvérsias nesse sentido. Perissinoto et al. 9 , na Itália, apontaram<br />

diminuição de 2 a 3 cm a cada década de vida. Já o Euronut Seneca<br />

Study 39 encontrou decréscimo de 1 a 2 cm <strong>em</strong> um estudo longitudinal de<br />

4 anos. Na América Latina, o Projeto Sabe 10 apontou perda de 0,5 a 2 cm<br />

por década. Por outro lado, considerando a tendência secular do crescimento,<br />

claramente descrita na literatura, a análise da estatura de indivíduos<br />

idosos com<strong>para</strong>tivamente a dos jovens dos dias atuais pode simplesmente<br />

estar relacionada a esse fenômeno. 40,41 Ad<strong>em</strong>ais, a tendência


72<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

secular do crescimento e o comprometimento da estatura com a idade<br />

pod<strong>em</strong> estar ocorrendo simultaneamente.<br />

Considerando alterações na postura, dev<strong>em</strong> ser buscadas alternativas<br />

<strong>para</strong> a tomada da estatura de idosos. Kwok e Whitelaw 42 propõ<strong>em</strong><br />

a medida da envergadura, ou seja, a medida dos braços abertos <strong>em</strong> cruz,<br />

de um dedo médio ao outro, como sendo proporcional à sua estatura.<br />

Entretanto, os idosos que eventualmente estejam fragilizados e comprometidos,<br />

não terão condições de permanecer com os braços abertos <strong>em</strong><br />

cruz por t<strong>em</strong>po suficiente <strong>para</strong> o procedimento de medida. Como alternativa,<br />

Mitchel e Lipchitz 43,44 propõ<strong>em</strong> a medida do comprimento do<br />

braço, a qual, de acordo com os autores, deve ser feita a partir do processo<br />

acromial da escápula até o final do processo estiloide da ulna.<br />

O método mais utilizado e mais citado na literatura é o comprimento<br />

ou a altura do joelho, por considerar que a medida <strong>em</strong> m<strong>em</strong>bros<br />

inferiores não é afetada pela diminuição das dimensões ósseas. A medida<br />

é feita com o indivíduo deitado e o joelho flexionado a 90°, a partir da<br />

sola do pé até a superfície superior do joelho.<br />

Para o estabelecimento da equação de regressão mais apropriada<br />

<strong>para</strong> estimativa da estatura a partir dessa medida, vários estudos são descritos<br />

na literatura. O primeiro foi realizado <strong>em</strong> uma amostra não representativa<br />

de Southest Ohio, apenas com indivíduos da raça branca. 45 Em<br />

outro 46 , foi avaliada uma amostra pequena e não representativa de indivíduos<br />

afrodescendentes não hispânicos. Finalmente, um estudo que utilizou<br />

uma amostra estratificada por gênero e raça a partir do NHANES<br />

III avaliou 4.750 indivíduos, sendo 1.369 homens não hispânicos brancos,<br />

1.472 mulheres não hispânicas brancas, 474 homens não hispânicos<br />

afrodescendentes e 481 mulheres não hispânicas afrodescendentes, além<br />

de 497 homens méxico-americanos e 457 mulheres méxico-americanas.<br />

Portanto, esse estudo procurou avaliar uma amostra bastante representativa<br />

de todas as diferenças raciais da população norte-americana. 12 Os<br />

resultados são traduzidos nas fórmulas descritas na Tabela 1, juntamente<br />

às estimativas de peso corporal citadas anteriormente.


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

73<br />

Embora os estudos sobre estimativas de estatura tenham oferecido<br />

grande contribuição às técnicas antropométricas <strong>para</strong> avaliação do estado<br />

nutricional <strong>em</strong> idosos, o erro dessa análise ainda é bastante considerável<br />

e, portanto, sugere-se a adoção dessas medidas apenas quando<br />

outras alternativas não for<strong>em</strong> possíveis. Outro ponto que se deve levar<br />

<strong>em</strong> consideração é a relação entre essas medidas e a realidade dos idosos<br />

brasileiros, uma vez que não há a mesma tendência de relação proporcional<br />

entre todas as populações. 47<br />

IDOSOS E RISCO NUTRICIONAL<br />

Investigar as causas de desvios nutricionais que pod<strong>em</strong> resultar <strong>em</strong> peso<br />

excessivo ou deficiente é de extr<strong>em</strong>a importância. Como as internações<br />

hospitalares são mais frequentes nesse grupo populacional, deve-se<br />

l<strong>em</strong>brar de que um acompanhamento detalhado do estado nutricional<br />

colabora <strong>para</strong> um menor t<strong>em</strong>po de internação e, portanto, <strong>para</strong> uma recuperação<br />

mais rápida. Dessa forma, a adoção de técnicas de avaliação<br />

subjetiva ou relatos de questões importantes relacionadas costuma caracterizar<br />

um primeiro passo, ou uma triag<strong>em</strong>, <strong>para</strong> se avaliar o estado<br />

nutricional de idosos. Nessa triag<strong>em</strong>, o ponto importante a ser identificado<br />

é o grau de risco nutricional.<br />

Assim, é importante definir o termo “risco nutricional”. Não há<br />

muito consenso <strong>para</strong> essa definição e também não está claro se estar <strong>em</strong><br />

risco nutricional t<strong>em</strong> um sentido mais ameno do que estar desnutrido.<br />

Alguns autores propõ<strong>em</strong> que essa avaliação seja realizada de forma subjetiva,<br />

a partir da identificação de alguns sinais ou sintomas de depleção.<br />

Nesse contexto, foi proposta a avaliação subjetiva global, especialmente<br />

no caso de idosos hospitalizados ou fragilizados. Ao final dessa avaliação<br />

é estabelecido um escore que define o risco nutricional. 48<br />

A Miniavaliação Nutricional t<strong>em</strong> sido uma das mais utilizadas no<br />

Brasil, uma vez que foi traduzida <strong>para</strong> o idioma português e validada<br />

<strong>para</strong> a população brasileira. 49,50 Consiste <strong>em</strong> um questionário que deve<br />

ser aplicado pelo profissional de saúde, com perguntas sobre hábitos de


74<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

vida, uso de medicamentos, valores antropométricos e autoavaliação. A<br />

partir do preenchimento do questionário, atribui-se um escore que classifica<br />

o risco nutricional. Em Unidades Básicas de Saúde ou <strong>em</strong> Centros<br />

de Referência a Idosos, esse tipo de avaliação garante maior agilidade no<br />

atendimento aos idosos.<br />

CONSIDERAÇÕES FINAIS<br />

O estabelecimento de técnicas apropriadas e de padrões de referência<br />

especificamente <strong>para</strong> indivíduos idosos são assuntos bastante complexos<br />

e controversos. Por isso, não existe ainda uma recomendação definitiva<br />

<strong>para</strong> a escolha e a adoção de métodos e técnicas. Dessa forma, é<br />

importante que a avaliação nesses casos seja feita da forma mais ampla<br />

possível, relacionando o maior número de variáveis possível. O contato<br />

pessoal, com o idoso e com os cuidadores permite uma importante troca<br />

de informações, que é fundamental na escolha de estratégias e condutas<br />

<strong>para</strong> a melhora do estado nutricional, da saúde e, portanto, da qualidade<br />

de vida do idoso.<br />

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CONSEQUÊNCIAS DE UM ENCONTRO:<br />

A INSEGURANÇA ALIMENTAR DAS<br />

POPULAÇÕES INDÍGENAS<br />

BRASILEIRAS E A RELAÇÃO DE CONTATO<br />

COM A SOCIEDADE NACIONAL<br />

Marcos Schaper dos Santos Junior<br />

Conversando com um professor indígena do povo Ikpeng, que vive no Médio<br />

Xingu, perguntei qual era a pior doença que ele conhecia, ele me respondeu: A<br />

pior doença <strong>para</strong> o meu povo foi o contato com o seu.<br />

INTRODUÇÃO<br />

As fontes de dados sobre a população indígena no Brasil s<strong>em</strong>pre foram<br />

muito precárias. Os mais de 230 povos indígenas somam, segundo o Censo<br />

IBGE 2010, 896.917 pessoas, o que corresponde, aproximadamente, a<br />

0,47% da população total do país. A diversidade da população indígena<br />

brasileira é imensa e manifesta-se <strong>em</strong> vários aspectos, na forma de organização<br />

social e política, mitos, cosmologia, etc. Cada povo t<strong>em</strong> sua maneira<br />

de se relacionar com o mundo e sua própria visão sobre o processo<br />

de saúde, doença, alimentação e nutrição. São mais de 180 línguas faladas<br />

por 238 povos <strong>em</strong> diferentes estágios de relação de contato com outros<br />

segmentos da sociedade nacional, desde indígenas morando há décadas<br />

<strong>em</strong> cidades até relatos de mais de 50 evidências de grupos isolados. 1<br />

Os povos indígenas apresentam, <strong>em</strong> geral, precárias condições de<br />

vida e saúde, diretamente relacionadas aos processos históricos de mudanças<br />

sociais, culturais, econômicas e ambientais. Essa situação é decorrente,<br />

<strong>em</strong> especial, de suas desprotegidas interações com a sociedade<br />

não indígena. Essas mudanças repercut<strong>em</strong> diretamente nos determinantes<br />

das condições de saúde e nutrição e geram situações de insegurança<br />

alimentar e nutricional.


80<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

A INSEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL DA<br />

POPULAÇÃO INDÍGENA BRASILEIRA: A RELAÇÃO DE<br />

CONTATO COMO PANO DE FUNDO<br />

O Conselho Brasileiro de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea)<br />

define segurança alimentar e nutricional como o direito de todos ao<br />

acesso regular e contínuo aos alimentos, tanto <strong>em</strong> qualidade como <strong>em</strong><br />

quantidade suficiente, s<strong>em</strong> comprometer o acesso a outras necessidades<br />

essenciais. São princípios básicos as práticas alimentares promotoras de<br />

saúde que respeit<strong>em</strong> a diversidade cultural e sejam sustentáveis na perspectiva<br />

socioeconômica e ambiental. 2<br />

Negar esse direito às pessoas leva à insegurança alimentar, que<br />

pode se manifestar por fome, desnutrição e obesidade. Os indicadores<br />

antropométricos são tradicionalmente utilizados <strong>para</strong> mensurar<br />

sua magnitude, sobretudo entre as crianças. Pesquisadores da Unicamp<br />

coor denaram o projeto que validou um questionário de avaliação<br />

familiar de segurança alimentar (Escala Brasileira de Insegurança<br />

Alimentar – EBIA). 3 O instrumento é composto de 15 perguntas<br />

que permit<strong>em</strong> avaliar a segurança alimentar a partir da percepção da<br />

família.<br />

Estudos <strong>para</strong> determinar a insegurança alimentar entre os povos<br />

indígenas são pontuais. Levantamento conduzido por Verdum, <strong>em</strong><br />

meados da década de 1990, já apontava que, <strong>em</strong> 1/3 das terras indígenas<br />

(TI) do Brasil, os indígenas conviviam com probl<strong>em</strong>as de insegurança<br />

alimentar, a maioria localizada no Nordeste, Sul e Sudeste. 4-6 Em<br />

2004, foi realizada, utilizando a EBIA adaptada, uma pesquisa com famílias<br />

da etnia Terena, moradoras da TI Buriti, localizada no Mato<br />

Grosso do Sul. Esse estudo encontrou prevalência de insegurança alimentar<br />

leve <strong>em</strong> 22,4%, moderada <strong>em</strong> 32,7% e grave <strong>em</strong> 20,4% entre as<br />

famílias estudadas. 6<br />

No meio indígena, a insegurança alimentar é fruto de uma relação<br />

de contato com a sociedade não indígena que levou a drásticas alterações<br />

no modo de viver dessa população, ocasionada, entre outras razões,


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

81<br />

pelo processo contínuo de diminuição territorial, esgotamento de recursos<br />

naturais e degradação ambiental.<br />

A atividade de subsistência por meio da agricultura, coleta, pesca e<br />

caça v<strong>em</strong> se modificando ao longo do t<strong>em</strong>po. O confinamento de populações<br />

inteiras <strong>em</strong> pequenos territórios e a instalação de regimes econômicos,<br />

entre outros fatores, levaram muitos povos indígenas ao <strong>em</strong>pobrecimento<br />

e colocaram-n0s <strong>em</strong> situação de vulnerabilidade alimentar<br />

e nutricional. Atualmente, cerca de 40% desses povos viv<strong>em</strong> <strong>em</strong> menos<br />

de 2% das TI nas regiões Nordeste, Sudeste e Sul do país. 1 Segundo<br />

a Fundação Nacional do Índio (Funai), a população indígena está distribuída<br />

por 688 TI e algumas áreas urbanas, inclusive nas capitais e grandes<br />

cidades brasileiras. 7 Nas cidades, a grande maioria vive <strong>em</strong> favelas e<br />

bolsões de pobreza, trabalha <strong>em</strong> sub<strong>em</strong>pregos e recebe salários que não<br />

lhes permit<strong>em</strong> adquirir alimentos <strong>em</strong> quantidade e qualidade <strong>para</strong> garantir<br />

a segurança alimentar de suas famílias. 8,9<br />

Contudo, mesmo onde exist<strong>em</strong> grandes extensões de terra, as terras<br />

boas <strong>para</strong> cultivo, com abundância de animais, peixes e alimentos obtidos<br />

por meio da coleta (frutas, mel, castanhas, raízes) estão dispersos, sendo<br />

necessários grandes deslocamentos <strong>para</strong> encontrá-los. Com a exploração,<br />

ocorre um esgotamento dos recursos próximos às aldeias, sendo necessário<br />

ir cada vez mais longe <strong>para</strong> caçar, pescar, produzir ou coletar alimentos.<br />

Antigamente, isso era resolvido com a mudança das aldeias <strong>para</strong> uma<br />

região onde os alimentos eram abundantes e as terras eram férteis. Hoje<br />

<strong>em</strong> dia, com a redução dos territórios e a fixação da população nas aldeias,<br />

<strong>em</strong> decorrência da existência de escolas, poços artesianos, geradores,<br />

unidade de saúde e outros bens, isso não é mais possível. 10<br />

Outro aspecto que provoca variações na produção, na oferta e no<br />

consumo de alimentos é a sazonalidade. 5,11 Os períodos de seca e chuva,<br />

descida e subida dos níveis dos rios, levam à diminuição de peixes<br />

e pod<strong>em</strong> afetar negativamente a nutrição da população nos períodos<br />

de escassez, sobretudo daqueles que já apresentam comprometimento<br />

do estado nutricional. Além disso, é significativo o impacto ambiental


82<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

provocado pela ocupação do entorno das TI com fazendas <strong>para</strong> criação<br />

de gado e atividades extrativistas, como a exploração da madeira.<br />

O garimpo e as atividades agrícolas, como a monocultura da soja no<br />

Mato Grosso, provocam o assoreamento dos rios. 12 Tais fatores levam à<br />

diminuição de peixes e animais, que são as principais fontes de proteína<br />

de alto valor biológico <strong>para</strong> os povos indígenas, e à piora da qualidade da<br />

água usada <strong>para</strong> o consumo.<br />

Outrossim, as condições de saneamento das áreas indígenas são<br />

precárias. A falta de locais apropriados <strong>para</strong> destinos dos dejetos levam<br />

à alta infestação <strong>para</strong>sitária do meio ambiente, e a inexistência de água<br />

de boa qualidade <strong>para</strong> o consumo, na maioria das aldeias, favorece a<br />

transmissão de helmintos e protozoários, b<strong>em</strong> como a contaminação<br />

por enterobactérias. 8,13,14 Esse cenário explica a alta prevalência de <strong>para</strong>sitoses<br />

intestinais 15-22 e diarreias entre os indígenas. 8,13,23-25<br />

Outro aspecto relevante diz respeito à contaminação do solo e lençóis<br />

freáticos das TI por resíduos sólidos (p.ex., plásticos, latas, papelão),<br />

resíduos dos serviços de saúde, fertilizantes e defensivos agrícolas<br />

usados na agricultura do entorno, recipientes de combustíveis e óleos<br />

lubrificantes usados no transporte fluvial, contaminantes químicos das<br />

baterias e pilhas 13 , e mercúrio usado no garimpo. 26,27 A situação é preocupante<br />

pelos efeitos danosos que essas substâncias pod<strong>em</strong> causar <strong>para</strong><br />

a saúde humana, porém são poucos os estudos direcionados <strong>para</strong> dimensionar<br />

o probl<strong>em</strong>a entre os indígenas.<br />

Para vários povos indígenas, a construção do corpo é fruto de uma<br />

relação com seu ambiente material, social e cultural. O corpo é nutrido,<br />

modelado e cresce por várias intervenções dentro e fora dele, como pinturas,<br />

amarrações <strong>em</strong> partes do corpo, escarificações, perfuração das<br />

orelhas, tatuagens, uso de ervas, participação <strong>em</strong> rituais, etc. Portanto,<br />

<strong>para</strong> muitos povos, na gênese dos distúrbios nutricionais estão as mudanças<br />

de hábitos culturais, o abandono da alimentação tradicional e<br />

dos cuidados com as crianças e o rompimento de tabus relacionados a<br />

puberdade, gestação, parto e puerpério. 28,29


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

83<br />

Todos esses fatores decorrentes das mudanças que vêm ocorrendo<br />

com as populações indígenas geram situações de insegurança alimentar,<br />

b<strong>em</strong> como a peculiaridade do perfil nutricional e epid<strong>em</strong>iológico desses<br />

povos.<br />

TRANSIÇÃO EPIDEMIOLÓGICA E PERFIL NUTRICIONAL<br />

DA POPULAÇÃO INDÍGENA BRASILEIRA: REFLEXO DA<br />

EXCLUSÃO SOCIAL<br />

A mortalidade infantil é considerada um bom indicador das condições de<br />

vida de uma população, pois retrata a condição de saúde de sua parcela<br />

mais vulnerável – os menores de 1 ano. Em 2007, a mortalidade infantil no<br />

Brasil foi de 20 óbitos por 1.000 nascidos vivos 30 , enquanto na população<br />

indígena foi de 46,9 por 1.000. 31 Ao contrário das crianças de outras etnias,<br />

<strong>em</strong> que as causas neonatais predominam, os óbitos <strong>em</strong> menores de 1 ano<br />

entre as crianças indígenas ocorr<strong>em</strong> por causas pós-neonatais <strong>em</strong> mais da<br />

metade dos casos. 32 Infecções respiratórias agudas (IRA), diarreias e desnutrição<br />

estão entre as principais causas de óbitos dessas crianças. 33<br />

Cardoso 25 constatou que a taxa anual de hospitalização global dos<br />

Guarani, no Sul e Sudeste do Brasil, superou <strong>em</strong> 70% a taxa correspondente<br />

verificada no território nacional. O estudo revela que IRA e diarreias<br />

são as principais causam de internação entre as crianças. A an<strong>em</strong>ia<br />

<strong>em</strong> menores de 1 ano e a desnutrição chamam a atenção entre os diagnósticos<br />

secundários.<br />

Essa situação epid<strong>em</strong>iológica retrata a baixa qualidade da assistência<br />

à saúde, a falta de saneamento e a situação de insegurança alimentar<br />

e nutricional dos povos indígenas. Os indicadores d<strong>em</strong>onstram iniquidade<br />

e reflet<strong>em</strong> a exclusão social que marca historicamente a relação<br />

das sociedades indígenas com outros segmentos da sociedade nacional.<br />

Os povos indígenas apresentam uma transição epid<strong>em</strong>iológica caracterizada<br />

pela <strong>em</strong>ergência de doenças crônicas não transmissíveis<br />

(DCNT) coexistindo com altas prevalências de doenças infecciosas e<br />

<strong>para</strong>sitárias. 8,34-36


84<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

A população total v<strong>em</strong> crescendo <strong>em</strong> ritmo acelerado, acima da média<br />

nacional. Entre as causas <strong>para</strong> esse quadro, destaca-se o crescimento<br />

vegetativo decorrente das elevadas taxas de fecundidade e da queda<br />

da mortalidade. Tais características são consequência de vários fatores,<br />

como o abrandamento de conflitos com frentes expansionistas, diminuição<br />

das epid<strong>em</strong>ias, melhor acesso aos serviços de assistência à saúde, garantia<br />

de territórios, além do desejo e decisão de crescer. 37<br />

No contexto nutricional, observam-se prevalências b<strong>em</strong> acima da<br />

média nacional <strong>para</strong> baixa estatura entre as crianças e sobrepeso e obesidade<br />

crescentes a partir da infância.<br />

Ao longo das últimas décadas, houve aumento no número de pesquisas<br />

sobre as condições nutricionais dos povos indígenas. Entretanto,<br />

<strong>em</strong> sua maioria, são estudos transversais, abrang<strong>em</strong> um pequeno número<br />

de etnias e estão concentrados na Amazônia Legal. Como poucos<br />

estudos são longitudinais, não permit<strong>em</strong> com<strong>para</strong>ções com outros momentos<br />

da população estudada. 38<br />

Sabe-se que um imenso contingente dessa população vive nas cidades<br />

e capitais brasileiras e confinado <strong>em</strong> territórios exíguos, no Nordeste,<br />

Sudeste e Sul do Brasil. Contudo, apesar da situação de maior vulnerabilidade,<br />

esse grupo não é avaliado na maioria dos estudos.<br />

Além da sociodiversidade, o grande número de etnias não cont<strong>em</strong>pladas<br />

pelos estudos limita as possibilidades de generalizações e a elaboração<br />

de um quadro da situação nutricional do universo da população<br />

indígena brasileira.<br />

Os estudos sobre as condições nutricionais das crianças indígenas<br />

mostram prevalências moderadas ou elevadas de desnutrição 11,34,38-48 ,<br />

b<strong>em</strong> acima dos níveis nacionais 49 , chegando a 62,7 e 51,7%, de baixa estatura<br />

e de déficit de peso <strong>para</strong> idade, respectivamente, entre os Pakaanóva-Wari.<br />

11 Nos poucos estudos que avaliaram o peso de nascimento<br />

das crianças, encontram-se prevalências que chegam a 30,4% 38,43,47 , b<strong>em</strong><br />

acima da média nacional, que é de 8,2%. 32 A despeito disso, exist<strong>em</strong> estudos<br />

apontando sobrepeso infantil. 41,42,48 Os índices antropométricos


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

85<br />

encontrados nos estudos nutricionais das crianças reflet<strong>em</strong> as precárias<br />

condições de vida e saúde das comunidades indígenas.<br />

Estudos suger<strong>em</strong> que as alterações do estilo de vida dos indígenas,<br />

com a mudança da dieta tradicional, passando de carboidratos complexos<br />

<strong>para</strong> os de absorção rápida dos alimentos industrializados, e a diminuição<br />

da atividade física levaram ao surgimento de DCNT, como<br />

obesidade <strong>em</strong> adolescentes 34,48,50 e adultos 5,34-36,51-53 , diabetes tipo II 8,54-57 e<br />

hipertensão arterial. 35,36,52,58,59<br />

Concomitant<strong>em</strong>ente, pesquisas apontam fortes evidências de que<br />

a desnutrição na infância e o baixo peso ao nascer causam uma série de<br />

mudanças a longo prazo. O menor gasto energético e a maior suscetibilidade<br />

aos efeitos de dietas com alto teor de gordura ocasionam diabetes<br />

tipo II, obesidade e hipertensão arterial na vida adulta, evento conhecido<br />

como programação ou orig<strong>em</strong> fetal das doenças. 60,61 Assim, além das<br />

alterações da dieta e da atividade física, a desnutrição entre as crianças<br />

indígenas pode ser um agravante a médio e longo prazos. Por isso, ações<br />

voltadas <strong>para</strong> uma melhor qualidade do pré-natal, b<strong>em</strong> como da situação<br />

nutricional das crianças também são importantes na prevenção de<br />

DCNT na idade adulta.<br />

Segundo Vieira Filho, os indígenas brasileiros possu<strong>em</strong> o genótipo<br />

econômico ou thrifty genotype. 62 Os genes que atualmente predispõ<strong>em</strong><br />

os indígenas ao diabete tipo II foram vantajosos entre seus ancestrais<br />

que viviam <strong>em</strong> ambientes onde a disponibilidade alimentar era<br />

muito irregular. A rápida resposta insulínica ao estímulo da glicose favorecia<br />

a capacidade de converter a glicose <strong>em</strong> gordura de reserva, conferindo<br />

uma vantag<strong>em</strong> de sobrevivência durante períodos de escassez.<br />

Essa adaptação genética <strong>para</strong> garantir a sobrevivência <strong>em</strong> períodos de<br />

fome passou, diante de alterações ambientais, a ser a causa de ganho excessivo<br />

de peso e acúmulo de gordura. 63 Portanto, as políticas de saúde<br />

dev<strong>em</strong> evitar intervenções nutricionais que proporcion<strong>em</strong> maior ganho<br />

de peso corporal do que de estatura, como a distribuição de cesta de alimentos<br />

com alto valor calórico.


86<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

Em relação à deficiência de micronutrientes, os estudos limitam-se<br />

à avaliação da an<strong>em</strong>ia, que afeta, <strong>em</strong> especial, mulheres <strong>em</strong> idade fértil e<br />

crianças menores de 2 anos, chegando à prevalência de 92%, como mostra<br />

estudo com a população infantil da etnia Suruí, de Rondônia. 40,42,45,46<br />

O principal determinante da an<strong>em</strong>ia entre as crianças é a deficiência de<br />

nutrientes na alimentação, <strong>em</strong> especial o ferro, associada a uma necessidade<br />

aumentada desse mineral, <strong>em</strong> função do crescimento. Merec<strong>em</strong><br />

destaque entre os indígenas as doenças infecto<strong>para</strong>sitárias, sobretudo<br />

as <strong>para</strong>sitoses, e, <strong>em</strong> algumas comunidades, a malária. Entre as mulheres,<br />

as condições inadequadas das gestações e partos são agravantes. Em<br />

muitos casos, elas iniciam suas gestações anêmicas ou com baixas reservas<br />

de ferro. 44<br />

Quanto às outras carências nutricionais, são poucos os estudos entre<br />

os povos indígenas brasileiros. 44 Vieira Filho et al. relataram a ocorrência<br />

de dois casos de polineuropatia carencial entre os Xavante, decorrentes<br />

da deficiência da tiamina (vitamina B 1<br />

). Os quadros foram<br />

associados a uma dieta baseada quase exclusivamente <strong>em</strong> arroz beneficiado,<br />

resultado de mudanças na dieta desse grupo indígena e da introdução<br />

de alimentos industrializados. 64<br />

Pesquisadores da Escola Nacional de Saúde Pública coordenaram<br />

o primeiro Inquérito Nacional de Saúde Indígena, que avaliou 6.707<br />

mulheres na faixa etária de 14 a 49 anos e 6.285 crianças menores de 5<br />

anos. Os resultados, divulgados <strong>em</strong> maio de 2010, corroboram pesquisas<br />

anteriores com os povos indígenas e mostram que 30,2% das mulheres<br />

indígenas avaliadas estão com sobrepeso e 15,7% foram classificadas<br />

como obesas. A hipertensão arterial teve a maior prevalência, 12,1%,<br />

entre as mulheres das regiões Sul e Sudeste. As crianças menores de 5<br />

anos apresentaram a maior prevalência de baixa estatura, 41,1%, na região<br />

Norte. A an<strong>em</strong>ia está presente <strong>em</strong> todas as regiões. As maiores prevalências<br />

foram encontradas na região Norte: 66% entre as crianças de<br />

6 a 59 meses e 46,9 e 44,8% entre as mulheres não grávidas e gestantes,<br />

respectivamente. 65


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

87<br />

Pela iniciativa governamental e abrangência nacional, essa pesquisa<br />

representa um marco na luta de pesquisadores, indígenas e indigenistas<br />

<strong>para</strong> dar visibilidade aos probl<strong>em</strong>as de saúde desses povos, apesar de<br />

suas limitações <strong>para</strong> retratar a situação de uma população tão diversa<br />

como a população indígena brasileira.<br />

A diversidade sociocultural, b<strong>em</strong> como a heterogeneidade dos perfis<br />

epid<strong>em</strong>iológicos e das relações de contato com a sociedade não indígena,<br />

além de dificultar generalizações, exige políticas públicas e ações<br />

diferenciadas e sensíveis às profundas transformações ambientais, econômicas,<br />

sociais e culturais que os povos indígenas estão vivenciando.<br />

ATENÇÃO DIFERENCIADA À SAÚDE DA POPULAÇÃO<br />

INDÍGENA BRASILEIRA: UMA CONQUISTA AINDA A SER<br />

CONSOLIDADA<br />

A Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas, implantada<br />

a partir de 1999 pela Lei Arouca (Lei n. 9.836, de 23 de set<strong>em</strong>bro de<br />

1999), garante aos indígenas o direito a um modelo de atenção diferenciada<br />

à saúde, configurando um Subsist<strong>em</strong>a de Atenção à Saúde, parte<br />

do Sist<strong>em</strong>a Único de Saúde (SUS), que deve respeitar a especificidade e<br />

a diversidade sociocultural dessa população e se baseia na implantação<br />

dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI), identificados como<br />

um modelo de organização de serviço <strong>em</strong> bases territoriais definidas segundo<br />

critérios étnicos, culturais, geográficos, administrativo e de distribuição<br />

d<strong>em</strong>ográfica tradicional 66 , que não necessariamente coincide<br />

com os limites de estados e municípios onde estão localizadas as TI.<br />

Após 11 anos da implantação do subsist<strong>em</strong>a de saúde indígena, ainda<br />

se está longe de colocar <strong>em</strong> prática o modelo de atenção diferenciada.<br />

Existe uma distância enorme entre o discurso oficial e a prática nos<br />

DSEI. 67 A imensa complexidade do subsist<strong>em</strong>a e de sua operacionalização<br />

carece de uma reflexão profunda e de novas estratégias de intervenção.<br />

Essa situação levou a propostas de mudanças na gestão, que culminaram,<br />

<strong>em</strong> 2010, com a saída da responsabilidade da gestão da saúde


88<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

indígena da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) e a criação da Secretaria<br />

Especial de Saúde Indígena (Sesai) no Ministério da Saúde, antiga<br />

reivindicação do movimento indígena e indigenista. 68<br />

Em 2006, foi instituído o Sist<strong>em</strong>a de Vigilância Alimentar e Nutricional<br />

<strong>para</strong> os DSEI – Sisvan Indígena, por meio da Portaria Funasa<br />

n. 984, de 6 de julho. 69 Segundo a Funasa:<br />

O Sisvan Indígena permite conhecer como se apresentam os agravos<br />

nutricionais nesta população propondo medidas imediatas ao<br />

diagnóstico e medidas articuladas intersetorialmente, incluindo<br />

políticas e ações eficazes <strong>para</strong> todos ou <strong>para</strong> os grupos de maior<br />

vulnerabilidade. 70<br />

Atualmente, o programa ainda está focado na implantação de rotinas de<br />

vigilância nutricional <strong>em</strong> áreas indígenas voltadas <strong>para</strong> o registro de dados<br />

nutricionais e retroalimentação do sist<strong>em</strong>a. De modo geral, as informações<br />

não são disponibilizadas <strong>para</strong> as Equipes Multidisciplinares de<br />

Saúde Indígena (EMSI), que atuam nos DSEI, <strong>para</strong> auxiliar a avaliação, o<br />

monitoramento e o planejamento das ações de enfrentamento dos probl<strong>em</strong>as<br />

<strong>em</strong> âmbito local.<br />

Algumas ações realizadas pela Funasa merec<strong>em</strong> destaque, como a<br />

implantação do Curso de Especialização <strong>em</strong> Vigilância Alimentar e Nutricional<br />

por meio da parceria com a Escola Nacional de Saúde e a realização<br />

do Inquérito Nacional de Saúde e Nutrição dos Povos Indígenas,<br />

<strong>em</strong> parceria com o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à<br />

Fome. Entretanto, o enfrentamento da insegurança alimentar e nutricional<br />

dos povos indígenas d<strong>em</strong>anda avanços além dos programas de<br />

supl<strong>em</strong>entação alimentar e transferência de renda. A magnitude do probl<strong>em</strong>a<br />

exige projetos de segurança alimentar permanentes com ações<br />

intersetoriais e sustentáveis.<br />

De modo geral, as políticas públicas e as iniciativas da sociedade<br />

civil <strong>para</strong> enfrentamento da insegurança alimentar dos povos indígenas


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

89<br />

têm encontrado dificuldades <strong>para</strong> atingir os resultados esperados. Várias<br />

razões são apontadas <strong>para</strong> o insucesso desses programas e projetos,<br />

como: desrespeito à organização social, ao conhecimento dos grupos indígenas<br />

e às suas relações com os territórios; implantação como núcleos<br />

isolados; dificuldades <strong>para</strong> articulação intersetorial; não participação das<br />

comunidades indígenas no planejamento dos projetos e elaboração sob<br />

a lógica do modelo de desenvolvimento ocidental. 71,72<br />

Embora existam indígenas <strong>em</strong> situação de extr<strong>em</strong>a pobreza, <strong>em</strong><br />

que o combate imediato à fome é necessário por meio do fornecimento<br />

de alimentos ou de dinheiro <strong>para</strong> adquiri-los, é preciso avançar <strong>para</strong><br />

propostas que caus<strong>em</strong> impacto sobre os determinantes das precárias<br />

condições de vida da imensa maioria dos povos indígenas, que geram<br />

insegurança alimentar e aumentam a vulnerabilidade desses povos aos<br />

distúrbios nutricionais.<br />

BUSCANDO UM NORTE E SONHANDO EM<br />

TRANSFORMAR REALIDADES<br />

Este capítulo visa a apontar caminhos, mas s<strong>em</strong> a pretensão de ensinar<br />

a traçá-los completamente. A diversidade dos povos é imensa; muitos e<br />

diferentes caminhos dev<strong>em</strong> ser pensados e trilhados. O desejo maior é<br />

despertar o querer mudar a realidade dos povos indígenas e estimular<br />

sonhos transformadores de práticas, realidades e pessoas.<br />

Os profissionais das EMSI dev<strong>em</strong> ser protagonistas na construção<br />

de propostas <strong>para</strong> o enfrentamento dos probl<strong>em</strong>as de saúde das pessoas<br />

que estão sob seus cuidados. 73 Para tanto, dev<strong>em</strong> conhecer os determinantes<br />

e condicionantes da situação de insegurança alimentar dos povos<br />

com os quais trabalham; <strong>em</strong>poderar as comunidades, professores, mulheres<br />

e lideranças por meio da divulgação das informações relacionadas à<br />

situação de saúde das comunidades e seus determinantes, relativizando<br />

seus conhecimentos e valorizando os conhecimentos e cuidados tradicionais;<br />

capacitar os profissionais indígenas de saúde <strong>para</strong> o desenvolvimento<br />

de ações de enfrentamento dos probl<strong>em</strong>as de saúde <strong>em</strong> suas aldeias;


90<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

incentivar a participação de lideranças e profissionais indígenas nos espaços<br />

de debate; desenvolver ações efetivas <strong>para</strong> a melhoria das condições<br />

do pré-natal, parto, puerpério, acompanhamento de crescimento e desenvolvimento<br />

das crianças e da saúde dos adultos e idosos, com ênfase na<br />

vigilância da saúde das mulheres <strong>em</strong> idade fértil e das crianças <strong>em</strong> maior<br />

risco nutricional, acompanhamento das doenças prevalentes na população<br />

infantil e das DCNT entre os adultos; e agregar outros segmentos sociais,<br />

como mulheres, lideranças e profissionais da medicina tradicional<br />

<strong>para</strong> valorizar e legitimar os cuidados, as orientações, as ações de educação<br />

<strong>em</strong> saúde e vigilância da saúde desenvolvidas nas aldeias.<br />

Entretanto, as ações setoriais de saúde, isoladas, não apresentam a<br />

eficácia necessária <strong>para</strong> se enfrentar o cenário epid<strong>em</strong>iológico, garantir<br />

segurança nutricional e causar impacto positivo na vida dos povos indígenas.<br />

Desse modo, além da sensibilidade antropológica necessária <strong>para</strong><br />

que as ações e orientações tenham chances maiores de surtir<strong>em</strong> efeito, é<br />

fundamental a articulação das equipes de saúde com os professores indígenas<br />

e profissionais que trabalh<strong>em</strong> nas TI com questões relacionadas<br />

ao meio ambiente e à produção de alimentos. A intersetorialidade deve<br />

ser uma diretriz básica <strong>para</strong> o enfrentamento das questões nutricionais<br />

e alimentares.<br />

Nesse contexto, é fundamental a busca por alternativas às cestas básicas<br />

com carboidratos de absorção rápida dos alimentos industrializados,<br />

com altos valores calóricos e ricos <strong>em</strong> sódio, como elaboração de cestas<br />

básicas e cardápio das merendas das escolas indígenas compostas com alimentos<br />

in natura, s<strong>em</strong>ielaborados e que respeit<strong>em</strong> os hábitos alimentares<br />

e a experiência produtiva de cada local; e incentivo à produção de alimentos<br />

tradicionais nas áreas indígenas e à busca de fontes alternativas de proteínas<br />

de alto valor biológico que sejam culturalmente sustentáveis. Essas<br />

iniciativas dev<strong>em</strong> ser colocadas na pauta de discussão de gestores, profissionais<br />

das diversas áreas, inclusive da saúde, e das comunidades indígenas.<br />

Aumentar o número de pesquisas sobre a população indígena, priorizando<br />

estudos longitudinais e que cont<strong>em</strong>pl<strong>em</strong> a diversidade dessa


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

91<br />

população, é medida fundamental <strong>para</strong> tirar os indígenas da situação de<br />

invisibilidade a que historicamente estão submetidos.<br />

Urge, <strong>para</strong> se avançar no enfrentamento da insegurança alimentar<br />

e nutricional dos povos indígenas, a implantação de políticas públicas e<br />

ações que respeit<strong>em</strong> a diversidade cultural e a relação de contato desses<br />

povos com a sociedade não indígena. É fundamental o protagonismo das<br />

comunidades e o envolvimento das associações indígenas, da sociedade<br />

civil e do governo com a participação de todas as instituições que desenvolv<strong>em</strong><br />

políticas públicas voltadas <strong>para</strong> os povos indígenas e relacionadas<br />

aos fatores causais que levam à insegurança alimentar e nutricional<br />

dessa população. É preciso ampliar a discussão e incluir na pauta as<br />

questões territoriais, o saneamento, a educação, as alternativas econômicas<br />

e o desenvolvimento sustentável <strong>para</strong> as comunidades indígenas<br />

do país, buscando transformar a realidade e as condições de saúde desses<br />

povos.<br />

Conclui-se com a transcrição do diálogo do personag<strong>em</strong> Kindzu<br />

com o fantasma de seu pai, do <strong>livro</strong> Terra sonâmbula, do moçambicano<br />

Mia Couto:<br />

– O que andas a fazer com um caderno, escreves o quê?<br />

– N<strong>em</strong> sei, pai. Escrevo conforme vou sonhando.<br />

– E alguém vai ler isto?<br />

– Talvez.<br />

– É bom assim, ensinar alguém a sonhar.<br />

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ANTROPOMETRIA DE<br />

CRIANÇAS QUILOMBOLAS DE<br />

0 A 5 ANOS DE IDADE<br />

José Augusto de A. C. Taddei<br />

Fernando A. B. Colugnati<br />

Fernanda Cobayashi<br />

INTRODUÇÃO<br />

Os inquéritos antropométricos de abrangência nacional realizados no<br />

Brasil e <strong>em</strong> outros países s<strong>em</strong>pre tiveram como limitação a não inclusão,<br />

<strong>em</strong> seus planos amostrais, dos subgrupos infantis com maiores riscos nutricionais.<br />

Pertenc<strong>em</strong> a esses subgrupos não considerados nas amostras<br />

nacionais as crianças que viv<strong>em</strong> nas ruas, <strong>em</strong> favelas e <strong>em</strong> cortiços, as de<br />

famílias s<strong>em</strong> terra e s<strong>em</strong> teto, as crianças abrigadas <strong>em</strong> orfanatos e as que<br />

viv<strong>em</strong> <strong>em</strong> locais de difícil acesso, como as da região Norte, além das r<strong>em</strong>anescentes<br />

de etnias específicas, como os quilombolas e os indígenas.<br />

A não inclusão desses contingentes de crianças nos inquéritos leva<br />

a estimativas de prevalências de desnutrição mais otimistas que as realmente<br />

existentes, motivando afirmativas imprecisas de que as prevalências<br />

dos desvios antropométricos estariam dentro dos níveis de normalidade<br />

no país. Mais importante, no entanto, do que o erro introduzido<br />

pelo viés de seleção nas estimativas nacionais ou regionais é a invisibilidade<br />

dessas populações. As populações quilombolas são <strong>em</strong>bl<strong>em</strong>áticas<br />

como representantes dos brasileiros invisíveis e, consequent<strong>em</strong>ente, excluídos.<br />

Muitos não sabiam, até b<strong>em</strong> pouco t<strong>em</strong>po, de sua existência e


100<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

acreditavam que só faziam parte da história do Brasil, tendo desaparecido<br />

com a abolição da escravatura.<br />

Os dados apresentados a seguir representam o primeiro perfil das<br />

condições de saúde e nutrição dos menores de 5 anos residentes <strong>em</strong> comunidades<br />

quilombolas. São informações que pod<strong>em</strong> ser úteis <strong>para</strong> políticos,<br />

líderes e gerentes envolvidos <strong>em</strong> programas de promoção das<br />

condições de vida, no sentido de melhorar a cobertura e adequar as<br />

ações de forma a minimizar o sofrimento e as privações por que passam<br />

as crianças quilombolas.<br />

SITUAÇÃO ANTROPOMÉTRICA E NUTRICIONAL<br />

A Tabela 1 apresenta as prevalências das condições nutricionais, utilizando-se<br />

os pontos de corte clássicos de -2 escores z <strong>para</strong> déficit e +2<br />

<strong>para</strong> excesso, segundo os padrões da Organização Mundial da Saúde<br />

(OMS) e do National Center for Health Statistics (NCHS). Observa-se<br />

que a maior prevalência é a do déficit altura/idade: 11,6% quando se utiliza<br />

o padrão NCHS e 15% com a população padrão da OMS. Em seguida,<br />

a relação peso/idade apresenta prevalências de 8,1 e 5,9%, considerando<br />

as populações de referência do NCHS e da OMS, respectivamente. No<br />

entanto, como esperado, <strong>para</strong> relação peso/altura, tais prevalências de<br />

déficit ca<strong>em</strong> bastante, sendo a estimativa de aproximadamente 2% <strong>para</strong><br />

ambas as populações de referência. 1-4<br />

TABELA 1<br />

Prevalências dos indicadores antropométricos de crianças quilombolas<br />

menores de 5 anos de idade considerando as populações de referência do NCHS 1 e<br />

da OMS 1977 e 2005 3,4<br />

ÍNDICES N DÉFICIT EUTROFIA EXCESSO<br />

NCHS/OMS 2.723<br />

Altura/idad e 11,6 87,6 0,8<br />

Peso/idade 8,1 89,5 2,4<br />

(continua)


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

101<br />

(continua)<br />

Peso/altura 2 94 3,9<br />

OMS<br />

2.725 a<br />

Altura/idade 15 84,2 0,8<br />

Peso/idade 5,9 92,1 2,1<br />

Peso/altura 1,9 92,7 5,4<br />

a Plausíveis <strong>para</strong> população de referência da WHO.<br />

4<br />

De acordo com a Tabela 1, pode-se dizer que a população estudada<br />

não apresenta situação preocupante do ponto de vista da desnutrição aguda.<br />

No entanto, deve-se atentar <strong>para</strong> o fato de que crianças com quadros<br />

agudos que se associam aos déficits de peso <strong>para</strong> estatura geralmente não<br />

participam dos inquéritos como o <strong>aqui</strong> realizado; permanec<strong>em</strong> <strong>em</strong> seus domicílios<br />

ou buscam assistência médica. É possível, portanto, que a desnutrição<br />

aguda esteja subestimada nesse estudo. Por sua vez, é evidente o quadro<br />

de retardo de desenvolvimento <strong>em</strong> razão da desnutrição crônica medida<br />

pelos déficits de altura/idade. Tal ocorrência torna-se ainda mais preocupante<br />

ao se atentar <strong>para</strong> o fato de que as crianças estudadas são as sobreviventes.<br />

Essas prevalências seriam ainda maiores se foss<strong>em</strong> considerados os<br />

vieses de sobrevivência a que estão sujeitos os estudos transversais. 5,6<br />

Com<strong>para</strong>ndo-se essa população à das crianças da amostra da Chamada<br />

Nutricional do S<strong>em</strong>iárido, nota-se que estão <strong>em</strong> situação um pouco<br />

mais desfavorável (Figura 1). Observa-se que as crianças quilombolas<br />

estão <strong>em</strong> situação s<strong>em</strong>elhante às do Nordeste urbano brasileiro de 1996,<br />

segundo dados da Pesquisa Nacional de D<strong>em</strong>ografia e Saúde (PNDS). 7<br />

Ainda na Tabela 1, que apresenta as prevalências de desvios nutricionais,<br />

vale ressaltar os excessos no índice peso/altura. Apesar de não<br />

ser o critério mais adequado <strong>para</strong> a classificação de obesidade da faixa<br />

etária estudada, as prevalências de aproximadamente 5% mostram quadro<br />

s<strong>em</strong>elhante aos encontrados <strong>em</strong> centros urbanos. Evidenciam que,<br />

também entre as crianças quilombolas, já coexist<strong>em</strong> o retardo de crescimento<br />

e os excessos de peso <strong>para</strong> a altura.


102<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

FIGURA 1 Prevalências estimadas dos déficits nutricionais entre populações<br />

quilombolas e outras populações infantis <strong>em</strong> situação de insegurança alimentar,<br />

segundo o padrão NCHS.<br />

30<br />

25<br />

25,2<br />

20<br />

%<br />

15<br />

10<br />

11,6<br />

8,2<br />

13<br />

7<br />

10,1<br />

6,6 5,6<br />

2,8<br />

5<br />

2<br />

3,2<br />

2,3<br />

0<br />

Quilombolas, 2006 S<strong>em</strong>iárido, 2005 NE urbano, 1996 NE rural, 1996<br />

Déficit A/I Déficit P/I Déficit P/A<br />

A/I: altura/idade; P/I: peso/idade; P/A: peso/altura; NE: Nordeste.<br />

Na Tabela 2, as prevalências de déficits são analisadas de acordo<br />

com variáveis biológicas e condições de nascimento e de cuidados básicos<br />

de saúde na infância. São marcantes as diferenças de prevalências<br />

entre crianças nascidas <strong>em</strong> condições adequadas quando com<strong>para</strong>das<br />

às menos favorecidas. Para crianças nascidas com peso menor de 3 kg,<br />

mediana estimada na amostra, nota-se 18,1% de déficit de altura/idade,<br />

com<strong>para</strong>do com 7,4% <strong>para</strong> crianças nascidas <strong>em</strong> melhores condições<br />

nutricionais. Situação similar se observa <strong>para</strong> o índice de peso/idade,<br />

<strong>em</strong> que as mesmas prevalências nos grupos contrastantes de peso<br />

ao nascer são 14,3 e 4,6%, respectivamente. Esse padrão de diferenças<br />

se repete quando se observam atendimento e frequência aos exames<br />

pré-natal.


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

103<br />

TABELA 2 Prevalência de déficits antropométricos, segundo variáveis biológicas,<br />

de condições de nascimento e atenção básica à saúde<br />

VARIÁVEIS<br />

ALTURA/IDADE<br />

PESO/IDADE<br />

PESO/ALTURA<br />

(N = 316) 11,6%<br />

(N = 224) 8,1%<br />

(N = 55) 2%<br />

N % N % N %<br />

Sexo da criança 2.723<br />

Masculino 176 12,8 112 8,1 29 2,1<br />

F<strong>em</strong>inino 140 10,4 112 8,2 26 1,9<br />

Idade (anos) 2.723<br />

0 40 7,3 28 5 8 1,4<br />

1 84 14,6 60 10,4 22 3,8<br />

2 64 12 56 10,5 9 1,7<br />

3 65 12,7 40 7,8 6 1,2<br />

4 63 11,7 40 7,4 10 1,9<br />

Faixa etária 2.723<br />

0 a 5 meses 6 2,9 2 1 0 0<br />

6 a 11 meses 27 9,4 21 7,3 7 2,4<br />

12 a 35 meses 151 13,5 116 10,3 20 2,5<br />

Maiores de 36 meses 132 11,9 85 7,7 20 1,8<br />

Fez pré-natal 1.203<br />

Sim 116 10,4 81 7,2 28 2,5<br />

Não 13 17,3 10 13,3 1 1,3<br />

Consultas no pré-natal 955<br />

Até 4 consultas 29 12,3 27 11,2 7 2,9<br />

5 ou mais consultas 70 9,8 46 6,4 15 2,1<br />

Peso ao nascer 2.231<br />

Até 3 kg 136 18,1 108 14,3 23 3,1<br />

Acima de 3 kg 110 7,4 68 4,6 20 1,3<br />

T<strong>em</strong>po de aleitamento total 497<br />

Até 6 meses 33 13,3 20 8 4 1,6<br />

Acima de 6 meses 28 11,3 24 9,7 8 3,2<br />

(continua)


104<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

(continuação)<br />

T<strong>em</strong>po de aleitamento<br />

1.007<br />

exclusivo<br />

Até 3 meses 66 11,7 48 8,5 8 1,6<br />

Acima de 3 meses 43 9,7 33 7,4 12 2,7<br />

Número de refeições<br />

De 0 a 2 anos 1.824<br />

Até 3 refeições 65 17,8 54 14,8 17 4,7<br />

Mais de 3 refeições 164 11,2 105 7,2 25 1,7<br />

De 3 a 11 anos 2.312<br />

Até 3 refeições 129 15,6 100 12,1 23 2,8<br />

Mais de 3 154 10,4 99 6,7 21 1,4<br />

Acima de 11 anos 2.473<br />

Até 3 refeições 212 13,6 139 8,9 32 2,1<br />

Mais de 3 82 9 64 7 18 1,9<br />

Analisando-se a situação nutricional <strong>em</strong> vista de fatores socioeconômicos,<br />

constata-se, mais uma vez, que a população menos favorecida<br />

é a que apresenta as maiores prevalências de déficits (Tabela 3). Segundo<br />

classificação <strong>para</strong> nível socioeconômico pelo critério da Associação<br />

Brasileira dos Institutos de Pesquisa de Mercado (Abip<strong>em</strong>e) 8 , observa-<br />

-se que as prevalências são cerca de 3 vezes maiores no nível E, <strong>em</strong> com<strong>para</strong>ção<br />

com os d<strong>em</strong>ais níveis. Ex<strong>em</strong>plificando, a prevalência de retardo<br />

de crescimento na classe E é estimada <strong>em</strong> 15,6%, enquanto <strong>para</strong> a classe<br />

D é de 5,6%. A maior concentração da população no nível mais baixo<br />

poderia levar à estimativa das prevalências subestimadas <strong>para</strong> os níveis<br />

socioeconômicos mais altos. No entanto, quando se analisam as d<strong>em</strong>ais<br />

associações com variáveis de condições de moradia, saneamento e alimentação,<br />

essa relação se mantém. As prevalências dos déficits são s<strong>em</strong>pre<br />

maiores <strong>para</strong> a população residente <strong>em</strong> domicílios s<strong>em</strong> luz, com esgoto<br />

a céu aberto e s<strong>em</strong> rede pública de abastecimento de água.


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

105<br />

TABELA 3 Prevalência de déficits antropométricos, segundo variáveis<br />

sociod<strong>em</strong>ográficas<br />

VARIÁVEIS N = 2.723 ALTURA/IDADE<br />

Sexo do chefe da família 2.715<br />

(N = 316) 11,6%<br />

PESO/IDADE<br />

(N = 224) 8,1%<br />

PESO/ALTURA<br />

(N = 55) 2%<br />

Masculino 90 12,5 161 8,5 11 1,5<br />

F<strong>em</strong>inino 226 11,3 161 8 44 2,2<br />

T<strong>em</strong>po de escolaridade<br />

do chefe da família<br />

Até 4 anos 220 13,1 160 9,6 40 2,4<br />

Mais de 4 anos 86 8,9 56 5,8 13 1,4<br />

T<strong>em</strong>po de escolaridade<br />

2.369<br />

2.289<br />

da mãe<br />

Até 4 anos 167 13,7 125 10,3 33 2,7<br />

Mais de 4 anos 101 8,8 67 5,8 16 1,4<br />

Classificação<br />

(Abip<strong>em</strong>e) 8<br />

socioeconômica<br />

B + C 14 7,2 9 4,6 3 1,6<br />

D 42 5,6 26 3,5 9 1,2<br />

E 242 14,9 178 10,9 39 2,4<br />

Luz no domicílio 2.698<br />

Sim 228 10,6 153 7 37 1,7<br />

Não 85 15,4 69 12,5 17 3,1<br />

Tipo de esgoto sanitário<br />

2.715<br />

da casa<br />

Rede pública 3 3,3 3 3,3 2 2,2<br />

Fossa séptica 55 7,4 39 5,1 11 1,6<br />

Fossa rudimentar 92 15,8 66 11,2 13 2,2<br />

Vala/céu aberto 162 12,7 116 9,1 29 2,3<br />

Não sabe 3 18,8 0 0 0 0<br />

(continua)


106<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

(continuação)<br />

Fonte de água que a<br />

2.714<br />

criança utiliza <strong>para</strong><br />

beber<br />

Rede pública 78 10,2 53 6,9 15 1,9<br />

Poço/cacimba/barreiro 143 13,7 100 9,6 18 1,7<br />

Cisterna/água da chuva 23 13,1 13 7,8 4 2,4<br />

Outros 71 9,7 58 7,9 18 2,5<br />

A água de beber da<br />

2.691<br />

criança é tratada no<br />

domicílio?<br />

Sim 183 10,6 134 7,7 44 2,5<br />

Não 130 13,6 88 9,1 12 1,2<br />

Não sabe 1 11,1 1 11,1 0 0<br />

Tratamento da água de<br />

2.697<br />

beber da criança<br />

Filtrada 72 9,2 64 8,1 25 3,2<br />

Clorada/hipoclorito 87 11,6 56 7,5 16 2,1<br />

Fervida 28 14,1 16 8,1 4 2<br />

Não se aplica 131 13,2 88 8,8 11 1,1<br />

DISCUSSÃO E CONSIDERAÇÕES FINAIS<br />

Embora limitado, como todo inquérito transversal, a Chamada Nutricional<br />

Quilombola é a linha de base a partir da qual deve ser construído<br />

o conhecimento sobre as condições de nutrição e saúde das crianças<br />

quilombolas. Com a repetição periódica desse estudo, pod<strong>em</strong> ser<br />

definidas tendências dos desvios nutricionais e estimadas efetividades<br />

de políticas e programas. Tais melhorias dev<strong>em</strong> ocorrer não só a partir<br />

de recursos externos às comunidades, mas também potencializando<br />

competências e recursos locais na construção de grupamentos sociais<br />

autossustentáveis.


I JORNADA DE ANTROPOMETRIA E SUAS BASES CONCEITUAIS<br />

107<br />

Os indicadores antropométricos não traduz<strong>em</strong> somente as condições<br />

de nutrição da população infantil, são também indicadores relevantes<br />

do desenvolvimento humano de um grupamento populacional.<br />

Em especial, o retardo no crescimento é bastante sensível a melhorias<br />

das condições de vida e pode ser um importante indicador das melhorias<br />

ocorridas entre essas populações nos próximos anos.<br />

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />

1. Hamill PV, Drizd TA, Johnson CL, Reed RB, Roche AF. NCHS growth curves<br />

for children birth-18 years. Vital Health Stat 11 1977; 165:i-iv,1-74.<br />

2. World Health Organization. Anthro 2005, Beta version Feb 17th, 2006: Software<br />

for assessing growth and development of the world’s children. Genebra:<br />

WHO, 2006a. Disponível <strong>em</strong>: http://www.who.int/childgrowth/software/en/.<br />

3. World Health Organization. Multicentre Growth Reference Study Group. Enrolment<br />

and baseline characteristics in the WHO Multicentre Growth Reference<br />

Study. Acta Paediatrica Suppl<strong>em</strong>entum 2006b; 450:7-15.<br />

4. WHO. Physical Status: The use and interpretation of anthropometry. Report<br />

of a WHO Expert Committee. (WHO technical report series, 854.) Genebra:<br />

WHO, 1995.<br />

5. Oliveira O, Taddei JAAC. Efeito dos vieses de sobrevivência nas prevalências da<br />

desnutrição <strong>em</strong> crianças no sexto ano de vida. Brasil PNSN, 1989. Cad Saúde<br />

Pública 1998; 14(3):493-9.<br />

6. Boerma JT, Sommerfeld AE, Bicego GT. Child anthropometry in cross-sectional<br />

surveys in developing countries: an assessment of the survivor bias. Amer J<br />

Epid<strong>em</strong>iol 1992; 135:438-49.<br />

7. B<strong>em</strong>fam – Sociedade Civil B<strong>em</strong>-Estar Familiar no Brasil. PNDS: Pesquisa Nacional<br />

sobre D<strong>em</strong>ografia e Saúde. Rio de Janeiro: B<strong>em</strong>fam, 1996.<br />

8. Associação Brasileira de Empresas de Pesquisas. Critério de Classificação Econômica<br />

Brasil. São Paulo, 2003. Disponível <strong>em</strong>: http://www.abep.org. Acessado<br />

<strong>em</strong>: 1/1/2007.


II JORNADA DE PROPAGANDA<br />

DE ALIMENTOS E OBESIDADE NA<br />

INFÂNCIA E NA ADOLESCÊNCIA<br />

26 de março de 2008<br />

Teatro Marcos Lindenberg – <strong>Unifesp</strong>


A EPIDEMIA DA OBESIDADE<br />

E A PUBLICIDADE DE ALIMENTOS<br />

José Augusto de A. C. Taddei<br />

Giovana Longo-Silva<br />

Maysa Helena de Aguiar Toloni<br />

PERFIL NUTRICIONAL BRASILEIRO<br />

Com o advento da industrialização, mudanças significativas ocorreram<br />

nos mais diversos segmentos da economia mundial, no estilo de vida e<br />

nos hábitos alimentares da população. 1<br />

A sociedade cont<strong>em</strong>porânea converge <strong>para</strong> um padrão dietético caracterizado<br />

por alimentos de alta densidade energética com altos teores<br />

de sal, gorduras totais, colesterol, carboidratos refinados e baixos teores<br />

de ácidos graxos insaturados e fibras. Tais mudanças alimentares, aliadas<br />

à rotina de vida sedentária e à falta de t<strong>em</strong>po <strong>para</strong> preparo e consumo<br />

de refeições, levando ao aumento do consumo de produtos industrializados,<br />

resultam no crescimento da obesidade e no aparecimento<br />

cada vez mais precoce de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT). 2<br />

Decorrente da falta de t<strong>em</strong>po e do aumento da participação f<strong>em</strong>inina<br />

no mercado de trabalho, a alimentação realizada fora de casa (bares, restaurantes,<br />

redes de fast-food e vendedores ambulantes) teve um importante<br />

crescimento, representando, atualmente, 25% dos gastos totais das<br />

famílias com alimentação. Como consequência, o número de restaurantes<br />

no Brasil saltou de 320 mil, <strong>em</strong> 1980, <strong>para</strong> 817 mil, <strong>em</strong> 2000. 1


112<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

Concomitant<strong>em</strong>ente a essas mudanças, a sociedade cont<strong>em</strong>porânea<br />

caracteriza-se pela redução da prática de atividade física espontânea,<br />

denominada como toda e qualquer movimentação corporal que<br />

promova gasto energético, o que t<strong>em</strong> sido intensamente reduzido com<br />

o aumento das atividades de lazer passivas, caracterizadas pela substituição<br />

das brincadeiras ativas, como jogar bola, <strong>em</strong>pinar pipa e correr,<br />

por jogos eletrônicos. 3<br />

Esse contexto resulta na elevação das prevalências de sobrepeso<br />

e obesidade, fatores de risco importantes <strong>para</strong> a ocorrência de DCNT,<br />

como d<strong>em</strong>onstra a Figura 1, que reflete a tendência da prevalência de excesso<br />

de peso <strong>em</strong> crianças menores de 5 anos, adolescentes e adultos, e<br />

a estimativa de prevalência <strong>para</strong> o ano de 2016, caso a velocidade de aumento<br />

do excesso de peso permaneça constante. 4-7<br />

FIGURA 1 Tendência secular da prevalência (%) de excesso de peso <strong>em</strong> menores de<br />

5 anos de idade, adolescentes e adultos.<br />

16,6<br />

5,7<br />

4,4<br />

4,4<br />

9,6<br />

7,6<br />

5,3<br />

13,9<br />

10,7<br />

7,3<br />

15,2<br />

13<br />

7,8<br />

14,6<br />

8,3<br />

Menores de<br />

cinco anos<br />

Adolescentes<br />

Adultos<br />

1974 1989 1996 2006 2016<br />

Fonte: IBGE, 1978 4 ; IBGE, 1989 5 ; IBGE, 1999 6 ; PNDS, 2006. 7


II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />

113<br />

Portanto, entre as crianças menores de 5 anos, houve o aumento<br />

de 4,4%, <strong>em</strong> 1974, <strong>para</strong> 7,8%, <strong>em</strong> 2006 e, se a progressão permanecer incessante,<br />

<strong>em</strong> 10 anos, essa proporção terá aumentado <strong>para</strong> 8,3%. Já entre<br />

os adolescentes, ocorreu aumento de 4,1% <strong>para</strong> 15,2% entre 1974 e 2006,<br />

estimando-se que <strong>em</strong> 2016 serão obesos 16,6% dos adolescentes no país.<br />

Para os adultos, observa-se aumento de 5,7%, <strong>em</strong> 1974, <strong>para</strong> 14,6%, <strong>em</strong><br />

2006, podendo-se atingir, caso esse valor se mantenha constante, 14,6%<br />

<strong>em</strong> 2016. Resumindo, <strong>em</strong> 2016, <strong>em</strong> torno de 1 <strong>em</strong> cada 10 crianças e 1 <strong>em</strong><br />

cada 7 adolescentes e adultos brasileiros serão obesos.<br />

As estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS) apontam<br />

que 48% dos anos potenciais de vida saudável perdidos (APVSP)<br />

ocorr<strong>em</strong> <strong>em</strong> consequência de doenças crônicas, como cardiovasculares,<br />

câncer e diabetes, 39% <strong>em</strong> consequência de doenças transmissíveis,<br />

condições maternas perinatais e deficiências nutricionais e 13% decorrente<br />

de acidentes e violência. 8<br />

As DCNT possu<strong>em</strong> algumas características peculiares: levam décadas<br />

<strong>para</strong> se estabelecer, tendo sua orig<strong>em</strong> na infância e na juventude;<br />

<strong>em</strong> virtude de sua longa duração, exist<strong>em</strong> muitas possibilidades <strong>para</strong><br />

prevenção; e o tratamento <strong>em</strong> geral é de longa duração, complexo e caro.<br />

A determinação das causas dessas enfermidades engloba fatores<br />

socioeconômicos, culturais, políticos e ambientais, como a globalização,<br />

a urbanização e o envelhecimento populacional, compostos por<br />

fatores de risco modificáveis, como dietas geradoras de doenças, inatividade<br />

física e tabagismo. Consequent<strong>em</strong>ente, t<strong>em</strong>-se hipertensão arterial,<br />

hiperglic<strong>em</strong>ia, dislipid<strong>em</strong>ia, sobrepeso e obesidade. Isso, por sua<br />

vez, leva ao aparecimento das DCNT, como doenças cardiovasculares,<br />

acidente vascular encefálico, câncer, doenças respiratórias crônicas e<br />

diabetes. 8<br />

Anualmente, o Sist<strong>em</strong>a Único de Saúde (SUS) gasta cerca de 1,2 bilhão<br />

de reais com tratamento do sobrepeso, obesidade e suas consequências.<br />

Tais gastos são decorrentes do aumento do consumo de medicamentos,<br />

dos procedimentos diagnósticos e das internações por obesidade mórbida,


114<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

hipertensão, acidente vascular encefálico, infarto do miocárdio, diabetes,<br />

câncer de cólon e colelitíase. 9<br />

No mundo, 7,1 milhões de pessoas morr<strong>em</strong> a cada ano <strong>em</strong> decorrência<br />

da hipertensão arterial; 2,6 milhões como consequência do sobrepeso<br />

e obesidade e 4,4 milhões <strong>em</strong> decorrência de níveis totais de colesterol<br />

elevados. No Brasil, as DCNT são causas de 32,2% das mortes.<br />

Essa realidade poderia ser revertida e controlada por meio da adoção de<br />

práticas alimentares saudáveis e redução do sedentarismo. 8<br />

Esses dados são mais uma evidência de que a sociedade cont<strong>em</strong>porânea,<br />

<strong>em</strong> decorrência da falta de t<strong>em</strong>po <strong>para</strong> o preparo de suas refeições,<br />

é tentada a adquirir alimentos prontos <strong>para</strong> o consumo disponibilizados<br />

pela indústria. 2,10 O cerne da questão é que a população os<br />

adquire <strong>em</strong> um contexto mercadológico, otimizado por propaganda<br />

ostensiva, <strong>em</strong> detrimento da saúde e da nutrição, prejudicadas pelo consumo<br />

excessivo e rotineiro desses alimentos. 3<br />

PUBLICIDADE DE ALIMENTOS<br />

A indústria alimentícia investe fort<strong>em</strong>ente na divulgação de produtos<br />

de alta densidade energética <strong>para</strong> crianças e adolescentes, que os incorporam<br />

<strong>em</strong> suas dietas e tend<strong>em</strong> a se manter como consumidores<br />

fiéis a esses hábitos de consumo por longos períodos, transmitindo-<br />

-os a seus filhos. Embora sejam alimentos potencialmente causadores<br />

de obesidade, esses produtos geralmente aparec<strong>em</strong> nas propagandas<br />

associados a saúde, beleza, b<strong>em</strong>-estar, juventude, energia e prazer.<br />

As crianças nascidas após os anos 1980 estão sendo progressivamente<br />

mais expostas aos efeitos nocivos da propaganda enganosa de alimentos<br />

que promov<strong>em</strong> hábitos alimentares obesogênicos, aumentando os<br />

riscos de desenvolvimento precoce das DCNT associadas à obesidade<br />

e ao sedentarismo. 3,11,12<br />

A exposição frequente às propagandas veiculadas na televisão<br />

exerce grande influência sobre os hábitos alimentares, além de promover<br />

o sedentarismo. Assistindo à televisão, uma criança pode aprender


II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />

115<br />

concepções incorretas sobre o que é um alimento saudável. O próprio hábito<br />

de assistir à televisão está diretamente relacionado a pedidos, compras<br />

e consumo de alimentos anunciados. Uma vez que a maioria dos alimentos<br />

anunciados possui elevados teores de gorduras, óleos, açúcares e<br />

sal, contribui <strong>para</strong> mudança nos hábitos alimentares de crianças e agrava<br />

o probl<strong>em</strong>a da obesidade na população. 13-15<br />

Há grande influência da propaganda, veiculada principalmente<br />

pela televisão, visto que os produtos industrializados são alvos de intensas<br />

campanhas publicitárias, além do forte investimento promocional<br />

que receb<strong>em</strong> nos pontos de comercialização. 3 Alguns estudos citam<br />

a influência da publicidade sobre a confiança que as mães depositam nos<br />

produtos apresentados nos comerciais, principalmente <strong>em</strong> razão da falta<br />

de conhecimento. Nesse contexto, Almeida et al. 13 avaliaram 1.395 anúncios<br />

de produtos alimentícios veiculados na televisão e descobriram que<br />

cerca de 60% estão no grupo da pirâmide alimentar representado por gorduras,<br />

óleos, açúcares e doces, além da ausência de publicidade <strong>para</strong> frutas<br />

e hortaliças.<br />

Estudo de 2007 desenvolvido pela Universidade Federal de São<br />

Paulo (<strong>Unifesp</strong>) analisou os comerciais veiculados <strong>em</strong> programação infantil<br />

de canais abertos da TV brasileira. Surpreendent<strong>em</strong>ente, os alimentos<br />

constituíram 10% de todas as propagandas veiculadas. A pesquisa<br />

verificou que, entre as propagandas de alimentos, cerca de 45%<br />

correspondiam a guloseimas (chocolates, bolachas recheadas, balas, gomas<br />

de mascar, salgadinhos e sorvetes), 22,5%, a institucionais (lanches<br />

de redes de fast-food), 18%, a bebidas não lácteas (refrigerantes, sucos),<br />

9%, a cereais (cereais matinais e pães), 4%, a bebidas lácteas (iogurtes,<br />

bebidas achocolatadas), 0,5%, a alimentos pré-pre<strong>para</strong>dos (macarrão<br />

instantâneo, hambúrgueres) e 1%, a outros. 16<br />

O Brasil é o recordista mundial na quantidade de horas que as<br />

crianças assist<strong>em</strong> à televisão por dia: 4 horas e 51 minutos. Essa quantidade<br />

é maior que a média norte-americana, e é ainda mais assustadora<br />

se for observado que 80% da programação a que assist<strong>em</strong> é formatada


116<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

<strong>para</strong> o público adulto. 17 Nesse sentido, parece evidente que a presença<br />

da televisão no cotidiano das crianças brasileiras t<strong>em</strong> substituído experiências<br />

importantes <strong>para</strong> seu desenvolvimento, como o fortalecimento<br />

dos laços familiares e a criação de vínculos sociais. Portanto, visando à<br />

reversão de tal quadro, é imprescindível a criação de ações que estimul<strong>em</strong><br />

uma dieta equilibrada <strong>para</strong> toda a família, associada a brincadeiras<br />

e atividades físicas, com estratégias de lazer atraentes e prazerosas <strong>em</strong><br />

substituição à televisão, ao computador e ao consumo de dietas pouco<br />

saudáveis. 13,18,19<br />

As crianças brasileiras receb<strong>em</strong>, <strong>em</strong> média, R$ 28,60 de mesada, o<br />

que, no universo infantil brasileiro, significa R$ 69.237.069,00, a cada<br />

mês. O mercado infantil, no ano de 2004, movimentou 5 bilhões de reais<br />

com consumo de fast-food e, <strong>em</strong> 2006, o mercado publicitário infantil<br />

investiu, só <strong>em</strong> produtos infantis, 209,7 milhões de reais. Em recente<br />

pesquisa, ao ser<strong>em</strong> perguntadas <strong>em</strong> que mais gastam seu dinheiro, as<br />

guloseimas foram citadas por 73% das crianças entrevistadas, os salgadinhos<br />

por 47%, os sorvetes por 44% e as bebidas por 29%, ou seja, <strong>para</strong><br />

o público infantil, alimentos e bebidas têm maior apelo do que até mesmo<br />

os brinquedos. 20<br />

Para documentar a hipótese de que são prevalentes os erros alimentares<br />

desde a infância, realizou-se um estudo transversal com 270<br />

crianças que frequentavam berçários de creches públicas do município<br />

de São Paulo. Constatou-se que aproximadamente 67% dos pais ofereceram<br />

alimentos industrializados ainda no primeiro ano de vida, sendo<br />

que foram os filhos de mães com baixa escolaridade, mais jovens e<br />

com menor renda os mais suscetíveis aos erros alimentares. A Tabela 1<br />

apresenta o número e a frequência acumulada (%) das crianças estudadas,<br />

segundo faixa etária de introdução dos alimentos industrializados<br />

e de consumo tradicional. Fica evidente que cerca de 3 <strong>em</strong> cada 4 crianças,<br />

ao completar<strong>em</strong> 12 meses, já haviam consumido todos os tipos de<br />

alimentos considerados. 21 Contudo, o consumo precoce desses alimentos<br />

contraria as normas do Ministério da Saúde. 22


II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />

117<br />

TABELA 1 Distribuição de crianças, segundo a introdução de alimentos industrializados e de uso tradicional e faixa etária<br />

IDADE DE INTRODUÇÃO<br />

0 a 3M 4 a 6M 7 a 9M 10 a 12M > 12M<br />

NÃO IN-<br />

TRODUZIU<br />

NÃO IN-<br />

FORMADO TOTAL<br />

N % N %* N %* N %* N %* N % N % N<br />

Gelatina 14 5,2 100 42,2 53 61,8 71 88,1 06 90,3 26 9,7 0 0 270<br />

Bala/pirulito, chocolate 05 1,9 32 13,8 49 32 114 74,2 28 84,8 42 15,6 0 0 270<br />

Macarrão instantâneo 06 2,2 58 23,7 54 43,7 92 77,8 14 83 45 16,6 01 0,4 270<br />

Salgadinhos 04 1,5 32 13,4 40 28,2 123 73,7 19 80,7 52 19,3 0 0 270<br />

Bolacha recheada 03 1,1 41 16,3 51 35,2 97 71,1 22 79,2 56 20,8 0 0 270<br />

Suco artificial 06 2,2 43 18,1 39 32,5 84 63,6 22 71,7 75 27,9 01 0,4 270<br />

Embutidos 01 0,4 26 10,1 22 18,2 108 58,2 24 67,1 89 32,9 0 0 270<br />

Refrigerante 03 1,1 30 12,2 20 19,6 99 56,5 28 66,7 89 32,9 01 0,4 270<br />

ALIMENTOS DE<br />

USO TRADICIONAL<br />

ALIMENTOS<br />

INDUSTRIALIZADOS<br />

Açúcar 84 31,1 87 63,3 23 71,8 41 87 08 90 27 10 0 0 270<br />

Chá 133 49,3 87 81,5 12 85,9 06 88,1 0 88,1 29 10,8 03 1,1 270<br />

Mel 49 18,2 90 51,5 24 60,4 36 73,7 08 76,7 60 22,2 03 1,1 270<br />

Espessantes 34 12,6 95 47,8 41 63 18 69,6 03 70,7 78 28,9 01 0,4 270<br />

Fritura de imersão 0 0 15 5,6 20 13 106 52,3 25 61,6 103 38 01 0,4 270<br />

Café 01 0,4 17 6,7 15 12,3 50 30,8 27 40,8 159 58,8 01 0,4 270<br />

*Percentual acumulado.<br />

Fonte: Toloni et al., 2011. 21


118<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

Hoje <strong>em</strong> dia, as crianças reconhec<strong>em</strong> melhor as marcas de salgadinhos<br />

do que os nomes das frutas. É o que mostra o documentário Criança,<br />

a alma do negócio, que propõe uma reflexão sobre como a sociedade<br />

de consumo e as mídias de massa influenciam na formação de crianças e<br />

adolescentes, além de mostrar a realidade atual, <strong>em</strong> que as crianças prefer<strong>em</strong><br />

ir ao shopping a brincar, conhec<strong>em</strong> marcas pelo logotipo e, apesar<br />

de ter<strong>em</strong> uma vasta coleção de brinquedos e jogos, encantam-se mais<br />

por um pequeno bonequinho de plástico que, na campanha promocional,<br />

é associado ao consumo de um alimento obesogênico. 23 Esse documentário<br />

reflete sobre essas questões e mostra como a criança se tornou<br />

a alma do negócio <strong>para</strong> a publicidade no Brasil. As crianças são bombardeadas<br />

por propagandas que estimulam o consumo e falam diretamente<br />

com elas dentro de suas próprias casas. O resultado é devastador e é<br />

cada vez mais comum ver crianças que, aos 5 anos, já vão à escola totalmente<br />

m<strong>aqui</strong>adas e que deixaram de brincar de correr por causa de seus<br />

saltos altos; que sab<strong>em</strong> as marcas de todos os celulares, mas não sab<strong>em</strong><br />

o que é uma minhoca; que reconhec<strong>em</strong> as marcas de todos os salgadinhos,<br />

mas não reconhec<strong>em</strong> frutas e hortaliças do cotidiano da alimentação<br />

do brasileiro, como mamão, cenoura e beterraba. 23<br />

O investimento do mercado publicitário de alimentos evidencia o<br />

poder desse setor. Em 2001, o orçamento publicitário das indústrias de<br />

alimentos mundial foi estimado <strong>em</strong> torno de 40 bilhões de dólares. No<br />

Brasil, <strong>em</strong> 2005, foram investidos cerca de 1 bilhão de reais. 24<br />

Os interesses mercantilistas saciam-se por meio de vultosos investimentos<br />

no marketing televisivo, um campo promissor e lucrativo, <strong>em</strong><br />

detrimento da saúde das crianças e dos adolescentes. Utilizando-se da<br />

mídia televisiva, o marketing alimentício t<strong>em</strong> como objetivo único ampliar<br />

suas vendas e garantir seu futuro mercado consumidor, introduzindo<br />

precoc<strong>em</strong>ente o <strong>para</strong>digma da sociedade de consumo de massa<br />

no público infantojuvenil. 25<br />

Diante das mudanças no perfil epid<strong>em</strong>iológico atual da população<br />

brasileira, b<strong>em</strong> como no padrão alimentar, com preocupantes reflexos


II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />

119<br />

na população infantil, sugere-se a criação de medidas factíveis de promoção<br />

da alimentação saudável no ambiente familiar e escolar, considerando<br />

os valores sociais, econômicos e culturais envolvidos nos diferentes<br />

contextos.<br />

Por meio da brincadeira, pod<strong>em</strong> ser incutidos no público infantil<br />

conhecimentos nutricionais e relacionados a uma dieta alimentar saudável.<br />

Ex<strong>em</strong>plo disso é o jogo Prato Feito, desenvolvido pela <strong>Unifesp</strong>,<br />

<strong>para</strong> ensinar crianças acima de 7 anos de idade a fazer<strong>em</strong> uma alimentação<br />

equilibrada e montar<strong>em</strong> refeições diversificadas e apetitosas. Brincando<br />

com os grupos alimentares (energéticos, reguladores e construtores),<br />

elas aprend<strong>em</strong> a identificar os nutrientes de cada alimento e a<br />

substituí-los por outros, que tenham a mesma propriedade nutricional.<br />

Vence o jogo o participante que montar primeiro o seu prato com itens<br />

de todos os grupos da pirâmide e completar o caminho do tabuleiro. 26<br />

O PAPEL DA ROTULAGEM NUTRICIONAL NA ADOÇÃO<br />

DE HÁBITOS ALIMENTARES SAUDÁVEIS<br />

Grande parte dos estudos e pesquisas que envolv<strong>em</strong> a área de nutrição<br />

e suas relações com estratégias <strong>para</strong> redução dos riscos de doenças destaca<br />

a importância do adequado conhecimento da rotulag<strong>em</strong> nutricional<br />

dos alimentos <strong>para</strong> a promoção da alimentação saudável. Considera-<br />

-se que o adequado conhecimento da rotulag<strong>em</strong> pode funcionar como<br />

um instrumento na educação do consumidor a respeito das relações entre<br />

nutrição e saúde, visando a capacitá-lo a fazer escolhas alimentares<br />

mais saudáveis. 27-29<br />

O uso da informação nutricional obrigatória nos rótulos de alimentos<br />

e bebidas produzidos, comercializados e <strong>em</strong>balados na ausência<br />

do cliente e prontos <strong>para</strong> ser<strong>em</strong> oferecidos ao consumidor está regulamentado<br />

no Brasil desde 2001. 30,31 Apesar do indiscutível benefício<br />

dessa normatização, estudos com o objetivo de verificar o grau de conhecimento<br />

da população sobre nutrição e comportamento do consumidor<br />

diante da utilização de rótulos de alimentos não são animadores.


120<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

De acordo com o Inquérito Domiciliar sobre Comportamentos de Risco<br />

e Morbidade Referida de Doenças e Agravos não Transmissíveis realizado<br />

<strong>em</strong> 14 capitais e no Distrito Federal, no Brasil, apenas 44% da população<br />

consulta o rótulo nutricional, sendo esse grupo predominant<strong>em</strong>ente<br />

constituído pelo sexo f<strong>em</strong>inino, com idades entre 15 e 24 anos e com<br />

grau de ensino fundamental <strong>completo</strong> ou superior. 32<br />

A não utilização da rotulag<strong>em</strong> nutricional e sua interpretação incorreta<br />

estão associadas a diversos fatores, destacando-se falta de t<strong>em</strong>po,<br />

insuficiência de conhecimentos sobre nutrição e falta de habilidades<br />

mat<strong>em</strong>áticas dos consumidores, que têm limitações <strong>para</strong> utilizar as informações<br />

expostas, constituindo, assim, uma barreira <strong>para</strong> melhores<br />

escolhas alimentares. 33<br />

Tendo <strong>em</strong> vista que <strong>para</strong> muitos compradores a informação contida<br />

nos rótulos é excessivamente técnica e pouco clara, foi criada no Reino<br />

Unido, pela Food Standards Agency (FSA), uma proposta simples e<br />

intuitiva <strong>para</strong> orientar o consumidor na escolha de produtos mais saudáveis.<br />

34 Essa ferramenta, que já se expandiu <strong>para</strong> outros países da Europa,<br />

é o Traffic Light Labelling, ou S<strong>em</strong>áforo Nutricional, que fornece<br />

subsídios <strong>para</strong> que se acrescent<strong>em</strong> nos rótulos informações diretas e<br />

práticas sobre a composição nutricional do alimento, tornando a compreensão<br />

mais acessível a leigos e crianças, direcionando-os <strong>para</strong> dietas<br />

mais equilibradas.<br />

O S<strong>em</strong>áforo Nutricional baseia-se nas cores do s<strong>em</strong>áforo, analisando<br />

se<strong>para</strong>damente a concentração de gorduras, gorduras saturadas, açúcares<br />

e sal correspondente a 100 g ou 100 mL de cada produto. Dessa<br />

forma, o sinal vermelho indica que o nutriente está presente <strong>em</strong> quantidade<br />

excessiva, o sinal amarelo indica média quantidade, e o verde, pouca<br />

quantidade. 34 O consumidor é orientado, caso consuma um alimento<br />

com sinal vermelho <strong>para</strong> um nutriente específico, a consumir outro com<br />

sinal verde <strong>para</strong> o mesmo nutriente.<br />

A FSA recomenda a utilização dessa metodologia <strong>em</strong> produtos processados<br />

de conveniência, como refeições prontas, pizzas, hambúrgueres,


II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />

121<br />

sanduíches, salsichas e cereais matinais, uma vez que seus conteúdos<br />

nutricionais são de difícil compreensão pelos consumidores. O s<strong>em</strong>áforo<br />

deve estar preferencialmente na parte frontal da <strong>em</strong>balag<strong>em</strong> do produto,<br />

de modo a facilitar a visualização pelo consumidor. 34<br />

Com o objetivo de identificar a compreensão da rotulag<strong>em</strong> nutricional<br />

pelos consumidores, foi conduzida uma pesquisa no Reino Unido com<br />

2.932 consumidores, na qual se constatou que a interpretação da rotulag<strong>em</strong><br />

nutricional foi favorecida pelo Traffic Light Labelling (71% de compreensão),<br />

quando com<strong>para</strong>da à rotulag<strong>em</strong> tradicional (58% de compreensão). Outra<br />

pesquisa, realizada na Austrália com 790 consumidores de todas as classes<br />

socioeconômicas, apontou que 81% dos entrevistados foram capazes de<br />

escolher corretamente os alimentos mais saudáveis e com<strong>para</strong>r, de forma<br />

rápida, dois produtos, utilizando o Traffic Light Labelling. Houve diferença<br />

estatisticamente significativa entre o des<strong>em</strong>penho observado no uso do<br />

S<strong>em</strong>áforo e da rotulag<strong>em</strong> nutricional tradicional. 35<br />

Diante do exposto e visando a difundir os benefícios do S<strong>em</strong>áforo<br />

Nutricional <strong>para</strong> a população brasileira, os autores deste capítulo adaptaram<br />

o Traffic Light Labelling às normas vigentes no Brasil e à classificação<br />

de produtos industrializados comercializados no país (Tabela 2). 27,28<br />

TABELA 2 Pontos de corte <strong>para</strong> a classificação de 100 g ou 100 mL dos alimentos,<br />

segundo a adaptação do S<strong>em</strong>áforo Nutricional às normas brasileiras<br />

NUTRIENTE VERDE AMARELO VERMELHO<br />

SÓLIDO LÍQUIDO SÓLIDO LÍQUIDO SÓLIDO LÍQUIDO<br />

Gordura ≤ 3 ≤ 1,5 > 3 e ≤ 20 > 1,5 e ≤ 10 > 20 > 10<br />

total (g) 31,34<br />

Gordura ≤ 1,5 ≤ 0,75 > 1,5 e ≤ 5 > 0,75 e<br />

saturada (g) 31,34 ≤ 2,5<br />

> 5 > 2,5<br />

Gordura<br />

0 0 > 0 e ≤ 1 > 0 e ≤ 1 > 1 > 1<br />

trans (g) 31<br />

(continua)


122<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

(continuação)<br />

Sódio (mg) 31 ≤ 40 ≤ 40 > 40 e ≤ 120 > 40 e ≤ 120 > 120 > 120<br />

Fibra (g) 31 ≥ 6 ≥ 3 ≥ 3 e < 6 ≥ 1,5 e < 3 < 3 < 1,5<br />

Açúcar (g) 31,34 ≤ 5 ≤ 2,5 > 5 e ≤ 12,5 > 2,5 e ≤ 6,3 > 12,5 > 6,3<br />

Fonte: ANVISA, 2003 31 ; FSA, 2007. 34<br />

Com base nos pontos de corte utilizados no país, foram classificados<br />

100 produtos industrializados, os quais foram selecionados da página<br />

eletrônica de um hipermercado brasileiro, optando-se, <strong>para</strong> cada categoria<br />

(salgadinhos de pacote, cereais matinais, <strong>em</strong>butidos, maionese,<br />

cereais <strong>em</strong> barra, bebidas artificiais, queijos, pizzas prontas congeladas,<br />

tortas salgadas prontas congeladas, hambúrgueres congelados, biscoitos<br />

doces, molhos de tomate, pó <strong>para</strong> misturar no leite, refeições prontas<br />

congeladas, tortas doces congeladas e produtos lácteos), pelos primeiros<br />

5 a 8 produtos listados na página. O resultado dessa classificação<br />

encontra-se na Figura 2 e reflete a situação de inadequação nutricional<br />

dos alimentos industrializados, quadro preocupante se considerado que<br />

os estudos têm d<strong>em</strong>onstrado aumento contínuo no consumo desses alimentos<br />

no país. 36<br />

Em relação aos resultados dessa classificação <strong>para</strong> gordura trans,<br />

vale salientar que, de acordo com o Regulamento Técnico sobre Rotulag<strong>em</strong><br />

Nutricional de Alimentos Embalados 37 , a informação de um nutriente<br />

pode ser expressa <strong>em</strong> “0” (zero) ou “não contém” quando o alimento<br />

contiver quantidades menores ou iguais às estabelecidas como<br />

não significativas. Assim, caso uma porção do alimento contenha quantidades<br />

iguais ou inferiores a 0,2 g de gordura trans, o fabricante pode<br />

omiti-la. Conclui-se, portanto, que os resultados da análise desse nutriente<br />

<strong>aqui</strong> apresentados pod<strong>em</strong> não retratar a realidade, de modo que,<br />

<strong>em</strong> 100 g do alimento pode haver quantidade superior à reconhecida<br />

pela rotulag<strong>em</strong> nutricional, que muitas vezes se refere a quantidades<br />

bastante inferiores a 100 g.


II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />

123<br />

FIGURA 2 Classificação dos 100 produtos industrializados disponíveis no mercado<br />

brasileiro, segundo a adaptação do S<strong>em</strong>áforo Nutricional às normas brasileiras.<br />

20<br />

28<br />

11<br />

13<br />

12<br />

11<br />

86<br />

57<br />

40<br />

76 77<br />

Verde<br />

Amarelo<br />

Vermelho<br />

23 32<br />

Gordura<br />

total<br />

Gordura<br />

saturada<br />

9<br />

5<br />

Gordura<br />

trans<br />

Fibra<br />

alimentar<br />

Sódio<br />

Obs.: As quantidades de açúcar não foram classificadas, pois, segundo norma da Anvisa, não são informadas<br />

no rótulo nutricional.<br />

As barras pod<strong>em</strong> ser lidas como percentuais, uma vez que se trata de 100 alimentos.<br />

Fonte: Ministério da Saúde, 2008. 7<br />

Fonte: Longo-Silva et al., 2010. 27<br />

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PORTAL ESTILO DE VIDA<br />

SAUDÁVEL: UMA FERRAMENTA<br />

PARA O CONTROLE DAS DOENÇAS<br />

CRÔNICAS NÃO TRANSMISSÍVEIS<br />

Kelly de Jesus Viana<br />

Sarah Warkentin<br />

Anna Helena Pedreira de Freitas<br />

José Augusto de A. C. Taddei<br />

Desde a década de 1960, observam-se inúmeras mudanças no padrão de<br />

alimentação e atividade física da população, tendo ocorrido processos de<br />

transição epid<strong>em</strong>iológicos, d<strong>em</strong>ográficos e nutricionais. Houve queda da<br />

mortalidade, com aumento do número de idosos. De 1980 a 2000, a população<br />

de idosos aumentou <strong>em</strong> 107%, enquanto os menores de 14 anos<br />

aumentaram apenas 14%. Esse crescimento do número de idosos, por<br />

sua vez, está relacionado com o aumento da incidência e prevalência de<br />

doenças crônicas não transmissíveis (DCNT). 1<br />

As alterações no estilo de vida que ocorreram na população acarretaram<br />

aumento progressivo das taxas de sobrepeso e obesidade, com<br />

consequente crescimento das DCNT. Tais doenças são consideradas<br />

uma ameaça que aflige um número cada vez maior de pessoas, famílias<br />

e comunidades, sendo responsáveis por 60% das mortes que ocorr<strong>em</strong><br />

no mundo. As doenças crônicas inclu<strong>em</strong> doenças cardiovasculares,<br />

alguns tipos de câncer, doenças respiratórias crônicas e diabetes. 2,3<br />

Geralmente, essas doenças não têm cura, porque as lesões causadas são


130<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

irreversíveis, levando a complicações e morte. As principais complicações<br />

são as do aparelho circulatório (hipertensão, infarto do miocárdio,<br />

acidente vascular encefálico, etc.), os diversos tipos de câncer, diabetes,<br />

doenças pulmonares obstrutivas crônicas (enfis<strong>em</strong>a e bronquite crônica)<br />

e doenças osteoarticulares (osteoporose e artrose). Pequena parte<br />

dessas doenças (20%) está associada a predisposição genética ou alteração<br />

orgânica de nascimento. Na maioria das vezes, essas doenças são<br />

consequência do estilo de vida dos indivíduos. 4<br />

Dos 58 milhões de óbitos ocorridos mundialmente <strong>em</strong> 2005, aproximadamente<br />

35 milhões foram causados por DCNT. 2,3 Oitenta por cento<br />

das mortes por DCNT ocorr<strong>em</strong> nos países de baixa e média renda,<br />

onde vive a maioria da população do mundo, e apenas 20% das mortes<br />

por doenças crônicas acontec<strong>em</strong> <strong>em</strong> países de alta renda. A grande<br />

maioria dos óbitos causados por doenças crônicas <strong>em</strong> todas as idades,<br />

<strong>em</strong> homens e mulheres, e <strong>em</strong> todas as partes do mundo é <strong>em</strong> razão dos<br />

fatores de risco comuns e modificáveis, incluindo dietas não saudáveis,<br />

sedentarismo e tabagismo. 2,3<br />

Estilos de vida inadequados que expõ<strong>em</strong> crianças e adolescentes a<br />

riscos cumulativos desde o nascimento pod<strong>em</strong> conduzir a importantes<br />

condições clínicas, representadas pelas DCNT. Elas compõ<strong>em</strong> um conjunto<br />

de enfermidades que se caracterizam por apresentar longo período<br />

de latência, t<strong>em</strong>po de evolução prolongado, etiologia não totalmente elucidada,<br />

lesões irreversíveis e complicações que acarretam graus variáveis<br />

de incapacidade ou óbito precoces. As DCNT foram responsáveis, <strong>em</strong><br />

2003, por quase 50 óbitos/100.000 habitantes no Brasil, figurando como<br />

a principal causa de morte da população. 5<br />

A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios de 2008 (PNAD<br />

2008), realizada pelo Ministério da Saúde, mostrou que 31,3% dos indivíduos<br />

avaliados informaram apresentar pelo menos uma DCNT e 5,9%<br />

afirmaram ter três ou mais DCNT. O percentual de pessoas que sofr<strong>em</strong><br />

de DCNT foi maior entre as mulheres (35,2%) do que entre os homens<br />

(27,2%), ocorrendo aumento desses agravos com o avanço da idade. A


II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />

131<br />

pesquisa, que também abordou a prática de atividade física, destaca que<br />

20% da população maior de 14 anos de idade não realizava qualquer tipo<br />

de atividade física. O sedentarismo foi maior entre os homens (25%), enquanto<br />

14,9% das mulheres se declararam sedentárias. O maior percentual<br />

de inatividade física foi encontrado entre pessoas acima de 65 anos<br />

(38,1%). Somente 10,2% da população foi considerada ativa segundo a definição<br />

de fisicamente ativo da Organização Mundial da Saúde (OMS).<br />

Os fatores de risco <strong>para</strong> o aparecimento de DCNT são classificados<br />

como modificáveis e não modificáveis. Entre os modificáveis, estão<br />

a hipertensão arterial, a ingestão de álcool exagerada, a hiperglic<strong>em</strong>ia, o<br />

tabagismo, o sedentarismo, o estresse, a obesidade e o colesterol elevado.<br />

Entre os fatores não modificáveis, destacam-se idade, hereditariedade,<br />

raça e sexo. 6<br />

A prevenção e o retardo no aparecimento das enfermidades crônico-degenerativas<br />

pod<strong>em</strong> ocorrer precoc<strong>em</strong>ente, antes mesmo de se<br />

manifestar<strong>em</strong> clinicamente. Segundo o modelo explicativo do processo<br />

saúde-doença, descrito por Leavell e Clark 8 , ações intervencionistas<br />

direcionadas a tais enfermidades dev<strong>em</strong> ocorrer ainda no primeiro nível<br />

da fase de prevenção primária (período pré-patogênico). Esse nível<br />

de prevenção diz respeito à promoção de saúde, conceito que envolve a<br />

ideia de fortalecimento individual e coletivo <strong>para</strong> lidar com a multiplicidade<br />

dos condicionantes da saúde. 7<br />

A partir de meados de 1970, ocorreu a reconstrução do conceito<br />

de promoção da saúde, por meio de inúmeras conferências internacionais.<br />

Tal conceito representava uma reação à acentuada medicalização<br />

da vida social, que t<strong>em</strong> tido baixo impacto na melhoria das condições<br />

de vida. A promoção da saúde deixou de ser interpretada como simples<br />

caracterização de um nível de atenção da medicina preventiva, conforme<br />

o modelo proposto por Leavell e Clark. 8 Agora, é tratada a partir de<br />

enfoque político e técnico <strong>em</strong> torno do processo saúde-doença-cuidado.<br />

Não obstante, mudanças culturais pressupõ<strong>em</strong> processo de aprendizado<br />

contínuo, enfocando as diversas fases da vida. Nesse contexto,


132<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

sobrevém o papel dos diversos ambientes sociais, como escolas, domicílios,<br />

locais de trabalho e comunitários. Tais espaços dev<strong>em</strong> ser utilizados<br />

<strong>para</strong> a promoção de ações organizadas e conduzidas por organizações<br />

educacionais, profissionais, comerciais e voluntárias, b<strong>em</strong> como pelas<br />

instituições governamentais, conforme proposto na Carta de Ottawa. 9<br />

Assim, a promoção de estilos de vida saudáveis, incluindo hábitos<br />

alimentares e atividade física, pode e deve ter função pedagógica <strong>em</strong><br />

diferentes veículos de comunicação. Afinal, eles não se reduz<strong>em</strong> apenas<br />

às questões nutricionais e de fisiologia do exercício – as formações<br />

dos hábitos alimentares e das práticas de atividade física compreend<strong>em</strong><br />

processos graduais, nos quais estão envolvidos valores culturais,<br />

sociais, afetivo-<strong>em</strong>ocionais e comportamentais. 10,11 Práticas educativas<br />

impl<strong>em</strong>entadas por equipes multidisciplinares que conscientiz<strong>em</strong> a população<br />

da importância da alimentação saudável e da prática regular de<br />

atividade física também dev<strong>em</strong> continuar sendo um dos componentes<br />

prioritários nas estratégias de Saúde Pública, a fim de deter o avanço da<br />

obesidade e DCNT no país.<br />

Diante dessa realidade e no contexto da sociedade cont<strong>em</strong>porânea,<br />

sobretudo com a difusão maciça dos sist<strong>em</strong>as midiáticos de utilização<br />

mundial (televisão e internet), observa-se que, se por um lado aumentou<br />

o número de programas e sites informativos sobre nutrição e alimentação,<br />

por outro t<strong>em</strong>-se o marketing alimentício nos mesmos veículos promovendo<br />

aumento da baixa qualidade nutricional dos alimentos na quase<br />

totalidade das situações. 12,13 Um estudo realizado por Pontes et al. 14<br />

analisou a qualidade nutricional dos alimentos veiculados na TV brasileira<br />

e constatou que as guloseimas representavam cerca de 45% das<br />

propagandas alimentícias, seguidas das redes de fast-food, com 23%.<br />

Os esforços de promoção da saúde que são mediados por computadores<br />

e outras tecnologias digitais, conhecidas como cibersaúde,<br />

pod<strong>em</strong> ter grande potencial <strong>para</strong> promover mudanças no comportamento<br />

por meio de características únicas da população geral, possibilitando<br />

interatividade e conveniência. Evidências indicam que o uso da


II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />

133<br />

cibersaúde pode melhorar os resultados comportamentais. No entanto,<br />

é preciso compreender se a cibersaúde será eficaz dentro da realidade<br />

social. 15<br />

Os meios de comunicação pod<strong>em</strong> ajudar com estratégias de saúde<br />

pública, mas, na maioria das vezes, influenciam negativamente o consumo<br />

de alimentos, já que os comercias com finalidade preponderant<strong>em</strong>ente<br />

financeira exerc<strong>em</strong> grande influência no hábito de consumo,<br />

principalmente das crianças. Das cinco horas de televisão que a criança<br />

assiste, uma hora é ocupada por comerciais. 16<br />

Atualmente, a internet é um dos meios de comunicação mais utilizado<br />

no mundo. A internet teve orig<strong>em</strong> <strong>em</strong> 1969, com o projeto do<br />

governo norte-americano, que tinha como objetivo interligar universidades<br />

e instituições de pesquisa e militares. Na década de 1970, a rede tinha<br />

poucos centros, mas o Protocolo NCP (Network Control Protocol)<br />

foi visto como inadequado, sendo criado o TCP/IP, que continua como<br />

o protocolo-base da internet. 17<br />

No início, a internet possuía poucos serviços, sendo o e-mail o serviço<br />

mais utilizado. Ao longo da década de 1980, foi sendo criada a internet<br />

que se conhece atualmente, <strong>em</strong> que diversas instituições dos Estados<br />

Unidos e de outros países se interligaram, criando uma grande rede, mas<br />

s<strong>em</strong> fim comercial. No início dos anos 1990, com a pressão <strong>para</strong> que <strong>em</strong>presas<br />

pudess<strong>em</strong> também participar da rede mundial, a internet foi aberta<br />

<strong>para</strong> uso comercial. Em 1991, Tim Berners-Lee lançou o World Wide Web<br />

(www), que foi a base <strong>para</strong> que Marc Andreesen criasse o Mosaic, base do<br />

que se t<strong>em</strong> do conceito da internet, <strong>para</strong> a Unix, <strong>em</strong> fevereiro de 1993 e <strong>em</strong><br />

agosto do mesmo ano, lançar a versão <strong>para</strong> o Windows. 17<br />

A internet chegou ao Brasil <strong>em</strong> 1991, pela Rede Nacional de Pesquisas,<br />

com o objetivo de atender à conexão das redes de universidades<br />

e centros de pesquisas. Em 1995, os Ministérios de Comunicações e de<br />

Ciência e Tecnologia abriram a internet <strong>para</strong> sua operação comercial.<br />

Ela continua sendo o principal serviço de conectividade cada vez mais<br />

presente nos dias atuais. 17


134<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

Dessa forma, o acesso à internet e seu aumento contínuo tornaram-se<br />

um modo viável <strong>para</strong> promover a saúde da população. Além de<br />

estar acessível 24 horas por dia, a internet oferece anonimato. 18<br />

Há evidência epid<strong>em</strong>iológica de que a adoção generalizada de mudanças<br />

específicas no comportamento pode melhorar significativamente<br />

a saúde da população. No entanto, os esforços da comunicação <strong>em</strong><br />

saúde, <strong>em</strong>bora b<strong>em</strong> intencionados, muitas vezes não envolv<strong>em</strong> as pessoas<br />

<strong>para</strong> mudar o comportamento dentro dos complexos contextos de<br />

suas vidas. 15<br />

O Portal Estilo de Vida Saudável, da Universidade Federal de São<br />

Paulo (<strong>Unifesp</strong>), cadastrado no endereço eletrônico www.saude.br, é de<br />

livre acesso a todos os usuários de internet e t<strong>em</strong> 11 parceiros institucionais;<br />

visa à construção e à diss<strong>em</strong>inação do conhecimento sobre estilo<br />

de vida saudável, sendo a primeira página eletrônica não comercial <strong>em</strong><br />

português que promove divulgação de informações, participação e interação<br />

dos usuários, sugestões de links, leitura de artigos científicos e<br />

divulgação de eventos relacionados com estilo de vida saudável. A proposta<br />

do Portal é ser uma fonte de construção de conhecimento, englobando<br />

as áreas de alimentação saudável e prática de atividade física,<br />

contribuindo <strong>para</strong> a prevenção de DCNT.<br />

O Portal Estilo de Vida Saudável foi disponibilizado <strong>para</strong> os usuários<br />

da internet <strong>em</strong> abril de 2008. Foi desenvolvido <strong>em</strong> linguag<strong>em</strong> HTML<br />

(http://www.w3c.org) e PHP (http://www.php.net/) e está hospedado <strong>em</strong><br />

um servidor Linux da rede <strong>Unifesp</strong>. Em 35 meses (até fevereiro de 2011),<br />

recebeu a média mensal de 142 acessos internos (rede <strong>Unifesp</strong>) e 1.817<br />

acessos externos.<br />

Cadastraram-se como m<strong>em</strong>bros da comunidade Estilo de Vida<br />

Saudável 810 usuários, com o seguinte perfil profissional: 34,8% são nutricionistas;<br />

13,7% profissionais da área da saúde; 16,4% profissionais que<br />

não são da área da saúde; 18,1% estudantes da área da saúde; 11,1%, estudantes<br />

de outras áreas; e 3,5% não informaram a profissão. São originários,<br />

<strong>em</strong> sua quase totalidade, da região Sudeste (75,1%) e 9 m<strong>em</strong>bros são


II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />

135<br />

do exterior (1,1%). De todos os m<strong>em</strong>bros cadastrados, 90,5% são do gênero<br />

f<strong>em</strong>inino e 61,7% têm idade inferior a 30 anos.<br />

Nesse período, foram publicados no site 107 matérias (atualidades<br />

e notícias) e 10 vídeos e também foram realizados diversos sorteios. A<br />

fim de incentivar o frequente acesso ao Portal Estilo de Vida Saudável,<br />

são enviados informativos mensais, com os principais t<strong>em</strong>as abordados<br />

no site no mês vigente. Todas essas estratégias foram adotadas visando<br />

a difundir conteúdos que estimul<strong>em</strong> o estilo de vida saudável e a promover<br />

a incorporação do maior número possível de participantes.<br />

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dados na internet] IDB – Indicadores e Dados Básicos – Brasil 2003. Indicadores<br />

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de 08 de maio de 2006. Disponível <strong>em</strong>: http://dtr2004.saude.gov.br/sas/legislacao/portaria1010_08_05_06.pdf.<br />

Acessado <strong>em</strong>: 12/2/2009.<br />

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II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />

137<br />

17. Halpern G. Comerciais veiculados <strong>em</strong> programação infanto-juvenil de canais<br />

abertos de TV e sua relação com escolha de alimentos <strong>em</strong> amostra de escolares.<br />

[Tese de Doutorado]. São Paulo: <strong>Unifesp</strong>, 2003.<br />

18. Leiner B. A brief history of the Internet. version 3.314. Disponível <strong>em</strong>: http://<br />

www.isoc.org/internet-history/brief.html#Introduction.


A MÍDIA E A ALIMENTAÇÃO<br />

INFANTIL<br />

Clóvis de Barros Filho<br />

Martin Fabius Alcover de Barros<br />

INTRODUÇÃO<br />

A mídia é t<strong>em</strong>a da agenda pública e questão política candente. Regulamentar<br />

a atuação de seus profissionais implica conhecer com alguma<br />

precisão tudo de mal que se pretende evitar, discernir a extensão dos<br />

efeitos sociais da mídia supostamente indesejáveis. O discurso sobre a<br />

mídia oscila entre a apologia ingênua e o denuncismo ressentido. 1 O que<br />

mais chama a atenção é que n<strong>em</strong> uns n<strong>em</strong> outros d<strong>em</strong>onstram saber ao<br />

certo até onde a mídia impacta a sociedade com suas mensagens.<br />

Na discussão sobre a regulamentação da atividade jornalística, a<br />

impl<strong>em</strong>entação de uma comissão reguladora enfrenta os arautos da liberdade<br />

de imprensa. No caso da publicidade, o discurso do campo<br />

parece legitimar a atuação de um mecanismo autorregulatório de sua<br />

produção. O Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária<br />

(Conar) estaria autorizado pelos agentes do campo a dar uma solução<br />

aos probl<strong>em</strong>as éticos da produção publicitária. Controlado por publicitários,<br />

o Conar decidiria, caso a caso, sobre o certo e o errado, o aceitável<br />

e o inaceitável, o dizível e o indizível nas mensagens publicitárias.


140<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

Cabe <strong>aqui</strong> uma advertência: a legitimidade de tal instituição junto<br />

aos agentes do campo pode autorizá-la a regulamentar relações e julgar<br />

conflitos entre esses agentes – questões internas, portanto. Todavia,<br />

as questões éticas mais graves envolvendo a prática publicitária não diz<strong>em</strong><br />

respeito a eventuais conflitos entre publicitários, porque a publicidade<br />

é a mensag<strong>em</strong> que atinge toda a sociedade. É com o corpo social<br />

global que o publicitário se relaciona prioritariamente; por isso, deixar<br />

aos publicitários a prerrogativa da decisão sobre os limites de sua própria<br />

atuação – na relação que mantêm com a sociedade como um todo –<br />

é desrespeitar o princípio da terceridade da justiça; é entregar as chaves<br />

do galinheiro à raposa; é presumir altruísmo e abnegação incompatíveis<br />

com o mundo da técnica, com a lógica do capital e com os rigores da<br />

competição no mercado <strong>para</strong> o qual trabalham. 2<br />

Este capítulo destaca alguns aportes científicos, apresentados no<br />

campo da comunicação, sobre os efeitos sociais da mídia – aportes que<br />

pretend<strong>em</strong> oferecer fundamento científico às reflexões sobre a eventual<br />

pertinência de um controle ou de regulamentação da atividade publicitária.<br />

RESPONSABILIDADE DA MÍDIA SOBRE O AGENDAMENTO<br />

Os meios de comunicação ag<strong>em</strong> sobre a sociedade, e o leitor sabe disso.<br />

O senso comum não se cansa de denunciar. As pessoas repet<strong>em</strong> expressões<br />

apreendidas da fala de alguma personag<strong>em</strong>, compram coisas sugeridas<br />

pela publicidade, discut<strong>em</strong> fatos noticiados pelo jornalismo, gastam<br />

t<strong>em</strong>po e energia <strong>para</strong> fundamentar suas opções de “paredão” <strong>em</strong><br />

reality shows e assim por diante.<br />

Ora, no momento de refletir sobre a mídia, nada mais normal que se parta<br />

do caso que se conhece melhor: o seu próprio. Seu apreço por Ana Maria<br />

Braga, Luciana Gimenez, Gugu, Chico Lang, Faustão, Galvão Bueno, Pedro Bial<br />

e outros ícones da telinha. Além da própria experiência, percebe-se que outras<br />

pessoas, com qu<strong>em</strong> se interage, fizeram o mesmo, acompanharam a mesma<br />

transmissão, os mesmos programas e as mesmas publicidades e, portanto,<br />

encontram-se aptas a conversar a respeito do mesmo cardápio t<strong>em</strong>ático.


II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />

141<br />

É possível constatar que essas conversas versam sobre notícias do<br />

Jornal Nacional, que o William Bonner abastece seus papos – esse é o<br />

seu caso particular. Outra coisa é aprender que, <strong>para</strong> além de tais conversas,<br />

na sociedade da qual se faz parte, os t<strong>em</strong>as mais tratados pelos<br />

meios de comunicação são, com recorrência, os mais discutidos pelas<br />

pessoas <strong>em</strong> geral: que os meios impactam a sociedade, que a maneira<br />

como isso acontece interessa aos cientistas, que muitas pesquisas pelo<br />

mundo procuram dar conta desses efeitos. 3<br />

Por ex<strong>em</strong>plo, pesquisas que relacionam o que é veiculado pelos<br />

meios e o que é discutido pela sociedade constataram que os assuntos<br />

mais presentes nos meios de comunicação também são os mais abordados<br />

nas conversas entre as pessoas. O professor Maxwell McCombs da<br />

Universidade do Texas nomeou essa relação de agenda setting. 4<br />

Essa denominação foi conservada <strong>em</strong> inglês <strong>em</strong> quase todos os países<br />

que estudam a mídia. Mas do que se trata exatamente? Afinal, que<br />

agenda é essa? O leitor, quando se fala <strong>em</strong> agenda, t<strong>em</strong> o direito de pensar<br />

<strong>em</strong> uma forma mais primitiva (<strong>em</strong> papel) ou mais atual (no computador)<br />

de registrar seus compromissos vindouros. Talvez também passe<br />

pela sua cabeça inscrever ordenadamente números de telefone, endereços<br />

e e-mails.<br />

Pois b<strong>em</strong>, a agenda de que se trata <strong>aqui</strong> é outra. Trata-se de um<br />

conjunto de t<strong>em</strong>as sobres os quais se conversa. Esses t<strong>em</strong>as, <strong>em</strong> inglês,<br />

são issues. Assim, a agenda da mídia é uma maneira pomposa de designar<br />

a reunião dos t<strong>em</strong>as abordados pelos meios de comunicação, e a<br />

agenda pública, por sua vez, refere-se aos t<strong>em</strong>as discutidos pelos agentes<br />

sociais fora dos meios de comunicação. 5<br />

Por ex<strong>em</strong>plo, não poderia haver estranheza se, na época da queda<br />

do avião da Air France – voo Rio-Paris –, um desconhecido propusesse<br />

um diálogo afirmando que não deve ser nada fácil passar 11 minutos <strong>em</strong><br />

queda livre dentro de um avião e, por fim, cair no oceano, de madrugada.<br />

E seria compreensível que alguém argumentasse, mesmo s<strong>em</strong> nunca<br />

ter visto aquele interlocutor, que muito provavelmente, no momento do


142<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

encontro com a água do oceano, todos já estivess<strong>em</strong> mortos ou inconscientes.<br />

Afinal, esse t<strong>em</strong>a, naquele momento, estava autorizado. Era conversável<br />

por qualquer um. Era, s<strong>em</strong> dúvida, um t<strong>em</strong>a da agenda pública.<br />

Os meios de comunicação facultam essa possibilidade. S<strong>em</strong> eles, de<br />

fato, não haveria como se falar de agenda pública. O espaço <strong>em</strong> que seus t<strong>em</strong>as<br />

pod<strong>em</strong> ser discutidos é, rigorosamente, qualquer lugar. Um espaço estilhaçado,<br />

onde a copresença não se faz mais necessária, <strong>em</strong> que a presunção<br />

de discutibilidade dos t<strong>em</strong>as públicos se deve não mais ao lugar <strong>em</strong> que<br />

são discutidos, mas ao pertencimento a uma zona de influência midiática<br />

que faculta e promove laços sociais a respeito das mensagens que enuncia.<br />

Por isso, diz-se que a agenda dos meios determina a agenda pública. 6<br />

No termo consagrado agenda setting, o verbo setting está no gerúndio<br />

to set. Significa fixar, estipular, determinar. Seria possível, assim, traduzir<br />

agenda setting por fixação, imposição ou determinação da agenda;<br />

ou, simplesmente, por agendamento. Desse modo, de acordo com a<br />

hipótese do agendamento, a agenda pública, discutida pelas pessoas <strong>em</strong><br />

sociedade, é determinada pelos meios de comunicação. A<br />

Por que esse assunto interessa a uma reflexão ética sobre a mídia?<br />

Ora, o leitor imagina que os profissionais que trabalham na produção<br />

das mensagens por ela veiculadas poderiam agir de maneira diferente<br />

do que faz<strong>em</strong>, propor outras mensagens, escolher outros t<strong>em</strong>as. No<br />

caso do jornalismo, a aplicação de critérios propriamente jornalísticos<br />

permite a conversão de alguns fatos <strong>em</strong> notícia; no caso da publicidade,<br />

a utilização de algumas técnicas criativas consagradas.<br />

Contudo, outros fatos ou técnicas poderiam merecer tal honra se<br />

novos critérios foss<strong>em</strong> adotados, de tal maneira que, se a sociedade conversa<br />

sobre os assuntos que conversa, discute sobre as questões que discute<br />

e, <strong>em</strong> última instância, interage <strong>em</strong> torno dos t<strong>em</strong>as que interage, é<br />

porque esses profissionais ag<strong>em</strong> de certa forma e não de modo diferente.<br />

Em outras palavras, as escolhas midiáticas produz<strong>em</strong> consequências<br />

importantes na constituição do tecido social, na organização dos espaços<br />

de socialização, e dev<strong>em</strong>, então, ser responsáveis por isso.


II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />

143<br />

A mídia é, portanto, responsável por determinar o agendamento da sociedade,<br />

o que inclui a publicidade. B O conteúdo da publicidade é veiculado<br />

lado a lado à programação. Às vezes, ela está até inserida na programação.<br />

É normal, então, que foliões discutam o comercial da cerveja na época do<br />

Carnaval, assim como é normal que crianças discutam sobre o lançamento<br />

de bolinho que traz consigo duas tatuagens do Hom<strong>em</strong> Aranha 3. C<br />

O agendamento não esgota a ação da mídia sobre a sociedade,<br />

é só o seu princípio mais rudimentar. Além de impor t<strong>em</strong>as de discussão,<br />

os meios tend<strong>em</strong> a agir sobre as opiniões que as pessoas têm sobre<br />

esses t<strong>em</strong>as, os valores que são atribuídos aos diferentes pontos de vista.<br />

Por isso, além de ensinar sobre o que falar, os meios também oferec<strong>em</strong><br />

opiniões legítimas a ser<strong>em</strong> adotadas, ou seja, ensinam às pessoas sobre<br />

o que falar.<br />

OPINIÃO PÚBLICA E A ESPIRAL DO SILÊNCIO<br />

A espiral do silêncio, assim como a agenda setting, é uma hipótese científica<br />

de sucesso, discutida <strong>em</strong> congressos, explicada <strong>em</strong> manuais e ensinada<br />

a todos que estudam opinião pública, incluindo os estudiosos da<br />

mídia, aos quais se juntam os interessados <strong>em</strong> psicologia social, investigadores<br />

da influência do coletivo sobre os comportamentos individuais.<br />

A espiral do silêncio, modelo proposto por Elisabeth Noelle-Neumann 8 ,<br />

resulta de exaustivas pesquisas sobre o comportamento eleitoral da sociedade<br />

al<strong>em</strong>ã. Para explicá-lo, responde-se a duas perguntas: por que<br />

“silêncio” e por que “espiral”?<br />

Começa-se pelo silêncio. Por que, então, essa espiral é do silêncio?<br />

Afinal, a que silêncio se está fazendo referência? Qu<strong>em</strong> se cala? E por<br />

quê? Segundo o modelo da espiral do silêncio, as pessoas não se manifestam<br />

sobre certos assuntos por medo. Mas medo de quê? De se sentir<strong>em</strong><br />

isoladas, de se dar<strong>em</strong> conta de que outros não pensam, não sent<strong>em</strong><br />

e não ag<strong>em</strong> como elas. Nos espaços de interação infantil e adolescente,<br />

esse medo é potencializado pela maior contundência das punições a<br />

eventuais desalinhamentos de comportamento. 9


144<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

Para não sentir esse medo, procuram-se no outro coincidências<br />

com os próprios pontos de vista, opiniões, critérios éticos, etc. Adotam-<br />

-se estratégias de aproximação, de pertencimento; evita-se destacar as<br />

discrepâncias e evidenciar a discórdia. Evita-se, assim, expressar opiniões<br />

que, supõe-se, não coincidam com as opiniões dominantes.<br />

O modelo de Noelle-Neumann garante que esse acanhamento advém<br />

da busca de adequação que as pessoas s<strong>em</strong>pre <strong>em</strong>preend<strong>em</strong>, entre<br />

suas opiniões e as que julgam dominantes no universo <strong>em</strong> que estão circulando.<br />

Não cabe perguntar se, de fato, cada um pensa no que diz pensar.<br />

Jamais será possível saber ao certo. Assim, quando se vota <strong>em</strong> alguém<br />

execrado por corrupção, não v<strong>em</strong> ao caso nesse exame saber se<br />

deixou de gostar de fato do candidato; o que importa é que, na hora de<br />

tomar posição a respeito, cada um opera um cálculo de adequação complicado<br />

entre as próprias crenças e os discursos que observa <strong>em</strong> circulação<br />

por onde passa. Havendo incompatibilidade, o jeito é ficar calado.<br />

Mas o que permite a cada pessoa essa adequação entre suas manifestações<br />

e a tal opinião dominante? Essa adequação pressupõe que se conheça<br />

essa opinião dita dominante, ou melhor, que se acredite ter uma noção<br />

clara do que pensa a maioria sobre os t<strong>em</strong>as a respeito dos quais se vai fazer<br />

algum posicionamento. Se não houver essa noção, talvez se possa respeitar,<br />

com menos medo, a espontaneidade dos pontos de vista. Para que se tenha<br />

medo do isolamento, é preciso que a opinião dominante chegue até si. Essa<br />

impressão que se t<strong>em</strong> do que se pensam sobre os outros Noelle-Neumann<br />

chama de “clima de opinião”, a partir do qual as pessoas se ajustam.<br />

Ora, como saber o que pensa a maioria da sociedade – a tal opinião<br />

dominante – se não se conhece, muitas vezes, o que pensam as pessoas<br />

que moram dentro de casa? Fica evidente que não pode ser pelo contato<br />

direto, perguntando a cada um dos que circulam nesse universo. Sobretudo<br />

porque alguns dos t<strong>em</strong>as sobre os quais é preciso se manifestar<br />

transcend<strong>em</strong> a sociedade, são de âmbito internacional.<br />

A pergunta permanece: o que ajudaria a dispor de um clima de opinião<br />

sobre os t<strong>em</strong>as da agenda pública s<strong>em</strong> ter um instituto de pesquisa atrelado


II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />

145<br />

o t<strong>em</strong>po todo? A resposta não poderia ser outra. Os meios de comunicação<br />

fornec<strong>em</strong> muito do que se precisa <strong>para</strong> se viver <strong>em</strong> sociedade e ajustar os<br />

pontos de vista assumidos ao que supostamente pensa o coletivo.<br />

Sobre o silêncio já se falou bastante – talvez seja melhor mesmo<br />

calar –, mas ainda resta entender o que a autora quis dizer com espiral.<br />

O que justifica o recurso da alegoria geométrica? O leitor se l<strong>em</strong>brará<br />

das aulas do ensino médio e terá diante de si um caderno, possivelmente<br />

espiralado. A espiral da geometria caracteriza-se por não ter fim n<strong>em</strong><br />

começo, talvez como os processos sociais e discursivos de definição de<br />

uma s<strong>em</strong>pre mutante opinião pública.<br />

Imagina-se a seguinte situação: os meios de comunicação, diante de<br />

um escândalo político, constro<strong>em</strong> uma imag<strong>em</strong> desfavorável de seu protagonista.<br />

Essa imag<strong>em</strong> será dominante no universo social consumidor dos<br />

produtos desses meios, mas isso não impede que haja, nesse universo, vozes<br />

discordantes. Elas serão minoritárias. Haverá, no entanto, uma tendência<br />

ao silêncio entre os m<strong>em</strong>bros desse grupo minoritário. Quando parte<br />

desse grupo se cala, a opinião discordante, que já era minoritária, torna-se<br />

ainda mais minoritária. O número de silentes será, portanto, maior. Aqueles<br />

que ainda persistir<strong>em</strong>, exprimindo-se favoravelmente ao político, terão<br />

de suportar um ônus social crescente <strong>em</strong> suas tomadas de posição, estarão<br />

cada vez mais isolados e não encontrarão qu<strong>em</strong> lhes dê apoio.<br />

Muitos fatores incid<strong>em</strong> sobre as tomadas de posição pública e, consequent<strong>em</strong>ente,<br />

sobre o fenômeno da espiral do silêncio. A seguir, dois<br />

deles são destacados: o medo do isolamento e a competência específica<br />

do agente social <strong>para</strong> manifestar-se sobre este ou aquele t<strong>em</strong>a.<br />

O ser humano t<strong>em</strong> horror ao isolamento opinativo. Sustentar uma<br />

opinião contrária à da maioria traz desconforto. Esse medo é generalizado<br />

e comprovado por estatísticas. Para evitar tal isolamento, é preciso<br />

intuir qual é a opinião dominante. Só a percepção relativamente<br />

aguda do que pensam os d<strong>em</strong>ais e <strong>em</strong> qual sentido se deslocam essas<br />

opi niões permite ao ser humano manifestar-se <strong>em</strong> sociedade s<strong>em</strong> suportar<br />

o ônus da reprovação de seus pares. 7


146<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

Esse medo do isolamento, segundo Noelle-Neumann, determina o<br />

minguamento progressivo das opiniões dominadas quando confrontadas<br />

com opiniões majoritárias. No entanto, deve-se observar que esse medo<br />

se manifesta nos atores sociais de maneiras distintas. N<strong>em</strong> s<strong>em</strong>pre o indivíduo<br />

que sustenta uma opinião minoritária se cala. Um dos fatores que<br />

condiciona essa tomada de posição pública é a competência específica<br />

<strong>para</strong> abordar os t<strong>em</strong>as <strong>em</strong> discussão, ou seja, os t<strong>em</strong>as de agenda pública.<br />

Sobre t<strong>em</strong>as da agenda privada todos falam. A forma das intervenções<br />

varia, mas os t<strong>em</strong>as que diz<strong>em</strong> respeito à vida privada de cada um<br />

são tratados <strong>em</strong> circuitos de relações mais ou menos abrangentes. Por<br />

isso, a questão a que se faz referência <strong>aqui</strong> diz respeito a t<strong>em</strong>as da agenda<br />

pública. Essa limitação t<strong>em</strong>ática torna os meios de comunicação um<br />

fator decisivo na construção e imposição da opinião dominante.<br />

Se, como se viu, são os meios que oferec<strong>em</strong> o menu t<strong>em</strong>ático comum,<br />

são também os que têm prerrogativa de indicar qual é o enfoque<br />

a ser dado a cada um desses t<strong>em</strong>as. No entanto, mesmo na discussão de<br />

assuntos políticos, por ex<strong>em</strong>plo, outros fatores, além da opinião da mídia,<br />

influenciam uma possível manifestação pública. A competência específica<br />

reconhecida <strong>para</strong> abordar o t<strong>em</strong>a é um deles. 10<br />

A maior disposição <strong>para</strong> que um indivíduo se manifeste e exiba<br />

sua opinião diante de outros sobre um t<strong>em</strong>a político dependerá de sua<br />

maior ou menor familiaridade no manejo desses t<strong>em</strong>as. Essa familiaridade,<br />

por sua vez, está vinculada ao grau de politização. Quanto maior<br />

o grau de politização, maior a tendência a uma manifestação política sobre<br />

um t<strong>em</strong>a político. Esse grau de politização envolve um conjunto de<br />

el<strong>em</strong>entos cognitivos, avaliativos e afetivos.<br />

Quando o t<strong>em</strong>a abordado é a opinião de crianças, pode-se dizer<br />

que poucas teriam a legitimidade <strong>para</strong> manifestar-se. Levando <strong>em</strong> consideração<br />

que a construção identitária de um indivíduo ocorre aos poucos,<br />

compreende-se que, nesse período da vida, o indivíduo possui a<br />

identidade pouco sólida. Isso faz com que a opinião da mídia seja determinante<br />

<strong>para</strong> a tomada de posição da criança. Em <strong>para</strong>lelo a isso, a


II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />

147<br />

criança está <strong>em</strong> plena construção de valores sobre o mundo, o que a torna<br />

mais influenciável e, portanto, a publicidade de produtos <strong>para</strong> crianças<br />

t<strong>em</strong> maior chance de ser uma opinião dominante.<br />

MÍDIA E IDEOLOGIA<br />

Até o desenvolvimento da mídia (impressa e eletrônica), a publicidade<br />

de um indivíduo ou de um t<strong>em</strong>a era ligada ao compartilhamento de um<br />

lugar comum; afinal, ela dependia da presença física do receptor, uma<br />

vez que era realizada essencialmente por meio da interação face a face.<br />

Para que se pudesse tornar pública uma ideia – algum tipo de ideal político,<br />

por ex<strong>em</strong>plo –, era preciso ter à volta pessoas capazes e dispostas<br />

a escutar o que se tinha a dizer. Diante disso, seu caráter era essencialmente<br />

dialógico, com os indivíduos falando ou representado uns diante<br />

dos outros, argumentando e participando ativamente do debate acerca<br />

do t<strong>em</strong>a discutido.<br />

Após o desenvolvimento dos meios de comunicação, novas formas<br />

de publicidade foram criadas além da copresencial. Ações e eventos passaram<br />

a se tornar públicos pela gravação e transmissão distantes do t<strong>em</strong>po e<br />

do espaço de suas ocorrências, o que se deu, sobretudo, com o surgimento<br />

das comunicações eletrônicas. Com o advento da televisão, por ex<strong>em</strong>plo,<br />

passou-se a ter acesso à imag<strong>em</strong> audiovisual daquele jogo de futebol<br />

que não se pode ver ao vivo. Essas novas formas de publicidade, evident<strong>em</strong>ente,<br />

não substituíram por <strong>completo</strong> a tradicional, já que ainda exist<strong>em</strong><br />

encontros públicos, d<strong>em</strong>onstrações de massa, etc. No entanto, de qualquer<br />

modo, ela passou a ser uma das mais importantes formas de publicidade<br />

atuais – publicidade que t<strong>em</strong> características um pouco distintas da<br />

tradicional. Em primeiro lugar, porque ela é menos dialógica. A possibilidade<br />

de o receptor intervir na programação televisiva, por ex<strong>em</strong>plo, é muito<br />

menor do que <strong>em</strong> um diálogo. Em segundo lugar, porque as ações e os<br />

eventos publicizados – sobretudo pela televisão – são visíveis <strong>para</strong> um número<br />

muito maior de pessoas. E, <strong>em</strong> terceiro lugar, porque fenômenos que<br />

ocorr<strong>em</strong> <strong>em</strong> contextos muito distantes passaram a também ser visíveis. Em


148<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

quarto e último lugar, porque a direção da visão é praticamente de sentido<br />

único. Quando se assiste ao Jornal Nacional, pode-se ver a Patrícia Poeta<br />

e o William Bonner, mas eles não pod<strong>em</strong> ver os espectadores.<br />

Assim, pode-se dizer que o desenvolvimento da mídia criou uma<br />

nova forma de publicidade, proporcionando, com isso, um tipo de visibilidade<br />

bastante diferente daquele tradicional de copresença. 11 Isso,<br />

s<strong>em</strong> dúvida, alterou significativamente as condições sob as quais o poder<br />

político é exercido. Foram diversos os desdobramentos dessa transformação,<br />

porém o foco principal deste capítulo não é esse, e, sim, como<br />

essa visibilidade é administrada pelos meios de comunicação e como<br />

essa administração pode entrecruzar-se com as relações de dominação<br />

existentes na sociedade atual.<br />

Os meios de comunicação pod<strong>em</strong> controlar a visibilidade de determinados<br />

assuntos de muitas formas. A principal delas é ocultando-os.<br />

Bourdieu, <strong>em</strong> seu clássico sobre a televisão, tece uma fina reflexão acerca<br />

de como esses meios ocultam muitos assuntos importantes, os quais,<br />

<strong>em</strong> suas palavras, seria preciso mostrar. Ocultam de maneira <strong>para</strong>doxal,<br />

mostrando. Mas como exatamente? Mostrando outra coisa <strong>em</strong> seu lugar<br />

ou, ainda, mostrando esses assuntos de modo que sejam vistos como<br />

algo insignificante ou como algo muito diferente da realidade.<br />

Se os meios de comunicação de massa pod<strong>em</strong> estabelecer e sustentar<br />

relações de dominação ao dar espaço <strong>para</strong> determinadas questões<br />

<strong>em</strong> detrimento de outras, como se viu, eles também pod<strong>em</strong> fazer o mesmo<br />

por meio do conteúdo veiculado por suas mensagens, isto é, configurando<br />

as mensagens de tal e tal forma, mobilizando este ou aquele<br />

sentido. Como se verá a seguir, <strong>para</strong> algumas teorias, o receptor é mero<br />

espectador passivo, que absorve indiscriminadamente o que se passa<br />

diante dele, uma espécie de receptáculo das mensagens midiáticas, esponja<br />

que tudo absorve. Muitas das primeiras teorias da comunicação<br />

segu<strong>em</strong> esse viés. Embora seu valor heurístico seja reconhecido, pode-<br />

-se crer que essas teorias são limitadas e ca<strong>em</strong> n<strong>aqui</strong>lo que Thompson 11<br />

chamou de “mito do receptor passivo”.


II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />

149<br />

Ao analisar o desenvolvimento dos meios de comunicação, Thompson<br />

observa que eles possibilitaram a produção, a reprodução e a circulação<br />

das formas simbólicas – expressões linguísticas, obras de artes, anúncios<br />

publicitários, gestos, ações, etc. – <strong>em</strong> uma escala antes inimaginável.<br />

Em suas palavras (p. 12), “viv<strong>em</strong>os, hoje, <strong>em</strong> sociedades onde a produção<br />

e recepção das formas simbólicas é s<strong>em</strong>pre mais mediada por uma rede<br />

complexa, transnacional, de interesses institucionais”. Nunca antes na história<br />

houve a possibilidade de acesso a tantas formas simbólicas. Compõe-<br />

-se hoje uma audiência extensa e potencialmente ampla, dispersa no t<strong>em</strong>po<br />

e no espaço e que, por conseguinte, amplia significativamente o raio de<br />

operação da ideologia, campo de análise que parece permanecer central<br />

<strong>para</strong> a compreensão de como, ainda que sejam ativas na recepção das mensagens<br />

midiáticas, as pessoas são, <strong>em</strong> algumas ocasiões, subjugadas por elas.<br />

Thompson 11 , ao analisar a história dessa disputa, distingue dois tipos<br />

gerais de concepção de ideologia: a neutra e a crítica. A primeira delas<br />

foi desenvolvida por autores como Destutt de Tracy, Lênin, Mannheim<br />

(<strong>em</strong> sua formulação geral da concepção total de ideologia) e Lukács, e<br />

compreende a ideologia como “um aspecto da vida social (ou uma forma<br />

de investigação social), entre outros, não [sendo] n<strong>em</strong> mais n<strong>em</strong><br />

menos atraente ou probl<strong>em</strong>ático do que qualquer outro” (p. 72). Assim,<br />

dessa perspectiva, um fenômeno considerado ideológico não é necessariamente<br />

enganador ou ilusório n<strong>em</strong> precisa estar ligado aos interesses<br />

de um grupo particular. Por ex<strong>em</strong>plo, quando se fala que a ideologia<br />

de um partido político é incompatível com a de outro, assume-se uma<br />

concepção neutra de ideologia. Afinal, nesse caso, o termo não denota<br />

necessariamente algo bom ou ruim, refere-se apenas à visão de mundo<br />

do partido <strong>em</strong> questão, ao seu ideário político.<br />

A concepção crítica de ideologia, por sua vez, foi desenvolvida, entre<br />

outros autores, por Napoleão, Marx e Mannheim (<strong>em</strong> sua concepção<br />

restrita de ideologia), e imputa aos fenômenos caracterizados como<br />

ideo lógicos um criticismo implícito ou sua própria condenação. Nas palavras<br />

de Thompson (2000, p. 73), “concepções críticas são aquelas que


150<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

possu<strong>em</strong> um sentido negativo, crítico ou pejorativo”. Assim, dessa perspectiva,<br />

todo fenômeno ideológico é enganador, ilusório e/ou parcial.<br />

Quando se fala que tal discurso não é científico, mas ideológico, assume-se<br />

uma concepção crítica de ideologia. Afinal, nesse caso, o termo<br />

está sendo <strong>em</strong>pregado pejorativamente.<br />

Ao considerar o papel do contexto de produção, circulação e recepção<br />

das formas simbólicas na análise da ideologia, Thompson enfoca,<br />

s<strong>em</strong> dúvida, a participação ativa do sentido na constituição da realidade<br />

social, além de também enfocar seu caráter indeterminado, o que<br />

quer dizer que o sentido não é alguma coisa acabada, previamente determinada<br />

pela mensag<strong>em</strong> que o mobiliza, mas alguma coisa viva, <strong>em</strong><br />

negociação, que depende também dos processos seletivos de recepção<br />

descritos no tópico anterior. Com isso, o autor abre a possibilidade de se<br />

pensar as mensagens mediáticas como potenciais estruturadores das relações<br />

de dominação, ainda que as pessoas sejam receptores ativos.<br />

Mas de quais relações de dominação se está falando propriamente?<br />

De qualquer uma. Seja de gênero, de idade, de raça, de classe, etc. Afinal,<br />

outra vantag<strong>em</strong> analítica da concepção de ideologia <strong>em</strong> questão é o fato<br />

de ela não colocar a ideologia como necessariamente dependente das relações<br />

de dominação de classe. Pelo contrário, ela se caracteriza justamente<br />

por uma abertura à análise da força simbólica de outras formas de<br />

dominação, derivadas ou não das relações de produção. Com isso, pode-<br />

-se discutir ideologia na produção midiática s<strong>em</strong>, no entanto, reduzi-la a<br />

mero reflexo das estruturas econômicas e sociais. Isso decorre do fato de<br />

Thompson partir de uma teoria social que, <strong>em</strong>bora confira importância à<br />

luta de classes na análise das sociedades cont<strong>em</strong>porâneas, considera centrais<br />

também outros conflitos estruturais, não os condicionando necessariamente<br />

às contradições entre o trabalho e o capital.<br />

Se no campo jornalístico o discurso da objetividade pode ser interpretado<br />

como uma ideologia, no campo publicitário, o mesmo ocorre<br />

com o discurso acerca da criatividade. Esta é habitualmente vista pelos<br />

publicitários como uma abertura <strong>para</strong> uma potencialidade esquecida


II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />

151<br />

ou reprimida. A ideia de que qualquer pessoa pode ser criativa, de que<br />

a criatividade está aberta a qualquer um, é quase uma unanimidade no<br />

discurso desses profissionais.<br />

Então, se todos pod<strong>em</strong> ser criativos, por que não são de fato? Trata-se<br />

de uma pergunta capciosa, mas prontamente respondida por José<br />

Predebon, publicitário e professor de criação: porque a criatividade possui<br />

inimigos. Entre os principais, estão a acomodação, a miopia estratégica,<br />

o imediatismo, a timidez, a insegurança, a prudência, o desânimo e<br />

a decepção. Assim, uma pessoa criativa seria aquela que consegue combater<br />

esses inimigos, dando vazão a suas pulsões criativas.<br />

S<strong>em</strong> dúvida, ao retratar a criatividade, o autor, assim como a maioria<br />

dos publicitários, assume uma perspectiva idealista. Não só porque a interpreta<br />

como uma potência universal, como uma entidade escondida ou<br />

recalcada nos porões da mente, mas também porque a interpreta como<br />

algo intrínseco às coisas do mundo, às suas produções. Afinal, imputa a<br />

elas um valor criativo interno, como se houvesse produções criativas de<br />

maneira intrínseca, independent<strong>em</strong>ente de um agente assim as classificar.<br />

Desse modo, o anúncio criativo conteria valores, os quais estariam<br />

nas próprias mensagens que veiculam, <strong>em</strong> suas imagens e textos, b<strong>em</strong><br />

como na relação entre ambos os valores passíveis de ser<strong>em</strong> reconhecidos.<br />

Equívoco idealista. Inversão de realidade, ao menos da perspectiva<br />

materialista. Afinal, sob essa última perspectiva, o valor não pode estar<br />

nas próprias coisas. O real não diz o que vale, diria Comte-Sponville.<br />

Um anúncio, então, não pode conter valores, ser intrinsecamente bom<br />

ou ruim. Em consequência, não se reconhec<strong>em</strong> valores <strong>em</strong> um anúncio,<br />

mas atribu<strong>em</strong>-se valores a ele. Um anúncio é inovador e estética e culturalmente<br />

relevante porque assim é classificado, e não o contrário: é inovador<br />

e estética e culturalmente relevante, portanto, é assim classificado.<br />

Assim, um mesmo anúncio pode provocar reações completamente<br />

distintas. Os anúncios de cerveja, por ex<strong>em</strong>plo, costumam agradar<br />

aos homens, aumentar sua potência de existir, elevar seu conatus. Afinal,<br />

apresentam mulheres bronzeadas, alegres e cheias de vida, trajadas


152<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

<strong>em</strong> minúsculos biquínis, exibindo a volúpia de seus corpos e uma deliciosa<br />

“gelada” <strong>em</strong> suas mãos. No entanto, os mesmos comerciais costumam<br />

provocar a ira das f<strong>em</strong>inistas, mulheres não tão bronzeadas assim,<br />

n<strong>em</strong> s<strong>em</strong>pre tão alegres e cheias de vida. Afinal, na visão delas, tais comerciais<br />

reforçariam a concepção machista de mulher-objeto, a concepção<br />

de que a mulher não passa de um produto a ser consumido, um produto<br />

entre outros, um produto mercantilizado e banalizado.<br />

Não é necessário dizer que as palavras e a forma de se expressar<br />

carregam <strong>em</strong> si uma carga ideológica capaz de atingir mais um determinado<br />

público do que outros. A publicidade de biscoito que leva <strong>em</strong><br />

sua <strong>em</strong>balag<strong>em</strong> o personag<strong>em</strong> favorito de uma criança vai convencê-la<br />

muito mais do que a seus pais. A publicidade vai alavancar o conatus da<br />

criança, vai extasiá-la, fazendo com que sua felicidade dependa da obtenção<br />

ou não do objeto desejado.<br />

Parece ficar claro que o valor de qualquer anúncio é s<strong>em</strong>pre uma<br />

atribuição, que um comercial simplesmente é, não guardando nenhum<br />

valor (positivo ou negativo), intrínseco, e que, se possui valor criativo, é<br />

porque assim alguém os valorou. Mas se a perspectiva idealista da criatividade<br />

constitui evident<strong>em</strong>ente uma ilusão, por que ela constituiria<br />

uma ideologia? Porque no campo publicitário a criatividade é um b<strong>em</strong>,<br />

algo que possui utilidade, que pode ser acumulado e t<strong>em</strong> o poder de se<br />

reproduzir. Um capital, portanto, simbólico, de maneira mais específica,<br />

pois confere a seus detentores a autoridade profissional ao ser reconhecido<br />

como criativo e talentoso por seus colegas. Um profissional da publicidade<br />

adquire entre eles um prestígio que pode lhe trazer uma série<br />

de outros benefícios, inclusive financeiros.<br />

Quando o Festival Internacional de Publicidade de Cannes pr<strong>em</strong>ia determinados<br />

comerciais, estabelece, <strong>em</strong> certa medida, as diretrizes da boa<br />

publicidade. Diretrizes que, s<strong>em</strong> dúvida, possu<strong>em</strong> implicações políticas.<br />

Afinal, têm o poder de alçar comerciais pr<strong>em</strong>iados à condição de criativos<br />

eficientes, trazendo, <strong>em</strong> resultado, prestígio e reconhecimento <strong>para</strong> seus<br />

produtores – prestígio que pode, portanto, converter-se <strong>em</strong> lucro.


II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />

153<br />

Dessa forma, ao interpretar<strong>em</strong> a criatividade como uma potencialidade<br />

universal, como uma entidade pronta a ser acessada, os profissionais da<br />

publicidade acabam servindo aos interesses daqueles que possu<strong>em</strong> mais<br />

poder nesse espaço. Afinal, essa interpretação coloca a criatividade como<br />

determinação do agente – determinação de uma subjetividade discriminada<br />

capaz de atualizar tal potência – <strong>em</strong> vez de apreen dê-la como uma<br />

determinação de um espaço social estruturado de maneira objetiva. Com<br />

isso, o sucesso ou fracasso de um anúncio, sua consagração ou não, acabam<br />

sendo atribuídos ao próprio profissional que o produziu – sua competência<br />

e habilidade <strong>em</strong> saber trabalhar ou não com a potência criativa<br />

que supostamente possui –, e não aos interesses de qu<strong>em</strong> assim o classificou.<br />

Isto é, aos interesses daqueles que dominam seu espaço de produção.<br />

Isso faz com que a estratégia utilizada pelas agências <strong>para</strong> se comunicar<strong>em</strong><br />

com as crianças, fique de certa forma, consagrada. As <strong>em</strong>presas,<br />

portanto, reproduz<strong>em</strong> esse tipo de medida que permanece ao longo<br />

dos t<strong>em</strong>pos. Voltando à implicação ética da comunicação, poderia<br />

ser diferente.<br />

CONCLUSÕES<br />

Neste capítulo, foram apresentadas três formas imbricadas de interação<br />

da mídia com os agentes sociais: a agenda, a opinião e a ideologia. Denunciou-se<br />

a incipiência das pesquisas na área, <strong>em</strong> especial no que diz<br />

respeito ao público infantil. A sociedade lamenta.<br />

O trabalho universitário é essencial <strong>para</strong> que os <strong>em</strong>bates políticos<br />

sobre a normatização da atividade publicitária tenham fundamento<br />

científico e se afast<strong>em</strong> das especulações e achismos de aventureiros interessados.<br />

Afinal, no desequilíbrio entre o capital e qualquer outro ideal,<br />

só evidências científicas irrefutáveis no momento pod<strong>em</strong> converter-se<br />

<strong>em</strong> argumentos de proteção aos despossuídos.


154<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />

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2. Bourdieu P. Il n’y a pas d’actes désinteressé. In: Coisas ditas. São Paulo: Ática,<br />

2004.<br />

3. Wolf M. Teorias da comunição de massa. São Paulo: Martins Fontes, 2005.<br />

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1971.<br />

5. Barros Filho C. Ética na comunicação. São Paulo: Summus, 2008.<br />

6. Barros Filho C. Agenda setting na educação. Rev Com Edu 1995; 5.<br />

7. Barros Filho C. A publicidade como suporte pedagógico: a questão da discriminação<br />

por idade na publicidade da Sukita. In Famecos. Revista do Curso de Pós-<br />

-graduação da PUCRS 2001; 16:122-35.<br />

8. Noelle Neumann E. The social skin. Chicago: University of Chicago Press, 1993.<br />

9. Piaget J. O juizo moral na criança. São Paulo: Summus, 1994.<br />

10. Bourrdieu P. Ce que parler veut dire. Paris: Fayard, 1982.<br />

11. Thompsom JB. Ideologia e cultura moderna. Petrópolis: Vozes, 1998.<br />

NOTAS<br />

A<br />

B<br />

C<br />

A perspectiva determinista da hipótese mereceu críticas. De um lado, por parte<br />

daqueles que ve<strong>em</strong> na relação entre t<strong>em</strong>as da mídia e t<strong>em</strong>as da agenda pública<br />

uma relação dialética. De outro, por parte daqueles que, reconhecendo a influência<br />

da mídia, não consideram a agenda pública um resultado mecânico das decisões<br />

editoriais.<br />

As pesquisas sobre o agendamento de t<strong>em</strong>as publicitários é menos frequente se<br />

com<strong>para</strong>da a outros produtos da mídia, como a notícia. Um ex<strong>em</strong>plo de investigação<br />

crítica da produção publicitária que investiga seu agendamento é proposto<br />

por Barros Filho. 7<br />

É de urgência e grande interesse social a investigação, ainda incipiente, sobre os<br />

efeitos do agendamento publicitário junto ao público infantil. Os programas de<br />

pós-graduação <strong>em</strong> comunicação poderiam consagrar <strong>em</strong> suas linhas de pesquisa<br />

um espaço <strong>para</strong> essa relevante produção.


REGULAMENTAÇÃO VERSUS<br />

AUTORREGULAMENTAÇÃO<br />

João Lopes Guimarães Júnior<br />

A necessidade de restringir a publicidade de alimentos dirigida às crianças<br />

v<strong>em</strong> sendo debatida <strong>em</strong> todo o mundo por especialistas <strong>em</strong> nutricionismo<br />

e saúde pública, preocupados <strong>em</strong> reverter o probl<strong>em</strong>a da obesidade<br />

infantil a partir da constatação de que uma política pública séria<br />

não pode ignorar o impacto de estratégias de marketing cada vez mais<br />

agressivas adotadas pelas <strong>em</strong>presas <strong>para</strong> seduzir esse público.<br />

As razões que mobilizam as iniciativas no sentido da regulamentação<br />

da publicidade de alimentos não saudáveis <strong>para</strong> crianças baseiam-se<br />

nas seguintes constatações:<br />

• a obesidade, nas décadas recentes, evoluiu e se tornou um dos mais<br />

graves probl<strong>em</strong>as mundiais de saúde pública, como resultado de profundas<br />

mudanças de hábitos alimentares e da adoção de estilos de vida<br />

sedentários;<br />

• as autoridades sanitárias dev<strong>em</strong> conceber e impl<strong>em</strong>entar uma política pública<br />

ampla e eficiente, que atinja não apenas os efeitos, mas também as<br />

causas da obesidade, uma vez que “a saúde é direito de todos e dever do


156<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

Esta do, garantido mediante políticas sociais e econômicas que vis<strong>em</strong> à redução<br />

do risco de doença” (Constituição Federal, Art. 196);<br />

• é impossível combater a obesidade s<strong>em</strong> promover a reeducação alimentar;.<br />

• a preocupação com a adoção de uma dieta saudável, que impeça o consumo<br />

excessivo de alimentos ricos <strong>em</strong> açúcar, sódio e gordura, deve começar<br />

na infância, <strong>em</strong> um esforço <strong>para</strong> reverter o alarmante aumento da obesidade<br />

entre as crianças e evitar agravos sanitários precoces;<br />

• a publicidade de alimentos dirigida ao público infantil exerce influência<br />

significativa nos hábitos alimentares das crianças, constituindo, assim,<br />

um fator importante <strong>para</strong> o agravamento de um probl<strong>em</strong>a de saúde<br />

pública, uma vez que estimula o consumo de produtos de baixo valor<br />

nutricional.<br />

O enfoque na proteção da saúde das crianças precisa ser ressaltado diante<br />

da reação de setores cujos interesses econômicos pod<strong>em</strong> ser atingidos,<br />

os quais argumentam que restringir publicidade significaria violar<br />

os direitos à livre iniciativa e à liberdade de expressão. A estratégia dos<br />

lobbies que atuam contra a regulamentação consiste <strong>em</strong> desviar indevidamente<br />

o debate <strong>para</strong> um suposto conflito ideológico – liberalismo<br />

versus intervencionismo –, com espaço <strong>para</strong> argumentos ad terror<strong>em</strong><br />

sugerir<strong>em</strong> uma interferência paternalista, abusiva e arbitrária do Estado<br />

na vida dos cidadãos.<br />

A retórica diversionista de lobbies que colocam seus interesses corporativos<br />

acima de interesses sociais procura, estrategicamente, evitar a<br />

questão de fundo: como negar a legitimidade da intervenção estatal na<br />

economia quando se trata de proteger a saúde de crianças diante de um<br />

probl<strong>em</strong>a grave e concreto? Vale l<strong>em</strong>brar que o Brasil e diversos outros<br />

países de grande tradição d<strong>em</strong>ocrática possu<strong>em</strong>, há muito t<strong>em</strong>po, legislação<br />

que restringe intensamente atividades econômicas consideradas<br />

de algum modo lesivas à saúde pública. A criminalização do comércio<br />

de entorpecentes, a restrição à venda de psicotrópicos e a proibição da<br />

publicidade de cigarros são apenas alguns ex<strong>em</strong>plos b<strong>em</strong> conhecidos de


II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />

157<br />

estratégias de políticas públicas que autoridades sanitárias adotaram <strong>em</strong><br />

várias partes do mundo – não <strong>para</strong> eliminar o capitalismo ou as liberdades<br />

individuais, mas <strong>para</strong> proteger a saúde pública.<br />

Nesse contexto, a reação alarmista contra a regulamentação só se<br />

explica como desespero de qu<strong>em</strong> quer que interesses privados prevaleçam<br />

sobre interesses públicos. É l<strong>em</strong>brado <strong>aqui</strong> que muitas das maiores<br />

<strong>em</strong>presas alimentícias têm reconhecido a gravidade do probl<strong>em</strong>a e<br />

vêm assumindo, voluntariamente, o compromisso de não veicular publicidade<br />

de produtos não saudáveis <strong>para</strong> as crianças. Essa é a responsabilidade<br />

social esperada dos agentes econômicos, com a consciência de<br />

que a livre iniciativa deve assegurar a todos existência digna, observado<br />

o princípio da defesa do consumidor, como prevê o Art. 170 da Constituição<br />

Federal.<br />

O filósofo inglês John Stuart Mill (1806-1873) estabeleceu um dos<br />

princípios que fundamenta o liberalismo, inclusive a liberdade de expressão.<br />

O Princípio do Dano fixa condição <strong>para</strong> que a interferência estatal<br />

sobre a liberdade humana seja aceitável na conhecida fórmula: “o<br />

único propósito pelo qual pode ser exercido com pleno direito o poder<br />

sobre qualquer m<strong>em</strong>bro de uma comunidade civilizada, contra a vontade<br />

deste, é o de prevenir o dano a outros”. A imposição de restrições às<br />

<strong>em</strong>presas na veiculação de publicidade que pode estimular hábitos alimentares<br />

não saudáveis legitima-se, segundo essa lógica, na prevenção<br />

de danos às crianças. Além disso, se por lei as crianças “são absolutamente<br />

incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil”, não deveriam<br />

ser alvo de indução ao consumo por meio de estratégias que se<br />

aproveit<strong>em</strong> da sua deficiência de julgamento e experiência, proibidas<br />

pelo Center for Disease Control (CDC).<br />

Havendo, como efetivamente há, razões legítimas <strong>para</strong> a regulamentação<br />

da publicidade de alimentos pelo Estado, no contexto de política<br />

pública sanitária, a sociedade não deve se contentar com a autorregulamentação,<br />

isto é, a restrição interna corporis ditada pelo próprio<br />

mercado.


158<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

É certo que a publicidade comercial vai muito além da mera veiculação<br />

de informação. É inegável seu propósito imperativo: ela existe<br />

<strong>para</strong> persuadir o público, <strong>para</strong> instigar o consumo de determinados bens<br />

e serviços, <strong>para</strong> interferir na vontade dos destinatários de suas sofisticadas<br />

mensagens, <strong>para</strong> causar repercussão no comportamento das pessoas.<br />

É por isso que os próprios publicitários, por meio do Código Brasileiro<br />

de Autorregulamentação Publicitária, defin<strong>em</strong> publicidade como<br />

“toda atividade destinada a estimular o consumo de bens e serviços, b<strong>em</strong><br />

como promover instituições, conceitos ou ideias” (Art. 8º) e reconhec<strong>em</strong><br />

que “a publicidade exerce forte influência de ord<strong>em</strong> cultural sobre<br />

grandes massas da população” (Art. 7º).<br />

Mas qual é o limite ético e legal <strong>para</strong> as mensagens e estratégias publicitárias<br />

dirigidas ao público infantil? Até que ponto é lícito, <strong>para</strong> as<br />

<strong>em</strong>presas, “estimular o consumo de bens e serviços” e “exercer forte influência<br />

de ord<strong>em</strong> cultural” sobre massas de crianças por meio da publicidade?<br />

O que dizer quando essa influência é determinante na promoção<br />

de hábitos alimentares prejudiciais à saúde infantil?<br />

A ética publicitária é insuficiente <strong>para</strong> a proteção de todos os valores<br />

da sociedade brasileira. Embora o Conselho de Autorregulamentação<br />

Publicitária (Conar) mereça todo o respeito, deve ser visto pelo<br />

que é: uma entidade corporativa que jamais se colocará contra interesses<br />

econômicos do mercado publicitário. Em uma sociedade plural e d<strong>em</strong>ocrática,<br />

todos os setores dev<strong>em</strong> se submeter a controle externo, especialmente<br />

quando se trata de observar interesses e valores protegidos<br />

pela Constituição. Essa regra deve valer também <strong>para</strong> o mercado publicitário,<br />

cuja atividade influencia fort<strong>em</strong>ente o comportamento social.<br />

A importância da publicidade é inegável <strong>para</strong> a dinâmica de uma<br />

economia baseada na livre iniciativa, mas vale l<strong>em</strong>brar que a mensag<strong>em</strong><br />

s<strong>em</strong>pre será <strong>em</strong>itida com finalidade meramente venal – a intenção<br />

é vender. A preponderância de interesses mercantis não pode ser<br />

absoluta, especialmente <strong>em</strong> um país que t<strong>em</strong> como fundamentos a<br />

dignidade humano e os valores sociais da livre iniciativa, como quer a


II JORNADA DE PROPAGANDA DE ALIMENTOS E OBESIDADE...<br />

159<br />

Constituição logo <strong>em</strong> seu primeiro artigo. Assim, conclui-se que a autorregulamentação,<br />

por si só, não basta <strong>para</strong> a garantia dos direitos<br />

constitucionais de proteção integral de crianças e adolescentes e de<br />

defesa dos consumidores diante da publicidade.


I JORNADA SOBRE TABELAS DE<br />

COMPOSIÇÃO DE ALIMENTOS<br />

E CÁLCULO INFORMATIZADO<br />

DE DIETAS<br />

29 de outubro de 2008<br />

Teatro Marcos Lindenberg – <strong>Unifesp</strong>


DETERMINAÇÃO DO NÍVEL DE<br />

HEMOGLOBINA UTILIZANDO<br />

A TÉCNICA DA GOTA SECA EM<br />

PAPEL DE FILTRO – PESQUISA<br />

NACIONAL DE DEMOGRAFIA E<br />

SAÚDE (PNDS, 2006)<br />

Helio Vannucchi<br />

A an<strong>em</strong>ia é a desord<strong>em</strong> nutricional mais generalizada no mundo, representando<br />

um grave probl<strong>em</strong>a de saúde pública. Na América Latina e no<br />

Caribe, aproximadamente 30% das mulheres e 25% das crianças abaixo<br />

de 5 anos de idade são anêmicas. No Brasil, a an<strong>em</strong>ia t<strong>em</strong> sido encontrada<br />

<strong>em</strong> várias regiões e diferencia-se de outras condições carenciais<br />

por não se limitar a acometer apenas as populações de mais baixa renda<br />

ou apenas os desnutridos. 1 Contudo, a an<strong>em</strong>ia ferropriva compromete<br />

principalmente alguns grupos mais sensíveis à escassez de ferro devido<br />

ao crescimento rápido ou ao aumento de d<strong>em</strong>anda: crianças entre 6<br />

meses e 5 anos de idade, adolescentes do sexo f<strong>em</strong>inino e mulheres <strong>em</strong><br />

idade fértil. 2-4<br />

No Brasil, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), 30%<br />

das crianças abaixo de 5 anos têm an<strong>em</strong>ia, sendo a segunda maior prevalência<br />

na América Latina. 2 Em um enfoque nacional, alguns autores<br />

consideram que essas estimativas estão subestimadas e que a prevalência<br />

efetiva do probl<strong>em</strong>a <strong>em</strong> crianças pode ser 50% maior que os valores<br />

ditados pela OMS, alcançando 45%. 5


164<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

O diagnóstico clínico de an<strong>em</strong>ia de severidade moderada é complicado<br />

por causa da baixa percepção de palidez intermediária no exame<br />

físico. 6-8 No Brasil, a validade e a confiabilidade da presença de palidez<br />

palmar e conjuntival <strong>para</strong> a detecção de an<strong>em</strong>ia foi avaliada por Spinelli<br />

et al. 9 A com<strong>para</strong>ção entre os diagnósticos de an<strong>em</strong>ia obtidos pelo exame<br />

palmar e conjuntival contra os resultados obtidos pela determinação<br />

dos níveis de h<strong>em</strong>oglobina mostrou baixa concordância.<br />

Uma alternativa relativamente simples <strong>para</strong> a avaliação de an<strong>em</strong>ia<br />

pode ser observada pela utilização de um aparelho portátil com capacidade<br />

de medir a concentração de h<strong>em</strong>oglobina no sangue obtido por<br />

punção digital com resultado imediato. Entretanto, esse equipamento<br />

(h<strong>em</strong>oglobinômetro – H<strong>em</strong>ocue®) <strong>para</strong> pesquisas abrangendo distâncias<br />

e condições locais tão díspares, com grandes dificuldades <strong>em</strong> um<br />

país de dimensões continentais como o Brasil, não pode ser considerado<br />

viável. Isso exigiria a disponibilidade dos equipamentos <strong>em</strong> muitos municípios<br />

e os procedimentos dependeriam da habilidade de cada operador,<br />

cujo treinamento envolveria conhecimento de técnicas de laboratório,<br />

ainda que simples.<br />

Contudo, a gota seca pre<strong>para</strong>da com sangue periférico t<strong>em</strong> sido<br />

indicada <strong>para</strong> testes (screening) <strong>em</strong> vários estudos epid<strong>em</strong>iológicos. 10<br />

Essa técnica, na qual o sangue colhido por punção digital é depositado<br />

<strong>em</strong> papel de filtro especial, seco <strong>em</strong> t<strong>em</strong>peratura ambiente e depois<br />

eluído <strong>para</strong> dosag<strong>em</strong>, t<strong>em</strong> sido utilizada <strong>para</strong> análises s<strong>em</strong>iquantitativas<br />

de aminoácidos 11,12 , hormônios 13 , lipídios 14 e drogas terapêuticas 15 , assim<br />

como <strong>para</strong> testes genéticos. 16 O teste da gota seca t<strong>em</strong> sido muito utilizado<br />

com sucesso nos testes neonatais <strong>para</strong> defeitos congênitos, tais como<br />

a fenilcetonúria, oferecendo grande contribuição ao diagnóstico desse<br />

probl<strong>em</strong>a metabólico.<br />

Considerando as dificuldades técnicas <strong>para</strong> o diagnóstico clínico<br />

de an<strong>em</strong>ia, uma vez que o exame físico possui baixa sensibilidade, o exame<br />

de sangue é invasivo e a utilização de h<strong>em</strong>oglobinômetro foi considerada<br />

inviável por razões técnicas e econômicas, propõe-se estimar a


I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />

165<br />

prevalência de an<strong>em</strong>ia <strong>em</strong> mulheres e crianças menores de 5 anos pela<br />

técnica de gota seca.<br />

Esse método possui como vantagens:<br />

• a coleta das amostras é relativamente indolor, não invasiva e pode ser feita<br />

no domicílio, com menor necessidade de pessoal altamente qualificado;<br />

• as amostras dispensam centrifugação, se<strong>para</strong>ção ou congelamento imediato<br />

e proteção especial <strong>para</strong> transporte, como congelamento;<br />

• uma vez no laboratório, as amostras permanec<strong>em</strong> estáveis, congeladas<br />

por longos períodos. Uma gota típica contém 50 mcL de sangue total e<br />

t<strong>em</strong> aproximadamente 12 mm de diâmetro, permitindo a obtenção de até<br />

7 discos de 3,2 mm.<br />

A principal desvantag<strong>em</strong> desse método é que, no momento, poucos laboratórios<br />

comerciais ou acadêmicos têm experiência direta com ele.<br />

Utilizando essa técnica, foram analisadas 3.455 amostras de sangue<br />

de crianças de 6 a 59 meses e 5.669 amostras de sangue de mulheres<br />

não grávidas de 15 a 49 anos de idade <strong>para</strong> a determinação de h<strong>em</strong>oglobina.<br />

As amostras de sangue coletadas <strong>em</strong> papel de filtro foram secas<br />

ao ar ambiente <strong>para</strong> posterior quantificação por meio de kit laboratorial<br />

(Labtest®, Brasil).<br />

Em crianças, os critérios diagnósticos <strong>para</strong> an<strong>em</strong>ia, considerando-<br />

-se a faixa etária e as recomendações da OMS, são: an<strong>em</strong>ia leve (h<strong>em</strong>oglobina<br />

na faixa de > 9 a < 11 g/dL), an<strong>em</strong>ia moderada (h<strong>em</strong>oglobina entre<br />

7 e 9 g/dL) e an<strong>em</strong>ia grave (abaixo de 7 g/dL). 17<br />

Os principais resultados desse estudo mostram que a prevalência<br />

de an<strong>em</strong>ia <strong>em</strong> mulheres não grávidas é de 33% entre 15 e 19 anos, 29,2%<br />

entre 20 e 35 anos e 28,3% entre 36 e 49 anos. A região Nordeste apresentou<br />

a maior prevalência (39,1%), seguida das regiões Sudeste (28,5%),<br />

Sul (24,8%), Centro-oeste (20,1%) e Norte (19,3%).<br />

Em crianças de 6 a 59 meses de idade, a prevalência de an<strong>em</strong>ia seguiu<br />

a mesma tendência apresentada pelas mulheres, sendo a maior na


166<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

região Nordeste (25,5%), seguida das regiões Sudeste (22,6%), Sul (21,5%),<br />

Centro-oeste (11%) e Norte (10,4%). A prevalência foi maior na área urbana<br />

(23,1%) e não houve diferença entre as faixas etárias estudadas.<br />

No Brasil, os dados de prevalência de an<strong>em</strong>ia variam de 22,7 a 77%,<br />

e nas diferentes regiões essas discrepâncias estão relacionadas aos fatores<br />

socioeconômicos. 18<br />

Vale destacar que essa é a primeira pesquisa com gota seca realizada<br />

no Brasil e que o trabalho no laboratório ocorreu de modo seguro,<br />

sendo as amostras recebidas e identificadas conforme enviadas, ou seja,<br />

nenhum envelope foi violado ou rasurado, e o processamento das amostras<br />

seguiu o fluxo de chegada, s<strong>em</strong> acúmulo excessivo.<br />

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />

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I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />

167<br />

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2004; 4(2):121-3.


TABELA BRASILEIRA DE<br />

COMPOSIÇÃO DE ALIMENTOS<br />

DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO<br />

(TBCA-USP)<br />

Eliana Bistriche Giuntini<br />

Elizabete Wenzel de Menezes<br />

Franco Maria Lajolo<br />

INTRODUÇÃO<br />

Informações <strong>em</strong> relação ao conteúdo de nutrientes e de outros componentes<br />

de alimentos, in natura e processados, são necessárias <strong>para</strong> a elaboração<br />

de programas nos campos da nutrição, saúde e educação, além<br />

de agricultura, indústria e marketing de alimentos. 1 De acordo com Sevenhuysen<br />

2 , “os benefícios econômicos de dados de composição de boa<br />

qualidade <strong>para</strong> a indústria e políticas governamentais são de fundamental<br />

importância”, tanto na padronização e na regulamentação de alimentos,<br />

como no favorecimento do comércio internacional, por meio da<br />

rotulag<strong>em</strong>.<br />

Segundo Southgate 3 , bancos de dados de alimentos são usados <strong>para</strong><br />

inúmeras atividades, porém todos os usuários têm algumas expectativas<br />

comuns. Eles esperam que os dados represent<strong>em</strong> os alimentos de sua região,<br />

que tenham sido obtidos por métodos de análise apropriados, de<br />

maneira criteriosa, e que reflitam a composição real do alimento.<br />

Dados de composição de alimentos, utilizados <strong>para</strong> determinar a<br />

ingestão de nutrientes, dev<strong>em</strong> representar alimentos consumidos na


170<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

atualidade, a fim de que seja possível relacionar a ingestão alimentar e a<br />

função metabólica. 4 Durante a década de 1990, inúmeros avanços baseados<br />

<strong>em</strong> dados epid<strong>em</strong>iológicos esclareceram o papel das dietas na redução de<br />

risco e no controle da morbidade e da mortalidade pr<strong>em</strong>atura resultante<br />

de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), como obesidade, diabetes,<br />

doenças cardiovasculares, hipertensão e alguns tipos de câncer. 5<br />

Esses avanços só foram possíveis graças à evolução dos métodos<br />

analíticos, que, cada vez mais, são capazes de fornecer informações fidedignas<br />

sobre a composição química dos alimentos.<br />

O INÍCIO DOS ESTUDOS DE COMPOSIÇÃO<br />

DOS ALIMENTOS<br />

Durante séculos, estudos químicos começaram a fundamentar o que seria<br />

o estudo sist<strong>em</strong>ático sobre composição de alimentos. Em 1665, Robert<br />

Hooke publicou uma teoria sobre combustão; Scheele, na Suécia,<br />

e Priestley, na Inglaterra, descobriram, independent<strong>em</strong>ente, o oxigênio;<br />

Cavendish identificou o hidrogênio <strong>em</strong> 1766; e Black, da University of<br />

Glasgow, descobriu a formação de gás carbônico na respiração, <strong>em</strong> 1757.<br />

Essas descobertas, não diretamente ligadas à nutrição, permitiram a Lavoisier,<br />

<strong>em</strong> 1780, d<strong>em</strong>onstrar a natureza da combustão e entender o processo<br />

de produção de energia <strong>em</strong> relação ao alimento. 6,7<br />

Mulder, <strong>em</strong> 1838, introduziu o termo proteína <strong>em</strong> estudos sobre albumina.<br />

Magendie mostrou que as proteínas pod<strong>em</strong> ter diferentes constituições<br />

e publicou, <strong>em</strong> 1841, um trabalho com<strong>para</strong>ndo a proteína da gelatina<br />

à da carne 6,7 , mas só <strong>em</strong> 1909 Thomas introduziu o conceito de qualidade<br />

proteica e o método <strong>para</strong> identificar o valor biológico das proteínas. 7<br />

O conhecimento sobre respiração e calorimetria permitiu o estudo<br />

sobre a necessidade energética do hom<strong>em</strong>. Von Voit, professor de fisiologia<br />

da University of Munich, foi o principal pesquisador dessa linha;<br />

junto a Pettenkofer, conduziu muitos estudos sobre metabolismo e influenciou<br />

Henneberger. Por toda sua contribuição, Lavoisier foi considerado<br />

o pai da composição química. 6


I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />

171<br />

Em 1850, um grupo de pesquisadores al<strong>em</strong>ães, comandado por<br />

Henneberger e Stohmann, iniciou a análise de composição centesimal<br />

de alimentos, <strong>em</strong> ração animal. Essa proposta foi chamada de método<br />

Weende e tornou-se um procedimento comum <strong>em</strong> alimentos: determinação<br />

da umidade por meio de secag<strong>em</strong> por aquecimento (heat-drying);<br />

determinação dos lipídios por meio de extração contínua com éter;<br />

teor de proteína obtido pela aplicação do fator 6,25 ao conteúdo de nitrogênio;<br />

fibra bruta determinada pela fração insolúvel após tratamento<br />

com ácido e álcali <strong>em</strong> resíduo s<strong>em</strong> minerais e gordura; e carboidratos<br />

calculados por diferença. A utilização do fator 6,25 <strong>para</strong> a conversão<br />

de nitrogênio <strong>em</strong> proteína baseou-se no conteúdo de 16% desse componente<br />

<strong>em</strong> proteína animal isolada, considerando que toda proteína<br />

contém a mesma quantidade de nitrogênio e que todo o nitrogênio é<br />

produto da proteína. No entanto, soube-se mais tarde que ambas as hipóteses<br />

não eram verdadeiras. 8,9<br />

A aplicação desses conceitos na ciência da nutrição foi feita por<br />

Max Rubner, médico e fisiologista al<strong>em</strong>ão, que, com sua equipe, <strong>em</strong> 1894,<br />

conseguiu d<strong>em</strong>onstrar com um cão o resultado da combustão de alimentos<br />

pela excreção da ureia e das trocas gasosas ao mesmo t<strong>em</strong>po. 10<br />

A investigação sist<strong>em</strong>ática do conteúdo de energia bruta dos alimentos<br />

pode ser atribuída a Rubner, na Al<strong>em</strong>anha, e a Atwater (que estudou<br />

com Rubner) nos Estados Unidos, usando bombas calorimétricas.<br />

Rubner, além de determinar a densidade energética de vários alimentos,<br />

d<strong>em</strong>onstrou que o corpo humano não consegue aproveitar toda a energia<br />

proveniente da combustão dos alimentos. Atwater e Bryant aprofundaram<br />

esses estudos e determinaram coeficientes de disponibilidade<br />

energética (Tabela 1) <strong>para</strong> os macronutrientes 11 , por meio da determinação<br />

do conteúdo de lipídios e nitrogênio de alimentos consumidos <strong>em</strong><br />

dietas mistas e da urina e fezes de indivíduos que consumiram essas dietas.<br />

Os carboidratos resultaram da diferença entre a quantidade total de<br />

material orgânico e a soma de proteína e gordura.


172<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

TABELA 1 Fatores de Atwater <strong>para</strong> combustão, coeficiente de disponibilidade e<br />

energia disponível <strong>para</strong> macronutrientes <strong>em</strong> uma dieta mista<br />

MACRONU-<br />

ENERGIA DE<br />

COEFICIENTE DE<br />

ENERGIA DISPONÍVEL<br />

TRIENTE<br />

COMBUSTÃO<br />

DISPONIBILIDADE<br />

POR TOTAL DE<br />

(KCAL/G)<br />

(%)<br />

NUTRIENTE (KCAL/G)<br />

Proteínas 5,65 92 4*<br />

Lipídios 9,4 95 8,9<br />

Carboidratos 4,1 97 4<br />

*Corrigido <strong>para</strong> material não oxidado na urina (5,65 kcal/g × 0,923 – 1,25 kcal/g).<br />

Fonte: Buchholz e Schoeller, 2004. 11<br />

Em 1941, Jones 12 sugeriu que o fator de conversão 6,25 <strong>para</strong> cálculo<br />

de proteína fosse substituído por fatores específicos, baseado no conhecimento<br />

de que o nitrogênio pode estar presente <strong>em</strong> outros compostos,<br />

como aminoácidos livres, nucleotídeos, creatina e colina, cujo nitrogênio<br />

não proteico (NPN) está disponível apenas <strong>em</strong> parte <strong>para</strong> a síntese<br />

de aminoácidos não essenciais, e que o conteúdo de nitrogênio varia de<br />

acordo com o peso molecular dos aminoácidos. Desse modo, o percentual<br />

de nitrogênio pode variar de 13 a 19%, dependendo da composição<br />

de aminoácidos. Esses fatores específicos, chamados fatores específicos<br />

de Jones, apresentam variação de 5,3 <strong>para</strong> algumas nozes ou s<strong>em</strong>entes a<br />

6,4 <strong>para</strong> o leite. 13<br />

Em 1955, Merrill e Watt refinaram os fatores do sist<strong>em</strong>a de Atwater,<br />

criando outros ainda mais específicos, baseados na variação do calor de<br />

combustão e no coeficiente de digestibilidade de diferentes proteínas, lipídios<br />

e carboidratos. 14 Esses fatores, com poucas modificações, foram<br />

republicados <strong>em</strong> 1973. 13,14 Paralelamente, Southgate e Durnin 15 testaram<br />

novamente os fatores gerais de Atwater <strong>em</strong> 1970 e concluíram por sua<br />

validade, exceto quando há grande consumo de carboidratos não disponíveis,<br />

pois há aumento de excreção de lipídios, nitrogênio fecal e, consequent<strong>em</strong>ente,<br />

da energia derivada desses nutrientes.


I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />

173<br />

De acordo com Dwyer 16 , os estudos sobre composição de alimentos<br />

passaram por quatro revoluções. A primeira, com Atwater, descreveu<br />

a energia advinda dos alimentos; a segunda trouxe a caracterização<br />

de vitaminas e minerais, que se mostraram importantes <strong>para</strong> evitar as<br />

doenças decorrentes de sua deficiência; na terceira, conhecendo-se melhor<br />

a composição dos alimentos, foram feitas associações entre dieta e<br />

doenças, incluindo as relacionadas à má nutrição e as DCNT; e a quarta<br />

relacionou-se com a descoberta de outras substâncias nos alimentos<br />

que também pod<strong>em</strong> afetar a saúde humana, como os compostos bioativos<br />

e fatores antinutricionais, que vêm sendo estudados e evidenciam<br />

que há um amplo campo de atuação a ser explorado.<br />

Possivelmente, a quinta revolução deverá estar relacionada com a<br />

biodiversidade. Segundo a Organização das Nações Unidas <strong>para</strong> Agricultura<br />

e Alimentação (FAO), o amplo conhecimento das informações<br />

de composição de alimentos de diferentes culturas das diversas regiões<br />

e países é importante <strong>para</strong> garantir a preservação e o uso sustentável da<br />

biodiversidade <strong>em</strong> programas de segurança alimentar e nutrição humana.<br />

AS PRIMEIRAS TABELAS DE<br />

COMPOSIÇÃO DE ALIMENTOS<br />

• 1844 – O francês Boussingault publicou uma tabela sobre o valor nutricional<br />

da ração animal. 6<br />

• 1851 – O al<strong>em</strong>ão Liebig publicou uma tabela com o valor nutritivo de alimentos<br />

baseado no conceito de alimentos plásticos ou nitrogenados e não<br />

nitrogenados. 6,9<br />

• 1878 – Konig publicou a primeira tabela europeia na Al<strong>em</strong>anha, Ch<strong>em</strong>ie<br />

der Menschlichen Nahrungs und Genussmittel. 17<br />

• 1891 – Jenkins e Winton publicaram a Compilation of Analyses of American<br />

Feeding Stuffs, com dados de análise de grãos e hortaliças. 6<br />

• 1894 – Atwater lançou uma primeira tabela oficial norte-americana de<br />

composição de alimentos – Foods: Nutritive Value and Cost. 18


174<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

• 1896 – Atwater e Wood 8 publicaram o Boletim 28 do United States Department<br />

of Agriculture (USDA) com The Ch<strong>em</strong>ical Composition of<br />

American Food Materials.<br />

• 1906 – Atwater et al. editaram uma revisão do Boletim 28. 6<br />

• 1916 – McKillop publicou, na Grã-Bretanha, uma tabela com muitos dados<br />

de alimentos norte-americanos. 6<br />

• 1921 – Plimmer publicou Analyses and Energy Valuers of Foods <strong>em</strong><br />

Londres. 17<br />

• 1925 – McKillop publicou a terceira edição da tabela, já com dados de alimentos<br />

britânicos, mas com influência de Atwater. 6<br />

• 1933 – McCance e Shipp publicaram, <strong>em</strong> Londres, The Ch<strong>em</strong>ie of Flesh<br />

Foods and their Losses on Cooking. 17<br />

• 1936 – Waller, do University of Michigan Hospital, publicou Nutritive Values<br />

of Foods, com dados sobre vitaminas. 6<br />

• 1937 – O USDA publicou Vitamin Content of Foods, com dados sobre vitaminas<br />

A, B, D, G e ácido ascórbico, compilados por Daniel e Munsell. Não<br />

havia dados sobre vitamina E, e os autores explicaram que se sabia que a<br />

riboflavina era essencial <strong>para</strong> algumas espécies, <strong>em</strong>bora fosse desconhecido<br />

seu papel <strong>para</strong> o hom<strong>em</strong>. 6<br />

• 1940 – Chatfield e Adams publicaram, pelo USDA, uma atualização da tabela<br />

de 1906, Proximate Composition of American Food Materials. O termo<br />

“proximal” foi utilizado <strong>em</strong> reconhecimento de que cada componente<br />

é composto por substâncias que têm propriedades <strong>em</strong> comum, mas<br />

que também pod<strong>em</strong> conter pequenas quantidades de outras substâncias<br />

ainda não conhecidas do ponto de vista químico. Não havia dados<br />

de vitaminas. 6<br />

• 1940 – McCance e Widdowson publicaram The Ch<strong>em</strong>ical Composition<br />

of Foods, na Inglaterra, já apresentando maior divergência com relação<br />

aos dados norte-americanos, principalmente <strong>em</strong> função dos métodos<br />

aplicados. 6,17<br />

• 1942 – Booher, Hartzler e Hewston publicaram Vitamin Values of Foods<br />

in Relation to Processing and Other Variants, <strong>em</strong> que são relacionados os


I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />

175<br />

fatores que afetam o teor de vitaminas, como variedade, método de cultivo,<br />

local de produção, processamento, estocag<strong>em</strong>, grau de maturação e<br />

métodos de análise. 6<br />

• 1942 – Vitamin Values of Foods in Terms of Common Measures foi publicado<br />

por Hewston e Marsh. Esses dados foram utilizados na publicação<br />

Table of Food Values Recommended for Use in Canada, no mesmo ano. 6<br />

• 1945 – Tables of Food Composition in Terms of Eleven Nutrients foi publicado<br />

pelo USDA, com dados de energia, proteína, lipídios, carboidratos,<br />

cálcio, fósforo, ferro, vitamina A, tiamina, riboflavina, niacina e ácido<br />

ascórbico. 6<br />

• 1944 a 1959 – Vários países lançaram suas primeiras tabelas: Vietnã, França,<br />

Al<strong>em</strong>anha, Noruega, Itália, Groelândia, Holanda, Grécia, África do<br />

Sul, Austrália, Japão, Filipinas, Índia, Coreia, Egito, Havaí. 6<br />

• 1949 – A FAO publicou pela primeira vez uma tabela de composição, Food<br />

Composition Tables for International Use, de Chatfield, na qual há uma referência<br />

datada de 1948 sobre dados de alimentos brasileiros. 18<br />

• 1954 – A FAO lançou, do mesmo autor, Food Composition Tables – Minerals<br />

and Vitamins – for International Use, a fim de compl<strong>em</strong>entar a tabela<br />

anterior. 6<br />

• 1961 – Foi lançada a primeira tabela <strong>para</strong> a América Latina – Food Composition<br />

Table for use in Latin America, de Leung e Flores –, cujos dados<br />

foram utilizados <strong>em</strong> programas de políticas governamentais <strong>em</strong> nutrição<br />

e saúde. Entretanto, muitos países na América Latina já tinham suas próprias<br />

tabelas (Tabela 2). 1<br />

Com o progresso da ciência da nutrição, referente às necessidades nutricionais<br />

e ao entendimento sobre a variabilidade do conteúdo dos nutrientes,<br />

tornou-se evidente a importância de aprimorar o conhecimento<br />

sobre os alimentos típicos de cada região. Assim, a partir de 1958, a<br />

FAO iniciou um programa de criação e publicação de tabelas de composição<br />

de alimentos regionais. 2


176<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

TABELA 2<br />

Publicações de tabelas de composição de alimentos na América Latina<br />

PAÍS/REGIÃO<br />

PRIMEIRAS PUBLICAÇÕES<br />

América Latina 1961<br />

Argentina 1935 a 1942<br />

Bolívia 1966<br />

Brasil 1948* a 1950<br />

Chile 1961<br />

Colômbia 1944<br />

Equador 1954<br />

México 1940<br />

Peru 1960<br />

República Dominicana 1964<br />

Uruguai 1949<br />

Venezuela 1950<br />

*1948 – citada pela FAO. 18<br />

Fonte: Bressani. 1<br />

ATUAÇÃO DA FAO E DA UNITED NATIONS UNIVERSITY<br />

APÓS A DÉCADA DE 1980<br />

Depois de colaborar na elaboração das tabelas regionais de composição<br />

de alimentos, a FAO reduziu suas atividades nessa área na década de<br />

1970, quando <strong>completo</strong>u sua série de tabelas. 19<br />

Anos mais tarde, baseada na recomendação de um grupo internacional<br />

coordenado pela United Nations University (UNU), <strong>em</strong> 1984, foi<br />

criada a International Network of Food Data Syst<strong>em</strong>s (Infoods), com o<br />

objetivo de estimular e coordenar esforços <strong>para</strong> melhorar a qualidade e<br />

a disponibilidade de dados analíticos de alimentos pelo mundo. 20<br />

Na América Latina, <strong>em</strong> 1986, ocorreu a primeira Conferência sobre<br />

Composição de Alimentos no Instituto de Nutrición de Centroamérica<br />

y Panamá (Incap), que visava a avaliar o grau de desenvolvimento


I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />

177<br />

das tabelas de composição dos países individualmente e por região, propor<br />

programas <strong>para</strong> atingir os objetivos propostos pelo Infoods e, ainda,<br />

desenvolver uma rede de trabalho de composição de alimentos na América<br />

Latina – o Latinfoods. 1<br />

Após a International Conference on Nutrition <strong>em</strong> 1992, a FAO, por<br />

meio do Infoods, v<strong>em</strong> propondo novas diretrizes e critérios <strong>para</strong> a área<br />

de composição de alimentos, publicando guias e manuais com protocolos<br />

a ser<strong>em</strong> usados na geração e compilação de dados e ampliando a comunicação<br />

e o intercâmbio de informações entre laboratórios. Outra<br />

proposta surgida nessa década foi a de incentivar a cooperação entre os<br />

governos e a indústria de alimentos, <strong>para</strong> o uso de dados de composição<br />

na informação pública e a promoção do comércio. 2 As instituições governamentais,<br />

por sua vez, dev<strong>em</strong> usar dados de composição de alimentos<br />

na formulação de políticas de saúde, alimentação e segurança alimentar,<br />

de acordo com a necessidade de grupos populacionais.<br />

A estratégia da FAO é a aplicação de um modelo regional de atuação,<br />

baseado na comunicação e no controle de qualidade, e t<strong>em</strong> como<br />

meta a geração, a diss<strong>em</strong>inação e a promoção do uso da informação de<br />

composição de alimentos de alta qualidade e <strong>em</strong> larga escala por profissionais,<br />

pesquisadores e instituições governamentais. O modelo fornece<br />

bases <strong>para</strong> a geração e a distribuição dos dados por meio de padrões e<br />

critérios continuamente revisados e dá suporte a comitês governamentais<br />

e instituições representativas <strong>para</strong> a supervisão de procedimentos e<br />

atividades relacionadas. 19<br />

Em âmbito internacional, a padronização é necessária <strong>para</strong> aumentar<br />

a difusão e o intercâmbio de dados. Os bancos de dados dev<strong>em</strong> ser<br />

compatíveis e padronizados, pois, dessa forma, o trabalho harmonizado<br />

promove a redução de gastos associados à geração e à manutenção<br />

de dados de composição <strong>em</strong> uma base global e, consequent<strong>em</strong>ente, diminui<br />

custos de produção de dados <strong>em</strong> países <strong>em</strong> desenvolvimento. 19<br />

Uma das propostas de padronização é a adoção de identificadores<br />

<strong>para</strong> os nutrientes. 20-23 Esses identificadores do Infoods (tagnames)<br />

representam o nutriente/componente de forma inequívoca, de acordo


178<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

com o método utilizado na análise, unidade e sua utilização <strong>em</strong> diferentes<br />

tabelas (Tabela 3).<br />

Uma das principais preocupações da FAO é referente à qualidade<br />

das informações. Os sist<strong>em</strong>as propostos <strong>para</strong> avaliação dos dados levam<br />

<strong>em</strong> conta o plano de amostrag<strong>em</strong>, o número de amostras e tratamento<br />

dado a elas, o método analítico e o controle de qualidade analítica (exatidão<br />

e precisão). Esses aspectos e números estão relacionados a conceitos<br />

de abrangência e representatividade que, aliados à documentação e à<br />

harmonização das informações, são a chave <strong>para</strong> a obtenção de um banco<br />

de dados de qualidade.<br />

TABELA 3 Ex<strong>em</strong>plos de identificadores (tagnames) do Infoods adotados <strong>para</strong> a<br />

descrição de cada componente<br />

NUTRIENTES UNIDADES IDENTIFICADORES/DESCRIÇÃO<br />

Umidade g Umidade <strong>em</strong> estufa a 105 o C<br />

Lipídios totais g Lipídios totais<br />

Lipídios totais obtidos por meio de extração<br />

contínua (método Soxhlet)<br />

Proteínas g Proteína total. Para cálculo das proteínas a partir<br />

do nitrogênio total, foram usados fatores de conversão da<br />

FAO/73*<br />

Produtos animais: carnes e peixes - 6,25; gelatina - 5,55; leite<br />

e derivados - 6,38; caseína - 6,40; leite humano - 6,37; ovo:<br />

inteiro - 6,25, albumina - 6,32, vitelina - 6,12<br />

Produtos vegetais: trigo: inteiro - 5,83, farelo - 6,31, <strong>em</strong>brião<br />

- 5,80, endosperma - 5,70; arroz e farinha de arroz - 5,95;<br />

centeio e farinha de centeio - 5,83; cevada e farinha de cevada<br />

- 5,83; aveia - 5,83; milho - 6,25; feijões - 6,25; soja - 5,71<br />

Oleaginosas: castanha-do-pará - 5,46; outras - 5,30<br />

Para os d<strong>em</strong>ais alimentos foi utilizado o fator 6,25<br />

(continua)


I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />

179<br />

(continuação)<br />

Fibra alimentar<br />

total<br />

Carboidratos<br />

disponíveis<br />

por diferença<br />

g<br />

g<br />

Fibra alimentar total determinada por método<br />

enzímico-gravimétrico ou não enzímico-gravimétrico (<strong>para</strong><br />

alimentos com baixo teor de amido) da AOAC** (24,25)<br />

Carboidratos metabolizáveis. Exclui a fração<br />

fibra alimentar (100 g – gramas totais de umidade, proteína,<br />

lipídios, cinzas e fibra alimentar)<br />

Energia kJ Energia total metabolizável expressa <strong>em</strong><br />

AOAC: Association of Official Agricultural Ch<strong>em</strong>ists.<br />

* Merril e Watt, 1973. 13<br />

** Cho et al., 1997; 24 Li e Cardozo, 1992. 25<br />

quilojoule (kJ), calculada a partir da energia dos nutrientes,<br />

considerando os fatores de conversão de Atwater: (17 × g<br />

proteína)+ (16 × g carboidratos (total de carboidratos - fibra<br />

alimentar) + (37 × g total de lipídios) + (29 × g de etanol)<br />

PERFIL DAS PRINCIPAIS TABELAS<br />

UTILIZADAS NO BRASIL<br />

• 1948 – Tabela de Alimentos Brasileiros, do Serviço de Alimentação da<br />

Previdência Social: 18 foi citada pela FAO <strong>em</strong> 1949, na publicação Food<br />

Composition Tables for International Use, mas não há informações sobre<br />

a orig<strong>em</strong> dos dados.<br />

• 1951 – Tabela de Composição Química de Alimentos, de Guilherme Franco,<br />

do Serviço de Alimentação da Previdência Social: 26 foi reeditada inúmeras<br />

vezes, <strong>em</strong>bora não apresente informações sobre a forma de obtenção<br />

dos dados e nunca tenha sido atualizada.<br />

• 1977 – Tabelas de Composição de Alimentos – Estudo Nacional de Despesas<br />

Familiares do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE): 27<br />

adaptada aos objetivos do Endef, essa tabela é uma compilação de dados<br />

nacionais e internacionais, quando foram escolhidos os dados mais representativos,<br />

considerando-se números de amostras e métodos analíticos<br />

utilizados na época. Essas informações são mencionadas na parte introdutória<br />

da publicação, onde também é identificada sua orig<strong>em</strong>. As publicações<br />

e metodologias utilizadas são das décadas de 1960 e 1970; <strong>em</strong>


180<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

função disso, os dados sobre fibra apresentados refer<strong>em</strong>-se à fibra bruta e,<br />

no caso de vitaminas e minerais, são pouco precisos. Apresentam o nome<br />

científico dos alimentos e informações de alimentos crus e pre<strong>para</strong>dos.<br />

• 1995 – Tabela de Composição de Alimentos, de Mendez et al.: editada pela<br />

Universidade Federal Fluminense 28 , apresenta informações sobre preparo<br />

das amostras, nome científico, nome <strong>em</strong> espanhol e <strong>em</strong> inglês dos alimentos<br />

e metodologia utilizada na análise. Contudo, a fibra insolúvel foi obtida<br />

com solução detergente (ácido e neutro) e, a solúvel, por método que<br />

determina parte da pectina, de modo que os dados pod<strong>em</strong> estar subestimados,<br />

assim como os dados sobre energia.<br />

• 1998 – Tabela Brasileira de Composição de Alimentos – Universidade de<br />

São Paulo (TBCA-USP), Brasilfoods, Faculdade de Ciências Farmacêuticas<br />

da Universidade de São Paulo 29 : trata-se da primeira tabela da América<br />

Latina a ser disponibilizada na internet e v<strong>em</strong> sendo constant<strong>em</strong>ente atualizada.<br />

Adota padrões internacionais (Infoods/Latinfoods) no que se refere<br />

aos métodos analíticos e à identificação de alimentos e nutrientes; apresenta<br />

os alimentos de maneira detalhada (nome científico, parte do alimento,<br />

processamento, grau de maturação, etc.) e os dados por 100 g, b<strong>em</strong> como<br />

por medidas caseiras mais utilizadas ao respectivo alimento. É a primeira<br />

tabela que conta com informações sobre as diferentes frações de carboidratos<br />

e resposta glicêmica. As informações são encontradas pelo sist<strong>em</strong>a<br />

de busca por alimento, que contém dados de 2.089 alimentos entre composição<br />

centesimal, fibra alimentar, amido resistente, vitamina A e carotenoides,<br />

ácidos graxos e colesterol. É também a primeira tabela que conta<br />

com informações sobre diferentes frações de carboidratos e resposta glicêmica.<br />

Os dados sobre fibra alimentar foram obtidos por método enzímico-gravimétrico,<br />

há informações sobre carboidratos totais e disponíveis e<br />

os dados sobre energia são apresentados <strong>em</strong> quilocaloria (kcal) e quilojoule<br />

(kJ), calculados sobre o teor de carboidratos disponíveis, ou seja, não inclu<strong>em</strong><br />

a fibra alimentar. 30 Oferece, ainda, informações sobre porções recomendadas<br />

pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e sobre<br />

a orig<strong>em</strong> dos dados. 31


I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />

181<br />

• 2001 – Tabela de Composição de Alimentos – Suporte <strong>para</strong> Decisão Nutricional<br />

de Philippi 32 : t<strong>em</strong> como base o banco de dados utilizado no Virtual<br />

Nutri, um programa de nutrição e cálculo de dietas da Faculdade<br />

de Saúde Pública da Universidade de São Paulo 33 , que traz dados de várias<br />

tabelas, nacionais e internacionais, e dados de rótulos de produtos<br />

industrializados.<br />

• 2004 – Tabela Brasileira de Composição de Alimentos (Taco), do Núcleo<br />

de Estudos e Pesquisa <strong>em</strong> Alimentação da Universidade Estadual de<br />

Campinas (Nepa/Unicamp): é uma tabela com dados de energia, macronutrientes,<br />

fibra alimentar, vitaminas, minerais de dados de frações de<br />

ácidos graxos de 495 alimentos, considerados representativos do hábito<br />

alimentar brasileiro. O teor energético foi obtido utilizando-se dados de<br />

carboidratos totais, o que inclui a fração de fibra alimentar.<br />

É importante destacar a elaboração de manuscritos internos (compilados<br />

e traduzidos de dados internacionais) <strong>para</strong> seu <strong>em</strong>prego <strong>em</strong> unidades<br />

e instituições, como os utilizados na Faculdade de Saúde Pública,<br />

no Curso de Graduação de Nutricionistas, durante as décadas de 1970<br />

e 1980.<br />

TBCA-USP<br />

A TBCA-USP 29 , criada <strong>em</strong> 1998, v<strong>em</strong> sendo elaborada mediante a adoção<br />

de uma série de critérios que inclu<strong>em</strong> informações referentes a<br />

amostrag<strong>em</strong>, procedimento analítico e identificação detalhada do alimento,<br />

conferindo confiabilidade aos dados analisados diretamente ou<br />

compilados a ser<strong>em</strong> incluídos. 34-36<br />

A Rede Brasileira de Dados de Composição de Alimentos (Brasilfoods)<br />

A iniciou suas atividades na década de 1980 e, ao longo dos anos,<br />

v<strong>em</strong> discutindo aspectos relacionados à importância da obtenção de<br />

dados de qualidade. Entre esses aspectos, estão os estudos colaborativos<br />

<strong>para</strong> aferição de técnicas analíticas <strong>para</strong> nutrientes críticos, com a<br />

realização de estudos <strong>para</strong> composição centesimal, aminoácidos, fibra


182<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

alimentar, vitamina A e carotenoides; compilação de dados com avaliação<br />

e documentação de metodologia utilizada; e integração com<br />

organismos internacionais, como Infoods, que define normas e padrões,<br />

com base científica, na área de composição de alimentos. 37,38<br />

Uma primeira iniciativa de compilação de dados nacionais no início<br />

da década de 1990 detectou a reduzida qualidade dos dados de composição<br />

de alimentos. 39 Muitos alimentos, basicamente de orig<strong>em</strong> vegetal,<br />

não apresentavam a descrição dos métodos analíticos utilizados<br />

ou haviam sido analisados por métodos inadequados, principalmente<br />

<strong>em</strong> relação à fibra alimentar (FA). Inúmeros dados foram descartados,<br />

outros foram utilizados após a compl<strong>em</strong>entação de informação com<br />

a realização de análise da FA por métodos validados pela Faculdade<br />

de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (FCF/USP). 35<br />

Dessa forma, reiterou-se a necessidade de uniformizar procedimentos<br />

analíticos.<br />

O Projeto Integrado de Composição de Alimentos, criado pelo<br />

Brasilfoods, t<strong>em</strong> como objetivo principal a elaboração e a manutenção<br />

de uma tabela nacional de composição de alimentos, mediante a análise<br />

de novos alimentos, da compilação e avaliação da qualidade de dados<br />

de composição. Para tanto, foi criado um banco de dados de alimentos<br />

brasileiros, baseado nas diretrizes preconizadas pelo Infoods e adotadas<br />

pelo Latinfoods, relativas à identificação de nutrientes e alimentos, que<br />

visam a facilitar a troca de informações entre pesquisadores da área e<br />

bancos de dados de diferentes regiões do mundo. 34,30<br />

A TBCA-USP, que se tornou realidade <strong>em</strong> 1998, é o resultado da<br />

soma de esforços de mais de 27 laboratórios participantes do Projeto Integrado<br />

de Composição de Alimentos. É coordenada pela Rede Brasileira<br />

de Dados de Composição de Alimentos (Brasilfoods)/Departamento<br />

de Alimentos e Nutrição Experimental da FCF/USP e visa a disponibilizar<br />

informações de qualidade sobre composição de alimentos. 30<br />

Esses esforços foram reconhecidos pelo Ministério da Saúde,<br />

que indicou a TBCA-USP como referência <strong>para</strong> o estabelecimento da


I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />

183<br />

Resolução RDC 40, da Anvisa, sobre a rotulag<strong>em</strong> nutricional obrigatória<br />

<strong>em</strong> alimentos e bebidas <strong>em</strong>baladas 40 , e da RDC 360 de dez<strong>em</strong>bro de<br />

2003 31 , que substituiu a RDC 40 <strong>para</strong> se tornar compatível com o Mercado<br />

Comum do Sul (Mercosul).<br />

O Brasilfoods, além de centralizar as informações nacionais de<br />

composição de alimentos, colabora com a Tabla de Composición de Alimentos<br />

de América Latina, disponibilizando suas informações atualizadas<br />

<strong>para</strong> essa base de dados e participando de atividades que têm como<br />

meta gerar, compilar e difundir informações adequadas e confiáveis sobre<br />

composição de alimentos na região, além de promover a melhoria<br />

da qualidade desses dados. 41<br />

De acordo com Greenfield e Southgate 36 , <strong>para</strong> a elaboração de tabelas<br />

de alimentos os dados de composição pod<strong>em</strong> ser obtidos de três formas:<br />

análise direta, compilação e análise/compilação. A análise direta é<br />

a forma ideal, mas envolve custo elevado, infraestrutura (equipamentos<br />

e pessoal treinado), padronização e validação de metodologias, entre<br />

outras variáveis. A compilação envolve uma base teórica complexa,<br />

com critérios preestabelecidos <strong>para</strong> avaliação cuidadosa da qualidade<br />

dos dados. Nessa avaliação, dev<strong>em</strong> ser considerados diversos fatores,<br />

como plano de amostrag<strong>em</strong>, descrição do tratamento dado à amostra,<br />

identificação e procedimento do método analítico adotado, fatores de<br />

conversão, controle de qualidade analítica, identificação detalhada dos<br />

nutrientes e alimentos. 34-36<br />

O banco de dados da TBCA-USP baseia-se <strong>em</strong> análises químicas<br />

efetuadas na FCF/USP e compilação de dados de alimentos nacionais, levantados<br />

<strong>em</strong> publicações, dissertações, teses, informações internas de laboratórios<br />

públicos e privados, b<strong>em</strong> como de indústrias de alimentos. Os<br />

dados levantados são avaliados criteriosamente <strong>para</strong> a verificação das informações<br />

disponíveis sobre a metodologia analítica utilizada, o plano de<br />

amostrag<strong>em</strong>, o número de amostras, o controle de qualidade analítica, o<br />

tratamento dado à amostra, a descrição detalhada do alimento, entre outros.<br />

Análises de certos componentes são, às vezes, efetuadas na FCF/USP


184<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

a fim de compl<strong>em</strong>entar a informação, como é o caso da FA ou, ainda, umidade<br />

e cinzas. A FA deve ser analisada por metodologia específica – enzímico-gravimétrico<br />

–, a fim de que o teor de carboidratos e o valor energético<br />

possam ser calculados de maneira adequada. 42<br />

Informações disponíveis na TBCA-USP<br />

Desde seu lançamento, a TBCA-USP passou por inúmeras modificações<br />

<strong>em</strong> termos de formato e introdução de dados de novos alimentos e componentes.<br />

Na Tabela 4, encontram-se as principais alterações e a evolução<br />

<strong>em</strong> número de dados de composição centesimal. O banco de dados<br />

da TBCA-USP é composto, atualmente, por várias planilhas: de dados<br />

de nutrientes por 100 g de alimento, de identificação geral do alimento<br />

e uma de medidas caseiras/unidade e porção recomendada. No website,<br />

é feita a interface entre essas planilhas utilizando o código alfanumérico<br />

de identificação do alimento. O nome do alimento é composto pela sequência<br />

de colunas preenchidas na planilha de identificação, que segue<br />

a mesma ord<strong>em</strong> do formulário de compilação, e o programa executa cálculos<br />

cruzando as informações do banco de dados por 100 g com os gramas<br />

correspondentes à(s) determinada(s) medida(s) caseira(s), que aparecerão<br />

no resultado da busca (Figuras 1 e 2), ao lado das informações<br />

por 100 g (Figura 3). 42<br />

Um resumo das informações disponíveis na TBCA-USP pode ser<br />

visto na Tabela 5. Como os carboidratos e a resposta glicêmica dos alimentos<br />

estão relacionados à redução de risco de desenvolvimento de<br />

DCNT, dados dessa natureza vêm sendo analisados na FCF/USP <strong>para</strong><br />

ser<strong>em</strong> incorporados à TBCA-USP. O mesmo acontece com as vitaminas,<br />

ácidos graxos, compostos bioativos (flavonoides, carotenoides, organossulfurados<br />

e fitosteróis).


I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />

185<br />

FIGURA 1 Página inicial da TBCA-USP 5.0.<br />

FIGURA 2 Ex<strong>em</strong>plo da página de resultados da busca na TBCA-USP 5.0.


186<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

FIGURA 3 Ex<strong>em</strong>plo de apresentação dos dados na TBCA-USP 5.0.


I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />

187<br />

TABELA 4 Versões, data de lançamento e número de alimentos com dados de<br />

composição centesimal da TBCA-USP<br />

VERSÃO<br />

DATA DE<br />

NÚMERO DE<br />

PRINCIPAIS ALTERAÇÕES<br />

LANÇAMENTO<br />

DADOS CC<br />

TBCA-USP 1.0 Julho/1998 300 Formato de tabela tradicional<br />

TBCA-USP 1.1 Março/1999 390 Número de dados<br />

TBCA-USP 2.0 Junho/2000 390 Apresentação gráfica<br />

TBCA-USP 3.0 Março/2001 696 Tabela blocada, divisão por grupos<br />

de alimentos, número de dados<br />

TBCA-USP 4.0 Julho/2004 1.205 Sist<strong>em</strong>a de busca por alimento,<br />

medidas caseiras, energia <strong>em</strong> kj,<br />

número de dados<br />

TBCA-USP 4.1 Nov<strong>em</strong>bro/2004 1.205 Sist<strong>em</strong>a de busca alimento/nutriente<br />

Conferência eletrônica<br />

TBCA-USP 5.0 Agosto/2008 1.205 Informações sobre frações de<br />

carboidratos e resposta glicêmica<br />

CC: composição centesimal.<br />

TABELA 5<br />

Resumo das informações disponíveis na TBCA-USP sobre número de<br />

alimentos e componentes<br />

COMPONENTE<br />

NÚMERO DE ALIMENTOS<br />

Composição centesimal* 1.205<br />

FA total** 194<br />

Amido resistente 128<br />

Vitamina A/carotenoides # 290<br />

Ácidos graxos/colesterol 119<br />

Fenilalanina ## 251<br />

Frações de carboidratos 112<br />

Resposta glicêmica 41<br />

FA: fibra alimentar.<br />

* Inclui dados de FA por métodos enzímico-gravimétrico.<br />

** FA por métodos enzímico-gravimétrico, s<strong>em</strong> composição centesimal.<br />

#<br />

Parte das amostras foram analisadas com se<strong>para</strong>ção de isômeros.<br />

##<br />

Link disponibilizado.


188<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

No it<strong>em</strong> “Como enviar dados”, o formulário <strong>para</strong> compilação de dados,<br />

acompanhado de manual de preenchimento, está disponível <strong>para</strong><br />

download, tanto <strong>para</strong> estimular a r<strong>em</strong>essa de dados como <strong>para</strong> incentivar<br />

os pesquisadores a divulgar<strong>em</strong> seus dados de maneira mais completa,<br />

a fim de que possam ser devidamente avaliados <strong>em</strong> termos de qualidade<br />

da informação. 30 Para facilitar o trabalho de compilação de dados<br />

e promover a uniformização das informações enviadas, o formulário é<br />

composto de planilhas de compilação independentes <strong>para</strong> os grupos de<br />

nutrientes: carboidratos, aminoácidos, ácidos graxos, minerais, vitaminas<br />

lipossolúveis, vitaminas hidrossolúveis, composição centesimal,<br />

além de incluir as planilhas <strong>para</strong> a identificação dos alimentos e <strong>para</strong><br />

avaliação da qualidade analítica dos dados. 43 Esse formulário e o manual<br />

de preenchimento foram traduzidos <strong>para</strong> o espanhol e vêm sendo utilizados<br />

por diversos países participantes do Latinfoods. 44<br />

Com a finalidade de facilitar a busca por informações de alimentos/produtos<br />

não cont<strong>em</strong>plados pela TBCA-USP, estão disponíveis aos<br />

usuá rios links com websites relacionados, assim como referências bibliográficas<br />

publicadas pela Rede Brasilfoods e outros órgãos internacionais<br />

relevantes na área de composição de alimentos e bancos de dados.<br />

Várias dessas publicações estão <strong>em</strong> formato portable document<br />

format (<strong>PDF</strong>), possibilitando arquivamento ou impressão. 30<br />

Com<strong>para</strong>ções e utilização de dados de alimentos de diferentes tabelas<br />

pod<strong>em</strong> ocorrer, porém algumas informações são imprescindíveis<br />

<strong>para</strong> tal. Entre as tabelas disponíveis na internet, a tabela dinamarquesa<br />

Danish Food Composition Databank 45 , a Souci-Fachmann-Kraut 46 ,<br />

a do U.S. Department of Agriculture 47 , a da rede Latinfoods 41 , a da<br />

Argentina 48 , a Tabela Brasileira de Composição de Alimentos (Taco) 49<br />

e a TBCA-USP apresentam dados de umidade e cinzas, o que possibilita<br />

a completa avaliação da composição centesimal, a conversão de<br />

dados <strong>para</strong> a base seca durante com<strong>para</strong>ções e a importação/exportação<br />

de dados.


I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />

189<br />

PROGRAMAS COMPUTADORIZADOS<br />

E VARIABILIDADE DE DADOS<br />

Ao se utilizar um programa computadorizado <strong>para</strong> cálculo de dietas ou<br />

consultar uma tabela de composição química de alimentos, deve-se ter<br />

<strong>em</strong> mente que os dados são valores médios, referentes a um determinado<br />

número de amostras analisadas. Portanto, variações entre tabelas são<br />

absolutamente normais, mesmo utilizando-se métodos analíticos oficiais,<br />

reconhecidos internacionalmente e validados. Segundo Klensin 20 ,<br />

“dados de composição de alimentos, assim como a maioria de outros dados<br />

científicos, raramente são verdadeiros ou falsos de forma absoluta”.<br />

Os alimentos, por seu caráter biológico, pod<strong>em</strong> conter diferentes<br />

teores de nutrientes, <strong>em</strong> função de variedade, safra, solo, clima, produção,<br />

formulação, entre outros; dessa forma, variações encontradas não<br />

pod<strong>em</strong> ser consideradas erros. No entanto, é de primordial importância<br />

a adoção de cuidados que envolvam desde a identificação detalhada do<br />

alimento até o controle da qualidade analítica, <strong>para</strong> garantir a qualidade<br />

das informações, mesmo que os dados provenientes de diferentes laboratórios<br />

não sejam exatamente iguais.<br />

Quando são avaliados e com<strong>para</strong>dos valores oriundos de diferentes<br />

tabelas, usadas <strong>em</strong> diferentes programas, dev<strong>em</strong>-se observar quais<br />

critérios foram adotados <strong>para</strong> esse fim. A omissão de detalhes analíticos<br />

ou a adoção de procedimento analítico inadequado, por ex<strong>em</strong>plo,<br />

pode afetar o julgamento das informações. Minimizando essas interferências,<br />

pod<strong>em</strong>-se, então, identificar fontes de variações, que não configuram<br />

erros.<br />

Alguns critérios básicos dev<strong>em</strong> ser observados <strong>para</strong> que haja maior<br />

confiabilidade das informações, como referência sobre procedimentos<br />

analíticos adotados e sua adequação <strong>para</strong> o nutriente, forma de seleção<br />

dos dados de alimentos a ser<strong>em</strong> compilados, número de amostra que<br />

originou os dados e identificação detalhada do alimento.<br />

Uma observação importante refere-se aos dados de FA, que dev<strong>em</strong><br />

ser obtidos por método enzímico-gravimétrico. Muitas tabelas <strong>em</strong> uso


190<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

ainda apresentam dados de fibra bruta (basicamente, celulose e parte de<br />

h<strong>em</strong>icelulose e lignina), que é apenas uma parte da FA. Além da importância<br />

de ser identificado o real teor de FA, responsável por inúmeros<br />

efeitos fisiológicos e associada à redução de risco de desenvolvimento<br />

de certas doenças, o valor obtido deve ser descontado da quantidade de<br />

carboidratos totais da dieta, <strong>para</strong> fins de cálculo de energia.<br />

A estimativa de carboidratos totais por diferença é um ex<strong>em</strong>plo<br />

clássico de prática adotada que interfere nos resultados. Embora bastante<br />

utilizada, essa estimativa permite que esse dado seja uma fonte de<br />

erro recorrente, pois se trata de cálculo dependente de análise de outros<br />

nutrientes e pode acumular variações referentes a elas, b<strong>em</strong> como<br />

incluir outros componentes. 9 Ainda hoje, algumas tabelas de composição<br />

de alimentos adotam essa estimativa, ou seja, descontam-se de 100<br />

os valores de umidade, cinzas, lipídios e proteínas. Esse valor obtido refere-se<br />

ao total de carboidratos, no qual a FA está incluída. Para o cálculo<br />

do valor energético do alimento, é necessário descontar o teor de<br />

FA da quantidade de carboidratos totais do alimento (carboidratos totais<br />

por diferença – FA = carboidratos disponíveis por diferença). Portanto,<br />

quando se utiliza uma tabela com dados de fibra analisada pelo<br />

método de fibra bruta, ou no caso de a FA não ter sido analisada, deve-<br />

-se saber que esses alimentos pod<strong>em</strong> estar com teor de energia superestimado.<br />

O ideal é que os diferentes carboidratos sejam analisados por<br />

métodos específicos <strong>para</strong> cada tipo. 50 Países como Austrália, Nova Zelândia<br />

e Reino Unido apresentam <strong>em</strong> suas tabelas os carboidratos analisados<br />

se<strong>para</strong>damente.<br />

É importante ressaltar que a TBCA-USP, desde sua criação, v<strong>em</strong><br />

apresentando dados de alimentos de forma individualizada, fornecendo<br />

informações detalhadas sobre variedade, espécie, grau de maturação,<br />

sazonalidade, entre outras. Essas informações são extr<strong>em</strong>amente importantes<br />

do ponto de vista nutricional, porque pod<strong>em</strong> implicar variações<br />

na quantidade de nutrientes dos alimentos. Tal detalhamento v<strong>em</strong> também<br />

ao encontro da preocupação que muitos órgãos internacionais têm


I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />

191<br />

d<strong>em</strong>onstrado <strong>em</strong> relação à biodiversidade de alimentos, pois os bancos<br />

de dados e tabelas de composição de alimentos, <strong>em</strong> sua maioria, apresentam<br />

valores médios de amostras compostas ou provenientes de cálculos<br />

sobre dados de amostras individuais.<br />

Vale l<strong>em</strong>brar que Atwater enfatizou que bancos de dados de composição<br />

de alimentos são ferramentas científicas que dev<strong>em</strong> ser usadas<br />

corretamente e que seu uso adequado depende do treinamento e da perícia<br />

do usuário. 16<br />

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I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />

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química de alimentos en nutrición. Santiago: FAO/INTA, 1997, p.327-56.<br />

NOTA<br />

A<br />

O Brasilfoods está ligado ao Latinfoods (Red Latinoamericana de Dados<br />

de Composición de Alimentos)/Infoods (International Network Food Data<br />

Syst<strong>em</strong>s).


VIRTUAL NUTRI PLUS:<br />

PROGRAMA PARA APOIO<br />

ÀS DECISÕES NUTRICIONAIS<br />

Sonia Tucunduva Philippi<br />

Greisse Viero da Silva Leal<br />

É importante o conhecimento dos dados sobre a composição de alimentos<br />

produzidos e consumidos nas diferentes regiões do Brasil, pois eles<br />

fornec<strong>em</strong> el<strong>em</strong>entos básicos <strong>para</strong> ações de promoção da saúde, como<br />

orientação nutricional baseada <strong>em</strong> princípios de desenvolvimento local<br />

e diversificação da alimentação, <strong>em</strong> contraposição à massificação de<br />

dietas monótonas e inadequadas. Esses dados precisam ser confiáveis e<br />

apresentar informações sobre a composição do alimento in natura, processado<br />

ou como pre<strong>para</strong>ção culinária, <strong>para</strong> possibilitar a tomada de<br />

decisão sobre os tipos de alimentos que dev<strong>em</strong> compor a dieta, observadas<br />

as recomendações nutricionais. O conhecimento da energia, dos<br />

macro e micronutrientes dos diferentes alimentos possibilita, <strong>em</strong> conjunto<br />

com outras informações, um adequado planejamento da dieta não<br />

só <strong>para</strong> coletividades sadias como <strong>para</strong> indivíduos com dietas específicas<br />

que necessitam de controle de nutrientes especiais. 1<br />

Os profissionais da área de alimentação e nutrição (nutricionista,<br />

gastrônomo, engenheiro de alimento, médico) buscam programas e tabelas<br />

de composição <strong>para</strong> consultas sobre a composição centesimal de


198<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

alimentos ou a utilização dos dados <strong>em</strong> trabalhos clínicos, ambulatoriais,<br />

laboratoriais, de desenvolvimento de novas tecnologias e melhoramento<br />

da qualidade do valor nutritivo dos alimentos. As indústrias de<br />

alimentos e pequenas <strong>em</strong>presas também pod<strong>em</strong> utilizar a composição<br />

centesimal de alimentos e ingredientes <strong>para</strong> planejamento da informação<br />

nutricional nos rótulos. As Unidades Produtoras de Refeições públicas<br />

ou privadas buscam informações <strong>em</strong> programas e <strong>em</strong> tabelas <strong>para</strong><br />

planejamento e cálculo de seus cardápios, que estão cada vez mais disponíveis<br />

<strong>para</strong> conhecimento do consumidor exigente e comprometido<br />

com uma qualidade de vida saudável. 1<br />

O programa Virtual Nutri Plus (VNPlus) é um sist<strong>em</strong>a computadorizado<br />

<strong>para</strong> avaliação da composição nutricional de indivíduos e grupos<br />

populacionais <strong>em</strong> versão nova 2 e norteada pelo primeiro programa<br />

nutricional do Brasil desenvolvido por nutricionista, o Virtual Nutri. 2<br />

O VNPlus foi desenvolvido 3 a partir de 2001 utilizando a linguag<strong>em</strong><br />

Delphi 5.0 da Borland como linguag<strong>em</strong> de programação e banco de<br />

dados Paradox, seguindo o modelo incr<strong>em</strong>ental segundo os <strong>para</strong>digmas<br />

de engenharia de software. Esse software t<strong>em</strong> como objetivo auxiliar no<br />

planejamento e na avaliação de dietas e no acompanhamento e na evolução<br />

de pacientes e grupos populacionais, além de possibilitar funcionalidades<br />

como o cadastramento e a inclusão de alimentos e pre<strong>para</strong>ções<br />

culinárias, a criação de banco de dados (pacientes, dietas, protocolos de<br />

pre<strong>para</strong>ções culinárias/receitas), a avaliação de dietas de grandes grupos<br />

populacionais (pesquisa), b<strong>em</strong> como a utilização <strong>em</strong> acad<strong>em</strong>ias, consultórios,<br />

trabalhos acadêmicos de graduação, especialização e de pós-graduação,<br />

universidades, unidades produtoras de alimentação e nutrição,<br />

hospitais, escolas e creches.<br />

É possível exportar dados de um determinado grupo de pacientes<br />

<strong>para</strong>, por ex<strong>em</strong>plo, uma planilha de Excel (.xls), possibilitando que o<br />

usuário proceda as análises estatísticas necessárias. Permite também o<br />

acesso ao manual de utilização com explicações detalhadas de todas as<br />

funcionalidades. 3


I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />

199<br />

Destaca-se que a funcionalidade “Cadastro de alimentos” permite<br />

ao usuário incluir seus próprios alimentos no banco de dados, alterar<br />

alimentos já existentes e imprimir relatórios da composição nutricional<br />

de determinados alimentos ou dietas. Possibilita a análise de dados coletados<br />

<strong>em</strong> pesquisas de consumo alimentar por meio de inquéritos alimentares,<br />

como o recordatório de 24 horas, o diário alimentar e o questionário<br />

de frequência alimentar. 3<br />

Além do VNPlus, outro material de consulta que se mostra rápido<br />

e prático no planejamento e cálculo do valor nutritivo de dietas, principalmente<br />

<strong>em</strong> locais e situações nas quais não há possibilidade de utilização<br />

de um programa destinado a este fim, é a Tabela de composição de<br />

alimentos: suporte <strong>para</strong> decisão nutricional. 4 A elaboração dessa tabela<br />

partiu da necessidade da existência de um banco de dados, com composição<br />

de alimentos atualizada, com os alimentos consumidos <strong>em</strong> sua<br />

forma usual, e não apenas uma lista de alimentos crus, com informações<br />

sobre alguns principais nutrientes. O trabalho com pesquisas sobre o<br />

consumo de alimentos <strong>em</strong> indivíduos e populações d<strong>em</strong>anda necessidade<br />

de informações sobre os alimentos industrializados, com as respectivas<br />

marcas comerciais e as pre<strong>para</strong>ções culinárias mais habitualmente<br />

consumidas. As informações sobre o valor nutritivo dos alimentos,<br />

reunidas <strong>em</strong> uma tabela, possibilitam a tomada de decisão sobre os alimentos<br />

e as pre<strong>para</strong>ções culinárias que dev<strong>em</strong> integrar o planejamento<br />

dietético de acordo com as recomendações nutricionais. O conhecimento<br />

sobre os valores de energia (kcal), umidade, proteína, lipídios,<br />

carboidratos, vitaminas, minerais, fibras, ácidos graxos, aminoácidos e<br />

outros micronutrientes dos alimentos é imprescindível <strong>para</strong> um diagnóstico<br />

eficiente do consumo alimentar e planejamento de políticas públicas<br />

de intervenção nutricional, principalmente <strong>em</strong> grupos com maior<br />

vulnerabilidade. 4<br />

Inicialmente, <strong>para</strong> a composição dessa tabela, foi utilizado como<br />

base o banco de dados do programa Virtual Nutri versão 1.0, <strong>para</strong><br />

Windows. 3 Para os alimentos in natura, as informações foram retiradas


200<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

de várias tabelas de composição de alimentos nacionais e internacionais.<br />

5-10 Para conhecer o conteúdo nutricional dos alimentos industrializados,<br />

foi realizado um trabalho de leitura e interpretação das informações<br />

contidas <strong>em</strong> rótulos/<strong>em</strong>balagens, fichas técnicas, consultas a<br />

serviços de orientação ao consumidor e sites das indústrias alimentícias<br />

(período de 1995 a 2000). A tabela é também composta por alimentos<br />

consumidos pela população <strong>em</strong> forma de pre<strong>para</strong>ções, possibilitando a<br />

consulta imediata daqueles mais consumidos, como arroz, feijão, pizza,<br />

pastel de feira e fast-food, e traz informações sobre o valor nutritivo por<br />

100 g do alimento pronto <strong>para</strong> consumo. Nas receitas das pre<strong>para</strong>ções<br />

culinárias, foram considerados o rendimento, a forma de preparo e o indicador<br />

de conversão (IC) do estado do alimento.<br />

Posteriormente, o banco de dados da tabela foi atualizado <strong>para</strong> o<br />

desenvolvimento e aprimoramento do VNPlus, com a inclusão de dados<br />

da Tabela Brasileira de Composição de Alimentos (Taco) 11 , coordenada<br />

pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas <strong>em</strong> Alimentação (Nepa) da Universidade<br />

Estadual de Campinas (Unicamp), além de novas inclusões<br />

de alimentos, fórmulas e supl<strong>em</strong>entos por meio da interpretação das<br />

informações contidas <strong>em</strong> rótulos/<strong>em</strong>balagens, fichas técnicas e novas<br />

consultas a Serviços ao Consumidor (período de 2000 a 2010). Mais recent<strong>em</strong>ente,<br />

as partes não convencionais dos alimentos também foram<br />

incluídas, com base no material técnico publicado pelo Sesi. 12<br />

O banco de dados atual do VNPlus possui mais de 2.900 alimentos<br />

entre naturais (270), pre<strong>para</strong>ções (490) e industrializados (2150); apresenta<br />

mais de 3.200 variações de alimentos de acordo com forma de preparo<br />

(cru, assado, grelhado, etc.) e com suas medidas usuais; entre elas,<br />

unidade, copo, fatia, folha, ramo, gomo, bago, colher de servir, colher de<br />

sopa, colher de sobr<strong>em</strong>esa, colher de chá, colher de café, xícara de chá,<br />

escumadeira e concha. 2<br />

As pre<strong>para</strong>ções culinárias do hábito alimentar brasileiro presentes<br />

no programa, <strong>em</strong> sua maioria, foram elaboradas no laboratório de Técnica<br />

Dietética da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo


I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />

201<br />

(FSP-USP), com variações culinárias de diversas regiões do Brasil, como<br />

abobrinha frita, arroz com lentilha, bife à milanesa, acarajé, feijoada,<br />

entre outras. 3<br />

O programa avalia energia (kcal), unidade (g), proteína (g), carboidrato<br />

(g), fibra total (g), fibra insolúvel (g), fibra solúvel (g), gordura total (g),<br />

gordura saturada (g), gordura monoinsaturada (g), gordura poli-insaturada<br />

(g), colesterol (mg), vitamina A (RE), vitamina B1 (mg), vitamina B2 (mg),<br />

vitamina B6 (mg), vitamina B12 (mcg), vitamina C (mg), vitamina D (mcg),<br />

vitamina E (mg), niacina (mg), cálcio (mg), cobre (mg), ácido pantotênico<br />

(mg), folato (mcg), ferro (mg), fósforo (mg), iodo (mcg), magnésio (mg),<br />

manganês (mg), potássio (mg), selênio (mcg), sódio (mg) e zinco (mg). 2<br />

O VNPlus possui diversas funções, como avaliação do estado nutricional<br />

segundo as recomendações das DRI; recomendação diária de ingestão<br />

de energia e nutrientes de acordo com peso, altura, idade, sexo e atividade<br />

física; relatórios que descrev<strong>em</strong> o valor nutritivo dos alimentos por gramas;<br />

visualização da distribuição de nutrientes por refeição; e descrição<br />

da dieta <strong>em</strong> medidas usuais e <strong>em</strong> gramas. 2<br />

É importante ressaltar a necessidade de se conhecer as tabelas de<br />

composição de alimentos que compõ<strong>em</strong> o banco de dados de um programa<br />

a ser utilizado <strong>para</strong> planejamento e avaliação dietética. Dev<strong>em</strong>-<br />

-se utilizar tabelas que apresent<strong>em</strong> dados de alimentos locais com análises<br />

padronizadas realizadas por laboratórios certificados, como é o<br />

caso das tabelas Taco 11 e Tabela Brasileira de Composição de Alimentos<br />

(TBCA-USP). 13<br />

Em 1984, foi criada a rede Infoods (International Network of Food<br />

Data Syst<strong>em</strong>s), ligada à Universidade das Nações Unidas (UNU) e à Food<br />

and Agriculture Administration (FAO), que propôs diretrizes e criou ferramentas<br />

que implicaram grande avanço nas tabelas de composição. Atualmente,<br />

a consciência relativa à biodiversidade de alimentos existentes v<strong>em</strong><br />

ampliando o enfoque das tabelas e dos bancos de dados de composição<br />

química de alimentos. No Brasil, a TBCA-USP, da Rede Brasileira de Dados<br />

de Composição de Alimentos (Brasilfoods), desde sua criação <strong>em</strong>


202<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

1998, v<strong>em</strong> adotando esses padrões internacionais e encontra-se disponível<br />

na internet (http://www.fcf.usp.br/tabela). 13 Os dados de porções<br />

e medidas usuais de consumo dos alimentos utilizados na TBCA foram<br />

compilados do VNPlus.<br />

A Taco foi coordenada pelo Nepa da Unicamp e teve a participação<br />

de diferentes instituições brasileiras e de pesquisadores renomados.<br />

Teve financiamento dos Ministérios da Saúde e do Desenvolvimento Social<br />

e Combate à Fome. O objetivo era proporcionar informações sobre<br />

um grande número de nutrientes <strong>em</strong> alimentos nacionais e regionais<br />

obtidos por meio de amostrag<strong>em</strong> representativa e análises realizadas<br />

por laboratórios com competência analítica comprovada por estudos<br />

interlaboratoriais, segundo critérios internacionais. Teve início <strong>em</strong> 1997<br />

e foi desenvolvida <strong>em</strong> cinco fases, sendo que a quinta fase teve início<br />

<strong>em</strong> 2005. Foi lançada <strong>em</strong> 2004 e atualmente totaliza 495 alimentos. Essa<br />

tabela inovou ao apresentar 90 protocolos padronizados por Philippi 11<br />

<strong>para</strong> alimentos pre<strong>para</strong>dos, do hábito alimentar e de caráter regional,<br />

desenvolvidos e inseridos na Tabela após análise <strong>em</strong> 100 g de alimento<br />

pronto. Ex<strong>em</strong>plos: pintado assado/grelhado, mandioca cozida, feijão-<br />

-roxo cozido, coxinha frita, bolinho de arroz, entre outros.<br />

O projeto Taco foi desenvolvido <strong>em</strong> fases com a preocupação de<br />

inserir na Tabela um número expressivo de informações sobre nutrientes<br />

<strong>em</strong> alimentos nacionais, regionais e alguns industrializados, obtidos<br />

por amostrag<strong>em</strong> representativa e com análises realizadas apenas por 20<br />

laboratórios com competência comprovada por estudos interlaboratoriais<br />

e internacionais, sendo sete de São Paulo, dois do Paraná, dois do<br />

Rio de Janeiro e nove de outros estados brasileiros. No caso, por ex<strong>em</strong>plo,<br />

de frutas, verduras e legumes, as coletas foram realizadas no Ceasa<br />

<strong>em</strong> Campinas, no Ceagesp <strong>em</strong> São Paulo, no Mercado Municipal <strong>em</strong><br />

São Paulo ou <strong>em</strong> supermercados, s<strong>em</strong>pre de fornecedores com maior<br />

volume de vendas, com coleta aleatória <strong>para</strong> cada alimento. No Instituto<br />

Tecnológico de Alimentos (ITAL Campinas), todos os alimentos foram<br />

homogeneizados, com protocolos específicos e três amostras compostas


I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />

203<br />

(100 a 200 g) encaminhadas <strong>para</strong> análises laboratoriais. Como ex<strong>em</strong>plo<br />

de metodologia analítica, todas de alta complexidade, foram avaliados<br />

teores de minerais e vitaminas.<br />

Os minerais (Ca, Fe, MG, Mn, P, Na, K, Cu e Zn) foram determinados<br />

por espectrometria de <strong>em</strong>issão atômica com fonte de plasma indutivamente<br />

acoplado ICP-OES, segundo a Association of Official Analytical<br />

Ch<strong>em</strong>ists (AOAC, 2000). As vitaminas, como o retinol, foram<br />

determinadas por cromatografia líquida de alta eficiência (Clae) com<br />

detecção por fluorescência, segundo Mans e Philippi e Zahar e Smith<br />

(referências completas no site da Taco). 1 Após todo o procedimento<br />

analítico, os valores definidos foram incluídos na Tabela por 100 g do<br />

alimento. 1<br />

As tabelas de composição de alimentos nacionais e internacionais<br />

dev<strong>em</strong> ser s<strong>em</strong>pre consultadas, <strong>para</strong> avaliar as informações disponíveis<br />

e compl<strong>em</strong>entar as lacunas existentes quando da busca dos dados. Os<br />

bancos de dados dos alimentos dos programas nutricionais nacionais ou<br />

internacionais dev<strong>em</strong> também trazer suas referências <strong>para</strong> identificar a<br />

fonte dos dados e sua confiabilidade.<br />

De acordo com Johana Dwyer 14 , nutricionista e pesquisadora norte-americana,<br />

os estudos sobre composição de alimentos passaram por<br />

quatro revoluções. A primeira, com Atwater 15 , descreveu a energia advinda<br />

dos alimentos; a segunda apresentou a caracterização de vitaminas<br />

e minerais que se mostraram importantes <strong>para</strong> evitar as doenças<br />

decorrentes de sua deficiência; na terceira, conhecendo-se melhor a<br />

composição dos alimentos, foram feitas associações entre dieta e doença,<br />

incluindo as relacionadas a má nutrição e doenças crônicas não transmissíveis;<br />

e a quarta revolução relaciona-se com a descoberta de outras<br />

substâncias nos alimentos que também pod<strong>em</strong> afetar a saúde humana,<br />

como os compostos bioativos e fatores antinutricionais. A quinta revolução<br />

deverá estar relacionada com a biodiversidade.<br />

Segundo a FAO, o amplo conhecimento das informações de composição<br />

de alimentos de diferentes culturas das diversas regiões e países é


204<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

importante <strong>para</strong> garantir a preservação e o uso sustentável da biodiversidade<br />

<strong>em</strong> programas de segurança alimentar e nutrição humana. Portanto,<br />

um banco de dados de um programa ou de uma tabela deve estar s<strong>em</strong>pre<br />

<strong>em</strong> construção, atualização e aperfeiçoamento. 1<br />

A partir de 2011, uma equipe de programadores deu início à construção<br />

do Virtual Nutri Plus Web, a partir do VNPlus. O trabalho foi<br />

apresentado no Congresso Latinoamericano de Nutrição (SLAN), <strong>em</strong><br />

2012, <strong>em</strong> Havana, Cuba. 16<br />

O Virtual Nutri Plus Web 2 foi desenvolvido na plataforma ASP.<br />

NET da Microsoft, sendo, portanto, um software 100% Web. Sua concepção<br />

e seu desenvolvimento foram idealizados pela Dra. Sonia Tucunduva<br />

Philippi e realizados pela <strong>em</strong>presa Keeple. A equipe contou<br />

com dois nutricionistas, um gerente de projeto, um designer e três desenvolvedores.<br />

Por se tratar de um sist<strong>em</strong>a totalmente Web, não requer<br />

instalação e funciona com dispositivo conectado à internet com<br />

um browser (Internet Explorer, Mozilla, Safari, Chrome, etc.) e é compatível<br />

com qualquer sist<strong>em</strong>a operacional (Windows, Mac OS, Linux,<br />

etc.). O aplicativo é executado nas “nuvens” e, por consequência, seu<br />

des<strong>em</strong>penho é garantido pela <strong>em</strong>presa desenvolvedora. O novo Virtual<br />

Nutri Plus está hospedado <strong>em</strong> um dos maiores Data Centers do Brasil,<br />

o que garante alto des<strong>em</strong>penho e manutenção adequada <strong>para</strong> seu<br />

perfeito e constante funcionamento, além de total segurança no armazenamento<br />

das informações.<br />

Em relação ao modelo de cobrança, o VNPlus foi desenvolvido no<br />

modelo SaaS (software as a service), que permite ao nutricionista obter<br />

uma assinatura somente pelo t<strong>em</strong>po que desejar utilizar o sist<strong>em</strong>a.<br />

As principais vantagens de utilização do VNPlus são a automatização,<br />

a garantia de que a informação sobre a composição nutricional dos alimentos<br />

está atualizada, a otimização de alguns passos no processo de<br />

atendimento nutricional (p.ex., avaliações) e o acompanhamento das<br />

ações pelo usuário, facilitando as atividades de planejamento e avaliação<br />

pelo nutricionista. 2


I JORNADA SOBRE TABELAS DE COMPOSIÇÃO...<br />

205<br />

O desenvolvimento de pesquisas sobre valor nutritivo e composição<br />

dos alimentos deveria ser uma atribuição governamental, com<br />

recursos financeiros, materiais e humanos alocados <strong>em</strong> alguma esfera<br />

governamental, <strong>para</strong> permitir plenas condições operacionais, com<br />

continuidade, atualização permanente e divulgação imediata dos dados<br />

obtidos. Contudo, essa tarefa t<strong>em</strong> ficado na iniciativa dos pesquisadores<br />

que buscam recursos financeiros junto aos órgãos governamentais,<br />

mas s<strong>em</strong>pre insuficientes e descontínuos. Existe morosidade<br />

<strong>em</strong> razão da complexidade e é necessário rigor nas análises laboratoriais,<br />

permitindo a existência de lacunas entre as necessidades e as<br />

reais possibilidades.<br />

Como reflexão sobre o t<strong>em</strong>a de programas de nutrição informatizados,<br />

deveria haver uma tabela oficial brasileira, com alimentos naturais,<br />

processados e pre<strong>para</strong>ções tipicamente de nosso país, coordenada por um<br />

órgão governamental como Ministérios da Saúde, Agricultura, Ciência e<br />

Tecnologia, com parcerias técnicas com universidades, órgãos de pesquisa,<br />

instituições privadas e <strong>em</strong>presas alimentícias, <strong>em</strong> um esforço único<br />

de desenvolver programas específicos <strong>para</strong> a área de alimentação e nutrição,<br />

possibilitando conhecer a composição dos alimentos nacionais e<br />

todo o potencial de seus macro e micronutrientes, além de outros compostos<br />

ainda não conhecidos.<br />

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />

1. Virtual Nutri Plus (Software online). Disponível <strong>em</strong>: http://www.virtualnutriplus.com.br.<br />

2. Philippi ST. Tabela de composição de alimentos: a palavra da Profa. Dra. Sonia<br />

Tucunduva Philippi. Nestlé Bio-Nutrição e Saúde São Paulo 2011; 4:4-9.<br />

3. Philippi ST. Virtual Nutri Plus (Software) versão 1.0. São Paulo, 2008.<br />

4. Bowes AP, Church CF. Food values of portions commonly used. Rev By JAT<br />

Pennington. 17.ed. Nova York: Lippincott – Raven Publishers, 1998.<br />

5. Geltz R, Geltz B. The food processor for Windows. Versão 6.0: nutrition analysis<br />

software. Sal<strong>em</strong>: Esha research, 1995.


206<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

6. Holland B, Welch AA, et al. Mc Cance and Winddwson’s. The composition of<br />

foods. 5.ed. Cambridge: TheRoyal Society of Ch<strong>em</strong>istry/ Ministry of Agriculture,<br />

Fisheries and Food, 1991.<br />

7. Instituto de Geografia e Estatística. Estudo Nacional de Despesa Familiar – EN-<br />

DEF: Tabela de Composição de Alimentos. Publicações especiais. Rio de Janeiro<br />

1997; 3.<br />

8. Souci SW, Farchman W, Kraut K. Food composition and nutrition tables. 5.ed.<br />

Stutgard: Medpharm Scientific Publishers, 1994.<br />

9. Watt B, Merrill AL. Composition of foods: raw, processed, prepared. Agriculture<br />

Handbook, 8. Washington DC: Consumer and Food Economics Research<br />

Division/Agricultural Research Service, 1963.<br />

10. Núcleo de Estudos e Pesquisas <strong>em</strong> Alimentação. Universidade Estadual de<br />

Campinas. Tabela Brasileira de Composição de alimentos (TACO): versão1.<br />

São Paulo: NEPA/Unicamp, 2004. Disponível <strong>em</strong>: www.unicamp.br/nepa/taco.<br />

11. Programa Alimente-se B<strong>em</strong>. Tabela de composição química das partes não<br />

convencionais dos alimentos. São Paulo: Sesi-SP, 2008.<br />

12. Universidade de São Paulo. Faculdade de Ciências Farmacêuticas. Departamento<br />

de Alimentos e Nutrição Experimental. Tabela Brasileira de Composição<br />

de Alimentos-USP. Versão 4.1. Disponível <strong>em</strong>: http://www.fcf.usp.br/tabela.<br />

13. Dwyer JT. Future directions in food composition studies. J Nutr 1994; 124<br />

(Suppl.):1783-88S.<br />

14. Atwater WO, Woods CD. The Ch<strong>em</strong>ical composition of American food materials.<br />

Farmers Bulletin n.28. U.S. Department of Agriculture. Washington, 1896.<br />

15. Philippi ST, Guerreiro RER, Cechin J, Sossai J, Filho AGF, Leal GVS. Assessment<br />

on diet, nutritional status and health conditions: Web-Virtual Nutri<br />

Plus, Brazilian software for clinical and epid<strong>em</strong>iological use. XVI Congresso<br />

Latinoamericano de Nutrición – SLAN, 2012.


I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA<br />

ESCOLA E SEGURANÇA<br />

ALIMENTAR E NUTRICIONAL<br />

27 de outubro de 2009<br />

Teatro Marcos Lindenberg – <strong>Unifesp</strong>


A ALIMENTAÇÃO ESCOLAR COMO<br />

OPORTUNIDADE DE PROMOÇÃO DA<br />

SAÚDE<br />

Glaura César Pedroso<br />

INTRODUÇÃO<br />

A Carta de Ottawa 1 define Promoção da Saúde como “processo de capacitação<br />

da comunidade <strong>para</strong> atuar na melhoria da sua qualidade de vida<br />

e saúde, incluindo maior participação no controle deste processo”. Esse<br />

documento também define os seguintes campos de ação <strong>para</strong> promoção<br />

da saúde: elaboração e impl<strong>em</strong>entação de políticas públicas saudáveis,<br />

criação de ambientes favoráveis à saúde, fortalecimento da participação<br />

comunitária, desenvolvimento de habilidades pessoais e reorientação<br />

dos serviços de saúde. Assim, chama-se a atenção <strong>para</strong> os determinantes<br />

múltiplos da saúde e <strong>para</strong> a necessidade de um trabalho intersetorial<br />

e interinstitucional na mediação entre os diferentes interesses existentes<br />

<strong>em</strong> relação à saúde.<br />

Os conceitos ligados à promoção da saúde, assim como suas práticas,<br />

vêm sendo elaborados mundialmente <strong>em</strong> diferentes contextos<br />

sociais, levando à produção de vários documentos voltados <strong>para</strong> os<br />

diferentes campos de promoção da saúde. 2 No caso brasileiro, o desenvolvimento<br />

da promoção da saúde ocorre no contexto da red<strong>em</strong>ocratização<br />

do país e da reforma sanitária, cujos princípios e diretrizes estão<br />

incorporados no texto constitucional. Os conceitos trazidos do contexto


210<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

internacional encontraram, no Brasil, um debate com forte participação<br />

popular que resgata a noção de saúde como produção social e direito de<br />

cidadania. 3 Entende-se promoção da saúde como mais do que a adoção<br />

de estilos de vida saudáveis, sendo fundamentais a discussão das condições<br />

objetivas de existência dos indivíduos e grupos sociais e a luta pela<br />

garantia de seus direitos.<br />

Em 2006, por meio da Portaria n. 687 do Ministério da Saúde, oficializou-se<br />

a Política Nacional de Promoção da Saúde, articulando e reforçando<br />

programas e iniciativas anteriores, visando a consolidar uma<br />

agenda nacional, coerente com os princípios e diretrizes do Sist<strong>em</strong>a<br />

Único de Saúde (SUS). 4-6 Além das ações desenvolvidas nos serviços de<br />

saúde, numerosas iniciativas de promoção da saúde vêm se articulando<br />

no espaço das políticas públicas de desenvolvimento, da intersetorialidade<br />

e da ação comunitária. Entre essas iniciativas, destacam-se as<br />

experiências de Escolas Promotoras de Saúde, que envolv<strong>em</strong> parcerias<br />

entre os Ministérios da Saúde e da Educação, as universidades, os estados<br />

e os municípios, com o apoio da Sociedade Brasileira de Pediatria. 5-8<br />

A Escola Promotora da Saúde considera as pessoas, <strong>em</strong> especial as<br />

crianças e os adolescentes, inseridas <strong>em</strong> seu ambiente familiar, comunitário<br />

e social, e t<strong>em</strong> três princípios básicos, relacionados entre si 9 :<br />

• educação <strong>para</strong> saúde com enfoque integral, incluindo o desenvolvimento<br />

de habilidades <strong>para</strong> a vida: discute a saúde como construção social, abordando<br />

a relação entre a saúde e seus determinantes, e usa todas as oportunidades<br />

educativas <strong>para</strong> promover a saúde;<br />

• criação e manutenção de ambientes físicos e psicossociais saudáveis: destaca<br />

o desenvolvimento humano saudável e as relações construtivas e harmônicas,<br />

promove aptidões e atitudes <strong>para</strong> a saúde, busca oferecer um<br />

espaço físico seguro e confortável, com água potável e instalações sanitárias<br />

adequadas e uma atmosfera psicológica positiva <strong>para</strong> a aprendizag<strong>em</strong>.<br />

Promove a autonomia, a criatividade e a participação dos alunos, b<strong>em</strong><br />

como de toda a comunidade escolar; 10


I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />

211<br />

• oferta de serviços de saúde: visa ao fortalecimento da articulação entre os<br />

setores da educação e da saúde; no caso brasileiro, estimula-se o acesso a<br />

serviços de saúde, com definição conjunta e participativa das prioridades<br />

e estratégias, contribuindo <strong>para</strong> a consolidação do SUS. 11<br />

Como l<strong>em</strong>brou Cerqueira 12 , essa visão se contrapõe ao que ocorre<br />

na maioria dos casos, <strong>em</strong> que a escola é vista pelo setor da saúde como<br />

“lugar de aplicação de medidas de controle e prevenção de doenças”, <strong>em</strong><br />

que os alunos seriam um grupo passivo, alvo de ações isoladas e assistencialistas,<br />

<strong>em</strong> que se usa a escola, mas não se oferece uma atenção integral<br />

n<strong>em</strong> se aproveitam as oportunidades pedagógicas <strong>para</strong> promover<br />

o desenvolvimento e o protagonismo da criança e do adolescente <strong>em</strong> relação<br />

à sua saúde e à de sua comunidade.<br />

Essa visão também é coerente com o texto dos Parâmetros Curriculares<br />

Nacionais 13 , que elege como t<strong>em</strong>as transversais: saúde, meio ambiente,<br />

trabalho e consumo, pluralidade cultural, orientação sexual e ética.<br />

As questões sociais cont<strong>em</strong>porâneas passam a ser abordadas não<br />

apenas como conteúdo de disciplinas específicas, mas por todas as disciplinas<br />

e também <strong>em</strong> projetos interdisciplinares. Nesse contexto, a segurança<br />

alimentar e nutricional torna-se um componente fundamental e<br />

indissociável das estratégias de promoção da saúde no contexto escolar. 14<br />

A articulação das ações de promoção da saúde com o Programa Nacional<br />

de Alimentação Escolar pode ocorrer <strong>em</strong> vários momentos, trazendo<br />

valiosas oportunidades de aprendizag<strong>em</strong>, de discussão sobre as<br />

condições de vida e de construção de estilos de vida saudáveis, por meio<br />

de conteúdos de várias disciplinas e também nos t<strong>em</strong>as transversais,<br />

como a orig<strong>em</strong> dos alimentos, o alimento nas diferentes culturas, os processos<br />

de trabalho e produção de alimentos, a escolha de alimentos saudáveis<br />

e a pressão pelo consumo de alimentos industrializados, a questão<br />

do desperdício e da sustentabilidade, entre outras. O momento da merenda<br />

não deve ficar dissociado dos outros momentos da vida escolar. 15,16<br />

Nesse contexto, merec<strong>em</strong> destaque os aspectos descritos a seguir.


212<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

CONDIÇÕES SANITÁRIAS<br />

Garantia das condições de higiene e de qualidade na <strong>aqui</strong>sição, na conservação<br />

e no preparo dos alimentos. Esses aspectos também pod<strong>em</strong> ser<br />

objeto de discussão com os alunos e pais, possibilitando sua participação<br />

no processo. 17,18<br />

ALIMENTAÇÃO COMO DIREITO FUNDAMENTAL<br />

Toda criança t<strong>em</strong> o direito de se manter alimentada durante o período<br />

escolar, com alimentos <strong>em</strong> quantidade e qualidade adequadas às suas<br />

necessidades e respeitando seus hábitos culturais. A alimentação escolar<br />

é parte do dia alimentar da criança e não deve ser tratada como política<br />

meramente assistencial n<strong>em</strong> como solução <strong>para</strong> a desnutrição ou<br />

o fracasso escolar, como se observou <strong>em</strong> vários momentos de sua história.<br />

A alimentação escolar precisa ser entendida como a garantia de um<br />

direito de cidadania. 17<br />

TREINAMENTO E SUPERVISÃO DE RECURSOS HUMANOS<br />

Todos os profissionais que participam da elaboração e distribuição<br />

da merenda escolar dev<strong>em</strong> ser vistos como m<strong>em</strong>bros da equipe escolar,<br />

tendo, portanto, seu papel como educadores. Tudo o que acontece<br />

na escola pode e deve ser aproveitado como oportunidade pedagógica.<br />

Para isso, deve-se proporcionar formação profissional compatível com<br />

esse papel, além de condições adequadas de trabalho e acesso à educação<br />

continuada/permanente a todos os envolvidos.<br />

INTEGRAÇÃO DA EQUIPE<br />

O planejamento conjunto das atividades pode promover a ligação entre<br />

os conteúdos da sala de aula e a alimentação. Uma possibilidade de<br />

trabalho educativo é envolver o professor no trabalho junto aos alunos,<br />

no momento da merenda, buscando valorizar, assim, os aspectos simbólicos<br />

e vivenciais relacionados à alimentação e proporcionando novas<br />

relações entre educadores e educandos, pelo compartilhamento das


I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />

213<br />

refeições. Esse trabalho pode e deve ser compartilhado com merendeiras<br />

e nutricionistas. 19-21<br />

CANTINAS<br />

Para as escolas que têm cantinas, além da regulamentação da venda de<br />

alimentos, é importante realizar um trabalho educativo com os profissionais<br />

e proprietários desses estabelecimentos, com a finalidade de oferecer<br />

e estimular a escolha de alimentos saudáveis. Um ex<strong>em</strong>plo é o trabalho<br />

de Schmitz et al. 22<br />

ATENÇÃO<br />

Não se pode deixar de lado a discussão sobre as condições de vida, saúde<br />

e trabalho da equipe da escola, incluindo-se também as merendeiras.<br />

O trabalho digno e a atenção à saúde desses profissionais são componentes<br />

indissociáveis da meta de se construir uma escola promotora de saúde.<br />

ORIGEM E PREPARO DOS ALIMENTOS<br />

A abordag<strong>em</strong> dos conteúdos relativos à orig<strong>em</strong> dos alimentos e seu preparo<br />

pode também motivar a escolha de alimentos saudáveis e propor novas<br />

relações entre produção e consumo. Projetos interdisciplinares, como a<br />

instalação de hortas escolares e a participação do escolar na seleção e pre<strong>para</strong>ção<br />

das refeições, pod<strong>em</strong> ser de grande valia <strong>para</strong> discutir a orig<strong>em</strong> do<br />

alimento; os processos de produção, transporte, armazenamento e consumo;<br />

a importância dos produtos locais e dos alimentos próprios de cada<br />

estação do ano; a relação entre o clima, a água e a produção de alimentos,<br />

entre outros. Esses projetos pod<strong>em</strong> também constituir um valioso incentivo<br />

à escolha de alimentos saudáveis provenientes da produção local. 23,24<br />

A ORIGEM DO ALIMENTO – FRUTO DA NATUREZA E DO<br />

TRABALHO COLETIVO<br />

Seus significados nas diferentes culturas e <strong>em</strong> diferentes momentos da vida,<br />

a culinária regional, as relações sociais e afetivas envolvidas no servir e no


214<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

comer são aspectos importantes que pod<strong>em</strong> dar orig<strong>em</strong> a vários projetos e<br />

atividades transversais e interdisciplinares, que respeitam e valorizam a criança<br />

como sujeito, e não como consumidor. Alimentação não é prescrição ou<br />

treinamento, mas envolve dimensões simbólicas e vivenciais e traz possibilidades<br />

de compartilhamento de experiências e maior proximidade entre os<br />

alunos e a equipe da escola. 17 Nas palavras de Domene 16 : “O comportamento<br />

alimentar reflete o resultado de experiências vividas <strong>em</strong> diferentes níveis de<br />

relação, desde interpessoais, ambientais, comunitários e até políticos”.<br />

CONCLUSÕES<br />

Objetiva-se, com isso, satisfazer as necessidades biológicas, mas também<br />

de afeto e cidadania, recuperando-se a alimentação escolar como<br />

espaço pedagógico repleto de significados. 16,17 O aproveitamento da alimentação<br />

escolar como oportunidade de promoção da saúde requer<br />

planejamento interdisciplinar e intersetorial, respeito à cultura e conhecimento<br />

das necessidades locais, além da elaboração de materiais didáticos<br />

e de apoio apropriados <strong>para</strong> esse fim.<br />

Para projetos locais, é necessário o envolvimento de toda a equipe, merecendo<br />

destaque também o papel dos gestores, articulando e facilitando os<br />

projetos e iniciativas dos educadores e d<strong>em</strong>ais m<strong>em</strong>bros da comunidade<br />

escolar. Em âmbito regional, é importante o compromisso dos gestores da<br />

educação e do Programa de Alimentação Escolar, <strong>para</strong> impl<strong>em</strong>entação das<br />

políticas de promoção da saúde, preferencialmente definidas <strong>em</strong> conjunto<br />

com os Conselhos de Escola e outras instâncias de participação popular. Esses<br />

conselhos surgiram no processo de red<strong>em</strong>ocratização da sociedade brasileira<br />

e são compostos por representantes de todos os atores participantes<br />

dos processos educativos – pais, professores, diretores, funcionários e alunos.<br />

Segundo Silva 25 , constitu<strong>em</strong> espaços de educação <strong>para</strong> a d<strong>em</strong>ocracia e<br />

sua implantação d<strong>em</strong>andou esforços dos setores progressistas da sociedade.<br />

Valorizar os Conselhos de Escola como instâncias de planejamento<br />

local requer uma concepção de educação como “processo coletivo, partilhado<br />

entre a escola e a sociedade” e, consequent<strong>em</strong>ente, promover a


I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />

215<br />

d<strong>em</strong>ocratização do planejamento e da gestão, incluindo os “leigos” historicamente<br />

excluídos desses processos. Como locais de construção coletiva<br />

e de poder partilhado, os conselhos de escola dev<strong>em</strong> ser fortalecidos,<br />

valorizando-se a cidadania ativa <strong>em</strong> oposição às relações de consumo. A<br />

participação é entendida, assim, como forma de conquista de poder e,<br />

por meio dele, de direitos. 26 Essa participação possibilita a consolidação<br />

do trabalho voltado <strong>para</strong> a promoção da saúde, pela apropriação do processo<br />

pelos conselhos e por cada um dos segmentos envolvidos.<br />

A implantação de políticas intersetoriais e participativas requer decisões<br />

políticas e envolve mudanças nas estruturas de poder, assim como<br />

o enfrentamento de contradições e restrições de vários tipos. No caso da<br />

saúde escolar, observa-se a convivência do modelo antigo – higienista e assistencialista<br />

– com novas propostas, mais próximas dos princípios da promoção<br />

da saúde <strong>em</strong> seus aspectos transformadores. Assim, a ex<strong>em</strong>plo de<br />

Valadão 27 , observa-se que a saúde escolar, ao mesmo t<strong>em</strong>po que serve <strong>para</strong><br />

estabelecimento de “práticas compensatórias da inexistência de serviços<br />

de saúde, da iniquidade e da falta de acesso à cidadania”, permite vislumbrar<br />

oportunidades <strong>para</strong> o fortalecimento de políticas públicas e da construção<br />

de projetos com real impacto na qualidade de vida. Como l<strong>em</strong>bra a<br />

mesma autora, “é precisamente a valorização de suas especificidades que<br />

faz das instituições de educação e de saúde parceiras privilegiadas.” Por<br />

isso, afirma que a política <strong>para</strong> promoção da saúde na escola deve sustentar-se<br />

menos na inflexibilidade das normas e mais na exigência de conexão<br />

entre as normas e o compromisso de transformação social; apresentar-se<br />

como uma estratégia, entre outras, <strong>para</strong> qualificar a escola na recomposição<br />

de sua identidade política e pedagógica, visando a tornar mais saudáveis<br />

e solidárias as experiências de conviver e aprender cidadania.<br />

Faz-se necessário, portanto, superar a visão da escola e da comunidade<br />

escolar como objetos, combatendo a transformação da escola <strong>em</strong><br />

mero local de assistência social. A participação da escola na rede de proteção<br />

social só pode se efetivar por meio do respeito à especificidade da<br />

educação e às tarefas primordiais da escola. No dizer de Silva 28 :


216<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

O bom trabalho pedagógico é aquela atividade intencional que acontece<br />

na escola, que possibilita as relações de aprendizagens entre sujeitos,<br />

orientadas pela ética profissional; é aquele que se alcança por<br />

meio de atividades voltadas <strong>para</strong> produção de ideias, de concepções,<br />

conceitos, valores, símbolos, hábitos, atitudes e habilidades. A educação<br />

de qualidade social implica, pois, assegurar a redistribuição<br />

da riqueza produzida e que os bens culturais sejam socialmente distribuídos<br />

entre todos.<br />

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />

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EDUCAÇÃO ALIMENTAR<br />

E NUTRICIONAL NA ESCOLA<br />

Claudia Ridel Juzwiak<br />

INTRODUÇÃO<br />

A promoção de um estilo de vida saudável desde a infância t<strong>em</strong> o potencial<br />

de afetar positivamente a saúde atual e futura, ao garantir o crescimento<br />

e o desenvolvimento físico e mental esperados e reduzir o risco<br />

de doenças e agravos não transmissíveis na idade adulta.<br />

A escola representa um dos locais mais interessantes <strong>para</strong> ações de<br />

promoção de educação <strong>em</strong> saúde, pois propicia inúmeras situações de<br />

aprendizag<strong>em</strong> direcionadas a um extenso setor da população, com ampla<br />

faixa etária que frequenta da creche à Educação de Jovens e Adultos<br />

(EJA), permitindo, ainda, a articulação com a família e a comunidade. 1<br />

Os Parâmetros Curriculares Nacionais reforçam esse papel ao incluír<strong>em</strong><br />

a saúde como um dos t<strong>em</strong>as a ser<strong>em</strong> trabalhados transversalmente<br />

e ao colocar<strong>em</strong> como um de seus objetivos que os alunos sejam<br />

capazes de “conhecer e cuidar do próprio corpo, valorizando e adotando<br />

hábitos saudáveis como um dos aspectos básicos da qualidade de<br />

vida e agindo com responsabilidade <strong>em</strong> relação à sua saúde e à saúde<br />

coletiva”. 2


220<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

Dentro da perspectiva da adoção de hábitos saudáveis, a nutrição<br />

merece destaque, ressaltando-se a necessidade de impl<strong>em</strong>entação de<br />

ações de Educação Alimentar e Nutricional no ambiente escolar. Boog 3<br />

descreve que “a educação alimentar e nutricional não t<strong>em</strong> por finalidade<br />

prescrever formas adequadas de se alimentar, mas, sim, ensinar a pensar<br />

certo a respeito da alimentação” e que, “pensar certo não é transferir<br />

um conhecimento pronto e inerte sobre o que ‘deve’ ser consumido,<br />

às vezes desconexo com o cotidiano alimentar da casa e da escola”. Assim,<br />

fica claro que esse processo na escola deve levar ao desenvolvimento<br />

da capacidade crítica e de habilidades que se traduzam <strong>em</strong> mudança<br />

no comportamento, ou seja, autonomia <strong>para</strong> a tomada de decisões relacionadas<br />

a <strong>aqui</strong>sição, pre<strong>para</strong>ção, preservação e consumo de alimentos,<br />

principalmente diante das consequências da transição nutricional, que<br />

inclu<strong>em</strong> a grande diversidade e a constante ampliação de opções de alimentos<br />

processados, b<strong>em</strong> como a perda de aspectos culturais e sociais<br />

da alimentação. 4<br />

Neste texto, pretende-se ressaltar alguns aspectos envolvidos no<br />

complexo processo da educação alimentar e nutricional no ambiente<br />

escolar.<br />

EDUCAÇÃO ALIMENTAR E NUTRICIONAL NA ESCOLA<br />

A importância de ações intersetoriais<br />

A publicação da Portaria Interministerial n. 1.010, <strong>em</strong> maio de 2006, representou<br />

um marco no processo de fortalecimento das ações de Educação<br />

Alimentar e Nutricional ao instituir as diretrizes <strong>para</strong> a promoção<br />

da alimentação saudável nas escolas de educação infantil, fundamental e<br />

de nível médio, públicas e privadas, <strong>em</strong> âmbito nacional, <strong>em</strong> consonância<br />

com a Política de Alimentação e Nutrição, que prevê a “incorporação<br />

do t<strong>em</strong>a alimentação saudável no projeto político pedagógico da escola,<br />

perpassando todas as áreas de estudo e propiciando experiências no cotidiano<br />

das atividades escolares”. 5


I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />

221<br />

Em 2009, essa portaria foi reforçada com a sanção da Lei n. 11.947,<br />

de junho de 2009, e a publicação da Resolução do Fundo Nacional de<br />

Desenvolvimento da Educação (FNDE) n. 38, de julho de 2009, ambas<br />

enfatizando a importância da Educação Alimentar e Nutricional como<br />

parte do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). 6,7 Nesses<br />

documentos são sugeridas estratégias <strong>para</strong> a impl<strong>em</strong>entação da Educação<br />

Alimentar e Nutricional visando à oferta de alimentação saudável na<br />

escola, sendo elas a implantação e manutenção de hortas escolares pedagógicas,<br />

a inserção do t<strong>em</strong>a alimentação saudável no currículo escolar,<br />

a realização de oficinas culinárias experimentais com os alunos, a formação<br />

da comunidade escolar, b<strong>em</strong> como o desenvolvimento de tecnologias<br />

sociais que a benefici<strong>em</strong>. Esses documentos ressaltam que não só<br />

o responsável técnico (nutricionista) deve estar envolvido, mas todos os<br />

profissionais da educação relacionados a esse processo. 5-7<br />

A ênfase dada à educação alimentar e nutricional no PNAE a partir<br />

da publicação dessas regulamentações é fundamental <strong>para</strong> que a alimentação<br />

escolar tenha sua dimensão ampliada, desviando-se do objetivo<br />

puramente biológico de fornecer energia e nutrientes, e passando a<br />

ter um papel pedagógico, ainda mais quando se avalia o alcance do Programa,<br />

cuja expectativa foi atender a 47 milhões de alunos, da educação<br />

básica à educação de jovens adultos <strong>em</strong> 2010. 8<br />

Quanto à sociedade, vale ressaltar sua participação <strong>em</strong> um importante<br />

instrumento de controle social – o Conselho de Alimentação Escolar<br />

(CAE). Esse órgão colegiado deliberativo, criado com a missão de<br />

acompanhar e assessorar as Entidades Executoras do PNAE <strong>em</strong> cada<br />

um dos municípios, é formado por representantes do poder executivo,<br />

entidade civil local, representantes das entidades de trabalhadores<br />

da educação e representantes dos pais e alunos. 6,7 Atua verificando se a<br />

distribuição da alimentação escolar está sendo regular, se há falta de alimentos,<br />

se os alunos estão satisfeitos com a qualidade da alimentação<br />

e se exist<strong>em</strong> falhas que prejudicam a qualidade do PNAE. Dessa forma,<br />

contribui <strong>para</strong> a constante melhora do Programa. 9


222<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

Segundo a Lei n. 11.947, os CAE pod<strong>em</strong> desenvolver suas atribuições<br />

<strong>em</strong> regime de cooperação com os Conselhos de Segurança Alimentar<br />

e Nutricional estaduais, municipais e d<strong>em</strong>ais conselhos afins e<br />

dev<strong>em</strong> observar as diretrizes estabelecidas pelo Conselho Nacional de<br />

Segurança Alimentar e Nutricional (Consea). 6<br />

Outra questão que mostra a importância da consolidação de ações<br />

intersetoriais diz respeito ao previsto, desde a publicação da Portaria<br />

n. 1.010, sobre a orientação de “restrição ao comércio e à promoção comercial<br />

no ambiente escolar de alimentos e pre<strong>para</strong>ções com altos teores<br />

de gordura saturada, gordura trans, açúcar livre e sal e incentivo ao<br />

consumo de frutas, legumes e verduras” 6 , a qual estimulou a publicação<br />

de regulamentações <strong>em</strong> diversos municípios e estados e que, <strong>em</strong>bora<br />

com abordagens distintas, visavam a contribuir com a promoção da<br />

alimentação saudável na escola. 10 Esses dispositivos legais defin<strong>em</strong> os<br />

alimentos cuja comercialização deve ser proibida, permitida ou obrigatória,<br />

ações educativas, capacitação de cantineiros, alvará sanitário, assessoria<br />

técnica, venda nas cercanias, propaganda de alimentos e fiscalização<br />

e sanções. O fato de essas regulamentações existir<strong>em</strong> <strong>em</strong> apenas<br />

algumas localidades e de n<strong>em</strong> todas estar<strong>em</strong> <strong>em</strong> vigor sugere a necessidade<br />

de uma regulamentação nacional. 10<br />

Quanto a publicidade e marketing de alimentos, a World Health<br />

Organization 11 identificou que as principais formas de incentivar a<br />

venda de alimentos <strong>para</strong> crianças são a televisão e o marketing na escola.<br />

Princípios internacionais foram estabelecidos <strong>para</strong> que as crianças<br />

não sejam prejudicadas pela propaganda e por outras estratégias de<br />

marketing de alimentos (p.ex., associação do alimento a personagens<br />

famosos, brindes na <strong>em</strong>balag<strong>em</strong>), uma vez que estudos já mostraram<br />

que esses jovens consumidores são influenciados pelos comerciais e<br />

incentivos agregados e solicitam que os pais compr<strong>em</strong> os alimentos<br />

anunciados. 11,12<br />

No Brasil, recent<strong>em</strong>ente, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária<br />

(Anvisa) publicou a RDC n. 24/2010, que estabelece:


I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />

223<br />

[...] assegurar informações indisponíveis à preservação da saúde de<br />

todos aqueles expostos à oferta, propaganda, publicidade, informação<br />

e outras práticas correlatas cujo objetivo seja a divulgação e a<br />

promoção comercial dos alimentos. 13<br />

Nessa estratégia, são apresentadas as definições de alimento com quantidade<br />

elevada de açúcar, gordura saturada, gordura trans e sódio. Isso<br />

contribui <strong>para</strong> que os consumidores tenham maior possibilidade de tomada<br />

de decisão diante da ampla oferta de alimentos, porém outras medidas<br />

de regulamentação ainda são aguardadas. Monteiro e Castro 14 reforçam<br />

que as ações públicas não dev<strong>em</strong> limitar-se apenas à restrição da<br />

publicidade desses alimentos, mas garantir campanhas que incentiv<strong>em</strong><br />

o consumo de alimentos saudáveis.<br />

Importância da atuação interdisciplinar<br />

dos diversos atores da escola<br />

Segundo o Conselho Federal de Nutricionistas (CFN), as atribuições<br />

do nutricionista na escola inclu<strong>em</strong><br />

[...] planejar, organizar, dirigir, supervisionar e avaliar os serviços de<br />

alimentação e nutrição, além de realizar assistência e educação nutricional<br />

a coletividade ou indivíduos sadios ou enfermos <strong>em</strong> instituições<br />

públicas e privadas. 15<br />

A gestão do PNAE t<strong>em</strong> sido indicada como a atribuição que ocupa o<br />

maior t<strong>em</strong>po dos nutricionistas. 16 Esse fator, muitas vezes associado a um<br />

número reduzido de nutricionistas nas equipes, dificulta que estes estejam<br />

à frente do desenvolvimento e da implantação de ações permanentes<br />

de educação alimentar e nutricional na escola. Para viabilizar essas<br />

ações, é fundamental que o nutricionista conte com a parceria da comunidade<br />

escolar. Todos os atores que estão envolvidos no processo educativo<br />

dev<strong>em</strong> participar, mesmo tendo diferentes graus de influência –


224<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

o esforço conjunto de diretores, coordenadores pedagógicos, assistentes<br />

de direção, professores, agentes escolares e outros funcionários garante<br />

que o processo educativo ocorra, sendo essencial que esses profissionais<br />

desenvolvam trabalho interdisciplinar. 3<br />

Para o pleno envolvimento, esses atores também dev<strong>em</strong> passar<br />

pelo processo de educação alimentar e nutricional, a fim de que se apoder<strong>em</strong><br />

desses conceitos <strong>para</strong> suas próprias vidas – dessa maneira, espera-se<br />

que todos sejam sensibilizados e capacitados <strong>para</strong> produzir e desenvolver<br />

estratégias de formação do aluno. 17 Ao nutricionista, citando<br />

Costa et al. 18 , cabe “estabelecer relação de diálogo entre o saber popular<br />

e o saber técnico, rompendo com o tradicional modelo tecnicista”. Nesse<br />

contexto, a relação do nutricionista com as cozinheiras e os professores<br />

deve ser evidenciada.<br />

Considerando o ambiente escolar, vale enfatizar o papel das cozinheiras<br />

(também denominadas merendeiras). Carvalho et al. 19 , <strong>em</strong> estudo<br />

sobre o seu papel na produção e distribuição da alimentação escolar,<br />

identificaram uma série de fatores que apontam <strong>para</strong> a importância da<br />

inclusão dessas profissionais no processo educativo.<br />

Além de suas atribuições na produção das refeições, que garant<strong>em</strong><br />

que o alimento oferecido seja adequado higienicamente, nutricionalmente<br />

e <strong>em</strong> termos de características sensoriais, as cozinheiras<br />

desenvolv<strong>em</strong> uma relação de afeto com os escolares ao acompanhá-<br />

-los no dia a dia, podendo, dessa maneira, envolver-se no processo<br />

de formação de seus hábitos alimentares e, por essa razão, dev<strong>em</strong> ser<br />

valorizadas. 3,18-20<br />

No processo de formação/capacitação das cozinheiras, é fundamental<br />

que, assim como t<strong>em</strong>as voltados à higiene dos alimentos, sejam<br />

abordadas questões relativas à alimentação saudável dos escolares, pois<br />

além de ser<strong>em</strong> agentes multiplicadores desses conhecimentos durante<br />

o contato com os alunos, muitas vezes pod<strong>em</strong>, por desconhecimento,<br />

tomar atitudes baseadas <strong>em</strong> percepções que afetam negativamente<br />

o processo educativo. Por ex<strong>em</strong>plo, ao servir pratos com quantidade de


I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />

225<br />

acordo com sua percepção do que acham que determinada criança precisa<br />

consumir, e não com base no per capita previsto, ou ao atribuir valor<br />

aos alimentos com base <strong>em</strong> sua capacidade de provocar saciedade<br />

(alimentos fortes versus fracos) ou, ainda, decidir por formas de preparo<br />

que pod<strong>em</strong> levar à monotonia alimentar ou estar <strong>em</strong> desacordo com<br />

as recomendações nutricionais. 19-21<br />

Os professores têm enorme importância no processo, pois conviv<strong>em</strong><br />

por muitas horas diárias com os escolares, desenvolvendo forte vínculo,<br />

tendo a oportunidade de atuar como modelo e vivenciando inúmeras<br />

situações que permit<strong>em</strong> que trabalh<strong>em</strong> t<strong>em</strong>as sobre alimentação<br />

e nutrição. 3<br />

Doyle e Feldman 22 , <strong>em</strong> estudo realizado com estudantes do Ensino<br />

Médio de Manaus, apontaram a importância da identificação dos<br />

educandos com os comunicadores. Nesse estudo, houve uma resposta<br />

positiva às mensagens sobre nutrição quando os comunicadores foram<br />

percebidos pelos estudantes como mais s<strong>em</strong>elhantes a eles, independent<strong>em</strong>ente<br />

do nível de especialização, característica que beneficia<br />

os professores nessa missão.<br />

No entanto, além da identificação com o grupo, também é necessário<br />

que professores tenham formação técnica adequada <strong>em</strong> nutrição<br />

e acesso a materiais que os auxili<strong>em</strong> nessa tarefa. A detecção dessas necessidades<br />

aponta <strong>para</strong> alguns benefícios que a parceria professor-nutricionista<br />

pode gerar. Ressalta-se que <strong>para</strong> essa parceria se efetivar é<br />

fundamental que a direção da escola esteja sensibilizada <strong>para</strong> o desenvolvimento<br />

das ações propostas, além de ter pleno conhecimento da legislação<br />

e atuar como facilitadora do processo.<br />

Em relação às barreiras que os professores pod<strong>em</strong> encontrar, Olivares<br />

et al. 23 , <strong>em</strong> levantamento realizado com 80 instituições de ensino<br />

primário de 50 países da Ásia, África, América Latina, Caribe e Oriente<br />

Médio, por meio de questionário, identificaram carências que limitam o<br />

desenvolvimento da educação alimentar e nutricional; entre elas, as relacionadas<br />

a formação <strong>em</strong> nutrição dos professores, com programas de


226<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

capacitação e atualização suficientes, frequentes e com ampla cobertura,<br />

materiais educativos apropriados <strong>para</strong> educadores e educandos, apoio<br />

político, financiamento e pessoal especializado.<br />

Quanto à formação, segundo Contento et al. 24 , a partir de análises<br />

de programas de educação alimentar e nutricional impl<strong>em</strong>entados<br />

<strong>em</strong> escolas nos Estados Unidos durante a década de 1980, professores<br />

pre<strong>para</strong>dos apresentaram maior interesse por nutrição, melhora na atitude<br />

<strong>em</strong> relação à seleção alimentar e maior t<strong>em</strong>po de aula dedicado a<br />

esse t<strong>em</strong>a. Estudo de Gaglianone et al. 25 mostrou aumento significativo<br />

no conhecimento sobre nutrição e nas atitudes positivas <strong>em</strong> relação<br />

à impl<strong>em</strong>entação de ações educativas sobre esse t<strong>em</strong>a, após capacitação.<br />

Contudo, Boog 3 enfatiza que mais do que o conhecimento técnico,<br />

o professor deve “estar comprometido com a busca ativa: do direito ao<br />

acesso a uma alimentação saudável <strong>para</strong> si e <strong>para</strong> a coletividade, da valorização<br />

da alimentação de boa qualidade”.<br />

Entre os materiais utilizados pelos professores <strong>para</strong> a discussão<br />

sobre alimentação e nutrição, destaca-se o <strong>livro</strong> didático. Vários estudos<br />

têm identificado limitações nesse material, que apresenta muitos<br />

dos conteúdos desatualizados e até mesmo informações incorretas. 26,27<br />

Como ex<strong>em</strong>plo, Gaglianone 26 , <strong>em</strong> seu estudo sobre os conteúdos de 23<br />

<strong>livro</strong>s didáticos de Ciências, encontrou ausência de informações que relacionass<strong>em</strong><br />

maus hábitos alimentares e o surgimento de doenças, estímulo<br />

ao consumo de alimentos de orig<strong>em</strong> animal (supervalorização das<br />

proteínas), tratamento preconceituoso da obesidade e falta de incentivo<br />

ao aleitamento materno.<br />

Em estudo realizado <strong>em</strong> Piracicaba/SP, também foi observado que,<br />

<strong>em</strong> sua maioria, os professores avaliados planejavam seu ensino com<br />

base <strong>em</strong> currículos previamente construídos, s<strong>em</strong> realizar diagnóstico<br />

do interesse dos alunos e s<strong>em</strong> evolução dos conteúdos, que foram ministrados<br />

de forma s<strong>em</strong>elhante <strong>para</strong> as 4 a , 5 a e 7 a séries, ignorando-se<br />

o processo cognitivo dos escolares. Além disso, há uma tendência <strong>em</strong><br />

concentrar essa t<strong>em</strong>ática nas aulas de ciências, privilegiando o enfoque


I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />

227<br />

biológico 28 e distanciando-se do papel social e cultural do alimento, assim<br />

como das situações de vivência. Para que o ensino sobre a alimentação<br />

e a nutrição possa atender ao proposto nas diretrizes <strong>para</strong> a promoção<br />

da alimentação saudável nas escolas 5-7 , é importante que o t<strong>em</strong>a<br />

não fique restrito às aulas de ciências, a um determinado período do<br />

ano, ou que seja trabalhado <strong>em</strong> projetos específicos e desconectados do<br />

comer cotidiano. 3 Deve-se, ainda, valorizar o conhecimento prévio dos<br />

alunos 28 e identificar os interesses e as motivações sobre o t<strong>em</strong>a, tanto<br />

de alunos como de professores, s<strong>em</strong>pre respeitado o contexto cultural<br />

da comunidade. 1<br />

Mesmo com essas limitações, estudos têm mostrado que professores<br />

perceb<strong>em</strong> a importância de desenvolver t<strong>em</strong>as de alimentação e nutrição<br />

e vêm realizando esse trabalho. 25,27,29 Contudo, é importante salientar<br />

que os próprios professores indicam outras dificuldades, além<br />

das que já foram mencionadas, <strong>para</strong> a impl<strong>em</strong>entação de programas de<br />

educação alimentar e nutricional, como o calendário escolar e a necessidade<br />

de dedicar maior t<strong>em</strong>po aos conteúdos tradicionais. 25 Ad<strong>em</strong>ais, ao<br />

mesmo t<strong>em</strong>po que reforçam a necessidade de mais conhecimento/formação<br />

sobre o t<strong>em</strong>a, apontam outros fatores relevantes como barreiras<br />

<strong>para</strong> seu trabalho: a integração entre o que é desenvolvido na escola e na<br />

família e a inclusão do t<strong>em</strong>a no projeto pedagógico. 21,25,30<br />

A efetivação dessas parcerias não é um processo simples, pois exige<br />

grande colaboração entre as partes <strong>para</strong> que a interdisciplinaridade possa<br />

realmente ser praticada.<br />

Ações na escola<br />

Ao se planejar<strong>em</strong> programas de educação alimentar e nutricional no<br />

ambiente escolar, as necessidades e os fatores motivacionais da população-alvo<br />

(incluindo estudantes, professores e comunidade escolar),<br />

assim como o conhecimento prévio, dev<strong>em</strong> ser avaliados cuidadosamente<br />

<strong>para</strong> que sejam adotadas estratégias adequadas, respeitando-se<br />

as questões culturais que envolvam modificações dos conhecimentos


228<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

e das atitudes e que result<strong>em</strong> <strong>em</strong> transformação e mudança no<br />

comportamento. 4<br />

Contento 31 propõe um modelo <strong>para</strong> o desenvolvimento de projetos<br />

que se baseia <strong>em</strong> três eixos:<br />

• fase diagnóstica, na qual ocorre a identificação de recursos e pessoal disponível<br />

<strong>para</strong> o desenvolvimento do programa, assim como os processos<br />

que identificam as necessidades de saúde do grupo, os comportamentos<br />

individuais e as práticas da comunidade que possam melhorar a saúde;<br />

• fase de desenvolvimento definido por meio de uma série de passos, a partir<br />

dos quais são identificados os mediadores potenciais da mudança de<br />

comportamento desejada, a determinação da teoria ou modelo <strong>para</strong> mediar<br />

essas mudanças, o estabelecimento dos objetivos educacionais e o<br />

planejamento de estratégias e atividades baseadas <strong>em</strong> teorias. A forma de<br />

avaliação dos resultados também deve ser planejada nessa fase;<br />

• fase de análise dos resultados que reflet<strong>em</strong> o impacto do programa sobre<br />

o comportamento e as práticas, cujas mudanças foram inicialmente<br />

objetivadas.<br />

Dentro dessa perspectiva, dois aspectos do desenvolvimento de programas<br />

serão discutidos: a seleção de algumas estratégias de trabalho e o<br />

processo de avaliação.<br />

Aprender fazendo<br />

Além da importância de os t<strong>em</strong>as ser<strong>em</strong> tratados de forma transversal 5-7 ,<br />

a metodologia pedagógica adotada <strong>para</strong> o desenvolvimento dos programas<br />

e projetos de Educação Alimentar e Nutricional deve privilegiar o<br />

diálogo horizontal. 32 As atividades propostas dev<strong>em</strong> ser probl<strong>em</strong>atizadoras,<br />

respeitar o conhecimento e a cultura e, o mais importante, ter significado<br />

<strong>para</strong> o educando. 3,32 Isso faz com que os educandos sejam capazes<br />

de ir além da simples <strong>aqui</strong>sição de conhecimento, passando a refletir sobre<br />

suas escolhas alimentares e cultivando a construção da cidadania. 3,32


I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />

229<br />

Dois aspectos pod<strong>em</strong> ser destacados quanto à seleção de estratégias<br />

a ser<strong>em</strong> adotadas: é importante selecionar atividades que estimul<strong>em</strong><br />

a participação dos educandos, enfatizando o aprender fazendo, um dos<br />

quatro pilares da educação propostos pela United Nations Educational,<br />

Scientific and Cultural Organization (Unesco), e, no caso de crianças,<br />

o lúdico t<strong>em</strong> um papel fundamental, pois permite explorar o aprender<br />

brincando. Entre as ferramentas que pod<strong>em</strong> ser usadas, a alimentação<br />

escolar passa a ter papel pedagógico quando inserida no currículo, pois<br />

o momento da alimentação, consumida no ambiente escolar, fornece<br />

inúmeras oportunidades <strong>para</strong> que escolares coloqu<strong>em</strong> <strong>em</strong> prática o que<br />

v<strong>em</strong> sendo desenvolvido nas diferentes áreas de conhecimento. 4<br />

Ao mesmo t<strong>em</strong>po, os alimentos servidos na própria escola dev<strong>em</strong><br />

estar no centro das atividades pedagógicas, sendo explorados a partir<br />

do conhecimento dos escolares sobre o planejamento e preparo das refeições,<br />

além do que v<strong>em</strong> sendo discutido sobre seus diversos aspectos<br />

<strong>em</strong> diferentes áreas. 33,34 É importante olhar o alimento além de suas características<br />

nutricionais, explorando, por ex<strong>em</strong>plo, sua orig<strong>em</strong>, sua importância<br />

<strong>para</strong> o desenvolvimento do ser humano e seu significado social<br />

e econômico. Várias são as oportunidades de aprendizag<strong>em</strong> a partir<br />

da alimentação escolar: higiene pessoal e dos alimentos, relacionamento<br />

e interação, comportamento, autonomia, uso adequado de utensílios,<br />

desenvolvimento do paladar, controle do desperdício, autoestima e imag<strong>em</strong><br />

corporal positiva. 1,3<br />

Horta escolar e oficinas culinárias<br />

A utilização de hortas escolares t<strong>em</strong> sido incentivada pelas regulamentações<br />

publicadas. 5-7 Fruto de uma proposta conjunta da FAO, do FNDE<br />

e do MEC, o projeto (TCP/BRA/2003) “Horta escolar como eixo gerador<br />

de dinâmicas comunitárias, educação ambiental, alimentação saudável<br />

e sustentável” traz inúmeras oportunidades de aprendizag<strong>em</strong>, pois<br />

representa um ecossist<strong>em</strong>a que permite a inclusão dos educandos, dos<br />

professores, da comunidade escolar e, ainda, a articulação com a família,


230<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

pois essas experiências práticas pod<strong>em</strong> ser transmitidas. Prevê-se também<br />

o envolvimento de agricultores familiares e gestores de políticas<br />

públicas. 35<br />

Tal estratégia proporciona oportunidade <strong>para</strong> a prática educativa<br />

integrada, contínua e permanente, não só <strong>para</strong> as questões do alimento<br />

e da nutrição, mas também <strong>para</strong> o ambiente e a cidadania. 35 No estudo<br />

de Moreira 21 , os professores relataram ter desenvolvido as seguintes<br />

atividades a partir da horta: plantio, observação do canteiro, colheita,<br />

contato com a terra, experimentação, atividades <strong>em</strong> sala de aula com<br />

músicas, pesquisa, desenhos, manuais, histórias e caça-palavra. A horta<br />

permite ainda mais: a valorização de produtos regionais e orgânicos,<br />

a redução do desperdício e a produção de hortaliças frescas, s<strong>em</strong> utilização<br />

de agrotóxicos, que pod<strong>em</strong> ser incorporadas ao cardápio da escola,<br />

enriquecendo a qualidade da alimentação.<br />

A experiência da horta pode ser compl<strong>em</strong>entada com oficinas de<br />

culinária, que valorizam a cultura da comunidade e permit<strong>em</strong> a participação<br />

ativa no processo de aprendizag<strong>em</strong>. 36 Além de aprender fazendo, a<br />

criança é exposta a novos alimentos, novas formas de preparo e sabores,<br />

b<strong>em</strong> como à experimentação – aprender a conhecer – junto ao grupo<br />

social, o que pode influenciar positivamente a ingestão dos alimentos. 33<br />

Aprender brincando<br />

No caso de crianças, a opção por atividades lúdicas, que inclu<strong>em</strong> o brincar<br />

e o jogar, parece lógica, uma vez que a brincadeira é um ato natural<br />

desse período da vida. A brincadeira estimula o desenvolvimento infantil<br />

e facilita a aprendizag<strong>em</strong>, pois a própria motivação da criança é aproveitada,<br />

tornando a tarefa mais atrativa, enquanto o conhecimento vai sendo<br />

construído a partir do estímulo aos sentidos, da valorização de sua cultura,<br />

do desenvolvimento motor, da socialização e interação, do exercício da<br />

imaginação e criatividade e da sist<strong>em</strong>atização das experiências. 37,38<br />

Como qualquer material didático de apoio, o jogo deve ter coerência<br />

com as pr<strong>em</strong>issas pedagógicas propostas. 32 Pode ser considerado


I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />

231<br />

como uma brincadeira que envolve regras. A partir das habilidades que<br />

permite desenvolver, é possível <strong>em</strong>pregá-lo <strong>para</strong> uma variedade de propósitos<br />

– no contexto da educação alimentar e nutricional, pode ser<br />

usado <strong>para</strong> transmitir informações, ajudar a construir a autoconfiança,<br />

incr<strong>em</strong>entar a motivação, fomentar a reflexão, possibilitar a prática significativa<br />

d<strong>aqui</strong>lo que está sendo aprendido, contribuir <strong>para</strong> o aprendizado<br />

de regras sociais e também como instrumento de avaliação da ação<br />

educativa.<br />

O uso de histórias também é um recurso interessante, pois pod<strong>em</strong><br />

ser trabalhadas de diversas formas – leitura, dramatização, contador de<br />

histórias, pre<strong>para</strong>ção de alimentos, músicas, fantoches – ou ser o ponto<br />

de partida <strong>para</strong> o desenvolvimento de outros conteúdos e atividades.<br />

Estudos suger<strong>em</strong> que crianças pod<strong>em</strong> ser influenciadas pelas situações<br />

mostradas nas histórias infantis e descobrir mecanismos de tomada de<br />

decisão e solução de probl<strong>em</strong>as, e que pode haver melhora <strong>em</strong> sua autoestima.<br />

39 No acervo de histórias infantis tradicionais, pod<strong>em</strong> ser encontradas<br />

várias situações relacionadas à alimentação possíveis de ser<strong>em</strong><br />

exploradas no ambiente escolar. Estudo norte-americano 40 avaliou<br />

<strong>livro</strong>s infantis pr<strong>em</strong>iados, voltados <strong>para</strong> o público pré-escolar, e identificou<br />

que 45% apresentavam pelo menos uma menção a alimentos. O<br />

grupo mais mencionado foi o de alimentos fonte de carboidratos complexos,<br />

seguido das frutas e açúcares simples/gorduras, <strong>em</strong> sua maioria<br />

(77%) relacionada a mensagens positivas. Hortaliças foram significativamente<br />

menos mencionadas. Embora não esteja claro qual o impacto das<br />

mensagens sobre mudanças nos hábitos alimentares 39 , histórias infantis<br />

permit<strong>em</strong> o desenvolvimento de inúmeros conceitos sobre alimentos<br />

e nutrição. 33<br />

Para o sucesso da utilização/criação de jogos e histórias, é importante<br />

estabelecer objetivos claros do que se pretende alcançar e adequá-los<br />

às habilidades da criança, respeitando-se sua idade e seu desenvolvimento.<br />

O conhecimento dessas características é importante <strong>para</strong> a criação<br />

ou escolha de materiais adequados. Entre os diversos educadores que


232<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

trataram do brincar e da aprendizag<strong>em</strong>, destacam-se as teorias de Piaget<br />

e Vygotsky. Segundo a teoria construtivista proposta por Piaget, as crianças<br />

passam por quatro estágios associados às idades (mas não de forma<br />

rígida), nos quais interag<strong>em</strong> com a realidade de maneira diferente, construindo<br />

seu entendimento de mundo. Tais estágios representam uma sequência<br />

constante e evolu<strong>em</strong> de maneira que <strong>em</strong> cada um o esqu<strong>em</strong>a de<br />

assimilação anterior é englobado e ampliado, devendo ser conhecidos<br />

<strong>para</strong> que a escolha do material didático seja a mais adequada. Vygotsky,<br />

por sua vez, reforçou a importância da atuação dos outros m<strong>em</strong>bros do<br />

grupo social como essencial <strong>para</strong> o desenvolvimento da criança. 17<br />

Respeitando-se esses conceitos, todos os jogos pod<strong>em</strong> ser <strong>em</strong>pregados,<br />

seja o mais simples ou aquele desenvolvido especificamente <strong>para</strong><br />

esse fim ou adaptado (m<strong>em</strong>ória, tabuleiro, lenço-atrás, etc.), desde o<br />

mais tradicional até os modernos games <strong>para</strong> computadores.<br />

Avaliação<br />

Embora todas as etapas de elaboração de programas de Educação Alimentar<br />

e Nutricional sejam essenciais <strong>para</strong> seu sucesso, n<strong>em</strong> s<strong>em</strong>pre sua<br />

avaliação está prevista no planejamento, sendo este um aspecto fundamental<br />

e que deve s<strong>em</strong>pre ser realizado <strong>para</strong> que seja possível julgar a<br />

efetividade e a eficácia do programa e nortear novos caminhos a ser<strong>em</strong><br />

seguidos.<br />

Pérez-Rodrigo e Aranceta 1 reforçam que não só a avaliação final é<br />

importante, mas também a avaliação do processo (avaliação formativa),<br />

que resulta na identificação de fatores que pod<strong>em</strong> gerar maior eficácia<br />

das ações. A avaliação do processo foca <strong>em</strong> impl<strong>em</strong>entação do programa,<br />

controle de qualidade e monitoramento, que explicam seu resultado.<br />

Essa avaliação permite investigar qual é a extensão do programa, o<br />

grau de adesão, o alcance das ações, o uso de materiais, os mediadores<br />

ambientais (p.ex., formação de professores), o conteúdo trabalhado, o<br />

envolvimento da família, a disponibilidade de alimentos saudáveis <strong>em</strong>


I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />

233<br />

casa, as modificações nas refeições oferecidas na escola, a presença de<br />

subgrupos com necessidades especiais, as dificuldades <strong>para</strong> sensibilização,<br />

o apoio externo, entre outros fatores importantes.<br />

Para cada intervenção, é necessário que indicadores de avaliação<br />

sejam determinados. Alguns dos instrumentos que pod<strong>em</strong> ser adotados<br />

<strong>para</strong> essa avaliação inclu<strong>em</strong> a observação das classes, o acompanhamento<br />

da alimentação escolar, os grupos focais e a análise de fatores que<br />

afetam a adesão. 1<br />

A avaliação final, que avalia o impacto do programa, é importante<br />

<strong>para</strong> identificar sua eficácia e deve incluir medidas qualitativas e<br />

quantitativas. 1,29<br />

A adoção de um processo de avaliação pleno e envolvendo toda a<br />

equipe norteia as decisões <strong>para</strong> novas intervenções; portanto, deve ser<br />

s<strong>em</strong>pre considerado cuidadosamente no planejamento.<br />

CONSIDERAÇÕES FINAIS<br />

Este texto teve como objetivo pontuar fatores implicados no desenvolvimento<br />

da educação alimentar e nutricional na escola. Fica claro, mesmo<br />

com base <strong>em</strong> apenas alguns aspectos <strong>aqui</strong> tratados, que não são poucos<br />

os desafios envolvidos nesse amplo processo, que engloba uma gama<br />

tão variada de questões, que vão desde intersetorialidade até o desenvolvimento<br />

de materiais didáticos. Espera-se que a percepção da magnitude<br />

dessa complexidade provoque a reflexão sobre o papel que cada um<br />

pode exercer.<br />

O sucesso das ações depende de quanto o processo está integrado<br />

à realidade dos alunos – a alimentação servida, o currículo, as questões<br />

culturais – e dos esforços, os quais dev<strong>em</strong> ser permanentes e envolver<br />

todos os setores e atores.<br />

Apenas o trabalho <strong>em</strong> conjunto com a finalidade de que os escolares<br />

alcanc<strong>em</strong> muito além da <strong>aqui</strong>sição de conhecimentos, atingindo<br />

competências que os permitam utilizar as informações e recursos


234<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

disponíveis de forma a adotar hábitos alimentares saudáveis, garantirá o<br />

êxito das ações de educação alimentar e nutricional na escola.<br />

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PROGRAMAS DE ALIMENTAÇÃO<br />

ESCOLAR: INSTRUMENTOS DE<br />

PROMOÇÃO DA SEGURANÇA<br />

ALIMENTAR E NUTRICIONAL NA<br />

AMÉRICA LATINA<br />

Walter Belik<br />

Luciana Rosa de Souza<br />

INTRODUÇÃO<br />

Este capítulo visa a discutir a importância dos Programas de Alimentação<br />

Escolar enquanto ações de política social no campo da segurança alimentar<br />

e nutricional, considerando seus transbordamentos <strong>para</strong> a área educacional<br />

e no desenvolvimento local. A principal motivação desse estudo<br />

vincula-se às observações que indicam que os programas de alimentação<br />

escolar têm sido tímidos e não têm chegado à população que mais necessita.<br />

Na América Latina, <strong>em</strong> geral, apenas 1,1% do gasto social associado<br />

ao Produto Interno Bruto (PIB) t<strong>em</strong> sido direcionado aos programas de<br />

alimentação, dentro dos quais se insere a alimentação escolar. 1 Na realidade,<br />

pode-se inferir que caso esses programas foss<strong>em</strong> estendidos e aplicados<br />

de forma universal, de modo a atender toda a população-alvo s<strong>em</strong><br />

discriminação de renda, seus efeitos poderiam ir além do simples aporte<br />

alimentar, além de gerar efeitos no desenvolvimento das regiões.<br />

De fato, quando as políticas sociais são dirigidas de forma intensiva<br />

<strong>para</strong> o apoio a programas de alimentação escolar, pod<strong>em</strong> provocar<br />

enormes ganhos vinculados a educação, saúde e desenvolvimento local,


240<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

além de ter impactos diretos sobre a segurança alimentar. Define-se a<br />

segurança alimentar a partir do acesso aos alimentos de qualidade <strong>em</strong><br />

quantidade adequada e com regularidade. É importante destacar que os<br />

Programas de Alimentação Escolar (PAE), ao reforçar<strong>em</strong> os aspectos da<br />

produção e do consumo local, preservando hábitos alimentares, têm capacidade<br />

de ir além e promover o que se costuma denominar soberania<br />

alimentar das comunidades. 2<br />

Os programas de alimentação escolar são capazes de gerar meios<br />

<strong>para</strong> desenvolver a produção local, desvinculando-a de crises setoriais<br />

e mantendo regularidade nas rendas da comunidade, ao mesmo t<strong>em</strong>po<br />

<strong>em</strong> que se garante o abastecimento alimentar. No momento atual, considerando<br />

o cenário de irregularidade nos preço dos alimentos, a dinamização<br />

local criada a partir da agricultura familiar pode ser um caminho<br />

<strong>para</strong> evitar crises de abastecimento e falta de produtos essenciais à<br />

alimentação. Ad<strong>em</strong>ais, “(esses programas) pod<strong>em</strong> cumprir um papel relevante<br />

na rede de proteção social devido à sua alta capacidade de responder<br />

<strong>em</strong> momentos de crise”. 3<br />

Este capítulo usa o caso do Brasil como ex<strong>em</strong>plo b<strong>em</strong>-sucedido –<br />

mas não acabado – de um PAE que serve como referência <strong>para</strong> toda a<br />

região, já que possui um desenho mais avançado 4,A , além de ter cobertura<br />

universal. Um total de quase 20 países da América Latina e do Caribe<br />

desenvolve programas de alimentação escolar, porém muitos programas<br />

não passam de pequenas ajudas que são transferidas a certas<br />

escolas de regiões carentes <strong>em</strong> algumas épocas do ano. Em outros casos,<br />

a quantidade de alimentos utilizada nas merendas é tão pequena que<br />

proporciona baixos resultados <strong>em</strong> termos nutricionais.<br />

O objetivo mais direto desse trabalho é indicar que os PAE pod<strong>em</strong><br />

ser mais b<strong>em</strong> utilizados como instrumento de promoção da segurança<br />

alimentar e nutricional. Argumenta-se que tal instrumento não t<strong>em</strong><br />

sido b<strong>em</strong> aproveitado, <strong>em</strong> função de seu baixo alcance sobre a população<br />

mais necessitada e do valor relativamente reduzido de suas transferências<br />

aos municípios. Mesmo no Brasil, considerado um ex<strong>em</strong>plo na


I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />

241<br />

impl<strong>em</strong>entação de seu PAE, os resultados medidos <strong>em</strong> termos de impacto<br />

direto ou na percepção da segurança alimentar são reduzidos ou<br />

não foram avaliados. 5 As constatações a respeito do impacto do PAE no<br />

Brasil são provenientes de levantamentos realizados com base na aplicação<br />

de questionários e segundo a Escala Brasileira de Insegurança Alimentar<br />

(Ebia), <strong>em</strong> pesquisa com amostras de domicílios <strong>em</strong> 2006. B De<br />

toda forma, o poder que esses programas pod<strong>em</strong> ter caso sejam desenhados<br />

<strong>para</strong> dinamizar a renda dos produtores locais e outros el<strong>em</strong>entos<br />

ligados à educação e à saúde nas comunidades enseja sua grande capacidade<br />

de atuar como política social.<br />

Este capítulo foi dividido <strong>em</strong> três seções: a primeira analisa a literatura<br />

acerca dos impactos locais dos PAE sobre a dinamização local;<br />

a segunda discute as correlações que pod<strong>em</strong> ser estabelecidas entre<br />

educação e alimentação escolar; e a terceira traça um panorama geral<br />

dos programas de transferência de renda na América Latina, ressaltando<br />

que o ex<strong>em</strong>plo do PAE brasileiro perpassará todo o texto, <strong>em</strong> razão<br />

de seus aspectos de universalidade na oferta do serviço e seu desenho<br />

orientado <strong>para</strong> a dinamização local, facultado por meio do Programa de<br />

Aquisição de Alimentos (PAA), do Governo Federal, que facilita a compra<br />

de produtos da agricultura familiar por parte das prefeituras.<br />

ALIMENTAÇÃO ESCOLAR E DESENVOLVIMENTO LOCAL<br />

O fornecimento de alimentação nas escolas tende a ser um processo<br />

descentralizado por definição, pois a matéria-prima ou mesmo as refeições<br />

prontas precisam chegar até as escolas, sendo distribuídas <strong>em</strong><br />

um amplo espaço geográfico. A alimentação acontece <strong>em</strong> um espaço de<br />

grande dispersão, procurando atender a seu público beneficiário e ao<br />

mesmo t<strong>em</strong>po resguardar aspectos ligados aos hábitos alimentares de<br />

cada grupo envolvido. São muitas as dificuldades presentes no processo<br />

de obtenção dos alimentos e sua posterior distribuição.<br />

Fica evidente que <strong>para</strong> países que depend<strong>em</strong> de doações da cooperação<br />

internacional <strong>para</strong> atender às necessidades diárias de alimentação


242<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

dos estudantes é difícil mencionar a importância de preservação de hábitos<br />

locais. O mesmo ocorre com as estruturas centralizadas de compra<br />

e gestão dos recursos públicos. Nos países mais burocratizados e<br />

com controles mais rígidos quanto aos poderes provinciais ou municipais,<br />

torna-se difícil promover a descentralização dessas compras.<br />

Como resultado, nesses casos, compras centralizadas costumam ocorrer,<br />

muitas vezes, concentradas <strong>em</strong> algumas poucas <strong>em</strong>presas fornecedoras<br />

s<strong>em</strong> promover qualquer geração de renda nas economias locais.<br />

Analisar o caso do Brasil permite entender como o sist<strong>em</strong>a de alimentação<br />

escolar transitou de um formato focalizado <strong>em</strong> termos sociais<br />

e geográfico via compra centralizada <strong>para</strong> um formato universal, com a<br />

<strong>aqui</strong>sição de alimentos por meio da compra descentralizada baseada <strong>em</strong><br />

sist<strong>em</strong>as locais de fornecimento.<br />

No Brasil, o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE)<br />

sofreu grande evolução <strong>em</strong> seus mais de 50 anos de vida. Em seu início,<br />

era uma simples campanha voltada <strong>para</strong> algumas escolas durante<br />

alguns dias da s<strong>em</strong>ana. Seus suprimentos tinham relação direta<br />

com a disponibilidade proporcionada pelas doações de gêneros proveniente<br />

da ajuda alimentar internacional ou programas como o PL 480<br />

norte-americano. C<br />

Em 1979, o programa assumiu caráter nacional e universal. Na década<br />

de 1990, o PNAE começou a se estruturar, estabelecendo algumas<br />

regras referentes às quantidades a ser<strong>em</strong> fornecidas, aos valores nutricionais<br />

e ao sist<strong>em</strong>a de compras envolvido no fornecimento. Finalmente,<br />

<strong>em</strong> 1994, adotou-se a descentralização na gestão do programa, promovendo<br />

seu controle por parte da sociedade civil e facilitando-se as compras<br />

por meio de sist<strong>em</strong>as locais de abastecimento.<br />

Em 1994, o mesmo Projeto de Lei que descentralizou e municipalizou<br />

D a merenda escolar recomendava a preferência por produtos in natura<br />

na compra e a priorização da produção local <strong>para</strong> reduzir custos.<br />

Em 1996, uma nova portaria passou a definir critérios <strong>para</strong> a <strong>aqui</strong>sição


I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />

243<br />

de alimentos <strong>para</strong> a merenda escolar. Essa portaria acentuou a importância<br />

da comercialização de alimentos produzidos na região <strong>para</strong> incentivar<br />

a produção local, além de recomendar a <strong>aqui</strong>sição de produtos<br />

que estivess<strong>em</strong> <strong>em</strong> período de safra na região. Também se indicava a necessidade<br />

de evitar a compra de alimentos de <strong>em</strong>presas monopolísticas,<br />

ou seja, dos grandes atacadistas do setor de alimentação.<br />

As ações vinculadas ao PNAE no modelo descentralizado (ou seja,<br />

após a municipalização da merenda escolar) centravam-se no estímulo<br />

ao associativismo e à profissionalização dos produtores agrícolas familiares.<br />

Nesse modelo de administração do PNAE, a prefeitura seria o<br />

agente promotor da associação entre alimentação escolar e desenvolvimento<br />

local. Entende-se que esse desenho descentralizado apresentado<br />

pelo PNAE é mais apropriado <strong>para</strong> promover o desenvolvimento<br />

local, especialmente <strong>para</strong> municípios pequenos. Parte-se do suposto<br />

que esse desenho de PAE tende a gerar maiores reflexos sobre os produtores<br />

de produtos hortifrutigranjeiros e carnes, situações nas quais<br />

os benefícios derivados da logística, do preço/qualidade e do fortalecimento<br />

da economia local são evidentes. Nesse tipo de PAE, a exceção<br />

deve ser feita <strong>para</strong> a gestão da alimentação escolar nos grandes municípios<br />

e também <strong>para</strong> a compra de gêneros não perecíveis, <strong>para</strong> os quais<br />

as compras <strong>em</strong> grandes quantidades pod<strong>em</strong> representar uma grande<br />

economia.<br />

Informações recolhidas nas quatro edições do Prêmio Gestor Eficiente<br />

da Merenda Escolar organizado pela ONG Ação Fome Zero E<br />

mostram que os municípios que promoveram a compra de alimentos<br />

junto à agricultura e à agroindústria familiar ou ao pequeno comércio<br />

tiveram vantagens <strong>em</strong> termos de renda e <strong>em</strong>prego <strong>para</strong> seu município,<br />

além de garantir<strong>em</strong> uma alimentação saudável e respeitar os hábitos alimentares<br />

regionais. Entretanto, essa opção, por privilegiar os fornecedores<br />

locais, implicou grande esforço, seja no campo administrativo ou<br />

de reorientação de prioridades nas decisões políticas municipais.


244<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

Em alguns casos de municípios b<strong>em</strong>-sucedidos que foram avaliados<br />

pelo prêmio, já se contava com uma estrutura produtiva estabelecida<br />

e um sist<strong>em</strong>a de distribuição constituído. Nesses casos, a gestão da<br />

merenda escolar era feita de forma rotineira e burocrática até que, por<br />

algum motivo de crise – por ex<strong>em</strong>plo, uma baixa nos preços de mercado<br />

pagos aos produtores locais ou uma mudança nos fluxos dos mercados,<br />

ou mesmo por pressão exercida pelos produtores locais –, a opção pela<br />

utilização das compras locais passou a ser adotada. Esses foram os casos<br />

da adoção do suco de laranja na merenda escolar na região de Bebedouro<br />

(SP), do leite no oeste de Santa Catarina, do leite de cabra <strong>em</strong> Sergipe,<br />

da castanha-do-pará <strong>em</strong> alguns municípios da Amazônia, do doce<br />

de coco <strong>em</strong> Quissamã (RJ) e dos alimentos orgânicos <strong>em</strong> vários municípios<br />

analisados.<br />

Em outros casos, o avanço de programas de compra da agricultura<br />

familiar pode ser visto como mais difícil de ser impl<strong>em</strong>entado, pois<br />

envolve o que se chama de desenvolvimento de fornecedores. Nessa<br />

circunstância, torna-se necessário identificar produtores, capacitá-<br />

-los <strong>para</strong> o atendimento aos requisitos de qualidade exigida, auxiliá-los<br />

na pre<strong>para</strong>ção de documentação e estabelecer rotinas de atendimento<br />

e entrega. Geralmente, esse trabalho t<strong>em</strong> início dentro da escola, com<br />

programas de educação alimentar e recuperação de tradições e hábitos<br />

locais apoiados ou incentivados pelo Conselho Municipal de Alimentação<br />

Escolar (CAE). Em momento posterior, há o envolvimento de agrônomos,<br />

assistentes sociais e o pessoal administrativo da prefeitura nas<br />

compras escolares.<br />

Pelo fato de a legislação brasileira <strong>para</strong> compras públicas ser muito<br />

rígida, criou-se uma dificuldade <strong>para</strong> que os pequenos produtores agropecuários<br />

ou pequenos processadores pudess<strong>em</strong> participar dos processos<br />

licitatórios. Em resposta a essas dificuldades, no ano de 2003, o governo<br />

brasileiro lançou o PAA, com uma modalidade <strong>para</strong> a compra da<br />

agricultura familiar (s<strong>em</strong> licitação <strong>em</strong> montante de até R$ 5.000,00/ano)<br />

e posterior doação desse alimento <strong>para</strong> a merenda escolar. Mais tarde,


I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />

245<br />

essa modalidade foi subdividida <strong>em</strong> outras. Entretanto, pode-se resumir<br />

a atuação do governo nesse particular <strong>em</strong> dois tipos: a compra com<br />

doação simultânea e o programa de compra do leite. Em ambos os casos,<br />

as estatísticas não faz<strong>em</strong> diferenciação sobre o destino das compras, de<br />

modo que elas pod<strong>em</strong> ser utilizadas <strong>para</strong> a merenda escolar, como também<br />

<strong>para</strong> a doação a instituições de assistência social.<br />

Levantamentos realizados por Turpin 6 d<strong>em</strong>onstram que foram<br />

gastos R$ 619 milhões nos estados e municípios, entre 2003 e 2008, com<br />

esses dois programas F , porém não se sabe ao certo quanto foi destinado<br />

à alimentação escolar, que deve ser predominante <strong>em</strong> com<strong>para</strong>ção com<br />

outros itens cobertos pelas compras governamentais transferidos a instituições<br />

de caridade municipais. Contudo, há ainda outra modalidade<br />

de PAA que é operado diretamente pela Companhia Nacional de Abastecimento<br />

(Conab), que realiza as compras e que pode ter contribuído<br />

com um pequeno montante adicional <strong>para</strong> o abastecimento da merenda<br />

escolar.<br />

Em sua concepção original, ao consolidar a relação entre o consumo<br />

de alimentos <strong>para</strong> a merenda escolar e sua produção local, buscava-<br />

-se manter as compras da merenda escolar sob o controle do município,<br />

ou da escola, e permitir o acesso de pequenos produtores cadastrados<br />

<strong>para</strong> o circuito de compras dos municípios. Com isso, era possível preservar<br />

os hábitos de consumo locais nas escolas e, ao mesmo t<strong>em</strong>po, gerar<br />

uma escala econômica de produção capaz de viabilizar esses pequenos<br />

agricultores. A conjugação do PNAE com o PAA é um ex<strong>em</strong>plo do<br />

esforço nessa direção que acontece no Brasil.<br />

No entanto, <strong>para</strong> que essas propostas possam ser ampliadas, seria<br />

necessário também melhorar o aporte de alimentos destinados à<br />

merenda escolar. Atualmente, a legislação brasileira prevê que a merenda<br />

deve atender a 15% das necessidades calóricas diárias e prover<br />

9 g de proteína <strong>para</strong> os alunos durante os 200 dias letivos do calendário<br />

escolar. Esses valores são muito reduzidos e não pod<strong>em</strong><br />

alterar significativamente o quadro nutricional grave de famílias <strong>em</strong>


246<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

extr<strong>em</strong>a pobreza. Entretanto, com mais refeições e alimentação de<br />

melhor qualidade, as municipalidades poderiam mudar esse quadro.<br />

Poderiam, por ex<strong>em</strong>plo, comprar mais dos produtores locais, gerando,<br />

dessa maneira, um fluxo significativo de alimentos adquiridos da<br />

agricultura familiar.<br />

Outra providência importante é o incentivo à criação de hortas escolares<br />

(administradas por famílias ou cooperativas de produtores) <strong>para</strong><br />

oferta local. Para tanto, é fundamental que o Poder Público disponibilize<br />

áreas ociosas <strong>em</strong> terrenos municipais e áreas contíguas às escolas.<br />

Este é um el<strong>em</strong>ento importante <strong>para</strong> o funcionamento de uma relação<br />

direta entre fornecedores e compradores, no que se refere à qualidade<br />

dos alimentos fornecidos. Ao mesmo t<strong>em</strong>po, a proximidade das áreas<br />

de produção permite o desenvolvimento de atividades escolares, tendo<br />

a merenda (produção, relações de trabalho, conteúdo nutricional e outros<br />

el<strong>em</strong>entos) como ponto de destaque.<br />

Atualmente, o programa brasileiro atende a um total de 37 milhões<br />

de crianças (pré-escola, ensino infantil e fundamental) com gastos da<br />

União superiores a R$ 1,5 bilhão. Estima-se que, com a incorporação dos<br />

estudantes do Ensino Médio ao PNAE, o gasto do Governo Federal supere<br />

os R$ 2 bilhões, atendendo a cerca de 45 milhões de alunos. Essa<br />

foi outra inovação importante que foi introduzida <strong>em</strong> 2009 – uma diretriz<br />

estabelecendo percentuais <strong>para</strong> a compra local. A legislação atual<br />

prevê que 70% do valor repassado deve ser utilizado <strong>para</strong> a compra de<br />

produtos básicos, o que, por si só, não é uma garantia de compras junto<br />

aos agricultores locais, pois n<strong>em</strong> todos os municípios produz<strong>em</strong> todos<br />

os produtos necessários à merenda escolar, mesmo porque exist<strong>em</strong><br />

vários municípios urbanos, além do fato de muitos produtos básicos ser<strong>em</strong><br />

industrializados, como queijos, carnes, farinhas, óleo de soja, etc., e<br />

os produtores locais não ser<strong>em</strong> capazes de fornecer esses bens <strong>em</strong> condições<br />

(qualidade e quantidade) adequadas.<br />

Finalmente, há um probl<strong>em</strong>a de preços praticados: muitas vezes, a<br />

compra de produtos (mesmo aqueles da produção local) é mais barata


I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />

247<br />

quando feita por <strong>em</strong>presas fornecedoras. Isso s<strong>em</strong> contar custos de<br />

transação envolvidos na operação com pequenos produtores.<br />

Nesta sessão, procurou-se indicar os possíveis impactos da alimentação<br />

escolar sobre a dinamização local, com base no ex<strong>em</strong>plo brasileiro,<br />

cuja importância <strong>em</strong> termos de PAE na América Latina ainda será explorada<br />

na sequência deste estudo. A próxima seção busca apreender as<br />

relações entre os programas de alimentação escolar e o aproveitamento<br />

educacional dos escolares beneficiados, entre outras informações que<br />

vinculam educação das crianças <strong>em</strong> situação de desvantag<strong>em</strong> com relação<br />

à alimentação escolar.<br />

PAE E EDUCAÇÃO<br />

A valorização do espaço escolar como el<strong>em</strong>ento <strong>para</strong> a atração das comunidades<br />

e a participação d<strong>em</strong>ocrática tende a provocar efeitos que<br />

extrapolam a simples necessidade de gestão e o acompanhamento das<br />

políticas públicas. Nas comunidades, a escola funciona como ponto de<br />

encontro, promovendo a educação, a boa nutrição e a integração dos<br />

grupos mais vulneráveis. Assim, vislumbrar a escola como um centro<br />

de referência <strong>em</strong> segurança alimentar e os PAE como seus condutores<br />

pode abrir um novo horizonte <strong>para</strong> as comunidades participar<strong>em</strong><br />

<strong>em</strong> um novo desenho das políticas de alimentação escolar. A participação<br />

popular faculta o <strong>em</strong>poderamento dos atores e t<strong>em</strong> se tornado<br />

a nova política pública que, <strong>em</strong>bora tenha raízes na preocupação neoliberal<br />

de reduzir a tutela do Estado, pode promover a cidadania e<br />

conter grande potencial <strong>para</strong> revitalizar a d<strong>em</strong>ocracia. 7 Portanto, não<br />

se pode identificar os PAE como estando unicamente voltados <strong>para</strong> a<br />

alimentação.<br />

Muitas pesquisas foram realizadas sobre a efetividade dos programas<br />

de alimentação escolar <strong>em</strong> termos nutricionais, e a pergunta que<br />

t<strong>em</strong> balizado tais pesquisas é: qual seria o impacto da alimentação escolar<br />

<strong>em</strong> termos nutricionais? Entretanto, segundo estudo de Kristjansson<br />

et al. 8 , não seria possível apontar dados conclusivos a respeito do


248<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

impacto da merenda escolar sobre a nutrição das crianças. Um mapeamento<br />

de 18 estudos realizados desde a década de 1920, <strong>em</strong> países industrializados<br />

e <strong>em</strong> desenvolvimento, mostra que os resultados variam<br />

dependendo do grupo que está sendo analisado, desde a qualidade e a<br />

frequência dos alimentos fornecidos até outras variáveis da conjuntura<br />

econômica envolvidas no processo. Pode-se concluir, entretanto, que,<br />

do ponto de vista da frequência escolar e da redução da repetência e do<br />

abandono escolar, os PAE representam um grande avanço.<br />

Conforme estudo de Kristjansson et al. 8 , no qual foram analisados<br />

os impactos da alimentação escolar tanto <strong>em</strong> países de baixa renda<br />

como <strong>em</strong> países de alta renda:<br />

Results for height from High Income countries were mixed, but generally<br />

positive. In low income countries, children who were fed at<br />

school attended school more frequently than those in control groups;<br />

this finding translated to an average increase of 4 to 6 days a year per<br />

child. For educational and cognitive outcomes, children who were<br />

fed at school gained more than controls on math achiev<strong>em</strong>ent, and<br />

on some short-term cognitive tasks. School meals may have small<br />

physical and psychosocial benefits for disadvantaged children. (p.8)<br />

É comum a associação das dificuldades de aprendizag<strong>em</strong> com insuficiência<br />

de micronutrientes. No trabalho de Kristjansson et al. 8 , ficou<br />

clara a possibilidade de os programas de alimentação escolar ajudar<strong>em</strong><br />

a minorar os impactos negativos da desnutrição sobre o processo<br />

de aprendizag<strong>em</strong>. Os autores consideram que os PAE pod<strong>em</strong> ter como<br />

objetivos:<br />

• alívio da fome no curto prazo; 9<br />

• oferta de micronutrientes essenciais ao desenvolvimento saudável da<br />

criança;<br />

• facultar o crescimento das crianças; 10


I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />

249<br />

• promover o desenvolvimento cognitivo das crianças e melhorar seu des<strong>em</strong>penho<br />

acadêmico. 10<br />

O estudo de Kristjansson et al. 8 também afirma que “nos países <strong>em</strong> desenvolvimento<br />

a alimentação escolar visa a melhorar a frequência escolar,<br />

a participação e encorajar os estudantes”.<br />

Essa conclusão pode ser corroborada nos estudos do programa norte-americano<br />

segundo evidências a partir do NSLP (National School Luch<br />

Program), <strong>em</strong> atividade desde 1946, quando foi transformado <strong>em</strong> um programa<br />

de alcance nacional. Atualmente, o NSLP atende crianças e jovens<br />

do ensino el<strong>em</strong>entar e secundário cujas famílias possuam renda máxima<br />

entre 131 e 185% da linha da pobreza. As refeições <strong>para</strong> os alunos são subsidiadas<br />

de modo que o Estado cobre até US$ 1,14 do valor da refeição, dependendo<br />

do tipo de refeição e da família beneficiária. G,11 Segundo estudos<br />

realizados <strong>em</strong> diversas escolas norte-americanas nos anos 1980, há um<br />

claro aumento de frequência e pontualidade entre os alunos participantes<br />

do NSLP, porém esses estudos não foram conclusivos sobre a melhoria no<br />

rendimento desses estudantes <strong>em</strong> disciplinas como linguag<strong>em</strong>, mat<strong>em</strong>ática<br />

e leitura. Contudo, exist<strong>em</strong> evidências de que os almoços dos estudantes<br />

beneficiários continham calorias e nutrientes <strong>em</strong> excesso, com evidentes<br />

implicações sobre a situação de obesidade dessas crianças e jovens. 11<br />

Um estudo mais abrangente foi realizado pelo Programa Mundial<br />

de Alimentos (PMA). Segundo esse organismo das Nações Unidas,<br />

quando a alimentação foi oferecida nas escolas, além de a fome ter sido<br />

aliviada imediatamente, a frequência escolar praticamente dobrou durante<br />

um ano. 12 Assim, no que se refere à frequência escolar, há indícios<br />

claros de sua correlação positiva com o programa de alimentação, <strong>em</strong>bora<br />

seus efeitos objetivos na nutrição não tenham sido constatados.<br />

De acordo com os mesmos autores, pesquisas a respeito do impacto<br />

da alimentação escolar, apresentadas <strong>em</strong> encontro realizado no ano<br />

2000, indicaram que existe baixa evidência dos benefícios nutricionais<br />

da alimentação escolar, ainda que se possa apresentar fortes indícios de


250<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

melhorias no processo de aprendizag<strong>em</strong>. Ao mesmo t<strong>em</strong>po, é preciso<br />

ressaltar, tal como afirma Macintyre 13 , que a alimentação escolar se direciona<br />

muito mais aos sintomas da fome que às suas causas subjacentes;<br />

ou seja, <strong>em</strong>bora o alimento possa dar uma satisfação imediata ao estudante,<br />

as raízes da desnutrição pod<strong>em</strong> persistir.<br />

O mesmo estudo encontrou efeitos positivos da alimentação escolar<br />

sobre o crescimento da massa muscular da criança <strong>em</strong> algumas<br />

situa ções especiais. Em relação à capacidade cognitiva das crianças, por<br />

sua vez, os testes mostraram que exist<strong>em</strong> efeitos de longo prazo, além<br />

de outros impactos de curto prazo, como mudanças metabólicas, que<br />

aumentam a oferta de energia <strong>para</strong> as crianças. 8 Em termos de comportamento,<br />

a pesquisa dos autores referidos indica que houve melhoria na<br />

interação das crianças nas atividades da escola após a oferta da alimentação<br />

escolar.<br />

Para resumir, o estudo dos autores acima referidos indica que os<br />

impactos são pequenos nos quesitos antropométricos. Contudo, pode-se<br />

ressaltar, com base nas evidências apontadas, que a alimentação<br />

escolar trouxe melhoria nos indicadores relativos a inteligência, capacidade<br />

de compreensão e comportamento. Além disso, o estudo reforça<br />

que a potencialização dos benefícios depende do desenho do programa<br />

e conclui que afirmar que a alimentação escolar isoladamente é<br />

capaz de resolver todas as dificuldades inerentes à pobreza é uma falha<br />

grave, pois a pobreza d<strong>em</strong>anda ações <strong>em</strong> diferentes frentes <strong>para</strong> ser<br />

erradicada.<br />

Greenhalgh, Kristjansson e Robinson 14 , <strong>em</strong> artigo publicado no<br />

British Medical Journal, corroboram essas afirmações e reforçam o fato<br />

de que<br />

[...] apesar de se verificar que os programas têm um efeito significativo<br />

no crescimento e no des<strong>em</strong>penho cognitivo, as pesquisas realizadas<br />

tiveram muitos desenhos diferentes e foram impl<strong>em</strong>entadas <strong>em</strong><br />

contextos sociais e sist<strong>em</strong>as educacionais variados, por pessoas das


I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />

251<br />

mais diferentes formações, culturas e crenças; e com uma ampla variação<br />

no ambiente econômico e contexto político.<br />

As autoras mostram que uma pesquisa realizada com o fornecimento de<br />

supl<strong>em</strong>entos à base de leite <strong>para</strong> estudantes na Grã-Bretanha <strong>em</strong> 1920,<br />

período de recessão, mostrou um efeito evidente sobre o crescimento<br />

das crianças. A mesma pesquisa, com o mesmo supl<strong>em</strong>ento a base de<br />

leite foi aplicada <strong>em</strong> crianças britânicas <strong>em</strong> 1970, quando não apresentou<br />

benefício significativo. 14<br />

Ainda que se reconheça a necessidade de avaliação mais detalhada<br />

a respeito dos impactos dos PAE sobre quesitos como peso, altura,<br />

desenvolvimento cognitivo e melhorias nutricionais <strong>em</strong> geral, é importante<br />

reconhecer que os impactos exist<strong>em</strong> e que os desenhos das políticas<br />

dev<strong>em</strong> ser suficientes <strong>para</strong> maximizar os efeitos positivos almejados<br />

pela alimentação escolar. Embora, existam evidências importantes de<br />

que a alimentação escolar promove impactos <strong>em</strong> termos de frequência<br />

e avanços nutricionais sobre o beneficiário, vale l<strong>em</strong>brar que, <strong>em</strong> muitos<br />

casos, uma boa alimentação escolar pode influenciar a mudança de hábitos<br />

alimentares da família, mas também pode acontecer de a alimentação<br />

na escola induzir uma redução das quantidades de alimentos servidos<br />

a essa criança <strong>em</strong> seu lar. 14<br />

O ESTADO DA ARTE DOS PAE NA AMÉRICA LATINA<br />

Na América Latina, os PAE já exist<strong>em</strong> há algumas décadas. O Uruguai<br />

possui o mais antigo, com o surgimento datado do começo do século<br />

XX, sendo que os d<strong>em</strong>ais pertenc<strong>em</strong> aos anos de 1950 e 1960. 15 Apesar<br />

do caráter pioneiro desses programas, a desnutrição ainda se apresenta<br />

com alta incidência na região, como um verdadeiro probl<strong>em</strong>a de saúde<br />

pública ainda não solucionado.<br />

Os eixos gerais perseguidos pelos PAE são o alívio da pobreza no<br />

curto prazo associado à melhoria nos níveis nutricionais e à manutenção<br />

das crianças na escola. Ao mesmo t<strong>em</strong>po, esses programas, <strong>para</strong>


252<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

ter<strong>em</strong> efetividade, d<strong>em</strong>andam fort<strong>em</strong>ente investimentos <strong>em</strong> infraestrutura<br />

(saneamento básico, energia elétrica, meios de transporte, etc.),<br />

além de ser<strong>em</strong> dependentes de uma coordenação institucional que pode<br />

estar nos âmbitos da sociedade civil, governo ou mesmo de organismos<br />

internacionais.<br />

Segundo a FAO 16 , os PAE são fundamentais <strong>para</strong> reduzir a pobreza,<br />

a desigualdade econômica e social, tendo <strong>em</strong> vista que:<br />

1. Provêm alimento seguro e sustentável aos menores <strong>em</strong> idade escolar. Incentivam<br />

maior participação das crianças na escola e auxiliam na redução<br />

do abandono escolar e das dificuldades de aprendizag<strong>em</strong>.<br />

2. Oferec<strong>em</strong> um percentual importante de calorias, proteínas e vitaminas<br />

que as crianças necessitam <strong>para</strong> obter melhor nutrição.<br />

3. Auxiliam a integração social e comunitária, contribuindo com a formação<br />

de capital social via participação de pais, professores e autoridades locais<br />

no processo de distribuição, armazenamento, preparo e entrega de<br />

alimentos.<br />

4. Oferec<strong>em</strong> oportunidade de aprendizag<strong>em</strong> e inovação pedagógica ao envolver<br />

diferentes atores no processo.<br />

5. Contribu<strong>em</strong> <strong>para</strong> mobilização de recursos locais por meio da compra de<br />

alimentos de pequenos produtores e utilização de recursos originários da<br />

comunidade.<br />

6. Promov<strong>em</strong> a inserção de crianças e indígenas na escola e na comunidade,<br />

integrando enfoques de gênero s<strong>em</strong> discriminação por raça.<br />

7. Nos casos <strong>em</strong> que estão associados aos programas de saúde, contribu<strong>em</strong><br />

<strong>para</strong> maior participação da comunidade <strong>em</strong> programas de saúde e<br />

nutrição.<br />

A respeito dessa lista, pod<strong>em</strong> ser acrescentados mais dois aspectos de<br />

grande importância <strong>para</strong> o desenvolvimento regional. Do ponto de vista<br />

econômico, os programas de alimentação escolar, quando desenhados<br />

<strong>para</strong> dinamizar a agricultura local, pod<strong>em</strong> permitir o fechamento do


I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />

253<br />

circuito de geração de renda e distribuição dos benefícios, promovendo<br />

o desenvolvimento local e evitando transbordamentos dessa renda <strong>para</strong><br />

outras localidades. Além disso, do ponto de vista do <strong>em</strong>poderamento,<br />

esses programas promov<strong>em</strong> a transparência nas relações de cidadania,<br />

aproximando o Poder Público dos pais de alunos e da sociedade civil organizada.<br />

Em resumo, a gestão local dos recursos da alimentação escolar<br />

reforça o sentimento de pertencimento comunitário.<br />

Na América Latina, os programas de alimentação escolar se generalizaram<br />

nos anos 1950, a partir de repasses de recursos e alimentos<br />

provenientes de programas da ajuda humanitária internacionais, como<br />

o programa PL 480 dos Estados Unidos. Segundo Levine 17 , a doação<br />

de alimentos tinha como objetivo reduzir o superávit de produção dos<br />

agricultores norte-americanos e já havia sido aplicada durante os anos<br />

1930 naquele país <strong>para</strong> garantir a alimentação escolar. Nos anos 1950, no<br />

contexto da Guerra Fria, visando a alimentar o Terceiro Mundo, o Congresso<br />

norte-americano aprovou a doação de alimentos como forma de<br />

conter os movimentos revolucionários que começavam a <strong>em</strong>ergir <strong>em</strong><br />

vários países da região. Milhares de toneladas de trigo, milho e leite <strong>em</strong><br />

pó foram enviadas aos países <strong>em</strong> desenvolvimento com nomes de sugestivos<br />

programas como Aliança <strong>para</strong> o Progresso e Alimentos <strong>para</strong> a Paz.<br />

Relatórios do governo Johnson, nos anos 1960, mencionados por Levine<br />

17 , indicam que os doadores praticamente nada sabiam acerca dos hábitos<br />

alimentares das populações que receberiam os alimentos doados.<br />

Em 1962, as Nações Unidas criaram o PMA, organismo voltado<br />

<strong>para</strong> o desenvolvimento de programas <strong>em</strong>ergenciais de doação. Em<br />

pouco t<strong>em</strong>po, o PMA passou a administrar uma parte importante dos<br />

excedentes norte-americanos, sendo que os Estados Unidos se transformaram<br />

no principal doador <strong>para</strong> a organização. Segundo Marchione<br />

18 , aproximadamente metade do que o PMA faz como doação atualmente<br />

v<strong>em</strong> dos Estados Unidos. Embora o PL 480 tenha um orçamento<br />

anual aprovado pelo Congresso, a ajuda alimentar norte-americana<br />

pode extrapolar esse total s<strong>em</strong>pre que houver excedentes agrícolas s<strong>em</strong>


254<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

colocação no mercado. 18 Os programas de alimentação escolar <strong>em</strong> boa<br />

parte da América Central foram estruturados com base nos excedentes<br />

norte-americanos, à s<strong>em</strong>elhança dos programas dos anos 1930 <strong>em</strong><br />

território norte-americano. Mais tarde, <strong>em</strong> 1946, os países da América<br />

Central passaram a se orientar no programa nacional norte-americano,<br />

após a institucionalização do National School Lunch Program nos Estados<br />

Unidos. 19 Posteriormente, esses programas foram transferidos <strong>para</strong><br />

a administração do PMA. Atualmente, o PMA sustenta programas de<br />

alimentação escolar <strong>em</strong> 74 países, atendendo 21,7 milhões de estudantes<br />

<strong>em</strong> 2005. H<br />

Conforme o documento “Programas de Alimentación Escolar en<br />

América Latina y el Caribe”, I pôde-se apreender que, dentre os países<br />

analisados, J o Brasil é o único que apresenta um desenho de PAE de caráter<br />

puramente universal, <strong>em</strong> que todas as crianças que frequentam escolas<br />

da rede pública nos níveis da pré-escola e educação primária receb<strong>em</strong><br />

refeições, cujo fornecimento t<strong>em</strong> frequência anual, <strong>em</strong>bora a lei<br />

garanta a alimentação <strong>para</strong> apenas os 200 dias letivos.<br />

Os d<strong>em</strong>ais países apresentam programas focalizados, seja no quesito<br />

renda ou <strong>em</strong> termos geográficos. Dessa maneira, apenas os grupos<br />

mais pobres ou de regiões escolhidas receb<strong>em</strong> a merenda escolar. Por<br />

ex<strong>em</strong>plo, a Bolívia focaliza seus programas <strong>em</strong> duas províncias, ao passo<br />

que a Colômbia focaliza o programa <strong>em</strong> áreas rurais e <strong>em</strong> localidades<br />

onde existe maior diversidade étnica. Outros países oferec<strong>em</strong> a merenda<br />

escolar por poucos dias durante um ano e, ao mesmo t<strong>em</strong>po, oferec<strong>em</strong><br />

exclusivamente o café da manhã ou almoço (quase não oferecendo<br />

ambos ao mesmo t<strong>em</strong>po), como é possível verificar no caso do Equador.<br />

O Chile, por sua vez, apresenta um programa de caráter universal<br />

<strong>em</strong> termos espaciais, mas restrito a partir da renda das famílias dos estudantes.<br />

Esse país parte de um programa de alimentação escolar com<br />

uma proposta universal, porém focado <strong>para</strong> que os estudantes de renda<br />

mais baixa obtenham acesso à alimentação. Esse programa é administrado<br />

de forma centralizada pela Junta Nacional de Auxílio Escolar e


I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />

255<br />

Becas (Junaeb), encarregada de fazer as compras da merenda e definir<br />

os beneficiários do programa.<br />

Conforme dados do inventário realizado pela rede de pesquisadores,<br />

<strong>em</strong>presas e gestores envolvidos na alimentação escolar com a<br />

América Latina, <strong>em</strong> dez<strong>em</strong>bro de 2005, entre os países latino-americanos,<br />

somente o Peru (além do Brasil) deixou de ter ajuda internacional<br />

<strong>para</strong> seus programas de alimentação escolar. Ao mesmo t<strong>em</strong>po,<br />

esse levantamento aponta que apenas o Brasil possui um programa<br />

de atendimento universal que funciona com recursos integrais originários<br />

de orçamentos públicos. Os d<strong>em</strong>ais países têm estratégias diferenciadas<br />

de focalização, as quais priorizam um ou mais critérios,<br />

como municípios com alto índice de pobreza, presença de escolas, locais<br />

onde os níveis de frequência escolar são baixos, áreas rurais e regiões<br />

com populações indígenas. Nos países que optaram pela focalização,<br />

a seleção dos beneficiários é feita por indicadores de pobreza<br />

e carências materiais. De modo geral, com<strong>para</strong>ndo-se a situação dos<br />

países na América Latina, os PAE alcançam uma cobertura <strong>em</strong> torno<br />

de 40% <strong>para</strong> alunos da pré-escola e ensino básico 6 , o que pode ser considerado<br />

muito baixo.<br />

A respeito dos programas internos de cada país, Abreu 20 apresentou<br />

uma classificação <strong>em</strong> três grupos de países da América Latina:<br />

aqueles com economias menos complexas, de baixa industrialização,<br />

onde não há tradição de intervenção do Estado na área social e a<br />

execução do programa de merenda escolar é focalizada e centralizada,<br />

existindo grande dependência externa, <strong>em</strong> que se enquadravam Bolívia,<br />

Equador, Peru, Nicarágua e Guat<strong>em</strong>ala; os países com economia<br />

mais desenvolvida, cujos ex<strong>em</strong>plos são a Colômbia e a Venezuela, além<br />

do Chile, onde a merenda ainda é administrada de forma altamente focalizada<br />

e centralizada, <strong>em</strong>bora com maior flexibilidade de gestão que<br />

os primeiros; e os países que, assim como o Brasil, possuíam já no momento<br />

do estudo economias mais diversificadas, com significativa industrialização,<br />

<strong>em</strong> que as políticas de alimentação escolar decorriam


256<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

de uma longa história de atuação do Estado na área social, caracterizando-se<br />

por baixo financiamento externo.<br />

Na América Latina, tornou-se praticamente unânime o estabelecimento<br />

do objetivo principal dos programas como sendo a equidade no<br />

sist<strong>em</strong>a educacional. O objetivo de equidade poderia ser alcançado a<br />

partir dos PAE, uma vez que estes contribu<strong>em</strong> <strong>para</strong> a melhoria no acesso,<br />

permanência e habilidades de aprendizag<strong>em</strong> dos escolares mais vulneráveis,<br />

b<strong>em</strong> como a garantia de suas necessidades nutricionais, particularmente<br />

de carências específicas (ferro, vitamina A, iodo e cálcio).<br />

Assim, esses alunos estariam <strong>em</strong> igualdade de condições com os outros<br />

escolares que se alimentam regularmente, desde que os programas se<br />

estabelecess<strong>em</strong> de forma regular e com um aporte alimentar significativo.<br />

Alguns países ainda dão ênfase à equidade de gênero; outros, como<br />

Bolívia e Colômbia, almejam o fortalecimento da pequena produção<br />

agrícola com a compra local; e outros, ainda, visam ao desenvolvimento<br />

de hortas escolares, como é o caso da Argentina.<br />

Em resumo, são poucos os países do mundo que possu<strong>em</strong> programas<br />

de merenda escolar de alcance verdadeiramente universal. Na América<br />

Latina, apenas três possu<strong>em</strong> programas de merenda escolar com<br />

expressão nacional e de grande cobertura: Brasil, Chile e Panamá. No<br />

Chile, entretanto, assim como nos Estados Unidos, a alimentação escolar<br />

não possui características universais, pois só está disponível <strong>para</strong> os<br />

alunos declarados ou considerados pobres. Nos d<strong>em</strong>ais países da América<br />

Latina, a merenda escolar não t<strong>em</strong> cobertura nacional – são programas<br />

localizados, não atend<strong>em</strong> todos os dias do ano letivo n<strong>em</strong> dispõ<strong>em</strong><br />

de fontes de financiamento fixas e constantes ao longo do t<strong>em</strong>po, baseadas<br />

<strong>em</strong> legislação.<br />

A seguir, encontra-se um quadro resumindo as características principais<br />

dos PAE <strong>em</strong> países da América Latina (Tabela 1).


I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />

257<br />

TABELA 1 Caracterização dos Programas de Alimentação Escolar na América Latina K,21<br />

PAÍS ANO DE<br />

INÍCIO<br />

FOCALI-<br />

ZADO/UNI-<br />

VERSAL<br />

ALUNOS<br />

BENEFICIA-<br />

DOS (10 3 )<br />

COBERTURA GASTO GASTO/DIA<br />

(US$ 10 6 ) 1L NO (US$)<br />

ANUAL POR ALU-<br />

TIPO DE<br />

ALIMENTOS<br />

DIAS/ANO<br />

Argentina 1964 F 1.978 Básica 75 0,15 Desjejum e<br />

almoço<br />

Bolívia 1996 F M 1.274 Básica 20,2 0,08 Desjejum S.I.<br />

Brasil<br />

1954 U 36.300 Pré-escolar e<br />

(2007) N básica<br />

Colômbia 1941 F 2.612 Pré-escolar e<br />

básica<br />

Costa Rica S.I. F 666 Pré-escolar e<br />

básica<br />

Chile 1964 U Q 2.835 Pré-escolar e<br />

básica<br />

1.232,2 O 0,17 Lanche ou<br />

almoço<br />

39,2 0,08 Desjejum, lanche<br />

e almoço<br />

20,9 0,3 Desjejum e<br />

almoço<br />

165,7 0,5 Desjejum e<br />

almoço<br />

Equador 1987 F 2.189 Básica 30,1 0,12 Desjejum e<br />

almoço<br />

Guat<strong>em</strong>ala 1956 F 2.706 Pré-escolar e<br />

básica<br />

200 dias<br />

200 dias<br />

142 P<br />

S.I.<br />

27,2 0,09 Lanche S.I.<br />

180 dias<br />

Parte do ano<br />

escolar R<br />

Honduras 1970 F 1.826 Básica 9,9 0,57 Desjejum 200 dias<br />

México 1960 F 18.351 Básica 286,4 0,26 Desjejum S.I.<br />

Nicarágua 1994 S F 938 Pré-escolar e<br />

básica<br />

4,9 0,06 Lanche S.I.<br />

(continua)


258<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

(continuação)<br />

Panamá T<br />

(2007)<br />

S.I. U 473 Básica 18,7 U 0,26 Leite,<br />

bolachas e<br />

almoço<br />

Paraguai S.I. F 1.384 Básica 5 0,05 Desjejum e<br />

almoço<br />

Peru 1950 V,22 F 4.508 Pré-escolar e<br />

básica<br />

75,4 0,13 Desjejum e<br />

almoço<br />

Uruguai 1910 F 405 Básica 16,6 0,39 Desjejum, lanche<br />

e almoço<br />

Venezuela S.I. F 5.427 Básica 55,8 0,38 Desjejum, lanche<br />

e almoço<br />

S.I.: s<strong>em</strong> informação.<br />

Fonte: Infante 23 e FAO. 24<br />

150 dias<br />

S.I.<br />

S.I.<br />

S.I.<br />

S.I.


I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />

259<br />

Acompanhando a situação dos PAE na América Latina, observam-<br />

-se alguns movimentos recentes que pod<strong>em</strong> alterar o quadro apresentado<br />

na tabela anterior. Há informações de que, no caso da Bolívia W , o governo<br />

haveria encaminhado uma lei que garantiria a universalização do<br />

PAE, a partir de 2007. Os recursos <strong>para</strong> o financiamento dessa expansão<br />

viriam das rendas decorrentes do aumento dos preços do gás natural extraído<br />

do solo boliviano. Entretanto, não há informação sobre os desdobramentos<br />

dessa lei e sobre seus impactos no período recente.<br />

No caso da Nicarágua, no ano de 1994, foi iniciado o Programa Integral<br />

de Nutrición Escolar X , o qual deu um caráter permanente com<br />

t<strong>em</strong>poralidade indefinida ao programa de alimentação escolar na Nicarágua.<br />

Este programa procura reunir os vários programas pulverizados<br />

existentes na Nicarágua, com objetivos que se ass<strong>em</strong>elhavam a este, os<br />

quais tiveram seu surgimento datado de 25 a 30 anos atrás.<br />

Recent<strong>em</strong>ente, no Uruguai, o governo anunciou uma diferenciação<br />

no tipo de alimentação servida por tipo de escola e região. A alimentação<br />

escolar teria oferta universal, mas, existiriam distinções. Y Em escolas<br />

rurais, todas as crianças receberiam almoço diário; nas escolas especiais,<br />

por sua vez, com jornada de oito horas diárias, todos os alunos<br />

receberiam desjejum, almoço e merenda; e nas escolas urbanas, o almoço<br />

seria servido de acordo com a d<strong>em</strong>anda.<br />

No Chile, entende-se que o PAE possui características de universalidade,<br />

pois seu acesso pode ser estendido a todas as crianças; porém<br />

existe um critério de seletividade apenas <strong>para</strong> aquelas carentes, identificadas<br />

por levantamentos do governo, as quais poderiam <strong>acessar</strong> a alimentação<br />

escolar, algo que não apareceu nas experiências do Panamá e<br />

do Brasil.<br />

O objetivo da Tabela 1 foi criar um breve panorama das ações <strong>para</strong><br />

alimentação escolar na América Latina, cujo objetivo maior foi descrever<br />

a situação de tais intervenções e corroborar com o objetivo deste capítulo,<br />

que foi apontar como as políticas de alimentação escolar exist<strong>em</strong>


260<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

<strong>em</strong> praticamente todos os países da região, mas têm sido pouco utilizadas<br />

como ferramenta <strong>para</strong> promover tanto melhorias nutricionais<br />

às crianças latino-americanas como <strong>para</strong> dinamização das economias<br />

locais.<br />

CONSIDERAÇÕES FINAIS<br />

Este capítulo revisitou a literatura e as experiências latino-americanas<br />

sobre alimentação escolar, indicou que estas mostraram relações positivas<br />

entre os desenhos dos programas de alimentação escolar e seus possíveis<br />

resultados <strong>em</strong> termos de desenvolvimento cognitivo e fre quência<br />

escolar dos beneficiários e apresentou resultados sobre dinamização<br />

das economias locais. Considera-se que, a depender dos desenhos adotados<br />

pelos PAE, pode-se promover o dinamismo local e a estabilidade<br />

na renda dos pequenos agricultores, uma vez vinculados com a compra<br />

de alimentos da agricultura familiar <strong>para</strong> a merenda escolar.<br />

O artigo mostrou que a alimentação escolar é parte integrante dos<br />

programas de segurança alimentar desenvolvidos pelos países na América<br />

Latina, <strong>em</strong>bora n<strong>em</strong> s<strong>em</strong>pre as refeições sejam <strong>em</strong> número e quantidade<br />

suficientes.<br />

Exist<strong>em</strong> muitos modelos de programas adaptados às realidades locais<br />

e restritos à capacidade financeira dos governos. Entretanto, <strong>para</strong><br />

enfrentamento da questão da pobreza e da fome na América Latina, é<br />

essencial que haja uma compl<strong>em</strong>entação de esforços entre as comunidades,<br />

entidades governamentais e agências multilaterais, de modo a avançar<br />

no sentido de melhorar os sist<strong>em</strong>as de educação, incluindo o apoio<br />

à saúde e à infraestrutura. Esse tipo de programa não pode depender de<br />

ajudas humanitárias ou doações de excedentes agrícolas de países desenvolvidos,<br />

como t<strong>em</strong> sido a prática nos últimos anos.<br />

Outro aspecto essencial dos PAE refere-se à sua gestão. A observação<br />

dos casos latino-americanos – que são majoritariamente focalizados<br />

– indicou que, nas situações nas quais esses programas foram<br />

implantados, de forma descentralizada no âmbito da região e geridos


I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />

261<br />

d<strong>em</strong>ocraticamente, foi possível atender de forma diferenciada aos diversos<br />

grupos sociais. Essas ações conseguiram promover a capacitação<br />

e a educação nutricional incorporando programas de saúde e nutrição e<br />

mantendo o respeito às tradições locais.<br />

O caso do PAE brasileiro t<strong>em</strong> sido usado como referência, especialmente<br />

na América Latina e Caribe, graças a seu desenho universal<br />

e descentralizado no âmbito do município, com aportes de recursos totalmente<br />

definidos por orçamento do Governo Federal, com perenidade<br />

garantida por lei. Outros países, como Panamá e Chile, também possu<strong>em</strong><br />

programas de abrangência nacional, <strong>em</strong>bora no caso do Chile sua<br />

ação seja direcionada <strong>para</strong> públicos específicos, ou seja, há um processo<br />

de seletividade na oferta do PAE.<br />

Neste momento, <strong>em</strong> que a alta dos preços dos alimentos se coloca<br />

como uma preocupação de todos os países, a alimentação escolar como<br />

uma política de atenção à alimentação aparece <strong>para</strong> a América Latina<br />

como crucial <strong>em</strong> diversos sentidos, seja <strong>para</strong> garantir um acesso mínimo<br />

das crianças à alimentação, melhorando sua nutrição, seja <strong>para</strong> dinamizar<br />

localmente os pequenos produtores. Ainda que não existam<br />

dados consolidados – apenas indicações – dos impactos da alimentação<br />

escolar sobre nutrição e rendimento escolar das crianças, é indicada a<br />

importância de se utilizar a alimentação escolar <strong>para</strong> aumentar os efeitos<br />

positivos sobre os três eixos que a política pode afetar: desenvolvimento<br />

local, frequência escolar e ampliação da segurança alimentar da<br />

população.<br />

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />

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2007. Disponível: http://www.cepal.org/cgi-bin/getProd.asp?xml=/publicaciones<br />

/xml/9/30309/P30309.xml&xsl=/dds/tpl-i/p9f.xsl&base=/tpl-i/top-bottom.xsl.<br />

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da segurança alimentar. [Dissertação de Mestrado]. Campinas: Instituto<br />

de Economia, 2008.<br />

7. Gaventa J. Foreword. In: Cornwall A, Coelho VSP. Spaces for change? The politics<br />

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AEI Press, 1998.<br />

12. World Food Programme. WFO head calls on leaders to support universal school<br />

feeding for world’s poor children. 2005. Disponível <strong>em</strong>: http://www.wfp.org/<br />

english/?ModuleID=137&Key=464 2005. Acesso <strong>em</strong>: 18/8/2008.<br />

13. Macintyre 1992 apud Greenlalgh, Kristjansson e Robinson 2007.<br />

14. Greenhalgh T, Kristjansson E, Robinson V. Realist review to understand the<br />

efficacy of school feeding programmes. 2007. Disponível <strong>em</strong>: http://resources.<br />

bmj.com/bmj/subscribers.


I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />

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Editores, 2006.<br />

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América Latina y el Caribe. 2007. mimeo.<br />

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programe. New Jersey: Princeton University Press, 2008.<br />

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Distribution. J Nutr 2002; 132:2104-11.<br />

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e a Mensuração da Fome dos Estados Unidos. In: Takagi M, Graziano da Silva<br />

J, Belik W. Combate à fome e à pobreza rural. São Paulo: Instituto Cidadania,<br />

2002. p.33-74.<br />

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21. Zepeda AON. Alimentación en las escuelas de América Latina. Recomendaciones<br />

<strong>para</strong> mejorar su efectividad. In: iniciativa alcsh – Working Paper N. 2008.<br />

Disponível <strong>em</strong>: www.rlc.fao.org/iniciativa/wps.htm.<br />

22. Martinez R. Hambre y desigualdad en los países andinos: la desnutrición y<br />

la vulnerabilidad alimentaria en Bolivia, Colombia, Ecuador y Perú. In: Série<br />

Políticas sociais 2005; 112.<br />

23. Infante R. Inventario de los Programas de Alimentación Escolar. Programa<br />

Mundial de Alimentos, 2005.<br />

24. FAO/RLC. Programas de Alimentación Escolar en América Latina y el Caribe<br />

Análisis y Recomendaciones <strong>para</strong> su Efectividad. 2007. (mimeo).


264<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

NOTAS<br />

A<br />

B<br />

C<br />

D<br />

E<br />

F<br />

Entende-se como um desenho mais avançado como PAE aquele que cont<strong>em</strong>pla a<br />

participação da comunidade nas decisões sobre a compra dos alimentos e sobre<br />

os cardápios definidos nas escolas. Em algumas localidades, esses programas de<br />

merenda inclu<strong>em</strong> as hortas escolares, o consumo de produtos orgânicos, os programas<br />

de educação alimentar nas escolas, etc.<br />

A Ebia foi adotada na Pesquisa sobre Amostra de Domicílios (PNAD) aplicada<br />

pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) <strong>em</strong> 2006. Essa escala<br />

está baseada nos estudos de K. Radimer da Universidade de Cornell nos Estados<br />

Unidos dos anos 1990. A escala de Radimer foi utilizada <strong>em</strong> diversos estudos<br />

patrocinados pelo Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (conhecida<br />

como Household Food Security Survey Module – HFSSM), tendo sido aplicada,<br />

com adaptações e após validação, <strong>em</strong> várias comunidades na Venezuela, Colômbia,<br />

República Dominicana, México, Bolívia, Guat<strong>em</strong>ala, Brasil, Burkina Fasso,<br />

Gana, Malásia e Filipinas. 5<br />

A Public Law 480 foi aprovada <strong>em</strong> 1954 nos Estados Unidos e visava à compra de<br />

excedentes alimentares dos produtores <strong>para</strong> doação a países pobres. Internamente,<br />

a PL 480 representava um subsídio ao agricultor e uma forma de estabilizar os<br />

preços de mercado.<br />

Essa lei tornou os municípios unidades responsáveis pela oferta da alimentação<br />

escolar. Esse fato foi um divisor de águas, pois foi por meio dessa medida que se<br />

descentralizou a gestão da alimentação escolar no Brasil, colocando seus mais de<br />

5.000 municípios como responsáveis pela gestão e oferta da alimentação escolar.<br />

As informações sobre o Prêmio pod<strong>em</strong> ser verificadas no site: www.pr<strong>em</strong>iomerenda.org.br.<br />

Compra com doação simultânea e programa de compra do leite, ambos participam<br />

do PAA.<br />

G<br />

Dados de 1997-1998.<br />

H<br />

I<br />

Disponível <strong>em</strong>: http://www.wfp.org/food_aid/school_feeding/Docs/WFP%20<br />

SFfactsheet%20SP06.pdf.<br />

Pre<strong>para</strong>do <strong>para</strong> a o Escritório Regional da FAO <strong>para</strong> a América Latina e o Caribe,<br />

com participação dos autores durante o ano de 2007.


I JORNADA DE ALIMENTAÇÃO NA ESCOLA...<br />

265<br />

J<br />

K<br />

L<br />

M<br />

N<br />

O<br />

P<br />

Q<br />

R<br />

S<br />

T<br />

Os países analisados pelo documento foram: Argentina, Bolívia, Brasil, Colômbia,<br />

Chile, Equador, Guat<strong>em</strong>ala, Honduras e México.<br />

Essa tabela baseou-se <strong>em</strong> estudo desenvolvido por Zepeda 21 e no material fornecido<br />

pela FAO: Programas de Alimentación Escolar en América Latina y el Caribe,<br />

documento da FAO. 16<br />

Do Governo Central, exceto Brasil, com estimativa de contribuição dos estados e<br />

municípios.<br />

Em artigo retirado do site http://www.oei.es/noticias/spip.php?article1303, t<strong>em</strong>-<br />

-se que a Bolívia promoverá a universalização do PAE. O artigo é datado de 5 de<br />

nov<strong>em</strong>bro 2007.<br />

Fonte PNAE – FNDE/MEC.<br />

Considerando-se o gasto de R$ 1,6 bilhão do Governo Federal com uma compl<strong>em</strong>entação<br />

integral desse valor, segundo a Lei, cumprida por apenas 50% dos municípios.<br />

Transformado <strong>em</strong> dólares ao câmbio médio de 2007 de R$ 1,9475/US$.<br />

Dados <strong>para</strong> 2006, informação retirada do documento: Programas de Alimentación<br />

Escolar en América Latina y el Caribe, documento da FAO. 16<br />

O programa é considerado universal porque qualquer aluno da rede de ensino do<br />

Chile t<strong>em</strong> direito de pedir a alimentação escolar. Entretanto, existe um critério<br />

de seletividade segundo o qual apenas os alunos carentes, com renda abaixo de<br />

determinado patamar, terão acesso à alimentação escolar. Portanto, o programa<br />

pode ser classificado como universal com critério de seletividade.<br />

O dado mais recente coloca a oferta de 88 dias de desjejum e 54 dias de almoço.<br />

Esse dado foi coletado <strong>para</strong> o ano de 2004, conforme documento da FAO: Programas<br />

de Alimentación Escolar en América Latina y el Caribe, documento da<br />

FAO. 16<br />

De acordo com o documento disponível <strong>em</strong>: http://<strong>em</strong>aberto.inep.gov.br/index.<br />

php/<strong>em</strong>aberto/article/viewFile/1010/912.<br />

Fonte: Meduca – Ministério de Educação do Panamá.<br />

U<br />

Média dos anos 2005 a 2007.<br />

V<br />

W<br />

Nasceu com ajuda da Usaid, via programa Alimentos <strong>para</strong> o Desenvolvimento,<br />

conforme documento de Martinez. 22<br />

Disponível <strong>em</strong>: http://www.oei.es/noticias/spip.php?article1303.


266<br />

JORNADAS CIENTÍFICAS DO NISAN 2008/2009<br />

X<br />

Y<br />

Disponível <strong>em</strong>: http://<strong>em</strong>aberto.inep.gov.br/index.php/<strong>em</strong>aberto/article/view<br />

File/1010/912.<br />

Disponível <strong>em</strong>: http://<strong>em</strong>aberto.inep.gov.br/index.php/<strong>em</strong>aberto/article/viewFile<br />

/1003/906.

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