Referências Bibliográficas - Nestlé
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Editorial<br />
Caro(a) pediatra<br />
É uma grande satisfação para a <strong>Nestlé</strong> Nutrition poder contribuir<br />
continuamente com a sua atualização científica através desta tradicional<br />
parceria com a Sociedade Brasileira de Pediatria, materializada no Curso<br />
<strong>Nestlé</strong>. Como você poderá perceber, abordaremos temas de grande<br />
importância para a sua prática diária, desta vez com foco especial em<br />
assuntos relacionados à Nutrologia Pediátrica.<br />
A Nutrologia é a área com a qual se relacionam todas as atividades de<br />
pesquisa e desenvolvimento da nossa empresa. Trabalhamos constantemente<br />
para que essas inovações científicas e tecnológicas possam ser incorporadas<br />
aos nossos produtos e, dessa forma, beneficiem as crianças brasileiras de<br />
maneira cada vez mais efetiva.<br />
Este resumo busca facilitar seu aprendizado e seu aprimoramento durante<br />
e após o Curso, constituindo-se em um dos vários serviços que prestamos<br />
aos pediatras brasileiros. Mais um fruto da parceria de longa data que temos<br />
com a classe pediátrica e que muita nos honra.<br />
Tenha um ótimo aproveitamento!<br />
Marília Rosado<br />
Diretora da<br />
<strong>Nestlé</strong> Nutrition
Editorial<br />
Cara(o) colega<br />
Temos o prazer de colocar em suas mãos um volume da coletânea de<br />
resumos das palestras do 64 o Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria.<br />
Trata-se de um dos inúmeros componentes pedagógicos que a organização<br />
do evento desenvolveu para garantir a você o bom acompanhamento das<br />
atividades programadas.<br />
Por meio desses textos, elaborados de forma clara e concisa pelos<br />
professores do Curso, você pode conhecer antecipadamente um pouco do<br />
conteúdo das palestras e refletir sobre os principais conceitos que serão<br />
expostos. Pode também preparar-se para participar ativamente da discussão<br />
dos temas a ser abordados nas mesas-redondas, uma oportunidade que você<br />
não pode deixar de aproveitar. O livro inclui, ademais, espaço reservado<br />
para as anotações que você julgar interessantes para sua prática profissional.<br />
Vale dizer que os professores redigiram os resumos e você os completa, tudo<br />
de acordo com a especificidade de seu interesse em cada tema ou de sua<br />
visão do exercício pediátrico.<br />
Essa publicação cumpre, assim, um papel relevante no aproveitamento<br />
ideal do investimento que reúne a <strong>Nestlé</strong> Nutrition e a SBP, sempre no<br />
intuito de proporcionar-lhe um Curso que não se restrinja apenas à<br />
apresentação de palestras diversas, mas o instrumentalize com recursos<br />
que facilitem o resultado máximo da interação pedagógica planejada.<br />
Um grande abraço,<br />
Dioclécio Campos Júnior<br />
Presidente<br />
da Sociedade Brasileira de Pediatria
Índice<br />
Diretorias - Sociedade Brasileira de Pediatria e<br />
Sociedade Catarinense de Pediatria ..................................................................................................... 8<br />
Organização ............................................................................................................................................................ 12<br />
Programa Científico ............................................................................................................................................... 13<br />
Titulação dos Professores ....................................................................................................................................... 19<br />
Resumos ................................................................................................................................................................. 23<br />
Nutrição saudável na promoção da saúde e prevenção de doenças<br />
Aleitamento Materno ............................................................................................................................................. 25<br />
Alimentação Complementar .................................................................................................................................. 28<br />
Alimentação na Adolescência ................................................................................................................................ 32<br />
Seguimento ambulatorial: como vigiar o crescimento<br />
e nutrir adequadamente?<br />
Novas Curvas de Crescimento (OMS) ...................................................................................................................... 37<br />
Avaliação do Crescimento do Prematuro .............................................................................................................. 39<br />
Déficit de Crescimento ........................................................................................................................................... 43<br />
Combatendo a fome oculta: deficiência de micronutrientes<br />
e de macronutrientes<br />
Fortificação de Alimentos ...................................................................................................................................... 47<br />
Educação Nutricional ............................................................................................................................................. 49<br />
Suplementação Nutricional - Medicamentosa ...................................................................................................... 52<br />
Deficiência de ferro<br />
Dados Epidemiológicos, Causas Principais e Mecanismos Fisiopatológicos Envolvidos ..................................... 59<br />
Sintomatologia Clínica e Repercussão no Processo de Aprendizagem ................................................................62<br />
Prevenção e Tratamento da Deficiência de Ferro ................................................................................................. 63<br />
Tópicos em gastroenterologia pediátrica<br />
Constipação ............................................................................................................................................................ 69<br />
Diarréia Persistente ................................................................................................................................................ 72<br />
Refluxo Gastroesofágico ......................................................................................................................................... 75<br />
Como orientar a alimentação e nutrição em situações de:<br />
Disfagia ................................................................................................................................................................... 79<br />
Alergia Alimentar e Manejo Terapêutico Nutricional ........................................................................................... 82<br />
Doenças Infecciosas ............................................................................................................................................... 86<br />
Defesa profissional<br />
A Consulta Pediátrica ............................................................................................................................................. 91<br />
A Cooperação no Universo da Pediatria ................................................................................................................ 94<br />
O Pediatra no PSF: Direito da População e Garantia de Qualidade no Atendimento ......................................... 98<br />
O pediatra e a escola<br />
Dificuldades Escolares .......................................................................................................................................... 101<br />
O Pediatra, a Escola e a Creche ............................................................................................................................ 105<br />
Prevenção de Acidentes no Ambiente Escolar .................................................................................................... 106<br />
6 6<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Índice<br />
Adolescência<br />
Diagnóstico de Puberdade Precoce ..................................................................................................................... 111<br />
Tratamento da Acne ............................................................................................................................................. 115<br />
Anabolizantes ....................................................................................................................................................... 118<br />
Genética, nutrição e atividade física em doenças crônicas na infância<br />
Obesidade/Diabetes ............................................................................................................................................. 123<br />
Diagnóstico e Tratamento da Criança com Osteoporose .................................................................................... 127<br />
Hipertensão Arterial Sistêmica - Genética, dieta e exercício ................................................................................... 130<br />
Anorexia nervosa<br />
Causas e Epidemiologia ....................................................................................................................................... 133<br />
Bioquímica, Comportamento e Quadro Clínico .................................................................................................. 134<br />
Tratamento e Prevenção ...................................................................................................................................... 136<br />
Novidades no diagnóstico, tratamento e prevenção<br />
das infecções respiratórias agudas<br />
Epidemiologia e Importância do Diagnóstico Etiológico das Infecções Respiratórias Agudas ......................... 141<br />
Infecções Respiratórias Agudas e Crescimento ................................................................................................... 144<br />
Terapêutica Medicamentosa nas Infecções Respiratórias Agudas (IRA): Usos e Abusos .................................... 147<br />
Seguimento do prematuro após a alta<br />
Interpretação do Crescimento ............................................................................................................................. 153<br />
Manejo Nutricional .............................................................................................................................................. 154<br />
Avaliação do Desenvolvimento ........................................................................................................................... 155<br />
Transmissão vertical do HIV<br />
Dados Epidemiológicos Atuais ............................................................................................................................. 161<br />
Protocolos de Diagnóstico e Tratamento ............................................................................................................ 165<br />
Cuidados durante o Acompanhamento de Crianças Nascidas de Mães Infectadas pelo HIV<br />
e Orientação dos Familiares ................................................................................................................................ 169<br />
Interrupção da gravidez de fetos anencefálicos: aspectos bioéticos<br />
O Anencéfalo como Doente em Estado Terminal ............................................................................................... 175<br />
Doação de Órgãos de Recém-Nascido Anencefálico ........................................................................................... 177<br />
O Direito de Interrupção da Gravidez à Luz do Conceito de Vida Humana ...................................................... 181<br />
Neonatologia: como conduzir<br />
A Consulta Pediátrica Pré-Natal ........................................................................................................................... 187<br />
Transporte Neonatal ............................................................................................................................................ 188<br />
Infecção Fúngica .................................................................................................................................................. 190<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 7
Diretoria<br />
Sociedade Brasileira de Pediatria<br />
(Triênio 2007 / 2009)<br />
DIOCLÉCIO CAMPOS JÚNIOR<br />
Presidente<br />
FÁBIO ANCONA LOPEZ<br />
1º Vice-Presidente<br />
EDUARDO DA SILVA VAZ<br />
2º Vice-Presidente<br />
EDSON FERREIRA LIBERAL<br />
Secretário Geral<br />
SHEILA SOUZA MUNIZ TAVARES<br />
1ª Secretária<br />
DENNIS ALEXANDER RABELO BURNS<br />
2º Secretário<br />
MÁRCIO MOACYR DE VASCONCELOS<br />
3º Secretário<br />
MARILENE AUGUSTA R. CRISPINO SANTOS<br />
Diretoria Financeira<br />
MÁRCIA GARCIA ALVES GALVÃO<br />
2º Diretor Financeiro<br />
MÔNICA TESSINARI RANGEL TURA<br />
3º Diretor Financeiro<br />
Assessorias da Presidência<br />
VALÉRIA MARIA BEZERRA SILVA LUNA<br />
Integração Regional<br />
RUBENS TROMBINI GARCIA<br />
Planejamento e Reforma Administrativa<br />
ANAMARIA CAVALCANTE E SILVA<br />
Saúde Pública<br />
ELIANE MARA CESÁRIO PEREIRA<br />
Saúde Ambiental<br />
CARLOS EDUARDO NERY PAES<br />
Políticas Públicas<br />
MÁRIO LAVORATO DA ROCHA<br />
PPP (Procedim. Pediátricos Padronizados)<br />
MARIA DE LOURDES FONSECA VIEIRA<br />
Legislação Escolar<br />
MARIÂNGELA DE MEDEIROS BARBOSA<br />
Apoio às Filiadas<br />
LUIZ CLÁUDIO GONÇALVES DE CASTRO<br />
Grupos de Trabalho e Núcleos Permanentes<br />
DENISE CORRÊA DE PAULA NUNES<br />
Assuntos da Amazônia Continental<br />
CÉLIA MARIA STOLZE SILVANY<br />
Assuntos Legislativos<br />
NEY MARQUES FONSECA<br />
Assuntos Estratégicos<br />
MARIA ARLETE MEIL SCHIMITH ESCRIVÃO<br />
Elaboração de Projetos<br />
Diretorias e Coordenações<br />
JOSÉ HUGO LINS PESSOA<br />
Diretor de Qualificação e Certificação Profissionais<br />
HÉLCIO VILLAÇA SIMÕES<br />
Coordenador do CEXTEP<br />
VIRGINIA RESENDE SILVA WEFFORT<br />
Coordenadora de Áreas de Atuação<br />
MITSURU MIYAKI<br />
Coordenador de Certificação Profissional<br />
FERNANDO JOSÉ DE NÓBREGA<br />
Diretor de Relações Internacionais<br />
SÉRGIO CABRAL<br />
Representante na IPA<br />
VERA REGINA FERNANDES<br />
Representante no MERCOSUL<br />
JOSÉ SABINO DE OLIVEIRA<br />
Diretor dos Departamentos Científicos<br />
e Coordenador de Documentos Científicos<br />
8<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Diretoria<br />
Sociedade Brasileira de Pediatria<br />
(Triênio 2007 / 2009)<br />
JOEL ALVES LAMOUNIER<br />
Diretor-Adjunto dos Departamentos Científicos<br />
ÉRCIO AMARO DE OLIVEIRA FILHO<br />
Diretor de Cursos, Eventos e Promoções<br />
PAULO ROBERTO ANTONACCI CARVALHO<br />
Coordenação dos Cursos de Reanimação<br />
LUIZ ANDERSON LOPES<br />
Coordenador de Congressos<br />
HELIO SANTOS DE QUEIROZ FILHO<br />
Coordenador de Simpósios<br />
MARIA FERNANDA BRANCO DE ALMEIDA<br />
Coordenadora da Reanimação Neonatal<br />
RUTH GUINSBURG<br />
Coordenadora da Reanimação Neonatal<br />
LUIZ FERNANDO LOCH<br />
Coordenador da Reanimação Pediátrica<br />
VALÉRIA MARIA BEZERRA SILVA LUNA<br />
Coordenadora do Suporte Básico de Vida<br />
ROCKSANE DE CARVALHO NORTON<br />
Coordenação CIRAPS<br />
GISÉLIA ALVES PONTES DA SILVA<br />
Diretoria de Ensino e Pesquisa<br />
ANGÉLICA MARIA BICUDO ZEFERINO<br />
Coordenação de Graduação<br />
SILVIA WANICK SARINHO<br />
Coordenadora Adjunta de Graduação<br />
VERA LUCIA VILAR DE ARAÚJO BEZERRA<br />
Coordenadora de Residência e de Estágios em Pediatria<br />
CRISTINA MIUKI ABE JACOB<br />
Coordenadora de Pesquisa<br />
FERNANDA LUISA CERAGIOLI OLIVEIRA<br />
Coordenadora de Pós Graduação<br />
LUCIANA RODRIGUES SILVA<br />
Coordenadora de Doutrina Pediátrica<br />
DANILO BLANK<br />
Diretor de Publicações<br />
RENATO PROCIANOY<br />
Editor do JPED<br />
LUCIA FERRO BRICKS<br />
Coordenadora do PRONAP<br />
JOSÉ PAULO VASCONCELLOS FERREIRA<br />
Coordenador do Centro de Informação Científica<br />
ANA MARIA RAMOS<br />
Diretora de Benefícios e Previdência<br />
RACHEL NISKIER SANCHEZ<br />
Coordenadora de Campanhas<br />
Comissão de Sindicância<br />
ANTONIO DA SILVA MACEDO<br />
ANALÍRIA MORAES PIMENTEL<br />
EDMAR DE AZAMBUJA SALLES<br />
ROSA DE FÁTIMA DA SILVA VIEIRA MARQUES<br />
AROLDO PROHMANN DE CARVALHO<br />
Conselho Fiscal<br />
JOSÉ RUBENS DO AMARAL ZAITUNE<br />
Presidente<br />
SILVIANO FIGUEIRA DE CERQUEIRA<br />
Vice-Presidente<br />
JOÃO SERAFIM FILHO<br />
Secretário<br />
Academia Brasileira<br />
de Pediatria<br />
EDWARD TONELLI<br />
Presidente<br />
JOSÉ DIAS REGO<br />
Secretário<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 9
Diretoria<br />
Sociedade Catarinense de Pediatria<br />
(Gestão 2006 / 2008)<br />
REMACLO FISCHER JÚNIOR<br />
Presidência<br />
DENISE BOUSFIELD DA SILVA<br />
Vice-Presidência<br />
Secretaria<br />
MARCELO FERNANDO DO NASCIMENTO<br />
Secretário Geral<br />
TARCÍSIO CROCOMO<br />
Primeiro Secretário<br />
Coordenadora de Eventos<br />
Sociais e Comemorações<br />
ROSE MARIE MULLER LINHARES<br />
Diretoria de Ações<br />
Comunitárias e Sociais<br />
ISABELA DE CARLOS BACK GIULIANO<br />
MARIA BERNADINO CORREA<br />
MARIA CLAUDIA SCHMITT LOBE<br />
MARGARETE DAMIAN<br />
MAURÍCIO LAERTE SILVA<br />
Segundo Secretário<br />
Tesouraria<br />
MARISTELA AGOSTINHO DOS SANTOS VIEIRA<br />
Tesoureira Geral<br />
GILSON GONÇALVES CÂNDIDO<br />
Primeiro Tesoureiro<br />
CLARISSA INÊS DE ALMEIDA<br />
Segunda Tesoureira<br />
Diretoria dos<br />
Departamentos Científicos<br />
SÉRGIO MARCOS MEIRA<br />
Diretoria de Cursos<br />
e Eventos<br />
EDSON CARVALHO DE SOUZA<br />
Coordenador do Curso<br />
de Reanimação Neonatal<br />
MARCO ANTÔNIO MOURA REIS<br />
Coordenadora do Curso de<br />
Reanimação Pediátrica<br />
CÉSAR AUGUSTO LEMOS<br />
Coordenadora<br />
de Humanização<br />
LEONICE TERESINHA TOBIAS<br />
Diretor de Defesa Profissional<br />
EDSON LUÍS LEMOS<br />
Coordenador de Regionais<br />
JORGE ALBERTO HAZIM<br />
Diretor de Ética e<br />
Credenciamento<br />
MÁRIO CELSO SCHIMITT<br />
Diretoria de Publicações<br />
MARILZA LEAL DO NASCIMENTO<br />
ROSE TEREZINHA MARCELINO<br />
Diretoria de Ensino<br />
e Pesquisa<br />
MARIA MARLENE DE SOUZA PIRES<br />
Diretoria de Informática<br />
MÔNICA AKEMI DE SOUZA K. DOS REIS<br />
LUCIANA HOESCHEL MENDONÇA<br />
PATRÍCIA GHISI<br />
10<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Diretoria<br />
Sociedade Catarinense de Pediatria<br />
(Gestão 2006 / 2008)<br />
Conselho Fiscal<br />
Efetivos<br />
SILVIA MEYER CARDOSO<br />
EVANDRO THOMSEN ANTUNES<br />
GEAN CARLO DA ROCHA<br />
Suplentes<br />
FERNANDO MENEGAZZO ROSA<br />
CLAUDIA VALÉRIA SILVA LEMOS<br />
ANTÔNIO AUGUSTO DE CARVALHO<br />
BRASIL NETO<br />
Conselho Deliberativo<br />
LEILA DENISE CESÁRIO PEREIRA<br />
AROLDO PROHMANN DE CARVALHO<br />
ROBERTO SOUZA MORAES<br />
Cuidados Hospitalares<br />
JANE CARDOSO<br />
Cuidados Primários<br />
MIGUEL PUERTO FILHO<br />
Defesa Profissional<br />
TÂNIA BERNADETE CAMPOS<br />
Dermatologia<br />
GENOIR SIMONI<br />
Endocrinologia e Genética<br />
NILZA MEDEIROS PERIN<br />
Gastroenterologia<br />
Comissão de Sindicância<br />
JOSÉ EDUARDO COUTINHO GÓES<br />
FLÁVIO MORGADO<br />
FERNANDO MARQUES<br />
Departamentos Científicos<br />
MARILZA LEAL NASCIMENTO<br />
Coordenadora<br />
GERSON JOSÉ COELHO<br />
Adolescência<br />
MARIA BEATRIZ R. DO NASCIMENTO<br />
Aleitamento Materno<br />
HELENA MARIA CORREA DE SOUZA VIEIRA<br />
Alergia e Imunologia<br />
NELSON GRISARD<br />
Bioética<br />
MAURÍCIO LAERTE SILVA<br />
Cardiologia<br />
AROLDO PROHMANN DE CARVALHO<br />
Infectologia<br />
NILZETE LIBERATO BRESOLIN<br />
Nefrologia<br />
REMACLO FISCHER JÚNIOR<br />
Neonatologia<br />
JÚLIO AMARO DE SA KONESKI<br />
Neurologia e Saúde Mental<br />
MARIA MARLENE DE SOUZA PIRES<br />
Nutrição e Suporte Nutricional<br />
DENISE BOUSFIELD DA SILVA<br />
Onco-Hematologia<br />
NORBERTO LUDWIG NETO<br />
Pneumologia<br />
AUSTREGÉSILO DA SILVA<br />
Segurança Infantil<br />
JOSÉ EDUARDO COUTINHO GOES<br />
Terapia Intensiva<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 11
Organização<br />
MARÍLIA ROSADO<br />
CARLOS AUGUSTO RODRIGUES<br />
CLAUDIO NUNES<br />
CLEIDE JORGE<br />
ÉRICA BREDA<br />
EVELIZE PEREIRA<br />
FLÁVIO BARCELOS<br />
HENRIQUE OLIVEIRA<br />
ILDERICO JÚNIOR<br />
IRINEU ZETTEL<br />
JOSE BUENO<br />
KEILA FARKUH<br />
MARCELO FREIRE<br />
MARCELO GUERRA<br />
MOACIR LACERDA<br />
RENAN SOUZA<br />
RICARDO MOREIRA<br />
ROBERTO SATO<br />
ROBSON SANTOS<br />
ROSTYLAV SZYMANSKYJ<br />
RUBENS FABEL<br />
SERGIO LOPES<br />
VALÉRIA OLIVEIRA<br />
LUIZ PAULO DE SALLES<br />
12<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Programa<br />
Científico<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 13
Programa Científico<br />
18/08/07<br />
Sábado<br />
Manhã<br />
Tarde<br />
das 08h00<br />
às 09h00<br />
das 09h00<br />
às 10h00<br />
Mesa-Redonda:<br />
Nutrição saudável na<br />
promoção da saúde e<br />
prevenção de doenças<br />
Colóquio<br />
Moderador: Fabio Ancona Lopez (SP)<br />
1. Aleitamento materno<br />
Maria Beatriz Reinert do Nascimento (SC)<br />
2. Alimentação complementar<br />
Virginia Resende Silva Weffort (MG)<br />
3. Alimentação na adolescência<br />
Anne Lise Dias Brasil (SP)<br />
das 14h00<br />
às 15h00<br />
das 15h00<br />
às 16h00<br />
Mesa-Redonda:<br />
Combatendo a fome<br />
oculta: deficiência<br />
de micronutrientes<br />
e de macronutrientes<br />
Colóquio<br />
Moderador: Ennio Leão (MG)<br />
1. Fortificação de alimentos<br />
Paulo Pimenta de Figueiredo Filho (MG)<br />
2. Educação nutricional<br />
Maria Marlene de Souza Pires (SC)<br />
3. Suplementação medicamentosa<br />
Luiz Anderson Lopes (SP)<br />
das 10h15<br />
às 11h15<br />
das 11h15<br />
às 12h15<br />
Mesa-Redonda:<br />
Seguimento ambulatorial:<br />
como vigiar o crescimento<br />
e nutrir adequadamente?<br />
Colóquio<br />
Moderador: Cláudio Leone (SP)<br />
1. Novas curvas de crescimento (OMS)<br />
Vera Lúcia Vilar de Araújo Bezerra (DF)<br />
2. Crianças nascidas prematuramente<br />
Gean Carlo da Rocha (SC)<br />
3. Déficit de crescimento<br />
Isabel Rey Madeira (RJ)<br />
das 16h15<br />
às 17h15<br />
das 17h15<br />
às 18h15<br />
Mesa-Redonda:<br />
Deficiência de ferro<br />
Colóquio<br />
Moderador: Severino Dantas Filho (ES)<br />
1. Dados epidemiológicos/Causas<br />
principais/Mecanismos<br />
fisiopatológicos envolvidos<br />
Rocksane de Carvalho Norton (MG)<br />
2. Sintomatologia clínica/Repercussão<br />
no processo de aprendizagem<br />
Roseli Oselka Saccardo Sarni (SP)<br />
3. Tratamento e prevenção<br />
Denise Bousfield da Silva (SC)<br />
14<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Programa Científico<br />
19/08/07<br />
Domingo<br />
Manhã<br />
Tarde<br />
das 08h00<br />
às 09h00<br />
das 09h00<br />
às 10h00<br />
Mesa-Redonda:<br />
Tópicos em<br />
gastroenterologia<br />
pediátrica<br />
Colóquio<br />
Moderadora: Mônica Lisboa<br />
Chang Wayhs (SC)<br />
1. Constipação intestinal<br />
Renata Gonçalves Rocha (SC)<br />
2. Diarréia persistente<br />
Rose Terezinha Marcelino (SC)<br />
3. Refluxo gastroesofágico<br />
Nilza Perin (SC)<br />
das 14h00<br />
às 15h00<br />
das 15h00<br />
às 16h00<br />
Mesa-Redonda:<br />
Defesa profissional<br />
Colóquio<br />
Moderadores: Milton Macedo de Jesus (PR)<br />
e Remaclo Fischer Júnior (SC)<br />
1. A consulta pediátrica<br />
Eduardo da Silva Vaz (RJ)<br />
2. Cooperativas/Departamento<br />
de convênios<br />
João Cândido de Souza Borges (CE)<br />
3. O pediatra no PSF<br />
Dioclécio Campos Junior (DF)<br />
das 10h15<br />
às 11h15<br />
das 11h15<br />
às 12h15<br />
Mesa-Redonda:<br />
Como orientar a<br />
alimentação e nutrição<br />
em situações de:<br />
Colóquio<br />
Moderador: Mauro Batista de Morais (SP)<br />
1. Disfagia<br />
Guilherme Mariz Maia (RN)<br />
2. Alergia alimentar<br />
Marileise dos Santos Obelar (SC)<br />
3. Doenças infecciosas<br />
Elza Daniel de Mello (RS)<br />
das 16h15<br />
às 17h15<br />
das 17h15<br />
às 18h15<br />
Mesa-Redonda:<br />
O pediatra e a escola<br />
Colóquio<br />
Moderador: Paulo César de Almeida<br />
Mattos (RJ)<br />
1. Dificuldades escolares<br />
Carlos Nogueira Aucelio (DF)<br />
2. O papel do pediatra na creche<br />
e na escola<br />
Mércia Lamenha Medeiros Santos (AL)<br />
3. Prevenção de acidentes no<br />
ambiente escolar<br />
Carlos Eduardo Nery Paes (RS)<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 15
Programa Científico<br />
20/08/07<br />
Segunda-feira<br />
Manhã<br />
Tarde<br />
das 08h00<br />
às 09h00<br />
Mesa-Redonda:<br />
Adolescência<br />
das 14h00<br />
às 15h00<br />
Mesa-Redonda:<br />
Anorexia nervosa<br />
das 09h00<br />
às 10h00<br />
Colóquio<br />
Moderador: Paulo César Pinho<br />
Ribeiro (MG)<br />
1. Diagnóstico de puberdade precoce<br />
Marilza Leal do Nascimento (SC)<br />
2. Tratamento da acne<br />
Rubens Marcelo Souza Leite (DF)<br />
3. Uso de anabolizantes<br />
Ary Lopes Cardoso (SP)<br />
das 15h00<br />
às 16h00<br />
Colóquio<br />
Moderador: Ricardo Halpern (RS)<br />
1. Causas e dados epidemiológicos<br />
principais<br />
Luzia Viviane Fabre (PR)<br />
2. Características bioquímicas, clínicas<br />
e comportamentais<br />
Mauro Fisberg (SP)<br />
3. Tratamento e prevenção<br />
Dênio Lima (DF)<br />
das 10h15<br />
às 11h15<br />
das 11h15<br />
às 12h15<br />
Mesa-Redonda:<br />
Genética, nutrição e<br />
atividade física em doenças<br />
crônicas na infância<br />
Colóquio<br />
Moderadora: Letícia Lima Leão (MG)<br />
1. Obesidade/Diabetes<br />
Romolo Sandrini (PR)<br />
2. Osteopenia/Osteoporose<br />
Genoir Simoni (SC)<br />
3. Hipertensão<br />
Isabela de Carlos Back Giuliano (SC)<br />
das 16h15<br />
às 17h15<br />
das 17h15<br />
às 18h15<br />
Mesa-Redonda:<br />
Novidades no diagnóstico,<br />
tratamento e prevenção<br />
das infecções respiratórias<br />
agudas<br />
Colóquio<br />
Moderador: José Dirceu Ribeiro (SP)<br />
1. Epidemiologia/Importância<br />
do diagnóstico etiológico<br />
Consuelo Silva Oliveira (PA)<br />
2. Impacto no estado nutricional,<br />
no crescimento e no desenvolvimento<br />
Mônica Lisboa Chang Wahys (SC)<br />
3. Terapêutica medicamentosa:<br />
usos e abusos<br />
Cristiano Marques (SC)<br />
16<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Programa Científico<br />
21/08/07<br />
Terça-feira<br />
Manhã<br />
Tarde<br />
das 08h00<br />
às 09h00<br />
das 09h00<br />
às 10h00<br />
das 10h15<br />
às 11h15<br />
Mesa-Redonda:<br />
Seguimento do prematuro<br />
após a alta<br />
Colóquio<br />
Moderadora: Leila Denise Cesário<br />
Pereira (SC)<br />
1. Interpretação do crescimento<br />
José Roberto de Moraes Ramos (RJ)<br />
2. Manejo nutricional<br />
Helenilce de Paula Fiod Costa (SP)<br />
3. Avaliação do desenvolvimento<br />
Rita de Cássia Silveira (RS)<br />
Mesa-Redonda:<br />
Transmissão vertical<br />
do HIV<br />
das 14h00<br />
às 15h00<br />
das 15h00<br />
às 16h00<br />
Mesa-Redonda:<br />
Interrupção da gravidez<br />
de fetos anencefálicos:<br />
aspectos bioéticos<br />
Colóquio<br />
Moderador: Clóvis Francisco<br />
Constantino (SP)<br />
1. O anencéfalo como doente<br />
em estado terminal<br />
Jussara Azambuja Loch (RS)<br />
2. Doação de órgãos de recém-nascido<br />
anencefálico<br />
Sílvia Reis dos Santos (RJ)<br />
3. O direito de interrupção da<br />
gravidez à luz do conceito de vida<br />
humana<br />
Nelson Grisard (SC)<br />
das 11h15<br />
às 12h15<br />
Colóquio<br />
Moderadora: Helena Maria Correa<br />
de Sousa Vieira (SC)<br />
1. Dados epidemiológicos atuais<br />
Aroldo Prohmann de Carvalho (SC)<br />
2. Protocolo de diagnóstico<br />
e tratamento<br />
Rosana Campos da Fonseca (RS)<br />
3. Cuidados durante o<br />
acompanhamento e orientação<br />
dos familiares<br />
Sônia Maria de Faria (SC)<br />
das 16h15<br />
às 17h15<br />
das 17h15<br />
às 18h15<br />
Mesa-Redonda:<br />
Neonatologia:<br />
como conduzir<br />
Colóquio<br />
Moderador: Paulo de Jesus Hartmann<br />
Nader (RS)<br />
1. A consulta pediátrica pré-natal<br />
Antonio Carlos de Almeida Melo (RJ)<br />
2. O transporte neonatal<br />
Valéria Maria Bezerra Silva Luna (PE)<br />
3. Infecção fúngica<br />
Giovana Carla Trilha (SC)<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 17
18<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Professores<br />
Anne Lise Dias Brasil<br />
Doutora em Medicina pela UNIFESP/EPM<br />
Chefe do Setor de Distúrbios do Apetite da Disciplina de<br />
Nutrologia do Departamento de Pediatria da UNIFESP/EPM<br />
Membro do Departamento de Nutrologia da SBP - 2007<br />
Antonio Carlos de Almeida Melo<br />
Neonatologista Responsável pela Unidade Intermediária<br />
Neonatal da Maternidade Carmela Dutra da Secretaria<br />
Municipal de Saúde do Rio de Janeiro<br />
Membro do Departamento de Neonatologia da SBP<br />
Membro dos Comitês de Perinatologia e Aleitamento da SOPERJ<br />
Aroldo Prohmann de Carvalho<br />
Professor Adjunto Doutor de Pediatria da Universidade Federal<br />
de Santa Catarina e Universidade do Vale do Itajaí<br />
Doutor e Mestre em Pediatria pela Universidade Federal<br />
de Minas Gerais<br />
Infectologista Pediatra do Hospital Infantil Joana de Gusmão<br />
de Florianópolis, Santa Catarina<br />
Membro do Conselho Científico do Departamento<br />
de Infectologia da SBP e do Comitê Assessor para Terapia<br />
Anti-Retroviral em Pediatria do Ministério da Saúde do Brasil<br />
Ary Lopes Cardoso<br />
Responsável pela Unidade de Nutrologia do Instituto da Criança<br />
do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP<br />
Médico Assistente Doutor em Medicina pelo Departamento<br />
de Pediatria da Faculdade de Medicina da USP<br />
Carlos Eduardo Nery Paes<br />
Médico Pediatra<br />
Mestre em Saúde Coletiva<br />
Diretor Técnico do Hospital Fêmina de Porto Alegre<br />
Diretor da Presidência da Sociedade Brasileira de Pediatria<br />
Membro do Departamento Científico de Segurança da Criança<br />
e do Adolescente da Sociedade Brasileira de Pediatria<br />
Carlos Nogueira Aucelio<br />
Graduação em Medicina pela Universidade de Brasília (1989)<br />
Mestrado em Ciências da Saúde pela Universidade de Brasília<br />
(2000) e Doutorado em Ciências da Saúde pela Universidade<br />
Federal do Rio Grande do Norte (2006), com Título de<br />
Especialista em Pediatria e Neurofisiologia Clínica<br />
Atualmente é Professor Universitário da Universidade de Brasília,<br />
responsável pelo Setor de Neuropediatria e pelo Laboratório de<br />
Neurofisiologia Clínica do Hospital Universitário de Brasília<br />
Tem experiência na Área de Medicina, com ênfase em<br />
Neurologia Infantil e Neurofisiologia Clínica, atuando<br />
principalmente nos seguintes temas: Epilepsia, Adolescência,<br />
Distúrbio do Aprendizado e EEG na Infância<br />
Cláudio Leone<br />
Professor Livre Docente de Pediatria Preventiva e Social<br />
da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo<br />
Professor Associado do Departamento de Saúde Materno-Infantil<br />
da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo<br />
Clóvis Francisco Constantino<br />
Editor da Revista Bioética do Conselho Federal de Medicina<br />
Presidente do Departamento de Bioética da Sociedade Brasileira<br />
de Pediatria<br />
Presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado<br />
de São Paulo, 2003-2004<br />
Presidente da Sociedade de Pediatria de São Paulo, 1998-2000<br />
Consultor de Bioética do Conjunto Hospitalar do Mandaqui<br />
da Secretaria de Estado de Saúde do Estado de São Paulo<br />
Pediatra<br />
Consuelo Silva de Oliveira<br />
Médica Pesquisadora do Instituto Evandro Chagas<br />
Docente da Universidade do Estado do Pará - Disciplina<br />
de Doenças Infecciosas e Parasitárias<br />
Membro do Departamento de Infectologia Pediátrica<br />
da Sociedade Paranaense de Pediatria<br />
Cristiano Marques<br />
Professor Adjunto de pediatria da Universidade Federal<br />
de Santa Catarina<br />
Pneumologista do Hospital Infantil Joana de Gusmão<br />
Especialista em Pneumologia infantil pela Sociedade Brasileira<br />
de Pediatria e Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia<br />
Dênio Lima<br />
PLD pela Universidade de Londres<br />
Professor de Psiquiatria da Universidade de Brasília,<br />
Chefe da Área de Psiquiatria da Clínica Médica<br />
Psiquiatra da Infância e Adolescência<br />
Denise Bousfield da Silva<br />
Mestre em Ciências Médicas pela Universidade Federal<br />
de Santa Catarina na Área de Concentração de Pediatria<br />
Oncohematologista do Hospital Infantil Joana de Gusmão<br />
Professora do Departamento de Pediatria da Universidade<br />
Federal de Santa Catarina<br />
Dioclécio Campos Júnior<br />
Presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP)<br />
Professor Titular de Pediatria da Universidade de Brasília<br />
(UNB), onde também é Chefe do Centro de Clínicas<br />
Pediátricas do Hospital Universitário<br />
Formado pela Faculdade de Medicina do Triângulo Mineiro,<br />
Doutor em Pediatria pela Université Libre de Bruxelles<br />
Foi Coordenador Nacional do Programa de Assistência Integral<br />
à Saúde da Criança do Ministério da Saúde de 1985 a 1987 e<br />
Secretário Executivo do Ministério da Saúde de 1993 a 1995<br />
Eduardo da Silva Vaz<br />
Pediatra - Especialista em Pediatria pela Sociedade Brasileira<br />
de Pediatria<br />
2º Vice-Presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria<br />
Coordenador dos Programas de Residência Médica do Hospital<br />
Geral de Nova Iguaçu<br />
Elza Daniel de Mello<br />
Professora Adjunta do Departamento de Pediatria da UFRGS<br />
Médica Gastropediatra e Nutróloga<br />
Presidente do Comitê de Nutrologia da SPRS<br />
Ennio Leão<br />
Professor Emérito da Faculdade de Medicina da Universidade<br />
Federal de Minas Gerais<br />
Membro Voluntário de Doenças Nutricionais do Departamento<br />
de Pediatria e do Hospital das Clínicas da Universidade Federal<br />
de Minas Gerais<br />
Membro das Academias Brasileira e Mineira de Pediatria<br />
Fabio Ancona Lopez<br />
Professor Titular da Disciplina de Nutrologia do Departamento<br />
de Pediatria da UNIFESP<br />
Vice-Presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria<br />
Gean Carlo da Rocha<br />
Pediatra e Neonatologista da Maternidade Carmela Dutra -<br />
Florianópolis<br />
Pediatra e Neonatologista da Clínica Santa Helena - Florianópolis<br />
Pediatra da Prefeitura Municipal de Florianópolis<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 19
Professores<br />
Genoir Simoni<br />
Médico Endocrinologista Pediátrico do Hospital Infantil<br />
Joana de Gusmão e Hospital Universitário<br />
Coordenador do Programa de Residência Médica<br />
em Pediatria no Hospital Infantil Joana de Gusmão<br />
Presidente da Associação Catarinense de Medicina<br />
Giovana Carla Trilha<br />
Neonatologista da Maternidade Carmela Dutra - Florianópolis<br />
Neonatologista da Maternidade do Hospital Universitário<br />
da Universidade Federal de Santa Catarina<br />
Guilherme Mariz Maia<br />
Presidente do Departamento de Gastroenterologia Pediátrica da SBP<br />
Médico Gastroenterologista do Hospital Infantil Varela Santiago<br />
Diretor Médico do Hospital Promater - Natal<br />
Helena Maria Correa de Sousa Vieira<br />
Pediatra e Imunologista do Hospital Infantil Joana de Gusmão<br />
Complementação Especializada em Alergia e Imunologia pelo<br />
Instituto da Criança da FMUSP<br />
Responsável pelo Serviço de Atendimento Especializado -<br />
Hospital Dia, do Serviço de Infecto e Imuno do Hospital Infantil<br />
Joana de Gusmão<br />
Helenilce de Paula Fiod Costa<br />
Mestre em Pediatria pela UNIFESP<br />
Coordenadora da Unidade Neonatal do Hospital e Maternidade<br />
Santa Joana - São Paulo<br />
Membro do Departamento de Neonatologia da Sociedade<br />
Brasileira de Pediatria e Sociedade de Pediatria de São Paulo<br />
Isabel Rey Madeira<br />
Pediatra com Área de Atuação em Endocrinologia Pediátrica<br />
pela SBP e SBEM<br />
Professora Assistente do Departamento de Pediatria<br />
da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade<br />
do Estado do Rio de Janeiro<br />
Presidente do Departamento de Pediatria Ambulatorial da SBP<br />
Isabela de Carlos Back Giuliano<br />
Cardiologista Pediátrica, Responsável pelo Ambulatório<br />
de Cardiologia Pediátrica Preventiva do HIJG<br />
Presidente do Grupo de Estudos de Cardiologia Pediátrica<br />
Preventiva da SBC<br />
Doutora em Cardiologia pela Faculdade de Medicina<br />
da Universidade de São Paulo<br />
João Cândido de Souza Borges<br />
Pediatra - Neonatologista, Membro do Departamento<br />
de Defesa Profissional da Sociedade Brasileira de Pediatria<br />
Presidente da Cooperativa dos Pediatras do Ceará<br />
José Dirceu Ribeiro<br />
Coordenador do Departamento de Pediatria da UNICAMP<br />
Presidente do Departamento de Pneumologia Pediátrica<br />
da SBP e da SBPT<br />
Pesquisador da FAPESP e CNPq<br />
José Roberto de Moraes Ramos<br />
Doutor em Ciências pelo Instituto Fernandes Figueira - FIOCRUZ<br />
Chefe do Departamento de Neonatologia do Instituto Fernandes<br />
Figueira - FIOCRUZ<br />
Membro do Departamento de Neonatologia da SBP<br />
e Secretário Geral da SOPERJ - Sociedade de Pediatria<br />
do Estado do Rio de Janeiro<br />
Jussara de Azambuja Loch<br />
Médica Pediatra<br />
Mestre em Bioética pela Universidade do Chile / Organização<br />
Panamericana da Saúde<br />
Professora Assistente de Pediatria e de Bioética da Faculdade<br />
de Medicina e dos Cursos de Pós-Graduação em Ciências da<br />
Saúde da PUC-RS<br />
Coordenadora do Comitê de Bioética da Faculdade de Medicina<br />
e do Hospital São Lucas da PUC-RS<br />
Leila Denise Cesário Pereira<br />
Mestre em Ciências Médicas pela Universidade Federal<br />
de Santa Catarina<br />
Chefe da UTI Neonatal da Maternidade Carmela Dutra<br />
de Florianópolis<br />
Presidente do Departamento Científico de Neonatologia<br />
da Sociedade Catarinense de Pediatria<br />
Letícia Lima Leão<br />
Pediatra e Geneticista<br />
Presidente do Comitê de Genética da Sociedade Brasileira<br />
de Pediatria<br />
Membro do Serviço de Genética do Hospital das Clínicas da UFMG<br />
Luiz Anderson Lopes<br />
Mestre e Doutor em Pediatria - Universidade Federal<br />
de São Paulo - Escola Paulista de Medicina<br />
Coordenador de Congressos da Sociedade Brasileira de Pediatria<br />
Professor Titular de Pediatria da Universidade de Santo Amaro<br />
Professor Adjunto Visitante do Departamento de Pediatria<br />
da Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista<br />
de Medicina<br />
Luzia Viviane Fabre<br />
Psiquiatra, atuando na Área Particular e Pública como<br />
Assessora da Coordenação de Saúde Mental da Secretaria<br />
da Saúde de Curitiba<br />
Residência em Psiquiatria na New Jersey Med SCH, USA<br />
Fellowship em Psiquiatria Infantil na Rutgers Med SCH, USA<br />
Maria Beatriz Reinert do Nascimento<br />
Neonatologista e Coordenadora Médica do Banco de Leite<br />
Humano da Maternidade Darcy Vargas de Joinville/SC<br />
Mestre em Medicina - Área de Concentração: Pediatria - pela<br />
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - FMUSP<br />
Coordenadora e Professora do Núcleo Materno-Infantil do Curso<br />
de Medicina da Universidade da Região de Joinville - UNIVILLE<br />
Maria Marlene de Souza Pires<br />
Professora do Departamento de Pediatria da Universidade<br />
Federal de Santa Catarina<br />
Chefe da Pediatria do Hospital Universitário e do Serviço<br />
de Nutrologia do Hospital Infantil Joana de Gusmão<br />
e Pediatria do Hospital Universitário<br />
Pediatra Nutróloga<br />
Marileise dos Santos Obelar<br />
Mestre em Ciências Médicas - Pediatria UFSC<br />
Professora do Departamento de Saúde Materno-Infantil<br />
da Universidade do Sul de Santa Catarina<br />
Pediatra Nutróloga do HU/UFSC e Hospital Infantil Joana de Gusmão<br />
Membro do Departamento Científico de Nutrologia da SBP<br />
Marilza Leal Nascimento<br />
Professora Assistente do Departamento de Pediatria da UFSC<br />
Mestre em Ciências Médicas<br />
Endocrinologista Pediatra do Hospital Infantil Joana de Gusmão<br />
20<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Professores<br />
Mauro Batista de Morais<br />
Professor Associado, Livre Docente e Chefe da Disciplina de<br />
Gastroenterologia Pediátrica da Universidade Federal de São Paulo<br />
Membro do Departamento de Gastroenterologia da Sociedade<br />
Brasileira de Pediatria<br />
Membro da Diretoria dos Departamentos Científicos<br />
da Sociedade de Pediatria de São Paulo<br />
Mauro Fisberg<br />
Professor Adjunto e Chefe do Centro de Atendimento<br />
e Apoio ao Adolescente, Departamento de Pediatria<br />
da Universidade Federal de São Paulo<br />
Coordenador Científico da Força Tarefa Estilos de<br />
Vida Saudável ILSI Brasil<br />
Mércia Lamenha Medeiros<br />
Professora da Universidade Federal de Alagoas<br />
Mestre em Saúde da Criança e do Adolescente<br />
Milton Macedo de Jesus<br />
Presidente do DC de Defesa Profissional da SBP<br />
Vice-Presidente da Sociedade Paranaense de Pediatria<br />
Presidente do Departamento de Pediatria e Cirurgia Pediátrica<br />
da Associação Médica de Londrina<br />
Mônica Lisboa Chang Wayhs<br />
Pediatra Gastroenterologista e Nutróloga<br />
Professora Doutora do Departamento de Pediatria<br />
da Universidade Federal de Santa Catarina<br />
Nelson Grisard<br />
Professor Livre-Docente Doutor pela UFSC<br />
Pediatra Titular da Academia Brasileira de Pediatria<br />
Professor de Ética e Bioética da UNIVALI e UNISUL, ambas<br />
Universidades em Santa Catarina e Conselheiro do CREMESC<br />
Nilza Medeiros Perin<br />
Mestre em Ciências Médicas pela Universidade Federal<br />
de Santa Catarina<br />
Especialista em Gastroenterologia Pediátrica pela Federação<br />
Brasileira de Gastroenterologia e Sociedade Brasileira de<br />
Pediatria<br />
Gastroenterologista Pediátrica do Hospital Infantil Joana<br />
de Gusmão - Florianópolis/SC<br />
Paulo César de Almeida Mattos<br />
Presidente do Departamento Científico de Saúde Escolar da SBP<br />
Membro do Comitê de Saúde Escolar da Sociedade de Pediatria<br />
do Estado do Rio de Janeiro<br />
Coordenador de Programas de Saúde da Secretaria Municipal<br />
de Saúde do Rio de Janeiro<br />
Paulo César Pinho Ribeiro<br />
Presidente do Departamento de Adolescência da Sociedade<br />
Brasileira de Pediatria<br />
Mestre em Ciências da Saúde da Criança e do Adolescente<br />
pela Universidade Federal de Minas Gerais<br />
Coordenador do Programa “Saúde na Escola” do Governo<br />
de Minas Gerais<br />
Paulo de Jesus Hartmann Nader<br />
Presidente do Departamento de Neonatologia da SBP<br />
Diretor do Serviço de Pediatria e Neonatologia da Universidade<br />
Luterana do Brasil - Canoas/RS<br />
Professor Adjunto de Pediatria da ULBRA<br />
Paulo Pimenta de Figueiredo Filho<br />
Professor do Departamento de Pediatria da Faculdade<br />
de Medicina da UFMG<br />
Coordenador do Setor de Nutrição Pediátrica do Hospital<br />
das Clínicas da UFMG<br />
Membro do Setor de Gastroenterologia Pediátrica<br />
do Hospital das Clínicas da UFMG<br />
Remaclo Fischer Júnior<br />
Coordenador do Serviço de Neonatologia da Maternidade<br />
Carmela Dutra e do Berçário do Hospital Infantil Joana<br />
de Gusmão<br />
Diretor da Clínica e Maternidade Santa Helena<br />
em Florianópolis<br />
Presidente da Sociedade Catarinense de Pediatria<br />
Renata Gonçalves Rocha<br />
Pediatra com Área de Atuação em Gastroenterologia Pediátrica<br />
Professora do Curso de Medicina da Universidade do Extremo<br />
Sul Catarinense e da Universidade do Sul de Santa Catarina<br />
Ricardo Halpern<br />
Professor Adjunto de Pediatria FFFCMPA e ULBRA<br />
Doutor em Pediatria UFRGS<br />
Pediatra do Desenvolvimento e Comportamento<br />
pela Universidade da Carolina do Norte - USA<br />
Presidente do Departamento de Saúde Mental<br />
da Sociedade Brasileira de Pediatria<br />
Rita de Cássia Silveira<br />
Professora Adjunta de Pediatria da UFRGS<br />
Neonatologista do HCPA<br />
Responsável pelo Ambulatório de Seguimento de RN<br />
do HCPA<br />
Rocksane de Carvalho Norton<br />
Professora Adjunta do Departamento de Pediatria<br />
da Faculdade de Medicina da UFMG<br />
Especialista em Nutrologia pela SBP/ABRAN e Doutora<br />
em Gastroenterologia<br />
Membro dos Setores de Nutrologia e de Gastroenterologia<br />
do Departamento de Pediatria da UFMG<br />
Romolo Sandrini Neto<br />
Professor Titular de Pediatria - Universidade Federal<br />
do Paraná<br />
Presidente do Departamento Científico de Endocrinologia<br />
da Sociedade Brasileira de Pediatria<br />
Visiting Associate Professor da Johns Hopkins University -<br />
Departamento de Pediatria - Serviço de Endocrinologia<br />
Pediátrica<br />
Rosana Campos da Fonseca<br />
Pesquisadora Internacional em HIV-NICHD/USA<br />
Consultora Matricial Projeto Nascer/CN-AIDS/MS<br />
Pediatra Responsável-Técnica Prevenção TV do HIV GHC<br />
(Fêmina e Conceição)<br />
Rose Terezinha Marcelino<br />
Gastroenterologista Pediatra, Mestre e Doutoranda<br />
em Pediatria pela Universidade Federal de São Paulo -<br />
UNIFESP/EPM<br />
Preceptora da Residência Médica de Pediatria do Hospital<br />
Municipal São José - Joinville/SC<br />
Presidente da Sociedade Joinvilense de Pediatria e Editora<br />
da Revista Catarinense de Pediatria<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 21
Professores<br />
Roseli Oselka Saccardo Sarni<br />
Doutora em Medicina pela UNIFESP e Médica Assistente<br />
do Departamento de Pediatria da UNIFESP<br />
Professora Assistente do Departamento de Pediatria<br />
da Faculdade de Medicina do ABC<br />
Presidente do Departamento Científico de Nutrologia<br />
da Sociedade Brasileira de Pediatria<br />
Rubens Marcelo Souza Leite<br />
Professor de Dermatologia da Universidade Católica de Brasília<br />
Presidente do Comitê de Dermatologia da Sociedade Brasileira<br />
de Pediatria<br />
Mestre em Dermatologia Pediátrica pela Universidade de Brasília<br />
Severino Dantas Filho<br />
Professor de Pediatria da Escola Superior de Ciências<br />
da Santa Casa de Misericórdia de Vitória/ES - EMESCAM<br />
Professor de Pediatria da Universidade Federal<br />
do Espírito Santo - UFES<br />
Membro do Comitê de Gastroenterologia e Nutrição<br />
da Sociedade Espiritossantense de Pediatria - SOESPE<br />
Sílvia Reis dos Santos<br />
Médica Pediatra e Sanitarista, Chefe da Divisão de Ensino<br />
do Instituto de Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira<br />
da Universidade Federal do Rio de Janeiro<br />
Doutora em Saúde Pública pela Faculdade de Saúde Pública<br />
da Universidade de São Paulo<br />
Mestre em Educação Médica pelo Department<br />
of Medical Education - University of Illinois at Chicago<br />
Mestre em Pediatria pela Universidade Federal do<br />
Rio de Janeiro<br />
Membro do Comitê de Bioética da Sociedade de Pediatria<br />
do Estado do Rio de Janeiro<br />
Sônia Maria de Faria<br />
Professora do Departamento de Pediatria da Universidade<br />
Federal de Santa Catarina<br />
Infectologista Pediatra do Hospital Infantil Joana de Gusmão -<br />
Florianópolis/SC<br />
Mestre em Pediatria pela Universidade Federal<br />
de São Paulo<br />
Valéria Maria Bezerra Silva<br />
Médica Pediatra Instrutora do Curso de Suporte Avançado<br />
de Vida em Pediatria e Coordenadora do Programa<br />
do Suporte Básico de Vida da SBP<br />
Mestre em Pediatria pela UFPE<br />
Chefe da Pediatria do Hospital de Lucena em Recife - PE<br />
Vera Lúcia Vilar de Araújo Bezerra<br />
Professora Titular de Pediatria do Departamento de Medicina<br />
da Criança e do Adolescente da Faculdade de Medicina da<br />
Universidade de Brasília<br />
Virginia Resende Silva Weffort<br />
Professora Adjunta e Chefe da Disciplina de Pediatria da<br />
Universidade Federal do Triângulo Mineiro - Uberaba/MG<br />
Membro do Departamento de Nutrologia da SBP<br />
Pró-Reitora Extensão da UFTM e Coordenadora Adjunta<br />
da Área de Saúde no Fórum de Pró-Reitores das Universidades<br />
Públicas Brasileiras<br />
22<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Resumos
24<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Nutrição saudável na promoção<br />
da saúde e prevenção de doenças<br />
Aleitamento Materno<br />
MARIA BEATRIZ REINERT<br />
DO NASCIMENTO<br />
“Crianças são o futuro da sociedade,<br />
e suas mães são guardiãs desse futuro”<br />
The World Health Report 2005<br />
Em nosso mundo, mais de seis milhões de<br />
mortes de crianças com idade inferior a cinco<br />
anos ocorrem a cada ano como conseqüência,<br />
direta ou indireta, da desnutrição. Estima-se<br />
que ao menos dois terços destas catástrofes<br />
sociais ocorram no primeiro ano de vida, e<br />
estejam relacionadas a práticas alimentares<br />
inapropriadas.<br />
O desmame precoce, a rara prática do aleitamento<br />
materno (AM) exclusivo – em todo o<br />
mundo apenas 35% dos lactentes menores de<br />
quatro meses são exclusivamente amamentados<br />
– e a utilização de alimentos complementares<br />
inadequados estão intimamente<br />
relacionados ao aumento da mortalidade e<br />
morbidade infantil. À longo prazo, observa-se,<br />
ainda, influência negativa sobre o rendimento<br />
escolar, a produtividade e o desenvolvimento<br />
intelectual e social.<br />
Há necessidade de se melhorar a sobrevivência,<br />
o crescimento e o desenvolvimento das crianças<br />
durante os primeiros anos de vida. Assim, como<br />
política global de saúde pública, a Organização<br />
Mundial da Saúde recomenda a proteção,<br />
promoção e apoio da amamentação precoce e<br />
exclusiva até os seis meses de vida, seguida da<br />
manutenção do AM até os dois anos ou mais,<br />
com alimentação complementar apropriada<br />
para a idade.<br />
O AM é o modo mais natural e seguro de alimentação<br />
para a criança pequena. Proporciona<br />
uma combinação única de proteínas, lipídios,<br />
carboidratos, minerais, vitaminas, enzimas e<br />
células vivas, assim como benefícios nutricionais,<br />
imunológicos, psicológicos e econômicos reconhecidos<br />
e inquestionáveis.<br />
As crianças não são as únicas beneficiadas pelo<br />
aleitamento natural. As vantagens são estendidas<br />
às mães, com redução do sangramento pósparto,<br />
involução uterina mais rápida, menor<br />
risco de diabetes tipo 2, diminuição da incidência<br />
de osteoporose, câncer de ovário e de mama,<br />
além de maior espaçamento entre gestações.<br />
Um dos mais nobres aspectos do leite humano<br />
é a presença dos elementos de defesa que,<br />
associados a sua perfeita composição e pureza<br />
garantem efeito protetor em relação à morbidade<br />
e à mortalidade da criança.<br />
Nos países em desenvolvimento, as principais<br />
causas de morte na faixa etária pediátrica são<br />
a desnutrição protéico-calórica e as moléstias<br />
infecciosas. A desnutrição ocorre especialmente<br />
nos locais onde os alimentos complementares<br />
têm baixo valor nutricional. Nesses locais,<br />
é significativo o efeito do aleitamento natural<br />
sobre a mortalidade infantil, pois pelo menos<br />
1,45 milhões de vidas são perdidas, a cada<br />
ano, em decorrência de uma amamentação<br />
sub-ótima.<br />
O AM está associado à redução da mortalidade<br />
pós-neonatal também nos países desenvolvidos.<br />
Cerca de 720 mortes anuais de lactentes americanos,<br />
com idade entre um e 11 meses, poderiam<br />
ser evitadas se 100% das mães iniciassem<br />
a amamentação.<br />
O impacto do AM sobre a mortalidade neonatal<br />
tem sido estudado. A amamentação precoce<br />
compreende um importante passo para prevenir<br />
a hipotermia e a hipoglicemia, que podem<br />
ser causa de óbito na primeira semana de vida.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 25
Nutrição saudável na promoção da saúde e prevenção de doenças<br />
Estudo realizado na África mostrou que intervenções<br />
para melhorar as práticas alimentares<br />
dos recém-nascidos poderiam resultar em redução<br />
considerável da mortalidade neonatal.<br />
O número de mortes diminuiria em 16,3%<br />
se todos os neonatos fossem amamentados no<br />
primeiro dia de vida, e em 22,3% se o início do<br />
AM acontecesse já na primeira hora pós-parto.<br />
Os componentes imunológicos do leite humano<br />
são responsáveis pela diminuição da incidência<br />
de doenças infecciosas, alérgicas e inflamatórias,<br />
com conseqüente redução do número de<br />
internações hospitalares nos recém-nascidos e<br />
lactentes aleitados naturalmente. Há proteção<br />
contra infecções gastrointestinais e respiratórias,<br />
bem como redução na incidência de otite<br />
média aguda, de infecção do trato urinário e de<br />
meningite por Haemophilus influenza.<br />
A ação do leite humano no sistema imune do<br />
lactente poderia explicar o relato de que as<br />
doenças alérgicas são menos prevalentes e<br />
menos severas em crianças amamentadas, bem<br />
como que o desmame é descrito como fator<br />
de risco para doença de Crohn e linfoma.<br />
Esse efeito também poderia ser considerado para<br />
justificar uma melhor resposta de produção de<br />
anticorpos após doses de vacinas contra poliomielite,<br />
tétano e difteria em lactentes amamentados,<br />
quando comparados com os que recebem<br />
leite artificial.<br />
O AM determina um efeito benéfico sobre o<br />
desenvolvimento da cavidade oral da criança,<br />
com adequado alinhamento dos dentes e raros<br />
casos de mal-oclusão. Os lactentes amamentados<br />
apresentam uma menor incidência de<br />
cáries. A amamentação está associada, também,<br />
a um menor risco de síndrome da morte súbita<br />
do lactente, embora a etiologia desse evento<br />
ainda não esteja bem esclarecida.<br />
Novas evidências sugerem a possibilidade de<br />
prevenção na infância de doenças do adulto, a<br />
partir de uma alimentação saudável.<br />
Uma metanálise recente, publicada pela Organização<br />
Mundial da Saúde, destaca os efeitos à<br />
longo prazo do AM sobre a saúde na idade<br />
adulta, tais como a redução do risco de<br />
26<br />
sobrepeso, obesidade e diabete melito, melhor<br />
prognóstico cognitivo, níveis mais baixos de<br />
pressão arterial e de colesterol.<br />
A ingestão precoce de altos teores de proteínas<br />
está relacionada ao acúmulo excessivo de gordura<br />
no organismo. Além disso, lactentes<br />
alimentados com fórmula infantil têm maior<br />
resposta insulínica, com conseqüente maior<br />
número de adipócitos e deposição de gordura.<br />
Lactentes amamentados parecem se adaptar<br />
mais facilmente aos alimentos complementares,<br />
aceitando dietas menos calóricas. Os indivíduos<br />
que foram amamentados na infância têm<br />
menos chance de serem considerados obesos ou<br />
com sobrepeso (OR = 0,78; IC95% = 0,72-0,84).<br />
Uma grande diferença entre o leite humano e<br />
os leites artificiais diz respeito às concentrações<br />
de ácidos graxos poliinsaturados de cadeia longa.<br />
Destacam-se pela importância, o ácido<br />
docosahexaenóico, no desenvolvimento cerebral<br />
e da retina, e o ácido araquidônico, como precursor<br />
de prostaglandinas e leucotrienos. O AM<br />
proporciona as melhores condições para o estabelecimento<br />
do vínculo mãe-filho, o que<br />
por sua vez, pode influenciar positivamente<br />
o desenvolvimento cognitivo. Sujeitos que<br />
foram aleitados pelas mães apresentam escores<br />
significativamente melhores em testes de desenvolvimento<br />
(diferença=4,9; IC95%=2,97-6,92).<br />
Um efeito positivo do AM também pode ser<br />
observado na melhor performance escolar<br />
avaliada entre adolescentes e adultos jovens.<br />
Níveis pressóricos sistólicos e diastólicos mais<br />
baixos são descritos entre indivíduos amamentados<br />
na primeira infância. Embora a redução<br />
seja pequena, o AM pode trazer benefícios<br />
importantes para a saúde cardiovascular da<br />
população em geral. O efeito à longo prazo<br />
da alimentação com leite humano sobre a pressão<br />
arterial tem sido justificado de três maneiras,<br />
que são sua menor quantidade de sódio<br />
em relação às fórmulas infantis, um índice mais<br />
baixo de obesidade e sobrepeso entre os amamentados,<br />
e especialmente, pela presença dos<br />
ácidos graxos poliinsaturados de cadeia longa,<br />
que são importantes componentes das membranas<br />
celulares do endotélio vascular.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Nutrição saudável na promoção da saúde e prevenção de doenças<br />
Níveis mais baixos de colesterol total têm<br />
sido descritos em adultos com antecedente<br />
de alimentação com leite materno (diferença<br />
média = -0,18; IC95% = -0,30 a - 0,06 mmol/L).<br />
Sabe-se que a concentração de colesterol é<br />
alta no leite humano, sendo a dosagem<br />
plasmática dessa substância maior em<br />
lactentes amamentados que nos alimentados<br />
com leite artificial. Uma maior concentração<br />
de colesterol nessa fase da vida seria vantajosa<br />
pela melhor disponibilidade para o<br />
cérebro em desenvolvimento e para manter<br />
níveis sangüíneos mais baixos e apropriados<br />
de colesterol na vida adulta.<br />
A duração do AM e o atraso na introdução de<br />
outros alimentos parecem ser fatores importantes<br />
na prevalência de diabete melito. Sujeitos<br />
que foram amamentados estão associados<br />
a uma menor chance de desenvolver diabete<br />
tipo 2 (OR = 0,63; IC 95% = 0,45 –0,89).<br />
É descrito que os níveis de glicemia de jejum<br />
são inversamente proporcionais aos de ácidos<br />
graxos de cadeia longa encontrados nas membranas<br />
celulares de músculos esqueléticos.<br />
Como essas gorduras poiliinsaturadas estão<br />
presentes no leite humano, mas não na maioria<br />
dos leites artificiais, aqueles alimentados<br />
artificialmente poderiam desenvolver resistência<br />
à insulina com hiperinsulinismo compensatório<br />
à medida que fosse alterada a<br />
composição de tais membranas celulares, o<br />
que poderia levar à progressiva falência das<br />
células β e conseqüente diabete. Os níveis<br />
basais e pós-prandiais de insulina e neurotensina<br />
– moduladora da liberação de insulina<br />
e glucagon, também se mostraram mais<br />
elevados entre lactentes que recebem fórmulas<br />
infantis.<br />
É importante lembrar que, enquanto a lactação<br />
é um processo normal e fisiológico, a arte de<br />
amamentar não é totalmente instintiva e o<br />
sucesso é mais facilmente alcançado através do<br />
conhecimento e do suporte emocional. Aí reside<br />
a importância dos profissionais de saúde,<br />
em especial dos médicos, que precisam ser treinados<br />
para que ofereçam, desde o pré-natal,<br />
informações corretas sobre as qualidades do<br />
aleitamento ao peito e orientações para solução<br />
de problemas da lactação. Este último aspecto<br />
é tão importante quanto o primeiro, uma<br />
vez que, apesar de reconhecerem a superioridade<br />
do AM, a maioria das gestantes revela desconhecimento<br />
sobre a arte da amamentação.<br />
A promoção do aleitamento no período neonatal<br />
é de fundamental importância, uma vez que o<br />
início precoce das mamadas, dentro da primeira<br />
hora após o parto, aumenta a duração da<br />
lactação e os benefícios da amamentação exclusiva<br />
na redução da morbi-mortalidade já são<br />
evidenciados desde o primeiro mês de vida.<br />
Como o risco de desmame nessa fase é grande,<br />
essa intervenção positiva também pode levar<br />
ao aleitamento exclusivo continuado além<br />
desse período.<br />
As primeiras duas semanas pós-parto são decisivas<br />
para a amamentação. Durante esse<br />
período, os bebês saudáveis devem ser amamentados<br />
exclusivamente, não devem perder<br />
mais do que 7% do peso de nascimento, precisam<br />
recuperar o peso de nascimento até 14 dias<br />
de vida, devem apresentar pelo menos três<br />
evacuações e seis micções diárias no 4.º dia de<br />
vida, e ganhar no mínimo 20 gramas por dia,<br />
nos primeiros três meses. As mães de bebês<br />
saudáveis devem amamentar exclusivamente,<br />
reconhecer e responder apropriadamente para<br />
os sinais de fome dos seus filhos, reconhecer<br />
os sinais de saciedade pós-amamentação, não<br />
apresentar dor ou traumatismo mamilar, e ter<br />
conhecimento do manejo da lactação.<br />
Uma maior duração do AM exclusivo está significativamente<br />
associada a atitudes maternas<br />
positivas em relação ao aleitamento natural, ao<br />
apoio familiar, ao bom vínculo mãe-filho,<br />
à técnica de sucção apropriada e à ausência<br />
de problemas mamilares, entre outros fatores.<br />
Sabe-se que a amamentação está sujeita, também,<br />
a pressões econômicas e sociais, assim, a<br />
mulher que escolhe amamentar exclusivamente<br />
precisa de apoio da comunidade e sociedade<br />
para atingir seu objetivo e dar ao seu filho o<br />
melhor início de vida.<br />
Embora sejam públicos e bem divulgados os<br />
benefícios do uso de leite humano, em nenhuma<br />
outra área da saúde a prática clínica está<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 27
Nutrição saudável na promoção da saúde e prevenção de doenças<br />
em tamanha oposição aos avanços científicos<br />
e aos interesses dos pacientes. Muitos são os<br />
prejuízos da interrupção precoce do AM para a<br />
saúde infantil, e não há motivo, também, para<br />
o oferecimento de outros alimentos para a<br />
maioria dos lactentes antes dos seis meses de<br />
idade.<br />
Os hábitos alimentares inadequados e suas conseqüências<br />
são obstáculos ao desenvolvimento<br />
socioeconômico sustentável e à redução da<br />
pobreza. Fala-se muito que a sustentabilidade<br />
é a chave da qualidade de vida das gerações<br />
futuras. Sendo assim, a questão da alimentação<br />
infantil deve ser uma prioridade. As crianças<br />
têm direito, universalmente reconhecido, à nutrição<br />
adequada e à saúde.<br />
Nós pediatras, cuidadores do ser em crescimento<br />
e desenvolvimento, não devemos abdicar da<br />
nossa responsabilidade no adequado manejo<br />
clínico da lactação, visto que, por sermos os<br />
verdadeiros formadores de opinião no relacionado<br />
à saúde infantil, as famílias dependem<br />
dos nossos conhecimentos e experiências para<br />
bem atender as necessidades de seus filhos.<br />
Incentivando o AM exclusivo até os seis meses e<br />
complementado até os dois anos ou mais, estaremos<br />
garantindo que os benefícios do leite<br />
humano possam ser estendidos até a idade<br />
adulta, o que seria fundamental para uma vida<br />
com mais qualidade e um futuro melhor para<br />
toda a sociedade.<br />
<strong>Referências</strong> <strong>Bibliográficas</strong><br />
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infant and young child feeding. Geneva, Switzerland:<br />
World Health Organization; 2003.<br />
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Geneva, Switzerland: World Health Organization; 2005.<br />
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and years of life lost due to suboptimal breastfeedingamong<br />
children in the developing world: a<br />
global ecological risk assessment. Public Health<br />
Nutrition 2006: 9(6), 673-685.<br />
04. Chen A, Rogan W. Breastfeeding and the risk of postneonatal<br />
death in the United States. Pediatrics 2004;<br />
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05. Huffman SL, Zehner ER, Victora C. Can improvements<br />
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06. Edmond KM, Zandoh C, Quigley MA, Amenga-Etego S,<br />
Owusu-Agyei S, Kirkwood BR. Delayed breastfeeding<br />
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07. Nascimento MBR, Issler H. Breastfeeding: making the<br />
difference in the development, health and nutrition<br />
of term and preterm newborns. Rev. Hosp. Clín. Fac.<br />
Med. S. Paulo 2003; 58(1):49-60.<br />
08. Horta BL, Bahl R, Martines JC, Victora CG. Evidence on<br />
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reviews and meta-analyses. Geneva, Switzerland: World<br />
Health Organization; 2007.<br />
09. Overfield ML, Ryan CA, Spangler A, Tully MR. Clinical<br />
Guidelines for the Establishment of Exclusive<br />
Breastfeeding. Raleigh, USA: International Lactation<br />
Consultant Association (ILCA); 2005.<br />
Alimentação<br />
Complementar<br />
VIRGÍNIA RESENDE SILVA WEFFORT<br />
Desde os primeiros momentos da vida a alimentação<br />
está entrelaçada com emoções, simbolismos<br />
e influências socioeconômicas e culturais.<br />
28<br />
Comer bem não é o mesmo que comer muito<br />
ou pouco. Cuidar do corpo que cresce é saber<br />
escolher os alimentos para manter um equilíbrio<br />
entre ganhos e perdas calóricas, com os<br />
extras necessários para garantir o aumento<br />
da velocidade de crescimento, não exceder<br />
a capacidade funcional dos sistemas digestório<br />
e renal, propiciar um crescimento e desenvolvimento<br />
mental e motor adequados, fazer uma<br />
profilaxia e reconhecimento das doenças causadas<br />
por excesso ou escassez de nutrientes e evitar<br />
as doenças degenerativas do adulto.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Nutrição saudável na promoção da saúde e prevenção de doenças<br />
A não atualização das condutas, pelos profissionais<br />
de saúde, tem favorecido o uso inadequado<br />
dos alimentos. Muitas vezes, estes alimentos<br />
introduzidos não suprem as necessidades<br />
nutricionais do lactente, que tem a velocidade<br />
de crescimento elevada, tornando-os mais vulneráveis<br />
tanto à desnutrição como às deficiências<br />
de certos micronutrientes. Outras vezes, há<br />
um excesso de oferta de macro e micronutrientes<br />
predispondo à obesidade, hipertensão arterial,<br />
hipercolesterolemia a curto e longo prazo.<br />
A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), o Ministério<br />
da Saúde (MS) e a Organização Mundial<br />
de Saúde (OMS), recomendam amamentação<br />
materna até 2 anos de idade, com aleitamento<br />
exclusivo ao seio por período não inferior a<br />
6 meses e introdução de alimentos complementares<br />
a partir dessa idade.<br />
A interrupção precoce do aleitamento materno<br />
e a preconização de alimentos com baixos níveis<br />
de ferro, utilizados por tempo prolongado,<br />
favorecem a alta prevalência de anemia, um<br />
dos exemplos da inadequação da dieta às necessidades<br />
de nutrientes da criança.<br />
Diante da impossibilidade do aleitamento materno,<br />
deve-se utilizar uma fórmula infantil que<br />
satisfaça as necessidades deste grupo etário, conforme<br />
recomendado, sendo que antes do sexto<br />
mês deverá ser utilizada uma fórmula de partida<br />
e a partir do sexto mês recomenda-se uma<br />
fórmula infantil de seguimento.<br />
Para a introdução da alimentação complementar<br />
deve-se considerar a maturidade fisiológica,<br />
o desenvolvimento motor global e sensório<br />
motor oral da criança (mastigação, deglutição,<br />
digestão e excreção), que a habilita a receber<br />
outros alimentos além do leite materno. A maioria<br />
das crianças atinge este estágio de desenvolvimento<br />
por volta dos 6 meses de idade, quando<br />
o leite materno exclusivo já não supre as suas<br />
necessidades nutricionais. Além do que a introdução<br />
precoce da alimentação aumenta a morbimortalidade,<br />
diminui a duração do aleitamento<br />
materno, interfere na absorção de nutrientes,<br />
reduz a eficácia da lactação na prevenção de<br />
novas gravidezes e pode predispor a reações alérgicas,<br />
ao aumento da carga de soluto renal, a<br />
obesidade, a problemas futuros como hipertensão<br />
arterial, diabetes, doença cardiovascular e a<br />
obesidade. A introdução tardia está associada ao<br />
déficit de crescimento e ao risco de deficiência<br />
de micronutrientes (principalmente ferro, zinco,<br />
vitamina A), de energia e de proteínas.<br />
Esquema para introdução dos alimentos complementares<br />
Faixa etária<br />
Tipo de alimento<br />
Até 6º mês<br />
Leite materno<br />
6º mês Papa de frutas, papa de cereal<br />
6º ao 7º mês Primeira papa salgada, ovo, suco de frutas<br />
7º ao 8º mês Segunda papa salgada<br />
9º ao 11º mês Gradativamente passar para a comida da família<br />
12º mês Comida da família<br />
A introdução da alimentação complementar é<br />
uma fase de transição e de elevado risco para<br />
a criança, tanto pela administração de alimentos<br />
inadequados, quanto pelo risco de contaminação<br />
dos alimentos, favorecendo a ocorrência<br />
de doença diarréica, desnutrição ou mesmo a<br />
obesidade. A adequada orientação da mãe<br />
nesse período por profissionais de saúde é de<br />
fundamental importância.<br />
Os alimentos complementares, anteriormente<br />
designados “alimentos de desmame”, podem ser<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 29
Nutrição saudável na promoção da saúde e prevenção de doenças<br />
chamados de transicionais, quando são especialmente<br />
preparados para a criança pequena<br />
até que ela possa receber os alimentos consumidos<br />
pela família (em torno dos oito meses de<br />
idade). Estes, devem sofrer alteração na consistência<br />
para adequar à maturação da criança,<br />
sendo oferecidos inicialmente em forma de<br />
papa, passando para pequenos pedaços e após<br />
um ano, na mesma consistência dos consumidos<br />
pela família. Cabe ao Pediatra avaliar<br />
os hábitos alimentares da família, que muitas<br />
vezes não são adequados e corrigir as inadequações<br />
nutricionais.<br />
O termo “alimentos de desmame” deve ser evitado,<br />
por ter um sentido ambíguo. Pode significar<br />
“acostumar” com novos alimentos como pode<br />
sugerir a completa interrupção do aleitamento<br />
materno, sendo que o desejado é a sua manutenção<br />
com a introdução de novos alimentos. Assim,<br />
desde 1998 a OMS sugere a expressão alimentação<br />
complementar para definir o processo que se<br />
inicia quando o leite materno já não é suficiente<br />
para suprir as necessidades da criança.<br />
A partir de 1993, as recomendações alimentares<br />
foram alteradas. Em lugar das RDA (Recommended<br />
Dietary Allowances) dos Estados Unidos e das<br />
RNI (Recommended Nutrient Intakes) do Canadá,<br />
definiram-se as DRI (Dietary Reference<br />
Intakes, http://www.nap.edu ).<br />
A distribuição das calorias totais da dieta<br />
tende a seguir determinadas proporções de<br />
macronutrientes. Os alimentos complementares<br />
devem suprir aproximadamente 200 kcal/dia<br />
entre 6 e 8 meses, 300 kcal/dia entre 9 e<br />
11 meses e 550 kcal/dia dos 12 aos 23 meses.<br />
A densidade protéica deve ser de 0,7 g/100 kcal<br />
dos 5 aos 23 meses. Os lipídios devem assegurar<br />
30 a 45% da energia total. Para garantir a<br />
oferta de minerais e vitaminas necessária ao<br />
crescimento, a alimentação complementar deve<br />
conter alta densidade desses nutrientes de forma<br />
a compensar a pequena quantidade ingerida<br />
diariamente.<br />
A introdução dos alimentos complementares<br />
deve ser gradual. As frutas podem ser iniciadas<br />
aos 6 meses, sob a forma de papas, oferecidas<br />
em colher, inicialmente uma vez ao dia, depois<br />
pela manhã e à tarde. O tipo de fruta a ser<br />
oferecido deverá respeitar as características regionais,<br />
custo, estação do ano e presença de<br />
fibras. Nenhuma fruta é contra-indicada, exceto<br />
quando houver intolerância ou alergia. Sucos<br />
de frutas naturais devem ser oferecidos em<br />
volume não superior a 100 mL/dia, para não<br />
haver comprometimento da ingestão de alimentos<br />
de maior densidade nutricional.<br />
A primeira refeição de sal deve ser oferecida<br />
no horário habitual de almoço, ou à tarde, se<br />
for conveniente para a família. Os alimentos<br />
devem ser testados gradativamente, sendo necessárias<br />
várias exposições a um mesmo alimento<br />
antes da sua aceitação. As papas devem ser<br />
preparadas com cereais e tubérculos,<br />
leguminosas, carnes e hortaliças (verduras e<br />
legumes), na proporção 3:1:1:1<br />
Componentes das papas<br />
(3) Cereal ou tubérculo + (1) Leguminosa + (1) Proteína animal + (1) Hortaliça<br />
Arroz Feijão Carne de boi Legumes<br />
Milho Soja Vísceras Verduras<br />
Macarrão Ervilha Frango<br />
Batata Lentilhas Ovos<br />
Mandioca Grão de bico Peixe<br />
Inhame<br />
Cará<br />
30<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Nutrição saudável na promoção da saúde e prevenção de doenças<br />
A freqüência da alimentação complementar<br />
varia conforme a idade da criança. A OMS<br />
recomenda duas a três refeições ao dia<br />
dos 6 aos 8 meses e três a quatro para<br />
as crianças dos 9 até os 24 meses. Após<br />
os 12 meses são recomendados lanches<br />
adicionais. A freqüência das mamadas ao seio<br />
pode ser mantida.<br />
O MS/OPAS e a SBP estabeleceram, para crianças<br />
menores de 2 anos, normas para a alimentação<br />
infantil, denominadas: “Dez passos para<br />
a alimentação saudável”.<br />
Dez passos para a alimentação saudável da criança<br />
Passo 1<br />
Passo 2<br />
Passo 3<br />
Passo 4<br />
Passo 5<br />
Passo 6<br />
Passo 7<br />
Passo 8<br />
Passo 9<br />
Passo 10<br />
Dar somente leite materno até os 6 meses, sem oferecer água, chás ou nenhum<br />
outro alimento.<br />
A partir dos 6 meses, introduzir de forma lenta e gradual outros alimentos,<br />
mantendo o leite materno até os 2 anos de idade ou mais.<br />
Após os 6 meses, dar alimentos complementares (cereais, tubérculos, carnes,<br />
leguminosas, frutas, legumes), três vezes ao dia se a criança receber leite materno,<br />
e cinco vezes ao dia, se não estiver em aleitamento materno.<br />
A alimentação complementar deverá ser oferecida sem rigidez de horários, respeitando-se<br />
sempre à vontade da criança.<br />
A alimentação complementar deve ser espessa desde o início e oferecida com<br />
colher; começar com consistência pastosa (papas/purês) e, gradativamente,<br />
aumentar a consistência até chegar à alimentação da família.<br />
Oferecer à criança diferentes alimentos ao dia. Uma alimentação variada é uma<br />
alimentação colorida.<br />
Estimular o consumo diário de frutas, verduras e legumes nas refeições.<br />
Evitar açúcar, café, enlatados, frituras, refrigerantes, balas, salgadinhos e outras<br />
guloseimas nos primeiros anos de vida. Usar sal com moderação.<br />
Cuidar da higiene no preparo e manuseio dos alimentos; garantir o seu<br />
armazenamento e conservação adequada.<br />
Estimular a criança doente e convalescente a se alimentar, oferecendo sua alimentação<br />
habitual e seus alimentos preferidos, respeitando a sua aceitação.<br />
<strong>Referências</strong> <strong>Bibliográficas</strong><br />
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Guia alimentar para crianças menores de 2 anos. 2002.<br />
02. Sociedade Brasileira de Pediatria. Departamento de<br />
Nutrologia. Manual de orientação: alimentação do<br />
lactente, alimentação do pré-escolar, alimentação do<br />
escolar, alimentação do adolescente, alimentação na<br />
escola. São Paulo. 2006.<br />
03. Saccardo Sarni RO, Weffort VRS. Alimentação no primeiro<br />
ano de vida. PRONAP – SBP Ciclo IX. Número 1. 2006.<br />
04. Norton RC, Weffort VRS, Dantas Filho S, Fisberg M.<br />
Alimentação do lactente ao adolescente. In: Lopez<br />
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Brasileira de Pediatria. Manole, Barueri. 2007.<br />
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Nutrition. Formula feeding of term infants. In<br />
Pediatrics press, 2005. Cap 4. p. 87-97.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 31
Nutrição saudável na promoção da saúde e prevenção de doenças<br />
Alimentação na<br />
Adolescência<br />
ANNE LISE DIAS BRASIL<br />
Introdução<br />
A nutrição assume importância e característica<br />
específicas na adolescência, considerando que<br />
nessa fase da vida há um crescimento acelerado<br />
e transformações somáticas intensas, com a<br />
necessidade de aporte adequados de calorias e<br />
nutrientes. Além do crescimento e desenvolvimento<br />
intensos, a adolescência é caracterizada<br />
pela crescente independência e transformações<br />
psicológicas em busca de autonomia, definição<br />
da identidade, influência do grupo de amigos,<br />
rebeldia contra os padrões sociais e familiares,<br />
preocupação com a aparência física, levando os<br />
adolescentes a hábitos alimentares inadequados<br />
e a serem considerados como um grupo de<br />
risco nutricional.<br />
O estilo de vida atual da maioria dos adolescentes<br />
é caracterizado pelo sedentarismo, permanecendo<br />
grande parte do tempo em frente à televisão,<br />
computador e videogame. Além disso, há<br />
preferência por alimentos altamente calóricos,<br />
ricos em gordura saturada, sal e pobres em fibras,<br />
vitaminas e minerais. Esses hábitos têm<br />
contribuído muito para o aumento da prevalência<br />
de sobrepeso e obesidade nessa faixa etária.<br />
A prevenção primária de doenças crônicas<br />
degenerativas do adulto deve ser iniciada já na<br />
infância e adolescência com estratégias específicas<br />
para a adoção de hábitos de vida saudáveis,<br />
como a prática regular de atividade física<br />
e alimentação saudável.<br />
A prevalência de transtornos alimentares entre<br />
os adolescentes também tem aumentado muito<br />
nas últimas décadas. A sociedade atual com a<br />
sua valorização e o culto à magreza tem levado<br />
a maioria das pessoas à busca frenética do “corpo<br />
ideal”, predispondo os vulneráveis a desenvolver<br />
doenças. Têm-se observado que esta preocupação<br />
exacerbada pela aparência magra começa<br />
a surgir em grupos cada vez mais jovens.<br />
É aconselhável, portanto, que a nutrição e o<br />
hábito alimentar dos adolescentes sejam<br />
monitorados e orientados periodicamente, com<br />
o objetivo de reduzir os riscos nutricionais<br />
comuns nesta fase da vida.<br />
A orientação dietética deve ser flexível e discutida<br />
com o adolescente para que possa resultar<br />
em mudanças reais de atitudes e hábitos alimentares,<br />
devendo ser incluída nos programas<br />
de promoção à saúde.<br />
Deve-se ter em mente as diversas nuances a que<br />
está sujeito o adolescente, desde as suas características<br />
de crescimento até as demais transformações<br />
biopsicossociais, para que a alimentação atenda<br />
às reais necessidades. Devem ser observadas:<br />
•Maturidade sexual - estadiamentos puberais<br />
de Tanner;<br />
• Atividade física habitual - tipo, freqüência,<br />
intensidade;<br />
•Participação em atividades físicas competitivas;<br />
• Uso de contraceptivos hormonais;<br />
• Uso do álcool, fumo e drogas;<br />
• Gravidez e lactação;<br />
• Uso de dietas restritivas ou dietas da moda;<br />
•Presença de distúrbios nutricionais e transtornos<br />
alimentares;<br />
•Aumento ou diminuição do IMC nos últimos<br />
12 meses;<br />
•Presença de história familiar de doença<br />
cardiovascular prematura, obesidade, hipertensão<br />
ou diabetes mellitus.<br />
Necessidades nutricionais<br />
As alterações físicas deste período são muito<br />
variáveis devido à ampla variação no início do<br />
estirão de crescimento, pela variação da taxa de<br />
maturação e padrão de crescimento associado<br />
às diferenças étnicas e socioeconômicas. Frente<br />
à variabilidade das mudanças físicas, as necessidades<br />
nutricionais são complexas e devem ser<br />
consideradas as variações individuais.<br />
32<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Nutrição saudável na promoção da saúde e prevenção de doenças<br />
Nesta fase de crescimento acelerado é de extrema<br />
importância a observação da ingestão de<br />
energia e de alguns nutrientes como proteína,<br />
ferro, cálcio e vitaminas A e C.<br />
Energia<br />
O crescimento na adolescência acompanha-se<br />
de grande variação na necessidade energética,<br />
observando-se que o pico máximo de ingestão<br />
energética coincide com o pico de velocidade<br />
máxima de crescimento, refletindo o aumento<br />
das necessidades energéticas.<br />
As recomendações atuais sugerem que o melhor<br />
índice para a estimativa de ingestão de energia<br />
é a relação de energia por unidade de estatura,<br />
pois o crescimento linear é o evento que melhor<br />
representa o estado anabólico deste período.<br />
Proteínas<br />
Durante a adolescência a necessidade protéica<br />
está mais fortemente associada ao padrão de<br />
crescimento do que à idade cronológica, sendo<br />
determinada pela quantidade necessária para<br />
manter o crescimento de novos tecidos: aumento<br />
da massa muscular, formação de novos componentes<br />
associados ao desenvolvimento sexual.<br />
Hábitos alimentares inadequados durante o<br />
período da adolescência, principalmente aqueles<br />
com restrição energética representam um<br />
risco nutricional grande, quando fontes protéicas<br />
são usadas como energia, levando ao comprometimento<br />
do crescimento, particularmente,<br />
durante o estirão pubertário.<br />
Gorduras<br />
É recomendada para a criança e para o adolescente<br />
a ingestão de dieta balanceada (15% a 20%<br />
de proteínas, 30% de gorduras e 50% a 55% de<br />
carboidratos), proporcionando 300 mg de colesterol<br />
por dia ou 100mg por cada 1.000 kcal consumidas.<br />
O percentual recomendado de 30% de gordura na<br />
dieta deve ser originado de alimentos com gorduras<br />
poliinsaturadas, monosaturadas e saturadas<br />
divididas em partes iguais.<br />
Ferro<br />
Na adolescência a necessidade de ferro aumenta<br />
para ambos os gêneros, decorrente do acelerado<br />
crescimento linear, do aumento da massa<br />
muscular, do aumento do volume sangüíneo e<br />
das enzimas respiratórias. No sexo masculino<br />
há um adicional apenas durante o estirão<br />
pubertário. Para o sexo feminino, o adicional é<br />
devido à fase do estirão e à menarca, permanecendo<br />
maior até a idade adulta pelas perdas<br />
menstruais.<br />
Cálcio<br />
As necessidades de cálcio são maiores durante<br />
a puberdade e adolescência do que em qualquer<br />
época da vida, devido ao acelerado crescimento<br />
muscular e esquelético. Nesse período a<br />
densidade óssea é máxima e a massa esquelética<br />
adquire 45% do total da fase adulta. No pico da<br />
velocidade de crescimento, a deposição de cálcio<br />
é duas vezes maior que a média do crescimento<br />
durante todo o período da adolescência.<br />
As inter-relações entre o cálcio e outros nutrientes<br />
da dieta, como vitamina D e fósforo, devem<br />
ser observadas.<br />
Vitamina A<br />
A necessidade de vitamina A, como também de<br />
outras vitaminas, para os adolescentes são inexatos,<br />
pois são extrapolados das recomendações<br />
de crianças e de adulto.<br />
As necessidades de vitamina A na adolescência<br />
são consideradas separadamente por gênero.<br />
Estas diferenças são devidas à influência<br />
hormonal nos valores sangüíneos de vitamina A<br />
independentemente de suas reservas.<br />
Alguns estudos demonstram haver correlação<br />
significante entre níveis de vitamina A e o padrão<br />
de crescimento linear, além do processo<br />
de maturação sexual, embora os mecanismos<br />
específicos permaneçam desconhecidos.<br />
Vitamina C<br />
A recomendação pelo RDA, após revisão, pode<br />
ser aumentada de 50mg a 60mg/dia para 100mg<br />
a 200mg/dia, sem diferenciação para os gêneros.<br />
Deve ser estimulada a ingestão de pelo menos<br />
cinco porções de frutas e hortaliças por dia, para<br />
que se garanta a ingestão desse nutriente.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 33
Nutrição saudável na promoção da saúde e prevenção de doenças<br />
Tabela 1 - Ingestão Dietética Diária de Referência - Minerais (DRI, 1998)<br />
Masculino<br />
Feminino<br />
Minerais Idade (anos) Idade (anos)<br />
9 – 13 14 – 18<br />
Cálcio (g) 2,5 2,5<br />
Cobre (µg) 5.000 8.000<br />
Flúor (mg) 10 10<br />
Iodo (µg) 600 900<br />
Ferro (mg) 40 45<br />
Magnésio (mg) 350 350<br />
Manganês (mg) 6 9<br />
Molibdênio (µg) 1.100 1.700<br />
Níquel (mg) 0,6 1,0<br />
Fósforo (g) 4 4<br />
Selênio (µg) 280 400<br />
Zinco (mg) 23 34<br />
Fonte: Dietary Reference Intakes - Food and Nutrition Board / National Academies, 1998.<br />
Tabela 2 - Ingestão Dietética Diária de Referência - Vitaminas (DRI, 1997)<br />
Masculino<br />
Feminino<br />
Vitaminas<br />
Idade (anos)<br />
Idade (anos)<br />
9 – 13 14 – 18 9 – 13 14 – 18<br />
A (µg) 600 900 600 700<br />
C (mg) 45 75 45 65<br />
D (µg) 5 5 5 5<br />
E (mg) 11 15 11 15<br />
K (µg) 60 75 60 75<br />
Tiamina (mg) 0,9 1,2 0,9 1,0<br />
Riboflavina (mg) 0,9 1,3 0,9 1,0<br />
Niacina (mg) 12 16 12 14<br />
B 6 (mg) 1,0 1,3 1,0 1,2<br />
Folato (µg) 300 400 300 400<br />
B 12 (µg) 1,8 2,4 1,8 2,4<br />
Ácido Pantotênico (mg) 4 5 4 5<br />
Biotina (µg) 20 25 20 25<br />
Colina (mg) 375 550 375 400<br />
Fonte: Dietary Reference Intakes - Food and Nutrition Board / National Academies, 1997.<br />
34<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Nutrição saudável na promoção da saúde e prevenção de doenças<br />
<strong>Referências</strong> <strong>Bibliográficas</strong><br />
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Academy Press, 1998.<br />
02. Institute of Medicine, Food and Nutrition Board.<br />
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Aminoacids (macronutrients). Washington DC, National<br />
Academy Press, 2002.<br />
03. Institute of Medicine, Food and Nutrition Board.<br />
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Selenium and Carotenoids. Washington DC, National<br />
Academy Press, 2000.<br />
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07. Gidding SS et all. Dietary recommendations for children<br />
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08. Setian N. Puberdade normal. In: Setian N.<br />
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do Rn ao adolescente. 2ª ed. São Paulo, Sarvier,<br />
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09. Gong JE, Heald FP. Diet, Nutrition and adolescence.<br />
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10. Ballabriga A, Carrascosa A. Nutrición en la infancia<br />
y la adolescencia. 2ª ed. Madri, Arboleda, 2001.<br />
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11. Costa MCO, Leão LSCS, Werutsky CA. Obesidade.<br />
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clínicos e psicossociais. Porto Alegre, Artmed, 2002.<br />
p. 45-58.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 35
Nutrição saudável na promoção da saúde e prevenção de doenças<br />
36<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Seguimento ambulatorial:<br />
como vigiar o crescimento<br />
e nutrir adequadamente?<br />
Novas Curvas de<br />
Crescimento (OMS)<br />
VERA LÚCIA VILAR DE ARAÚJO BEZERRA<br />
O crescimento é o fator diferencial entre a criança<br />
e o adulto. Ele ocorre desde a concepção até<br />
a idade adulta, se mantendo num padrão semelhante<br />
na maioria dos indivíduos. Para que<br />
ele se faça em toda a sua plenitude há necessidade<br />
de monitoração freqüente uma vez que<br />
o desvio desse padrão de crescimento normal<br />
pode indicar o surgimento de um processo<br />
patológico. O registro deve ser analisado através<br />
das curvas de crescimento úteis para avaliação<br />
do estado nutricional.<br />
O gráfico de crescimento mais antigo que se<br />
conhece foi feito pelo Conde de Montbeillard<br />
que verificou e registrou com grande freqüência<br />
os dados de peso e altura do seu filho. 1 O<br />
primeiro método de classificação do estado<br />
nutricional foi elaborado em 1956 por Gómez<br />
no México e baseia-se no parâmetro peso/idade<br />
cujo limite de normalidade foi fixado em 90%<br />
do referencial de Harvard. Teve larga utilização,<br />
embora mostrasse algumas desvantagens relacionadas<br />
à não utilização da estatura bem como<br />
por não permitir a distinção entre desnutrição<br />
aguda e crônica. 2 Para suprir as limitações desse<br />
método a Organização Mundial da Saúde passou<br />
a recomendar, desde 1976, o critério descrito<br />
por Waterlow. É um critério que combina<br />
peso/estatura e estatura/idade, trabalhando,<br />
assim, com parâmetros que tornam possível a<br />
identificação de gravidade e o tipo da desnutrição,<br />
uma vez que os déficits de peso e de estatura<br />
traduzem distintos processos de desnutrição<br />
que se originam e evoluem de formas diferentes.<br />
A referência utilizada foi a de Harvard e<br />
posteriormente foi adaptada para o padrão do<br />
Centro Nacional de Estatísticas de Saúde Norte-<br />
Americano (NCHS). 3-4<br />
Em 1986, o Brasil, através do Ministério da Saúde<br />
(MS), instituiu o “Programa de Ações Básicas<br />
na Assistência Integral à Saúde da Criança” que<br />
envolvia cinco ações básicas sendo o “Acompanhamento<br />
do Crescimento e Desenvolvimento”<br />
uma delas. 5 Foi confeccionado então o “Cartão<br />
da Criança” com modelo semelhante ao “Caminho<br />
da Criança” de autoria do médico inglês<br />
David Morley. O acompanhamento sugerido era<br />
o de peso/idade de zero a cinco anos e a referência<br />
usada foi o NCHS. Naquela ocasião foi<br />
instituída a “Ficha de Acompanhamento do Desenvolvimento”<br />
usada até hoje em muitos centros<br />
de atendimento a infância. Vários outros<br />
cartões da criança foram elaborados pelo MS e<br />
usados sempre com a referência NCHS e com o<br />
indicador peso/idade. Além do Cartão da Criança<br />
do MS vários estados do Brasil utilizam cartão<br />
próprio. Em 2005 a Sociedade Brasileira de<br />
Pediatria (SBP) elaborou a Caderneta Brasileira<br />
de Saúde da Criança e do Adolescente tendo<br />
como referência o NCHS com a inovação de ser<br />
um documento único para ambos os gêneros,<br />
abrangendo do recém-nascido ao adolescente,<br />
com curvas de peso/idade, estatura/idade, peso/<br />
estatura, perímetro cefálico/idade, índice de<br />
massa corporal (IMC) por idade, dados de pressão<br />
arterial e orientação odontológica. 6<br />
Em 2006, o MS elaborou um novo documento,<br />
a “Caderneta de Saúde da Criança” que a exemplo<br />
do documento da SBP é um documento<br />
único para meninos e meninas com gráficos<br />
de perímetro cefálico de 0 a 2 anos, peso/idade<br />
de 0 a 2 anos, altura/idade de 0 a 2 anos,<br />
peso/idade de 2 a 5 anos, altura/idade de 2 a<br />
5 anos e altura e peso/idade de 5 a 10 anos.<br />
O diferencial da nova caderneta é que os gráficos<br />
de peso/idade e de altura/idade de 0 a<br />
2 anos e de 2 a 5 anos utilizam um novo padrão<br />
de crescimento que é o padrão OMS - 2006.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 37
Seguimento ambulatorial: como vigiar o crescimento e nutrir adequadamente?<br />
A caderneta passou a ser usada por crianças<br />
nascidas a partir de 2007. 7<br />
Este padrão foi pensado a partir do ano de 1993<br />
quando a OMS instituiu o Grupo de Trabalho<br />
sobre o Crescimento Infantil diante das críticas<br />
freqüentes a referência NCHS. As principais<br />
críticas a essas referências fazem-se pela variação<br />
do tamanho da amostra nas várias faixas<br />
etárias, grande intervalo entre as aferições<br />
antropométricas sendo a mais importante o fato<br />
de que a maior parte das crianças era alimentada<br />
por mamadeira.<br />
Em 1994 a OMS referendou a idéia de que novas<br />
curvas de crescimento fossem elaboradas e<br />
em 1995 instituiu um grupo de trabalho para<br />
essa finalidade. Junto à avaliação antropométrica<br />
foi incluída uma avaliação sobre desenvolvimento<br />
motor. O estudo foi multicêntrico e constituiu-se<br />
de uma parte longitudinal com crianças<br />
do nascimento até 24 meses de idade e de uma<br />
parte transversal com crianças de 18 a 71 meses<br />
de idade.<br />
O estudo foi feito com uma amostragem internacional<br />
de diferentes etnias nos diferentes<br />
continentes, em seis países, abrangendo o Brasil<br />
(Pelotas), Estados Unidos (Davis), Ghana<br />
(Accra), Índia (Nova Delhi), Noruega (Oslo) e<br />
Oman (Muscat).<br />
Os critérios de inclusão foram entre outros que<br />
a criança pertencesse a uma família com boa<br />
condição sócio-econômica, mãe não ser fumante,<br />
não ser portadora de doença que interferisse<br />
no crescimento, parto único, gestação a termo,<br />
intenção de aleitamento materno exclusivo<br />
durante seis meses e de continuar amamentando<br />
pelo menos até 12 meses.<br />
A amostragem inicial foi com 8.440 crianças e a<br />
final foi de 8.406 sendo que, 1.737 participaram<br />
do estudo longitudinal (0 a 24 meses) e<br />
6.669 do estudo transversal (18 a 71 meses).<br />
As crianças selecionadas para o estudo longitudinal<br />
foram visitadas nas semanas de vida 1, 2,<br />
4 e 6. A partir dos 2 meses as visitas foram<br />
feitas mensalmente até os 12 meses (2 a 12<br />
meses) e consultas bimensais até os 24 meses.<br />
No estudo transversal, com exceção, do Brasil e<br />
38<br />
Estados Unidos, cada criança era medida uma<br />
única vez. No Brasil e Estados Unidos as crianças<br />
foram medidas por duas ou três vezes com<br />
intervalos de 3 meses. O nosso país participou<br />
com 309 crianças seguidas no estudo longitudinal<br />
e 480 crianças no estudo transversal.<br />
As medidas tomadas foram o peso, comprimento<br />
(0 a 24 meses), estatura (24 a 71 meses),<br />
perímetro cefálico para todas as idades, circunferência<br />
do braço e pregas cutâneas tricipital<br />
e subescapular (todas as crianças a partir dos<br />
3 meses de idade).<br />
A análise estatística dos dados foi realizada por<br />
um grupo de estatísticos e peritos em crescimento<br />
da OMS. A partir dessa análise foram<br />
construídas as curvas de peso/idade, peso/comprimento,<br />
peso/altura, IMC/idade, altura/idade,<br />
comprimento/idade, perímetro cefálico/idade,<br />
circunferência do braço/idade, prega tricipital/<br />
idade e a indicação do desenvolvimento motor<br />
nas diferentes faixas etárias.<br />
No próximo ano serão divulgadas as curvas de<br />
velocidade de crescimento e de perda de peso<br />
materno pós-parto. Estas curvas foram apresentadas<br />
em percentis e z escores para crianças de<br />
até 60 meses e as medidas mostraram grande<br />
uniformidade entre os seis centros de coleta. 8<br />
Quando da comparação dos dados entre OMS e<br />
NCHS em relação ao peso/idade verifica-se que<br />
os valores da OMS são maiores nas crianças com<br />
até 8 meses de idade quando tendem a diminuir.<br />
A velocidade de crescimento passa a ser<br />
mais lenta a partir dos 4 meses de idade. Na<br />
análise do comprimento – altura/idade observa-se<br />
que os pontos de corte da curva inferior<br />
do padrão OMS são superiores, o que aumenta<br />
a tendência de déficit de altura/idade (nanismo)<br />
principalmente entre 24 e 48 meses. Em<br />
relação ao peso/comprimento – altura há um<br />
aumento do déficit de peso/comprimento nas<br />
crianças de até 70 cm e á partir daí este déficit<br />
sofre uma redução. Quanto ao IMC/idade, podemos<br />
contar a partir de agora, com curvas para<br />
crianças abaixo de 24 meses de idade. A partir<br />
dos 24 meses as curvas da OMS mostram-se inferiores<br />
as do NCHS. 9 A importância do novo<br />
padrão é que além de ser um padrão interna-<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Seguimento ambulatorial: como vigiar o crescimento e nutrir adequadamente?<br />
cional, foi elaborado com crianças em aleitamento<br />
materno traduzindo-o como o modelo<br />
para o crescimento ideal. Isto significa que os<br />
novos gráficos deixam de ser um instrumento<br />
descritivo, ou seja, que mostram como as crianças<br />
estavam crescendo em um determinado<br />
momento e passam a ser uma ferramenta<br />
prescritiva mostrando como deve ser o crescimento<br />
ideal das crianças.<br />
<strong>Referências</strong> <strong>Bibliográficas</strong><br />
01. 1986. Lowrey, G.H. Hereditary and environmental<br />
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03. Waterlow JC, Classification and Definition of Protein<br />
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08. World Health Organization. The WHO Child Growth<br />
Standards. Disponível em http://www.who.int/<br />
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09. Ministério da Saúde - Atenção Básica. Alimentação e<br />
Nutrição. Novas curvas de avaliação de crescimento<br />
infantil adotadas pelo Ministério da Saúde. Disponível<br />
em http://dtr2004.saude.gov.br/nutricao//<br />
curvas.php.<br />
Avaliação do<br />
Crescimento<br />
do Prematuro<br />
GEAN CARLO DA ROCHA<br />
À medida que sobrevivem recém-nascidos (RN)<br />
com peso e idade gestacional progressivamente<br />
menores, cresce a preocupação dos profissionais<br />
que atuam no seguimento em longo<br />
prazo dessas crianças com a qualidade da vida<br />
de seus pequenos pacientes, considerando-se<br />
os diferentes aspectos envolvidos, quais sejam<br />
o crescimento somático e o desenvolvimento<br />
neuropsicomotor. Nascer prematuramente coloca<br />
o RN em uma condição de grande risco<br />
nutricional, relacionado aos seguintes fatores:<br />
baixos estoques, por nascer antes do final do<br />
3º trimestre, período onde ocorrem os depósitos<br />
de nutrientes; rápido crescimento característico<br />
dessa fase da vida e doenças que podem<br />
afetar as necessidades nutricionais e a<br />
tolerância alimentar. Estudiosos de problemas<br />
como a prematuridade e seu follow-up vêm<br />
atuando no sentido de descrever o padrão de<br />
crescimento dos pacientes expostos e buscar<br />
formas mais adequadas de manejo nutricional,<br />
que atendam aos objetivos da nutrição do RN<br />
pré-termo.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 39
Seguimento ambulatorial: como vigiar o crescimento e nutrir adequadamente?<br />
Há 20 anos, a Academia Americana de Pediatria<br />
(AAP) definiu como objetivo primordial da nutrição<br />
do RN de baixo peso a busca do mesmo<br />
ritmo de crescimento intra-uterino esperado<br />
para a mesma idade gestacional. No entanto,<br />
para que esse objetivo seja atingido, há a necessidade<br />
de oferta de uma quantidade generosa<br />
de nutrientes que podem não alcançar totalmente<br />
as necessidades diárias do RN pré-termo<br />
ou, ainda, sobrepujar as limitações inerentes à<br />
sua imaturidade e às doenças decorrentes dessa<br />
condição, criando dificuldades metabólicas<br />
para o manejo desses nutrientes.<br />
Conceitos importantes<br />
Catch-up: também designado recuperação do<br />
crescimento ou crescimento acelerado. Caracteriza-se<br />
pela taxa de crescimento mais rápida<br />
que o esperado, ou seja, velocidade acelerada<br />
de crescimento, que ocorre após um período de<br />
crescimento lento ou ausente, permitindo recuperar<br />
a deficiência prévia. No caso de prematuros<br />
que geralmente apresentam peso, comprimento<br />
e perímetro cefálico abaixo do percentil<br />
mínimo de normalidade nas curvas de crescimento<br />
pós-natal, a ocorrência de catch-up propicia<br />
que estes consigam, nos primeiros anos<br />
de vida, equiparar seu crescimento ao das crianças<br />
sadias nascidas de termo. Considera-se<br />
que, ao completar o catch-up, o prematuro recuperou<br />
seu potencial de crescimento.<br />
Falha de crescimento: traduz o crescimento<br />
inadequado nos primeiros anos de vida ao se<br />
avaliar a evolução da criança em uma curva<br />
de crescimento padrão. É geralmente definida<br />
pelo peso abaixo do percentil 5 na curva em<br />
2 ou mais avaliações ou quando a criança<br />
não mantém a taxa esperada de ganho de peso,<br />
com mudança no canal de crescimento para<br />
2 percentis abaixo ao das avaliações anteriores.<br />
Fatores que influenciam<br />
o crescimento<br />
Além da prematuridade, vários fatores influenciam<br />
o crescimento da criança, destacando-se:<br />
•Potencial genético, representado pela estatura<br />
dos pais. É o fator que canaliza o tamanho<br />
final do adulto.<br />
•RCIU. Exerce forte influência no padrão de<br />
crescimento pós-natal a curto e longo prazo e<br />
associa-se com doenças futuras do adulto.<br />
• Doenças e complicações da prematuridade,<br />
especialmente a displasia broncopulmonar,<br />
mas também a enterocolite necrosante grave<br />
e a neuropatia crônica decorrente de leucomalácia<br />
periventricular ou hemorragia periintraventricular<br />
grave.<br />
•Padrão nutricional após a alta hospitalar. Este<br />
é um fator fundamental, que merece especial<br />
atenção, pois é passível de intervenção.<br />
A otimização da nutrição dos prematuros, seja<br />
pelo uso do leite materno fortificado ou de<br />
fórmulas especiais para uso após a alta, favorece<br />
o catch-up, entretanto, em nosso país, a<br />
condição nutricional após a alta hospitalar<br />
é preocupante, pois o desmame precoce é<br />
freqüente nos pequenos prematuros que têm<br />
internações prolongadas e as fórmulas especiais<br />
pós-alta são pouco acessíveis à população<br />
em geral, principalmente devido ao alto<br />
custo.<br />
Como avaliar o crescimento<br />
A idade corrigida, também designada idade pósconcepção,<br />
traduz o ajuste da idade cronológica<br />
em função do grau de prematuridade. Considerando<br />
que o ideal seria nascer com 40 semanas<br />
de idade gestacional, deve-se descontar<br />
da idade cronológica do prematuro as semanas<br />
que faltaram para sua idade gestacional atingir<br />
40 semanas, ou seja, idade corrigida = idade<br />
cronológica - (40 semanas - idade gestacional<br />
em semanas).<br />
Embora não esteja totalmente esclarecido até<br />
quando devemos corrigir a idade do prematuro,<br />
a maioria dos autores recomenda utilizar a<br />
idade corrigida na avaliação do crescimento e<br />
do desenvolvimento até os 2 anos de idade, a<br />
fim de obter a expectativa real para cada criança,<br />
sem subestimar o prematuro ao confrontálo<br />
com os padrões de referência. Na avaliação<br />
40<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Seguimento ambulatorial: como vigiar o crescimento e nutrir adequadamente?<br />
do crescimento, este ajuste é necessário para<br />
reduzir a variabilidade que existe devido ao<br />
rápido crescimento no último trimestre de<br />
gestação e desaceleração do crescimento após<br />
o termo, possibilitando, então, avaliação mais<br />
acurada das taxas de crescimento pós-natal e<br />
comparação entre diferentes grupos de crianças.<br />
A correção da idade cronológica em função<br />
da prematuridade é fundamental para o correto<br />
diagnóstico do desenvolvimento nos primeiros<br />
anos de vida, pois, para um prematuro<br />
de 28 semanas, não utilizar a idade corrigida<br />
aos 2 anos implica em 12% de diferença em seu<br />
desempenho nos testes de desenvolvimento, o<br />
que é suficiente para erroneamente classificá-lo<br />
como anormal. Para os prematuros de extremo<br />
baixo peso (< 1.000g) e menores que 28 semanas,<br />
recomenda-se corrigir a idade até os 3 anos.<br />
O crescimento manifesta-se por alterações nas<br />
medidas antropométricas: peso, comprimento,<br />
perímetro cefálico, perímetro braquial. As relações<br />
entre estas medidas traduzem a proporcionalidade<br />
do crescimento, especialmente<br />
a relação peso/comprimento nos primeiros<br />
2 anos de vida e o índice de massa corporal<br />
(IMC - peso/estatura 2 ) a partir de 2 anos, sendo,<br />
portanto, úteis para monitorar a adequação<br />
do crescimento. O IMC permite identificar a<br />
criança com peso abaixo do esperado para a<br />
estatura (IMC < percentil 5), mas tem sido mais<br />
valorizado na identificação do sobrepeso<br />
(IMC ≥ percentil 95) e do risco de sobrepeso<br />
definido pelo IMC entre os percentis 85 e 95.<br />
Para os familiares, a preocupação inicial é o<br />
peso da criança, e depois, na idade escolar, a<br />
estatura. Mas, para o médico, é sempre importante<br />
a harmonia do crescimento, e neste contexto,<br />
o perímetro cefálico merece especial<br />
atenção nos primeiros anos, pois seu catch-up<br />
é precoce e geralmente ocorre até 12 meses<br />
de idade corrigida. Vários autores alertam para<br />
pior prognóstico de desenvolvimento nos casos<br />
de crescimento inadequado ou mesmo exagerado<br />
do perímetro cefálico nos primeiros meses<br />
de vida.<br />
As curvas de crescimento se constituem numa<br />
das melhores maneiras de se avaliar nutricionalmente<br />
o recém-nascido, inclusive prematuros.<br />
Nestas crianças, é muito importante monitorizar<br />
a taxa de crescimento nos primeiros anos de<br />
vida, por meio de medidas antropométricas<br />
periódicas avaliadas quanto à sua evolução em<br />
curvas-padrão, específicas para a faixa etária e<br />
sexo e geralmente expressas em percentis.<br />
Prematuros cuja curva de crescimento não se<br />
aproxima dos percentis mínimos da normalidade,<br />
apresentando achatamento ou padrão<br />
descendente, requerem investigação.<br />
Durante a infância, os prematuros de extremo<br />
baixo peso (EBP) geralmente são menores, em<br />
peso e comprimento, em relação às crianças<br />
nascidas de termo. Todavia, estes prematuros<br />
podem apresentar catch-up tardio do crescimento<br />
entre 8 e 14 anos de idade, e, na adolescência,<br />
encontram-se dentro da faixa de normalidade,<br />
havendo nítida relação entre a estatura<br />
do adolescente e a estatura de seus pais.<br />
Mesmo assim, comparados aos nascidos com<br />
peso > 2.500 g, os adolescentes nascidos com<br />
EBP são menores, com diferenças de 5-6 cm na<br />
estatura e 8-9 kg no peso. Cerca de 10% apresentam<br />
peso e comprimento abaixo do percentil<br />
3, mas não se observam diferenças na maturidade<br />
sexual e na composição corporal.<br />
Alguns dilemas na<br />
alimentação do pré-termo<br />
Idealmente, a dieta do pré-termo deveria satisfazer<br />
suas necessidades nutricionais específicas,<br />
garantindo um crescimento que mimetizasse o<br />
que ocorreria intra-útero, no mesmo período<br />
de tempo. Entretanto, esse objetivo raramente<br />
é atingido. Existem fatores próprios das crianças,<br />
assim como fatores decorrentes de preocupações<br />
dos neonatologistas, nem sempre muito<br />
bem fundamentadas, que conspiram contra o<br />
bom desempenho nutricional dos pré-termo.<br />
Insuficiência de crescimento, inclusive do perímetro<br />
craniano, atrasos no desenvolvimento<br />
neuropsicomotor, com repercussões tardias na<br />
capacidade cognitiva, de abstração e possivelmente<br />
permanecendo até a idade adulta, são<br />
algumas das conseqüências do parto prematuro<br />
que vêm chamando a atenção dos pesquisa-<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 41
Seguimento ambulatorial: como vigiar o crescimento e nutrir adequadamente?<br />
dores há tempos. Quanto menor o recém-nascido,<br />
maior tem sido a problemática apontada.<br />
Em comparação com o aporte abundante de<br />
nutrientes que o feto recebe, os pré-termo, invariavelmente,<br />
sofrem algum grau de desnutrição<br />
por algum período após o nascimento.<br />
Devemos ter em mente que quanto mais jovem<br />
o pré-termo, mais grave é a situação. O grande<br />
desafio é evitar que a desnutrição e seus efeitos<br />
deletérios ocorram.<br />
Devemos lembrar que o crescimento e o desenvolvimento<br />
são muito vulneráveis à privação<br />
nutricional e ter em mente que, se ainda estivesse<br />
intra-útero, o pré-termo extremo estaria<br />
experimentando um ritmo de crescimento que<br />
nunca mais seria alcançado extra-útero. Se tomarmos<br />
o parâmetro comprimento como exemplo,<br />
enquanto o pré-termo extremo apresenta<br />
crescimento intra-uterino de mais de 5 cm/mês,<br />
um recém-nascido a termo tem ritmo de 2 a<br />
3 cm/mês. Como base de comparação, um adolescente<br />
no auge de seu estirão de crescimento<br />
não costuma chegar a 1 cm/mês. Cálculos teóricos<br />
demonstram que os pré-termo apresentam<br />
reservas nutricionais de poucos dias, e<br />
quanto menor o tamanho ao nascer, menor esta<br />
reserva. Os pré-termo nascidos com 24 semanas<br />
chegam a possuir apenas um dia de reserva<br />
calórica. Os pré-termo com menos de 1.000 g,<br />
mesmo com a alimentação parenteral iniciada<br />
no primeiro dia, chegam a perder 10% de seu<br />
peso e demoram cerca de 11 dias para recuperarem<br />
o peso de nascimento. É enorme o desafio<br />
para se contornar esses problemas.<br />
Desafio da alimentação enteral<br />
do pré-termo: leite humano<br />
Quanto ao leite a ser utilizado, após anos de<br />
discussão, a literatura fornece quase unanimidade<br />
em apresentar o leite da própria mãe como<br />
o ideal para o pré-termo. Uma dúvida que perdurou<br />
por muito tempo foi se as vantagens do<br />
leite humano descritas para a criança a termo<br />
também seriam notadas nas crianças pré-termo.<br />
Para o RNPT, a recomendação do aleitamento<br />
materno (AM) tem sido defendida com base nas<br />
42<br />
propriedades imunológicas do leite humano,<br />
no seu papel na maturação gastrintestinal, na<br />
formação do vínculo mãe-filho e no melhor desempenho<br />
neurocomportamental apresentado<br />
pelas crianças amamentadas. Apesar de desejável,<br />
observa-se pouco sucesso na amamentação<br />
entre mães de neonatos prematuros, por ainda<br />
existirem muitas barreiras hospitalares à<br />
amamentação, principalmente em serviços de<br />
neonatologia para RN de alto risco. Com freqüência,<br />
o desmame do peito ocorre antes mesmo<br />
da alta do prematuro da unidade neonatal.<br />
Amamentar prematuros é, sem dúvida, um<br />
desafio. Os pré-termo apresentam imaturidade<br />
fisiológica e neurológica, hipotonia muscular e<br />
hiper-reatividade aos estímulos do meio ambiente,<br />
permanecendo em alerta por períodos muito<br />
curtos. Mas, apesar do inadequado controle<br />
da sucção/deglutição/respiração, um prematuro<br />
é capaz de alimentar-se ao peito, desde que<br />
com auxílio e apoio apropriados. Os profissionais<br />
de saúde precisam não só estar convencidos<br />
das múltiplas vantagens do AM e da possibilidade<br />
de se alimentar prematuros com leite<br />
humano, como também integrar o manejo e o<br />
apoio da lactação ao planejamento da ação<br />
terapêutica nesses pacientes.<br />
Para se avançar na questão da alimentação de<br />
prematuro, é necessário que haja uma mudança<br />
de postura na assistência hospitalar. É importante<br />
que a medicina praticada em unidades<br />
neonatais não se baseie apenas em<br />
tecnologia de elevado padrão, mas que também<br />
leve em consideração a humanização do<br />
atendimento. A atenção ao neonato deve ser<br />
realizada por profissionais especializados, em<br />
ambiente hospitalar adequado, proporcionando<br />
uma assistência individualizada e que permita<br />
maior interação dos pais com seu filho. Os<br />
pais do prematuro devem ser vistos como colaboradores<br />
no cuidado com a criança e como<br />
presenças essenciais para um saudável crescimento<br />
e desenvolvimento psicomotor.<br />
Para obter êxito no AM de prematuros, deve-se<br />
otimizar o cuidado perinatal, incluindo avaliação<br />
acurada e individualizada da mãe e do filho<br />
e garantindo apoio incondicional para o<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Seguimento ambulatorial: como vigiar o crescimento e nutrir adequadamente?<br />
estabelecimento e a manutenção da lactação. O<br />
seguimento apropriado do prematuro após a<br />
alta hospitalar é fundamental para a manutenção<br />
do AM no domicílio. As mães necessitam de<br />
atenção especial, principalmente na primeira<br />
semana pós-alta, e são indispensáveis avaliações<br />
periódicas do crescimento e desenvolvimento<br />
do lactente.<br />
É muito difícil predizer o crescimento ideal do<br />
recém-nascido prematuro porque crescimento é<br />
um processo contínuo, complexo, resultante da<br />
interação de fatores genéticos, nutricionais,<br />
hormonais e ambientais. Em se tratando de prematuros<br />
de EBP (< 1.000 g), estes são privados de<br />
um período crítico de crescimento intra-uterino<br />
acelerado (o terceiro trimestre de gestação).<br />
A expectativa quanto ao crescimento de recémnascidos<br />
prematuros é que ocorra aceleração<br />
máxima entre 36 e 40 semanas de idade pósconcepção<br />
e que a maioria apresente catch-up,<br />
atingindo seu canal de crescimento entre os<br />
percentis de normalidade nas curvas de referência<br />
até os 2-3 anos de idade. Geralmente, o<br />
catch-up ocorre primeiro no perímetro cefálico,<br />
seguido pelo comprimento e depois pelo peso.<br />
Prematuros de EBP podem ter uma vida normal,<br />
mas precisam ser acompanhados em programas<br />
de follow-up multiprofissional, onde<br />
serão avaliados e receberão, junto com suas<br />
famílias, todo o suporte necessário para favorecer<br />
seu crescimento e desenvolvimento, desde a<br />
infância até a adolescência.<br />
Déficit de Crescimento<br />
ISABEL REY MADEIRA<br />
O seguimento ambulatorial em pediatria tem<br />
como objetivo principal a garantia do desenvolvimento<br />
pleno da criança. Este deve ser acompanhado<br />
a fim de se diagnosticar a normalidade,<br />
promovendo a estimulação, diagnosticar<br />
a anormalidade, promovendo intervenção precoce<br />
e, no caso de agravos já instalados, impedir<br />
o seu progresso. O crescimento, que exprime<br />
aspectos do desenvolvimento que podem ser<br />
avaliados por medidas de tamanho, é eixo fundamental<br />
no acompanhamento ambulatorial.<br />
O acompanhamento do crescimento e do desenvolvimento,<br />
junto de outras ações básicas em<br />
pediatria, como a promoção do aleitamento<br />
materno e a introdução dos alimentos complementares,<br />
a prevenção das doenças imunopreveníveis,<br />
a prevenção de acidentes e violência e<br />
a prevenção e o tratamento das infecções respiratórias<br />
agudas e da diarréia aguda, visa, assim,<br />
a permitir o desenvolvimento da criança em<br />
toda sua potencialidade.<br />
Estas ações são interdependentes. Desta forma,<br />
a nutrição adequada do indivíduo, desde o<br />
período intrauterino, é uma garantia para seu<br />
crescimento adequado. Após o nascimento, o<br />
aleitamento materno exclusivo é a melhor forma<br />
de nutrir. Segundo a Organização Mundial<br />
de Saúde (OMS) e a Sociedade Brasileira de<br />
Pediatria (SBP), o aleitamento materno exclusi-<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 43
Seguimento ambulatorial: como vigiar o crescimento e nutrir adequadamente?<br />
vo deve ser mantido idealmente até os seis<br />
meses de vida, quando se deve iniciar a introdução<br />
dos alimentos complementares. O Ministério<br />
da Saúde (MS) preconiza os dez passos para<br />
uma alimentação saudável para crianças menores<br />
de dois anos, que devem ser seguidos na<br />
introdução dos alimentos complementares, além<br />
dos dez passos de uma alimentação saudável<br />
para crianças maiores de dois anos.<br />
Uma nutrição inadequada pode levar não só<br />
ao déficit de crescimento, como à obesidade,<br />
culminando na idade adulta com doenças<br />
cardiovasculares e diabetes mellitus (DM). Para<br />
promoção da saúde e prevenção destes principais<br />
agravos, a OMS faz recomendações específicas<br />
quanto à alimentação no primeiro ano de<br />
vida, visto ser este o período mais vulnerável<br />
para a desnutrição, além de ser o período em<br />
que se formam os hábitos alimentares, o que se<br />
refletirá em práticas alimentares para o resto<br />
da vida. Destaca-se a que, em caso da impossibilidade<br />
do aleitamento materno, ou da necessidade<br />
de complementação, a criança deve<br />
receber fórmulas lácteas adequadas para este<br />
período.<br />
O déficit de crescimento é diagnosticado quando<br />
a criança apresenta ganho inadequado de<br />
peso ou comprimento (ou de estatura), ao se<br />
comparar com os padrões de normalidade recomendados.<br />
Várias são as referências utilizadas<br />
como padrões de normalidade: as do<br />
National Center of Health Statistics americano,<br />
as de Marcondes e, mais recentemente, as da<br />
OMS. Todas fornecem gráficos com curvas de<br />
peso e comprimento versus idade, construídos<br />
a partir de estudos em grandes grupos populacionais,<br />
sendo que a última é a que dá a<br />
melhor descrição do que seria um crescimento<br />
fisiológico, normal e esperado para crianças até<br />
os cinco anos de idade.<br />
Quando uma criança apresenta retardo de crescimento<br />
intrauterino (RCIU), podem apresentar<br />
crescimento pós-natal compensatório, alcançando<br />
ou não o peso e o comprimento normais<br />
para a idade. A monitorização deste fenômeno<br />
requer atenção especial, e muitas vezes é realizada<br />
em ambulatórios especiais de seguimento<br />
44<br />
de bebês de risco. O RCIU acontece como conseqüência<br />
de condições do embrião ou do feto,<br />
maternas, ambientais ou então placentárias. São<br />
exemplos de condições do embrião ou do feto:<br />
infecções congênitas, cromossomopatias, anomalias<br />
congênitas. Condições maternas: má nutrição,<br />
toxemia, hipertensão arterial, DM, drogas,<br />
gestações múltiplas. Condições ambientais:<br />
sócio-econômicas, cuidados pré-natais, altitude.<br />
Condições placentárias: infartos, descolamento<br />
prematuro da placenta.<br />
No acompanhamento da criança ao longo do<br />
tempo, plota-se seu peso e seu comprimento<br />
nas curvas recomendadas, e observa-se a sua<br />
curva em particular. De uma maneira geral,<br />
crianças que apresentam perda de peso, baixo<br />
ganho ponderal, ou peso muito abaixo do<br />
ideal, estão em situação de perigo. O mesmo<br />
pode-se dizer em relação a baixo ganho de<br />
comprimento ou comprimento muito abaixo<br />
do ideal. Estas são possíveis situações de déficit<br />
de crescimento, que devem ser mais bem caracterizadas<br />
com anamnese e exame físico<br />
criteriosos.<br />
O peso deve ser sempre comparado com o comprimento,<br />
e para tal, recomenda-se o critério<br />
de Waterlow. Segundo este critério, crianças que<br />
tem déficit de comprimento para a idade, com<br />
peso adequado ao comprimento, podem ter<br />
tido uma desnutrição pregressa onde não se<br />
deu o crescimento de recuperação, mas podem<br />
também ser crianças com baixa estatura<br />
familiar ou constitucional. Crianças com déficit<br />
de comprimento para a idade, com peso baixo<br />
para o comprimento, provavelmente têm desnutrição<br />
crônica. Aquelas com comprimento<br />
adequado à idade mas peso baixo para o comprimento<br />
tem desnutrição aguda. Toda criança<br />
com déficit de crescimento onde está presente<br />
o componente déficit de peso para o<br />
comprimento deve ter todas as etapas do processo<br />
de nutrição verificadas.<br />
Das causas de baixa estatura, as mais freqüentes<br />
em nosso País são as ambientais. A seguir<br />
vem a causa familiar, o RCIU e por último<br />
as doenças crônicas. Sendo assim, devem ser<br />
verificados as condições de vida da criança, a<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Seguimento ambulatorial: como vigiar o crescimento e nutrir adequadamente?<br />
altura e o padrão de crescimento de seus familiares,<br />
e, só após isto, se pensar em doenças<br />
crônicas que possam estar interferindo no crescimento.<br />
As causas ambientais se referem a todas aquelas<br />
relacionadas às más condições sócio-econômicas<br />
que implicam em déficit de crescimento<br />
desde o período intrauterino e incluem saneamento<br />
básico deficiente, assistência à saúde<br />
deficitária, baixo poder aquisitivo de alimentos,<br />
e que condicionam a infecções de repetição, verminoses,<br />
além de má nutrição. Em conseqüência<br />
delas, as crianças podem apresentar todo o<br />
espectro de déficit de crescimento que vai desde<br />
a desnutrição grave até formas sutis, com<br />
deficiências de oligoelementos, como ferro, ou<br />
vitaminas, que impedem o seu crescimento pleno.<br />
Elas se refletem não só a nível individual,<br />
como condicionam a um crescimento deficiente<br />
de toda a população em questão, influenciando<br />
na estatura desta população. Trata-se<br />
assim, de uma questão de saúde pública.<br />
Cabe ao pediatra o papel, não só de vigiar o<br />
crescimento e promover práticas alimentares<br />
saudáveis, como também atuar como agente<br />
modificador desta realidade sócio-econômica.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 45
Seguimento ambulatorial: como vigiar o crescimento e nutrir adequadamente?<br />
46<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Combatendo a fome oculta:<br />
deficiência de micronutrientes<br />
e de macronutrientes<br />
Fortificação<br />
de Alimentos<br />
PAULO PIMENTA DE FIGUEIREDO FILHO<br />
O conceito de alimentos enriquecidos ou fortificados<br />
é definido, segundo recomendações do<br />
Ministério da Saúde do Brasil, como aquele alimento<br />
enriquecido de um ou mais nutrientes<br />
essenciais, para o crescimento, desenvolvimento<br />
e manutenção da saúde e que contenha, no mínimo,<br />
o fornecimento de 15% das necessidades<br />
diárias em 100ml do produto pronto para beber<br />
ou em caso de alimentos sólidos, 30% dessas<br />
necessidades diárias.<br />
A experiência mundial de fortificação de alimentos,<br />
historicamente remonta ao século XX, na<br />
década de 40, quando os EEUU utilizaram a<br />
adição de micronutrientes à farinha de trigo, e<br />
a Inglaterra acrescentou vitamina D ao leite,<br />
para evitar o raquitismo: possivelmente foi este<br />
acréscimo o desencadeador de surto de hipercalcemia<br />
na região. Na década seguinte, o Chile<br />
iniciou o enriquecimento da farinha de trigo<br />
e na década de 60 vários países da América<br />
Latina implementaram modelos semelhantes,<br />
porém utilizando fontes alimentares diferentes<br />
(farinha de milho na Venezuela, etc.).<br />
No Brasil, houve experiências marcantes e vitoriosas<br />
como a adição de iodo ao sal de cozinha,<br />
na prevenção do bócio por deficiência de<br />
iodo e a do flúor à água, na prevenção da cárie<br />
dentária.<br />
Atualmente a OMS tem empreendido grandes<br />
esforços e estratégias no combate a várias deficiências<br />
nutricionais, infelizmente ainda muito<br />
prevalentes e principalmente levando-se em<br />
conta as situações alarmantes e peculiares em<br />
muitos países em desenvolvimento, principalmente<br />
na África, Ásia e América Latina. Dessa<br />
maneira, várias ações visando entre elas a fortificação<br />
de alimentos têm sido propostas tais<br />
como a utilização de micronutrientes, em especial<br />
o ferro, o zinco e vitaminas, como a vitamina<br />
A e o ácido fólico e em algumas situações a<br />
vitamina D. Em vários desses países onde houve<br />
a implementação dessas medidas, resultados<br />
verdadeiramente positivos foram observados,<br />
entretanto, outros questionam sobre os possíveis<br />
riscos a que tais ações possam levar.<br />
Argumentos vários são discutidos, entre eles as<br />
grandes diferenças entre os vários países e também<br />
entre as próprias populações de muitos<br />
deles; a presença de determinadas condições<br />
genéticas, como a drepanocitose; as doenças<br />
infecto-parasitárias, malária, por exemplo; e as<br />
deficiências vitamínicas, como a hipovitaminose<br />
A, por exemplo. Em relação à malária, pode haver<br />
problemas com algumas suplementações e as<br />
fortificações indiscriminadas de vitaminas poderiam<br />
levar risco às populações não deficientes.<br />
O Brasil é, ele próprio, um exemplo dessa<br />
realidade: coexistem populações heterogêneas,<br />
algumas com bons índices de desenvolvimento<br />
humano (IDH), junto com outras, numerosas<br />
e com elevados riscos de agravos sociais e nutricionais.<br />
Também existem regiões com taxas elevadas<br />
de doenças genéticas, infecto-parasitárias<br />
e de carências de vitamina A (drepanocitose no<br />
Sudeste, Bahia e malária no Norte) que necessitariam<br />
de cuidados especiais na formulação de<br />
fortificações alimentares para uso geral.<br />
Outra questão importante é a de qual a melhor<br />
maneira de fortificar determinado alimento,<br />
qual seria esse alimento e qual o seu potencial<br />
de utilização pela população-alvo, levando-se em<br />
conta não apenas a faixa etária (lactentes, préescolares,<br />
adolescentes, adultos, gestantes e idosos)<br />
mas ainda os fatores culturais favorecedores<br />
de sua utilização (farinha de mandioca, farinha<br />
de milho, leite, etc).<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 47
Combatendo a fome oculta: deficiência de micronutrientes e de macronutrientes<br />
A anemia por deficiência de ferro, ainda um<br />
grande problema mundial, com alta prevalência<br />
e de graves conseqüências na faixa pediátrica,<br />
tem sido um dos principais alvos dos programas<br />
de fortificação de alimentos, visando a sua<br />
erradicação. Os vários programas, em países diferentes,<br />
utilizaram sais de ferro (sulfato ferroso,<br />
fumarato ferroso, etc.) com a associação da vitamina<br />
C, para melhora da sua absorção, com o<br />
alvo nas crianças dos seis meses aos 18 meses e,<br />
em algumas situações, até os cinco anos de idade.<br />
A fortificação do leite para crianças menores e<br />
de farinha de trigo e de milho, visando às populações<br />
de escolares e de adolescentes já têm<br />
sido utilizadas. Em algumas situações houve<br />
também a adição de zinco, principalmente nas<br />
formulações contendo o leite de vaca. Em todos<br />
eles, essas medidas mostraram evidencias de<br />
sucesso na queda progressiva e persistente das<br />
taxas de anemia por deficiência de ferro. Esse<br />
declínio foi especialmente marcante no programa<br />
de fortificação alimentar do Chile, que utilizou<br />
também a adição concomitante do zinco<br />
e do cobre, e onde as atuais taxas são consideradas<br />
baixas, principalmente nos primeiros<br />
15 meses de vida, faixa etária esta de maiores<br />
riscos para a ocorrência da deficiência do ferro<br />
e do zinco. Resultados semelhantes têm sido<br />
relatados nos EEUU, onde, rotineiramente, já é<br />
realizada a fortificação desses micronutrientes<br />
na alimentação das crianças e adolescentes.<br />
No Brasil, não há dados precisos para a<br />
prevalência da anemia por deficiência de ferro,<br />
porém as estimativas situam-na em menores de<br />
dois anos, entre 50% e 83%, dependendo da<br />
região em que foi estudada.<br />
Outro aspecto importante para a fortificação do<br />
ferro e do zinco é que apesar das medidas de<br />
uso de ferro medicamentoso serem eficientes na<br />
prevenção e no tratamento da deficiência de<br />
ferro, na realidade tais práticas, mesmo com o<br />
apoio de políticas públicas sérias, não têm sido<br />
suficientes para obter reduções seguras e duradouras<br />
na sua erradicação. Várias causas contribuem<br />
para esse insucesso, entre elas os fatores<br />
culturais da não valorização do impacto negativo<br />
da anemia ferropriva pela família, as baixas condições<br />
sócio-econômicas das populações, a dificuldade<br />
da administração prolongada e diária<br />
do medicamento, a intolerância digestiva ocasionada<br />
pelo uso dos sais de ferro e zinco, etc.<br />
O Brasil instituiu recentemente a fortificação da<br />
farinha de trigo com o ácido fólico para a prevenção<br />
das anormalidades de formação do tubo<br />
neural durante o período gestacional. Tal programa,<br />
entretanto, encontra-se em fase inicial e<br />
ainda sem avaliação dos seus resultados.<br />
Para finalizar, deve ser lembrada a importância<br />
do permanente estímulo ao aleitamento materno<br />
na prevenção da ocorrência das várias deficiências<br />
nutricionais observadas nas populações<br />
das crianças mais novas. É fundamental que<br />
todos os esforços sejam oferecidos às mães para<br />
a manutenção do aleitamento materno nos<br />
primeiros dois anos de vida e que na sua eventual<br />
falta, seja garantida às crianças a oferta<br />
de uma alimentação alternativa, segura e completa<br />
nutricionalmente, seja pela utilização de<br />
fórmulas comerciais completas (líquidas e sólidas)<br />
já disponíveis ou de políticas públicas de<br />
oferta de alimentos fortificados.<br />
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48<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Combatendo a fome oculta: deficiência de micronutrientes e de macronutrientes<br />
Educação Nutricional<br />
MARIA MARLENE DE SOUZA PIRES<br />
A alimentação tem sido ao longo da história<br />
uma constante nas preocupações do homem e<br />
o desenvolvimento das civilizações tem estado<br />
intimamente ligados à forma como o indivíduo<br />
se alimenta. O ato de comer, além de<br />
satisfazer necessidades biológicas e energéticas<br />
inerentes ao bom funcionamento do nosso<br />
organismo, é também fonte de prazer, de socialização<br />
e de transmissão de cultura. No<br />
entanto, quando não adequadamente utilizado<br />
de acordo com as necessidades dos indivíduos,<br />
torna-se responsável por uma série de<br />
enfermidades e agravos. Portanto é preciso<br />
saber eleger os alimentos em qualidade e quantidade<br />
adequadas às necessidades diárias, ao<br />
longo das diferentes fases da vida.<br />
Os estudos têm mostrado o aumento das enfermidades<br />
crônicas responsáveis por doenças e<br />
mortalidade prematura (obesidade, diabetes,<br />
doenças cardiovasculares, osteoporose entre<br />
outras) e que muitas dessas estão diretamente<br />
relacionadas com a prática alimentar. Por outro<br />
lado, embora uma parte da população tenha<br />
acesso a bens alimentares básicos, persistem<br />
ainda, em nosso país, problemas de carência<br />
alimentar. Somado a esse quadro, temos ainda<br />
o erro alimentar associado aos “fast food” que<br />
se propagam no país.<br />
O Brasil e diversos outros países estão<br />
vivenciando nos últimos vinte anos uma rápida<br />
transição demográfica, epidemiológica e<br />
nutricional. Ainda que as características e os<br />
estágios de desenvolvimento da transição se<br />
apresentem com particularidades próprias nos<br />
diferentes países da América Latina, há um<br />
denominador único, grave e importante: o aumento<br />
da prevalência de obesidade. Dentro<br />
desse contexto, a obesidade se consolidou como<br />
agravo nutricional associado a uma alta incidência<br />
de doenças cardiovasculares, câncer e<br />
diabetes, influenciando desta maneira, no perfil<br />
de morbi-mortalidade da população do nosso<br />
país. No entanto, ainda há que se ratificar a<br />
presença da anemia e da desnutrição, problemas<br />
esses não resolvidos, constituindo-se assim<br />
uma tríade de distúrbios nutricionais que<br />
exige uma ação imediata.<br />
Essa tríade é fator de risco de enorme importância<br />
para as principais causas de mortalidade,<br />
morbidade e incapacitação no país.<br />
Há que se registrar, no entanto, que é cada<br />
vez maior a consciência sobre a importância<br />
da qualidade de vida, e que o foco central<br />
tem que estar na promoção da saúde e prevenção<br />
de agravos.<br />
Embora as evidências empíricas disponíveis ainda<br />
não possam esclarecer quais as melhores<br />
metas para o combate dessas enfermidades,<br />
dados de pesquisa nos mostram que países em<br />
desenvolvimento apresentam tendências simultâneas<br />
de aumento do sedentarismo e deterioração<br />
dos padrões alimentares. Esses fatos indicam<br />
que ambos os problemas devam ser combatidos<br />
eficazmente e ao mesmo tempo. Portanto,<br />
partindo da premissa que o foco é promoção<br />
da saúde e prevenção de agravos, a ação<br />
deveria se centralizar na promoção de estilos<br />
de vida saudáveis, ou seja, abordar educação<br />
nutricional em conjunto com a atividade física<br />
tendo em vista que uma depende da outra para<br />
gerar uma resposta satisfatória.<br />
Sabe-se que uma alimentação saudável durante<br />
a infância é essencial para permitir um adequado<br />
crescimento/desenvolvimento e prevenir<br />
uma série de problemas de saúde ligados à<br />
alimentação, tais como; anemia, atraso de crescimento,<br />
desnutrição, obesidade, cárie dentária<br />
entre outros, ratificando dessa forma a importância<br />
da educação nutricional. Dados de investigação<br />
sugerem que as crianças não estão dotadas<br />
de uma capacidade inata para escolher<br />
alimentos em função do seu valor nutricional,<br />
pelo contrário, os seus hábitos alimentares são<br />
aprendidos por meio da experiência, da observação<br />
e da educação e que muitos dos nossos<br />
hábitos alimentares são condicionados desde os<br />
primeiros anos de vida.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 49
Combatendo a fome oculta: deficiência de micronutrientes e de macronutrientes<br />
O papel da família na alimentação e na educação<br />
alimentar das crianças e jovens é, portanto,<br />
inquestionável. No entanto, além da família, a<br />
escola e, em especial, o jardim de infância assumem<br />
uma particular importância, na medida<br />
em que podem oferecer um contexto de aprendizagem<br />
formal sobre esta e outras matérias,<br />
complementando o papel familiar.<br />
O hábito alimentar adequado está intimamente<br />
ligado ao desenvolvimento neuropsicomotor<br />
(DNPM). Sabe-se que o instinto da fome presente<br />
no recém-nascido vai ser a base para a construção<br />
de uma sensação mais elaborada que<br />
requer participação cortical: o apetite. A criança<br />
ao longo do seu crescimento e DNPM modulará<br />
sua conduta alimentar e a dupla vertente<br />
de nutrição e prazer tendo como base suas<br />
experiências gratificantes ou não. A incorporação<br />
de um padrão de conduta exige uma soma<br />
de experiências que requer uma maturação<br />
neuropsíquica prévia. Como em outros campos<br />
da aprendizagem a criança vai construir sua<br />
conduta alimentar mediante condicionamentos<br />
clássicos, operantes ou de gratificação e o hábito<br />
ou cultura familiar.<br />
Desde o nascimento a criança tem presente os<br />
sentidos que vão intervir na aprendizagem de<br />
sua alimentação: olfato, paladar, tato, audição<br />
e visão. Os reflexos primitivos também têm igual<br />
importância nessa fase. À medida que se matura<br />
sua participação é cada vez mais ativa. Sua<br />
aprendizagem se constrói tendo como base o<br />
DNPM, onde se observam etapas bem diferenciadas<br />
de acordo com sua maturação. Portanto,<br />
é a partir daí que se deve construir o processo<br />
de ensino-aprendizagem onde mãe-filho e família-filho<br />
possam construir um estilo de vida<br />
saudável.<br />
Durante a fase de alimentação láctea exclusiva<br />
o lactente vai participar de sua nutrição elegendo<br />
a quantidade e o ritmo do alimento. É muito<br />
importante nesta fase que a alimentação seja<br />
exclusivamente de leite materno até os seis<br />
meses de idade, dado a importância desse nutriente<br />
para o adequado crescimento e DNPM,<br />
bem como para estabelecer bases para uma<br />
alimentação saudável.<br />
50<br />
A etapa de introdução dos alimentos complementares,<br />
igualmente importante para a construção<br />
de uma adequada educação nutricional,<br />
prioriza o leite materno. Nessa etapa, onde o<br />
leite materno se mantém junto a introdução de<br />
novos alimentos, a criança amplia sua participação.<br />
A eleição dos alimentos está na dependência<br />
da evolução maturativa da criança e dos<br />
requerimentos nutricionais necessários a cada<br />
fase do crescimento e DNPM. Respeitar ambos<br />
parece ser o mais adequado para a educação<br />
dos hábitos alimentares. Quando se fala em<br />
educação nutricional há que se reportar ao<br />
período pré-natal, seguido aos períodos que vão<br />
envolver o lactente, pré-escolar, escolar, adolescência<br />
e participação da família e comunidade<br />
escolar. A escola, em especial o jardim de infância,<br />
assumem uma particular importância, na<br />
medida em que podem oferecer um contexto<br />
de aprendizagem formal complementando o<br />
papel familiar.<br />
Portanto, a participação da escola no processo<br />
de educação nutricional é fundamental, tendo<br />
em vista estudos que mostram que um programa<br />
de saúde escolar efetivo é o investimento<br />
de custo-benefício mais eficaz que um país pode<br />
fazer para melhorar, simultaneamente, a educação<br />
e a saúde. Outra forma de atuação da<br />
escola em relação à educação nutricional e a<br />
nutrição é nas situações de desagregação familiar,<br />
ou carência econômica grave, onde a escola<br />
é, por vezes, o principal local para a aprendizagem<br />
de princípios e de comportamentos<br />
alimentares saudáveis, bem como para o suprir<br />
de algumas carências alimentares.<br />
Vários programas têm sido desenvolvidos abordando<br />
a educação nutricional ou hábito de vida<br />
saudável. A Organização Mundial da Saúde lançou<br />
em 2002 a “Estratégia Mundial, Alimentação<br />
Saudável, Atividade Física e Saúde” priorizando o<br />
incentivo ao consumo de legumes, verduras e<br />
frutas; reforço do papel da escola, considerada<br />
como espaço de promoção de hábitos saudáveis,<br />
na promoção da alimentação saudável e definição<br />
de ações reguladoras. Alguns estados aderem<br />
utilizando outras estratégias como, por exemplo,<br />
em Santa Catarina com a implantação da lei das<br />
cantinas que proíbe a venda de guloseimas e<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Combatendo a fome oculta: deficiência de micronutrientes e de macronutrientes<br />
refrigerantes nas cantinas de escolas públicas e<br />
particulares do ciclo básico e as obriga a<br />
disponibilizar pelo menos dois tipos de frutas da<br />
estação. Outros estados seguem linhas de ações<br />
similares. Em maio de 2006 o Ministério da Saúde<br />
institui as diretrizes para a Promoção da Alimentação<br />
Saudável nas Escolas de educação infantil,<br />
fundamental e nível médio das redes públicas<br />
e privadas, em âmbito nacional, onde reconhece<br />
que a alimentação saudável deve ser<br />
entendida como direito humano, compreendendo<br />
um padrão alimentar adequado às necessidades<br />
biológicas, sociais e culturais dos indivíduos,<br />
de acordo com as fases do curso da vida e com<br />
base em práticas alimentares que assumam os<br />
significados sócio-culturais dos alimentos. Mesmo<br />
frente a essas ações, ainda não se conseguiu<br />
uma resposta satisfatória.<br />
A American Dietetic Association (ADA), assume a<br />
posição de que intervenções pediátricas requerem<br />
uma combinação de programas apoiados<br />
na família e na escola que incluem: a promoção<br />
de atividade física, treinamento de pais,<br />
aconselhamento comportamental, educação<br />
nutricional e desenvolvimento de programas e<br />
políticas, para a promoção eficaz de hábitos<br />
alimentares saudáveis e aumento da atividade<br />
física para todas as crianças e adolescentes independentemente<br />
do seu peso.<br />
Concluindo, estudos têm mostrado que a quantidade<br />
de alimentos que se deve ingerir, depende<br />
das necessidades energéticas de cada indivíduo<br />
e de um balanço entre aquilo que se perde<br />
ou elimina por diversos mecanismos e aquilo<br />
que se ingere, bem como da faixa etária e atividade<br />
física. Daí a importância de se agrupar<br />
educação nutricional à atividade física. Dentro<br />
da educação nutricional se busca estratégias<br />
para que o indivíduo aprenda que alimentação<br />
saudável requer a escolha de alimentos seguros,<br />
do ponto de vista da sua qualidade e higiene,<br />
e diversificados, de forma a satisfazer todas<br />
as necessidades de nutrimentos essenciais.<br />
Os constituintes dos alimentos, ou seja, os nutrientes<br />
(carboidratos, proteínas, gorduras, vitaminas,<br />
sais minerais, fibras alimentares e água)<br />
têm como objetivo desempenhar três funções<br />
principais: função energética, função plástica ou<br />
reparadora e função reguladora. Só dessa forma<br />
o processo da alimentação cumpre sua função<br />
que é importante ao longo de toda a vida,<br />
particularmente em determinados períodos,<br />
como a infância e a adolescência, a gravidez ou<br />
a terceira idade.<br />
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Suplementação<br />
Nutricional -<br />
Medicamentosa<br />
LUIZ ANDERSON LOPES<br />
O termo necessidades nutricionais define a<br />
quantidade de macro e micronutrientes que um<br />
indivíduo sadio deve ingerir, por meio dos alimentos,<br />
para que possa satisfazer suas necessidades<br />
basais e também prevenir os sinais e sintomas<br />
decorrentes de possíveis deficiências.<br />
Deste modo, as necessidades nutricionais modificam<br />
em decorrência das fases do crescimento,<br />
das características do ambiente no qual o indivíduo<br />
está inserido, do tipo e intensidade de<br />
atividade física que se expõem e de características<br />
próprias como a presença de doença ou<br />
características fisiológicas que venham criar<br />
demanda específica.<br />
Com base nestes dados foram definidas as recomendações<br />
nutricionais (Recommended Dietary<br />
Allowances - RDA - 1974) que visavam estabelecer<br />
as quantidades de nutrientes essenciais a<br />
serem ingeridos, com base em dados coletados<br />
cientificamente, e considerados adequados para<br />
atender as necessidades nutricionais de praticamente<br />
todos os indivíduos saudáveis.<br />
52<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Combatendo a fome oculta: deficiência de micronutrientes e de macronutrientes<br />
A Sociedade Brasileira de Alimentação e Nutrição<br />
(SBAN) procurou adaptar as recomendações, descritas<br />
para a época, para a população brasileira<br />
em meados de 1990.<br />
Já no ano de 1997, em trabalhos coordenados<br />
pelo Institute of Medicine / Food and Nutrition<br />
Board, procura-se definir consenso sobre as<br />
quantidades a serem consideradas como referência<br />
para a ingestão diária de nutrientes<br />
(Dietary Reference Intakes - DRI) e utilizadas no<br />
planejamento e avaliação dietética de populações<br />
saudáveis. Estes valores definidos para<br />
a Ingestão Dietética de Referência - IDR (DRI)<br />
devem substituir as recomendações nutricionais<br />
descritas anteriormente a esta publicação.<br />
As quantidades estimadas com base na Ingestão<br />
Dietética de Referência (IDRs) Incluem quatro indicadores<br />
definidos na própria metodologia, que<br />
procuram ajustar a referência de consumo alimentar<br />
a situações diferenciadas e assim ajudar<br />
no planejamento e avaliação dietética; são estes:<br />
- Necessidade Média Estimada (Estimated Average<br />
Requirement - EAR) - quantidade estimada como<br />
suficiente para atender as necessidades<br />
nutricionais definidas por um determinado indicador<br />
que considera cinqüenta por cento dos<br />
indivíduos (de acordo com a fase de crescimento<br />
e o gênero) de uma população saudável. - Quantidade<br />
Diária Recomendada (Recommended<br />
Dietary Allowances - RDA) - representa a ingestão<br />
média diária suficiente para atender as necessidades<br />
nutricionais (segundo um indicador específico<br />
de adequação) de quase todos os indivíduos<br />
(entre noventa e sete e noventa e oito por<br />
cento destes) de uma população saudável, segundo<br />
o gênero e fase da vida. Para o cálculo da<br />
Quantidade Diária Recomendada, quando o nutriente<br />
considerado tem curva normal de distribuição,<br />
soma-se o valor correspondente a dois<br />
desvios padrão à Necessidade Média Estimada;<br />
para os nutrientes tais como o Ferro, a Quantidade<br />
Diária Recomendada corresponde aos valores<br />
entre os percentis noventa e sete e noventa e<br />
oito da distribuição das recomendações. - Ingestão<br />
Adequada (Adequate Intake - AI) - representa a<br />
quantidade recomendada para a ingestão de determinado<br />
nutriente baseada em dados observados<br />
ou experimentalmente definidos, referente<br />
ao consumo de um determinado grupo de indivíduos<br />
saudáveis para os quais admite-se serem<br />
adequados. - Nível de Ingestão Máxima Tolerável<br />
- (Tolerable Upper Intake Levels - UL) - representa<br />
as quantidades mais elevadas para o consumo<br />
diário de determinado nutriente sem que possa<br />
ser definido efeitos adversos para a saúde de<br />
quase todos os indivíduos de uma população.<br />
A ingestão alimentar de quantidades acima das<br />
definidas pelas “ULs”, representa, potencialmente,<br />
aumento dos riscos de reações adversas.<br />
De acordo com estes novos indicadores procura-se<br />
estimar, com maior acurácia, as necessidades<br />
de um determinado nutriente, para uma<br />
determinada população, evitando assim a possibilidade<br />
de efeitos adversos.<br />
Quando médicos ou nutricionista avaliam o<br />
estado nutricional de um indivíduo, são consideradas<br />
as informações referentes ao consumo<br />
alimentar que serão consideradas em<br />
conjunto com aspectos clínicos, laboratoriais e<br />
antropométricos.<br />
O consumo alimentar pode ser avaliado quanto<br />
a qualidade (comparando-se os alimentos consumidos<br />
com os descritos pela pirâmide alimentar)<br />
ou quantitativamente (comparando-se as<br />
quantidades e os alimentos consumidos que<br />
foram descritos por meio de um registro alimentar<br />
ou de um questionário recordatório).<br />
Chama-se a atenção para o rigor necessário<br />
durante a coleta dos dados, bem como a necessidade<br />
de adequada seleção das tabelas a<br />
serem utilizadas para a análise do consumo e<br />
para a correta interpretação dos resultados.<br />
Nos casos em que podemos estudar adequadamente<br />
as necessidades, as recomendações e as<br />
características individuais a orientação nutricional<br />
apresenta variações discretas mas com importantes<br />
implicações para os indivíduos.<br />
Pode-se, então, imaginar o potencial erro quando<br />
a alimentação dos indivíduos sofre interferência<br />
de concepções culturais, modismos, hábitos<br />
ou expectativas alimentares dos familiares,<br />
muitas vezes associadas ao acesso a informações<br />
científicas distorcidas, com conseqüências mais<br />
ou menos desfavoráveis.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 53
Combatendo a fome oculta: deficiência de micronutrientes e de macronutrientes<br />
A prescrição de suplementos medicamentosos é<br />
solicitado em potencialmente todas as consultas<br />
pediátricas, partindo-se da premissa de que<br />
mais é melhor ou associada a queixa: “- meu<br />
filho não come nada doutor.”<br />
Com estes relatos, familiares acreditam que o<br />
menor está sendo privado de nutrientes importantes<br />
para o seu crescimento e desenvolvimento<br />
e passam a considerar a alternativa da<br />
“suplementação medicamentosa” como forma<br />
de corrigir o erro alimentar.<br />
Muitas vezes, o acompanhamento sistemático<br />
dos dados antropométricos do indivíduo em<br />
questão revelam evolução adequada ou até<br />
mesmo algum excesso de crescimento; ao analisar<br />
o consumo alimentar pode-se notar distúrbio<br />
nutricional definido pela inexistência de<br />
horários, troca dos alimentos em cada refeição<br />
e o consumo exagerado de alimentos industrializados,<br />
de alto teor energético, por exemplo.<br />
Para o Pediatra estas questões representam<br />
desafio maior pois, além convencer o seu cliente<br />
da necessidade de mudanças (especialmente<br />
escolares e adolescentes) deverá motivar os familiares<br />
para que estes possam acompanhar e<br />
aderir às orientações necessárias e, de modo<br />
adequado, situar a indicação ou a necessidade<br />
do suplemento solicitado.<br />
De maneira bem simples, os clientes e seus<br />
familiares deverão ser orientados em como interpretar<br />
os dados definidos pelas tabelas, de<br />
forma a habilitá-los a interpretar e adequar suas<br />
próprias preferências alimentares.<br />
Uma vez corrigida a alimentação o uso de suplementos<br />
medicamentosos torna-se desnecessário.<br />
Contudo, em determinadas circunstâncias, muitas<br />
vezes associadas a modificações ambientais,<br />
doenças ou condições orgânicas específicas, a<br />
suplementação medicamentosa esta indicada.<br />
Segundo as recomendações para a alimentação<br />
do lactente descritas no Manual de Alimentação<br />
da Sociedade Brasileira de Pediatria, a<br />
suplementação medicamentosa esta indicada<br />
para os seguintes nutrientes:<br />
A suplementação medicamentosa com vitamina<br />
A esta indicada pelo Ministério da Saúde<br />
para áreas de alta prevalência de deficiência<br />
desta vitamina; por ser lipossolúvel, espera-se<br />
que a mesma possa ser acumulada e<br />
formar depósitos, o que implica em doses<br />
mais elevadas a serem administradas em<br />
períodos mais longos (cada 4 ou 6 meses) de<br />
acordo com a idade (Tabela 1). Deste modo,<br />
segundo o Departamento de Nutrologia da<br />
SBP, recomenda-se:<br />
Tabela 1 - Suplementação de vitamina A (UI), segundo a idade, a dose<br />
e o intervalo de administração.<br />
Idade Periodicidade Recomendação<br />
lactentes até seis meses quatro a seis meses 50.000 UI / dose<br />
lactentes de seis a doze meses quatro a seis meses 100.000 UI / dose<br />
lactentes de doze a setenta e dois meses. quatro a seis meses 200.000 UI / dose<br />
A vitamina D tem sido discutida quanto a necessidade<br />
de suplementação em regiões de adequada<br />
insolação, desde que o indivíduo seja adequadamente<br />
exposto a radiação solar (tempo e<br />
horários adequados). Deste modo, o Departamento<br />
de Nutrologia da Sociedade Brasileira de Pediatria<br />
não recomenda a suplementação de<br />
54<br />
lactentes em aleitamento materno exclusivo com<br />
exposição regular ao sol ou aqueles recebendo,<br />
no mínimo, quinhentos mililitros de fórmula<br />
infantil. Para os demais lactentes, preconiza-se a<br />
dose diária de 200UI, até os 18 meses de vida.<br />
(Fatores de risco para deficiência de vitamina D:<br />
Restrição materna durante o período gestacional,<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Combatendo a fome oculta: deficiência de micronutrientes e de macronutrientes<br />
elevada altitude, áreas urbanas com alta concentração<br />
de prédios; alta concentração de poluentes<br />
na atmosfera; uso de bloqueadores solares, uso<br />
de anticonvulsivantes). Recomenda-se a exposição<br />
solar por até oito minutos por dia (trinta<br />
minutos por semana), após a segunda semana<br />
de vida e com o lactente apenas de fraldas (recomenda-se<br />
frisar o cuidado com a intensidade<br />
solar em cada região e o horário de exposição),<br />
ou até por cento e vinte minutos por semana,<br />
quando a exposição solar for parcial (áreas do<br />
corpo cobertas por roupas - apenas face e mãos<br />
expostas). Não esquecer de recomendar o uso de<br />
proteção ocular.<br />
Devido a maior prevalência de anemia<br />
carencial ferropriva em nosso meio, medidas<br />
de prevenção (tabela 2) e de tratamento da<br />
doença são amplamente discutidos mas, infelizmente,<br />
nem sempre contemplados na prática<br />
pediátrica. Desta forma pode-se encontrar<br />
lactentes que não estão recebendo as doses<br />
preventivas preconizadas e outros que, após<br />
tratamento de doença acometendo outros<br />
sistemas, mesmo com o diagnóstico da carência<br />
de ferro demonstrada por meio de exame<br />
laboratorial, segue o período de recuperação<br />
sem que a anemia receba o adequado tratamento.<br />
Tabela 2 - Recomendações de ferro elementar (mg) para lactentes, segundo as condições de<br />
nascimento e o tipo de alimentação. Recém-nascido nascido a termo (RNT); Recém-nascidos<br />
prematuros (RPT); Recém-nascidos de peso adequado (PA); Recém-nascidos de baixo peso (BP).<br />
Nascimento e Alimentação Idade de início Recomendação<br />
RNT, PA, em aleitamento nascimento até os seis meses não recomendado<br />
exclusivo.<br />
RNT, PA, em aleitamento a partir dos seis meses 1 mg/kg/dia até os dois<br />
exclusivo. ou a introdução de alimentos anos de idade<br />
complementares.<br />
RNT, PA, recebendo fórmula nascimento até os seis não recomendado<br />
e após os seis meses, segundo meses e após se consumo<br />
o volume consumido. > 500ml/dia de fórmula.<br />
RNT, BP, e RPT a partir do trigésimo 2 mg/kg/dia durante<br />
dia de vida<br />
o primeiro ano de vida<br />
e 1 mg/kg/di<br />
A vitamina K esta indicada para todos os recém-nascidos,<br />
na dose de 0,5 a 1,0 mg, por via<br />
intramuscular, com o objetivo de prevenir a<br />
doença hemorrágica.<br />
Em recém-nascidos prematuros, em função do<br />
ritmo de crescimento físico, especialmente o do<br />
sistema nervoso central, atenção especial tem<br />
sido dada a alimentação durante esta fase, principalmente<br />
entre os extremos. Aliada a maior<br />
necessidade nutricional, existe as condições específicas<br />
do sistema digestório que estabelece<br />
limites rígidos para a suplementação, ressaltando<br />
a influência positiva do uso do colostro ou<br />
do leite materno no que refere a maturação da<br />
mucosa e das funções digestórias.<br />
A nutrição enteral mínima não apresenta consenso<br />
quanto as suas diretrizes (início, manejo,<br />
composição); existe contudo, rotinas que são<br />
dependentes das condições gerais de cada RN e<br />
da capacidade digestória de cada um (características<br />
impossíveis de serem adequadamente<br />
abordadas neste texto). O leite materno é ade-<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 55
Combatendo a fome oculta: deficiência de micronutrientes e de macronutrientes<br />
quado no que diz respeito aos aspectos<br />
imunológicos, neurológicos, de promoção do<br />
vínculo mãe-filho, mas pode não ser suficiente<br />
para atender às necessidades nutricionais de<br />
prematuros com menos de 1000 g de peso de<br />
nascimento (3,5 a 4 g/kg/dia de proteínas) ou<br />
mais de 1000 g de peso de nascimento (3,0 a<br />
3,6 g/kg/dia de proteínas), o que pode implicar<br />
na indicação de suplementos alimentares especiais<br />
que contemplem as necessidades de cálcio<br />
e fósforo e demais nutrientes, que estarão aumentadas<br />
em função do maior ritmo de crescimento<br />
esperado e das limitações apresentadas.<br />
Lactentes com intolerâncias alimentares específicas<br />
(alergia ao leite de vaca, doença celíaca,<br />
entre outras), devem ser avaliados e acompanhados<br />
com vistas a definição da necessidade<br />
de suplementação específica.<br />
Para crianças maiores de dois anos, os erros alimentares<br />
são as causas mais comuns de carências<br />
nutricionais e podem, a longo prazo, vir a<br />
comprometer o crescimento pôndero-estatural,<br />
antes que sinais clínicos possam ser diagnosticados.<br />
Nestas situações, quando o tempo estimado<br />
para a efetivação das correções necessárias for<br />
prolongado e após diagnóstico nutricional confirmando<br />
as carências mais importantes, pode-se<br />
admitir o uso de suplementos medicamentosos<br />
com o objetivo de diminuir as repercussões das<br />
carências sobre a saúde do indivíduo. Nestes<br />
casos, temos orientado a correção dos valores<br />
recomendados objetivando atingir cinqüenta por<br />
cento por via medicamentosa e o restante pela<br />
correção alimentar.<br />
Durante a fase escolar, erros alimentares são<br />
atribuídos ao consumo inadequado de alimentos,<br />
desencadeado pelas preferências alimentares<br />
e a interferência do horário escolar sobre a<br />
alimentação. Embora com manifestações menos<br />
freqüentes, as carências nutricionais devem<br />
ser suspeitadas e orientadas adequadamente.<br />
Alguns trabalhos têm referido melhora do desempenho<br />
escolar e acadêmico de indivíduos<br />
que foram suplementados com vitaminas e sais<br />
minerais, mas os resultados são controversos<br />
quando comparados com as medidas de orientação<br />
nutricional que acompanharam a<br />
56<br />
suplementação descrita. Atribui-se maior valor<br />
às orientações e preocupação com os hábitos<br />
alimentares saudáveis do que com as quantidades<br />
dos nutrientes administrados.<br />
Comportamento particular tem sido encontrado<br />
entre adolescentes, com relação ao estado<br />
nutricional do ferro e do cálcio. Caracterizado pelo<br />
crescimento acelerado e pelas modificações corporais<br />
próprias do gênero, ou impostas pelo<br />
modelo corporal definido pela sociedade, estas<br />
carências podem comprometer a saúde como um<br />
todo ou aspectos específicos como a formação<br />
óssea, que mantém relação com doenças da<br />
maturidade (Osteopenia e Osteoporose). Nesta<br />
fase do crescimento a orientação alimentar deve<br />
preceder o uso de suplementos medicamentosos<br />
e respeitar as recomendações.<br />
Entre crianças e adolescentes a prática de atividade<br />
física irá modular as necessidades na<br />
dependência da intensidade e freqüência dos<br />
exercícios, e devem ser adequados segundo o<br />
gênero, o peso, a estatura. É consenso que a<br />
suplementação medicamentosa deve ser efetuada<br />
apenas nos casos em que a ingestão alimentar<br />
for menor do que a definida para o<br />
atleta. Os suplementos de vitaminas e sais minerais<br />
não são recomendados de modo rotineiro;<br />
outros nutrientes tais como os aminoácidos<br />
de cadeia ramificada não tiveram efeitos positivos<br />
confirmados e o uso abusivo e não controlado<br />
pode desencadear hiperamonemia e<br />
sobrecarga renal e hepática. O uso de soluções<br />
hidratantes contendo carboidratos estão<br />
indicadas em fases específicas do treinamento<br />
e nos períodos que antecedem e após as<br />
provas/competições, para atletas de alto desempenho.<br />
Para os demais, a correta orientação<br />
alimentar é suficiente para atingir as recomendações<br />
nutricionais.<br />
Quanto a indicação de suplementos medicamentosos<br />
para a prevenção de doenças do adulto,<br />
os resultados do uso de vitaminas, sais minerais,<br />
macronutrientes ou outros compostos,<br />
têm mostrado resultados duvidosos quanto a<br />
eficiência, ou mesmo inadequados quando<br />
observados os resultados de estudos de longa<br />
duração.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Combatendo a fome oculta: deficiência de micronutrientes e de macronutrientes<br />
Com base no descrito, os suplementos medicamentosos<br />
variam em composição e representam<br />
grande fração dos medicamentos<br />
disponíveis; são solicitados com muita freqüência<br />
durante as consultas pediátricas e devem<br />
ser indicados em situações especiais e de<br />
modo a contemplar as orientações alimentares<br />
preconizadas.<br />
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Brasil.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 57
Combatendo a fome oculta: deficiência de micronutrientes e de macronutrientes<br />
58<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Deficiência de ferro<br />
Dados Epidemiológicos,<br />
Causas Principais<br />
e Mecanismos<br />
Fisiopatológicos<br />
Envolvidos<br />
ROCKSANE DE CARVALHO NORTON<br />
Dados epidemiológicos<br />
A pobreza e as suas conseqüências sociais,<br />
nutricionais e sobre o processo saúde-doença<br />
impedem que aproximadamente 200 milhões<br />
de crianças dos países em desenvolvimento alcancem<br />
seu pleno potencial. Quando são consideradas<br />
as crianças de até cinco anos de idade<br />
quatro fatores de risco são mais significativos:<br />
desnutrição, baixa estimulação cognitiva, deficiência<br />
de iodo e deficiência de ferro. 1<br />
A deficiência de ferro, na atualidade, é a principal<br />
carência nutricional no mundo, acometendo<br />
perto de um terço da população geral. 2 A<br />
anemia, fase mais avançada da carência de ferro,<br />
acomete aproximadamente 42% das crianças<br />
dos países em desenvolvimento e 17% das<br />
crianças dos países industrializados. 3 Conforme<br />
proposta da OMS, pode ser classificada como<br />
problema de saúde pública de grave, média ou<br />
leve intensidade dependendo das taxas de<br />
prevalência da região (quadro 1).<br />
Quadro 1: Classificação da anemia como problema de saúde pública, conforme a prevalência. 4<br />
Significado do problema<br />
Prevalência<br />
Grave ≥ 40%<br />
Moderado 20% – 39,9%<br />
Leve 5% – 19,9%<br />
Sem significado ≤ 4,9%<br />
Na Ásia e na África concentram-se as maiores<br />
taxas de prevalência de anemia ferropriva, conforme<br />
dados do UNICEF (2004). Na Índia, por<br />
exemplo, entre crianças de até cinco anos de<br />
idade, a prevalência é de 75%. Os outros países<br />
do mundo com índices tão alarmantes de<br />
prevalência estão localizados no continente<br />
africano, entre eles Guiné-Bissau e Moçambique. 5<br />
Embora com taxas menos elevadas, o problema<br />
não é menor na América Latina, onde as cifras<br />
de prevalência de anemia por deficiência de ferro<br />
chegam a 30% entre crianças pré-escolares. 3<br />
No Brasil estima-se que a anemia carencial<br />
ferropriva acometa até 50% da população<br />
com menos de cinco anos de idade. Estudo de<br />
tendência secular evidenciou aumento do número<br />
de crianças acometidas nas três últimas<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 59
Deficiência de ferro<br />
décadas: 22% em 1974, 35% em 1984 e 46%<br />
no ano 2000. 6<br />
Os países do primeiro mundo, ao contrário,<br />
apresentam redução das taxas de prevalência<br />
ao longo dos anos. Dados do National Health<br />
and Nutrition Survey (NHANES) revelam taxas<br />
de 7% para deficiência de ferro para crianças<br />
de até dois anos de idade, com maiores índices<br />
detectados em mulheres férteis (9-16%) 7 ,<br />
muito aquém dos objetivos traçados pela<br />
proposta Health People 2010 de taxas inferiores<br />
a 5% para lactentes e 7% para mulheres<br />
férteis, mas bem melhores que os níveis detectados<br />
nos países pobres. 8 No Reino Unido<br />
estudos demonstram taxas de anemia de<br />
12% para crianças de 1 a 2 anos de idade, mas<br />
dessas apenas 3,4% de etiologia ferropriva. 2<br />
Populações de origem latina e africana<br />
e comunidades de imigrantes asiáticos e<br />
caucasianos têm taxas de prevalência de<br />
anemia mais elevadas (19-22% e 18-27%, respectivamente)<br />
quando comparadas às taxas<br />
encontradas nas populações brancas, americana<br />
e inglesa, o que revela a associação entre<br />
condições socioeconômicas e a má nutrição<br />
relativa ao ferro. 7<br />
Segundo Zlotkin 5 é tempo de agir no controle<br />
da anemia ferropriva nos países em desenvolvimento,<br />
uma vez que os dados epidemiológicos<br />
são consistentes e as estratégias conhecidas,<br />
viáveis e disponíveis. Portanto, é tempo de transformação<br />
do conhecimento em ações preventivas<br />
e curativas abrangentes. Essas medidas incluem<br />
incentivo ao aleitamento materno exclusivo<br />
até o sexto mês, controle de infecções e<br />
dos parasitas intestinais, uso de alimentos<br />
complementares ricos em ferro, fortificação de<br />
alimentos e suplementação medicamentosa.<br />
Resultados dos países ricos comprovam que<br />
melhores condições de vida, aliadas às estratégias<br />
de fortificação de alimentos, contribuíram,<br />
se não para a resolução definitiva do problema,<br />
para a efetiva redução das taxas de prevalência<br />
de anemia. Além dessas medidas, a Academia<br />
Americana de Pediatria recomenda screening<br />
para a anemia em crianças com maior risco<br />
entre os nove e os 12 meses de idade e entre<br />
um e cinco anos. 9<br />
60<br />
Causas principais e mecanismos<br />
fisiopatológicos envolvidos<br />
O ferro, mineral amplamente distribuído na<br />
natureza, é parte integrante de vários compostos<br />
entre os quais: hemoglobina, mioglobina,<br />
citocromos, catalase e peroxidade, responsáveis<br />
pelo transporte de oxigênio aos tecidos, mecanismos<br />
de neurotransmissão, síntese de DNA,<br />
metabolismo de catecolaminas. É transportado<br />
pela transferrina e armazenado na forma de<br />
ferritina, principalmente no fígado. Grande<br />
parte do ferro necessário ao indivíduo adulto<br />
resulta da reciclagem resultante da destruição<br />
das hemácias (95%). Nas crianças a menor contribuição<br />
do processo de reciclagem do ferro<br />
das hemácias aliada às maiores necessidades<br />
impostas pelo ritmo acelerado de crescimento,<br />
explica a grande importância da dieta para essa<br />
faixa etária.<br />
A absorção do ferro da dieta ocorre principalmente<br />
no jejuno, correspondendo a 5 a 10% da<br />
quantidade ingerida em condições adequadas<br />
de homeostase. Em estados de repleção há redução<br />
da absorção e nos estados de carência,<br />
aumento da absorção do ferro ingerido. A absorção<br />
dos compostos de ferro heme, de<br />
origem animal, é mais eficaz do que a de compostos<br />
não-heme, de origem vegetal, sendo,<br />
nesse caso, condicionada pela composição total<br />
da dieta: maior em presença de vitamina C e<br />
ferro heme das carnes e menor em presença de<br />
fatores inibidores como cálcio, fibras, café, chás. 8<br />
A deficiência de ferro resulta da combinação de<br />
fatores relacionados às necessidades e à disponibilidade:<br />
de um lado a oferta de alimentos<br />
contendo ferro em quantidade e qualidade<br />
adequadas e de outro as necessidades impostas<br />
por cada fase da vida e pela concomitância de<br />
agravos. 10<br />
No lactente as necessidades nutricionais de ferro<br />
aumentam aproximadamente 0,1mg/kg/dia<br />
após o sexto mês de vida em virtude da expansão<br />
de massa sangüínea e depleção das<br />
reservas hepáticas fetais. Nesta fase há maior<br />
necessidade de ferro exógeno do que em qualquer<br />
outro período da vida. O leite humano<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Deficiência de ferro<br />
contém baixo teor de ferro (0,6 mg/L), mas de<br />
grande biodisponibilidade, o que garante aporte<br />
adequado de ferro nos primeiros quatro a seis<br />
meses de vida. Entretanto, o aleitamento natural<br />
prolongado pode predispor à deficiência de<br />
ferro e, conseqüentemente, à anemia ferropriva.<br />
O uso de leite de vaca, não modificado, tem<br />
sido associado a risco aumentado de desenvolvimento<br />
de anemia ferropriva em lactentes<br />
de até dois anos de idade. Resultados do<br />
Euro Growth Study revelaram que para cada mês<br />
de uso de leite de vaca há redução média de<br />
2g/dL nos níveis de hemoglobina de lactentes. 2<br />
A introdução de alimentos ricos em ferro e a<br />
utilização de leites e cereais fortificados após o<br />
início do desmame constituem formas adequadas<br />
de prevenir a carência nutricional de ferro.<br />
O processo de crescimento na adolescência,<br />
caracterizado por grande aumento de massa<br />
muscular no menino e pela menarca na menina,<br />
gestações e infecções, são condições que<br />
aumentam as necessidades de ferro. 10 Nesses<br />
casos, mais uma vez, pode-se observar a relação<br />
entre condições de vida e estado de nutrição:<br />
alimentação inadequada na adolescência,<br />
curto intervalo entre gestações, gravidez na<br />
adolescência, prematuridade, baixo peso de<br />
nascimento e exposição às doenças infecciosas<br />
são todas condições predisponentes para a anemia<br />
ferropriva.<br />
A carência de ferro cursa com alterações em<br />
diversos processos orgânicos, razão pela qual é<br />
considerada, na atualidade, uma doença<br />
sistêmica. Além da anemia, manifestação mais<br />
tardia, a deficiência de ferro promove efeitos<br />
adversos precoces, entre os quais salientam-se<br />
os distúrbios do desenvolvimento e da capacidade<br />
cognitiva, alterações da resposta imune e<br />
da capacidade de trabalho. 2 Segundo o projeto<br />
Global Burden of Disease (GBD) 2000, a deficiência<br />
de ferro situa-se na nona colocação entre<br />
24 fatores relacionados ao risco de morrer e<br />
adoecer no mundo. 11 Essas são fortes motivações<br />
para o envolvimento dos profissionais de<br />
saúde e dos responsáveis pelas políticas públicas<br />
no controle dessa grave endemia.<br />
<strong>Referências</strong> <strong>Bibliográficas</strong><br />
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consequences. Food Nutr Bull, 2003. 24(4 suppl):s99-103.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 61
Deficiência de ferro<br />
Sintomatologia Clínica<br />
e Repercussão<br />
no Processo de<br />
Aprendizagem<br />
ROSELI OSELKA SACCARDO SARNI<br />
A anemia por deficiência de ferro ocasiona uma<br />
série de sinais e sintomas como: esclera azul,<br />
espessamento das unhas, palidez, anorexia, fadiga,<br />
taquicardia, aumento da área cardíaca,<br />
pica, irritabilidade, maior suscetibilidade à infecções,<br />
retardo no crescimento pônderoestatural,<br />
retardo no desenvolvimento cognitivo<br />
e motor, pior desempenho escolar e alterações<br />
no comportamento. Em relação ao sistema imune<br />
o ferro atua na imunidade celular (redução<br />
na proliferação dos linfócitos T) e na função dos<br />
macrófagos e neutrófilos. A função das células<br />
β não é alterada pela deficiência de ferro.<br />
Estudos longitudinais relatam que as alterações<br />
mentais e comportamentais relacionadas à anemia<br />
e/ou deficiência de ferro persistem na infância<br />
e adolescência apesar do tratamento. No<br />
cérebro, a deficiência de ferro tem efeitos diretos,<br />
indiretos, imediatos e em longo prazo que<br />
incluem alterações em: morfogênese, crescimento<br />
e diferenciação celular, bioenergética celular,<br />
bioquímica e biologia da mielina e<br />
neurotransmissores. O sistema dopamina tem<br />
sido amplamente estudado recentemente.<br />
Há pelo menos 6 estudos de seguimento avaliando<br />
os efeitos da anemia e/ou da deficiência<br />
de ferro na vida futura. Estudo realizado com<br />
crianças israelenses que tiveram a hemoglobina<br />
dosada aos 9 meses e o desenvolvimento avaliado<br />
aos 2 (n=873), 3 (n=388) e 5 (n=239) anos<br />
verificou associação inversa significativa entre o<br />
nível de Hb e o quociente de inteligência (QI)<br />
aos 5 anos. Para cada aumento de 0,1g/dl na<br />
hemoglobina houve elevação de 1,75 pontos no<br />
QI. O mesmo grupo de crianças foi reavaliado<br />
62<br />
aos 7 anos e evidenciou pior desempenho escolar<br />
mesmo após ajuste para variáveis como QI<br />
materno, relacionadas ao ambiente e níveis de<br />
chumbo. Outro estudo, na Iugoslávia, mostrou<br />
relação entre os baixos níveis de hemoglobina<br />
aos 6 e 36 meses e o QI comprometido mesmo<br />
após ajuste para as mesmas variáveis utilizadas<br />
no estudo em Israel.<br />
Na Costa Rica publicação envolvendo crianças<br />
com 5 anos de idade que tinham diferentes<br />
status de ferro quando lactentes. Todas as<br />
crianças anêmicas receberam ferro e nenhuma<br />
tinha deficiência de ferro após o tratamento.<br />
Após ajuste para variáveis ambientais e QI<br />
materno, o grupo com deficiência moderada de<br />
ferro mostrou níveis mais baixos na avaliação<br />
quantitativa do QI, na velocidade de percepção,<br />
integração visual e desempenho motor. Além<br />
disso, crianças com Hb superior a 10 cujos indicadores<br />
bioquímicos de deficiência de ferro não<br />
foram completamente corrigidos também tiveram<br />
pior desempenho. Houve alteração em<br />
outros setores como interação, verbalização,<br />
nível de atividade física e afetividade. Os dados<br />
desse estudo foram corroborados por outro<br />
realizado no Chile.<br />
Não apenas a anemia como também a deficiência<br />
de ferro pode determinar alterações persistentes<br />
no desenvolvimento. Estudo americano<br />
correlacionou níveis de ferritina no sangue<br />
de cordão, situados no quartil inferior, com a<br />
piora no desenvolvimento futuro relacionado à<br />
motricidade fina, linguagem e relacionamento.<br />
Estudo da Flórida, em crianças (n=3771) de baixa<br />
renda, mostrou associação entre anemia na fase<br />
de lactente e necessidade de reforço escolar. A<br />
chance de necessidade de reforço aumentou em<br />
1,28 vezes para cada queda de uma unidade de<br />
hemoglobina por ocasião no ingresso no programa<br />
governamental de assistência.<br />
Só existe um estudo de seguimento realizado<br />
com crianças acima de 10 anos. As 167 crianças<br />
da coorte da Costa Rica (87% dos participantes<br />
da coorte inicial), anteriormente citada, foram<br />
reavaliadas. As 48 crianças que tinham sido tratadas<br />
para anemia grave e crônica quando<br />
lactentes demonstraram desempenho inferior<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Deficiência de ferro<br />
em matemática, escrita e na função motora<br />
comparativamente a 114 crianças com status<br />
de ferro normal antes ou após o tratamento. A<br />
proporção de crianças que repetiram ou foram<br />
encaminhados para reforço foi 2 a 3 vezes maior<br />
para o grupo de crianças previamente anêmicas.<br />
Essas também apresentaram maior freqüência<br />
de transtornos como ansiedade/depressão e<br />
problemas de atenção. Houve persistência do<br />
atraso motor na avaliação realizada entre 11 e<br />
14 anos e piora nos escores mentais avaliados<br />
aos 19 anos.<br />
Resumidamente, crianças que tiveram anemia<br />
por deficiência de ferro, deficiência de ferro<br />
grave e crônica ou anemia possivelmente decorrente<br />
a deficiência de ferro continuam a ter<br />
desempenho pior que seus pares com bom estado<br />
nutricional relativo ao ferro quando<br />
lactentes. Eles apresentam pior desempenho em<br />
testes gerais de desenvolvimento, mental, motor,<br />
social e emocional bem como em testes<br />
neurocognitivos específicos para a idade préescolar,<br />
escolar e adolescência. Diferenças<br />
neurofisiológicas foram observadas durante todo<br />
período pré-escolar e no seguimento posterior<br />
sugerindo que as deficiências persistem. Tais<br />
achados reforçam a importância das intervenções<br />
profiláticas visando minimizar as seqüelas<br />
proporcionadas pela anemia por deficiência de<br />
ferro.<br />
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Prevenção e<br />
Tratamento da<br />
Deficiência de Ferro<br />
DENISE BOUSFIELD DA SILVA<br />
Introdução<br />
Os estudos epidemiológicos têm evidenciado<br />
considerável aumento da ocorrência da deficiência<br />
de ferro e da anemia ferropriva em indivíduos<br />
de todos os níveis sócio-econômicos,<br />
apesar de todos os progressos médicos ocorridos<br />
no mundo.<br />
Segundo dados publicados pelo Ministério da<br />
Saúde, a anemia acomete aproximadamente<br />
42% das crianças com idade inferior a cinco anos<br />
em países em desenvolvimento e cerca de 17%<br />
nos países industrializados.<br />
Embora ainda não haja um levantamento nacional,<br />
estudos apontam que aproximadamente<br />
metade dos pré-escolares brasileiros sejam anêmicos.<br />
A prevalência da anemia chega a 67,6%<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 63
Deficiência de ferro<br />
nas idades entre 6 e 24 meses. Nas gestantes,<br />
estima-se uma média nacional de prevalência<br />
de anemia em torno de 30%.<br />
Prevenção<br />
A deficiência de ferro e a anemia ferropriva representam<br />
relevante problema de saúde pública,<br />
considerando sua alta prevalência no Brasil<br />
e seus efeitos deletérios a curto e longo prazo.<br />
O Ministério da Saúde, juntamente com consenso<br />
de representantes da Sociedade Brasileira<br />
de Pediatria (SBP), da Organização Pan-Americana<br />
da Saúde (OPAS) e do Fundo das Nações<br />
Unidas para a Infância (UNICEF), recomenda a<br />
suplementação medicamentosa diária de 60 mg<br />
de ferro elementar, para gestantes a partir da<br />
20ª semana e mulheres até o 3º mês pós-parto,<br />
visando a prevenção da anemia por deficiência<br />
de ferro.<br />
Além da suplementação preventiva, as mulheres<br />
atendidas pelo Programa Nacional de<br />
Suplementação de Ferro são orientadas sobre a<br />
importância do consumo de alimentos ricos em<br />
ferro, incluindo informações sobre alimentos<br />
facilitadores ou dificultadores da absorção do<br />
ferro.<br />
Na criança e no adolescente, a prevenção da<br />
deficiência de ferro e da anemia ferropriva<br />
envolve orientações em relação à saúde e à<br />
educação alimentar durante a consulta médica<br />
de seguimento. O pediatra deve enfatizar a<br />
importância do vínculo familiar e das condições<br />
ambientais, considerando que a<br />
inadequação destes fatores contribuiria para instalação<br />
da doença.<br />
As orientações realizadas pelo pediatra durante<br />
a consulta médica devem abordar:<br />
– orientação alimentar e de suplementação de<br />
ferro para gestante e lactante;<br />
– estímulo ao aleitamento materno, exclusivo<br />
até o 6º mês de vida;<br />
– introdução de alimentos ricos em ferro e de<br />
boa biodisponibilidade no período de introdução<br />
da alimentação complementar e nas fases<br />
de maior vulnerabilidade dessa deficiência;<br />
64<br />
– não utilização de alimentos que inibam a<br />
absorção do ferro;<br />
– uso de fórmulas pediátricas, cereais e alimentos<br />
industrializados enriquecidos com ferro;<br />
– não utilização do leite de vaca antes do primeiro<br />
ano de vida;<br />
– recomendação para uso de alimentos ricos<br />
em ácido ascórbico, visando melhorar a absorção<br />
do ferro;<br />
– prevenção de outras deficiências nutricionais<br />
coexistentes e das doenças relacionadas às<br />
causas sociais;<br />
– importância do acesso ao saneamento básico<br />
adequado;<br />
–e a introdução de suplementação medicamentosa<br />
profilática para os grupos de risco.<br />
É importante enfatizar que o incentivo e a fiscalização<br />
dos programas de educação e de<br />
suplementação de ferro são fundamentais para<br />
adesão e sucesso dos mesmos.<br />
Em relação às orientações nutricionais, deve-se<br />
enfatizar sua importância para reverter o quadro<br />
da deficiência de ferro, ou seja, viabilizar a<br />
execução de ações educativas alimentares, com<br />
ênfase no consumo de alimentos regionais e<br />
ricos em ferro como, por exemplo, carne vermelha,<br />
vísceras, folhas verde-escuras, entre outros<br />
alimentos.<br />
O consumo de alimentos ricos em vitamina C,<br />
como acerola, caju, goiaba, limão, entre outros,<br />
devem ser estimulados, já que favorecem a<br />
absorção do ferro contido nos alimentos de<br />
origem vegetal.<br />
Outra orientação a ser realizada aos familiares<br />
é evitar o consumo de leite e seus derivados,<br />
mate, chá preto e café junto às refeições principais,<br />
pois estes produtos dificultam a absorção<br />
do ferro dos alimentos.<br />
Além das orientações relativas aos alimentos<br />
ricos em ferro e suas formas de consumo para<br />
aumentar a absorção do nutriente, é fundamental<br />
estimular a manutenção do aleitamento<br />
materno exclusivo até os seis meses e do<br />
aleitamento complementar até os dois anos<br />
de idade.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Deficiência de ferro<br />
Na população de maior risco para deficiência<br />
de ferro deve ser instituído programa de<br />
suplementação de ferro, como os protocolos sugeridos<br />
pela Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP)<br />
e pelo Ministério da Saúde (MS), entre outros.<br />
Os indivíduos considerados de risco para o desenvolvimento<br />
de deficiência de ferro incluem:<br />
– gestantes e lactantes;<br />
–recém-nascidos prematuros;<br />
–recém-nascidos pequenos para a idade<br />
gestacional;<br />
– filhos de mães diabéticas;<br />
– lactentes de curta duração de aleitamento materno<br />
exclusivo;<br />
– lactentes alimentados com leite de vaca e os<br />
que recebem alimentação complementar com<br />
baixo teor e/ou com baixa disponibilidade de<br />
ferro;<br />
– crianças e adolescentes com doenças crônicas<br />
e/ou com indicadores de pobreza.<br />
No sentido de viabilizar a suplementação de ferro<br />
para população de maior risco para esta doença,<br />
é importante não somente fornecer o suplemento,<br />
mas também sensibilizar as famílias,<br />
quanto à importância desta complementação,<br />
bem como sobre o modo de utilizar o produto<br />
(dosagem, periodicidade, tempo de permanência<br />
e conservação). Desta forma, a adesão ao<br />
programa torna-se mais efetiva, garantindo assim,<br />
a continuidade no mesmo e o impacto<br />
positivo na diminuição do risco da deficiência de<br />
ferro e da anemia entre as crianças.<br />
Na suplementação de ferro semanal, os familiares<br />
devem ser orientados para administrar o<br />
ferro no mesmo dia e hora em todas as semanas,<br />
entre as refeições (mínimo de 30 minutos<br />
antes da refeição), de preferência com suco de<br />
frutas ricas em vitamina C e nunca com leite e<br />
seus derivados.<br />
É importante alertar os familiares que o suplemento<br />
de ferro administrado pode determinar<br />
alguns efeitos adversos, como fezes escuras,<br />
diarréia, entre outros. É imprescindível ainda, que<br />
os responsáveis saibam que a suplementação<br />
com ferro não deve ser interrompida, caso os<br />
efeitos adversos ocorram, e que quando a<br />
suplementação adotada pelo programa é a semanal,<br />
esse efeito pode ser minimizado.<br />
O Programa Nacional de Suplementação de<br />
Ferro, instituído pelo Ministério da Saúde, que<br />
preconiza a utilização semanal de 25 mg de<br />
ferro elementar para as crianças de 6 a 18 meses<br />
de idade, juntamente com a fortificação obrigatória<br />
das farinhas de trigo e de milho com ferro<br />
e ácido fólico, bem como as orientações<br />
nutricionais, constituem um conjunto de estratégias<br />
direcionadas para o controle e a redução<br />
da anemia por deficiência de ferro no Brasil.<br />
A tabela 1 descreve a recomendação do Departamento<br />
Científico de Nutrologia Pediátrica da<br />
SBP para suplementação medicamentosa<br />
profilática de ferro.<br />
O Comitê de Nutrição da Academia Americana<br />
de Pediatria recomenda a utilização de doses<br />
mais elevadas, como a de 4 mg de ferro elementar/kg/dia<br />
no primeiro ano de vida para<br />
recém-nascidos com peso inferior a 1.000 gramas<br />
e de 3 mg de ferro elementar/kg/dia para<br />
as crianças entre 1.000 a 1.500 gramas.<br />
Tratamento<br />
O diagnóstico precoce e o adequado tratamento<br />
da deficiência de ferro e da anemia ferropriva<br />
são fundamentais para possível reversibilidade<br />
de qualquer alteração clínica ou de comportamento.<br />
O tratamento adequado requer um estudo individualizado<br />
das possíveis causas do equilíbrio<br />
negativo do ferro.<br />
Associado ao tratamento medicamentoso devese<br />
realizar o aconselhamento nutricional de<br />
acordo com a biodisponibilidade do ferro<br />
dietético e baseado nas condições sócio-econômicas<br />
da família.<br />
A biodisponibilidade do ferro é altamente influenciada<br />
por vários fatores, incluindo a dieta<br />
normal e a quantidade de ferro presente no<br />
organismo. Os farelos, fibras, sais de cálcio, taninos,<br />
oxalatos, fitatos, polifenóis e anti-ácidos<br />
inibem a absorção do ferro.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 65
Deficiência de ferro<br />
Tabela 1. Recomendação do Departamento Científico de Nutrologia Pediátrica da SBP<br />
para suplementação medicamentosa profilática de ferro.<br />
Situação<br />
Lactentes nascidos a termo, com peso adequado<br />
para idade gestacional, em aleitamento materno<br />
exclusivo até 6 meses de idade.<br />
Lactentes nascidos a termo, com peso adequado<br />
para idade gestacional, em uso de fórmula infantil<br />
até 6 meses de idade; a partir do 6º mês, se houver<br />
ingestão mínima de 500 ml de fórmula por dia.<br />
Lactentes nascidos a termo, com peso adequado<br />
para idade gestacional, a partir da introdução de<br />
alimentos complementares, se não houver ingestão<br />
mínima de 500 ml de fórmula por dia.<br />
Prematuros e recém-nascidos de baixo peso,<br />
a partir do 30º dia de vida.<br />
Recomendação<br />
Não indicado.<br />
Não indicado.<br />
1 mg de ferro elementar/kg/dia<br />
até 2 anos de idade.<br />
2 mg de ferro elementar/kg/dia,<br />
durante todo o primeiro ano de vida.<br />
Após este período, 1 mg/kg/dia até<br />
os 2 anos de idade.<br />
Outra recomendação é que o medicamento não<br />
seja administrado concomitantemente com<br />
outros suplementos polivitamínicos e minerais,<br />
pois estes podem reduzir a biodisponibilidade<br />
do ferro.<br />
A utilização concomitante de substâncias redutoras<br />
como ácido ascórbico, citrato, frutose e<br />
alguns aminoácidos podem aumentar a absorção<br />
do ferro.<br />
O sulfato ferroso continua sendo recomendado<br />
como tratamento adequado para prevenção e<br />
tratamento da anemia ferropriva, já que não<br />
há evidências de benefícios maiores, nem de<br />
redução significativa dos eventos adversos com<br />
a utilização de outras preparações.<br />
Entretanto, nas crianças com manifestações<br />
gastrintestinais importantes com ferro na forma<br />
de sais (sulfato, fumarato e gluconato) podem<br />
ser utilizados medicamentos que contêm<br />
ferro aminoácido quelato ou hidróxido de ferro<br />
polimaltosado.<br />
O tratamento medicamentoso consiste na administração<br />
oral de sais ferrosos, na dose diária<br />
de ferro elementar de 3 a 5 mg/Kg/dia, em dose<br />
única ou fracionada em duas vezes, antes das<br />
principais refeições, já que o ferro é melhor<br />
absorvido com estômago vazio.<br />
O uso de doses semanais para o controle da<br />
anemia estaria indicado nas situações em que a<br />
supervisão diária não seja factível, tais como, as<br />
realizadas nas escolas e nos casos de<br />
institucionalização.<br />
A terapêutica medicamentosa oral deve ser<br />
mantida por mais dois ou três meses após ter<br />
sido corrigida a concentração de hemoglobina,<br />
visando assim, repor as reservas de ferro no<br />
organismo.<br />
Na presença de falha terapêutica, deve-se considerar<br />
incorreção no diagnóstico, doença associada,<br />
não adesão ao tratamento, prescrição<br />
inadequada, perdas superiores à ingestão e má<br />
absorção de ferro.<br />
66<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Deficiência de ferro<br />
O ferro parenteral deve ser utilizado em crianças<br />
somente em situações excepcionais.<br />
O sucesso dos programas que controlam a deficiência<br />
de ferro e a anemia ferropriva depende<br />
fundamentalmente da clareza na definição<br />
de seus objetivos, da efetividade das estratégias<br />
utilizadas, além do comprometimento político<br />
em relação aos mesmos.<br />
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64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 67
Deficiência de ferro<br />
68<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Tópicos em gastroenterologia<br />
pediátrica<br />
Constipação<br />
RENATA GONÇALVES ROCHA<br />
Introdução<br />
Constipação é definida como defecação difícil<br />
ou demorada que gera um desconforto ao paciente,<br />
devendo este quadro estar presente por<br />
mais de duas semanas. O número de evacuações<br />
varia segundo a idade do paciente. Na<br />
primeira semana de vida o número de movimentos<br />
intestinais é em torno de 4 vezes ao<br />
dia, esta freqüência diminui gradualmente até<br />
os dois anos de vida, ficando em torno de 1,7<br />
vezes ao dia e, após em torno de 1,4 vezes ao<br />
dia. Lembrando que, crianças sob aleitamento<br />
materno exclusivo podem ficar períodos mais<br />
longos sem evacuar, sem que este fato esteja<br />
relacionado a uma alteração orgânica. Queixas<br />
quanto ao hábito intestinal são responsáveis por<br />
até 25% das consultas com gastroenterologistas<br />
pediátricos e 3% das consultas pediátricas.<br />
A prevalência de constipação descrita em estudos<br />
brasileiros varia de 12,7% até 38,4%<br />
dependendo da idade estudada.<br />
A constipação crônica é fonte de ansiedade para<br />
toda a família, sendo muitas vezes um momento<br />
dramático onde a criança apresenta choro e<br />
assume posições bizarras durante a defecação.<br />
A cronicidade dos sintomas leva a criança a um<br />
processo de má adaptação ao ato evacuatório,<br />
condicionando-a a inibi-lo, o que resulta em<br />
conseqüências emocionais, como: maior grau<br />
de ansiedade, auto-imagem negativa e afastamento<br />
do convívio social, especialmente na<br />
escola.<br />
Na maioria dos casos a constipação é funcional<br />
(90-95%), ou seja, constipação sem evidência de<br />
uma alteração patológica. E apenas 5-10% dos<br />
casos estão relacionados a alterações como<br />
doença de Hirschsprung, espinha bífida oculta<br />
ou outras mal-formações ano-retais.<br />
Fisiopatologia<br />
A constipação funcional normalmente é ocasionada<br />
por um ato evacuatório doloroso. Tal<br />
situação é decorrente de uma retenção voluntária<br />
de fezes pela criança, que tenta evitar uma<br />
evacuação desagradável – hábito retentor.<br />
A retenção prolongada de fezes no cólon provoca<br />
reabsorção dos líquidos do bolo fecal, levando<br />
a um aumento do volume e consistência das<br />
fezes, e fechando um círculo vicioso. Muitos<br />
acontecimentos podem ocasionar uma defecação<br />
dolorosa, como o treinamento do uso do<br />
banheiro, mudanças na dieta ou na rotina da<br />
criança, situações estressantes, doenças agudas,<br />
ou até mesmo a própria criança muito ocupada<br />
fica atrasando o ato evacuatório.<br />
Eventualmente, o reto “acostuma” com o bolo<br />
fecal volumoso e, a sensação de ampola retal<br />
repleta antes do ato de evacuar diminui. Nestes<br />
casos o escape fecal ou soiling pode estar presente,<br />
tal situação é definida como perda fecal<br />
involuntária de fezes amolecidas, sendo muitas<br />
vezes confundida com diarréia.<br />
Quanto às causas orgânicas, a doença de<br />
Hirschsprung ou aganglionose deve ser lembrada.<br />
Pode ocorrer em 1/4.000 recém-nascidos<br />
vivos, e deve ser considerada na presença de<br />
constipação severa e refratária ao tratamento<br />
em crianças e adolescentes. O diagnóstico é<br />
confirmado pela ausência de células<br />
ganglionares na biópsia retal.<br />
Outras causas que também devem ser avaliadas:<br />
a) uso de medicações (fenobarbital,<br />
opióides, anti-ácidos, anti-depressivos, antihipertensivos,<br />
entre outros); b) presença de<br />
doenças metabólicas (hipotireoidismo, hipercalcemia,<br />
hipocalemia); c) má-formação ano-retal;<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 69
Tópicos em gastroenterologia pediátrica<br />
d) doenças gastrintestinais (doença celíaca,<br />
fibrose cística, intolerância a proteína do leite<br />
de vaca) e e) alterações neurológicas.<br />
Manejo do paciente<br />
– Anamnese e exame físico:<br />
Uma história detalhada procurando definir a<br />
idade de início da constipação, a presença de<br />
hábito retentor e escape fecal/soiling, caracterizar<br />
o aspecto das fezes, o uso de medicações,<br />
o impacto psicossocial da alteração. Presença<br />
de febre, anorexia, náuseas, vômitos, distensão<br />
abdominal e perda ou dificuldade em ganhar<br />
peso podem ser sinais de alterações orgânicas.<br />
No exame físico, além da avaliação completa<br />
do paciente o exame da região perineal e<br />
perianal é essencial e, pelo menos um toque<br />
retal é recomendado. O toque retal avaliará o<br />
tônus do esfíncter anal, o tamanho do reto, a<br />
presença de fezes na ampola retal, bem como<br />
determinará a quantidade e consistência das<br />
fezes.<br />
Tabela 1 - Medicamentos usados no tratamento da constipação<br />
Laxantes Dose Efeitos colaterais Notas<br />
Osmótico<br />
Lactulose 1-3ml/kg/dia divido Flatulência e Dissacarídeo sintético, uso<br />
em 2 doses dor abdominal prolongado bem tolerado<br />
Hidróxido de 1-3ml/kg/dia divido Intoxicação por magnésio Uso com cuidado em<br />
magnésio em 2 doses em lactentes levando pacientes com função<br />
à hipermagnesemia, renal prejudicada<br />
hipofosfatemia<br />
e hipocalcemia<br />
PEG 3550 Desimpactação: Boa palatabilidade e<br />
1-1,5g/kg/dia, por 3 dias<br />
aceitação pelas crianças.<br />
Manutenção: 1g/kg/dia<br />
Poucos estudos<br />
Lubrificante<br />
Óleo mineral Não recomendado Pneumonia lipóidica se Fezes amolecidas,<br />
para 2anos: 6ml/kg causar episódios graves ou renal é normal não ocorre<br />
até 135ml letais de hiperfosfatemia acúmulos tóxicos.<br />
hipocalcemia com tetania.<br />
Enema glicerinado 10ml/kg até 200ml Risco de trauma mecânico Mais seguro para utilizar<br />
10-25% em crianças.<br />
70<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Tópicos em gastroenterologia pediátrica<br />
– Exames complementares:<br />
Não é rotina a solicitação de radiografias simples<br />
ou contrastadas em pacientes com constipação<br />
funcional, sendo a sua utilidade para a exclusão<br />
de doenças estruturais do intestino. O uso de<br />
marcadores radiopacos para avaliar o tempo de<br />
trânsito colônico pode ser útil em alguns casos,<br />
assim como a manometria anorretal. Em geral,<br />
quando se trata de constipação funcional, apenas<br />
quando o paciente não responde ao tratamento<br />
é que devemos iniciar a investigação com<br />
exames complementares.<br />
– Tratamento:<br />
Baseia-se em: a) tratar impactação quando presente,<br />
b) iniciar medicação laxativa via oral e<br />
orientação dietética e, c) orientar a família e<br />
cuidadores.<br />
a) Impactação é definida como a presença de<br />
uma massa endurecida palpável em abdome<br />
inferior, presença de fezes volumosas e endurecidas<br />
notada no toque retal ou visualizada<br />
na radiografia. A desimpactação pode ser por<br />
via oral, retal ou ambas (Tabela 1).<br />
b) As medicações mais utilizadas estão citadas<br />
na Tabela 1. A redução da ingesta de leite de<br />
vaca e derivados e o aumento de líquidos e<br />
fibras na dieta deve ser estimulado.<br />
c) As orientações para a família são parte fundamental<br />
para o tratamento. Entre elas: criar<br />
um hábito para sentar no vaso sanitário após<br />
as principais refeições, sem repreensão, com<br />
os pés apoiados e com protetor sanitário para<br />
que a criança sinta-se segura; uso de um<br />
calendário como marcador do hábito intestinal,<br />
como um ponto de reforço positivo, podendo<br />
até ter uma recompensa.<br />
O tratamento de manutenção pode ser necessário<br />
por vários meses. Apenas quando a criança<br />
apresentar um hábito intestinal regular, sem<br />
dificuldade para evacuar é que as medicações<br />
devem ser descontinuadas. Pode haver períodos<br />
de recaída, sendo necessário reiniciar as<br />
medicações.<br />
A chave do sucesso do tratamento é a orientação<br />
aos pais e à criança, incluindo explicações<br />
sobre o que é a constipação funcional e sua<br />
patogênese. É importante estimular uma postura<br />
não acusatória, evitando-se atitudes e comentários<br />
negativos. Uma das principais causas de<br />
falha, recorrência ou abandono do tratamento<br />
da constipação é a falta de conhecimento, por<br />
parte dos pais e da criança, do caráter prolongado<br />
do tratamento.<br />
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64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 71
Tópicos em gastroenterologia pediátrica<br />
Diarréia Persistente<br />
ROSE TEREZINHA MARCELINO<br />
Introdução<br />
Diarréia persistente (DP) é uma síndrome definida<br />
como episódios diarréicos de etiologia<br />
presumivelmente infecciosa, que se iniciam agudamente<br />
e persistem por mais de 14 dias. O<br />
conceito exclui síndromes diarréicas crônicas e<br />
recorrentes específicas, como doença celíaca e<br />
síndrome do intestino irritável. (6)<br />
No passado, essa síndrome recebeu várias denominações<br />
como diarréia intratável (1) em virtude<br />
das grandes dificuldades de se controlar o<br />
processo diarréico à luz dos conhecimentos<br />
terapêuticos da época, síndrome diarréia<br />
protraída (8) , e síndrome pós enterite. (13)<br />
Epidemiologia<br />
Estima-se que ocorram de 3 a 5 bilhões de<br />
episódios de diarréia aguda e 5 a10 milhões de<br />
mortes associadas à ela anualmente. (14) O advento<br />
da terapia de reidratação oral e o avanço<br />
no tratamento da reposição hidroeletrolítica<br />
permitiram reduzir drasticamente a mortalidade<br />
decorrente do choque hipovolêmico e dos<br />
distúrbios metabólicos graves da fase aguda,<br />
fazendo crescer o número de crianças nas quais<br />
os riscos passam a ser o prolongamento da<br />
diarréia e a conseqüente desnutrição. Bahn<br />
et al (2) encontraram aumento significativo da<br />
mortalidade de crianças quando a diarréia persistiu<br />
por período superior a 14 dias. Nos países<br />
em desenvolvimento a diarréia aguda evolui<br />
para persistente em 8 a 20% enquanto que nos<br />
países desenvolvidos esse número não ultrapassa<br />
5%. (14) Estudo realizado no Nordeste do<br />
Brasil, (9) detectaram evolução para diarréia persistente<br />
em 8% de 189 crianças portadoras de<br />
diarréia aguda. Nos países em desenvolvimento,<br />
62% dos óbitos infantis relacionados por<br />
diarréia devem-se à diarréia persistente, e principalmente<br />
em lactentes menores de 1 ano de<br />
idade. Outro estudo realizado em áreas metropolitanas<br />
do sul do Brasil, (12) a diarréia persistente<br />
foi responsável por 62% das mortes por<br />
diarréia, ao passo que a enfermidade diarréica<br />
aguda e a disenteria constituíram 28% e 10%,<br />
respectivamente.<br />
Fatores de risco<br />
A diarréia persistente é resultante de complexas<br />
interações entre hospedeiro, agentes enteropatogênicos<br />
e ambiente. (4,10,11) Os mais importantes<br />
são:<br />
1. Características do hospedeiro: lactentes, principalmente<br />
menores de 1 ano, desnutrição e<br />
função imunitária deficiente.<br />
2. Infecções prévias: o risco para o desenvolvimento<br />
de DP está aumentado em 2 a 4 vezes<br />
nos dois meses seguintes a um episódio<br />
diarréico.<br />
3. Desmame precoce e introdução recente de<br />
leite animal na dieta: o desmame precoce,<br />
em condições ambientais desfavoráveis, pode<br />
levar a introdução de alimentos contaminados<br />
e nutricionalmente inadequados, como<br />
o leite de vaca, propiciando as condições favoráveis<br />
para o prolongamento do episódio<br />
diarréico. O leite de vaca, além do risco de<br />
sensibilização de sua proteína, aumentando<br />
a permeabilidade intestinal, tem elevado teor<br />
de lactose e alta osmolaridade.<br />
4. Patógenos isolados: os principais agentes envolvidos<br />
no prolongamento da diarréia aguda<br />
são Escherichia coli enteropatogênica (EPEC),<br />
Escherichia coli enteroagregativa (EAggEC),<br />
Shigella, Salmonella, Cryptosporidium, Giardia<br />
lamblia e Rotavírus. No Brasil, inúmeros estudos<br />
demonstraram a predominância da EPEC<br />
como o agente mais freqüentemente isolado<br />
em menores de 1 ano de idade. (4)<br />
5. Uso de drogas na fase aguda da síndrome<br />
diarréia, como antimicrobianos que alteram<br />
a microflora intestinal e drogas que diminuem<br />
o peristaltismo intestinal, ambas favorecendo<br />
a ocorrência de sobrecrescimento<br />
bacteriano no intestino delgado. (10)<br />
72<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Tópicos em gastroenterologia pediátrica<br />
6. Presença de diarréia sanguinolenta (disenteria),<br />
febre, vômitos, alta freqüência de evacuações<br />
e desidratação durante o episódio<br />
diarréico agudo também são fatores comprovadamente<br />
relacionados ao prolongamento<br />
da diarréia aguda. (10)<br />
Fisiopatogenia<br />
A presença do agente infeccioso no intestino<br />
delgado ou cólon ocasiona alterações anatômicas<br />
e funcionais do tubo digestório:<br />
1. Secreção de água e eletrólitos, levando aos<br />
distúrbios hidroeletrolíticos e metabólicos.<br />
2. Lesão da mucosa intestinal, ocasionando:<br />
a) má-absorção dos hidratos de carbono e conseqüentemente<br />
intolerância aos dissacarídeos<br />
(lactose, sacarose e maltose) e nos quadros<br />
mais graves também aos monossacarídeos,<br />
b) aumento da permeabilidade intestinal, que<br />
facilita a absorção das proteínas da dieta e a<br />
translocação bacteriana, motivando alergias<br />
alimentares, principalmente às proteínas do<br />
leite de vaca e soja, e sepse, respectivamente.<br />
3. Sobrecrescimento bacteriano no intestino<br />
delgado provocando a desconjugação dos sais<br />
biliares e conseqüentemente lesão da mucosa<br />
com perda da permeabilidade intestinal e secreção<br />
de água e eletrólitos, além da máabsorção<br />
das vitaminas lipossolúveis e de<br />
gorduras, facilitando o agravo nutricional.<br />
Manifestações clínicas<br />
As características do processo diarréico são semelhantes<br />
a um processo de diarréia aguda, o<br />
qual se perpetua, agora associado a um quadro<br />
de má-absorção dos nutrientes, provocando<br />
importante agravo nutricional, independente do<br />
agente etiológico causal inicial. Geralmente são<br />
lactentes de baixa idade e com interrupção<br />
precoce ou ausência de aleitamento natural,<br />
com sintomas discretos ou quadros graves de<br />
desidratação, acidose metabólica, desnutrição<br />
importante e conseqüente comprometimento da<br />
imunidade, elevando a morbidade, devido ao<br />
risco de sepse.<br />
Diagnóstico<br />
O diagnóstico sindrômico da DP é clínico. São<br />
fundamentais anamnese e exame físico detalhados.<br />
Caracterizar o episódio inicial da diarréia<br />
aguda, sua duração e as repercussões no<br />
estado geral, no apetite, no estado de hidratação<br />
e na condição nutricional do paciente, através<br />
das medidas antropométricas. Conhecer o histórico<br />
alimentar desde o nascimento é primordial<br />
assim como as medicações utilizadas ao<br />
longo do curso da doença.<br />
Exames subsidiários são importantes para prevermos<br />
a evolução clínica do paciente e garantir<br />
um manejo dietético adequado. São eles:<br />
a) coprocultura e protoparasitológico de fezes,<br />
b) provas de absorção intestinal: teste D-xilose<br />
para avaliar a integridade da mucosa intestinal,<br />
testes de tolerâncias aos hidratos de carbono,<br />
avaliação da absorção de gorduras pelo<br />
esteatócrito ou Van de Kamer e das perdas<br />
protéicas pela dosagem da alfa-1-anti-tripsina<br />
fecal, c) biópsias do intestino delgado e do reto<br />
permitem o diagnóstico do grau de atrofia<br />
vilositária e de colite (alérgica ou infecciosa),<br />
respectivamente.<br />
Tratamento<br />
O tratamento baseia-se na manutenção do estado<br />
de hidratação e adequado suporte<br />
nutricional. (3,7)<br />
A prevenção da desidratação obtém-se com a<br />
utilização das soluções de reidratação oral. Devese<br />
ter atenção à correção da desidratação,<br />
acidose metabólica, anormalidades eletrolíticas<br />
e hipoglicemias, bem como ao tratamento de<br />
infecções concomitantes quando presentes.<br />
O manejo dietético apropriado permanece<br />
a base de um resultado com sucesso. Orienta-se<br />
a manutenção do aleitamento materno e nas<br />
crianças em aleitamento artificial, utilizamos<br />
fórmulas lácteas adequadas isentas de lactose e<br />
nos casos mais graves fórmulas semi-elementares<br />
(sem lactose e com proteínas parcialmente<br />
hidrolisadas). Em 17% dos casos as crianças<br />
podem também intolerar essas fórmulas, quan-<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 73
Tópicos em gastroenterologia pediátrica<br />
do faz-se necessário o uso de fórmulas elementares<br />
(aminoácidos puros).<br />
Devemos manter hospitalizados os pacientes<br />
considerados pertencentes a grupos de riscos,<br />
ou seja, quando estão presentes duas ou mais<br />
das seguintes características: menores de 12<br />
meses idade, desidratação moderada ou grave,<br />
acidose metabólica, desnutrição grave ou<br />
moderada, recidivas freqüentes de desidratação,<br />
infecção sistêmica associada. Nesses pacientes<br />
é comum a impossibilidade da alimentação<br />
por via oral devido anorexia severa,<br />
portando está indicado a administração das<br />
fórmulas semi-elementares ou elementares<br />
através de sonda enteral. A nutrição parenteral<br />
está indicada somente no fracasso comprovado<br />
da anterior.<br />
A utilização de fórmulas infantis industrializadas<br />
amenizam a deficiência seletiva de<br />
micronutrientes, como ferro, zinco e vitamina<br />
A, que podem ocorrer durante o curso da<br />
terapia, limitando o apetite e o ganho de peso<br />
e diminuindo a resistência do hospedeiro às<br />
infecções. (3)<br />
Recentemente, vários estudo tem demonstrado<br />
redução na duração e remissão da doença<br />
diarréica com a suplementação oral de zinco<br />
na dose de 1-2mg/Kg/dia por 15 dias. (5)<br />
Antimicrobianos estão indicados somente para<br />
o tratamento específico de infecções extra-intestinais<br />
nos casos de disenteria suspeitos de<br />
shigelose, sendo a escolha do antimicrobiano<br />
de acordo coma sensibilidade local da Shiguella<br />
e nas infecções sistêmicas associadas. (7)<br />
O uso de drogas anti-diarréicas está proscrito,<br />
pois podem agravar o quadro facilitando a ocorrência<br />
de sobre-crescimento bacteriano no<br />
intestino delgado.<br />
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74<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Tópicos em gastroenterologia pediátrica<br />
Refluxo<br />
Gastroesofágico<br />
NILZA MEDEIROS PERIN<br />
O refluxo gastroesofágico (RGE) é uma das queixas<br />
mais freqüentes em consultórios pediátricos.<br />
É definido como a passagem involuntária do<br />
conteúdo gástrico para o interior do esôfago,<br />
sendo um fenômeno fisiológico que ocorre várias<br />
vezes ao dia. É apenas um termo descritivo<br />
para um fenômeno muito comum e que ocorre<br />
em todos os indivíduos. Os episódios de RGE<br />
ocorrem principalmente devido ao relaxamento<br />
transitório do esfíncter esofágico inferior (EEI).<br />
Entretanto, outros mecanismos podem ocorrer<br />
tais como: tônus basal diminuído no EEI e abertura<br />
prolongada do EEI durante a deglutição.<br />
O RGE fisiológico refere-se à presença de refluxo<br />
em crianças saudáveis que vomitam ou que<br />
regurgitam e que não apresentam complicações.<br />
Neste grupo estão os “regurgitadores felizes”.<br />
Vômitos recorrentes estão presentes em<br />
50% dos lactentes nos primeiros três meses,<br />
em 60-70% dos lactentes aos quatro meses de<br />
idade e em 5-10% das crianças ao final do primeiro<br />
ano de vida. Na maioria das vezes os<br />
sintomas resolvem espontaneamente. Quando<br />
o RGE causa sintomas ou sinais sugestivos de<br />
complicações é chamado de doença do refluxo<br />
gastroesofágico (DRGE). Os sintomas incluem<br />
dor abdominal, dor retroesternal, pirose, recusa<br />
alimentar, irritabilidade, hiperextensão do<br />
pescoço durante as mamadas, hematêmese,<br />
anemia e baixo ganho pondero-estatural.<br />
É uma das causas de morte súbita e têm sido<br />
associado com doenças respiratórias crônicas<br />
como asma, estridor, tosse crônica, pneumonias<br />
recorrentes, e rouquidão. Lembrar sempre que<br />
complicações significativas se desenvolvem em<br />
10% das crianças não tratadas. As complicações<br />
podem ser esofágicas, decorrentes de<br />
esofagite ou extra-esofágicas. A inflamação<br />
esofágica crônica pode evoluir para estenoses<br />
de esôfago e substituição da mucosa esofágica<br />
distal por epitélio metaplásico, potencialmente<br />
maligno, conhecido como mucosa de Barrett.<br />
Manejo diagnóstico<br />
A investigação diagnóstica da criança com RGE<br />
depende da apresentação clínica. As crianças<br />
com RGE porém, sem sintomas de inflamação<br />
esofágica ou sintomas extra-esofágicos não requerem<br />
investigação. O entendimento das indicações<br />
e limitações dos diversos métodos diagnósticos<br />
é vital para se evitar que crianças com<br />
RGE sejam submetidas a testes inapropriados.<br />
Muitas vezes crianças recebem tratamento para<br />
RGE desnecessariamente, baseado em métodos<br />
diagnósticos inespecíficos. A dificuldade no<br />
diagnóstico e seguimento dos pacientes portadores<br />
da doença do RGE está no fato de que<br />
nenhum teste isolado é capaz de avaliar de<br />
forma global todos os aspectos e complicações<br />
relacionadas a esta doença. Os testes diagnósticos<br />
podem ser úteis para documentar a ocorrência<br />
do RGE, detectar complicações, estabelecer<br />
correlações entre RGE e sintomas, avaliar a<br />
terapêutica ou excluir outras causas para os sintomas.<br />
Cada teste é capaz de responder a uma<br />
ou a algumas dessas questões, sendo avaliáveis<br />
apenas quando indicados corretamente.<br />
Radiografia do esôfago contrastada: avalia a<br />
morfologia do esôfago, estômago e duodeno.<br />
Útil para investigar alterações anatômicas como<br />
hérnia de hiato, estenose pilórica, diafragma<br />
antral, etc. Indicada naqueles casos em que a<br />
história e o exame físico sugiram obstrução do<br />
trato gastrointestinal. Não é sensível nem específica<br />
para diagnóstico do RGE.<br />
PHmetria esofágica: útil para mensurar a freqüência<br />
e duração dos episódios de refluxo ácido<br />
e também sua relação temporal com os sintomas<br />
apresentados. As principais indicações são<br />
avaliação de sintomas atípicos, presença de sintomas<br />
extra-digestivos da DRGE, presença de RGE<br />
oculto, avaliação da resposta ao tratamento clínico<br />
em pacientes portadores de esôfago de<br />
Barrett ou de DRGE de difícil controle e avaliação<br />
pré e pós-operatória do paciente com DRGE.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 75
Tópicos em gastroenterologia pediátrica<br />
Deve ser realizada apenas nas situações em que<br />
proporciona alterações no diagnóstico ou no<br />
prognóstico do paciente. A monitorização do pH<br />
pode ser normal em muitos pacientes com<br />
DRGE, particularmente naqueles com complicações<br />
respiratórias.<br />
Endoscopia digestiva alta: não diagnostica o<br />
RGE em si, mas a esofagite a ele associada,<br />
e é o único método que avalia corretamente a<br />
esofagite erosiva ou ulcerada. Apresenta papel<br />
fundamental no diagnóstico diferencial com<br />
outras doenças pépticas e não-pépticas, como a<br />
úlcera duodenal e a esofagite eosinofílica, capazes<br />
de produzir sintomas semelhantes aos da<br />
DRGE. Permite também a identificação de<br />
estenose, hérnia de hiato, esôfago de Barrett e<br />
a coleta de biópsias para a histopatologia.<br />
Cintilografia: pode documentar a aspiração pulmonar<br />
do conteúdo gástrico através da demonstração<br />
do radionucleotídeo para o pulmão. Serve<br />
também para estudar o esvaziamento gástrico<br />
e detectar refluxo não ácido. O papel da<br />
cintilografia no manejo do RGE ainda não está<br />
bem definido.<br />
Impedanciometria intraluminal esofágica: é<br />
um novo método que detecta o movimento de<br />
fluidos e de ar no esôfago, independentemente<br />
do volume e do pH do material refluído. É capaz<br />
de detectar refluxos ácidos e não ácidos.<br />
Ainda não existe um padrão de normalidade<br />
para a faixa etária pediátrica.<br />
Tratamento conservador e<br />
alterações nos hábitos de vida<br />
a) Correções alimentares<br />
76<br />
Existem controvérsias sobre o papel do uso de<br />
fórmulas espessadas no tratamento da DRGE.<br />
A maioria dos estudos demonstrou que<br />
o espessamento da dieta diminui o volume e o<br />
número dos vômitos ou das regurgitações.<br />
Trabalhos recentes verificaram que fórmulas<br />
lácteas espessadas com amido também diminuem<br />
significativamente à exposição ácida<br />
esofágica documentada por pHmetria. Nos<br />
lactentes evitar refeições volumosas e altamente<br />
calóricas; nas crianças maiores, evitar alimentos<br />
ácidos, excessos de alimentos relaxadores<br />
do EEI (gorduras, chocolates, refrigerantes).<br />
b) Tratamento postural<br />
A posição prona apresenta um índice de RGE<br />
menor que a supina. Entretanto, sua relação<br />
com a morte súbita no recém-nascido gerou<br />
muitas controvérsias. Atualmente, recomendase,<br />
que para lactentes normais ou para aqueles<br />
com RGE leve, posição supina para dormir, e<br />
para aqueles com RGE grave, a Academia Americana<br />
de Pediatria recomenda a posição prona,<br />
desde que em superfícies firmes, para evitar o<br />
sufocamento.<br />
Tratamento medicamentoso<br />
De maneira geral, não se deve tratar o RGE com<br />
medicamentos, a menos que ele seja comprovadamente<br />
patológico. Não existe um<br />
algoritmo estabelecido para o tratamento do RGE<br />
em crianças, deve-se, sempre, levar em conta o<br />
custo-benefício e os efeitos colaterais de cada<br />
medicamento prescrito.<br />
a) Agentes procinéticos<br />
O embasamento teórico do uso das drogas<br />
procinéticas está no fato de elas aumentarem o<br />
tônus do EEI, melhorarem o “clearence”<br />
esofágico e o esvaziamento gástrico. Nas crianças<br />
a cisaprida apresenta a maior efetividade<br />
para tratamento de DRGE. No entanto, pelo risco<br />
potencial de arritmias cardíacas esta classe<br />
de medicamentos foi retirada do mercado. Os<br />
agentes procinéticos disponíveis atualmente são<br />
a metoclopramida, domperidona e bromoprida.<br />
Entretanto, não existem evidências suficientes<br />
de que estas drogas procinéticas sejam eficazes<br />
para tratamento de DRGE na população<br />
pediátrica.<br />
b) Antiácidos<br />
Neutralizam a acidez gástrica. Podem ser<br />
utilizados para alívio dos sintomas por curto<br />
período. Tratamento crônico não está indicado.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Tópicos em gastroenterologia pediátrica<br />
c) Inibidores da secreção ácida<br />
Antagonistas H 2<br />
São drogas eficazes em diminuir a acidez gástrica.<br />
As falhas terapêuticas podem ser devidas às<br />
doses usadas, que deveriam ser maiores nas<br />
crianças. Doses de até 10mg/kg/dia divididas em<br />
duas ou três vezes tem sido recomendadas.<br />
Taquifilaxia ou tolerância pode ocorrer tanto em<br />
adultos quanto em crianças.<br />
Bloqueador de Bomba de Prótons (BBP)<br />
Reduzem drasticamente a secreção ácida<br />
gástrica e podem ser utilizados como primeira<br />
escolha ou nos casos que não responderam ao<br />
tratamento com bloqueador H 2 . Atualmente<br />
somente dois BBP foram aprovados para uso<br />
em crianças, omeprazol e lanzoprazol.<br />
Correção cirúrgica<br />
Indicada nos casos de DRGE com falência persistente<br />
do tratamento clínico, pacientes com risco<br />
de vida ou de clara relação com sintomatologia<br />
respiratória importante, hérnia de hiato, esofagite<br />
de difícil controle e Esôfago de Barrett.<br />
A fundoplicatura de Nissen é o procedimento antirefluxo<br />
mais utilizado. Percentual de recidiva de<br />
3,5-35% dos casos.<br />
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Nutr, 2007; 44(1):35-40.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 77
Tópicos em gastroenterologia pediátrica<br />
78<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Como orientar a alimentação<br />
e nutrição em situações de:<br />
Disfagia<br />
GUILHERME MARIZ MAIA<br />
O termo disfagia pode se referir tanto à dificuldade<br />
de iniciar a deglutição quanto à sensação<br />
de que alimentos sólidos e/ou líquidos estão<br />
retidos de algum modo na sua passagem para<br />
o estômago. Disfagia, portanto, é a percepção<br />
de que há um impedimento à passagem<br />
do material deglutido. A deglutição é um processo<br />
controlado pelo centro de deglutição na<br />
medula e pelo esôfago médio e distal por um<br />
reflexo peristáltico predominantemente autônomo<br />
e coordenado pelo sistema nervoso entérico<br />
incrustado na parede esofágica. A deglutição normal<br />
envolve uma complexa série de contrações<br />
neuromusculares voluntária e involuntária, que<br />
avança da boca ao estômago. A deglutição pode<br />
ter suas fases divididas em, estágio orofaríngeo<br />
e estágio esofageano.<br />
Estágio orofaringeano<br />
O estágio orofaríngeo da deglutição começa com<br />
a contração da língua e músculos estriados da<br />
mastigação. Os músculos trabalham de uma<br />
maneira coordenada para misturar o bolo alimentar<br />
com a saliva e impulsioná-lo da cavidade<br />
anterior da boca até a orofaringe, onde é<br />
acionado um reflexo involuntário de deglutição.<br />
Na orofaringe posterior, ocorre uma sucessiva<br />
e complexa contração e relaxamento da musculatura.<br />
O palato mole se eleva para fechar a<br />
nasofaringe e o músculo supra-hióide puxa a<br />
laringe para frente e para cima. A epiglote se<br />
move para baixo cobrindo a passagem de ar<br />
enquanto os músculos estriados da faringe<br />
movem o bolo alimentar passando para o<br />
músculo cricofaríngeo.<br />
Estágio esofageano<br />
O alimento é impulsionado da faringe para<br />
o esôfago, contrações involuntárias de músculos<br />
esqueléticos do esôfago superior forçam<br />
o bolo alimentar para o esôfago médio<br />
e inferior.<br />
A medula controla este reflexo involuntário da<br />
deglutição, entretanto deglutição voluntária<br />
pode ser iniciada através do córtex cerebral nesta<br />
fase. O esfíncter esofagiano inferior se relaxa no<br />
início da deglutição e persiste relaxado até a<br />
passagem do bolo alimentar para o estômago.<br />
Isto pode levar de 8 a 20 segundos de contração<br />
para o bolo chegar ao estômago.<br />
Fisiopatologia<br />
Doenças orgânicas podem ser diagnosticadas<br />
tanto no início do reflexo orofaríngeo<br />
como na propulsão do bolo alimentar através<br />
do esôfago.<br />
Diagnóstico diferencial<br />
da disfagia<br />
Disfagia orofaríngea<br />
➢ Doença Neuromuscular<br />
• Doenças do sistema nervoso central<br />
Acidente vascular cerebral<br />
Tumor cerebral<br />
• Doenças degenerativas<br />
Esclerose múltipla<br />
Esclerose lateral amiotrófica<br />
➢ Pós Infecciosa<br />
•Poliomielite<br />
• Sífilis<br />
➢ Sistema Nervoso Periférico<br />
• Neuropatia periférica<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 79
Como orientar a alimentação e nutrição em situações de:<br />
➢ Miopatias<br />
•Poliomiosites<br />
• Dermatomiosites<br />
➢ Lesões Obstrutivas<br />
•Tumor<br />
• Massa de mediastino anterior<br />
• Ressecção cirúrgica<br />
•Trauma<br />
Disfagia Esofageana<br />
➢ Doenças Neuromusculares<br />
• Acalásia<br />
➢ Desordens Motoras<br />
• Espasmo esofageano difuso<br />
• Esfíncter esofageano inferior hipertensivo<br />
➢ Lesões Obstrutivas<br />
➢ Lesões Estruturais Intrínsicas<br />
•Tumor<br />
➢ Estreitamento<br />
• Doença péptica<br />
• Induzido por radiação<br />
• Induzido por medicação<br />
• Induzido por produtos químicos<br />
➢ Anel Esofageano Inferior<br />
História<br />
Pacientes que têm disfagia podem apresentar<br />
uma variedade de queixas, mas normalmente<br />
relatam tosse ou engasgo, sensação anormal de<br />
que o alimento ficou preso na parte posterior<br />
da garganta ou na parte superior do tórax enquanto<br />
eles tentam engolir.<br />
Uma cuidadosa condução da história do paciente,<br />
pode permitir que o médico identifique<br />
de 80% a 85% das causas de disfagia.<br />
Questões específicas sobre instalação, duração<br />
e intensidade da disfagia e a variedade de sintomas<br />
associados, vão colaborar para o diagnóstico<br />
diferencial entre uma patologia específica<br />
ou alterações anatômicas e fisiopatologias<br />
de diagnósticos correlatos.<br />
80<br />
Sintomas associados e possíveis etiologias<br />
da disfagia<br />
Condição<br />
Disfagia<br />
Progressiva<br />
Disfagia Súbita<br />
Dificuldade inicial<br />
em deglutir<br />
Alimento preso<br />
após deglutir<br />
Tosse<br />
• Começo<br />
Deglutição<br />
• Tarde Deglutição<br />
Perda de Peso<br />
• Com<br />
Regurgitação<br />
Sintomas<br />
Intermitentes<br />
Disfagia com Dor<br />
Dor piorada com:<br />
• Somente<br />
alimentos sólidos<br />
• Líquidos e<br />
sólidos<br />
Diagnóstico<br />
a considerar<br />
Disfagia<br />
neuromuscular<br />
Disfagia Obstrutiva<br />
Disfagia Orofaringea<br />
Disfagia Esofageana<br />
Disfagia<br />
Neuromuscular<br />
Disfagia Obstrutiva<br />
Acalásia<br />
Espasmo Esofageano<br />
Difuso<br />
Esofagite<br />
• Infecção –<br />
Herpes simples<br />
• Monília<br />
Disfagia Obstrutiva<br />
Disfagia<br />
Neuromuscular<br />
A cuidadosa anamnese pode responder a duas<br />
importantes questões:<br />
1. A disfagia é de natureza orofaríngea ou<br />
esofageana?<br />
2. É causada por obstrução mecânica ou distúrbio<br />
motilidade neuromuscular?<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Como orientar a alimentação e nutrição em situações de:<br />
Avaliação laboratorial<br />
A avaliação laboratorial inicial deve se limitar<br />
ao estudo específico do diagnóstico diferencial<br />
após completa história e exame físico.<br />
Exame de sangue completo para afastar doença<br />
infecciosa ou condição inflamatória. Estudo da<br />
função da Tireóide pode detectar hipo ou<br />
hipertireoidismo associado a causas de disfagia.<br />
Outros estudos devem ser baseados especificamente<br />
na condição clínica.<br />
Estudos especiais<br />
Embora uma boa anamnese e exame físico<br />
possam identificar a etiologia da disfagia em<br />
muitos pacientes, alguns exames podem ser<br />
indicados para confirmar o diagnóstico. Algumas<br />
especialidades médicas estão envolvidas na<br />
condução desta investigação. Há um destaque<br />
para o radiologista e o gastroenterologista.<br />
Nasofaringoscopia<br />
Nasofaringoscopia é particularmente usado na<br />
avaliação de pacientes com disfagia orofaríngea.<br />
Este procedimento facilita identificação de massas<br />
e lesões. É de grande ajuda na identificação<br />
da laringe sensitiva ao contato.<br />
Esofagograma<br />
O esofagograma é geralmente o primeiro passo<br />
na avaliação do paciente com disfagia, especialmente<br />
se existe suspeita de lesão obstrutiva.<br />
Ele identifica lesões estruturais intrínsicas e<br />
extrínsicas, mas falta precisão na identificação<br />
da natureza da lesão obstrutiva.<br />
O estudo baritado avalia a motilidade melhor<br />
que a endoscopia, tem custo reduzido e é de poucas<br />
complicações, entretanto é de difícil realização<br />
em pacientes debilitados ou não cooperativos.<br />
Endoscopia digestiva alta<br />
A endoscopia oferece o melhor acesso a mucosa<br />
esofágica. Massas ou outras lesões identificadas<br />
através do estudo baritado, podem ter sem estudo<br />
anátomo-patológico ajudado pelo exame.<br />
Em paciente com disfagia aguda, a endoscopia<br />
pode diretamente remover o bolo alimentar<br />
impactado e dilatar o estreitamento. A endoscopia<br />
tem ainda o benefício adicional na<br />
detectação de lesões erosivas e processos inflamatórios<br />
ou infecção da mucosa esofágica.<br />
Videofluoroscopia da deglutição<br />
Importante método diagnóstico que avalia<br />
presença, natureza e severidade de problemas<br />
de deglutição orofaríngea.<br />
Manometria<br />
A Manometria avalia a função motora do esôfago<br />
e está indicado principalmente quando há evidência<br />
de normalidade no estudo baritado ou<br />
na endoscopia digestiva. Há 3 tipos de contração:<br />
as primárias, associadas à deglutição, que<br />
se iniciam na faringe; as secundárias, que possuem<br />
função de depuração esofágica e são<br />
deflagradas pela presença de conteúdo no<br />
lúmen do órgão; e as terciárias, que são contrações<br />
não-coordenadas, espontâneas, sem função<br />
peristáltica.<br />
PHmetria esofágica de 24 horas<br />
A grande vantagem deste exame é avaliar o<br />
paciente em condições mais fisiológicas e por<br />
longos períodos. Ao mesmo tempo, é possível<br />
muitas vezes estabelecer a relação temporal<br />
entre o refluxo ácido e os sintomas.<br />
Manejo da disfagia<br />
O manejo da disfagia requer uma abordagem<br />
individualizada e deve incluir avaliação neurológica,<br />
respiratória, nutricional e possivelmente<br />
manejo gastroenterológico.<br />
Seis áreas afins identificadas devem ser consideradas<br />
no manejo da disfagia em lactentes e<br />
crianças.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 81
Como orientar a alimentação e nutrição em situações de:<br />
• Normalização da postura e posição<br />
• Adaptação da alimentação e equipamentos<br />
de alimentação<br />
•Terapia oromotora<br />
• Suporte nutricional<br />
• Manejo de desordens associadas<br />
Um time de profissionais deve assistir os pais e<br />
crianças objetivando uma alimentação prazerosa<br />
apropriada ao bom crescimento e desenvolvimento.<br />
<strong>Referências</strong> <strong>Bibliográficas</strong><br />
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William Ower BMJ. 2001; 323: 850-853.<br />
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gastrointestinal endoscopy: a medical position<br />
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Gastroenteroly and Nutrition. J Pediatr Gastroenterol<br />
Nutr, 1996; 23:107-10.<br />
Alergia Alimentar e<br />
Manejo Terapêutico<br />
Nutricional<br />
MARILEISE DOS SANTOS OBELAR<br />
Introdução<br />
A Alergia alimentar (AA) é uma reação adversa,<br />
imunologicamente mediada, decorrente da exposição<br />
a alérgenos alimentares. Ocorre em indivíduos<br />
suscetíveis e apresenta ampla variabilidade<br />
de manifestações clínicas dependentes de<br />
características individuais, do tipo de alimento e<br />
do tipo de mecanismo fisiopatológico envolvidos<br />
na reação. Os sinais e sintomas desencadeados<br />
no indivíduo, devem ser reproduzíveis frente a<br />
um estímulo, antígeno alimentar específico, em<br />
uma dose tolerada por pessoas normais.<br />
A prevalência de Alergia Alimentar parece<br />
estar aumentando, entretanto é necessário<br />
um melhor reconhecimento da doença com o<br />
estabelecimento de critérios diagnósticos adequados,<br />
para evitar diagnósticos errôneos. Em<br />
crianças tem sido relatada uma prevalência de<br />
até 8% que declina para aproximadamente 2%<br />
a vida adulta. Pacientes com doenças atópicas<br />
apresentam maior incidência de AA, sendo<br />
encontrada em até 30% dos pacientes com<br />
Dermatite Atópica e 5% dos pacientes portadores<br />
de asma.<br />
A proteína do leite de vaca é o alérgeno alimentar<br />
mais frequentemente envolvido. A<br />
prevalência da Alergia a Proteína do Leite de<br />
Vaca (APLV) é de 0,3 a 7,5% na população geral,<br />
ocorrendo em 39% das crianças com alergia<br />
alimentar no primeiro ano de vida, 27% aos<br />
3 anos e 8% aos 6 anos de idade.<br />
As reações de hipersensibilidade alimentar podem<br />
ser IgE ou não IgE mediadas, ou ainda<br />
desencadeadas por mecanismos imunológicos<br />
mistos.<br />
82<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Como orientar a alimentação e nutrição em situações de:<br />
Fisiopatologia, tolerância<br />
alimentar e alergenicidade,<br />
manifestações clínicas<br />
O trato digestório contribui para o desenvolvimento<br />
de tolerância a muitas proteínas as quais<br />
é exposto, reduzindo a exposição sistêmica destas,<br />
por meio de suas barreiras imunológicas e<br />
não imunológicas.<br />
As reações de hipersensibilidade ocorrem quando<br />
existem anormalidades nos mecanismos de<br />
indução ou de manutenção de tolerância<br />
imunológica, há falha na capacidade de reconhecer<br />
e ignorar antígenos alimentares. Entre<br />
os vários fatores envolvidos no desenvolvimento<br />
da AA destacando-se a predisposição genética,<br />
a flora intestinal do hospedeiro, a exposição<br />
precoce aos alérgenos alimentares, sua quantidade,<br />
freqüência e manipulação, o tempo decorrido<br />
entre a exposição ao alérgeno e o aparecimento<br />
dos sintomas, bem como o grau de<br />
alergenicidade de várias proteínas alimentares<br />
específicas.<br />
Embora tenhamos contato com muitos alérgenos<br />
alimentares, apenas alguns, que apresentam características<br />
físico-químicas favoráveis, são<br />
freqüentemente relacionados com o desenvolvimento<br />
da AA. Os principais alérgenos alimentares<br />
são identificados como classe 1 de<br />
alérgenos. São glicoproteínas hidrosolúveis, com<br />
peso molecular que varia de 10 a 70 kD, estáveis<br />
ao calor que apresentam resistência aumentada<br />
à ação ácida e de enzimas proteolíticas.<br />
São identificadas como alérgenos no leite de<br />
vaca, a α-S-1-caseína, a betacaseína, a alfalactoalbumina,<br />
a betalactoglobulina, a seroalbumina<br />
e a gamaglobulina bovinas. No amendoim as<br />
frações Ara 1, 2 e 3, homólogas à vicilina,<br />
conglutina e a glicina, comuns a outras<br />
leguminosas(soja). No ovo as glicoproteínas<br />
ovomucóide, ovoalbumina, ovotransferrina e<br />
lisozima são as mais comuns na clara de ovo.<br />
Nos peixes o principal antígeno identificado é a<br />
parvoalbumina e a tropomiosina no camarão.<br />
Várias reações cruzadas podem ser encontradas<br />
com relação aos alimentos, destacando-se as<br />
reações entre pólens e látex com frutas e legumes,<br />
que são decorrentes da presença das proteínas<br />
profilinas, tanto em pólens quanto em<br />
alimentos. Assim, o pólen do vidoeiro pode<br />
induzir a sensibilização do trato respiratório e<br />
resultar em sintomas orais de prurido a<br />
alérgenos classe 2 homólogos, que estão presentes<br />
na maçã ou cenoura cruas.<br />
A capacidade alergênica e a sensibilidade aos<br />
vários tipos de processamento dependem das<br />
características estruturais dos alérgenos, que podem<br />
apresentar epítopos lineares ou conformacionais,<br />
sendo os lineares mais associados a<br />
manifestações mais prolongadas, como da alergia<br />
à caseína do leite de vaca. O cozimento pode<br />
reduzir a alergenicidade de certas proteínas<br />
alimentares, inversamente, o aquecimento pode<br />
aumentar a alergenicidade de outras proteínas<br />
alimentares, através da indução de modificações<br />
covalentes que levam a novos antígenos ou<br />
melhoram a sua estabilidade.<br />
Nas crianças, a grande maioria das reações clínicas<br />
encontradas são desencadeadas como<br />
conseqüência de hipersensibilidade ao leite de<br />
vaca, ao ovo, a soja, ao trigo e ao amendoim,<br />
enquanto nos adultos o amendoim, as castanhas,<br />
o peixe e os frutos do mar são os alimentos<br />
mais comumente envolvidos.<br />
Nas reações de hipersensibilidade aos alimentos<br />
mediadas por IgE, ocorre a sensibilização<br />
numa primeira exposição aos alérgenos alimentares,<br />
havendo formação de anticorpos específicos<br />
da classe IgE, que em contatos posteriores<br />
determinarão a liberação de mediadores<br />
vasoativos, desencadeando a hipersensibilidade<br />
imediata, minutos ou horas após. As apresentações<br />
clínicas mais comuns deste tipo são: urticária,<br />
angioedema, anafilaxia gastrointestinal,<br />
Síndrome da Alergia Oral, prurido ocular e<br />
lacrimejamento, rash morbiliforme, congestão<br />
nasal e broncoespasmo e reações sistêmicas<br />
como anafilaxia com hipotensão e choque.<br />
Nas reações de hipersensibilidade não mediada<br />
por IgE as manifestações são mais tardias, estabelecendo-se<br />
em horas ou dias, e envolvem reações<br />
citotóxicas, mediadas por imunocomplexos<br />
e, mais freqüentemente, mediadas por<br />
células. Clinicamente, conseqüente a este último<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 83
Como orientar a alimentação e nutrição em situações de:<br />
mecanismo teremos a proctocolite, a enterocolite,<br />
a enteropatia e a dermatite de contato.<br />
Nas reações mistas estão incluídas as manifestações<br />
decorrentes de mecanismos mediados por<br />
IgE, com participação de linfócitos T e de<br />
citocinas pró-inflamatórias, como a esofagite e<br />
a gastroenterite eosinofílica, a dermatite atópica<br />
e a asma.<br />
Diagnóstico<br />
Apesar da história clínica isolada, ser confirmada<br />
com um enfrentamento positivo, duplo-cego<br />
controlado por placebo, em apenas 30-40% dos<br />
casos, ela é essencial para a avaliação clínica e<br />
a investigação. É necessária a obtenção de uma<br />
anamnese detalhada, que identifique o alérgeno<br />
alimentar desencadeador e os sintomas, o risco<br />
de atopia, bem como o período de tempo entre<br />
a ingestão e o aparecimento dos sintomas.<br />
A base para o diagnóstico de AA encontra-se na<br />
associação das seguintes condições. Primeiro, o<br />
alimento suspeito de desencadear manifestações<br />
clínicas, confirmado ou não por exames subsidiários,<br />
é excluído totalmente da dieta do paciente,<br />
ocorrendo recuperação clínica do mesmo.<br />
Posteriormente, há o reaparecimento dos<br />
sintomas e sinais clínicos quando a proteína<br />
alergênica é novamente ingerida pelo paciente,<br />
que é o teste de desencadeamento positivo.<br />
Os testes de hipersensibilidade, para anticorpos<br />
IgE-específicos, prick (testes percutâneos) ou<br />
RAST (séricos, semiquantitativos), ou ainda o Cap<br />
System (séricos, mais quantitativos), podem auxiliar<br />
na identificação de alérgenos.<br />
Tratamento dietético<br />
O tratamento da alergia alimentar é essencialmente<br />
nutricional. Consiste basicamente na<br />
retirada dos alimentos alergênicos da alimentação<br />
da criança. A exclusão do alimento reconhecido<br />
ou supostamente envolvido deve ser<br />
total, incluindo os produtos dele derivados,<br />
assim como qualquer preparação envolvendo a<br />
presença do alérgeno alimentar.<br />
84<br />
Os alimentos eliminados devem ser posteriormente<br />
testados por meio das provas de<br />
desencadeamento.<br />
É muito importante a correta identificação do<br />
alimento envolvido, assim como a avaliação do<br />
impacto da sua retirada na alimentação e estado<br />
nutricional da criança, e providências quanto<br />
a sua substituição. De maneira geral, deve-se<br />
evitar o uso de dietas desnecessárias ou muito<br />
restritivas, já que na população pediátrica a<br />
maioria dos casos de AA é causada pela proteína<br />
do leite de vaca. É fundamental realizar a<br />
avaliação do estado nutricional e planejar a<br />
adequação da ingestão de nutrientes, conforme<br />
as atuais recomendações de necessidades<br />
nutricionais.<br />
Nos bebês que alimentam-se com leite materno,<br />
este deve ser mantido, com a retirada completa<br />
da proteína alergênica da dieta da mãe,<br />
uma vez, como demonstrado em alguns estudos,<br />
que a proteína β-lactoglobulina pode ser<br />
detectada no leite de 95% das mães que estão<br />
amamentando.<br />
Naquelas crianças em aleitamento artificial,<br />
deve-se assegurar substituições alimentares<br />
nutricionalmente completas, palatáveis e seguras,<br />
sendo fundamental o uso de fórmulas substitutas,<br />
principalmente nas menores de 2 anos<br />
de idade, com o objetivo de garantir o adequado<br />
crescimento e desenvolvimento da criança.<br />
Nestes casos o Consenso da Sociedade Européia<br />
de Alergia e Imunologia Clínica Pediátrica e a<br />
Sociedade Européia de Gastroenterologia<br />
Hepatologia e Nutrição Pediátrica (ESPACI/<br />
ESPGHAN), recomenda para o tratamento e prevenção<br />
da Alergia Alimentar o uso de fórmulas<br />
extensamente hidrolisadas (FEH) como primeira<br />
opção de tratamento. Enfatiza que o leite de<br />
outros mamíferos, a exemplo da ovelha ou da<br />
cabra, não são recomendados como substitutos,<br />
devido ao risco bastante elevado de apresentação<br />
de reação cruzada com a proteína do<br />
leite de vaca, mais de 90% dos casos. Os produtos<br />
parcialmente hidrolisados, com moderada<br />
redução da alergenicidade, também não são<br />
recomendados, pois apresentam ainda grande<br />
quantidade da proteína β-lactoglobulina, de<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Como orientar a alimentação e nutrição em situações de:<br />
elevada alergenicidade. Finalmente, as fórmulas<br />
baseadas em proteína íntegra isolada de soja,<br />
não devem ser recomendadas para o tratamento<br />
inicial, especialmente de lactentes jovens.<br />
Uma vez que, deve ser considerada a possibilidade<br />
de haver também reação alérgica à proteína<br />
da soja em pelo menos 30% dos casos,<br />
pois esta proteína pode promover a reação inflamatória<br />
da mucosa intestinal, com aumento<br />
da sua permeabilidade e conseqüentemente penetração<br />
de macromoléculas. Assim, para o tratamento<br />
da APLV, os produtos recomendados<br />
são aqueles que apresentam alergenicidade extremamente<br />
reduzida, os baseados nas proteínas<br />
extensamente hidrolisadas, ou as misturas<br />
de aminoácidos. O Comitê de Nutrição da Academia<br />
Americana de Pediatria (AAP-CN) fez recomendações<br />
semelhantes com o adicional da<br />
recomendação das fórmulas de proteína isolada<br />
de soja para o tratamento inicial da APLV<br />
mediada por IgE.<br />
A ESPACI define como FEH aquelas baseadas em<br />
proteínas que sofreram hidrólise enzimática a<br />
fragmentos suficientemente pequenos para não<br />
induzir reação alérgica em crianças sensibilizadas,<br />
toleradas clinicamente por 90% (com 95%<br />
de intervalo de confiança) dos lactentes com<br />
Alergia a Proteína do Leite de Vaca, comprovada,<br />
também conforme AAP-CN. Porém, as FEH<br />
de substituição não são totalmente isentas de<br />
proteína alergênica, e tem sido testadas quanto<br />
a presença de indicador de alergenicidade, a<br />
betalactoglobulina, demonstrando a detecção de<br />
pequenas quantidades residuais com algum<br />
potencial alergênico. Entretanto a quantidade<br />
de proteína antigênica destas é ainda milhões<br />
de vezes menor que nas fórmulas de leite de<br />
vaca.<br />
Nos casos mais graves ou que envolvem mais<br />
de um alimento, uma restrição ampla pode ser<br />
necessária, por pelo menos 4 a 6 semanas, com<br />
utilização exclusiva de fórmulas semi-elementares<br />
ou elementares, quando a história e os<br />
testes laboratoriais falham na identificação dos<br />
potenciais alérgenos.<br />
Na alergia à proteína de múltiplos alimentos,<br />
geralmente mais de 5 alimentos, incluindo fórmulas<br />
à base de soja e FEH, há grande risco<br />
nutricional, uma vez que há o envolvimento de<br />
alimentos importantes para a nutrição da<br />
criança. Nesta situação a identificação precoce<br />
com a instituição da terapêutica adequada propicia<br />
boa resposta. Neste caso as fórmulas a<br />
base de aminoácidos sintéticos devido a sua<br />
maior redução da alergenicidade, totalmente<br />
hipoalergênicas, são consideradas seguras, e a<br />
melhor opção terapêutica.<br />
No manejo das alergias alimentares há contínua<br />
preocupação quanto a evitar a reexposição<br />
aos alérgenos alimentares. Isto envolve educação<br />
intensiva dos pais, extensiva a todas<br />
as pessoas envolvidas no cuidado da criança, e<br />
da própria criança quando em idade de compreensão.<br />
Uma das dificuldades freqüentemente<br />
encontrada está relacionada a leitura dos rótulos<br />
das embalagens dos alimentos. A Legislação<br />
ainda é inadequada a este respeito, não descrevendo<br />
claramente os ingredientes ou omitindo<br />
informação relacionada à presença de pequenas<br />
quantidades de conteúdo alergênico, sendo<br />
a causa, muitas vezes da permanência dos sintomas<br />
ou da ingestão acidental do alérgeno.<br />
Especial atenção deve também ser dada às<br />
crianças maiores, pois restrições sem a devida<br />
complementação podem causar diversas carências<br />
nutricionais. Um estudo conduzido na Escola<br />
Paulista, pela Gastroenterologia Pediátrica,<br />
evidenciou que as crianças que estavam em<br />
dietas restritivas devido a APLV, apresentavam<br />
atraso de crescimento e tinham menor ingestão<br />
protéico-energética e de cálcio, quando comparadas<br />
às crianças da mesma idade com dieta<br />
normal sem restrição.<br />
O seguimento destas crianças é muito importante<br />
com a avaliação periódica de registro de<br />
diário alimentar de 4 dias, envolvendo 1 dia de<br />
final de semana, anotações de qualquer manifestação<br />
associada à ingestão de alimentos específicos<br />
e monitorização do seu crescimento.<br />
O papel preventivo do pediatra na orientação<br />
alimentar, promoção do aleitamento materno e<br />
introdução adequada dos alimentos complementares,<br />
é muito importante, pois, aproximadamente<br />
20% das crianças com história familiar<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 85
Como orientar a alimentação e nutrição em situações de:<br />
de atopia apresentará Alergia à Proteína do Leite<br />
de Vaca, se alimentadas com fórmulas de leite<br />
de vaca, no primeiro ano de vida.<br />
A maioria das crianças com AA desenvolverá<br />
tolerância clínica até os 5 anos de idade. Assim,<br />
após um período de 6 meses a 1 ano de dieta<br />
de exclusão, deve-se realizar teste de provocação<br />
para verificar se a criança desenvolveu tolerância<br />
ao alimento excluído.<br />
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Doenças Infecciosas<br />
ELZA DANIEL DE MELLO<br />
86<br />
A boa nutrição é muito importante na doença,<br />
pois sabe-se que ela pode evitar complicações<br />
e amenizar a evolução da doença em questão.<br />
O estado nutricional de um indivíduo, por sua<br />
vez, resulta do balanço entre ingestão dos nutrientes<br />
e seu aproveitamento pelo organismo.<br />
Um bom estado nutricional, proveniente da<br />
ingestão de uma alimentação saudável, é fundamental<br />
para o adequado desenvolvimento e<br />
crescimento pôndero-estatural, além de ajudar<br />
a prevenir certas doenças como diabete melito,<br />
arteriosclerose, certos tipos de câncer e obesidade.<br />
Para que a nutrição se realize a contento, o<br />
organismo deve receber nutrientes específicos<br />
para cada função e em quantidades adequadas,<br />
a fim de que não ocorra desperdício, nem<br />
exigências aumentadas do trabalho metabólico<br />
para seu aproveitamento e excreção.<br />
A nutrição tem papel de destaque no crescimento,<br />
desenvolvimento, saúde e bem-estar da<br />
criança. A manutenção apropriada da nutrição<br />
ao longo da vida pode também prevenir, ou<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Como orientar a alimentação e nutrição em situações de:<br />
pelo menos adiar, o início de algumas doenças<br />
relacionadas à nutrição. E, finalmente, com a<br />
valorização da nutrição e o desenvolvimento de<br />
meios mais adequados de realizar a terapia<br />
nutricional, aumenta o número de doenças que<br />
exige uma intervenção nutricional específica, especialmente<br />
quando essa for precoce.<br />
O desafio para ser enfrentado para manter uma<br />
boa nutrição na infância é compatibilizar a oferta<br />
nutricional com as demandas dessa faixa<br />
etária, para que todo o potencial genético da<br />
pessoa possa ser desenvolvido. Não atingir este<br />
objetivo significa comprometer a saúde da criança<br />
e suas chances de sobrevida, influenciando<br />
também fortemente a saúde na vida adulta.<br />
O crescimento impõe elevadas demandas metabólicas<br />
durante toda a infância, principalmente<br />
na fase de lactente e na adolescência. Crescer<br />
não é apenas aumentar de tamanho. Quanto<br />
menor a criança, menor as reservas de nutrientes<br />
e menor o tempo de duração dessas reservas.<br />
O estado nutricional inadequado exerce impacto<br />
variável sobre a capacidade da criança<br />
recuperar-se de uma doença aguda, afetando<br />
principalmente as defesas imunológicas e a<br />
cicatrização de feridas, aumentando consideravelmente<br />
a morbidade e a mortalidade.<br />
A relação entre imunidade e fatores nutricionais<br />
é um aspecto muito importante, especialmente<br />
pelo fato de a dieta poder interferir na função<br />
e na modulação imune. A desnutrição é a<br />
causa mais comum de imunodeficiência secundária,<br />
principalmente em países pobres.<br />
Crianças desnutridas têm maiores taxas de<br />
mortalidade e morbidade, devido às doenças<br />
infecciosas, principalmente respiratórias e<br />
gastrointestinais.<br />
A desnutrição protéico-energética pode ser decorrente<br />
da condição sócio-econômica representada<br />
pela privação de alimentos, ou devido a<br />
doenças crônicas como neoplasias, doenças<br />
cardiorrespiratórias e do trato gastrointestinal.<br />
Em populações de baixa condição sócio-econômica,<br />
é bastante comum a concomitância desses<br />
fatores, contribuindo ainda mais para a<br />
gravidade da situação.<br />
A maneira de identificar uma criança desnutrida,<br />
tanto da forma clínica mais grave, como da<br />
subclínica, é através da avaliação nutricional.<br />
A avaliação nutricional é o instrumento diagnóstico,<br />
já que mede – de diversas maneiras –<br />
as condições nutricionais do organismo, determinadas<br />
pelos processos de ingestão, absorção,<br />
utilização e excreção de nutrientes, ou seja, a<br />
avaliação nutricional determina o estado<br />
nutricional, que é resultante do balanço entre a<br />
ingestão e a perda de nutrientes.<br />
Os métodos de avaliação do estado nutricional<br />
incluem dados antropométricos, resultados de<br />
testes bioquímicos, exame clínico, baseando-se<br />
em aspectos nutricionais, e da avaliação da<br />
ingestão dietética (abcd da avaliação<br />
nutricional).<br />
A interação entre nutrição e infecção aguda é<br />
particularmente importante nos países em desenvolvimento,<br />
onde a desnutrição preexistente<br />
pode aumentar a freqüência e a gravidade das<br />
infecções agudas podem precipitar a desnutrição.<br />
Os efeitos da infecção aguda sobre a nutrição<br />
e o metabolismo do hospedeiro assemelham-se<br />
aos de muitas outras condições de<br />
estresse e impedem, em grande parte, do<br />
patógeno causal. Além da gastrointestinais e da<br />
malária, as doenças infecciosas são extremamente<br />
heterogêneas em suas manifestações clínicas,<br />
embora diversas características nutricionais<br />
(anorexia, catabolismo, aumento da taxa de<br />
metabolismo basal, diminuição da atividade<br />
física e necessidades aumentadas de alguns<br />
micronutrientes) sejam comuns à maioria delas.<br />
Além das manifestações gerais, existem<br />
outros aspectos mais específicos de algumas<br />
doenças infecciosas que podem ter conseqüências<br />
nutricionais. A sepse, por exemplo, aumenta<br />
o gasto energético de 10 a 30%.<br />
Em relação à hospitalização, cabe salientar que<br />
a criança pode apresentar desnutrição, em diferentes<br />
graus, por ocasião da internação ou, o<br />
que não é raro, vir a desnutrir-se no hospital.<br />
Em ambas as situações, a desnutrição influi<br />
quase que diretamente na morbimortalidade.<br />
Vários fatores podem estar envolvidos no desenvolvimento<br />
da desnutrição por ocasião da<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 87
Como orientar a alimentação e nutrição em situações de:<br />
hospitalização, como os seguintes: (a) ingestão<br />
inadequada de nutrientes, em virtude de<br />
anorexia e de distúrbios do sistema digestório;<br />
(b) aumento da demanda de nutrientes causadas<br />
pelo hipermetabolismo desencadeado pela<br />
doença; e, (c) desnutrição preexistente associada<br />
às doenças de evolução crônica. Somente<br />
estando alerta a essas situações é que poderemos<br />
prevenir ou amenizar a desnutrição durante<br />
a hospitalização.<br />
O passo seguinte à avaliação nutricional consiste<br />
na terapia nutricional, que é o processo de fornecimento<br />
global das necessidades nutricionais.<br />
O tipo de terapia depende do tipo de doença, do<br />
ambiente e do estado de crescimento e desenvolvimento<br />
da criança.<br />
A terapia nutricional consistirá de: avaliação e<br />
classificação do estado nutricional; identificação<br />
das necessidades nutricionais e/ou déficits<br />
nutricionais específicos; planejamento da terapia<br />
nutricional e da sua progressão; e avaliação<br />
da efetividade da mesma.<br />
A terapia nutricional para uma criança pode<br />
significar, simplesmente, avaliação do estado<br />
nutricional, identificação da saúde nutricional<br />
adequada e, possivelmente, educação com relação<br />
aos hábitos alimentares que ajudarão a<br />
prevenir doença e assegurarão um crescimento<br />
e desenvolvimentos adequados. Já a terapia<br />
nutricional para a criança enferma e/ou hospitalizada<br />
é mais complexa, e significa mais do<br />
que simplesmente servir uma bandeja de refeições<br />
cinco a seis vezes por dia. Deve incluir<br />
uma avaliação adequada do consumo ou<br />
ingestão nutricional, manipulação da dieta,<br />
quando necessária, em relação à aceitação e à<br />
doença, provisão de terapia enteral e/ou<br />
parenteral, quando apropriada, e intervenção<br />
na forma de aconselhamento ou educação<br />
nutricional.<br />
Assim, as necessidades de nutrientes e de energia<br />
requeridas pelo organismo humano nos<br />
estados de saúde e de doença variam muito,<br />
devendo ser sempre consideradas. Muitas vezes,<br />
é preciso modificar a oferta de nutrientes,<br />
tanto em qualidade como em quantidade, para<br />
atender à demanda do organismo nas diversas<br />
88<br />
afecções, como sepse, insuficiências hepática e<br />
renal e na presença de neoplasias.<br />
A doença em questão é muito importante na<br />
prescrição nutricional, pois se ela está associada<br />
à presença de uma desnutrição prévia, vai interferir<br />
diretamente na escolha da terapia<br />
nutricional. Na sepse e no trauma observa-se<br />
claramente um aumento do gasto energético<br />
basal, com mobilização de gorduras e catabolismo<br />
do músculo esquelético. Os pacientes necessitarão<br />
de um maior suporte energético e protéico,<br />
especialmente se for desnutridos prévio.<br />
Tanto é importante a terapia nutricional na<br />
doença, que no “Guia alimentar para crianças<br />
menores de 2 anos” do Ministério da Saúde, o<br />
10º passo refere-se a este tema: “Estimular a<br />
criança doente e convalescente a se alimentar,<br />
oferecendo sua alimentação habitual e seus alimentos<br />
preferidos, respeitando a sua aceitação”.<br />
As crianças doentes têm menos apetite, por<br />
isso, devem ser estimuladas a se alimentar,<br />
sem, no entanto, serem forçadas a comer. Para<br />
garantir uma melhor nutrição e hidratação da<br />
criança doente, aconselha-se oferecer os alimentos<br />
de sua preferência, sob a forma de que<br />
a criança melhor aceite, e aumentar a oferta<br />
de líquidos. Para a criança com pouco apetite,<br />
oferecer um volume menor de alimentos por<br />
refeição e aumentar a freqüência de oferta de<br />
refeições ao dia. Para que a criança doente<br />
alimente-se melhor, é importante sentar-se ao<br />
lado dela na hora da refeição e ser mais flexível<br />
com horários e regras. No período de convalescença,<br />
o apetite da criança encontra-se<br />
aumentado. Por isso, recomenda-se aumentar<br />
a oferta de alimentos neste período, acrescentando<br />
pelo menos mais uma refeição nas 24<br />
horas. É fundamental que isso seja orientado<br />
pelo médico, já que as mães, de um modo<br />
geral, não valorizam muito a falta de apetite<br />
da criança durante a doença. A pouca ingestão<br />
de alimentos pelas crianças durante as doenças<br />
se deve a: (a) falta de apetite; (b) crença de<br />
que, nesse período, as crianças devem comer<br />
alimentos “mais leves”; (c) restrição de alimentos<br />
considerados prejudiciais; e (d) orientação<br />
médica inadequada.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Como orientar a alimentação e nutrição em situações de:<br />
Portanto, o manejo nutricional nas doenças infecciosas<br />
depende do estado nutricional prévio,<br />
da presença de doença crônica subjacente e da<br />
gravidade da doença. E, quanto mais comprometida<br />
a criança, mais rápida e eficiente deverá<br />
ser esta conduta. Deve-se estimular a ingestão<br />
de líquidos, o aumento do aporte protéico<br />
(relação calorias não protéicas: nitrogênio diminuída)<br />
e calorias. Geralmente este objetivo será<br />
alcançado a freqüência das refeições, pois é difícil<br />
aumentar o volume. Habitualmente aumenta-se<br />
a densidade calórica, na forma de suplementos,<br />
tanto “artesanais” – adição maior de óleo,<br />
açúcar, leite em pó – como industrializados.<br />
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64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 89
Como orientar a alimentação e nutrição em situações de:<br />
90<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Defesa profissional<br />
A Consulta Pediátrica<br />
EDUARDO DA SILVA VAZ<br />
A consulta pediátrica é sem dúvida o maior<br />
instrumento de acompanhamento do crescimento<br />
e desenvolvimento do ser humano. Infelizmente<br />
com a crescente mercantilização da<br />
medicina, através das operadoras de saúde, e<br />
da não valorização do profissional habilitado<br />
para executá-la, o Pediatra, pelos gestores em<br />
saúde pública, ele não tem tido o reconhecimento<br />
efetivo de seu valor. A Sociedade Brasileira<br />
de Pediatria através de ações junto ao<br />
setor público, tem lutado para garantir que a<br />
população de crianças e adolescentes brasileiros<br />
tenham acesso ao Pediatra. Ações junto a<br />
Associação Médica Brasileira e algumas operadoras,<br />
em especial as cooperativas, tem buscado<br />
uma melhoria na remuneração deste procedimento.<br />
No século 21 as doenças crônicas são, sem dúvida,<br />
as principais causas de mortalidade e<br />
morbidade, compreendendo as doenças<br />
cardiovasculares (choque, acidente vascular cerebral,<br />
hipertensão e insuficiência cardíaca),<br />
diabetes tipo 2, síndrome metabólica e câncer.<br />
Uma característica da doença crônica é que<br />
ela se manifesta muito tempo depois do inicio<br />
de sua fisiopatologia.<br />
Dados recentes do Centro de Doenças e Controles<br />
(CDC) documentam que doenças<br />
cardiovasculares, diabetes e câncer representam<br />
cerca de 70% de todas as mortes nos Estados<br />
Unidos da América. Além disso o<br />
sobrepeso e obesidade definida com Índice de<br />
Massa Corpórea (BMI) ≥ 25, tem sido estimado<br />
em mais de 60% da população adulta, e obesidade,<br />
diabetes e síndrome metabólica são<br />
agora comum em crianças. As doenças crônicas<br />
devido à inatividade e a má alimentação<br />
são um enorme custo para a sociedade. Em<br />
2000 representou cerca de 400.000 mortes nos<br />
EUA, ficando somente atrás do tabaco. (1)<br />
A consulta pediátrica envolve várias ações que<br />
vão desde o acompanhamento do crescimento<br />
e desenvolvimento, passando pela imunização,<br />
nutrição, avaliação da aprendizagem, saúde<br />
mental e a prevenção da mortalidade e<br />
morbidade pelas causas externas (acidentes e<br />
violência).<br />
Cerca de 18 milhões de pessoas morrem a<br />
cada ano de doenças cardiovasculares, sendo<br />
diabetes e hipertensão os maiores fatores<br />
predisponentes, que por sua vez devem em<br />
grande parte ao aumento do sobrepeso e da<br />
obesidade que durante a ultima década substituíram<br />
a má nutrição e as doenças infecciosas.<br />
De acordo com a força tarefa da Organização<br />
mundial da saúde cerca de 155 milhões<br />
de crianças tem sobrepeso ou são obesas. Cerca<br />
de 90% da diabete tipo 2 é atribuída ao<br />
excesso de peso. Aproximadamente cerca de<br />
197 milhões no mundo tem intolerância a<br />
glicose, pois a obesidade está associada a<br />
síndrome metabólica. Este número é previsto<br />
aumentar para 420 milhões em 2025. O risco<br />
de doença cardiovascular é consideravelmente<br />
maior entre as pessoas obesas, e neste<br />
grupo, o risco de hipertensão é cinco vezes<br />
maior. (2)<br />
Entre 1976-1980 e 1999, a prevalência da obesidade<br />
no adulto aumentou de 14% a 26%.<br />
A prevalência da obesidade em crianças na idade<br />
de 6 a 11 anos triplicou de 1971-1974 (aproximadamente<br />
4%) a 1999 (aproximadamente<br />
13%). (3) No Brasil, as crianças mais atingidas pela<br />
obesidade ainda pertencem às classes sociais<br />
mais privilegiadas, apesar da tendência recente<br />
de uma mudança nesse perfil. O Instituto<br />
Nacional de Alimentação e Nutrição (INAN)<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 91
Defesa profissional<br />
aponta que a obesidade infantil no Brasil atinge<br />
16% das crianças. (4)<br />
Os períodos críticos para o desenvolvimento<br />
da obesidade infantil são a gestação, o período<br />
do rebote adiposo (5-7anos) e a adolescência.<br />
De todos os achados é que os primeiros<br />
meses de vida devem ter especial intervenção<br />
para facilitar uma apropriada alimentação da<br />
criança e seu crescimento. (3) A obesidade que<br />
se inicia nestes períodos, aumentam o risco de<br />
ser persistente e apresentar complicações.<br />
O mecanismo que está associado ao aumento<br />
de risco nestas idades permanece desconhecido.<br />
Contudo a existência de períodos críticos<br />
serve de foco para esforços nas ações preventivas.<br />
Todos sabemos o custo da obesidade do<br />
adulto, e como é difícil tratá-la. A prevenção<br />
pela valorização do pediatra, com a garantia<br />
da consulta de puericultura trabalharia efetivamente<br />
na adequada nutrição da criança e<br />
adolescente, criando hábitos saudáveis.<br />
É responsabilidade precípua de todo pediatra<br />
cuidar da criança e do jovem na sua integralidade,<br />
na de sua família e de sua cultura, considerando<br />
uma ampla gama de opções terapêuticas<br />
apoiadas em evidências científicas – o que já<br />
foi chamado de medicina holística, é simplesmente<br />
boa medicina. Para melhor assumir seu<br />
papel nesse processo, o pediatra deve reforçar o<br />
relacionamento longitudinal com as famílias,<br />
aproveitando as oportunidades de intervenção<br />
construtiva; promover uma aliança terapêutica<br />
baseada na confiança; e compartilhar os problemas<br />
mais complexos com outros profissionais.<br />
No que tange ao controle de injúrias, muitos<br />
estudos demonstram que as famílias, vêem o<br />
pediatra como a primeira fonte de conhecimento<br />
sobre prevenção, e que, efetivamente,<br />
aprendem melhor com ele. Há evidências<br />
científicas de que a orientação das famílias sobre<br />
os riscos de injúria inerentes a cada etapa<br />
do desenvolvimento pode aumentar o conhecimento,<br />
bem como a adoção de medidas efetivas<br />
de segurança. Cabe ao pediatra orientar<br />
sobre como prevenir cada tipo específico de<br />
injúria, com foco definido e dirigido a ações<br />
simples, dando ênfase às medidas de proteção<br />
92<br />
passiva, que são capazes de tornar a casa “à<br />
prova de acidentes”, protegendo a criança independentemente<br />
do seu comportamento individual.<br />
Por fim, uma responsabilidade à qual nenhum<br />
pediatra pode se furtar é advogar ativamente<br />
pela promoção da segurança, em instâncias<br />
variadas, além do âmbito clínico. Advogar pela<br />
causa do controle de injúrias é uma arte e<br />
uma ciência, que envolve, no mínimo, escolher<br />
uma estratégia preventiva embasada em<br />
evidências acadêmicas, dirigir mensagens claras<br />
para os fóruns certos, granjear apoio da<br />
comunidade, estudar e aplicar princípios de<br />
marketing social e das teorias de mudança de<br />
comportamento e avaliar os resultados<br />
seqüencialmente.<br />
Além do seu papel, descrito acima, de conselheiro<br />
e advogado da causa da segurança, ele é<br />
a figura central do que se convencionou denominar<br />
“lar médico”, que se caracteriza pelo<br />
acesso fácil a cuidados de saúde contínuos,<br />
abrangentes, centrados na família, integrados,<br />
afetivos e que respeitam os diferentes contextos<br />
culturais.<br />
Além disso, é essencial não perder a perspectiva<br />
de que as injúrias têm relação direta com as<br />
desigualdades socioeconômicas; logo, como todo<br />
cidadão, o pediatra precisa fazer sua parte no<br />
aprimoramento das instituições democráticas,<br />
as quais, em última análise, condicionam o<br />
contexto social. (5)<br />
Além da inclusão do Pediatra como clínico da<br />
Criança e do Adolescente no Programa da Saúde<br />
da Família, aonde a SBP vem desenvolvendo<br />
projetos pilotos, foi encaminhada a Câmara<br />
Técnica da CBHPM, uma fundamentação Técnico-Científica<br />
dos Procedimentos Pediátricos, para<br />
garantir as consultas de Puericultura de 0-19<br />
anos como segue a tabela 1.<br />
Um outro aspecto e que o valor destes procedimentos<br />
deve ser diferenciando da Consulta<br />
em Consultório, pois esta seria um Procedimento<br />
de Puericultura. Os valores baseados nos<br />
da CBHPM atual é de R$ 82,00 de 0-6 anos e,<br />
R$ 66,00 de 7-19 anos.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Defesa profissional<br />
Tabela 1 - Visitas de Puericultura para Supervisão da Saúde do recém nascido ao adolescente.<br />
Lactente Pré-escolar Escolar Adolescente<br />
0-1 ano 1-4 anos 5-10 anos 11-19 anos<br />
Pré-natal 15 meses 5 anos 11 anos<br />
Neonatal 18 meses 6 anos 12 anos<br />
1ª semana 24 meses 7 anos 13 anos<br />
1 mês 30 meses 8 anos 14 anos<br />
2 meses 36 meses 9 anos 15 anos<br />
3 meses 42 meses 10 anos 16 anos<br />
4 meses 48 meses 17 anos<br />
5 meses 18 anos<br />
6 meses 19 anos<br />
9 meses<br />
12 meses<br />
Quando necessário o Atendimento Familiar do<br />
Adolescente, que consta da CBHPM, no valor de<br />
R$ 24,00, seria acrescida a consulta. Estas consultas<br />
referem-se ao acompanhamento do Crescimento<br />
e Desenvolvimento, com as orientações<br />
devidas, para garantir ao cidadão, na fase mais<br />
importante de sua vida, que é a do crescimento<br />
e desenvolvimento, um acompanhamento seguro,<br />
e com prevenção adequada para se tornar<br />
um adulto saudável e produtivo.<br />
Em Maio de 2002, a Diretoria de Defesa Profissional<br />
da SBP, apresentou uma proposta baseada<br />
em estudos consistentes, utilizando a mesma<br />
lógica da remuneração da THM/AMB, para<br />
atendimento do paciente internado, buscando<br />
a remuneração justa para um conjunto de patologias<br />
do dia a dia da Pediatria, que necessitam<br />
de tratamento ambulatorial, e precisam ser<br />
avaliadas por mais de uma consulta em consultório,<br />
garantindo uma melhor qualidade do<br />
atendimento e a desospitalização da criança.<br />
Procedimentos Padronizados em Pediatria (PPP),<br />
que prevêem remuneração, além da consulta inicial,<br />
de todo o tratamento clínico realizado em<br />
consultório. Isto no caso daquelas doenças que<br />
exigem acompanhamento, até a alta do paciente.<br />
O modelo já está em funcionamento nas<br />
Unimeds de Belo Horizonte (MG), Londrina,<br />
Maringá e Cascavel (PR), Itajaí e Camboriú (SC),<br />
Campo Grande (MS), Porto Alegre e Nordeste<br />
(esta com sede em Caxias do Sul, reúne 13<br />
municípios (RS), Ribeirão Preto (SP) e Juiz de<br />
Fora (MG), além de Cuiabá (MT), Aracaju (SE),<br />
Teófilo Otoni (MG), São Lourenço (sede da<br />
Unimed Circuito das Águas/MG), Limeira e Campinas<br />
(SP). Curitiba foi a quarta cidade<br />
paranaense a implementar os Procedimentos<br />
Padronizados em Pediatria (PPP).<br />
O Procedimento Padronizado em Pediatria trouxe<br />
grandes benefícios para os pediatras e, como<br />
decorrência, um aumento da auto-estima, em<br />
função do reconhecimento e do acréscimo de<br />
cerca de 30%-40% na remuneração.<br />
É fundamental a adesão e a luta pela implantação<br />
do PPP em todo sistema de saúde suplementar<br />
acarretando uma melhoria do acesso e<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 93
Defesa profissional<br />
qualidade de atendimento nos casos que necessitam<br />
de acompanhamentos; reduzir a<br />
internações e ou permanência hospitalar; valorização<br />
do trabalho exercido pelo pediatra, garantindo<br />
uma melhor remuneração; e melhoria<br />
na relação médico-paciente.<br />
<strong>Referências</strong> <strong>Bibliográficas</strong><br />
01. Roberts CK, Barnard RJ. Effects of exercise and diet on<br />
chronic disease. J Appl Physiol, 98: 3-30, 2005.<br />
02. Hossain P, MD, Kawar B, MD, Nahas M, MD, PhD. Nejm<br />
356: 213-215, January 28, 2007.<br />
03. Stettler N, Zemel BS, Kumanyika S, Stallings VA. Infant<br />
Weight Gain and Childhood Overweight Status in a<br />
Multicenter, Cohort Study. Pediatrics, Feb 2002;<br />
109:194-199.<br />
04. Giugliano R, Melo ALP. Diagnóstico de sobrepeso e<br />
obesidade em escolares: utilização do índice de massa<br />
corporal segundo padrão internacional: J Pediatr<br />
(Rio J). 2004; 80(2):129-34.<br />
05. Blank D. Controle de injúrias sob a ótica da pediatria<br />
contextual: J Pediatr (Rio J). 2005; 81(5 Supl):S123-36.<br />
A Cooperação no<br />
Universo da Pediatria<br />
JOÃO CÂNDIDO DE SOUZA BORGES<br />
A defesa profissional, inerente ao respeito e a<br />
responsabilidade no exercício do trabalho, é<br />
vista como uma autêntica maneira de promover<br />
a melhoria da qualidade da prestação de<br />
serviços e a satisfação de uma categoria. Ela<br />
impulsiona a uma competitividade saudável<br />
através da inovação e da busca e reconhecimento<br />
de maiores competências. Portanto, não<br />
é estranho para nenhum profissional falar das<br />
questões relativas à competitividade em sua<br />
área de trabalho. Porém, soa relativamente inusitado<br />
debater sobre cooperação em uma área<br />
profissional, seja ela qual for, num mundo<br />
capitalista, competitivo e voltado para o individualismo<br />
e o “salve-se quem puder”.<br />
Entretanto a dificuldade para a união ou cooperação<br />
dos profissionais com vistas ao fortalecimento<br />
de uma categoria tem demonstrado o grau<br />
de complexidade com que os interesses pessoais,<br />
profissionais e coletivos se articulam num modelo<br />
capitalista como o que vivenciamos no Brasil.<br />
94<br />
Todavia, os movimentos em busca da união têm<br />
quebrado alguns paradigmas nas últimas décadas<br />
de forma muito freqüente e justificável. Mas<br />
como toda quebra de cultura e valores, o<br />
paradigma da Cooperação, que traz em seu<br />
arcabouço o valor da visão coletiva, tem não só<br />
uma dificuldade de entendimento, mas principalmente<br />
de implantação.<br />
O Cooperativismo nasceu de um movimento que<br />
se impôs a uma demanda de um setor específico<br />
da economia da Inglaterra nos idos de 1944.<br />
Foi originário de uma necessidade de um grupo<br />
de tecelões que tiveram a capacidade criativa<br />
de encontrar uma alternativa para sua própria<br />
dificuldade de se impor num mercado que não<br />
lhes cabia isoladamente, mas que se tornava<br />
compensador na medida em que reuniam suas<br />
habilidades e capacidades em torno de um único<br />
objetivo. Se não houvessem tais movimentos<br />
teríamos sido totalmente engolidos por alguns<br />
perversos e insaciáveis princípios do capitalismo<br />
que sugam o profissional liberal, num claro<br />
desrespeito ao cidadão trabalhador.<br />
O ensinamento desses tecelões, resultado de<br />
uma experiência concreta vivenciada por<br />
aqueles humildes trabalhadores, criou escola:<br />
O movimento cooperativista.<br />
O fundamento básico desse movimento, cujas<br />
raízes tinham características econômicas e de so-<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Defesa profissional<br />
brevivência, estava alicerçado em valores humanos<br />
importantes, onde o lucro individual não<br />
tinha espaço e o bem comum era a meta perseguida<br />
por todos. Foi se tornando assim, pouco a<br />
pouco uma nova forma de pensar o homem, o<br />
trabalho e o desenvolvimento social. Como traz<br />
em sua essência a busca pela redução de desigualdades<br />
e uma perseguição a uma maior justiça<br />
social, tem sido visto por governos e pela sociedade<br />
em geral como um instrumento democrático<br />
que contribui de maneira efetiva para o desenvolvimento<br />
sócio econômico de uma nação.<br />
Na área médica essa evolução veio no início da<br />
década de 70 quando um grupo de médicos<br />
insatisfeitos com a gestão da saúde pública no<br />
Brasil, e desejosos de ampliarem a assistência<br />
médica a um maior número de pessoas, recorreram<br />
ao modelo do cooperativismo, encontrando<br />
nessa forma de organização, uma maneira<br />
adequada para garantir o livre exercício de sua<br />
profissão, um atendimento de qualidade a um<br />
maior número de pacientes e uma remuneração<br />
que pudesse ser justa e satisfatória para o<br />
esforço que a classe médica faz para exercer<br />
seu papel profissional.<br />
As cooperativas médicas nasceram com fragilidades<br />
que eram percebidas em função da falta<br />
de conhecimentos dos próprios médicos em<br />
assuntos importantes na área administrativa e<br />
de gestão de negócios, e na ausência de experiência<br />
relacionada a como gerenciar uma cooperativa.<br />
Essas dificuldades têm sido enfrentadas<br />
de forma muito profissional por todos os<br />
que ao longo desses anos tem abraçado essa<br />
causa. Na medida em que profissionalizam suas<br />
cooperativas, os médicos passam a reconhecer<br />
a importância do papel do gestor e de seu próprio<br />
papel, colocando assessorias, gerências e<br />
outras profissionalizações para dar o apoio e o<br />
suporte necessário ao empreendimento.<br />
A Cooperativa dos Pediatras do Ceará - COOPED-<br />
CE, com doze anos de fundação congrega 451<br />
pediatras. Esse número importante de associados<br />
e a própria demanda do mercado, motivanos<br />
a uma política de expansão que tem sido<br />
realizada através de constantes processos de<br />
negociação com novos clientes e com visitas a<br />
rede privada de hospitais, empresas particulares<br />
e caixas de assistências.<br />
Atualmente contamos com os seguintes tomadores:<br />
Secretaria de Saúde do Estado do Ceará,<br />
Secretaria de Saúde do Município de Maracanaú,<br />
Secretaria de Saúde do Município de Fortaleza,<br />
Maternidade de Caucaia, Maternidade Escola da<br />
Universidade Federal do Ceará e Têxtil Bezerra<br />
de Menezes.<br />
Evolução do número de cooperados<br />
Exercício - 1995 a 2006<br />
Fonte: COOPED-CE 2007<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 95
Defesa profissional<br />
Entretanto, se o pediatra não participa das decisões<br />
da cooperativa, integrado à filosofia que o<br />
movimento cooperativista evoca, ele acaba por se<br />
tornar um médico terceirizado, com um sentimento<br />
de estar injustiçado em sua remuneração, porque<br />
não se sente pertencente a uma empresa,<br />
mas apenas contratado por ela. Esse sentimento<br />
reduz o profissional e enfraquece a própria cooperativa.<br />
Daí o esforço que pessoalmente devemos<br />
ter enquanto presidentes de uma cooperativa<br />
dessa natureza. Em primeiro lugar investir na<br />
mudança de mentalidade e na renovação de valores<br />
que hoje fazem a cabeça dos nossos colegas<br />
profissionais. Uma mudança de atitudes e de comportamento<br />
frente a própria percepção de sua<br />
profissão e a forma como podem tornar-se mais<br />
fortes. Valores que não sejam apenas apregoados.<br />
Mas que possam ser vivenciados e só então, expressados<br />
pela categoria. Viver valores éticos, de<br />
integração, de sentido de coletividade é muito mais<br />
complexo do que se pode imaginar. Mas é preciso<br />
que se dê um pontapé inicial. Como já frisei, não<br />
apenas colocando no nosso planejamento estratégico,<br />
mas efetivamente procurando treinar, nas nossas<br />
experiências profissionais, essas mudanças. Os<br />
ganhos precisam ser percebidos, demonstrados e<br />
alardeados. Se não houver um trabalho nesse<br />
sentido, nós mesmos não iremos encontrar motivações<br />
para tamanhas mudanças.<br />
Também é importante que se tenha clareza de<br />
que o tempo é um fator importante nessa luta.<br />
A reeducação de nossos modelos mentais, das<br />
nossas crenças e valores estão subordinados<br />
ao tempo. Não podemos esquecer que passamos<br />
anos a fio, por muitas razões, pensando<br />
de forma individualista e imediatista. Portanto,<br />
não pode ser num curto espaço de tempo<br />
que tenhamos condições de garantir o alcance<br />
absoluto de todos esses objetivos.<br />
O Nordeste brasileiro é um exemplo típico de<br />
região que necessita criar mecanismos diferenciados<br />
para remuneração de algumas categorias.<br />
O Ceará, por exemplo, tem um PIB<br />
per capita em torno de 40% do PIB do Brasil<br />
e 54% da população do Ceará está abaixo da<br />
linha de pobreza. Além destes, estão em concentração<br />
elevada, os pobres e os que têm<br />
apenas suas necessidades básicas sendo atendidas<br />
de forma suficiente, considerados de<br />
classe média. Resta, pois, um número reduzido<br />
de pessoas que desfruta de um poder<br />
aquisitivo capaz de pagar a justa remuneração<br />
de uma consulta médica particular, o que<br />
por si já demonstra a debilidade de nossa<br />
economia. Esses dados revelam o quanto<br />
somos reféns de uma condição histórica,<br />
demográfica e política que pauta as raízes econômicas<br />
frágeis de nossa sociedade.<br />
Crescimento da Receita da COOPED<br />
Exercício - 1996 a 2006<br />
Fonte: COOPED-CE 2007<br />
96<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Defesa profissional<br />
Sendo assim, quando percebemos o crescimento<br />
da COOPED-CE temos a certeza que estamos,<br />
com o movimento cooperativista, alterando de<br />
forma positiva o quadro de remuneração dos<br />
médicos pediatras do Ceará.<br />
Essas iniciativas como a de união de profissionais<br />
em bloco, com objetivos comuns, que<br />
ampliam sua capacidade de negociação, e aumentam<br />
o poder de uma categoria junto aos<br />
que compram seus serviços, são alternativas<br />
estratégicas da própria sociedade, que encontra<br />
não apenas na área de saúde, mas também<br />
em outras áreas, as suas próprias formas<br />
de organização para se sobrepor aos inúmeros<br />
descaminhos criados pelo poder público<br />
em geral.<br />
As distorções produzidas não podem fazer negar<br />
a importância que o modelo de cooperação<br />
tem para os médicos em geral. O colega<br />
Paulo Tadeu Falanghe, presidente da Unimed<br />
de Piracicaba – 450 cooperados e 140 mil usuários<br />
em 10 municípios – alerta para o risco<br />
das falsas cooperativas, em que os médicos<br />
não têm direito a voto, nem podem participar<br />
da diretoria ou do Conselho Fiscal: “São<br />
apenas firmas de prestação de serviços, que<br />
excluem os direitos trabalhistas de qualquer<br />
empregado”.<br />
Essas condutas não recomendáveis não podem<br />
ser argumento maior para a existência ou a<br />
inexistência das cooperativas. A falta de ética<br />
de alguns, muitas vezes resultante da pouca<br />
participação de muitos, não pode ser responsável<br />
pela destruição de uma lógica de gestão<br />
e de organização que já deu inúmeras demonstrações<br />
de resultados positivos.<br />
A legitimidade das nossas cooperativas é que<br />
irá aumentar nosso poder de barganha, nossa<br />
capacidade de negociação e assim resultar<br />
em melhorias financeiras para todos. Mas é<br />
preciso pensar “empresarialmente”, embora<br />
guardando as diferenças entre organizações<br />
que visam lucros individuais das que visam o<br />
lucro e os investimentos distribuídos coletivamente.<br />
Pensar como dono de um grande empreendimento,<br />
alguém que tem visão de longo prazo,<br />
que se propõe a ganhar e investir no próprio<br />
negócio para que se torne cada vez mais competitivo.<br />
Caso contrário, se todos nós só pensarmos<br />
de forma imediatista, urgenciando retiradas<br />
e não disponibilizando recursos para<br />
investimentos no nosso empreendimento que<br />
é a cooperativa, infelizmente estaremos fadados<br />
ao insucesso.<br />
Acredito, pois numa união não apenas proclamada,<br />
mas especialmente bem orientada para<br />
o negócio e para os resultados. Não enxergar<br />
a cooperativa como um aglomerado de médicos,<br />
mas como um conjunto de pessoas de alto<br />
grau de qualificação, que tem o poder de prestar<br />
um serviço essencial à sociedade e que pode<br />
fazê-lo de forma honrada e justa para seus<br />
pacientes e para si mesmo.<br />
Assim vejo o ambiente cooperativo de pediatras.<br />
É assim que tenho tentado colocar minha<br />
gestão: à disposição de uma causa voltada para<br />
valores empreendedores, onde os ganhos possam<br />
ser mútuos (médicos e clientes), e fundamentalmente<br />
onde possamos nos sentir participantes<br />
e gratificados pelo investimento que<br />
fazemos como profissionais.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 97
Defesa profissional<br />
O Pediatra no PSF:<br />
Direito da População e<br />
Garantia de Qualidade<br />
no Atendimento<br />
DIOCLÉCIO CAMPOS JÚNIOR<br />
Introdução<br />
Desde que foi elevado à condição de política de<br />
governo, o PSF vem se difundindo pelo país,<br />
estimulado pelo Ministério da Saúde e financiados<br />
pelos generosos recursos orçamentários<br />
que lhe foram destinados. O êxito colhido por<br />
essa estratégia de atendimento vem-se traduzindo,<br />
em alguns municípios, por inquestionável<br />
aumento da cobertura à população.<br />
Não carece dúvida de que as equipes organizadas<br />
pelos projetos já implantados exercem<br />
uma atividade assistencial de forte poder<br />
multiplicador, conseguindo garantir razoável<br />
acesso da população aos recursos necessários<br />
para os cuidados à sua saúde. Os relatórios<br />
conhecidos dão conta do incontestável impacto<br />
quantitativo produzido pelo PSF nos seus objetivos<br />
assistenciais. Contudo, a avaliação qualitativa<br />
do desempenho das equipes é ainda muito<br />
tímida, se não de todo inexistente. Já em outros<br />
países, onde a preocupação com a qualidade<br />
dos serviços prestados é componente essencial<br />
da assistência à população, a avaliação de resultados<br />
têm mostrado que o desempenho do<br />
médico de família, relativamente aos problemas<br />
de saúde da criança, deixa a desejar quando<br />
comparado à atuação do pediatra.<br />
Nesse sentido, vale resumir os achados de pesquisa<br />
realizada nos EUA por Rebecca L. Watson e<br />
cols., publicada na revista PEDIATRICS do mês de<br />
abril de 2001. A investigação consistiu na análise<br />
das condutas diagnósticas e terapêuticas de pediatras<br />
e médicos de família em casos de infecções<br />
de vias aéreas superiores, tomando como<br />
referencial alguns princípios objetivos estabelecidos<br />
em trabalhos científicos anteriores, reunidos<br />
em suplemento da mesma revista publicado em<br />
1998. Concluem os autores que “a prática referida<br />
pelos médicos de família esteve mais<br />
freqüentemente em desacordo com os princípios<br />
publicados: era maior a probabilidade, relativamente<br />
aos pediatras, de omitirem a otoscopia<br />
pneumática para diagnóstico de derrame em<br />
ouvido médio (46% contra 25%), de omitirem a<br />
exigência de sintomatologia prolongada para o<br />
diagnóstico de sinusite (média de quatro contra<br />
40 dias) e de omitirem análises laboratoriais na<br />
faringite (27% contra 14%). Além disso, 58% dos<br />
médicos de família prescrevem antibióticos rotineiramente<br />
no resfriado comum, contra 30% de<br />
pediatras que o fazem.” Nota-se, pois, que o<br />
atendimento à criança pelo médico de família<br />
esteve menos qualificado do que o do pediatra,<br />
na experiência desses autores.<br />
Por outro lado, a esperada redução da demanda<br />
nas unidades de atendimentos hospitalares<br />
e emergenciais, como produto da atuação das<br />
equipes do PSF, não tem se confirmado em<br />
muitas das experiências conhecidas. Exemplo<br />
disso é o que ocorreu com o projeto “Saúde em<br />
Casa”, desenvolvido pelo governo do Distrito<br />
Federal. As equipes de saúde multiplicaram-se<br />
rapidamente e cobriram elevado percentual das<br />
populações localizadas na periferia de Brasília,<br />
foco da maior demanda assistencial às unidades<br />
de saúde da rede pública da capital do país.<br />
Contrariamente à expectativa, não houve diminuição<br />
da procura por esses serviços. Em muitos<br />
casos houve até aumento, conforme se registrou<br />
no ambulatórios e pronto-socorro do<br />
Hospital Universitário de Brasília, principalmente<br />
no tocante à demanda pediátrica.<br />
Na verdade, as equipes do PSF realizam busca<br />
ativa de pacientes, intensificando a procura dos<br />
serviços da rede pública por meio de encaminhamentos<br />
referenciais que decorrem de uma<br />
insuficiente resolutividade dos profissionais envolvidos.<br />
Não há dúvida de que a ausência do pediatra<br />
no PSF reduz consideravelmente sua capacidade<br />
resolutiva, posto que o médico de adulto<br />
98<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Defesa profissional<br />
não terá jamais a formação necessária para<br />
identificar e tratar adequadamente os problemas<br />
de saúde da criança e do adolescente, conforme<br />
sugere o trabalho acima citado. Configura-se,<br />
desta maneira, uma falha conceitual<br />
e funcional na implantação do Programa, responsável<br />
pela sua inadequada performance<br />
qualitativa.<br />
A insistência em manter o funcionamento do<br />
PSF com equipes que contam com um único<br />
médico generalista para todas as faixas etárias<br />
– sem apoio da pediatria – é um equívoco que<br />
merece revisão, sob pena de não se obter o<br />
resultado qualitativo indispensável ao projeto,<br />
sobretudo nas áreas onde a presença do pediatra<br />
já se consagrou como garantia de melhor<br />
padrão da assistência à saúde da criança e do<br />
adolescente. Por isso, as equipes do PSF devem<br />
ser constituídas pelo médico de adultos e por<br />
estrutura referencial que inclua o pediatra, com<br />
salário igual ao do médico de família, a fim de<br />
que ganhem resolutividade, ampliem a qualidade<br />
dos seus atendimentos e garantam o direito<br />
das famílias a terem acesso ao atendimento<br />
diferenciado do pediatra para os problemas<br />
de saúde de seus filhos.<br />
Não há pois, nenhuma justificativa válida para<br />
se continuar implantando o PSF sem pediatra.<br />
Alegar que qualquer modificação na concepção<br />
original do Projeto poderia desvirtuar seu objetivo,<br />
é fixar-se num radicalismo doutrinário inconsistente,<br />
que nada tem a ver com os genuínos<br />
interesses da população, nem mesmo com a<br />
própria soberania nacional, que preceitua a<br />
reformulação de todo e qualquer projeto oriundo<br />
de organismos internacionais para torná-lo<br />
compatível com os requisitos de nossa realidade<br />
e com os direitos conquistados pelo nosso povo.<br />
Em conclusão, insistir em manter o PSF fechado<br />
à inclusão do pediatra na sua estrutura, sob o<br />
pretexto de que o projeto não pode sofrer mudanças,<br />
é manifestação de fundamentalismo sanitário<br />
que somente satisfaz a expectativa, para<br />
não dizer a determinação colonialista, dos organismos<br />
internacionais que o recomendam e financiam.<br />
As particularidades do nosso país e o<br />
direito de nossa população devem falar mais alto.<br />
Fundamentos conceituais<br />
para proposta de qualificação<br />
da assistência à criança e ao<br />
adolescente no PSF<br />
Diante dos fatos e argumentos ora apresentados,<br />
cumpre enunciar algumas afirmações<br />
conceituais que devem servir de base à formulação<br />
de propostas direcionadas no sentido<br />
de contribuir para o aprimoramento do<br />
PSF.<br />
1. O direito universal à saúde é, ao mesmo tempo,<br />
valor jurídico, constitucional e conquista<br />
política da cidadania. A universalidade da assistência<br />
à saúde, conceito central do SUS, é<br />
uma proposta generosa, justa e de eqüidade<br />
social;<br />
2. O modelo tradicional de atenção à saúde,<br />
centrado no atendimento a doenças e caracterizado<br />
pela valorização da queixa principal,<br />
pela assistência médica individual,<br />
pela procura espontânea, pela colocação do<br />
hospital como centro do Sistema, pelo uso<br />
não racional da tecnologia, parece exigir modificações<br />
ou a adoção de programas que<br />
ampliem sua dimensão e melhorem sua qualidade;<br />
3. O desafio que se coloca é o de viabilizar, de<br />
forma não transitória, isto é, além da duração<br />
dos governos, as modificações entendidas<br />
como indispensáveis ao Sistema de Saúde<br />
brasileiro;<br />
4. As sociedades médicas, SBP entre outras, são<br />
instâncias de absoluta legitimidade para discutir<br />
e propor alternativas pertinentes;<br />
5. O trabalho do médico na equipe do PSF precisa<br />
ser resolutivo na maioria das vezes ou,<br />
pelo menos, na atenção primária, sob pena<br />
de inviabilizar o programa;<br />
6. A SBP deve defender não uma medicina<br />
de cesta básica para pobres, mas uma<br />
atenção ampla em cobertura e qualificada<br />
em tecnologia a todos os estratos da<br />
população, com especial ênfase na qualidade<br />
da atenção dispensada a crianças e<br />
adolescentes;<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 99
Defesa profissional<br />
7. Não é ético, nem justo, privar qualquer indivíduo,<br />
muito menos a criança ou adolescente,<br />
no estágio atual do desenvolvimento<br />
da ciência médica, do atendimento pelo<br />
profissional mais capacitado para a solução<br />
do seu problema de saúde;<br />
8. É conceitualmente incorreto situar a pediatria<br />
como especialidade médica para o sistema<br />
de referência do PSF.<br />
9. O diagnóstico e a prescrição, componentes<br />
essenciais do ato médico e prerrogativas<br />
intransferíveis deste profissional em qualquer<br />
programa de saúde, não devem ser<br />
delegados a enfermeiro, auxiliar de enfermagem,<br />
psicólogos ou qualquer outro profissional<br />
que venha a integrar equipes multi<br />
disciplinares do PSF;<br />
10. Nas atividades do PSF, tanto a elaboração<br />
diagnóstica quanto a escolha do tratamento<br />
adequado a cada caso, ainda que fundamentadas<br />
em protocolos oficialmente aprovados,<br />
são atribuições do médico;<br />
11. A implantação do PSF não pode ser feita<br />
isoladamente. Deve ser acompanhada de<br />
todas as providências necessárias a que os<br />
municípios estruturem adequadamente sua<br />
rede de serviços de saúde, dotando-a de<br />
equipes profissionais completas, organizadas<br />
em instâncias de referência e contrareferência,<br />
para assegurar à população o<br />
acesso ao ato médico qualificado, capaz de<br />
prover diagnóstico e tratamento em grau<br />
de resolução desejável;<br />
12. Nem o PSF, nem qualquer outra estratégia<br />
simplificadora de conhecimentos, podem<br />
substituir a assistência pediátrica, sob pena<br />
de se ferirem direitos elementares de crianças<br />
e adolescentes.<br />
Proposta da SBP para<br />
a inclusão da pediatria no PSF<br />
Preocupada com a garantia dos direitos de crianças<br />
e adolescentes brasileiros, e entendendo a<br />
validade do PSF como estratégia de ampliação<br />
do acesso ao Sistema Único de Saúde, a<br />
SBP defende as seguintes modificações na<br />
estruturação desse Programa – aprovadas pelo<br />
ENEM – a fim de que se compatibilize o alcance<br />
de seu objetivo maior com a inquestionável<br />
necessidade de se garantir a qualificação e a<br />
integralidade do atendimento à saúde na faixa<br />
etária em discussão:<br />
Documento aprovado pela plenária<br />
do XI Encontro Nacional de Entidades<br />
Médicas. (ENEM /Junho de 2007)<br />
Considerandos:<br />
1. Decorridos 13 anos de implantação do PSF<br />
no País cumpre suprir, em sua estrutura e<br />
funcionamento, as insuficiências quantitativas<br />
e qualitativas claramente evidenciadas.<br />
2. O acesso de crianças e adolescentes à assistência<br />
pediátrica é de direito amplamente reconhecido<br />
na atualidade e endossado pela<br />
maioria dos gestores de saúde, que o garantem<br />
aos seus próprios filhos.<br />
3. Na maior parte das avaliações já procedidas,<br />
constata-se uma menor capacidade de resolução<br />
da demanda, no atual modelo de equipes<br />
do PSF.<br />
4. A inclusão da assistência pediátrica no PSF<br />
confere qualidade a uma estratégia que celebra<br />
êxitos quantitativos, mas passa a requerer,<br />
para sua continuidade, o componente<br />
qualitativo essencial.<br />
5. Pesquisa realizada pelo Instituto Datafolha em<br />
setembro de 2006 demonstra que as mães<br />
de todas as capitais dos estados e de todos os<br />
estratos socioeconômicos querem o direito de<br />
assistência pediátrica para seus filhos.<br />
Proposta:<br />
1. Promover políticas que permitam, progressivamente,<br />
garantir o acesso de todas as crianças e<br />
adolescentes à assistência pediátrica no País.<br />
2. Assegurar, nos municípios e regiões onde haja<br />
recursos para fazê-lo, a referência de, no mínimo,<br />
um pediatra para cada três equipes do PSF,<br />
ensejando-lhe carga horária definida em função<br />
da necessidade configurada pela demanda,<br />
com remuneração igual a do médico de família,<br />
proporcionalmente à carga horária referida.<br />
100<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
O pediatra e a escola<br />
Dificuldades Escolares<br />
CARLOS NOGUEIRA AUCÉLIO<br />
“Sentimentos que a arte desperta devem<br />
ser compreensíveis à massa da população<br />
e não apenas a alguns poucos”<br />
Tolstoy<br />
Preocupação com a educação vem de longa<br />
data, no próprio meio acadêmico, médico, familiar,<br />
desencadeando nestes últimos 25 anos<br />
grandes esforços para identificar, quantificar,<br />
distinguir e categorizar as disfunções relacionadas<br />
a aprendizagem.<br />
Os fundamentos de uma sociedade desenvolvida<br />
têm que estar alicerçados na educação e<br />
saúde da população. O número excessivo de<br />
pessoas que não conseguem aprender, em todas<br />
as camadas sociais, faz com que repensemos<br />
o conceito de “distúrbios de aprendizagem”.<br />
As famílias apresentam relatos de pessoas normalmente<br />
desenvolvidas em outras esferas e<br />
dimensões da vida, mas que não aprendem<br />
quando colocadas em situação normal de escolaridade.<br />
Constata-se que um grande número de crianças<br />
que procuram a escola estão impedidas de lograr<br />
com sucesso. Quase não aproveitam a experiência<br />
vivida e acumulam, ao longo dos anos,<br />
lacunas e defasagens que aos poucos as afastam<br />
totalmente da vida escolar ou, quando não,<br />
terminam a escolaridade de forma precária e<br />
com grande atraso. Este fato, além de ser penoso<br />
para indivíduo, reveste-se, também, em prejuízo<br />
para a sociedade, considerando a ocupação<br />
mais demorada de vagas que poderiam ser<br />
ocupadas por novos alunos. Além disso, refletese<br />
diretamente na competência do profissional<br />
que tem acesso ao mundo do trabalho, gerando<br />
desempenho de baixa qualidade e estimulação<br />
ao sub-emprego.<br />
Podemos considerar o problema de aprendizagem<br />
como um sintoma, no sentido de que o<br />
não aprender não configura um quadro permanente,<br />
mas ingressa numa constelação peculiar<br />
de comportamentos nos quais se destaca<br />
como sinal de descompensação. Entretanto,<br />
estabelecer claramente os limites que separam<br />
“problemas” de aprendizagem dos chamados<br />
“distúrbios” de aprendizagem é uma tarefa<br />
muito complicada, que fica a critério dos especialistas<br />
das diferentes áreas em que a deficiência<br />
se apresenta.<br />
O TDAH, dislexia, epilepsia, distúrbios da<br />
ortóptica, são cada vez mais encaradas como<br />
problemas mundiais, onde somos todos nós<br />
responsáveis. Sua freqüência e características<br />
produzem adversidades não somente a criança,<br />
adolescente e sua família, mas também a<br />
sociedade como um todo. Assim não podemos<br />
negligenciar no tocante a cuidar desses destituídos<br />
do privilégio de aprender sem dificuldade.<br />
As deficiências ou déficits de aprendizagem específicos,<br />
merecem um assinalamento focalizado<br />
e adoção de recursos corretores de diagnóstico<br />
e intervenção uma vez que existem expectativas<br />
de aprendizagem à longo prazo. Assim,<br />
alguns desvios merecem maior discussão.<br />
A dominância funcional de um lado do corpo é<br />
determinada pela predominância de um hemisfério<br />
cerebral sobre outro. O hemisfério cerebral<br />
esquerdo controlaria a metade direita e o<br />
hemisfério direito a metade esquerda. Quando<br />
esta relação não é respeitada, teremos a<br />
lateralidade cruzada.<br />
A função binocular, ou seja a coordenação dos<br />
dois olhos como um só órgão, isto é, os dois<br />
olhos vendo uma única imagem ao mesmo<br />
tempo também está prejudicada. Geralmente<br />
essas crianças apresentam alto índice de fadi-<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 101
O pediatra e a escola<br />
ga; quedas freqüentes; coordenação pobre;<br />
atenção instável; problemas de linguagem escrita<br />
e falada.<br />
A dislexia é uma dificuldade acentuada, que<br />
ocorre no processo de leitura, escrita, soletração<br />
e ortografia. A criança com dislexia não é<br />
menos desenvolvida que as demais, o que acontece<br />
é que ela se desenvolve de maneira diferente,<br />
o seu ritmo, a sua velocidade de aprendizagem<br />
difere de uma outra criança. Isto se dá<br />
pelo fato de apresentar memória prejudicada,<br />
pois não consegue memorizar o que leu, conseqüentemente<br />
sua compreensão ficará automaticamente<br />
prejudicada, uma vez que existe um<br />
envolvimento direto do processamento auditivo<br />
central, ou seja, comprometimento das seguintes<br />
fases:<br />
Codificação: Apresenta dificuldade leve para<br />
acompanhar a conversação em situações que<br />
exigem associação dos sentidos audição e visão.<br />
Há dificuldade em associar os estímulos acústicos<br />
de fala com o significado, apresentando<br />
alteração na habilidade de integração de informações<br />
sensoriais auditivas e das auditivas com<br />
outras informações sensoriais não auditivas,<br />
como as visuais.<br />
Decodificação: Dificuldade de integrar auditivamente,<br />
do ponto de vista acústico, eventos<br />
sonoros, ocorrendo prejuízo em lidar com sons<br />
dentro da palavra, ou seja, comprometimento<br />
nas habilidades auditivas de atribuir significado<br />
a informação fonêmica.<br />
Organização: Representar eventos sonoros no<br />
tempo.<br />
O Transtorno do déficit de atenção e hiperatividade<br />
é um distúrbio neuro-comportamental,<br />
que atinge cerca de 8% das crianças<br />
e adolescentes na idade escolar, caracterizado<br />
por:<br />
– Dificuldade em prestar atenção a detalhes ou<br />
errar por descuido em atividades escolares;<br />
– Esquecem algo que haviam estudado previamente.<br />
Isso ocorre porque a atenção era superficial<br />
enquanto estudavam e, assim, o<br />
material não é levado corretamente para os<br />
armazéns da memória;<br />
– Dificuldades em manter atenção em tarefas<br />
ou atividades lúdicas;<br />
–Parecer não escutar quando lhe dirigem a<br />
palavra;<br />
– Não seguir instruções e não terminar tarefas<br />
escolares ou domésticas;<br />
– Dificuldade em organizar tarefas e atividades;<br />
– Evitar, ou relutar, em envolver-se em tarefas<br />
que exijam esforço mental constante;<br />
–Perder coisas necessárias para tarefas ou atividades;<br />
– Ser facilmente distraído por estímulos alheios<br />
à tarefa;<br />
–Apresentar esquecimentos em atividades diárias;<br />
– Dificuldade em brincar ou envolver-se silenciosamente<br />
ou interagir com outros colegas;<br />
–Freqüentemente dá respostas precipitadas;<br />
– Dificuldade em esperar a sua vez;<br />
–Freqüentemente interromper ou se meter em<br />
assuntos de outros;<br />
– Baixa tolerância a frustração.<br />
Seu exame neurológico foi caracterizado por<br />
uma fácies, postura e marcha atípica.<br />
A medicação de primeira escolha é o<br />
Metilfenidato, cuja droga é onde a finalidade é<br />
elevar os níveis de catecolaminas (Dopamina e<br />
Noradrenalina), os quais encontram-se reduzidas<br />
em determinadas regiões do sistema nervoso<br />
central, mais especificamente na região frontal<br />
(parte anterior do cérebro e suas conexões),<br />
ocasionando assim todos estes sintomas descritos<br />
anteriormente.<br />
Assim, devido ao aumento deste contingente da<br />
população que hoje tem acesso as instituições<br />
de ensino e o relativo despreparo da escola para<br />
recebê-lo; a complexidade cada vez maior do<br />
universo de conhecimentos que deve ser passado<br />
a criança; a competição que a escola sofre<br />
com outros meios de comunicação e informação;<br />
a discrepância, muitas vezes ressaltada e<br />
discutida, entre o conteúdo escolar e a vida; o<br />
despreparo do professor frente a mudanças rápidas<br />
e demandas diversificadas que caracterizam<br />
a sociedade pós-moderna; a ênfase exces-<br />
102<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
O pediatra e a escola<br />
siva na formação técnica e na transmissão de<br />
um conteúdo acabado, em detrimento de uma<br />
formação crítica, que valorize o processo do<br />
aprender e as características individuais do<br />
aprendiz no que tange ao ritmo e peculiaridades<br />
de seu desenvolvimento cognitivo, emocional,<br />
lingüístico, psicomotor e social, sugerimos:<br />
– Redução de turma para que a criança tenha<br />
mais atenção do professor e reduza o número<br />
de estímulos externos os quais podem<br />
desviar a atenção da criança.<br />
– Manter contato com os pais regularmente.<br />
Evitar reunir-se com os pais somente nos momentos<br />
de crise ou problemas.<br />
–Tentar acordos, perguntar ao aluno como ele<br />
acha que pode aprender melhor, pois por serem<br />
intuitivos, podem dar dicas úteis.<br />
– Monitorar as tarefas, marcando tempo, ajuda<br />
o aluno a se programar e se orientar dentro<br />
de um prazo preestabelecido.<br />
– Orientar o aluno previamente sobre o que é<br />
esperado dele, em termos de comportamento<br />
e aprendizagem. Assim, pode-se sentir mais<br />
seguro quanto ao que é esperado dele.<br />
– Usar recursos especiais como: gravador,<br />
retroprojetor, slides, etc. Como o portador de<br />
TDAH tem um apelo intrínseco a novidades,<br />
todos os recursos disponíveis podem ajudar<br />
na manutenção da atenção e, conseqüentemente,<br />
no processo de aprendizagem. Ele<br />
aprende melhor visualmente, pois dessa maneira<br />
pode pôr as idéias no lugar e se<br />
estruturar.<br />
– Discutir, precisamente, quando necessário,<br />
mudanças no cronograma, no currículo e na<br />
didática e realizar alterações até o aluno conseguir<br />
se ajustar no processo educacional.<br />
–Tentar entender as necessidades e as dificuldades<br />
educacionais do aluno. Por exemplo,<br />
o aluno com TDAH necessita de algo para<br />
fazê-lo lembrar das coisas, de previsões, de<br />
repetições, de diretrizes, de limites e de organização.<br />
– Ser tolerante para que o aluno possa sentirse<br />
aceito, tal como é. Geralmente, o portador<br />
de TDAH necessita se sentir “enturmado” e<br />
motivado.<br />
– Ser flexível para lançar mão de uma série de<br />
recursos e estratégias de ensino até descobrir<br />
o estilo de aprendizagem do aluno.<br />
– Incentivar e recompensar todo o bom comportamento<br />
e o desempenho. Esse aluno funciona<br />
melhor por meio de elogios, firmeza,<br />
aprovação e encorajamento, ´pois esses incentivos<br />
são suprimentos de sentimentos.<br />
– Dar o conteúdo passo-a-passo, verificando se<br />
houve aprendizado.<br />
–Apresentar tarefas em pequena quantidade<br />
para não assustar e desanimar o aluno. Uma<br />
grande quantia de tarefas faz com que o aluno<br />
sinta que não conseguirá dar conta de<br />
terminá-las e com isso ele desiste, antes<br />
mesmo de começá-las.<br />
– Estimular o interesse do aluno para aprender.<br />
Tentar envolver e motivar o aluno para o processo<br />
de aprendizagem.<br />
– Reduzir os estímulos que possam distrair o<br />
aluno, como, por exemplo, sentar-se próximo<br />
da porta ou da janela. Pode-se colocá-lo sentado<br />
próximo à mesa do professor.<br />
– Manter-se a sala de aula organizada e bem<br />
estruturada. Isso pode ajudar o aluno a se<br />
organizar internamente e no ambiente e,<br />
dessa forma, corresponder melhor no processo<br />
de aprendizagem.<br />
– Estabelecer regras claras e consistentes. Deixar<br />
claro o que é esperado dele. O aluno poderá<br />
sentir-se mais seguro sabendo o que é<br />
esperado dele naquele momento.<br />
– Alternar atividades de alto e baixo interesse<br />
durante a aula. Deve-se alternar as atividades<br />
mais interessantes com tarefas menos brilhantes.<br />
– Evitar tarefas repetitivas próximas uma das<br />
outras. Como esse aluno responde bem às novidades,<br />
deve-se evitar tarefas monótonas e<br />
repetitivas que podem levar a distração e a<br />
falta de interesse.<br />
–Fornecer instruções, orientações curtas e<br />
claras, em um nível que o aluno possa compreender<br />
e corresponder. Simplifique as<br />
instruções, as opções, a programação. O palavreado<br />
mais simples e objetivo será facilmente<br />
compreendido pelo aluno.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 103
O pediatra e a escola<br />
–Focalizar mais o processo (compreensão de<br />
um conceito) do que o produto (concluir cinqüenta<br />
problemas). Enfatizar mais a qualidade<br />
do que a quantidade.<br />
– Colocar o aluno com um par-tutor para que<br />
este tenha um modelo adequado de desempenho<br />
e que ele possa ter como um ponto de<br />
referência.<br />
–Envolver-se mais com o aluno para despertar<br />
nele a motivação, o interesse e a responsabilidade.<br />
– Olhar nos olhos para “trazê-lo de volta”; isto<br />
ajuda a tirar o aluno de seu devaneio ou darlhe<br />
liberdade para fazer um pergunta ou apenas<br />
dar-lhe segurança silenciosamente.<br />
– Desenvolver alternativas. Fornecer dicas de<br />
como o aluno pode lidar com as suas dificuldades;<br />
por exemplo, ensiná-lo a fazer resumos,<br />
usar rimas, códigos para facilitar a memorização<br />
de conteúdos. Auxiliá-lo a fazer listas,<br />
anotações, uma programação própria depois<br />
da aula, um calendário de compromissos, etc.<br />
– Dar supervisão adicional, sempre que necessário.<br />
Estar aberto para discutir e auxiliar,<br />
diariamente, nas principais dificuldades, no<br />
final de cada aula ou nos intervalos.<br />
– Estabelecer limites e fronteiras, devagar e com<br />
calma, não de modo punitivo. Ser firme e<br />
direto.<br />
–Deve-se enfatizar o aspecto emocional do<br />
aprendizado. Lidar com as emoções e descobrir<br />
o prazer na sala de aula e no processo de<br />
aprendizagem são itens necessários para se<br />
ter um bom desempenho escolar. Em vez de<br />
falhas e frustrações deve-se ter domínio e<br />
controle, em vez de medo e tédio, o melhor<br />
é a excitação.<br />
– Não enfatizar o fracasso. Esse aluno necessita<br />
de tudo o que for positivo que o professor<br />
puder oferecer. Sem encorajamento e elogios,<br />
ele murcha e retrocede. O prejuízo à<br />
auto-estima é mais devastador do que o DDA.<br />
– Dar retorno constante e imediato. Isto o ajuda<br />
a ter uma noção de como está se saindo<br />
e a desenvolver a auto-observação. Deve-se<br />
informá-lo de modo positivo e construtivo.<br />
– Monitorar, freqüentemente seu progresso,<br />
auxiliando-o a alcançar as suas metas.<br />
– Incentivar a leitura em voz alta, falar por<br />
tópicos. Essas atividades ajudam o aluno a<br />
organizar as idéias.<br />
– Estar atento ao talento do aluno, à criatividade<br />
e ao bom humor que ele manifesta. Geralmente,<br />
é também generoso e apresenta algo<br />
especial que enriquece e engrandece o<br />
ambiente onde está inserido.<br />
Todas estas atividades serão melhor trabalhadas<br />
com a turma reduzida.<br />
Com a finalidade de estabelecer uma discussão<br />
construtiva, com todos aqueles envolvidos neste<br />
contexto, e o objetivo de contribuir para que<br />
o impacto da dificuldade de aprendizado seja<br />
minimizado junto a nossa população infantojuvenil,<br />
através de maior detecção de casos e<br />
por um adequado encaminhamento de propostas<br />
com maior teor científico e menos as crenças<br />
populares, a importância de um trabalho<br />
multidisciplinar.<br />
Por isso, este tema não é simplesmente um<br />
conjunto de distúrbios, mas um álbum de família,<br />
cuja cada unidade estará captando sua<br />
própria verdade e desafiando a essência da<br />
humanidade.<br />
104<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
O pediatra e a escola<br />
O Pediatra, a<br />
Escola e a Creche<br />
MÉRCIA LAMENHA MEDEIROS SANTOS<br />
O conceito de saúde vem sendo modificado com<br />
as alterações observadas no cotidiano. A saúde<br />
que é uma das esferas da vida não pode permanecer<br />
fora das mudanças na sociedade. As<br />
mudanças econômicas, sociais, políticas e culturais<br />
que ocorreram no mundo desde o século<br />
XIX, e que se intensificaram no XX produziram<br />
alterações no estilo de vida, no comportamento,<br />
no meio ambiente, nas possibilidades de<br />
lazer, nas condições de trabalho, nas moradias,<br />
na alimentação o que determina um outro<br />
modo de pensar a medicina, as políticas na<br />
saúde e educação 1 .<br />
A pediatria como ramo da medicina era fundamentada<br />
no componente biológico, portanto<br />
tinha como instrumento práticas de normas e<br />
prescrições. Com a ampliação do conceito de<br />
saúde e da compreensão do é ser criança, vem<br />
modificando suas ações de atenção a saúde e a<br />
própria prática pediátrica.<br />
O cuidar do desenvolvimento e do crescimento<br />
infantil está entre as atribuições pediátricas em<br />
especial da puericultura. A saúde escolar foi responsabilizada<br />
foi responsabilizada por cuidar do<br />
grupo etário, entre 6 e 10 anos, que é considerada<br />
como a de menor adoecimento portanto<br />
que menos freqüentam os serviços de saúde,<br />
ultrapassaram a fase de maior vulnerabilidade<br />
e que eram vistos como prioridade nas políticas<br />
públicas de saúde.<br />
Associar o termo escolar à presença na escola<br />
amplia a área de atuação, visto que a ida a<br />
escola tem ocorrido cada vez mais cedo, 0 aos<br />
3 anos nas creches, 3 aos 5 no ensino infantil,<br />
6 aos 10 no ensino fundamental, maiores de 11<br />
no fundamental e médio, e se prolongado pela<br />
chegada nas faculdades ainda durante a adolescência.<br />
O olhar da saúde escolar deve ser ampliado para<br />
além da escola formal, sem perder como meta<br />
que todas as crianças devem estar nas escolas,<br />
visto que a Lei de Diretrizes de Bases da Educação<br />
Nacional, artigo 1 o , decretou que a educação<br />
deve abranger os processos formativos que<br />
se desenvolvem em todos os espaços de convivência<br />
humana e deverá vincular-se ao mundo<br />
do trabalho e às práticas sociais (BRASIL,1996).<br />
A aproximação da saúde e da educação é necessária<br />
para favorecer um melhor atendimento<br />
a infância e adolescência. O estimulo a participação<br />
de todos os setores envolvidos para<br />
compreender as dificuldades no processo de<br />
aprendizagem, pode levar a rever posturas rígidas,<br />
estimular a construção de novos conhecimentos,<br />
de preferência com ações intersetoriais<br />
e interinstitucionais.<br />
O entendimento que a escola é um espaço<br />
favorável para a construção de indivíduos mais<br />
conscientes e saudáveis, que é o local onde as<br />
pessoas estão disponíveis para aprender e socializar<br />
seus conhecimentos. A saúde precisa identificar<br />
essa oportunidade mas deve entender que<br />
a escola não é constituída por atores passivos,<br />
que se submetem a determinações, imposições,<br />
obediência de normas e ordens, regras de saúde<br />
que não nem sempre têm significados para si.<br />
Os profissionais de saúde não devem atuar com<br />
o olhar na assistência, com o objetivo de substituir<br />
o sistema de saúde, seja ele público ou<br />
privado.<br />
A presença física e constante do profissional de<br />
saúde na escola não é obrigatória, porém ter<br />
como consultoria, com o olhar da promoção da<br />
saúde será muito válido.<br />
A observação do ambiente escolar com condições<br />
favoráveis e atividades que proporcionem<br />
criação de hábitos saudáveis. De acordo com<br />
faixas etárias existem cuidados de higiene específicos,<br />
quantidade de professores e auxiliares<br />
por número de alunos, número de alunos por<br />
sala, ventilação, iluminação, notificação de quadros<br />
infecciosos, estabelecimento de critérios de<br />
permanência e de afastamento no ambiente<br />
escolar que precisam ser observados.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 105
O pediatra e a escola<br />
Aspectos do desenvolvimento infantil precisam<br />
ser respeitados, fases de isolamento, exploração<br />
do meio, autonomia, formação de hábitos, construção<br />
de identidade, para que ocorra de forma<br />
saudável, a promoção da segurança é fundamental<br />
desde a estruturação do prédio até a<br />
conservação do mesmo.<br />
Durante o processo de escolha da creche e escola<br />
o pediatra pode ser consultado, até pela<br />
forte aproximação que o pediatra tem com a<br />
família. Para atender algumas questões são<br />
necessários conhecimentos na área pedagógica,<br />
para possibilitar uma avaliação. Há valorização<br />
dos professores pela direção, quais as relações<br />
com os professores e entre eles, qualidade da<br />
proposta pedagógica, as crianças e adolescentes<br />
têm oportunidade de brincar, de se expressar<br />
oral e corporalmente.<br />
Deve-se sugerir aos pais visitar a instituição em<br />
horário de funcionamento normal, conferir a<br />
veracidade das informações, compreensão dos<br />
educadores sobre as dificuldades sentidas pela<br />
família nesse momento de separação, a proximidade<br />
da casa pode ser um fator em virtude<br />
do trânsito e da violência no entorno.<br />
Nas escolas públicas esses aspectos precisam<br />
ser considerados para que sejam obtidos melhores<br />
índices de aprendizagem e redução da<br />
evasão.<br />
Para que tenhamos o desenvolvimento do ser<br />
humano em todos seus aspectos, é importante<br />
a aproximação saúde e educação, a participação<br />
social, a intensificação de parcerias, deve-se<br />
valorizar ações interdisciplinares, investimento<br />
em educação continuada para os técnicos. Com<br />
o foco na educação preventiva e nas ações de<br />
promoção de saúde valorizando os hábitos e<br />
culturas regionais.<br />
<strong>Referências</strong> <strong>Bibliográficas</strong><br />
01. SBP. Sociedade Brasileira de Pediatria. Departamento<br />
de Saúde Escolar. Tratado de Pediatria.<br />
Editora Manole, 2007.<br />
02. SBP. Sociedade Brasileira de Pediatria. Departamento<br />
de Saúde Escolar. Escola Promotora de<br />
Saúde, 2005.<br />
03. Nigro, José Augusto. Saúde Escolar. A Criança, a Vida<br />
e a Escola. Editora Sarvier, 1994.<br />
Prevenção de<br />
Acidentes no<br />
Ambiente Escolar<br />
CARLOS EDUARDO NERY PAES<br />
106<br />
A utilização de medidas para a promoção<br />
da saúde encontra no ambiente escolar um<br />
dos mais férteis espaços para sua aplicação.<br />
A escola é um espaço privilegiado para o aprendizado<br />
de práticas educativas em saúde, com<br />
potenciais para desenvolver habilidades e atitudes,<br />
integração entre pessoas e comunidades<br />
e formulação de propostas que tenham<br />
como conseqüência a mudança de atitudes e<br />
a integração para a transformação do sujeito.<br />
Na escola é possível o desenvolvimento de práticas<br />
que transformem o ambiente em um<br />
espaço seguro, pois o desenvolvimento do ser<br />
humano passa pelo conhecimento e sua aplicação<br />
nos variados campos do saber.<br />
A segurança das crianças e dos adolescentes deve<br />
ser encarada como uma prioridade para o pediatra<br />
e para todos os profissionais de saúde.<br />
Os acidentes e a violência física constituem um<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
O pediatra e a escola<br />
grande problema de saúde pública em todo<br />
o mundo, especialmente nos países pobres, sendo<br />
responsável por mais de 5 milhões de óbitos<br />
ao ano (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2004).<br />
As causas externas constituem a principal causa<br />
de óbito entre crianças e adolescentes no país,<br />
com mais de 22% do total dos óbitos de pessoas<br />
entre zero e 19 anos de idade (BRASIL, 2005).<br />
Em 2006, foram realizadas 218 mil internações<br />
para atendimento a esses agravos, implicando<br />
em óbitos, seqüelas temporárias ou definitivas<br />
e perda de anos de vida saudável (BRASIL, 2006).<br />
Por isso, é evidente a importância da prevenção<br />
de eventos traumáticos na faixa etária escolar.<br />
No Brasil, 36,6% das crianças de zero a seis anos,<br />
96,9% das de 7 a 14 anos, e 81,5% dos indivíduos<br />
entre 15 e 17 anos freqüentam a escola (IBGE,<br />
2003). Isso representa 45 milhões de crianças e<br />
jovens que passam grande parte de seu dia<br />
dentro do ambiente escolar, e com trajetos de<br />
destino entre sua residência e o local de estudo.<br />
Dentre os fatores de risco apontados pela Unicef,<br />
destacam-se a pobreza, filhos de mãe solteira<br />
e jovem, baixo risco de educação materna, habitações<br />
pobres, famílias numerosas e uso de<br />
álcool e drogas pelos pais (BLANK, 2004). Este<br />
perfil, ligado a variáveis ambientais, culturais e<br />
principalmente socioeconômicas, devem ser<br />
identificados pelos pais, pelo Estado e pelos<br />
cuidadores diversos, dentre eles o pediatra<br />
(MACIEL & PAES, 2004).<br />
medida em que a criança aumenta sua idade,<br />
vai se expondo mais ao ambiente, aumentando<br />
os riscos de injúrias, especialmente havendo<br />
baixo controle sobre a mesma (ZUCKERMAN &<br />
DUBY, 1985). Neste período, é importante que a<br />
criança esteja envolvida em processos de construção<br />
de regras ou combinações e, dentro de<br />
limites seguros, aprenda com suas próprias experiências,<br />
aumentando gradualmente as responsabilidades<br />
(OVERBY, 1996).<br />
A adolescência é uma fase em que ocorre a<br />
combinação de comportamentos de risco com<br />
várias alterações fisiológicas (IRWIN et al.,<br />
1992). Em sua fase inicial, de dez a treze anos<br />
de idade, a adolescência propicia o surgimento<br />
de condutas impulsivas, se que haja capacidade<br />
para entender a etiologia de suas atitudes<br />
(IRWIN, 1996). Esse comportamento é conseqüência<br />
de quatro grupos de modificações que<br />
envolvem a área cognitiva (egocentrismo e perspectiva<br />
de futuro), percepções sobre o eu (identidade,<br />
auto-imagem), do ambiente social<br />
(apoio, controle e influência dos pais e de seus<br />
pares) e valores individuais (independência,<br />
afeto e capacidade de realização). Os dois<br />
primeiros levam a alterações sobre a percepção<br />
de risco. Essas tendências, associadas à<br />
necessidade de experimentação, e a pressão<br />
de crescer e de imitar os demais membros do<br />
grupo, aumentam a exposição a danos físicos<br />
(ZUCKERMAN & DUBY, 1985).<br />
O desenvolvimento da criança<br />
e a ocorrência de injúrias<br />
Na idade escolar, ocorrem várias mudanças no<br />
desenvolvimento cognitivo e motor. Sua prioridade<br />
passa a ser a aceitação social. Tende a ser<br />
destemida e aventureira, com a sensação que,<br />
com isso, passará a ser livre. Tende a desafiar<br />
regras e a tentar convencer os pais quanto à<br />
sua competência. Está na transição do pensamento<br />
pré-operacional para o operacional-concreto.<br />
Por isso, não havendo um entendimento<br />
completo das relações causais, pode tentar certas<br />
atividades sem um planejamento detalhado<br />
e sem pensar em todas as possibilidades. Na<br />
Abordagem geral<br />
Para a constituição de práticas eficazes de proteção<br />
física contra injúrias não intencionais,<br />
deve-se atuar de forma integrada em diversos<br />
aspectos.<br />
A adoção de medidas de prevenção primária,<br />
reduzindo a transferência de energia sobre a<br />
vítima, como a colocação de antiderrapantes nas<br />
escadas, reduzem a ocorrência de acidentes<br />
e seus impactos (OLIVEIRA, 2003). Conjuntamente,<br />
devemos aplicar medidas de prevenção<br />
secundária, para atenção ao indivíduo vitimado,<br />
e terciárias, com medidas de reabilitação,<br />
para que a pessoa possa voltar o mais<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 107
O pediatra e a escola<br />
próximo possível ao seu estado anterior ao<br />
evento traumático (LIBERAL, 2005).<br />
A integração entre os segmentos escolares,<br />
abordagens sobre o ambiente físico e social, as<br />
práticas pedagógicas e diversas outras ações<br />
são necessárias para termos efetividade no trabalho<br />
de promoção da saúde e prevenção de<br />
agravos não intencionais. Segundo o Instituto<br />
Nacional para Segurança e Saúde Ocupacional,<br />
do Centro para o Controle e Prevenção de<br />
Doenças dos Estados Unidos da América, é<br />
necessária a utilização de um programa de<br />
segurança escolar pode beneficiar segundo desenvolvendo<br />
várias iniciativas (CDC, 2006):<br />
– melhorar o ambiente de segurança e de saúde<br />
na escola;<br />
– impedir a ocorrência de acidentes entre os<br />
estudantes;<br />
– aumentar ocupacional e segurança e saúde e<br />
consciência ambiental de segurança na escola;<br />
– identificar um programa de checagem que<br />
possa ajudar a professores fazer uma análise<br />
de riscos de segurança e de saúde para cada<br />
sala de aula e laboratório;<br />
– detectar as áreas que necessitam a melhoria<br />
na segurança da escola e a saúde ocupacional<br />
e os programas ambientais da saúde;<br />
– encontrar fontes para mais informação sobre<br />
regulamentos, o auxílio técnico, e materiais<br />
educacionais.<br />
Além disso, a contextualização dos aspectos<br />
preventivos deve abordar os seguintes itens<br />
(LIBERAL et al., 2004):<br />
1. Ambiente Social: a comunidade escolar deve<br />
elaborar princípios que estabeleçam ambientes<br />
sociais que promovam segurança e previnam<br />
lesões, como a criação de Comissões de<br />
Prevenção de Acidentes e Violência Escolar<br />
(CIPAVEs);<br />
2. Ambiente Físico: a escola deve oferecer ambiente<br />
físico interno e externo que promova<br />
segurança e previna injúrias físicas; os funcionários,<br />
professores e alunos devem estar<br />
engajados na identificação de situações que<br />
aumentem a vulnerabilidade;<br />
3. Educação em Saúde: os alunos devem trabalhar<br />
conceitos e atitudes de promoção da<br />
saúde e de segurança, aumentando sua confiança<br />
e mudando estilos de vida inseguros;<br />
4. Educação Física e Atividades Extracurriculares:<br />
além das oportunidades para o ensino<br />
da promoção e prevenção em saúde, deve-se<br />
reforçar regras de segurança, inclusive nas práticas<br />
desportivas, com eventuais modificações<br />
de regras de jogos para redução de riscos;<br />
5. Serviços de Saúde: construir com os alunos<br />
cadernetas de registro de eventos, nos quais<br />
os acidentes de trajeto, e no ambiente escolar<br />
sejam devidamente registrados e analisados<br />
periodicamente;<br />
6. Plano de Catástrofes: devem ser executados<br />
periodicamente ações para comportamentos<br />
coletivos adequados em situações de risco,<br />
como tempestades, incêndios e outras situações<br />
identificadas localmente e que possam<br />
colocar em risco os alunos e o ambiente da<br />
escola;<br />
7. Integração de Esforços da Família, Escola e<br />
Comunidade: além de atividades extracurriculares,<br />
a escola deve estar aberta para a participação<br />
da comunidade e das famílias, atuando<br />
conjuntamente na prevenção de acidentes;<br />
8. Desenvolvimento dos Funcionários: a escola<br />
deve capacitar seus funcionários para a identificação<br />
de situações e comportamentos de<br />
risco, análise ambiental e condutas em situações<br />
relacionadas a acidentes; também deve<br />
ter canal de comunicação com serviços de atendimento<br />
a traumas e serviços de urgência.<br />
O relacionamento entre pais, professores, alunos,<br />
funcionários e a comunidade local são<br />
essenciais para o sucesso de medidas protetoras.<br />
Cabe à escola ter um papel ativo de<br />
mobilização dos setores da comunidade<br />
escolar, discutindo problemas, identificando<br />
alternativas e tomando decisões.<br />
De outro lado, é importante que os pais conheçam<br />
os aspectos que envolvem o aumento da<br />
vulnerabilidade da criança com relação à ocorrência<br />
de injúrias físicas, atuando para minimizá-los<br />
ou eliminá-los.<br />
108<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
O pediatra e a escola<br />
Outros pontos de análise<br />
Por fim, a avaliação de aspectos físicos é importante<br />
como um dos pontos de análise, mas deve<br />
ser contextualizada com as demais ações que<br />
devem ser desenvolvidas para a promoção da<br />
saúde e proteção vital na escola.<br />
Os aspectos gerais de segurança envolvem o<br />
padrão predial da escola: a conservação geral,<br />
a acessibilidade para portadores de deficiências,<br />
a iluminação, a ventilação, a integridade<br />
do piso, a existência de fiação elétrica visível e<br />
a rede de água e esgoto. Estes aspectos estão<br />
diretamente relacionados ao cumprimento da<br />
legislação municipal respectiva.<br />
Além desses, devem ser avaliados especialmente<br />
os meios de acesso. As escadas devem<br />
possuir piso antiderrapante, degraus entre 30 e<br />
150 cm de largura (além dessa largura, deve<br />
possuir corrimão medial, para evitar quedas).<br />
As portas devem possuir mecanismos para evitar<br />
o fechamento brusco, abrindo-se sempre<br />
para fora. Os sanitários, além de necessitarem<br />
ser divididos por sexo e faixa etária e para portadores<br />
de deficiência física, também devem ser<br />
de uso exclusivo dos alunos, com sanitários<br />
específicos para adultos em outra área (HARADA,<br />
KATAYAMA & PEDROSO, 2005).<br />
As áreas de recreação e de práticas desportivas<br />
devem merecer um cuidado especial. Elas são<br />
os locais onde mais ocorrem traumatismos. Na<br />
Austrália, um estudo sobre a freqüência de acidentes<br />
em equipamentos de playground em<br />
escolas públicas e parques revelou que brinquedos<br />
do tipo trepa-trepa, escada horizontal e<br />
escorregador, que seguem padrões dentro das<br />
normas de segurança (como a altura de acordo<br />
com a idade do público), contribuíram para a<br />
redução dos índices de acidentes (NIXON, 2003).<br />
A avaliação do entorno da escola é essencial.<br />
Deve-se observar a existência de semáforos,<br />
faixas de segurança e áreas de proteção para<br />
escolares. Além disso, o processo de embarque<br />
e desembarque dos alunos, com condições de<br />
segurança. No Brasil, em 2005, 40% dos óbitos<br />
por causas externas ocorridos entre 5 e 14 anos<br />
de idade foram em conseqüência de acidentes<br />
de transporte (BRASIL, 2005). Para a ocorrência<br />
da redução desses eventos, deverão ser adotadas<br />
intervenções que abordem, prioritariamente,<br />
três categorias: o controle de velocidade veicular,<br />
a separação entre veículos e pedestres, e<br />
medidas que aumentem a visibilidade dos pedestres<br />
(RETTING, FERGUSON & MCCARTT, 2003).<br />
Conclusão<br />
Considerando o contexto, que envolve múltiplas<br />
variáveis, e que causam um impacto severo<br />
sobre o perfil de morbimortalidade entre as<br />
crianças e os jovens brasileiros, a ação do pediatra<br />
pode contribuir para a redução da ocorrência<br />
de injúrias físicas não intencionais, e<br />
também as intencionais, no ambiente escolar e<br />
em seu entorno. Para isso, será essencial exploração<br />
de aspectos relacionados às características<br />
individuais, familiares e do ambiente no qual<br />
faremos intervenções.<br />
É necessário olhar para as interações entre<br />
as crianças, e destas com suas famílias, com a<br />
vizinhança e a comunidade onde vivem, sua<br />
cultura, sua etnia e seu grupo social. A atuação<br />
interdisciplinar, com a contribuição de idéias<br />
características de cada área pode levar ao desenvolvimento<br />
de inovações que reduzam as<br />
injúrias (RIVARA, 2002). Por isso, o papel do<br />
pediatra é essencial como um dos vértices da<br />
ação conjugada entre os setores citados.<br />
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O pediatra e a escola<br />
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110<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Adolescência<br />
Diagnóstico de<br />
Puberdade Precoce<br />
MARILZA LEAL NASCIMENTO<br />
A definição de puberdade normal tem sido<br />
muito discutida nos últimos anos. Estudos<br />
atuais demonstram que a puberdade normal<br />
tem inicio mais precoce do que antes suposto.<br />
Em virtude dos transtornos causados pela puberdade<br />
precoce, torna-se importante definirmos<br />
claramente quando estamos diante de uma<br />
puberdade precoce ou apenas de variações<br />
normais da puberdade.<br />
Conforme a definição clássica de Tanner, a puberdade<br />
é normal quando os caracteres sexuais<br />
secundários iniciam entre 8 e 13 anos nas meninas<br />
e entre 9 e 14 anos nos meninos.<br />
Puberdade precoce é o aparecimento de broto<br />
mamário e ou de pêlos pubianos antes dos 8<br />
anos de idade ou menarca antes dos 9 anos e<br />
meio nas meninas e de pêlos pubiano estágio II<br />
de Tanner ou volume testicular maior que 3cm 3<br />
ou tamanho testicular maior que 2,5 cm no<br />
maior eixo antes dos nove anos em meninos.<br />
Tem sido descrito um subgrupo de meninas<br />
normais que iniciam a puberdade mais cedo<br />
(entre 6 e 8 anos), e que progridem lentamente<br />
ou apresentam involução dos sinais puberais,<br />
sem repercussão sobre a idade da menarca ou<br />
sobre a estatura final. Representa uma aceleração<br />
constitucional do crescimento e puberdade<br />
e não determina perda da estatura final prevista,<br />
mesmo quando comparada ao padrão<br />
familial. A necessidade de investigação e o uso<br />
de medicamentos neste grupo, deve estar na<br />
dependência não apenas do simples aparecimento<br />
de sinais puberais, mas da velocidade<br />
de progressão deste e do potencial comprometimento<br />
da estatura final. Esta situação requer<br />
seguimento clínico cuidadoso.<br />
A presença de sintomas específicos ou de repercussões<br />
psicossociais secundárias ao início<br />
puberal precoce, representam aspectos importantes<br />
na decisão de investigar e tratar.<br />
O ritmo evolutivo dos sinais puberais é um<br />
aspecto extremamente importante. Uma puberdade<br />
que evolua muito rapidamente, mesmo<br />
em idade normal, pode ser patológica e merece<br />
alguma investigação. Em média, o intervalo<br />
entre dois estágios puberais é de 1 ano, sendo<br />
que intervalos inferiores a 6 meses devem ser<br />
considerados anormais e podem indicar puberdade<br />
patológica.<br />
Sinais puberais isolados (pubarca ou telarca)<br />
podem estar presentes em idade abaixo dos 8<br />
anos, sem que haja associação com aumento<br />
significante da velocidade de crescimento (VC)<br />
ou da idade óssea (IO), caracterizando variantes<br />
incompletas idiopáticas, como a adrenarca prematura<br />
e a telarca prematura. Estas situações<br />
não têm indicação de tratamento por não comprometerem<br />
a estatura final.<br />
Não existem evidências de que a antecipação<br />
puberal detectada no sexo feminino esteja também<br />
ocorrendo no sexo masculino. Nos meninos,<br />
o limite inferior considerado normal para<br />
início da puberdade permanece aos 9 anos.<br />
A Puberdade Precoce (PP) pode ser verdadeira<br />
ou GnRH (Hormônio Liberador de Gonadotrofinas)-dependente.<br />
E também pode ser periférica<br />
ou GnRH-independente.<br />
Na PP GnRH-dependente, também chamada de<br />
Puberdade Precoce Central (PPC), o aparecimento<br />
dos sinais puberais é secundário à ativação<br />
do eixo hipotalâmico-hipofisário-gonadal, sendo<br />
o mais freqüente mecanismo desencadeador<br />
do desenvolvimento puberal precoce. Em meninas<br />
a reativação precoce dos pulsos de GnRH é<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 111
Adolescência<br />
idiopática em 95% dos casos, enquanto nos<br />
meninos, menos de 50% é de etiologia<br />
indeterminada.<br />
A puberdade precoce GnRH-dependente cursa<br />
com progressão dos caracteres puberais, aumento<br />
significante da velocidade de crescimento e<br />
avanço desproporcional da idade óssea, determinando<br />
redução da estatura final prevista.<br />
A idade de início é muito variável, e em parte<br />
dependente da causa do processo. Quando se<br />
manifesta entre os 6 e 8 anos de idade, apresenta<br />
caráter rapidamente progressivo. Diferente<br />
do quadro de aceleração constitucional do<br />
crescimento e puberdade.<br />
As anormalidades responsáveis pela PPC incluem<br />
tumores hipotalâmicos (hamartomas,<br />
astrocitomas, neurofibromas), hidrocefalia,<br />
traumatismo crânio-encefálico, anóxia perinatal,<br />
quimioterapia, e/ou radioterapia do sistema<br />
nervoso central (SNC), síndromes convulsivas,<br />
infecções do SNC ou ainda maturação<br />
hipotalâmica secundária à exposição precoce aos<br />
esteróides sexuais endógenos ou exógenos.<br />
A PPC deve ser diferenciada da PP periférica<br />
devido a produção autônoma de esteróides sexuais<br />
pelas gônadas ou pela glândula adrenal<br />
ou exposição ao hormônio gonadotrofina<br />
coriônica (HGC) produzida por tumores.<br />
O diagnóstico de PP é clínico. Deve-se considerar,<br />
além do aparecimento dos caracteres sexuais<br />
secundários, a velocidade de progressão<br />
dos mesmos para os estágios subseqüentes de<br />
Tanner. A curva de crescimento é elemento de<br />
fundamental importância, A estatura na puberdade<br />
precoce geralmente está acima do canal<br />
familiar e a velocidade de crescimento costuma<br />
estar aumentada para a faixa etária.<br />
A elevação significante do hormônio luteinizante<br />
(LH), basal ou após GnRH, caracteriza a puberdade<br />
como de origem central ou GnRH-dependente,<br />
implicando que o eixo hipotalâmicohipofisário-gonadal<br />
esteja ativado. Para que o<br />
aumento do LH seja considerado significante,<br />
deve-se verificar o tipo de ensaio utilizado na<br />
sua quantificação. Nos ensaios imunorradiométricos<br />
(IRME), o limite foi estimado em 10mU/mL.<br />
112<br />
Ensaios utilizando o método imunofluorimétrico<br />
(IFME) apresentam valores de corte mais baixos<br />
e diferentes para os dois sexos, sendo de 9,6mU/<br />
mL nos meninos e de 6,9mU/mL nas meninas.<br />
Devido à sua especificidade e alta sensibilidade,<br />
o IFME parece ser capaz de reconhecer o<br />
início da puberdade mesmo com medidas em<br />
condições basais, onde se observam valores de<br />
LH > 0,6mU/mL. Quanto aos esteróides sexuais,<br />
a elevação persistente da testosterona em meninos<br />
(IFME > 19ng/dL; RIE > 30ng/dL) é um<br />
dado adicional bastante útil e freqüentemente<br />
associado a volume testicular acima de 3cm 3 .<br />
Níveis pré-puberais de testosterona excluem o<br />
diagnóstico de puberdade precoce nos meninos.<br />
O mesmo não ocorre nas meninas onde<br />
valores baixos de estradiol não são capazes de<br />
afastar esse diagnóstico. Apenas, valores póspuberais<br />
desse hormônio, são indicativos de<br />
estímulo gonadal.<br />
Em situações em que apenas virilização esteja<br />
presente, sendo no menino sem aumento de<br />
volume testicular sugerindo PP Periférica ou<br />
GnRH-independente, 17OH progesterona, composto<br />
S, dehidroepiandrosterona e androstenediona<br />
devem ser solicitados para diagnóstico de<br />
hiperplasia adrenal congênita. Quando se suspeita<br />
de um tumor adrenal, o sulfato de<br />
dehidroepiandrosterona (DHEAS) é um excelente<br />
marcador, com níveis muito elevados.<br />
Tumores feminizantes de adrenal, que poderiam<br />
ocasionar PP Periférica isossexual<br />
em meninas, são extremamente raros. Tumores<br />
produtores de gonadotrofina coriônica (hepatoblastoma,<br />
germinoma) são detectados pelos<br />
elevados níveis desta glicoproteína.<br />
Em meninos, na presença de virilização com<br />
aumento testicular unilateral, o diagnóstico<br />
provavelmente é tumor de testículo.<br />
Uma situação especial são os casos de<br />
hipotireoidismo primário graves, em quem os<br />
níveis muito elevados de TRH, TSH e prolactina<br />
sensibilizam os receptores gonadais de<br />
gonadotrofinas e desencadeiam puberdade,<br />
esta é a única situação em que a puberdade<br />
precoce se acompanha de desaceleração do<br />
crescimento.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Adolescência<br />
A idade óssea (IO) tem sido o exame inicial de<br />
imagem solicitado. Geralmente está avançada<br />
em relação a idade cronológica.<br />
Os métodos de imagem são de grande importância<br />
na investigação da etiologia do processo.<br />
A ultra-sonografia (USG) pélvica e abdominal é um<br />
método simples, rápido e não invasivo na triagem<br />
inicial de cistos ou tumores gonadais e adrenais.<br />
O volume ovariano aumenta de menos de 1ml<br />
a mais de 2,5ml na puberdade e o volume<br />
uterino aumenta mais acentuadamente. Volume<br />
uterino superior a 4ml é indicativo de puberdade.<br />
A presença de cistos ovarianos pode<br />
ser encontrada em toda a infância, mesmo em<br />
períodos pré-puberais. Macrocistos (superiores<br />
a 1cm de diâmetro) persistentes podem indicar<br />
que eles sejam a origem da produção hormonal.<br />
Em situações em que os ovários estão ativados<br />
por mutação da proteína G (Síndrome de<br />
McCune Albright), cistos ovarianos são encontrados<br />
bilateralmente. Diante dessa possibilidade<br />
diagnóstica, radiografia de esqueleto e/ou<br />
cintilografia óssea pode revelar displasia fibrosa<br />
poliostótica, respaldando o diagnóstico.<br />
Ultrassom de adrenais pode surpreender tumores<br />
adrenais, em geral virilizantes, mas que<br />
podem ser feminizantes e levar a pseudo-puberdade<br />
precoce isossexual em meninas.<br />
A tomografia de alta resolução e especialmente<br />
a ressonância magnética (RM) tem papel fundamental<br />
na avaliação etiológica da puberdade<br />
precoce GnRH-dependente. A RM tem boa<br />
resolução para as regiões do SNC habitualmente<br />
envolvidas no mecanismo desencadeante da<br />
puberdade precoce central, como o hipotálamo,<br />
III e IV ventrículos e a região da pineal, podendo<br />
evidenciar anormalidades não visualizadas<br />
na tomografia convencional. Ressonância magnética<br />
de crânio deve ser solicitada em todos<br />
os meninos com puberdade precoce e em meninas<br />
com menos de 6 anos de idade, devido<br />
à possibilidade de lesões de SNC (tumores,<br />
hamartomas) serem as desencadeantes do processo.<br />
Há dúvida quanto à indicação de RM<br />
em meninas entre 6 e 8 anos de idade, devido<br />
à alta incidência de formas idiopáticas de puberdade<br />
nesta faixa etária. Lembrar que a velocidade<br />
dos eventos puberais deve ser levada<br />
em conta, uma puberdade que progrida rapidamente<br />
pode ser secundária a processo<br />
tumoral. Presença de calcificações intracranianas<br />
podem sugerir infecção congênita,<br />
especialmente se acompanhadas de microcefalia<br />
e coriorretinite (toxoplasmose congênita,<br />
rubéola congênita).<br />
A utilização criteriosa de dados clínicos (história,<br />
exame físico, curva de crescimento), exames<br />
laboratoriais e exames de imagem, permitem<br />
uma abordagem racional que leva ao diagnóstico<br />
de puberdade precoce.<br />
Resumo<br />
Indicações de investigação laboratorial:<br />
Aparecimento de caracteres sexuais secundários<br />
antes dos 8 anos nas meninas e dos 9 anos nos<br />
meninos.<br />
Dados clínicos relevantes na<br />
investigação clínica inicial:<br />
– Investigar uso de andrógenos ou estrógenos.<br />
– Verificar altura e peso do paciente para cálculo<br />
do desvio padrão da altura, IMC e idade<br />
estatural.<br />
– Verificar velocidade de crescimento (cm/ano).<br />
– Altura dos pais para cálculo da estatura alvo.<br />
– Avaliar os caracteres sexuais secundários<br />
(utilizar critérios de Marshall e Tanner).<br />
– Verificar tamanho testicular: Puberal:<br />
> 2,5 cm no maior eixo ou volume > 3 ml.<br />
– Exame pele (pesquisa de manchas de café<br />
com leite – Síndrome de McCune-Albright).<br />
Investigação laboratorial:<br />
1. Dosagens dos níveis basais de LH, FSH, DHEAS e<br />
estradiol (meninas) ou testosterona (meninos).<br />
2. Teste de Estímulo com LHRH (GnRH): Indicado<br />
quando valores basais de LH pré-puberais<br />
estão associados a níveis de testosterona ou<br />
estradiol sugestivos de início de puberdade<br />
(testosterona > 19ng/dl e estradiol > 20,5pg/ml).<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 113
Adolescência<br />
Valores basais de testosterona e estradiol e valores basais e após estímulo com GnRH de LH (IFMA),<br />
que definem puberdade dependente de gonadotrofina:<br />
LH basal Pico LH Testosterona Estradiol<br />
Meninos > 0,6 UI/L > 9,6UI/L > 19ng/dl<br />
Meninas > 0,6UI/L > 6,9UI/L > 20,5pg/ml<br />
3. Raio X de mão e punho (Idade óssea).<br />
4. Ultra-sonografia pélvica (meninas).<br />
Diagnóstico Etiológico<br />
da Puberdade Precoce<br />
1. Dependente de Gonadotrofinas<br />
(GnRH-dependente)<br />
a. Avaliação Laboratorial: Níveis basais e/ou<br />
estimulados de gonadotrofinas puberais.<br />
b. Avaliação Radiológica do SNC: Ressonância<br />
magnética da região hipotalámo-hipofisária<br />
(normal: puberdade precoce idiopática).<br />
2. Independente de Gonadotrofinas<br />
(GnRH-independente)<br />
a. Avaliação Laboratorial:<br />
Níveis basais e estimulados de gonadotrofinas<br />
pré-puberais ou suprimidos.<br />
– Beta HCG (puberdade precoce dependente de<br />
produção tumoral de gonadotrofina anormal:<br />
só ocorre em meninos).<br />
– T4livre/TSH (pesquisa de hipotireoidismo<br />
primário).<br />
– Andrógenos (pesquisa de tumor gonadal ou<br />
adrenal).<br />
– Andrógenos + 17OH progesterona + 11<br />
deoxicortisol + 17Pregnenolona (pesquisa de<br />
hiperplasia adrenal).<br />
– Pesquisar mutações em genes relacionados a<br />
função gonadal. Temos duas possibilidades:<br />
1. Testotoxicose (mutações ativadoras em<br />
genes que codificam o receptor de LH, em<br />
pacientes do sexo masculino.<br />
2. Síndrome de McCune-Albright (mutações na<br />
sub unidade alfa da proteína G).<br />
b. Avaliação radiológica:<br />
Esta é variável e depende dos resultados laboratoriais<br />
prévios:<br />
–Pesquisa de tumores produtores de beta HCG:<br />
RM de crânio (germinoma de pineal), USG/TC<br />
abdominal e (hepatoma ou hepatoblastoma,<br />
tumor retroperitôneo), TC tórax (tumor<br />
mediastino) e USG testicular (tumores).<br />
– Pesquisa de tumores adrenais e gonadais:<br />
USG e/ou TC de adrenal e pélvica.<br />
– Pesquisa da Síndrome de McCune-Albright:<br />
USG pélvica (verificar cistos ovarianos), RX e<br />
cintilografia óssea.<br />
<strong>Referências</strong> <strong>Bibliográficas</strong><br />
01. Kaplowitz PB, Oberfield SE. Reexamination of the<br />
age limit for defining when puberty is precocious in<br />
girls in the United States: implications for evaluation<br />
and treatment. Drug and therapeutics and executive<br />
committees of the Lawson Wilkins Pediatric Endocrine<br />
Society. Pediatrics 1999; 104:936-41.<br />
02. Monte O, Longui CA, Calliari LEP. Puberdade Precoce:<br />
Dilemas no Diagnóstico e Tratamento. Arq Bras<br />
Endocrinol Metab 2001; 45:321-328.<br />
03. Chalumeau M, Chemaitilly W, Trivin C, Adan L,<br />
Bréart G, Brauner R. Central precocious puberty in<br />
girls: an evidence-based diagnosis tree to predict<br />
central nervous system abnormalities. Pediatrics<br />
2002; 109:61-7.<br />
04. Damiani D. Arq Bras Endocrinol Metab 2002;<br />
46:85-90.<br />
05. Chemaitilly W, Trivin C, Adan L, Gall V, Sainte-Rose<br />
C, Brauner R. Central precocious puberty: clinical<br />
and laboratory features. Clin Endocrinol 2001;<br />
54:289-94.<br />
06. Latrônico Xavier AC, Bilharino de Mendonça B.<br />
Protocolos - Puberdade precoce. Disponível em<br />
hptt:/www.fm.usp.<br />
114<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Adolescência<br />
Tratamento da Acne<br />
RUBENS MARCELO SOUZA LEITE<br />
A acne vulgar é uma doença comum e<br />
autolimitada, acometendo regiões ricas em glândulas<br />
sebáceas. Ela se manifesta por seborréia,<br />
queratinização anormal dos folículos pilosos,<br />
com a formação de comedos e subseqüentemente<br />
pápulas inflamatórias, pústulas, abscessos<br />
nodulares e cicatrizes. As regiões de acometimento<br />
preferencial são a face, o tórax e a<br />
região dorsal superior. A doença glandular<br />
possui significância estética importante, o que<br />
explica o estresse emocional observados em<br />
pacientes com acne.<br />
Hereditariedade: A tendência à acne é hereditária,<br />
assim como o tamanho e a atividade das<br />
glândulas sebáceas e a capacidade de produzir<br />
sebo. A herança é influenciada por diversos<br />
genes. Indivíduos com genótipo XXY comumente<br />
têm acne severa, tendo sido sugerido que o gen<br />
Y regularia a função pilosebácea nestes indivíduos,<br />
através de uma produção aberrante de<br />
testosterona, o que implicada numa maior produção<br />
sebácea. Contudo, a significância dessa<br />
relação é desconhecida. Um estudo clínico demonstrou<br />
que 25% das mulheres com acne têm<br />
um dos pais com história de acne, enquanto<br />
57% dos homens com acne apresentam história<br />
paterna ou materna de acne. O mesmo estudo<br />
demonstrou que 40% dos pacientes com acne<br />
não possuem história familiar da doença. Um<br />
outro estudo demonstrou que se ambos os pais<br />
apresentaram acne, a probabilidade de sua prole<br />
apresentar a doença é de 50%. A produção de<br />
sebo também tem caráter hereditário. A produção<br />
sebácea foi demonstrada ser semelhante<br />
entre gêmeos homozigotos, assim como a gravidade<br />
do quadro de acne que venham a apresentar.<br />
Uma explicação para diferentes gravidades<br />
de acne entre diversos pacientes está na<br />
capacidade individual de reagir á bactéria<br />
Propionibacterium acnes (P. acnes) através de<br />
mecanismos imunológicos, produzindo diversos<br />
graus de inflamação.<br />
Glândulas sebáceas: As glândulas sebáceas se<br />
desenvolvem entre a 13ª e 15ª semana de vida<br />
fetal a partir do epitélio folicular primordial.<br />
Essas estruturas não possuem inervação, sendo<br />
o seu controle de atividade primariamente<br />
hormonal. Ao nascimento, essas glândulas são<br />
moderadamente desenvolvidas, presumivelmente<br />
devido ao estímulo hormonal materno,<br />
se tornando progressivamente menores com o<br />
evoluir dos anos. O desenvolvimento glandular<br />
associado com a puberdade já se inicia normalmente<br />
no período escolar da infância. O papel<br />
das glândulas sebáceas é essencial no<br />
surgimento da acne. A acne vulgar ocorre no<br />
folículo sebáceo e este é o sítio do desenvolvimento<br />
de todas as lesões acnêicas. Os ácinos<br />
das glândulas sebáceas produzem um fluido<br />
viscoso, amarelado, conhecido como sebo. Os<br />
seus principais constituintes são glicerídeos e<br />
ácidos graxos (65%), ésteres de cera (25%) e<br />
esqualeno (10%). A bioquímica do sebo difere<br />
entre indivíduos somente quantitativamente,<br />
independente de raça ou compleição física.<br />
A dieta ou nutrição tem pequeno efeito na composição<br />
do sebo. Somente situações de inanição<br />
são capazes de reduzir de forma significativa a<br />
produção sebácea.<br />
O sebo flui livremente entre os ácinos glandulares<br />
e a superfície da pele. A função exata do<br />
sebo é desconhecida. Provavelmente trata-se de<br />
um efeito de proteção e hidratação cutânea,<br />
ambos limitados, e especial significado em climas<br />
secos.<br />
Os pacientes com acne produzem mais quantidade<br />
de sebo que indivíduos sem a doença e a<br />
produção tem relação direta com a gravidade<br />
da acne. A composição do sebo, entretanto, é<br />
igual ao das pessoas sem acne.<br />
O sebo produz substrato para o crescimento do<br />
P. acnes. Da mesma forma, o sebo possui em<br />
sua composição ácidos graxos livres de vários<br />
tamanhos de cadeia que são responsáveis por<br />
um mecanismo de reprodução celular nos<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 115
Adolescência<br />
canalículos glandulares, produzindo o mecanismo<br />
de hiperqueratose necessária para a formação<br />
dos comedos. Da mesma forma, os ácidos<br />
graxos possuem atividade citotóxica folicular,<br />
contribuindo para o surgimento de inflamação.<br />
Outros derivados do sebo, como o peróxido de<br />
esqualeno e o ácido oléico, no infundíbulo<br />
folicular, são também comedogênicos.<br />
O esqualeno também produz, pela sua oxidação,<br />
um ambiente propício para a reprodução<br />
do P. acnes, possuindo efeito pró-inflamatório<br />
direto, da mesma forma que os ácidos graxos.<br />
Microorganismos: A maioria dos folículos<br />
sebáceos é rica em bactérias e em fungos.<br />
Esses microorganismos não são patogênicos e<br />
são residentes permanentes dos folículos<br />
glandulares. O fundo dimorfo Pityrosporum<br />
furfur, o Staphylococcus epidermidis e outros<br />
micrococos são comuns, não possuindo papéis<br />
patogênicos na acne. Nas porções mais profundas<br />
dos folículos são encontradas bactérias<br />
como o P. acnes o P. granulosum e o P. parvum.<br />
As propionibactérias são gram-positivos<br />
difterióides anaeróbicas ou aerotolerantes.<br />
Os P. acnes produzem porfirinas, especialmente<br />
a coproporfirina III que são pró-inflamatórios.<br />
Os P. acnes também produzem inúmeras substâncias<br />
capazes de induzir inflamação, como<br />
lípases, sendo essas bactérias essenciais na<br />
patogênese da acne.<br />
O seu número está aumentado na acne e a<br />
gravidade do quadro guarda relação com a sua<br />
quantidade, assim como a sua redução com a<br />
melhora da doença. O Demodex folliculorum,<br />
um ácaro muitas vezes encontrado em folículos<br />
sebáceos, é raro na adolescência, sendo comum<br />
na meia idade, não é encontrado em lesões<br />
acnêicas e não guarda relação com a acne.<br />
116<br />
Hormônios: O estímulo androgênico é o outro<br />
fator que parece estar diretamente relacionado<br />
à acne. Os andrógenos guardam relação com o<br />
desenvolvimento e a atividade das glândulas<br />
sebáceas. A testosterona e hormônios esteróides<br />
anabolizantes aumentam a taxa de produção<br />
de sebo, enquanto os estrogênios inibem<br />
indiretamente a produção de sebo, via pituitária,<br />
e antiandrogênios sintéticos bloqueiam os receptores<br />
de testosterona no órgão alvo,<br />
ou seja, no folículo sebáceo. Os testículos<br />
produzem testosterona e delta-5-androstenediol.<br />
As adrenais são a maior fonte de dehidroepiandrosterona.<br />
Além disto, o metabolismo da<br />
androstenediona pode produzir testosterona.<br />
As glândulas sebáceas têm receptores para<br />
andrógenos, como por exemplo, para a 5-alfa<br />
dihidrotestosterona. Este hormônio é produzido<br />
por ação da enzima 5-alfa redutase, presente<br />
em abundância nos folículos sebáceos.<br />
A dihidrotestosterona é o andrógeno mais ativo<br />
sobre as glândulas alvo. Em homens e em<br />
mulheres, as glândulas sebáceas são estimuladas<br />
ao máximo mesmo por níveis fisiológicos<br />
de andrógenos. Devido a serem as glândulas<br />
sebáceas dependentes do estímulo androgênico<br />
para o seu desenvolvimento, foi sugerido que o<br />
aumento da atividade glandular sebácea observada<br />
em acne é resultado de disfunção<br />
hormonal envolvendo predominantemente a<br />
produção de andrógenos. Diversos estudos, contudo,<br />
não conseguiram estabelecer um vínculo<br />
obrigatório entre níveis anormais de andrógenos<br />
circulantes e acne. Desta forma, a maioria dos<br />
pacientes com acne possui níveis regulares de<br />
andrógenos circulantes. Contudo, indivíduos com<br />
anormalidades de produção androgênica podem<br />
apresentar acne. Mulheres com hiperplasia ovariana<br />
ou adrenal podem apresentar níveis elevados<br />
de produção androgênica com acne relacionada.<br />
Outros sinais de androgenização como<br />
hirsutismo, alopécia de padrão masculino, anormalidades<br />
menstruais e outros sinais de<br />
virilização podem estar associados. Pacientes<br />
com ovários policísticos como achado isolado<br />
não necessariamente apresentam alterações<br />
hormonais. Contudo, as concentrações séricas<br />
de testosterona, hormônio luiteinizante e<br />
prolactina podem estar elevados em pacientes<br />
com ovários policísticos. Um tumor virilizante<br />
adrenal pode produzir, em mulheres, níveis elevados<br />
de testosterona e dehidroepiandrosterona.<br />
Da mesma, a hiperplasia adrenal congênita pode<br />
levar a quadros de acne grave e refratária ao<br />
tratamento.<br />
A acne pode ser exacerbada por estresse emocional.<br />
A causa poderia estar relacionada a uma<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Adolescência<br />
hiperresponsividade adrenal resultante de ACTH<br />
produzido pelo estresse. Contudo, uma relação<br />
causa-efeito ainda é de difícil explicação.<br />
Formação do comedo: O infundíbulo da<br />
glândula sebácea é um longo ducto recoberto<br />
por queratinócitos. Os queratinócitos produzem<br />
corneócitos que são eliminados pelos lumens<br />
glandulares para a superfície cutânea. O primeiro<br />
sinal detectável de acne é um aumento<br />
anormal na produção de corneócitos, os quais<br />
deixam de ser extrusos das glândulas para o<br />
exterior. O acúmulo desses corneócitos produz<br />
um acúmulo de material, produzindo os<br />
comedos, comedões ou cravos. Os comedos constituem-se<br />
então em um acúmulo empactado de<br />
corneócitos queratinizados e lípides, que dilatam<br />
o folículo. A causa do surgimento desses comedos<br />
é desconhecida, contudo, o sebo pode ser o fator<br />
causador. As bactérias não têm papel nesse<br />
momento da patogênese.<br />
Os comedos são divididos em fechados e abertos.<br />
Os comedos fechados possuem uma abertura<br />
para o exterior pequena, em contraste com<br />
os comedos abertos, e são mais susceptíveis,<br />
com seu crescimento, a gerar ruptura da parede<br />
folicular com extrusão e seu conteúdo para a<br />
derme subjacente, produzindo inflamação. Com<br />
a ruptura do folículo um infiltrado inflamatório<br />
predominantemente neutrofílico ocorre, com<br />
resultante supuração.<br />
Formação de lesões inflamatórias: Pápulas inflamatórias<br />
e nódulos surgem a partir deste<br />
processo inflamatório inicial. Após a ruptura dos<br />
folículos, a presença de P. acnes é demonstrada<br />
a partir da evidencia da presença de bactéria<br />
difterióides fagocitadas no infiltrado inflamatório<br />
da acne, os quais também foram isolados<br />
em culturas de secreção de glândulas sebáceas<br />
alteradas pela acne.<br />
A capacidade de produzir inflamação parece<br />
estar diretamente relacionada à capacidade<br />
de produzir reação à presença do P. acnes.<br />
O P. acnes é capaz de produzir um peptídeo<br />
de baixo peso molecular quimiotático para<br />
polimorfonucleares. Os P. acnes intrafoliculares<br />
são fagocitados com a conseqüente liberação<br />
de enzimas hidrolíticas intra e extracelulares<br />
capazes de produzir distensão da parede dos<br />
folículos e ruptura epitelial. O P. acnes pode<br />
também ativar as vias clássicas e alternativa do<br />
complemento estimulando inflamação.<br />
A capacidade de produzir estímulos inflamatórios<br />
é variável entre diversos indivíduos, sendo<br />
a gravidade do quadro acnêico relacionado a<br />
esta capacidade individual de produzir eventos<br />
que possibilitem a formação do comedo, a ruptura<br />
da parede infundibular e a inflamação.<br />
Terapia da acne: O manejo da acne se relaciona<br />
com as diferentes etapas da formação das<br />
lesões acnêicas.<br />
Diversas substâncias são utilizadas em seu tratamento,<br />
sendo as mais comuns os retinóides<br />
tópicos e sistêmicos, os antimicrobianos tópicos<br />
e orais e a terapia hormonal.<br />
Os retinóides tópicos são substâncias essenciais<br />
para o tratamento da acne. São utilizados há<br />
mais de 30 anos e os principais compostos são<br />
o ácido retinóico, o adapaleno, a isotretinoína e<br />
o tazaroteno. Os retinóides promovem tratamento<br />
por diminuir a adesão celular e alterar a diferenciação<br />
celular epitelial, particularmente<br />
aquelas células da parede folicular, produzindo<br />
um efeito queratolítico. Outras substâncias com<br />
atividade queratolítica menos utilizadas incluem<br />
o ácido salicílico, os alfa hidróxi ácidos e<br />
o ácido azeláico.<br />
Os retinóides sistêmicos são armas de grande<br />
valia no tratamento da acne nodular e de<br />
quadros graves e resistentes. A utilização destas<br />
substâncias, contudo, requer rigor no controle<br />
anticoncepcional. O retinóide sistêmico utilizado<br />
mundialmente para o tratamento da acne<br />
grave é a isotretinoína oral. O seu uso deve<br />
ser realizado por dermatologistas sob controle<br />
laboratorial. Há a possibilidade de eventos<br />
transitórios como hipertrigliceridemia, hipercolesterolemia,<br />
elevação de transaminases, sendo<br />
eventos colaterais importantes raros. Métodos<br />
anticoncepcionais devem ser utilizados em<br />
mulheres em idade fértil, sendo a sua utilização<br />
proibitiva em casos de risco de gestação<br />
durante o período de tratamento, cuja média é<br />
de 5 meses a 1 ano, em utilização de dosagens<br />
internacionalmente recomendadas.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 117
Adolescência<br />
Os antimicrobianos tópicos são a base do tratamento<br />
para a acne inflamatória. O P. acnes é<br />
bastante susceptível à ação de uma grande gama<br />
desses agentes. O peróxido de benzoíla é tradicionalmente<br />
a medicação antimicrobiana tópica<br />
mais utilizada, seguindo-se a eritromicina e a<br />
clindamicina, podendo estes produtos serem<br />
utilizados eventualmente em combinação, particularmente<br />
o peróxido de benzoíla com a<br />
eritromicina ou a clindamicina. Em situações de<br />
maior intensidade das lesões inflamatórias lança-se<br />
mão da utilização de antibióticos orais,<br />
particularmente a tetraciclina, seus derivados<br />
limeciclina, doxicilina e minociclina e, mais raramente,<br />
da eritromicina ou da azitromicina. Os<br />
períodos de tratamento oral para a eliminação<br />
do P. acnes são em torno de 1 a 2 meses, exercendo<br />
também as tetraciclinas, um efeito<br />
imunomodulador na acne inflamatória.<br />
Hormonioterapia é utilizada em situações que<br />
se requeira um controle da ação dos andrógenos<br />
sobre as glândulas sebáceas. Contraceptivos orais<br />
com estrógenos em combinação com<br />
progestágenos de nova geração, com pequeno<br />
poder pró-seborrêico são as substâncias de eleição.<br />
Eventualmente antiandrogênios como a<br />
espironolactona, o acetato de ciproterona e a<br />
flutamida, esta última associada a raros, contudo<br />
graves episódios de hepatopatia, são de corrente<br />
uso.<br />
Sendo a acne uma doença multifatorial, a combinação<br />
de métodos terapêuticos é a regra: O<br />
controle da produção sebácea, da formação dos<br />
comedos, a redução da colonização bacteriana<br />
e a produção de hormônios andrógenos são os<br />
campos de atuação das medicações existentes.<br />
A acne é uma doença relacionada aos folículos<br />
sebáceos que atinge mais comumente adolescentes,<br />
pela natural associação de fatores genético-hormonais<br />
nesta fase da vida. Como a acne<br />
ocorre em um momento muito especial da formação<br />
do ser humano: a adolescência, situações<br />
psíquicas importantes podem ocorrer relacionadas<br />
á doença. Os familiares, os médicos e<br />
particularmente o pediatra devem estar atentos<br />
a estes fatos, encaminhando o paciente com<br />
acne para tratamento assim que ocorrer o desencadeamento<br />
da doença e realizando o acompanhamento<br />
do adolescente estimulando-o à<br />
adesão adequada ao tratamento. O entendimento<br />
da fisiopatologia da acne e da importância<br />
da doença nessa faixa etária são imprescindíveis<br />
para o sucesso terapêutico.<br />
Anabolizantes<br />
ARY LOPES CARDOSO<br />
O culto ao corpo ideal envolve discussões em<br />
diversas áreas de atuação do homem moderno.<br />
O corpo é considerado um objeto que pode<br />
118<br />
ser modelado, e as modificações que ele pode<br />
sofrer são comentadas e discutidas nos mais<br />
diferentes meios de comunicação existentes<br />
no planeta.<br />
Os anabolizantes são considerados como um dos<br />
principais instrumentos utilizados no trabalho<br />
de modelar o corpo. São produtos pouco<br />
dispendiosos, acessíveis a todos e cujos efeitos<br />
podem ser observados em pouco tempo. Muitos<br />
jovens adolescentes e atletas têm recorrido<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Adolescência<br />
a eles não só para melhorar o desempenho<br />
esportivo, mas também para obter um corpo<br />
mais bem delineado, mais atraente e que lhes<br />
possa trazer melhoria na auto-estima.<br />
O resultado do uso indiscriminado dessas drogas,<br />
ao lado das anfetaminas, álcool, cafeína, e<br />
diversos outros agentes dopantes vêm sendo<br />
observados com muita preocupação pela Medicina,<br />
Psicologia, Educação, Órgãos Sociais e Preventivos<br />
de todos os países. Esforços vêm sendo<br />
desenvolvidos no sentido de organizar projetos<br />
preventivos e terapêuticos que possam eliminar<br />
ou diminuir os desastres conseqüentes ao uso<br />
indiscriminado dessas substâncias.<br />
Neste espaço vamos nos deter a examinar os<br />
anabolizantes. São substâncias que compreendem<br />
uma variedade enorme de agentes<br />
farmacológicos que tem efeito de aumentar a<br />
força, a destreza e o desempenho de quem usa.<br />
É interessante comentar que a grande maioria<br />
dos usuários são atletas extremamente preocupados<br />
com seus treinos, suas possíveis contusões<br />
e com sua alimentação. Pecam por excesso<br />
de cuidados nessas áreas, e, no entanto utilizam<br />
as substâncias dopantes sem orientação e<br />
sem o mínimo cuidado com os efeitos colaterais<br />
potenciais.<br />
Definição<br />
Os esteróides hormonais são sintetizados e liberados<br />
pelo córtex das glândulas supra-renais.<br />
Essa secreção é controlada pela liberação<br />
hipofisária de corticotropina (ACTH). Eles podem<br />
ser classificados em: glicocorticóides que exercem<br />
funções importantes no metabolismo intermediário,<br />
mineralocorticóides, que exercem<br />
atividade de retenção de sal, e aqueles que<br />
possuem atividade androgênica, representados<br />
pela testosterona (5% da produção é feita pelas<br />
adrenais).<br />
A maior parte da testosterona, que representa o<br />
principal andrógeno, é produzida pelos testículos<br />
(95%). A testosterona e os seus derivados,<br />
dihidrotestosterona e androstenediona, representam<br />
os principais anabolizantes androgênicos<br />
produzidos no organismo.<br />
A produção diária de testosterona é de 4 a<br />
10 mg.<br />
A síntese de testosterona ocorreu em 1935 e o<br />
seu uso, na época era principalmente por soldados<br />
para adquirir mais agressividade.<br />
Na década de 50, iniciou-se entre os halterofilistas<br />
e fisiculturistas o uso ilícito dos<br />
anabolizantes entre os esportistas.<br />
Por questões éticas e pelos efeitos nocivos que<br />
podiam produzir à saúde, essas substâncias<br />
passaram a ter o seu uso proibido pelo Comitê<br />
Olímpico Internacional a partir de 1976, por ocasião<br />
da realização da Olimpíada de Montreal.<br />
Mesmo com todo o controle, há pouco mais de<br />
10 anos o Comitê Olímpico constatou que a<br />
testosterona ainda era a substância dopante<br />
mais utilizada entre os atletas competitivos.<br />
No Brasil, os esteróides anabólicos androgênicos<br />
são considerados substâncias dopantes desde a<br />
portaria 531 do MEC – 10/07/1985.<br />
Epidemiologia e ação<br />
dos anabolizantes<br />
Essas substâncias podem ser utilizadas por<br />
via oral, mas a injetável costuma ser preferida<br />
pelos seus efeitos mais rápidos e eficazes.<br />
Não existem estatísticas confiáveis da sua utilização<br />
exatamente por se tratar de produtos<br />
proibidos e utilizados apenas no submundo do<br />
esporte ou das comunidades jovens. Sabe-se<br />
que o uso é preferencial entre as idades de 18<br />
a 34 anos e principalmente entre os homens.<br />
Os principais efeitos metabólicos da atuação<br />
dessas substâncias:<br />
–retenção de nitrogênio e desenvolvimento<br />
muscular em quem tem Insuficiência de<br />
andrógenos naturais.<br />
– no músculo, liga-se a receptores da musculatura<br />
e o complexo esteróide-receptor estimula<br />
a produção de RNA, promovendo aumento<br />
da síntese de proteínas no ribossomo da célula<br />
– especialmente miosina e actina – proteínas<br />
contráteis produtoras de energia e que<br />
geram mais força.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 119
Adolescência<br />
– ação central de agressividade e uma sensação<br />
de alerta constante que leva a mais rápida<br />
recuperação após o exercício.<br />
–a agilidade, destreza e o desempenho físico<br />
seriam aumentados.<br />
Estes aspectos ainda dependem de mais estudos<br />
para serem confirmados.<br />
Indicações<br />
Entre as principais indicações do uso supervisionado<br />
dos anabolizantes estão:<br />
– deficiência de testosterona, câncer de mama,<br />
angioedema hereditário, anemia aplástica,<br />
endometriose, estímulo de crescimento em<br />
caso de puberdade tardia nos meninos, promoção<br />
de aumento de massa muscular e seu<br />
fortalecimento.<br />
Riscos<br />
– em homens – diminuição de testículos,<br />
azospermia, esterilidade,<br />
ginecomastia, calvície, acne,<br />
aumento de glândulas.<br />
Sebáceas, ruptura de tendões<br />
por excesso de massa<br />
muscular.<br />
– em mulheres – diminuição de mamas, acne,<br />
virilização, distúrbios menstruais,<br />
pilosidade, aumento<br />
clitoridiano.<br />
– parada de crescimento, virilização, doenças<br />
hepáticas inclusive câncer, policitemia e alterações<br />
de coagulação, estrias atróficas.<br />
– dislipidemia – diminuição da fração HDL<br />
e aumento da LDL e do colesterol total –<br />
portanto risco aumentado de doença cardiovascular.<br />
– alterações de personalidade, agressividade,<br />
euforia, distração, confusão mental, uso de<br />
outras drogas, quadros depressivos e suicídio.<br />
– pelo fato de muitas vezes ser usado por via<br />
injetável, a contaminação e a difusão de<br />
outras moléstias é possível.<br />
– o uso é ilegal – artigo 278: venda de produtos<br />
nocivos a saúde e artigo 282: falso exercício<br />
da Medicina.<br />
A busca pelo corpo perfeito e pelo melhor desempenho<br />
no esporte tem se tornado um grande<br />
problema entre os jovens. A conscientização<br />
dos usuários deve partir dos educadores desde<br />
a infância. O Pediatra e os pais devem estar<br />
preocupados na orientação das crianças e adolescentes<br />
com respeito aos riscos do uso de<br />
anabolizantes. A mídia, e os órgãos esportivos<br />
devem continuar a colaborar para a erradicação<br />
desses produtos, seja incentivando a pesquisa<br />
de novos métodos de detecção, seja no esclarecimento<br />
dos perigos que eles representam<br />
para o esporte como entidade formadora de<br />
personalidade do homem.<br />
O quadro abaixo mostra os principais produtos<br />
que possuem ação anabolizante, efeito androgênico<br />
e possível hepatotoxicidade:<br />
Nome Genérico Nome Comercial Formulação Anabólico<br />
Hepato-<br />
toxidade<br />
Androgênico<br />
Androisoxazol Neopondren, Cps 5 mg Bastante Pouco Sim<br />
Neo-ponden<br />
Androstanolona Androlone, Neodrol, Oral (10 e 25 mg), Bastante Pouco Pouca<br />
Anabolex, Anaprotin, injetável<br />
Protona<br />
(100 mg/mL)<br />
Boldenona Equipoise, Injetável (50 mg/mL) Bastante Médio Pouca<br />
Parenabol<br />
continua<br />
120<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Adolescência<br />
continuação<br />
Nome Genérico Nome Comercial Formulação Anabólico<br />
Hepato-<br />
toxidade<br />
Androgênico<br />
Etilestrenol Durabolin-o, Oral (2 mg) Pouco Pouco Bastante<br />
Maxibolin, Orabolin<br />
Fluoximesterona Halotestin Oral (5 mg) Bastante Bastante Bastante<br />
Metandienona Danabol, Dianabol Oral (5 mg) Bastante Pouco Bastante<br />
Nandrolona Deca-durabolin Injetável Bastante Pouco Pouca<br />
Oxandrolona Anavar, Lipidex Oral (2,5 mg) Bastante Pouco Bastante<br />
Oximetolona Hemogenin Oral (5 e 50 mg) Bastante Pouco Bastante<br />
Stanozolol Winstrol, Oral (2 e 5 mg), Bastante Pouco Bastante<br />
Stromba-jet injetável (25 mg/mL)<br />
Testosterona Durateston Oral e sublingual Bastante Bastante Não<br />
cristalina<br />
<strong>Referências</strong> <strong>Bibliográficas</strong><br />
01. McArdle W, Katch F, Katch V. Esssentials of Exercise<br />
Physiology 1994; Ergogenic Aids, p 403.<br />
02. Souza ES, Fisberg M. O uso de esteróides anabolizantes<br />
na adolescência. www.brazilpednews.org.br/mar2002/<br />
bnp3302.html.<br />
03. Pinho Ribeiro PC. Esportes e o uso indevido de<br />
esteróides anabolizantes. Comitê de Adolescência<br />
da SBP - Esportes e o uso indevido de esteróides<br />
anabolizantes (www.smp.org.br).<br />
04. Lamb DR. Maio/Junho 1996 - O uso abusivo de<br />
esteróides anabolizantes no esporte - Gatorade Sports<br />
Science Institute.<br />
05. Esteróides anabolizantes - Centro Brasileiro de Informações<br />
sobre drogas psicotrópicas. UNIFESP - 2002.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 121
Adolescência<br />
122<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Genética, nutrição e atividade física<br />
em doenças crônicas na infância<br />
Obesidade/Diabetes<br />
ROMOLO SANDRINI<br />
Dados epidemiológicos internacionais indicam<br />
que o problema é global. A prevalência de obesidade<br />
está aumentando em países desenvolvidos,<br />
emergentes e atingindo países menos desenvolvidos.<br />
Atualmente há mais indivíduos com<br />
sobrepeso que desnutridos no mundo. Enquanto<br />
alguns segmentos da população são mais<br />
propensos a apresentar sobrepeso e obesidade<br />
que outros, povos de todas as idades, raças,<br />
etnias, níveis sócio-econômicos e áreas geográficas<br />
estão apresentando um aumento importante<br />
no peso.<br />
No Brasil, isto também ocorre e as conseqüências<br />
sociais, políticas, econômicas e de saúde<br />
são enormes. Detectam-se variações estatísticas<br />
importantes na prevalência da obesidade e as<br />
ações de prevenção devem ser precoces, pois<br />
geralmente a criança obesa transforma-se no<br />
adolescente obeso e este no adulto obeso.<br />
A rapidez com que aumenta a obesidade sugere<br />
que, mais que aspectos biológicos, as mudanças<br />
de comportamento e ambientais desencadearam<br />
a epidemia.<br />
O aumento do consumo de energia e a diminuição<br />
do gasto energético são a combinação<br />
que levou nossa sociedade a aumentar o peso.<br />
Dados ecológicos sustentam a idéia de que o<br />
consumo calórico aumentou:<br />
– Maior oferta de energia per capita,<br />
–Aumento do consumo de alimentos fora da<br />
casa,<br />
–Aumento no consumo de refrigerantes, e<br />
–Aumento do tamanho das porções servidas.<br />
Os dados, contudo, sugerem que a mudança<br />
maior ocorreu no gasto de energia que no aumento<br />
do consumo.<br />
Há menos gasto de energia em:<br />
– Deslocamento das pessoas (transporte);<br />
– Atividades na casa;<br />
– Energia despendida no trabalho;<br />
– Trabalhos que são mais sedentários;<br />
– Atividade física nas escolas.<br />
Pesquisas no Brasil também mostraram a ocorrência<br />
de:<br />
– Mudanças sociais; presença da mulher profissional,<br />
– Necessidade de 2 salários para manter a casa,<br />
– Diminuição do preço dos alimentos,<br />
–Falta da ritualização das refeições,<br />
– Outros.<br />
Conseqüências médicas<br />
da obesidade<br />
Além do peso, outras medidas são importantes<br />
para medir o risco para a saúde:<br />
– Índice de Massa Corporal,<br />
– Circunferência abdominal,<br />
–Relação abdômen/quadril,<br />
– Espessura das pregas cutâneas,<br />
–Bioimpedância.<br />
“Mesmo pequenos aumentos no peso da população<br />
pode resultar em impacto devastador na<br />
Saúde Pública”.<br />
Impacto econômico<br />
Calcula-se que são gastos 117 bilhões de dólares/ano<br />
nos Estados Unidos com o<br />
– custo direto (diagnóstico e tratamento, consultas,<br />
medicações, hospitalizações e assistência<br />
em casa) e o<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 123
Genética, nutrição e atividade física em doenças crônicas na infância<br />
– custo indireto (perda salarial por diminuição<br />
da produtividade e morte prematura).<br />
Estima-se que os custos dos cuidados médicos<br />
devido ao excesso de peso é aproximadamente<br />
o mesmo que os devidos ao fumo.<br />
Em torno de 300.000 mortes/ano, nos Estados<br />
Unidos, podem ser atribuídas à obesidade<br />
(2ª causa de morte prevenível nos Estados<br />
Unidos); mais de 80% entre pessoas com IMC<br />
> 30 kg/m2. Quando se junta dieta inadequada<br />
com estilo de vida sedentário aumenta mais<br />
400.000 óbitos por ano.<br />
O sobrepeso e a obesidade aumentam o risco<br />
de vários tipos de doenças, entre elas:<br />
– Doenças cárdio-vasculares (DCV),<br />
– Diabetes Mellitus tipo 2,<br />
– Cânceres,<br />
– Mortes prematuras.<br />
Os efeitos da obesidade resultam de 2 fatores:<br />
–o aumento da massa de tecido adiposo, e<br />
–o aumento da produção de produtos<br />
patogênicos das células aumentadas.<br />
A obesidade é uma doença crônica como a hipertensão<br />
e a ateroesclerose.<br />
A hiperplasia e a hipertrofia das células adiposas<br />
são as lesões patogênicas da obesidade.<br />
A liberação de citoquinas, especialmente IL-6,<br />
dos adipócitos, pode estimular o estado proinflamatório<br />
que caracteriza a obesidade. O<br />
aumento da secreção do inibidor-1 do ativador<br />
da protrombina das células de gordura poderiam<br />
ter um papel no estado de pró-coagulação<br />
da obesidade e, junto com mudanças no<br />
endotélio, poderiam ser responsáveis pelo risco<br />
aumentado de DCV e hipertensão.<br />
O aumento da produção de estrogênios pelos<br />
adipócitos aumentados poderia ter um papel<br />
no aumento de câncer de mama.<br />
O aumento da massa de gordura é responsável<br />
por:<br />
– estigmas da obesidade,<br />
–mudanças de comportamento,<br />
– osteoartrites,<br />
–apnéia do sono,<br />
– asma brônquica,<br />
– dermopatias,<br />
– hirsutismo,<br />
– complicações da gravidez,<br />
– discriminação social,<br />
– diminuição da atividade física e vitalidade,<br />
– piora da qualidade de vida,<br />
– depressão.<br />
A obesidade e sobrepeso aumentam o risco de<br />
osteo-artrites, maior causa de invalidez parcial<br />
e a causa mais comum de cirurgia para substituição<br />
por articulação artificial.<br />
A 2ª categoria de riscos advém das mudanças<br />
metabólicas devidas a doenças associadas à<br />
hipersecreção dos adipócitos aumentados:<br />
– cálculos biliares,<br />
– hipertensão arterial,<br />
– DCV,<br />
– câncer,<br />
– DM tipo 2, insulino-resistência e síndrome<br />
metabólica,<br />
–dislipidemias,<br />
–catarata,<br />
– hipertrofia benigna da próstata,<br />
–irregularidade menstrual.<br />
Quanto aos cálculos biliares o sobrepeso aumenta<br />
2 vezes o risco de ocorrência e a obesidade<br />
3 vezes.<br />
A hipertensão arterial apresenta as seguintes<br />
características:<br />
– Está presente em 51% dos pacientes;<br />
–A redução do sobrepeso diminui a hipertensão<br />
em 48% dos brancos e em 28% dos negros;<br />
–Para cada diminuição de 1 mm Hg na pressão<br />
diastólica, diminui 3% o risco de infarto<br />
do miocárdio.<br />
Sobrepeso e obesidade causam hipertensão arterial,<br />
levando a:<br />
–gastos financeiros<br />
– complicações de saúde como:<br />
124<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Genética, nutrição e atividade física em doenças crônicas na infância<br />
• aumento de DCV,<br />
• disecção da aorta,<br />
• lesão renal,<br />
• doença cérebro-vascular.<br />
Quando comparados com indivíduos normais,<br />
o sobrepeso é responsável por uma chance 3<br />
vezes maior de desenvolver hipertensão e, em<br />
obesos, de 6 vezes mais.<br />
Em relação às doenças cardíacas:<br />
– 20 a 30% da mortalidade por DCV pode ser<br />
devida ao excesso de peso;<br />
– sobrepeso e obesidade produzem 2 a 3 vezes<br />
mais DCV;<br />
– aumenta probabilidade de morrer devido às<br />
mesmas;<br />
– adolescentes com sobrepeso tem chance 2 vezes<br />
maior de morrer de infarto na vida adulta;<br />
– o HDL baixo traz maior risco que para DCV<br />
que os triglicerídeos elevados.<br />
A apolipoproteína B é um forte preditor para<br />
risco de DCV.<br />
Identificam risco maior de doença metabólica e<br />
de doença coronariana:<br />
– Níveis elevados de apolipoproteína B,<br />
–Valores de insulina em jejum altos,<br />
– Concentração de triglicerídeos aumentada,<br />
– Concentração de HDL colesterol diminuída,<br />
–Aumento da cintura abdominal.<br />
Há correlação entre doença cérebro-vascular<br />
e IMC, circunferência abdominal e relação<br />
abdômen/quadril.<br />
Há 14 tipos de cânceres correlacionados com<br />
obesidade. São os cânceres de esôfago, cólon e<br />
reto, fígado, vesícula biliar, pâncreas, rim,<br />
linfoma não-Hodgkin, mieloma múltiplo, estômago,<br />
próstata, mama, útero, cérvix e ovários.<br />
O sobrepeso e a obesidade são responsáveis por:<br />
– 9% dos cânceres de mama pós-menopausa,<br />
– 11% dos de cólon,<br />
– 25% dos renais,<br />
– 37% dos de esôfago,<br />
– 37% dos de endométrio.<br />
Sobrepeso e obesidade são responsáveis por 14%<br />
de todos os óbitos por câncer em homens e<br />
20% em mulheres.<br />
No DM tipo 2 que ocorre no excesso de peso,<br />
• Risco mais baixo: IMC de 22kg/m 2,<br />
• IMC 35 kg/m 2 = risco 4.000% maior,<br />
• IMC > 35 kg/m 2 = risco 6.000% maior,<br />
• 65% dos casos de DM tipo 2 é devido à<br />
obesidade.<br />
– aumento de peso é responsável por 2/3 dos<br />
óbitos em DM tipo 2,<br />
– aumento da secreção de insulina,<br />
– insulino-resistência.<br />
O aumento da gordura visceral aumenta o grau<br />
de insulino-resistência associados à obesidade e<br />
hiperinsulinemia.<br />
Oitenta por cento do DM tipo 2 pode ser atribuído<br />
ao efeito combinado de inatividade e<br />
sobrepeso/obesidade. Há correlação entre índice<br />
de massa corporal (IMC) e DM tipo 2; obesos<br />
tem chance 10 vezes maior de desenvolver DM<br />
tipo 2.<br />
Ganho de peso, circunferência abdominal e relação<br />
cintura/quadril também correlacionam<br />
com risco de apresentar DM tipo 2.<br />
Na obesidade podem ocorrer lesões hepáticas<br />
como:<br />
–hepatomegalia,<br />
– aumento das enzimas hepáticas,<br />
– histologia hepática alterada,<br />
–esteatose,<br />
– esteato-hepatite,<br />
– fibrose e cirrose.<br />
Mudanças endócrinas são comuns:<br />
– menstruação irregular,<br />
– ciclos anovulatórios,<br />
– diminuição da fertilidade,<br />
– maior risco de toxemia gravídica,<br />
– hipertensão,<br />
– maior incidência de cesarianas,<br />
– IMC > 30 kg/m 2 = anomalias na secreção de:<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 125
Genética, nutrição e atividade física em doenças crônicas na infância<br />
• GnRH,<br />
•LH,<br />
• FSH,<br />
•resultando em anovulação.<br />
A obesidade encurta a vida.<br />
Anos de vida perdidos:<br />
• IMC >45 kg/m 2 = 13 anos para homens.<br />
• = 8 anos para mulheres.<br />
Gordura corporal:<br />
–5 óbitos/ano para gordura corporal
Genética, nutrição e atividade física em doenças crônicas na infância<br />
prevalência da obesidade ao mesmo tempo que<br />
reduziriam os níveis de colesterol. Este idéia era<br />
pura falácia. O papel do índice glicêmico permanece<br />
controverso...”<br />
Benefícios da perda de peso<br />
Perda de peso intencional reduz o risco de<br />
mortalidade.<br />
Acompanhamento de mulheres entre 40 e 60<br />
anos que perderam peso espontaneamente<br />
encontrou redução de 20-25% de todas as causas<br />
de mortalidade.<br />
Melhora da tensão arterial e dos triglicerídeos<br />
ocorrem com redução de 5 a 10 % do peso<br />
corporal; HDL aumenta de uma forma similar.<br />
A perda de peso trás conseqüências positivas para<br />
a saúde. A perda de peso, mesmo moderada:<br />
– diminui a pressão arterial,<br />
– melhora a tolerância à glicose,<br />
– melhora o perfil lipídico.<br />
Diagnóstico<br />
e Tratamento<br />
da Criança com<br />
Osteoporose<br />
GENOIR SIMONI<br />
Osteoporose está sendo cada vez mais freqüente<br />
na pediatria, tendo como conseqüência<br />
vários fatores. Estes incluem o aumento<br />
das doenças crônicas, bem como e o<br />
manejo terapêutico por pediatras, sedentarismo<br />
e a alimentação. A disponibilidade<br />
dos métodos para avaliar densidade óssea e a<br />
eficácia do tratamento médico também tem<br />
resultado num aumento do conhecimento<br />
da osteoporose.<br />
O tecido ósseo é uma estrutura dinâmica ao<br />
longo da vida de um indivíduo, apresentando<br />
funções metabólicas e mecânicas essenciais à<br />
manutenção da homeostase do organismo.<br />
A função metabólica está envolvida em uma<br />
série de reações bioquímicas, sobretudo do cálcio<br />
e do fósforo, enquanto a função mecânica<br />
da sustentação e proteção aos órgãos.<br />
O tecido ósseo na pediátrica está em constante<br />
modelação e remodelação, sendo que a formação<br />
óssea é mais intensa promovendo com isso<br />
o crescimento do indivíduo.<br />
Definição<br />
A osteoporose é definida como uma desordem<br />
esquelética caracterizada por comprometimento<br />
da resistência óssea, predispondo o aumento de<br />
fraturas. Em adultos, a osteoporose também é<br />
definida com base na avaliação da densidade<br />
óssea usando medidas da densitometria óssea<br />
(DO) – DXA dual energy X-Ray absorptiometry, que<br />
serve para predizer risco de fraturas. Aqui, a<br />
comparação de indivíduos com massa óssea (MO)<br />
é contrária ao pico de massa óssea visto em<br />
adultos jovens com T escore representando um<br />
número de desvios padrões (DP) a partir de um<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 127
Genética, nutrição e atividade física em doenças crônicas na infância<br />
valor. Assim, um T escore abaixo 2,5 DP é definido<br />
como osteoporose, enquanto um T escore<br />
entre 1 e 2,5 DP é definido como osteopenia.<br />
Até o momento não é possível definir osteoporose<br />
em crianças com base somente na avaliação<br />
da massa óssea. Uma das razões, é que<br />
atualmente a relação entre densidade óssea e<br />
o risco de fraturas em crianças com doenças<br />
crônicas é desconhecido. No momento, há estudos<br />
em crianças saudáveis que evidencia<br />
redução de densidade óssea quando apresentam<br />
fraturas de ossos longos.<br />
Outro fator é que a densidade óssea em crianças<br />
usando DXA é influenciada pelo tamanho corporal,<br />
podendo com isso crianças menores ter uma<br />
baixa densidade óssea e serem rotuladas erroneamente<br />
como portadoras de osteoporose.<br />
Com isso, a definição atual de osteoporose em<br />
crianças inclui a presença de fraturas com Massa<br />
Óssea reduzida principalmente em ossos<br />
trabeculares ou corticais. Há muitas condições<br />
na infância, nas quais a reduzida densidade óssea<br />
(osteopenia) tem sido demonstrada, mas relativamente<br />
poucas condições têm mostrado estar<br />
associadas com risco aumentado de fraturas.<br />
Etiologia<br />
Osteoporose em crianças pode ser primária,<br />
devido a anormalidades ósseas intrínsecas, ou<br />
secundárias a uma doença de base ou relacionada<br />
ao tratamento.<br />
Osteoporose primária<br />
Osteogênese imperfeita.<br />
Osteoporose Juvenil Idiopática.<br />
Osteoporose secundária<br />
Há vários fatores etiológicos que agem de forma<br />
isolada ou combinada negativamente no desenvolvimento<br />
ósseo da criança com doenças<br />
crônicas, que aumentam suas chances de desenvolver<br />
osteoporose.<br />
• Mobilidade reduzida na paralisia cerebral.<br />
• Citoquinas inflamatórias na doença de Crohn.<br />
• Glicocorticóides sistêmicos, como na ARJ.<br />
• Desordens puberais, como na Talassemia Major.<br />
• Síndrome de Cushing, Hiperparatirioidismo,<br />
Hipertirioidismo, Deficiência de GH, Diabetes<br />
tipo 1, Hipogonadismo, Causas Renais.<br />
• Desnutrição/ baixo peso, como na Anorexia<br />
nervosa entre outras.<br />
Investigação<br />
A investigação na criança com suspeita de<br />
osteoporose depende da história clínica. Uma<br />
criança com diagnóstico de Osteogênese Imperfeita,<br />
não necessita de biópsia óssea, enquanto<br />
justifica em uma criança com suspeita de<br />
osteoporose idiopática. O seguinte modelo pode<br />
ser útil:<br />
•Raio-X: Ossos longos: ossos longos delgados<br />
nas pernas de crianças que não sustentam<br />
o peso, adelgaçamento da cortical, e<br />
osteopenia.<br />
• RX coluna: perda de altura vertebral ou fraturas<br />
por compressão.<br />
• R-x do esqueleto: Ossos wormian nas crianças<br />
com suspeita de osteogênese imperfeita.<br />
• Bioquímica: cálcio sérico, fosfato, Fosfatase<br />
Alcalina 25OH vitamina D, PTH, - usualmente<br />
normais na osteoporose, mas importantes para<br />
excluir osteomalacia. Marcador de turnover<br />
ósseo no sangue e na urina mostra uma<br />
ampla variação nas crianças em crescimento,<br />
e não são úteis na investigação diagnóstica,<br />
mas podem ser benéficas no monitoramento<br />
da resposta ao tratamento.<br />
• Genética: Análise de mutação do DNA para<br />
COL1A1 e COL1A2, os dois genes codificam o<br />
colágeno tipo 1, identificará a mutação em<br />
aproximadamente 90% dos indivíduos com<br />
osteogênese imperfeita. Mutações no LRP5<br />
têm sido identificadas em algumas crianças<br />
com osteoporose idiopática.<br />
• Biópsia óssea: Investigação potencialmente<br />
útil em crianças sem causa óbvia como<br />
osteoporose idiopática juvenil é caracterizada<br />
por turnover ósseo baixo, e uma marcada<br />
redução do volume ósseo.<br />
128<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Genética, nutrição e atividade física em doenças crônicas na infância<br />
Densitometria óssea<br />
Modalidade mais freqüentemente utilizada é<br />
absortimetria de energia dupla de RX (DXA -<br />
dual energy X-Ray absorptiometry), devido<br />
a sua disponibilidade, rapidez na aquisição<br />
do exame com scanner e baixa dose de radiação.<br />
Um problema fundamental com o uso da<br />
DXA em crianças é que o valor produzido de<br />
densidade óssea em gm/cm 2 é uma densidade<br />
óssea areal, isto é, conteúdo de osso mineral<br />
formado escaneado é dividido pelas áreas<br />
ósseas. Isto falha em obter a medida em terceira<br />
dimensão e não supre uma densidade<br />
volumétrica óssea onde o conteúdo mineral<br />
ósseo é dividido pelo volume de osso para<br />
produzir um resultado em gm/cm 3 . Há uma<br />
forte correlação entre densidade óssea areal e<br />
peso e tamanho do osso. Isso significa na prática<br />
que a criança que é pequena para sua<br />
idade terá ossos pequenos e, portanto sua<br />
densidade óssea areal irá pertencer ao valor<br />
médio para a criança da mesma idade devido<br />
inteiramente a sua baixa estatura e poderia<br />
ser diagnosticada inapropriadamente como<br />
portadora de osteoporose.<br />
Tratamento<br />
O tratamento atual com maior evidência de<br />
benefícios são os bifosfonados. Embora haja<br />
diferentes bifosfonados disponíveis, a maioria<br />
dos estudos relacionados em crianças tem utilizado<br />
a preparação intravenosa, Pamidronato.<br />
Muitos estudos em crianças com diferentes<br />
condições têm mostrado uma melhora na<br />
densidade óssea com o uso dos bifosfonados,<br />
mas relativamente poucos que mostram uma<br />
redução na incidência de fraturas. Em um estudo<br />
observacional de uso de Pamidronato<br />
em um grupo de 30 crianças como OI moderada<br />
a severa, houve um incremento anual<br />
na densidade óssea em coluna lombar de<br />
42% e uma redução em risco de fraturas de<br />
1.7 por ano. Em um grupo de 38 crianças<br />
com OI e 18 crianças com paralisia cerebral em<br />
uso de Pamidronato intravenoso no intervalo<br />
de 2 a 8 meses estava associado com a redução<br />
em freqüência de fraturas em 79% e 88%<br />
respectivamente. Embora os bifosfonados<br />
orais sejam conhecidos pela efetividade na<br />
redução de risco de fraturas em adultos, há<br />
poucos estudos em pediatria com relação a<br />
sua efetividade. Em um estudo randomizado<br />
de dois anos em crianças com osteogênese<br />
imperfeita usando o bifosfonado oral Olpadronato<br />
constatou-se 31% a redução de risco de<br />
fratura.<br />
Na fase aguda os efeitos colaterais dos<br />
bifosfonados orais são os distúrbios gastrintestinais,<br />
hipocalcemia sintomática se existir<br />
uma pré-deficiência de vitamina D ou<br />
hipoparatireoidismo, atraso na melhora óssea<br />
após osteotomia eletiva em crianças com OI.<br />
Osteonecrose de mandíbula tem sido reportado<br />
em adultos com uso de bifosfonados embora<br />
não se tenha observado em crianças. Os<br />
relatos demonstram o potencial de sérios efeitos<br />
adversos que devem ser discutidos e apropriadamente<br />
informados por escrito.<br />
Prevenção<br />
As evidências atuais para intervenção que poderiam<br />
potencialmente prevenir osteoporose<br />
em crianças são limitadas em contraste com<br />
a situação da prática em adultos. Embora a<br />
suplementação de cálcio e vitamina D seja<br />
instintivamente sentida proporcionando uma<br />
apropriada resposta em crianças com baixa<br />
densidade óssea, não há boas evidências para<br />
suportar tal medida. Em crianças com condições<br />
de redução de mobilidade que são<br />
capazes de ficar de pé, há evidência que o<br />
incremento na duração na posição de pé<br />
ou atividade física pode melhorar a densidade<br />
óssea em coluna lombar e fêmur.<br />
Uma intervenção potencial adicional é o uso<br />
de plataformas vibratórias para estimular a<br />
atividade muscular e conseqüentemente a<br />
força do osso, com a qual foi mostrado aumento<br />
na densidade óssea tibial, mas estudos<br />
maiores são necessários para confirmar<br />
esse efeito. Embora o hormônio de crescimento<br />
tenha sido mostrado como contribuinte<br />
para aumento na área seccional total e cortical<br />
em ossos do rádio em crianças com artrite<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 129
Genética, nutrição e atividade física em doenças crônicas na infância<br />
idiopática juvenil, não há ainda boa evidência<br />
que sugira seu uso em crianças com<br />
osteoporose.<br />
Conclusões<br />
É importante frisarmos que o cuidado com a<br />
qualidade da massa óssea começa na gestação.<br />
Um adequado aporte de cálcio ao feto em<br />
fases em que há intensas e rápidas mineralização<br />
do esqueleto é fundamental. Se o pico<br />
de massa óssea formado for adequado estaremos<br />
contribuindo para que no futuro esta<br />
criança não venha desenvolver osteoporose<br />
precocemente.<br />
Portanto é fundamental que o pediatra reconheça<br />
e intervenha nas condições que comprometam<br />
a aquisição de massa óssea.<br />
<strong>Referências</strong> <strong>Bibliográficas</strong><br />
01. NIH Consensus Statement. Osteoporosis Prevention,<br />
Diagnosis and Therapy. Baltimore, MD: NHI, 2000;<br />
17:1-36.<br />
02. Clark EM, Ness AR, Bishop NJ et al. Association between<br />
boné mass and fractures in children: A prospective<br />
cohort study. J Boné Miner Res, 2006; 21:1489-95.<br />
03. Bechtold K, Ripperger W, Bonfig R et al. Growth hormone<br />
changes bone geometry and body composition in<br />
patients with juvenile idiopathic arthritis requiring<br />
glucocorticoid treatment: a controlled study using<br />
peripheral quantitative computed tomography. J Clin<br />
Endocrinol Metab 2005; 90:3168-73.<br />
04. Grissom LE, Kecskemethy HH, Bachrach SJ et al. Boné<br />
densitometry in Pediatric patients treated with<br />
pamidronate. Pediatr Radiol, 2005; 35:511-7.<br />
05. Sakkers R, kok D, Engelbert R et al. Skeletal effects<br />
and funcional Outcome with olpadronate in children<br />
with osteogenesis imperfecta: a 2 year randomised<br />
placebo-controlled study. Lancet, 2004; 363:1427-31.<br />
Hipertensão Arterial<br />
Sistêmica<br />
Genética, dieta e exercício<br />
ISABELA DE CARLOS BACK GIULIANO<br />
130<br />
Com o aumento da obesidade infantil em todo<br />
o mundo, cresce também o número de crianças<br />
e adolescentes hipertensos, assim como cresce a<br />
incidência de suas complicações cardiovasculares.<br />
São descritas prevalências de 0,5 a 12% de hipertensão<br />
arterial sistêmica (HAS) em populações<br />
infantis e de adolescentes.<br />
A HAS pode determinar co-morbidades precocemente,<br />
como disfunção renal progressiva, acidentes<br />
vasculares encefálicos, bem como de<br />
lesões cardiovasculares, como hipertrofia<br />
miocárdica, disfunção diastólica de ventrículo<br />
esquerdo e aceleração da progressão da<br />
aterosclerose.<br />
Diagnóstico<br />
Classifica-se como “pressão arterial sistêmica<br />
normal” quando os níveis pressóricos de uma<br />
criança ou um adolescente apresentam-se abaixo<br />
do 90º percentil para idade e estatura; “pressão<br />
arterial normal alta” ou “pré-hipertensão”<br />
quando estão entre os 90º e o 95º percentis; e<br />
“hipertensão arterial sistêmica” se acima desses<br />
níveis, por pelo menos três ocasiões. Para tal<br />
aferição, é utilizado um manguito que cubra ao<br />
menos 75% do comprimento do braço; na dúvida<br />
entre dois manguitos, utiliza-se preferencialmente<br />
o maior. 1<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Genética, nutrição e atividade física em doenças crônicas na infância<br />
Causas<br />
Quanto menor a criança, mais provavelmente<br />
sua hipertensão arterial sistêmica<br />
é de causa secundária. No Quadro 1 estão<br />
listadas as principais causas de HAS na<br />
infância e na adolescência, sendo que a<br />
maioria delas apresenta predisposição<br />
genética.<br />
Quadro 1 - Principais causas de HAS na infância, segundo faixa etária<br />
Faixa etária<br />
Recém-nascidos<br />
Lactentes e pré-escolares<br />
Causas<br />
Trombose de artéria renal, estenose de artéria renal (EAR),<br />
malformações renais, coarctação de aorta (CoAo) e displasia<br />
broncopulmonar.<br />
EAR, Doenças do parênquima renal (DPR), CoAo e estenose de<br />
artéria renal<br />
Escolar EAR, DPR, CoAo, hipertensão arterial sistêmica primária (HAS 1 ária )<br />
Adolescente<br />
DPR, HAS 1 ária<br />
HAS e genética<br />
Uma das áreas do conhecimento da HAS onde<br />
se têm desenvolvido mais pesquisas é sobre sua<br />
genética. 2 No Quadro 2 estão listados exemplos<br />
de doenças e polimorfismos associados à HAS e<br />
suas co-morbidades.<br />
Quadro 2 - Doenças e polimorfismos associados à HAS e suas co-morbidades<br />
Associação com HAS<br />
Doenças com herança<br />
de caráter genético<br />
Polimorfismos genéticos<br />
implicados na HAS 1 ária<br />
Polimorfismos genéticos<br />
implicados na ocorrência<br />
de co-morbidades<br />
Alteração genética<br />
Obesidade, lúpus eritematoso sistêmico, síndrome metabólica,<br />
malformações renais (rins policísticos), coarctação da aorta,<br />
diabetes melito tipo II, doença de Fabry, síndrome de Turner<br />
Fosfolipase C, angiotensina, enzima conversora,<br />
glicocorticóides, canais iônicos renais, adrenomedulina,<br />
receptores adrenérgicos, aldosterona, óxido nítrico<br />
Peptídeo natriurético, angiotensina, enzima conversora,<br />
canais iônicos renais, aldosterona, receptores adrenérgicos,<br />
calicreína<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 131
Genética, nutrição e atividade física em doenças crônicas na infância<br />
Tratamento<br />
O tratamento da HAS na infância baseia-se em<br />
mudanças do estilo de vida – nutrição, atividade<br />
física, controle do estresse e do peso – e<br />
tratamento medicamentoso, caso os níveis<br />
pressóricos não alcancem os considerados ideais<br />
para idade e estatura. O uso de medicamentos<br />
não será discutido porque foge do escopo<br />
desse resumo.<br />
Dieta<br />
Inicialmente, adota-se um padrão dietético saudável<br />
– rico em frutas, verduras, cereais integrais,<br />
laticínios desnatados, peixe, aves, nozes e<br />
amêndoas e pobre em gorduras saturadas (menos<br />
de 10% do volume calórico total diário),<br />
colesterol (menos de 300 mg/dL), açúcar e sal<br />
(no máximo 2,4g/dia), com aconselhamento<br />
sobre a ingestão de álcool para os adolescentes.<br />
Além disso, nas crianças com sobrepeso deve-se<br />
prescrever uma dieta que, associada à atividade<br />
física, determine o controle do seu peso<br />
corporal. 3<br />
Apesar de não haver evidências robustas de que<br />
a restrição de sal tenha um papel significativo<br />
no controle da HAS na infância, sugere-se uma<br />
ingestão máxima de 1,2g por dia para as crianças<br />
de 4 a 8 anos e de 1,5g ao dia, após esta<br />
idade. Estudos sugerem também que o aumento<br />
da ingestão de potássio, cálcio e magnésio<br />
podem contribuir na controle dos níveis<br />
tensionais.<br />
Atividade física<br />
Muitos estudos, especialmente em adultos,<br />
apontam para a associação negativa entre os<br />
níveis de atividade física e os tensionais. Assim,<br />
recomenda-se a prática de 1 hora de atividade<br />
física moderada diária (entre 60 e 80% da<br />
freqüência cardíaca máxima), predominantemente<br />
aeróbia, dando-se preferência a atividades<br />
lúdicas ou desporto que seja da preferência<br />
da criança, visando a manutenção do hábito<br />
pela vida adulta, sempre precedida de avaliação<br />
clínica prévia. Além disto, recomenda-se a<br />
restrição de no máximo 2 horas diárias da prática<br />
de lazer inativo (televisão, jogos eletrônicos<br />
ou computador). Os resultados sobre estudos<br />
com exercícios resistidos em pacientes hipertensos<br />
não são conclusivos, mesmo em adultos. 4<br />
Agudamente a atividade física pode determinar<br />
diminuição da pressão arterial após o esforço,<br />
por mecanismos da regulação adrenérgica. Cronicamente,<br />
evidenciam-se associações negativas<br />
entre níveis tensionais e nível de aptidão física,<br />
variando segundo gênero, idade e etnia.<br />
Os mecanismos envolvidos sugeridos são:<br />
regulação da atividade nervosa simpática,<br />
aumento da sensibilidade do reflexo pressorreceptor,<br />
diminuição da resistência vascular<br />
periférica, remodelação vascular e diminuição<br />
do debito cardíaco (decorrente da diminuição<br />
da freqüência cardíaca).<br />
<strong>Referências</strong> <strong>Bibliográficas</strong><br />
01. The fourth report on the diagnosis, evaluation, and<br />
treatment of high blood pressure in children and<br />
adolescents. Pediatrics 2004 Aug; 114(2 Suppl 4th<br />
Report):555-76.<br />
02. Meaney E. [Molecular aspect of systemic arterial<br />
hypertension]. Arch Cardiol Mex 2006 Apr; 76 Suppl<br />
2:S170-S175.<br />
03. Elmer PJ, Obarzanek E, Vollmer WM, Simons-Morton<br />
D, Stevens VJ, Young DR, et al. Effects of comprehensive<br />
lifestyle modification on diet, weight, physical fitness,<br />
and blood pressure control: 18-month results of a<br />
randomized trial. Ann Intern Med 2006 Apr 4;<br />
144(7):485-95.<br />
04. Pescatello LS, Franklin BA, Fagard R, Farquhar WB,<br />
Kelley GA, Ray CA. American College of Sports Medicine<br />
position stand. Exercise and hypertension. Med Sci<br />
Sports Exerc 2004 Mar; 36(3):533-53.<br />
132<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Anorexia nervosa<br />
Causas e Epidemiologia<br />
LUZIA VIVIANE FABRE<br />
Anorexia nervosa é um transtorno alimentar, que<br />
se caracteriza por uma síndrome de alterações<br />
comportamentais associadas a disfunções<br />
fisiológicas e a fatores físicos. São observadas<br />
primeiro no consultório do pediatra, ou na atenção<br />
básica, chegando a necessitar de internação<br />
por evoluir muitas vezes para uma caquexia<br />
grave. Caracteriza-se por recusa alimentar e de<br />
manter o peso dentro do mínimo esperado para<br />
idade e altura, medo obsessivo de ganhar peso,<br />
distorção da imagem corporal ou negação da<br />
gravidade de sua condição nutricional.<br />
Causas<br />
Embora as causas sejam imprecisas, há evidências<br />
crescentes que uma interação sóciocultural<br />
e fatores biológicos, assim como<br />
determinantes psíquicos determinam o desenvolvimento<br />
desta patologia. Os fatores de risco<br />
para o seu desenvolvimento incluem pessoas<br />
dedicadas a atividades que exigem magreza,<br />
como bailarinas, esportistas, jóqueis e modelos<br />
e com certos tipos de traços de personalidade,<br />
com baixa auto-estima, dificuldade em<br />
expressar sentimentos e resolver conflitos e<br />
perfeccionismo.<br />
Também concorrem fatores familiares, aparecendo<br />
padrões perturbados de relacionamento.<br />
Há debates sobre a causa principal deste transtorno,<br />
pesquisas atuais sugerem uma forte<br />
influencia de fatores genéticos na suscetibilidade<br />
à anorexia nervosa.<br />
Epidemiologia<br />
As pesquisas conhecidas são feitas nos países<br />
ocidentais, industrializados. A anorexia nervosa<br />
afeta com mais freqüência adolescentes do sexo<br />
feminino. Apresenta prevalência de 0,5 a 1% na<br />
população geral, sendo 10 vezes mais comum<br />
em meninas, 40% dos casos são diagnosticados<br />
entre 15 e 19 anos de idade. Na população<br />
pré-adolescente ou infantil (menores de 14 anos)<br />
a prevalência em meninos é mais alta, 20 a<br />
30% dos casos. A incidência calculada para um<br />
período de um ano foi de 5 para uma população<br />
de 100.000 habitantes. Em estudos americanos<br />
(NIMH) aparece em 8 a 13 casos por<br />
100.000 habitantes/ano.<br />
Junto com a bulimia nervosa, outro transtorno<br />
alimentar, são causas importantes de<br />
morbidade e mortalidade em adolescentes do<br />
sexo feminino.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 133
Anorexia nervosa<br />
Bioquímica,<br />
Comportamento<br />
e Quadro Clínico<br />
MAURO FISBERG<br />
WLADIMIR BACELLAR DO CARMO FILHO<br />
A anorexia nervosa apresenta como principal<br />
característica a perda e/ou recusa em manter<br />
o peso dentro da faixa normal para a idade<br />
(≥ 85% do esperado), associado por grande restrição<br />
alimentar auto-imposta, medo intenso<br />
de engordar, perturbação na forma de vivenciar<br />
o próprio peso, formato e tamanho, mesmo<br />
apresentando baixo peso e a ausência de pelo<br />
mesmo três ciclos menstruais consecutivos<br />
(amenorréia).<br />
O comportamento anoréxico tem como principais<br />
sintomas a perda acentuada de massa<br />
muscular e de gordura corporal; a redução do<br />
consumo alimentar, especialmente dos grupos<br />
considerados “proibidos” ou “engordantes”<br />
(alimentos fontes de carboidratos, gorduras e<br />
carnes); irregularidades menstruais, cardíacas<br />
e de motilidade gastrointestinal; desidratação;<br />
hipotermia; deficiências de micronutrientes;<br />
em adolescentes, pode ocorrer atraso na<br />
maturação sexual; e em casos mais avançados,<br />
desmineralização óssea (osteopenia e osteoporose),<br />
infertilidade e outros transtornos mentais<br />
(depressão, baixa auto estima e ansiedade).<br />
Freqüentemente a anorexia se manifesta em<br />
uma adolescente sem qualquer alteração<br />
psicopatológica anterior. Eram pessoas que<br />
tiveram bom desenvolvimento, tinham bom<br />
desempenho escolar e bons relacionamentos<br />
sociais e familiares. Inicia-se de uma maneira<br />
gradual, com uma dieta que começa por motivos<br />
estéticos ou mesmo profissionais. A dieta,<br />
no início, se preocupa apenas com a qualidade<br />
dos alimentos, evitando aqueles que contenham<br />
muitas calorias. Quando começa a acontecer<br />
a distorção da imagem corporal, isso é, quando<br />
134<br />
a pessoa começa a se “enxergar” gorda, a dieta<br />
vai ficando mais rigorosa, com diminuição<br />
também da quantidade de alimento ingerido, o<br />
que pode ser feito naturalmente ou através<br />
da ingestão de drogas que diminuam o apetite.<br />
Junto com isso, a pessoa começa a fazer exercícios<br />
físicos, que também vão aumentando<br />
gradativamente, chegando em casos mais graves,<br />
à várias horas de atividade física diária para<br />
perda de peso. Mais ou menos 20% dos pacientes<br />
anoréxicos utilizam laxantes para aumentar<br />
a perda de peso e alguns utilizam também<br />
diuréticos para, diminuindo a quantidade de<br />
água do corpo, diminuírem ainda mais o peso.<br />
É preciso lembrar que tudo isso, diminui o peso<br />
mas não emagrece, isto é, não provoca a<br />
perda de gordura do corpo. Outro método<br />
(chamado de purgação) também utilizado<br />
por anoréxicos, é a provocação de vômitos após<br />
a alimentação.<br />
Normalmente os pais só reconhecem o quadro<br />
de anorexia em seus filhos quando já está<br />
estabelecida uma perda de peso considerável.<br />
A pessoa inicia com dieta e exercícios físicos,<br />
que são comportamentos socialmente aceitáveis<br />
na nossa cultura, aprofunda-se nessas práticas<br />
e realiza na surdina os comportamentos<br />
ditos aberrantes, isto é, o uso de diuréticos,<br />
laxantes, provocação de vômitos ou medicamentos<br />
para emagrecer. Os pacientes muitas<br />
vezes utilizam-se de estratégias para não comer<br />
na frente da família ou de amigos, tentam<br />
não aparentar todo exercício físico que estão<br />
fazendo e escondem a utilização de medicamentos<br />
e provocação de vômitos, de tal<br />
maneira que, na maioria das vezes, apenas<br />
quando já existe uma perda importante de<br />
peso, existe então a tomada de consciência da<br />
família e dos amigos, de que algo de errado<br />
está acontecendo.<br />
Uma característica sempre presente nas meninas<br />
com anorexia é a parada da menstruação,<br />
que ocorre após um tempo variável, de acordo<br />
com a pessoa e com o grau das práticas utilizadas<br />
para a perda de peso. Essas pacientes têm<br />
também problemas de ajuste sexual, não pensando<br />
muito no assunto e com pouco interesse<br />
ou curiosidade pelo mesmo.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Anorexia nervosa<br />
Apesar do termo Anorexia (perda do apetite),<br />
ser consagrado pelo uso, ele não é um termo<br />
correto, pois esses pacientes pensam em comida<br />
o dia todo, o que gera alguns comportamentos<br />
estranhos. Esses pacientes costumam<br />
colecionar receitas, sabem o valor calórico de<br />
todos os alimentos, preparam verdadeiros banquetes<br />
para os outros, escondem doces pela<br />
casa e nos bolsos, cortam os alimentos em<br />
pedaços bem pequenos e levam muito tempo<br />
para terminar uma refeição, apesar de comerem<br />
bem pouco. Alguns pacientes não conseguem<br />
resistir aos pensamentos constantes<br />
em comida e sucumbem a alguns episódios<br />
periódicos de grande ingestão alimentar.<br />
Nesses episódios de grande voracidade (apetite<br />
exagerado ou bulimia), o paciente come uma<br />
grande quantidade de doces e alimentos gordurosos,<br />
sem parar, às vezes durante mais de<br />
uma hora. Após o episódio de bulimia, o indivíduo<br />
se sente envergonhado do que fez e, com<br />
medo de engordar, provoca o vômito.<br />
Geralmente essas pessoas têm uma personalidade<br />
obsessiva, são muito rígidos, perfeccionistas,<br />
exigem muito de si mesmos, sofrem de<br />
ansiedade e têm baixa tolerância à frustração.<br />
É muito comum também a ocorrência de<br />
depressão associada ao quadro anoréxico;<br />
esses pacientes apresentam episódios, que<br />
variam de semanas à meses, de perda de ânimo<br />
para fazer suas obrigações, insônia, falta de<br />
concentração, falta de prazer mesmo em atividades<br />
que antes lhes davam satisfação, tristeza<br />
intensa, falta de perspectivas e algumas vezes<br />
até mesmo idéias suicidas.<br />
A Anorexia Nervosa pode levar a inúmeras<br />
complicações, incluindo nos casos mais graves,<br />
a morte do paciente. Perda de massa muscular,<br />
intolerância ao frio, dor abdominal, amenorréia<br />
(parada da menstruação) são complicações<br />
comuns. Várias alterações cardíacas como<br />
arritmias cardíacas, diminuição ou aumento dos<br />
batimentos cardíacos e morte súbita, ocorrem<br />
como conseqüência à perda de massa muscular<br />
cardíaca e as alterações nas concentrações de<br />
vários minerais do organismo. Do ponto de vista<br />
cardiovascular ainda ocorre hipotensão.<br />
Bioquimicamente ocorrem distúrbios de coagulação,<br />
hipercarotenemia e elevação dos níveis<br />
plasmáticos de colesterol. O aparecimento de<br />
leucopenia, levando a infecções, também pode<br />
acontecer. Osteoporose, alterações de pele, cabelos<br />
e unhas e alterações neuropsiquiátricas<br />
também são comuns. A alopécia é freqüente.<br />
A indução freqüente de vômitos pode levar à<br />
várias alterações nas concentrações de íons do<br />
sangue, com graves perturbações clínicas, e também<br />
alterações dentárias por erosão do esmalte.<br />
O uso freqüente de laxativos leva a disfunção<br />
intestinal.<br />
Atualmente já se descreve o que poderia ser<br />
chamado de “período latente” para o desenvolvimento<br />
de transtornos alimentares, em que a<br />
presença de algumas atitudes pode facilitar o<br />
diagnostico e a intervenção precoce. São consideradas<br />
atitudes de risco:<br />
•Preferência por alimentar-se sozinho;<br />
• Seletividade (consumo limitado de alimentos<br />
ou só comer em um tipo de prato e sem misturar<br />
as diferentes preparações ou só aceitar<br />
a alimentação se esta tiver uma determinada<br />
técnica de preparo);<br />
• Classificar os alimentos em “bons ou ruins”<br />
ou em “seguros ou proibidos”;<br />
• Criar rituais no momento da refeição (seqüência<br />
de ingestão de alimentos);<br />
• Cortar os alimentos em pequenos pedaços;<br />
• Elaborar preparações para os outros sem<br />
provar e insistir para que os outros comam<br />
tudo;<br />
•Ter grande interesse por tudo relacionado a<br />
culinária e gastronomia;<br />
• Alterações bruscas e radicais na alimentação<br />
(como por exemplo tornar-se vegetariano sem<br />
motivo aparente) e na pratica de atividade<br />
física;<br />
•Ter grande conhecimento sobre calorias, dietas<br />
da moda e informações sobre nutrição;<br />
• Historia pregressa de conduta alimentar<br />
inadequada e/ou preocupação com o peso e<br />
técnicas de redução peso.<br />
É válido ressaltar também alguns novos agravantes<br />
como o uso inadequado da internet para<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 135
Anorexia nervosa<br />
promover sites, comunidades no Orkut e blogs<br />
– diários virtuais – que incentivam os transtornos<br />
alimentares, exibindo mensagens de apoio<br />
e incentivo à inapetência (“No Food”) ou dicas<br />
e artimanhas para enganar os pais, familiares e<br />
amigos, além de fotos de meninas esquálidas,<br />
apontadas como modelos de beleza.<br />
<strong>Referências</strong> <strong>Bibliográficas</strong><br />
01. Agras WS. Eating disorders: management of obesity<br />
bulimia, and anorexia nervosa. New York: Pergamon<br />
Press, 1987.<br />
02. Becker AE, Grinspoon SK, Klibanski A, et al. Eating<br />
disorders. N Engl J Med 1999; 340:1092.<br />
03. Fichter MM, Quadfling N. Six-year course of bulimia<br />
nervosa. Int J Eat Disord 1997; 22:361.<br />
04. Cereser MG, Cordás TA. Transtornos alimentares:<br />
anorexia nervosa e bulimia. In: Saito MI, Silva LEV<br />
editors. Adolescência: prevenção e risco. São Paulo:<br />
Atheneu; 2001. p. 269-276.<br />
05. Costa COM, Fisberg M, Higuchi AE. Características da<br />
nutrição na adolescência. Boletim Informativo da<br />
Sociedade Paraense de Pediatria, 4(2):3, abri/maio/<br />
junho, 1992.<br />
06. Siviero KC, Ferrini LG, Martins G, Delgado JN, Fisberg<br />
M. Imagem corporal em adolescentes obesos. Revista<br />
Paulista de Pediatria 16 (1) supl:37 (abst 45).<br />
Tratamento<br />
e Prevenção<br />
DÊNIO LIMA<br />
Introdução<br />
A anorexia nervosa é um transtorno do comportamento<br />
alimentar que implica em uma<br />
dietética auto-imposta; padrões bizarros de alimentação<br />
e perda de peso, induzida pelo<br />
paciente e representa um temor intenso de se<br />
tornar obeso 1 .<br />
O termo anorexia é derivado do grego “an”, deficiência<br />
ou ausência de, e “orexis”, apetite. Significa<br />
ainda uma aversão à comida, enjôo do<br />
estômago ou inapetência. A primeira referência<br />
a essa condição se reporta ao termo fastidium,<br />
em fontes latinas datadas da época de Cícero<br />
(106-43 aC) e vários textos do século XVI 2 .<br />
136<br />
Os primeiros quadros descritos datam de 1691,<br />
feitos por um médico inglês, Richard Morton,<br />
que se surpreendeu ao encontrar uma jovem<br />
de 17 anos, que não se alimentava e apresentava<br />
feições cadavéricas; lanugo substituindo os<br />
pelos corporais; bradicardia, hipotermia,<br />
hipotensão e extremidades cianóticas, sem qualquer<br />
afecção orgânica que justificasse o quadro.<br />
Em 1790, outro médico inglês relatou a<br />
história de um jovem , descrito sob o título de<br />
“Um caso marcante de abstinência”, com as<br />
mesmas características relatados anteriormente<br />
por Morton 1 .<br />
Foi relatado por Bell (1985) no seu livro “Holy<br />
anorexia”, (anorexia sagrada) o comportamento<br />
anoréxico, vivido por 260 santas italianas (que<br />
teriam vivido entre 1200 e 1600), aparentemente<br />
em resposta a estrutura social patriarcal a<br />
qual estavam submetidas.<br />
As necessidades físicas e sensações básicas<br />
(cansaço, impulso sexual, fome e dor), que<br />
eram suprimidas, pareciam liberar o corpo e<br />
alcançar metas espirituais superiores; no en-<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Anorexia nervosa<br />
tanto às crenças religiosas se misturavam com<br />
outras intenções das jovens, como a perda do<br />
atrativo feminino 2 .<br />
Critérios diagnósticos<br />
O sintoma principal que orienta o diagnóstico<br />
para anorexia nervosa é perda de peso intensa<br />
associada à recusa alimentar, sem distúrbios<br />
orgânicos. As classificações diagnósticas vão<br />
incluir a anorexia nervosa, de início a CID 9<br />
(1976) num grupo inespecífico de sintomas e<br />
síndromes especiais, caracterizado por “...transtorno<br />
no qual as características principais são a<br />
recusa ativa e persistente em comer e acentuada<br />
perda de peso.” Somente em 1980, o DSM III<br />
incluiu a anorexia nervosa entre a Doenças<br />
Mentais em Crianças e Adolescentes, caracterizando-a<br />
por:<br />
1 - medo intenso da obesidade.<br />
2 - perda de 25% ou mais do peso esperado.<br />
3 - distúrbio da imagem corporal.<br />
4 - ausência de doenças físicas.<br />
Em 1989, o DSM-III-R classifica a anorexia<br />
nervosa entre os transtornos alimentares e<br />
considera a margem menor para a perda de<br />
peso (15%), em relação à classificação anterior.<br />
A CID 10, em 1993, corrige a falha da CID 9 e<br />
traz instruções específicas de avaliação, representados<br />
pelo índice de massa corporal de<br />
Quetelet [relação do peso do indivíduo e o<br />
quadrado de sua altura, o IMC (peso/altura 2 )], e<br />
os seguintes critérios abaixo:<br />
1. o peso corporal é mantido em pelo menos<br />
15% abaixo do esperado (tanto perdido quanto<br />
nunca alcançado) ou índice de massa corporal<br />
de Quetelet em 17,5kg/m 2 ou menos;<br />
2. a perda de peso é auto-induzida por abstenção<br />
de “alimentos que engordam” e um ou<br />
mais dos sintomas que seguem:vômitos autoinduzidos;<br />
purgação auto-induzida; exercícios<br />
excessivos: uso de anorexígenos e/ou<br />
diuréticos;<br />
3. há uma distorção da imagem corporal na<br />
forma de uma psicopatologia específica, por<br />
meio da qual um pavor de engordar persiste<br />
como uma idéia intrusiva e sobre valorizada,<br />
e o paciente impõe um baixo limiar a<br />
si próprio;<br />
4. um transtorno endócrino generalizado envolvendo<br />
o eixo hipotálamo-hipofisário-gonadal<br />
é manifestado em mulheres como amenorréia<br />
e, em homens, como perda do interesse e<br />
apetite sexual (uma exceção aparente é a<br />
persistência de sangramentos vaginais em<br />
mulheres anoréxicas que estão recebendo terapia<br />
de reposição hormonal mais comumente<br />
tomada como uma pílula contraceptiva). Pode<br />
haver também níveis elevados de hormônio<br />
do crescimento, níveis aumentados de cortisol,<br />
alterações no metabolismo periférico do<br />
hormônio tireoidiano e anormalidade na secreção<br />
de insulina;<br />
5. se o início é pré-puberal, a seqüência de<br />
eventos da puberdade é demorada ou mesmo<br />
detida (o crescimento cessa; nas garotas<br />
os seios não desenvolvem e há uma amenorréia<br />
primária; nos garotos, os genitais permanecem<br />
pré-púberes). A recuperação, a<br />
puberdade é com freqüência completada<br />
normalmente, porém a menarca é tardia 1,2,3 .<br />
Tratamento<br />
As pessoas com transtornos alimentares graves<br />
podem ver o médico como aquele indivíduo<br />
que querem realimentá-las ou dobrar a sua<br />
vontade e engordá-las. O médico deve encorajar<br />
hábitos alimentares e peso normal, sem fazer<br />
disso o único foco do tratamento ou um campo<br />
de batalha. Deve deixar claro que ele estará<br />
sempre ao seu lado nos momentos difíceis e<br />
tratará de questões diferentes quando exigidas.<br />
O objetivo não é o controle do paciente<br />
anorético, mas o alívio do sofrimento 3 .<br />
No início, a educação do paciente é valiosa. É<br />
importante expor sobre a regulação do peso<br />
corporal e efeitos da inanição; rever os efeitos<br />
dos vômitos e laxantes sobre as funções do<br />
corpo; discutir questões de auto-estima.<br />
Considerando as implicações psicológicas e<br />
médicas da anorexia nervosa, recomenda-se um<br />
tratamento abrangente, incluindo hospitalização<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 137
Anorexia nervosa<br />
quando necessário, terapia individual e familiar.<br />
Abordagens comportamentais, interpessoais<br />
e cognitivas e medicamentosas, em alguns<br />
casos são importantes 1,2,3 .<br />
Normalmente o paciente é levado ao tratamento<br />
quando suas condições são precárias, o que<br />
é um determinante para a hospitalização, em<br />
face dos riscos de mortalidade. Assim sendo, os<br />
critérios para essa tomada de decisão são os<br />
seguintes:<br />
1. rápida perda de peso, maior do que 30% ao<br />
longo de seis meses;<br />
2. grave perda de energia;<br />
3. hipocalcemia ou alterações eletrocardiográficas.<br />
De acordo com Cordaz (1995), a necessidade de<br />
tratamento hospitalar deve ser encarada com<br />
parcimônia e cautela, propondo cinco principais<br />
categorias:<br />
1. tratamento em regime de hospitalização com<br />
vigorosos cuidados de enfermagem, dieta<br />
hipercalórica (mesmo contra a vontade do<br />
paciente; se necessário). Iniciar os demais tratamentos;<br />
2. técnicas comportamentais e cognitivas, sendo<br />
as mais empregadas: a exposição, prevenção<br />
da resposta, intenção paradoxal e<br />
reestruturação cognitiva;<br />
3. psicoterapia individual;<br />
4. psicoterapia familiar, naqueles pacientes<br />
cujos núcleos familiares vivem em constantes<br />
conflitos geradores de fatores precipitantes;<br />
5. psicofarmacoterapia, uso de medicações associadas<br />
a tratamentos psicológicos.<br />
Para o paciente hospitalizado que continua<br />
extremamente ansioso, apesar do tratamento<br />
com exercícios e relaxamento, pode ser usada<br />
uma pequena dose de benzodiazepínico de curta<br />
duração (lorazepam 0,25 ou 0,5mg) uma hora<br />
antes das refeições 2,3 .<br />
Os antidepressivos têm sido largamente utilizados<br />
no tratamento da anorexia nervosa. A<br />
amitriptilina, doses diárias de 50-100mg, só<br />
melhoram os sintomas depressivos, caso estes<br />
existam, mas não provocam aumento de peso.<br />
A clomipramina, via oral, nas doses de 50-250mg<br />
é pouco eficaz e nada acrescenta ao tratamento.<br />
A trazodona, utilizada por Hudson (1985),<br />
em 10 pacientes, não mostrou boa resposta.<br />
A fluoxetina na dosagem de 20 a 40mg/dia<br />
em uma amostra de 331 pacientes (Kaye,<br />
1991), mostrou boa resposta em apenas 10 deles<br />
(aumento de peso e redução ou desaparecimento<br />
de sintomas obsessivos, depressivos e<br />
ansiedade). Outro autor preconiza o uso de<br />
ciproeptadina, antiestamínico e antagonista da<br />
serotonina, nas doses de 12 a 28mg/dia, por<br />
não ter efeitos colaterais dos tricíclicos (diminuição<br />
da pressão arterial e aumento da freqüência<br />
cardíaca) 1,3 . Apolinaro e al., refere-se<br />
às drogas estudadas na anorexia nervosa que<br />
foram os antidepressivos (clomipramina, amitriptilina<br />
e fluoxetina); os antipsicóticos (pimozina<br />
e sulpirida) e outros agentes (cipro-heptadina,<br />
lítio, tetra-hidro-carbinal, clonidina, naltrexona,<br />
hormônio do crescimento, zinco e cisaprida). Os<br />
resultados mostram que na fase aguda não há<br />
diferença estatisticamente significativa, quando<br />
comparados a placebo em relação as principais<br />
medidas de desfecho. Os estudos apresentam<br />
limitações metodológicas que influenciam na<br />
falta de efeito terapêutico. A consistência dos<br />
resultados negativos sugere que o tratamento<br />
medicamentoso não proporciona nem acelera<br />
o restabelecimento do peso em pacientes<br />
hospitalizadas na fase aguda. Estudos abertos<br />
indicam resultados positivos com a olanzapina<br />
e risperidona 4 .<br />
Prevenção<br />
De acordo com a Psicóloga Psicanalista,<br />
Alessandra Sapiznik, coordenadora do curso de<br />
atualização em transtorno alimentar do<br />
PRODATA (UNIFESP/EPM), os estudos mostram<br />
que a abordagem direta dos jovens poderá<br />
induzi-los a desenvolver um comportamento<br />
não presente. A prevenção deve abordar indiretamente<br />
o tema, trabalhando em escola, temas<br />
relacionados á valorização de diferenças estéticas,<br />
étnicas e culturais.<br />
A prevenção deve acontecer junto aos educadores,<br />
que deveriam estar aptos a detectar<br />
138<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Anorexia nervosa<br />
eventuais perturbações de um momento importante<br />
como à adolescência. A família pode<br />
contribuir positivamente, ou negativamente,<br />
para que o jovem se sinta valorizado amado e<br />
reconhecido.<br />
Todo trabalho de prevenção deve ser iniciado<br />
com a alimentação das crianças e adolescentes.<br />
É necessário insistir em um hábito alimentar<br />
saudável, e desde a infância a alimentação deve<br />
ser balanceada e em horários fixos. A criança<br />
pode aprender que durante a semana ela deve<br />
comer, p.x., arroz, bife e salada. No final de<br />
semana pode ser liberado o refrigerante, o sorvete<br />
e até sanduíche.<br />
É necessário transformar a comida do dia-a-dia<br />
em momentos de prazer, fazendo a criança, na<br />
medida do possível, participar do preparo da<br />
comida (salada, molhos e temperos). É importante<br />
se reconhecer o ritmo de cada criança.<br />
Não se trata, no entanto, de fazer a sua vontade,<br />
mas descobrir o ritmo e um horário próprio<br />
de cada uma.<br />
Os adolescentes são diferentes, pois não conseguem<br />
se enquadrar em ritmos e horário. São<br />
frágeis e transformam a sua fragilidade em<br />
agressão e onipotência. Os pais e adultos devem<br />
ter um diálogo sincero e compartilhar as<br />
angústias que estão vivendo, pois perderam o<br />
corpo infantil, o mundo é outro com outras<br />
exigências, são desengonçados e crescem demais.<br />
Lembrar aos adolescentes que cada família<br />
tem uma compleição física, e que engordar<br />
ou emagrecer pode ser tratado de forma não<br />
traumática. As angústias podem ser minoradas<br />
em conversas com os mais velhos, pais, amigos<br />
e professores.<br />
O projeto Lei n o . 700, de 2006, publicado no<br />
DIÁRIO OFICIAL de SÃO PAULO, estabelece obrigações<br />
às agências com relação à saúde física e<br />
mental dos modelos profissionais de moda no<br />
estado de São Paulo:<br />
1. A agências precisam ter acompanhamento<br />
da saúde física e mental dos contratados<br />
(1 psicólogo ou psiquiatra, 1 endocrinologista);<br />
2. atestados com data inferior a 45 dias da<br />
realização do evento, deverão conter o IMC;<br />
3. IMC mínimo 18,5%.<br />
Projeto de Conscientização e Prevenção à<br />
anorexia e bulemia nervosa, de 05/12/2006, que<br />
institui a 2ª semana de novembro, como a<br />
Semana Municipal de Conscientizarão e Prevenção<br />
à anorexia e bulemia nervosa.<br />
<strong>Referências</strong> <strong>Bibliográficas</strong>:<br />
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dos transtornos alimentares, Rev Bras Psiquiatria,<br />
(Supl III):54-9, 2002.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 139
Anorexia nervosa<br />
140<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Novidades no diagnóstico,<br />
tratamento e prevenção das<br />
infecções respiratórias agudas<br />
Epidemiologia e<br />
Importância do<br />
Diagnóstico Etiológico<br />
das Infecções<br />
Respiratórias Agudas<br />
CONSUELO SILVA DE OLIVEIRA<br />
A infecção respiratória aguda (IRA) constitui<br />
hoje a maior causa de morte entre crianças de<br />
países em desenvolvimento. Os dados da Organização<br />
Mundial da Saúde (OMS) mostram que,<br />
na última década, cerca de um terço da mortalidade<br />
mundial em crianças (4 a 5 milhões<br />
de óbitos anuais) foi causada por infecções<br />
respiratórias agudas 7 . Estima-se que 90 a 95%<br />
dos casos de doenças agudas do trato respiratório<br />
superior e uma considerável parcela<br />
dos casos de doenças do trato inferior sejam<br />
causadas por vírus e agentes bacterianos. No<br />
Brasil as estatísticas oficiais do Ministério da<br />
Saúde apontam as IRA como a segunda ou<br />
terceira causa de morte em crianças menores<br />
de cinco anos, nas diferentes regiões do Brasil,<br />
sendo que 85% dos óbitos atribuídos a IRA<br />
são devidos à pneumonia.<br />
As infecções de brônquios e bronquíolos são<br />
reconhecidas como de etiologia viral, em sua<br />
ampla maioria. Já a etiologia aceita para a<br />
maioria dos quadros pneumônicos é bacteriana,<br />
sendo pouco reconhecida a participação dos<br />
agentes virais. Nos países desenvolvidos os agentes<br />
virais são considerados como responsáveis<br />
pela maior parte das infecções pulmonares,<br />
sejam brônquicas ou alveolares. Com a ampliação<br />
dos estudos clínicos e epidemiológicos nos<br />
países em desenvolvimento, está sendo constatado<br />
o relevante papel dos agentes virais nas<br />
infecções respiratórias do trato respiratório inferior<br />
(ITRI), reformulando os conceitos quanto<br />
a maior prevalência da etiologia bacteriana das<br />
infecções das vias aéreas inferiores.<br />
No Brasil, os estudos conduzidos por Myao e<br />
cols. (1999) 6 avaliaram a importância dos principais<br />
agentes virais em crianças carentes internadas<br />
por doenças agudas do trato respiratório<br />
inferior e constataram um amplo predomínio<br />
da etiologia viral – Vírus Respiratório Sincicial<br />
(52,4%) – detectado em cerca da metade das<br />
crianças com patologia da via respiratória inferior.<br />
Esses achados vêm corroborar a hipótese<br />
de que os agentes virais podem estar associados<br />
à patogenia da maior parte das infecções<br />
das vias aéreas inferiores, independentemente<br />
das condições socioeconômicas da população.<br />
O vírus sincicial respiratório (VSR) é considerado<br />
o principal agente causal de infecções do trato<br />
respiratório inferior (ITRI) em crianças abaixo<br />
de 1 ano, seguido dos vírus parainfluenza,<br />
influenza A e B, rhinovirus e coronavírus. No<br />
entanto, em 15 a 34% dessas infecções permanecem<br />
sem etiologia definida.<br />
Os estudos atuais demonstram a circulação<br />
de vírus emergentes e associados a quadros de<br />
ITRI em crianças, com destaque para os metapneumovírus<br />
(hMPV) e os Bocavírus humano<br />
(HBoV). Os metapneumovírus, isolados na<br />
Holanda em 2001 9 , foram relacionados às infecções<br />
respiratórias agudas graves no primeiro<br />
ano de vida, com a prevalência de 1,5% a 8%<br />
em crianças hospitalizadas e de espectro clínico<br />
similar ao vírus respiratório sincicial. Os estudos<br />
se sucederam com a identificação do vírus em<br />
várias partes do mundo, incluindo Canadá,<br />
Austrália, Reino Unido, Estados Unidos, confirmando<br />
a ampla distribuição do vírus e com uma<br />
incidência variando entre 2.3 a 17.5%, conforme<br />
a população estudada 9 . Nos estudos conduzidos<br />
por Esper e cols. 2003 4 , demonstrou-se pela<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 141
Novidades no diagnóstico, tratamento e prevenção das infecções respiratórias agudas<br />
primeira vez a circulação do vírus nos EUA, no<br />
período de 2001 a 2002, sua associação com<br />
quadros de Bronquiolite em crianças hospitalizadas<br />
e a ocorrência de co-infecção com VRS<br />
em até 70% das crianças 8 , que pode contribuir<br />
para maior severidade da doença. Na América<br />
Latina foi descrito pela primeira vez no Brasil<br />
por Cuevas e cols. 2003 2 , em Sergipe, com a<br />
caracterização clínico epidemiológica dos quadros<br />
de infecção respiratória aguda por VRS e<br />
hMPV em 111 crianças atendidas em clínicas e<br />
hospitais infantis. Os resultados também demonstraram<br />
que estes vírus podem produzir<br />
sinais e sintomas similares relacionados a outros<br />
vírus respiratórios e casos de co-infecção,<br />
especialmente com o vírus respiratório sincicial.<br />
Recentemente na Suécia, um novo parvovírus<br />
humano, o Bocavírus humano (HBoV), foi identificado<br />
em espécimes clínicos de crianças com<br />
um amplo espectro de infecção respiratória,<br />
incluindo quadros de epiglotite, bronquiolite<br />
severa e pneumonia 1 . Estudos adicionais tem<br />
sugerido que as características clínicas produzidas<br />
pelos HBoV são similares aquelas associadas<br />
aos vírus VRS e hMPV 5 . A patogenicidade do<br />
HBoV pode ser faclitada por condições<br />
predisponentes como a imunodeficiência,<br />
prematuridade, cardiopatia congênita e asma.<br />
No tocante a etiologia bacteriana, as infecções<br />
das vias respiratórias são classificadas conforme<br />
sua sintomatologia e sua localização anatômica,<br />
relacionando com os agentes infecciosos mais<br />
prevalentes. A epiglotite e a laringotraqueíte são<br />
doenças graves em crianças pequenas e<br />
neonatos e dentre os patógenos bacterianos<br />
mais prevalentes, destaca-se o Haemophilus<br />
influenzae. Outras infecções graves das vias respiratórias<br />
superiores são a coqueluche, causada<br />
pela Bordetella pertussis, e a difteria, pela<br />
Corynebacterium diphtheriae, além da faringite,<br />
uma das infecções bacterianas mais comuns no<br />
grupo de idade pediátrica, associada com mais<br />
freqüência ao Streptococcus pyogenes.<br />
142<br />
O Streptococcus pneumoniae associado a doença<br />
invasiva (pneumonia, bacteremia febril e meningite)<br />
está relacionado a mais de 1 milhão de<br />
óbitos por ano, a maioria em países em desenvolvimento,<br />
onde é considerado o agente infeccioso<br />
mais importante em crianças abaixo de<br />
5 anos 10 . A pneumonia adquirida na comunidade<br />
(PAC) associada aos pneumococos, atinge<br />
aproximadamente 100 por 100.000 adultos a<br />
cada ano na Europa e nos Estados Unidos.<br />
A maioria dos casos de sinusites estão associados<br />
com as bactérias Haemophilus influenzae<br />
e o Streptococcus pneumoniae, padrão similar<br />
às infecções do ouvido médio, como na otite<br />
média aguda, acrescida da maior freqüência de<br />
Branhamella catarrhalis.<br />
A utilização dos novos métodos diagnósticos,<br />
particularmente as técnicas imunológicas e a<br />
reação em cadeia da polimerase (PCR), tem<br />
se mostrado importante para a investigação<br />
epidemiológica e para a melhoria no diagnóstico<br />
específico das infecções respiratórias agudas,<br />
em termos de sensibilidade, especificidade e<br />
rapidez de resultados, com finalidade de orientação<br />
terapêutica adequada. O reconhecimento<br />
da etiologia viral no esclarecimento etiológico<br />
das infecções do trato respiratório, por exemplo,<br />
permite a diferenciação destas das infecções<br />
bacterianas, evitando muitas vezes, a<br />
prescrição desnecessária de antimicrobianos.<br />
Nos países em desenvolvimento os testes<br />
laboratoriais para identificação da maioria desses<br />
vírus relacionados aos quadros de IRA estão<br />
restritos aos centros de pesquisas. A cultura em<br />
células, o teste de imunofluorescência (IF) e o<br />
teste de ELISA, quando associados, são eficientes<br />
para detectar os agentes respiratórios virais<br />
mais prevalentes. Vale ressaltar que a IF na<br />
detecção de vírus no swab nasal ou no lavado<br />
nasofaringe apresenta uma sensibilidade mínima<br />
de 85% para VRS, parainfluenza, influenza A<br />
e B e adenovírus 7 .<br />
Os métodos para diagnóstico etiológico das<br />
pneumonias agudas adquiridas na comunidade<br />
podem ser divididos em métodos microbiológicos,<br />
imunológicos e de detecção do DNA<br />
do agente infeccioso. O método microbiológico<br />
clássico de cultivo do patógeno ainda é bastante<br />
utilizado, apesar de que o cultivo de<br />
amostras das vias aéreas superiores não reflete,<br />
de maneira satisfatória, a colonização do<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Novidades no diagnóstico, tratamento e prevenção das infecções respiratórias agudas<br />
foco pneumônico nas vias aéreas inferiores.<br />
Dentre os espécimes clínicos de maior<br />
representatividade do foco pneumônico temos<br />
as amostras de biópsia pulmonar (obtidas<br />
através de toracotomia ou punção por agulha),<br />
o líquido pleural, o sangue (demonstrando a<br />
ocorrência de bacteremia) e o lavado broncoalveolar,<br />
desde que sejam respeitados os critérios<br />
de cultura quantitativa e metodologia de<br />
coleta adequada.<br />
As punções pulmonares aspirativas favorecem<br />
o conhecimento da etiologia das pneumonias<br />
em crianças, mas o risco ao procedimento<br />
(pneumotórax, pneumomediastino, enfisema<br />
subcutâneo e hemoptise) limita a sua utilização<br />
rotineira como método diagnóstico. Já a<br />
cultura do aspirado pulmonar é positiva em<br />
cerca de 50 a 60% dos casos, enquanto que o<br />
exsudato parapneumônico aumenta consideravelmente<br />
a chance de se isolar o agente<br />
etiológico em cultura, com positividade de 50<br />
a 70% 7 . Contudo na prática clínica observa-se<br />
baixa positividade decorrente do uso freqüente<br />
de antibióticos antes da abordagem do derrame<br />
pleural. No que se refere às hemoculturas,<br />
são consideradas como um método<br />
muito confiável, porém de baixa positividade<br />
(10 a 35% dos casos internados) provavelmente<br />
pela baixa ocorrência de bacteremia entre os<br />
pacientes com pneumonia aguda. Atualmente<br />
se dispõe de um sistema de cultura de sangue<br />
automatizado (BacT/Alert 3D, Bio Merieux, França)<br />
3 com baixo risco de contaminação, período<br />
de incubação reduzido e uma maior taxa de<br />
isolamento bacteriano, comparado com os sistemas<br />
convencionais de cultura. Este procedimento<br />
possibilita estabelecer o diagnóstico<br />
etiológico precoce das pneumonias bacterianas<br />
adquiridas na comunidade (PAC) o que favorece<br />
a escolha da terapia antimicrobiana mais<br />
efetiva, culminando com e redução da mortalidade<br />
infantil por este agravo.<br />
Os métodos imunológicos compreendem os testes<br />
sorológicos (uso restrito na prática clínica),<br />
detecção de antígenos e marcadores da resposta<br />
inflamatória. Os testes de detecção de antígenos<br />
bacterianos permitem a identificação do agente<br />
infecciosos e não sofre influência do uso prévio<br />
de antimicrobianos Dentre os mais utilizados<br />
destacam-se a aglutinação pelo látex, contraimunoeletroforese<br />
(CIE) e Dot-ELISA.<br />
No que se refere aos marcadores da atividade<br />
inflamatória, a proteína C reativa (PCR), a interleucina<br />
6 (IL-6) e a pró-calcitonina (PCT) são os mais<br />
utilizados na prática clínica diária, principalmente<br />
frente as dificuldades de diferenciar a etiologia<br />
das pneumonias, viral ou bacteriana, com base<br />
em critérios clínicos e epidemiológicos. Em estudo<br />
recente, registrou-se valores mais elevados da<br />
pró-calcitonina e da proteína C reativa quando<br />
associadas às infecções bacterianas 8 .<br />
A identificação dos agentes etiológicos das infecções<br />
do trato respiratório é de fundamental<br />
importância para definir os melhores esquemas<br />
terapêuticos, evitando-se assim o tratamento<br />
empírico e baseado apenas nos dados epidemiológicos<br />
disponíveis. Com os novos avanços nos<br />
métodos diagnósticos tais como sorologias,<br />
detecção rápida de antígenos e testes de biologia<br />
molecular, há uma grande expectativa de futuramente<br />
serem incorporados na rotina e possibilitar<br />
o desenvolvimento de vacinas de maior<br />
impacto epidemiológico e por conseguinte promover<br />
impacto na morbi mortalidade infantil,<br />
nas taxas de hospitalizações e nos custos em<br />
saúde pública.<br />
<strong>Referências</strong> <strong>Bibliográficas</strong><br />
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Agudas e Crescimento<br />
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As infecções respiratórias agudas são responsáveis<br />
por 30 a 50% das consultas pediátricas e 20<br />
a 40% da hospitalização de crianças, sendo o<br />
motivo mais freqüente de procura aos serviços<br />
de saúde. A pneumonia é uma das principais<br />
causas de óbito em menores de cinco anos em<br />
todo o mundo, sendo responsável por cerca de<br />
8% dos óbitos nesta faixa etária no Brasil (1) . São<br />
vários os fatores de risco para o desenvolvimento<br />
das infecções respiratórias agudas, dentre eles<br />
a desnutrição energético protéica (2,3) e a deficiência<br />
de micronutrientes (4,6) . Entretanto, a infecção<br />
respiratória aguda recorrente, também<br />
pode ser a causa de uma falência nutricional,<br />
originando um ciclo vicioso. Durante um processo<br />
infeccioso agudo do trato respiratório, a<br />
criança está em risco nutricional em decorrência<br />
de vários fatores: ingestão inadequada de<br />
nutrientes (inapetência ou dificuldade para se<br />
144<br />
alimentar), maior gasto energético e hipoxemia.<br />
Ao final do processo infeccioso, caso não desenvolva<br />
uma pneumopatia crônica pós-infecciosa,<br />
a criança irá se recuperar nutricionalmente. Caso<br />
as infecções respiratórias (alta ou baixa) recorram<br />
num espaço curto de tempo, não haverá<br />
tempo hábil para a recuperação nutricional da<br />
criança, que apresentará um quadro de falência<br />
do crescimento. Alguns estudos também têm<br />
demonstrado comprometimento da secreção do<br />
hormônio do crescimento em decorrência da<br />
hipoxemia crônica, documentada principalmente<br />
em pacientes com hipertrofia de adenóides.<br />
Observando a evolução clínica de 129 pacientes<br />
com pneumopatia crônica pós-viral, Del Pino e<br />
cols. evidenciaram que os pacientes com<br />
hipercapnia crônica tinham risco cinco vezes<br />
maior de apresentarem falência do crescimento.<br />
Outros fatores de risco evidenciados por estes<br />
autores foram o uso prolongado de ventilação<br />
mecânica e de corticosteróides. Neste estudo<br />
as crianças apresentaram inicialmente comprometimento<br />
do ganho pôndero-estatural, com<br />
posterior recuperação nutricional, relacionada<br />
principalmente com a melhora do padrão<br />
respiratório, suporte nutricional adequado e<br />
qualidade do atendimento global destes<br />
pacientes (7) .<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Novidades no diagnóstico, tratamento e prevenção das infecções respiratórias agudas<br />
Vários estudos em pacientes com hipertrofia<br />
de amígdalas e adenóides têm auxiliado no entendimento<br />
do papel da hipoxemia, principalmente<br />
noturna, na gênese da falência do crescimento.<br />
Aumento significante do ganho ponderal foi<br />
observado em pacientes submetidos a amigdalectomia,<br />
em relação ao período pré-operatório (8,9) .<br />
Pacientes com obstrução respiratória alta em decorrência<br />
de hipertrofia de adenóides e amígdalas,<br />
apresentaram aumento significativo dos níveis<br />
séricos de IGF-I e IGFBP3, além de maior<br />
ganho ponderal após a ressecção cirúrgica das<br />
adenóides e amígdalas (10,11) . Acompanhando a<br />
evolução clínica durante um ano de 28 crianças<br />
de três a dez anos de idade, após a cirurgia para<br />
ressecção das amígdalas e adenóide, Ersoy e cols<br />
puderam observar um aumento significante da<br />
estatura e peso, além dos níveis séricos de IGF-I<br />
e IGFBP3, quando comparados com 20 crianças<br />
saudáveis com idade similar. É interessante ressaltar<br />
que estas crianças apresentavam nível sérico<br />
de IGF-I e IGFBP3 significantemente menor do<br />
que as do grupo controle no período pré-operatório,<br />
refletido numa menor velocidade de<br />
crescimento antes da cirurgia (12) . A alteração dos<br />
níveis de IGF-I e IGFBP3 sugere comprometimento<br />
da secreção ou atividade do hormônio do<br />
crescimento. É importante lembrar que a secreção<br />
do hormônio do crescimento ocorre durante<br />
o sono, e que um padrão ruim do mesmo,<br />
causado pela obstrução respiratória noturna e<br />
conseqüentemente hipoxemia, irá comprometer<br />
a secreção do hormônio de crescimento, resultando<br />
na diminuição da velocidade de crescimento<br />
da criança. Sabendo-se que a hipertrofia das<br />
amígdalas e adenóides são fatores de risco para<br />
o desenvolvimento de infecções respiratórias<br />
altas, é fácil inferir que além do risco nutricional<br />
decorrente de um quadro infeccioso (diminuição<br />
da ingestão de nutrientes e maior gasto energético),<br />
estes pacientes podem apresentar<br />
alteração hormonal com comprometimento do<br />
crescimento, em decorrência da hipoxemia e<br />
hipercapnia (10,12) . A recorrência das infecções,<br />
comum nos pacientes com hipertrofia de amígdalas<br />
e adenóide (13) , gera um ciclo vicioso difícil de<br />
ser rompido, com baixo ganho ponderal e deficiência<br />
de alguns micronutrientes devido a<br />
ingestão dietética inadequada, que por sua vez,<br />
contribuem para o desenvolvimento de infecções<br />
de repetição, devido ao comprometimento do<br />
sistema imune.<br />
As infecções respiratórias estão associadas à<br />
deficiência de micronutrientes, como zinco,<br />
vitamina A, vitamina D e ferro. Quadros infecciosos<br />
diminuem o estado corporal de ferro,<br />
entretanto, a deficiência de ferro está associada<br />
ao comprometimento da função do sistema<br />
imune, principalmente das células T, colaborando<br />
para o aparecimento de novas infecções.<br />
Sabendo-se que a deficiência de ferro é a carência<br />
nutricional de maior prevalência em todo<br />
o mundo e que a mesma é responsável pela<br />
falência de crescimento (14,16) , associa-se um<br />
fator adicional para o comprometimento<br />
do crescimento nas infecções respiratórias.<br />
A suplementação com ferro demonstrou reduzir<br />
a morbidade e freqüência de infecções<br />
respiratórias altas em crianças com e sem infecção<br />
respiratória alta, quando comparadas<br />
com crianças que receberam placebo (6) .<br />
A deficiência de outros micronutrientes pode<br />
estar envolvida na gênese das infecções de<br />
repetição, como a vitamina A, vitamina D e o<br />
zinco. A suplementação com vitamina A tem se<br />
mostrado eficaz na diminuição da freqüência<br />
de infecções respiratórias em crianças com<br />
deficiência desta vitamina, mesmo que<br />
subclínica. Entretanto, parece não haver benefício<br />
na suplementação de crianças sem deficiência<br />
de vitamina A (17,19) . A deficiência de vitamina<br />
D, mesmo subclínica, também parece estar<br />
associada ao maior risco de desenvolvimento<br />
de infecções respiratórias (4) . O zinco é um<br />
micronutriente essencial para o crescimento,<br />
desenvolvimento e função imune, sendo a sua<br />
deficiência relacionada à maior prevalência de<br />
infecções (5) , inclusive respiratórias (20) . Crianças<br />
que receberam suplementação de zinco apresentaram<br />
freqüência significantemente menor<br />
de infecções respiratórias quando comparadas<br />
com crianças que receberam placebo (21) .<br />
A origem do comprometimento do crescimento<br />
nas infecções respiratórias, principalmente as<br />
recorrentes, é multifatorial. A prevenção destas<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 145
Novidades no diagnóstico, tratamento e prevenção das infecções respiratórias agudas<br />
infecções ainda é a melhor forma de evitar a<br />
falência de crescimento de uma criança. O aleitamento<br />
materno exclusivo por no mínimo seis<br />
meses tem papel fundamental na prevenção das<br />
infecções do trato respiratório, principalmente<br />
em crianças com idade inferior a 24 meses. Esta<br />
proteção é independente de outros fatores, como<br />
exposição ao cigarro, creches, raça, tamanho da<br />
família, educação, nível sócio-econômico (22) .<br />
Manter uma alimentação adequada da criança,<br />
evitando as deficiências subclínicas de micronutrientes,<br />
também auxilia na prevenção destas<br />
infecções. É importante também o controle<br />
ambiental, com diminuição da exposição à<br />
poluição, cigarro, melhora do nível educacional<br />
e padrão sócio-econômico.<br />
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146<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Novidades no diagnóstico, tratamento e prevenção das infecções respiratórias agudas<br />
Terapêutica<br />
Medicamentosa nas<br />
Infecções Respiratórias<br />
Agudas (IRA):<br />
Usos e Abusos<br />
CRISTIANO MARQUES<br />
As infecções respiratórias agudas (IRA) são<br />
as patologias mais freqüentes na infância e originam<br />
1/3 dos atendimentos pediátricos em<br />
crianças abaixo de 5 anos de idade. A maioria<br />
das IRA nesta faixa etária são de etiologia viral<br />
(incluindo as pneumonias) com evolução<br />
autolimitada, necessitando apenas tratamento<br />
sintomáticos (febre e dor) e broncodilatadores.<br />
Porém, a sintomatologia da IRA como rinorréia,<br />
obstrução nasal, febre, dor e tosse origina um<br />
elevado consumo de medicamentos, muitos<br />
deles utilizados de forma inadequada, sem<br />
comprovação científica de sua eficácia e,<br />
também, do uso abusivo de antibióticos (ATB)<br />
para tratamento da IRA de etiologia viral.<br />
O uso abusivo de medicamentos inadequados<br />
está relacionado à vários fatores como:<br />
– dificuldades para diferenciar clinicamente infecções<br />
de etiologia viral ou bacteriana;<br />
–A falsa crença que o uso de ATB profilático<br />
poderia evitar a incidência de complicações;<br />
–A pressão familiar para prescrever medicamentos<br />
e ATB;<br />
–A falta de fiscalização para vendas destes<br />
fármacos;<br />
–O desconhecimento sobre os possíveis efeitos<br />
adversos e a potencial perda do paciente no<br />
caso de uma complicação.<br />
Além disso, o caráter autolimitado das IRA viral<br />
tende a reforçar o conceito popular da eficácia<br />
destes medicamentos.<br />
Todos estes fatores resultam em quatro situações<br />
preocupantes:<br />
1. O uso abusivo de ATB interfere com diagnóstico<br />
de doenças bacterianas graves, alterando<br />
o resultado das culturas e resultados<br />
laboratoriais;<br />
2. Aumento da resistência bacteriana aos ATB;<br />
3. Alto custo dispendido pelos familiares;<br />
4. Aumento de efeitos adversos a custo e longo<br />
prazo.<br />
Por esses motivos, neste artigo, serão abordados<br />
os aspectos diagnósticos e o uso apropriado<br />
destes medicamentos nas IRA prevalentes.<br />
Medicamentos utilizados na IRA<br />
• Associações descongestionantes-antihistamínicos:<br />
são as associações mais utilizadas<br />
no tratamento das gripes e resfriados. No resfriado<br />
comum, obstrução nasal é o sintoma<br />
principal. Embora existem vários medicamentos<br />
para estes sintomas, não há na literatura<br />
estudos bem desenhados para avaliar<br />
sua efetividade em crianças. Em recente<br />
meta-análise sobre o uso de descongestionantes,<br />
foram encontrados sete estudos somente<br />
em adultos 1 . Poucas evidências científicas<br />
indicam sua utilidade no resfriado comum<br />
em crianças. Os anti-histamínicos possuem<br />
efeitos anticolinérgicos e vasopressores, que<br />
é mais comum em lactentes. Podem causar<br />
insônia, irritabilidade, taquicardia, hipertensão,<br />
febre e alterações psiquiátricas, principalmente<br />
a Fenilpropanolamina em crianças<br />
abaixo de 6 anos de idade. Os vasos constrictores<br />
de uso tópico apresentam absorção<br />
rápida pela mucosa nasal e podem causar<br />
depressão no SNC, lesão e sangramento da<br />
mucosa nasal e vasodilatação de rebote. Não<br />
são recomendados para crianças principalmente<br />
abaixo dos 2 anos de idade 2 .<br />
• Antitussígenos: a tosse na maioria das vezes<br />
é um reflexo protetor e não deve ser suprimida.<br />
Vários estudos em crianças não confirmaram<br />
o efeito de antitussígenos não codeínicos.<br />
Um estudo randomizado e controlado em 100<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 147
Novidades no diagnóstico, tratamento e prevenção das infecções respiratórias agudas<br />
crianças avaliou o uso de dextrometorfano,<br />
defenidramina e placebo com IRA. Todas as<br />
crianças apresentam melhora significativa<br />
após o segundo dia de tratamento, indicando<br />
que a melhora da tosse faz parte da evolução<br />
natural da IRA 2 . O iodeto de potássio não tem<br />
indicação para crianças. A administração de<br />
antitussígenos (dextrometorfano) excepcionalmente<br />
pode se feita quando a tosse seca<br />
irritativa interfere no sono. É importante lembrar<br />
que a maioria da tosse seca na criança<br />
é por hiperreatividade brônquica.<br />
• Mucolíticos e expectorantes: a produção de<br />
muco é uma resposta a fatores agressivos ao<br />
aparelho respiratório. De acordo com o agente<br />
agressor apresenta celularidade, viscosidade<br />
e mediadores químicos diferentes. Apesar<br />
de serem muito utilizados na criança não há<br />
estudos que comprovem a efetividade desses<br />
medicamentos. Além disso, podem conter<br />
iodo, corantes e conservantes que podem<br />
causar efeitos adversos. Não são citados e<br />
indicados nos livros textos de Pediatria 3 .<br />
• Antinflamatórios: não tem indicação na<br />
IRA em crianças. São potentes analgésicos<br />
e antitérmicos, mascarando os sintomas e<br />
sinais de doenças graves. Podem alterar a<br />
resposta imunológica de defesa. Apresentam<br />
freqüentes efeitos adversos principalmente no<br />
trato gastrointestinal (sangramento) rins<br />
(nefrite intersticial) e pele. Tem indicações em<br />
algumas doenças reumatológicas (poliarterite<br />
nodosa e síndrome muscular-esquelética dolorosa<br />
idiopática) 3 .<br />
• Vitamina C: a análise de seis estudos<br />
randomizados e controlados com placebo de<br />
5.000 casos de resfriado comum demonstrou<br />
que o uso de vitamina C acima de 200 mg/dia<br />
não reduz a incidência de IRA 4 . Portanto seu<br />
uso não é indicado antes ou depois do início<br />
da IRA em crianças. A sua indicação absoluta<br />
é no escorbuto.<br />
• Antitérmicos-analgésicos: a febre é uma importante<br />
resposta de defesa nas infecções por<br />
microorganismos e pode ser medicada quando<br />
acarretar desconforto para a criança (geralmente<br />
acima de 38,5°C). O acetominofeno<br />
148<br />
e a dipirona não tem ação anti-inflamatória<br />
e são os mais indicados e utilizados na criança.<br />
O acetominofeno é considerado o antitérmico<br />
mais seguro na infância, porém não<br />
deve ser utilizado em hepatopatias, na diabetes<br />
e com cautela em crianças que utilizam<br />
medicamentos com metabolismo hepático<br />
(carbamazepina, fenobarbital e isoniazida).<br />
A dipirona também é um excelente antitérmico-analgésico<br />
e, ao contrário do que se acreditava,<br />
os estudos realizados em diversos<br />
países comprovaram que este fármaco é seguro<br />
e não está associado ou risco de aplasia<br />
de medula 6 . O ibuprofeno apresenta ação<br />
antitérmica, analgésica e anti-inflamatória.<br />
Não deve ser utilizado em asmáticos e na varicela.<br />
O ácido acetil salicílico (aspirina) não<br />
tem indicação para o tratamento da febre na<br />
criança. Podem precipitar a síndrome de Reye,<br />
irritação e hemorragia gástrica, edema, rinite<br />
e broncoespasmo 5 .<br />
Infecções respiratórias agudas<br />
mais comuns na criança<br />
• Resfriado comum (rinofaringite): o tratamento<br />
recomendado é de medicamentos<br />
sintomáticos para alívio da dor e da febre e<br />
administração de soro fisiológico (0,9%) para<br />
obstrução nasal.<br />
• Otite Média Aguda (OMA): a OMA é um dos<br />
principais motivos para o uso de antibióticos<br />
(ATB) em crianças. Uma recente meta-análise<br />
de 63 estudos demonstrou que os sintomas<br />
de OMA melhoram em 24 horas sem o uso de<br />
ATB em 61% das crianças, aumentando para<br />
80% em 2 a 3 dias. Outro dado importante<br />
deste estudo demonstrou que a frequência<br />
de complicações supurativas, quando os ATB<br />
são utilizados imediatamente (0,24%), é comparável<br />
com a freqüência de complicações<br />
quando os ATB são utilizados após um<br />
período inicial de observação de 48-72 horas<br />
(0,12%) 6 . As recomendações atuais da Associação<br />
Americana de Pediatria(AAP) para o<br />
diagnóstico e tratamento da OMA é o seguinte<br />
algoritmo 7 :<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Novidades no diagnóstico, tratamento e prevenção das infecções respiratórias agudas<br />
História de início agudo:<br />
–febre, otalgia, irritabilidade e otorréia<br />
+<br />
Presença de sinais de efusão<br />
em ouvido médio:<br />
–abaulamento da membrana timpânica<br />
(MT);<br />
–presença de nível líquido atrás da MT<br />
(atrás);<br />
– otorréia.<br />
Sinais ou sintomas de inflamação<br />
no ouvido médio:<br />
– hiperemia de MT<br />
– otalgia intensa<br />
+<br />
– Crianças hígidas entre 6 meses e 2 anos:<br />
– quadro não grave e diagnóstico incerto<br />
– Crianças com 2 anos ou mais:<br />
– quadro não grave<br />
– quadro não grave e diagnóstico incerto<br />
– Crianças hígidas entre 6 meses e 2 anos:<br />
– quadro grave e diagnóstico incerto<br />
– Crianças com 2 anos ou mais:<br />
– quadro não grave<br />
– quadro não grave e diagnóstico incerto<br />
– Analgesia para dor: observação por 48 a<br />
72 horas<br />
– Ausência de resolução do quadro: antibióticos<br />
O ATB recomendado para OMA na criança é a<br />
amoxacilina e, se não houver resposta, a associação<br />
amoxacilina mais Ac. Clavulônico.<br />
• Sinusite Aguda Bacteriana (SAB): embora<br />
o envolvimento dos seios seja comum em<br />
IRA virais, a verdadeira incidência de SAB,<br />
em crianças é desconhecida. A cronologia da<br />
aeração dos seios para-nasais na criança é<br />
irregular e multivariável. Estima-se que 10%<br />
das IVAS compliquem com SAB 8 . O risco da<br />
infecção bacteriana é maior quanto maior a<br />
duração dos sintomas 9 . Por isso, a principal<br />
indicação de ATB é a persistência de infecção<br />
de vias aéreas com descarga e/ou congestãonasal,<br />
rinorréia posterior e tosse por mais de<br />
10 dias, ou uma piora desses sintomas após<br />
5 a 7 dias. A AAP sugere o seguinte algoritmo<br />
para o diagnóstico e tratamento da SAB em<br />
crianças:<br />
1. Crianças com menos de 6 anos: o diagnóstico<br />
é baseado na persistência ou gravidade<br />
de sintomas respiratórios altos. O Rx de<br />
seios da face não tem valor e não deve ser<br />
solicitado nesta faixa etária;<br />
2. Crianças com idade maior que 6 anos o<br />
diagnóstico pode ser confirmado por exame<br />
radiológico. Quando houver sinais e<br />
sintomas associados com SAB: descarga<br />
nasal (clara, mucóide ou purulenta), congestão<br />
nasal, dor facial, rinorréia posterior,<br />
hiposmia ou anosmia, febre, tosse seca<br />
ou úmida diurna (embora freqüentemente<br />
piore à noite), fadiga e desconforto auditivo.<br />
Conduta: observar a evolução se não<br />
houver melhora em 10 dias ou piora em<br />
5 a 7 dias, medicar com ATB (amoxacilina)<br />
por 10 dias 10 .<br />
• Faringo-Amigdalite: a faringoamigdalite (FA)<br />
é um envolvimento comum na IRA viral. A FA<br />
viral incide em crianças abaixo de 2 anos de<br />
idade, com início lento, febre baixa e sinais<br />
de IVAS (tosse, coriza, rouquidão) e odinofagia.<br />
Apresenta adenopatia cervical discreta pouco<br />
dolorosa. Pode apresentar secreções broncacinzentada<br />
nas amígdalas, freqüentemente<br />
punctiformes. Necessita apenas de tratamento<br />
sintomáticos (analgésicos-antitérmicos).<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 149
Novidades no diagnóstico, tratamento e prevenção das infecções respiratórias agudas<br />
A FA bacteriana tem como agente etiológico<br />
principal o Streptococcus pyogenes. Acomete<br />
crianças com idade acima de 2-3 anos, com<br />
início rápido, febre alta, odinofagia variável e<br />
adenopatia cervical importante e dolorosa.<br />
É comum secreção esbranquiçada em amígdalas.<br />
Os sintomas gerais são importantes como<br />
mal estar, cefaléia e dor abdominal. Não é<br />
comum os sintomas de IVAS. O tratamento<br />
indicado é a Penicilina benzatina. Nos raros<br />
casos de alergia a penicilina pode-se utilizar<br />
a Eritromicina, macrolídeos, cefalosporina<br />
de 1ª geração e amoxacilina. Não tem indicação,<br />
na FA, a associação amoxacilina-ácido<br />
clavulônico. O seguinte algoritmo é recomendado<br />
pela AAP e departamento de infectologia<br />
de SBP para o diagnóstico e tratamento<br />
da FA 11,12 .<br />
Avaliar aspectos clínicos e epidemiológicos<br />
Não sugestivos de<br />
etiologia estreptocócica<br />
Compatíveis com<br />
etiologia estreptocócica<br />
Terapia sintomática negativa Cultura negativo Teste rápido<br />
Positivo(a)<br />
Antibioticoterapia<br />
• Pneumonias: Não é objetivo, neste artigo,<br />
uma discussão detalhada sobre diagnóstico e<br />
tratamento de Pneumonias na criança. Entre<br />
as IRA, a pneumonia resulta em 2 milhões de<br />
óbito por ano, no mundo, em crianças abaixo<br />
de 5 anos sendo 90% destes óbitos em países<br />
em desenvolvimento. Estima-se que 80% das<br />
IRA (incluindo pneumonias) são de etiologia<br />
viral. Os principais agentes virais são: vírus<br />
sincicial respiratório, Influenza, Parainfluenza<br />
e Adenovirus. Os principais agentes etiológicos<br />
bacterianos são: o Pneumococo, Haemophilus<br />
influenza-B, o Mycoplasma pneumoniae e o<br />
Stafilococcus aureus. As seguintes características<br />
auxiliam no diagnóstico entre pneumonias<br />
virais e bacterianas. Na pneumonia viral,<br />
150<br />
geralmente a criança encontra-se em bom<br />
estado geral com sinais de IVAS. A febre de<br />
etiologia viral, na grande maioria é de baixa<br />
intensidade (até 38,5°), apesar de uma minoria<br />
apresentar febre alta. A febre viral dura<br />
em média 2 a 3 dias e, quando rebaixada,<br />
desaparece a prostração da criança. Pode<br />
ter intervalos sem febre e no final pode diminuir<br />
de intensidade. A febre bacteriana geralmente<br />
é alta (349-40°) e persistente até o<br />
tratamento com ATB, e a criança persiste prostrada<br />
após seu rebaixamento. A ausência de<br />
febre, praticamente exclui a possibilidade de<br />
pneumonia bacteriana. O Rx das pneumonias<br />
virais é bem característica: apresenta infiltrados,<br />
difusos e de contornos imprecisos,<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Novidades no diagnóstico, tratamento e prevenção das infecções respiratórias agudas<br />
perihilares, bilaterais. Não há formação de<br />
Pneumotoceles e envolvimento pleural e é<br />
comum hiperinsuflação (uma característica de<br />
infecção viral). Na pneumonia bacteriana, o<br />
início é agudo e o Rx apresenta condensações<br />
geralmente lobar unilateral, de contornos precisos,<br />
podendo ter envolvimento pleural e formação<br />
de pneumatoceles. O hemograma, nas<br />
infecções virais, na maioria das vezes apresenta<br />
leucócitos totais abaixo de 20.000,<br />
neutrófilos abaixo de 10.000 e formas jovens<br />
abaixo de 500. Na pneumonia bacteriana,<br />
geralmente, o hemograma apresenta valores<br />
superiores aos descritos acima. O tratamento,<br />
nos quadros virais, é sintomático. Nas pneumonias<br />
bacterianas, adquiridas na comunidade<br />
o tratamento de escolha são os ATB betalactâmicos:<br />
amoxacilina e penicilina procaína.<br />
Nas crianças acima de 6 a 8 anos pode-se<br />
utilizar os macrolídeos.<br />
Conclusão<br />
A maioria dos medicamentos utilizados para<br />
tratar os sintomas de IRA, não tem efetividade<br />
comprovada, não são citados em livros textos<br />
clássicos de Pediatria e podem causar efeitos<br />
adversos. Além dos gastos financeiros o uso<br />
abusivo de ATB aumenta a resistência bacteriana<br />
e interfere no diagnóstico de doenças graves. As<br />
medidas mais importantes para evitar IRA são:<br />
boa alimentação, leite materno, vacinas e, principalmente<br />
evitar contato com doentes com IRA.<br />
<strong>Referências</strong> <strong>Bibliográficas</strong><br />
01. Sutter AI, Lemiengre M, Campbell H, Mackinnon HF.<br />
Cochrane Database Syst Rev 2003; (3):CD001267.<br />
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03. Arroll B. Respir Méd 2005; 99:1477-84.<br />
04. Douglas RM, Hemila H, D’Souza R. et al. Cochrane<br />
Database Syst Rev 2004; 18:CD000980.<br />
05. Bricks, LF. Analgésicos antitérmicos e antiinflamatórios<br />
não hormonais:controvérsias sobre sua utilização em<br />
crianças. Pediatria (São Paulo) 1998; 20:230-46.<br />
06. Rosenfeld RM, Kay D. Laryngoscope 2003; 113:1645-57.<br />
07. American Academy of Pediatrics. Pediatrics 2004;<br />
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08. Wald ER, Guerra N, Byers C. Pediatrics 1991; 87:29-33.<br />
09. Poole MD, Jacobs MR. Int J Pediatr Otohinolaryngol<br />
2002; 63:1-12.<br />
10. American Academy of Pediatrics. Pediatrics 2001;<br />
108:798-808.<br />
11. Gerber MA. Pediatr Clin North Am 2005; 52:729-47,vi.<br />
12. Nascimento-Carvalho CM, Marques HH. J Pediatr<br />
(Rio J) 2006; 82:79-80.<br />
13. World Health Organization. Wkly Epidemiol Record<br />
2003; 14:110-9.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 151
Novidades no diagnóstico, tratamento e prevenção das infecções respiratórias agudas<br />
152<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Seguimento do<br />
prematuro após a alta<br />
Interpretação do<br />
Crescimento<br />
JOSÉ ROBERTO DE MORAES RAMOS<br />
Nutrir adequadamente com o objetivo de proporcionar<br />
ao prematuro um crescimento semelhante<br />
ao crescimento fetal é um dos grandes<br />
desafios dentro da Neonatologia. Atualmente<br />
não há consenso sobre as necessidades<br />
nutricionais que garantam esse crescimento<br />
extra-útero adequado. A Academia Americana<br />
de Pediatria (AAP) recomenda desde 1985 que<br />
se forneçam nutrientes suficientes aos prematuros<br />
para que eles alcancem a velocidade de<br />
crescimento fetal fora do útero.<br />
Estudos demonstram que o crescimento pósnatal<br />
do prematuro não acompanha a curva de<br />
crescimento intra-uterino, permanecendo abaixo<br />
do percentil 10 ao chegar ao termo (37 semanas<br />
de idade corrigida). Além disso, observase<br />
que esses bebês podem permanecer abaixo<br />
da curva ainda na idade escolar e muitas das<br />
vezes até a adolescência (Allen, 1993; Hirata e<br />
Bosque, 1998).<br />
Nesse sentido é fundamental que o Pediatra<br />
esteja preparado e bem fundamentado para<br />
monitorizar adequadamente o crescimento<br />
destes bebês após a alta da UTI neonatal.<br />
A monitorização nutricional do prematuro é<br />
feita a partir da obtenção de medidas<br />
antropométricas como peso, comprimento, perímetro<br />
cefálico e circunferência braquial. Tais<br />
medidas são colocadas em gráficos e devemos<br />
sempre levar em conta a idade gestacional<br />
corrigida para a prematuridade. Deve-se lembrar<br />
que a idade corrigida para o perímetro<br />
cefálico é usada até 1 ano e meio, para o peso<br />
até 2 anos e para a estatura até os 3 anos e meio.<br />
A utilização da idade corrigida para se avaliar o<br />
crescimento e desenvolvimento do recém-nascido<br />
pré-termo, deve-se ao caráter progressivo<br />
de maturação do Sistema Nervoso Central, assim<br />
como possibilita certa comparação com o<br />
recém-nascido a termo. Durante a avaliação do<br />
crescimento do pré-termo, utilizamos as curvas<br />
de crescimento intra-uterino até atingir 40 semanas<br />
de idade corrigida ou ainda alguns autores<br />
sugerem a utilização das curvas Pós-natal<br />
como as decorrentes do estudo de Erhernkrans<br />
et al (1999) que respeitam a perda fisiológica de<br />
peso dos primeiros dias de vida. A partir de<br />
então, utilizamos as curvas do NCHS (2000) para<br />
avaliação da velocidade de crescimento pósnatal<br />
com as devidas correções de idade<br />
gestacional.<br />
<strong>Referências</strong> <strong>Bibliográficas</strong><br />
01. American Academy of Pediatrics Commitee on<br />
Nutrition (AAP). Nutrition needs of low birth weight<br />
infants. Pediatrics, 75:976-986, 1985<br />
02. Ehrenkranz, RA et al. Longitudinal growth of<br />
hospitalized very low birth weight infants, Pediatrics<br />
104 (2):280-289, 1999.<br />
03. Allen LH. The nutrition CRSP: What is marginal<br />
malnutrition, and does it affect human function.<br />
Nutrition Review, 51:255-267, 1993.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 153
Seguimento do prematuro após a alta<br />
Manejo Nutricional<br />
HELENILCE DE PAULA FIOD COSTA<br />
Durante as duas últimas décadas a atenção dos<br />
neonatologistas foi direcionada para melhorar<br />
a oferta nutricional do recém-nascido (RN) prétermo<br />
(PT), particularmente os de muito baixo<br />
peso (MBP), e idade gestacional menor que 34<br />
semanas durante o período de hospitalização.<br />
Isto incluiu o desenvolvimento de aditivos do<br />
leite humano e fórmulas especiais para prematuros,<br />
pois sabemos que a nutrição, no curto<br />
prazo, tem influência direta sobre a morbidade<br />
neonatal. Entretanto, a nutrição do PT após a<br />
alta da unidade neonatal tem sido relativamente<br />
negligenciada porque os aditivos são<br />
suspensos por ocasião da saída hospitalar e lhe<br />
são comumente indicadas fórmulas adequadas<br />
para RN a termo (T) para suplementação da<br />
oferta do leite materno.<br />
Estudos realizados em 14 centros americanos<br />
(NICHS) mostraram que 97% dos RN com peso<br />
de nascimento (PN) < 1500g apresentaram, com<br />
36 semanas de idade corrigida, peso abaixo do<br />
percentil 10 da curva do NICHS, ou seja, manifestaram<br />
crescimento extra-uterino restrito<br />
(CEUR).<br />
Assim, a má nutrição e o retardo de crescimento<br />
parecem ser problemas inevitáveis para<br />
PT de MBP no período pós-natal, visto que eles<br />
acumulam um déficit calórico de 406kcal/kg/<br />
semana e de proteína de 14g/kg/semana, sendo<br />
estas deficiências cumulativas.<br />
Dados de 2005 do NICHD - Neonatal Research<br />
Network, tendo como base as curvas do NCHS/<br />
CDC-2000, mostraram que com idade<br />
gestacional cronológica de 30 meses, 32% das<br />
crianças com PN ≤ 1000g estavam com peso<br />
abaixo do P10 e 24% abaixo do P10 em comprimento.<br />
Estudos relatam que com 14 anos<br />
essas crianças têm menor comprimento, peso<br />
e perímetro cefálico.<br />
Infelizmente não está determinado um guia<br />
nutricional preciso que inclua as necessidades<br />
para o “catch-up” do crescimento para<br />
crianças prematuras de muito baixo peso após<br />
a alta.<br />
Talvez a deficiência de nutrientes específica do<br />
PT de MBP mais estudada seja a do cálcio e<br />
fósforo, uma vez que é muito difícil suprir as<br />
necessidades desses minerais durante as primeiras<br />
semanas; e muitos desses saem com os ossos<br />
pouco mineralizados e alterações bioquímicas<br />
de Doença Metabólica Óssea. Estudos<br />
randomizados mostraram menor crescimento<br />
em peso e principalmente estatura dessas<br />
crianças aos 18 meses de vida.<br />
RN prematuros têm estoques corporais reduzidos<br />
de outros nutrientes como zinco, ferro e<br />
cobre, situação que pode ser agravada pelas<br />
doenças do período neonatal. O zinco é um<br />
elemento importante para o crescimento e desenvolvimento<br />
cerebral; prematuros alimentados<br />
com fórmulas adequadas para RN termo<br />
após a alta têm baixas concentrações de zinco<br />
plasmático. Por outro lado, aquelas que receberam<br />
suplementação de zinco pós-alta e até<br />
6 meses de idade corrigida, mostram maior<br />
crescimento linear e melhor desenvolvimento<br />
motor.<br />
Triagens randomizadas mostraram benefícios<br />
para o crescimento, principalmente de<br />
meninos, quando são administradas dietas<br />
enriquecidas com alto teor de proteína,<br />
minerais, ferro, vitaminas A, D e E e esses<br />
efeitos persistiram após o período de intervenção.<br />
O tempo de duração da alimentação com fórmulas<br />
enriquecidas ainda não está bem<br />
estabelecida. A Academia Americana de Pediatria<br />
reconhece a importância do uso dessas fórmulas<br />
durante os primeiros nove meses de idade<br />
corrigida. Afirma ainda que atualmente não<br />
há evidências suficientes para que seja feita uma<br />
recomendação oficial sobre a alimentação do<br />
pré-termo pós-alta.<br />
Após a alta, para crianças prematuras que estão<br />
em aleitamento materno misto, recomenda-se<br />
154<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Seguimento do prematuro após a alta<br />
que a suplementação do leite materno seja<br />
realizada preferencialmente com fórmulas<br />
enriquecidas e a introdução de alimentos sólidos<br />
com alto conteúdo de calorias, proteínas,<br />
ferro e zinco seja precoce.<br />
É preciso chamar a atenção também para o<br />
fato que prematuros têm alto risco de desenvolver<br />
dificuldades na aceitação da alimentação<br />
e isto parece ter impacto negativo sobre<br />
a sua nutrição no primeiro ano de vida. Essas<br />
evidências sugerem que o período pós-alta<br />
é crítico e influencia a trajetória do crescimento.<br />
Estudos futuros são necessários para determinar<br />
os efeitos da intervenção nutricional nesse<br />
período sobre o crescimento, desenvolvimento<br />
e saúde futura dessas crianças.<br />
<strong>Referências</strong> <strong>Bibliográficas</strong><br />
01. American Academy of Pediatrics, Committee on<br />
Nutrition: Nutritional needs of the preterm infant, in<br />
Kleinman RE (ed): Pediatric Nutrition Handbook (ed<br />
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fed nutrient-enriched or term formula after hospital<br />
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Semin Neonatal 2003; 8, 169-70.<br />
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composition. Am J Clin Nuth 2006; 84 (6); 1357-64.<br />
06. Greer FR. Post-Discharge Nutrition: What does the<br />
Evidence Support? Semin Perinatol 2007; 31: 89-95.<br />
Avaliação do<br />
Desenvolvimento<br />
RITA DE CÁSSIA SILVEIRA<br />
Os progressos com os cuidados intensivos oferecidos<br />
ao recém-nascido pré-termo nas duas últimas<br />
décadas, têm sido efetivos em reduzir a<br />
mortalidade neonatal. A maior sobrevida de prétermos<br />
implica na necessidade de seguimento<br />
ambulatorial cuidadoso dos recém-nascidos após<br />
a longa permanência no Centro de Tratamento<br />
Intensivo Neonatal, buscando qualidade de vida<br />
para estes pacientes.<br />
O sistema nervoso central (SNC) imaturo é vulnerável<br />
a eventos hipóxicos e isquêmicos envolvidos<br />
na fisiopatologia de morbidades durante a<br />
internação no CTI neonatal, como hemorragia<br />
peri-intraventricular, leucomalácia periventricular,<br />
infarto hemorrágico, dilatação pós-hemorrágica,<br />
hidrocefalia após leucomalácia, meningite<br />
neonatal, atrofia cerebral. Como conseqüência,<br />
no seguimento após a alta hospitalar, desabilidade<br />
é comum em prematuros de muito baixo<br />
peso; atraso no desenvolvimento é mais observado<br />
em idades gestacionais menores. A maioria<br />
dos estudos é realizada nesta população de maior<br />
risco, mas crianças nascidas entre 32 semanas e<br />
35 semanas, consideradas pré-termos tardios,<br />
também podem necessitar de educação especial<br />
na escola. Quando o peso de nascimento é inferior<br />
a 1.500 gramas, cerca de 10% desenvolvem<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 155
Seguimento do prematuro após a alta<br />
paralisia cerebral (PC) e em torno de 50% apresentam<br />
déficit cognitivo e comportamental. Nos<br />
prematuros extremos a prevalência de PC aos dois<br />
anos pode ser ainda mais elevada. Seqüelas<br />
neurossensoriais graves, como cegueira e surdez<br />
ocorrem em 6 a 20% dos prematuros de muito<br />
baixo peso.<br />
Recém-nascidos com peso de nascimento inferior<br />
a 1.500 gramas e idade gestacional abaixo<br />
de 32 semanas, e seus potenciais problemas de<br />
desenvolvimento após a alta da UTI neonatal<br />
serão o foco de abordagem dessa aula.<br />
As patologias decorrentes da imaturidade dos<br />
órgãos e sistemas; como doença pulmonar crônica,<br />
déficits nutricionais graves, hemorragia periintraventricular<br />
(HPIV), maior suscetibilidade a<br />
infecções, seqüelas de enterocolite necrosante,<br />
seqüelas neurossensoriais acarretadas pela<br />
retinopatia da prematuridade e surdez<br />
neurossensorial, podem contribuir para múltiplas<br />
re-internações após a alta do CTI neonatal, com<br />
crescimento físico deficiente, atraso no desenvolvimento<br />
neuro-psicomotor e maior mortalidade<br />
em longo prazo.<br />
HPIV da matriz germinativa é a lesão cerebral<br />
mais comum no prematuro de muito baixo peso,<br />
facilmente diagnosticada pela realização de<br />
ultrassonografia cerebral. A incidência aumenta<br />
abaixo das 30 semanas de idade gestacional. O<br />
comprometimento do neurodesenvolvimento<br />
está relacionado com o tamanho da hemorragia.<br />
A hemorragia pequena (graus I e II) são os<br />
casos mais freqüentes e o prognóstico é bom.<br />
Hemorragia moderada (grau III) é causa freqüente<br />
de diplegia quando evolui para hidrocefalia<br />
obstrutiva, e nos casos mais graves (grau IV), o<br />
comprometimento parenquimatoso evolui no<br />
seguimento para a forma hemiplégica da PC.<br />
A HPIV é classificada de acordo com Papile e<br />
colaboradores, baseada em achados do<br />
ultrassom cerebral, conforme descrito no quadro<br />
ao lado.<br />
Classificação da HPIV (in Silveira RC, Procianoy RS,<br />
J Ped (Rio J) 2005; 81:S23-S32).<br />
Grau I = hemorragia localizada somente na<br />
matriz germinativa.<br />
156<br />
Grau II = hemorragia intraventricular com tamanho<br />
dos ventrículos normais.<br />
Grau III = hemorragia intraventricular com dilatação<br />
ventricular aguda.<br />
Grau IV = hemorragia intraventricular com comprometimento<br />
do parênquima cerebral.<br />
Leucomalácia Periventricular (LPV) está muito<br />
associada com alta prevalência de PC e significativo<br />
déficit motor e cognitivo, especialmente<br />
a LPV cística. A forma diplégica de PC é a mais<br />
comum, clinicamente acometendo membros<br />
inferiores porque as fibras neuronais que transitam<br />
junto aos ventrículos laterais são as responsáveis<br />
pela inervação dos membros inferiores.<br />
A LPV consiste em infarto isquêmico na área<br />
da substância branca cerebral adjacente aos<br />
ventrículos laterais, ocorrendo comumente em<br />
recém-nascidos prematuros com menos de 35<br />
semanas de gestação. O diagnóstico é obtido<br />
pela ultrassonografia cerebral que evidencia<br />
inicialmente, uma área de ecogenicidade aumentada<br />
periventricular com subseqüente desenvolvimento<br />
de lesões císticas representando<br />
os focos necróticos.<br />
A displasia bronco-pulmonar (DBP) está entre as<br />
patologias inerentes da prematuridade, que<br />
compromete o seguimento dos recém-nascidos<br />
de muito baixo peso. As seqüelas pulmonares<br />
decorrentes do pulmão imaturo, a dependência<br />
do oxigênio e múltiplas infecções respiratórias,<br />
comprometem o crescimento, causando desnutrição<br />
crônica. As necessidades de nutrientes<br />
no CTI devem ser adequadas ao nascimento prematuro,<br />
de forma que a alimentação parenteral<br />
ou enteral consiga proporcionar taxas de crescimento<br />
comparáveis ao crescimento intra-uterino.<br />
A velocidade de crescimento durante o período<br />
de internação influencia o neurodesenvolvimento<br />
de pré-termos extremos com 18 e 22 meses de<br />
idade corrigida. A maior oferta calórica desde a<br />
internação no CTI neonatal e nutrição balanceada<br />
nos primeiros meses após a alta hospitalar<br />
podem compensar a maior demanda por<br />
nutrientes.<br />
Resumidamente, são situações descritas como<br />
relacionadas com pior prognóstico no seguimento:<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Seguimento do prematuro após a alta<br />
➢ PN < 750 g ou IG < 25 semanas.<br />
➢ HPIV (III/IV) ou Infarto.<br />
➢ LPV ou dilatação ventricular persistente.<br />
➢ Morbidades graves no período neonatal:<br />
convulsões, meningite neonatal, DBP.<br />
➢ Desnutrição grave e taxas de falha no crescimento.<br />
➢ Perímetro cefálico (PC) subnormal na alta.<br />
➢ Uso de corticóide pós-natal.<br />
Dentre os fatores ambientais; destacam-se:<br />
➢ Abuso de drogas pelos pais/cuidadores.<br />
➢ Pobreza.<br />
As principais anormalidades neurocognitivas observadas<br />
no seguimento do prematuro podem<br />
ser dividas de acordo com a idade de apresentação,<br />
e estão apresentadas no quadro abaixo.<br />
Anormalidades Neurocognitivas PMBP in Marlow N. Arch Dis Child Neonatal Ed 2004;89;224-8.<br />
Até 2 anos<br />
Dificuldades alimentares<br />
Distonias transitórias<br />
Atraso na linguagem<br />
Surdez<br />
Cegueira<br />
Baixo Escore nos testes<br />
PC<br />
Idade escolar<br />
Comprometimento cognitivo<br />
Dist. Coordenação motora<br />
Alteração na percepção viso-espacial<br />
TDAH<br />
TBH<br />
Alterações auditivas e oftalmológicas, estrabismo<br />
Necessidade de educação especial<br />
Avaliação do desenvolvimento<br />
na consulta de rotina<br />
O crescimento e o desenvolvimento são processos<br />
integrados e contínuos, ocorrendo em etapas<br />
que propiciam a realização de funções progressivamente<br />
mais complexas.<br />
Como os testes são baseados em crianças nascidas<br />
a termo, na adequação ao padrão de desenvolvimento,<br />
considera-se até os dois anos de<br />
idade da criança a Idade corrigida (IC) ou Pósconcepcional,<br />
como parâmetro de avaliação.<br />
A idade corrigida consiste na idade gestacional<br />
que o feto estaria no momento da avaliação,<br />
caso não tivesse nascido prematuramente.<br />
Ou seja, na prática é calculada pela fórmula:<br />
IC= I cronológica (dv) - (40 sem - IGP sem).<br />
Variáveis avaliadas no neurodesenvolvimento:<br />
Motor, cognição, aprendizagem, comportamento,<br />
visão e audição. Esta avaliação ocorre<br />
empregando-se testes, que são uma forma de<br />
triagem do DNPM.<br />
➢ Teste de triagem: DENVER II<br />
A escala de DENVER é rápida e facilmente<br />
aplicada, considerada teste de triagem aplicado<br />
pelo pediatra durante a consulta de rotina,<br />
não é teste diagnóstico.Os itens avaliados são:<br />
motor grosseiro (amplo), motor fino-adaptativo,<br />
linguagem e pessoal-social. Considera-se a avaliação<br />
da mãe na forma de relatos das capacidades<br />
(marcado com R no gráfico do DENVER<br />
quando a criança está adequada para idade),<br />
mas sempre que possível deve haver a obser-<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 157
Seguimento do prematuro após a alta<br />
vação do examinador no gráfico apropriado<br />
para anotação.<br />
➢ Marcos do desenvolvimento neuromotor:<br />
avaliam as aquisições motoras, especialmente<br />
nos dois primeiros anos de vida. O<br />
pediatra tem plena condição de realizar<br />
esta triagem nas consultas de supervisão<br />
de saúde. São avaliados: tônus passivo,<br />
postura, força muscular, mobilidade ativa.<br />
Alterações observadas no primeiro ano<br />
de vida podem significar ou não PC, uma<br />
vez que distonias transitórias podem ser<br />
normais, desaparecendo no segundo ano<br />
de vida. São distúrbios transitórios do<br />
tono muscular, como persistência de reflexos<br />
primitivos no lactente maior. Portanto,<br />
a maioria das alterações neurológicas<br />
e sensoriais graves é diagnosticada<br />
a partir dos dois anos de idade corrigida.<br />
➢ Desenvolvimento da linguagem: deve ser<br />
cuidadosamente avaliado no prematuro,<br />
desde os marcos pré-lingüísticos; como<br />
o reconhecimento de objetos e figuras,<br />
realização de pequenas tarefas ao ser<br />
comandado. Atraso na linguagem pode<br />
estar associado com deficiência auditiva.<br />
Escalas de desenvolvimento<br />
Bayley II (psicomotor e mental): é um instrumento<br />
de avaliação do desenvolvimento complementar<br />
ao DENVER, aplicado geralmente por<br />
psicólogas devidamente treinadas e capacitadas.<br />
É o método mais utilizado para diagnóstico de<br />
desenvolvimento até os três anos, avalia capacidade<br />
de orientação e desempenho cognitivo.<br />
A sigla vem do inglês, Bayley Scales of Infant<br />
Development second edition (BSDI-II). São<br />
qualificadas as funções mental e motora de<br />
forma quantitativa e objetiva, após rigorosa<br />
avaliação das capacidades da criança. Mental<br />
Developmental Index (MDI), Psychomotor<br />
Developmental Index (PDI) são considerados<br />
escores normais quando superiores a 85. Na<br />
presença de atraso leve a moderado há um<br />
desvio padrão (-1 SD) e os escores serão entre<br />
85 e 70, e nos casos graves há dois desvio-padrão<br />
(-2SD), ou seja, PC é representado pelo<br />
158<br />
escore inferior a 70. Observa-se também que os<br />
prematuros são menos atentos e persistentes, o<br />
que pode comprometer o desempenho cognitivo<br />
futuro. A cegueira impossibilita a aplicação do<br />
teste e já é critério para desabilidade grave.<br />
Após os três anos de idade, os testes de avaliação<br />
do desenvolvimento são mais complexos, onde é<br />
necessário maior atenção à linguagem, habilidade<br />
motora fina e escrita, que são diretamente<br />
relacionados com o potencial de aprendizagem.<br />
Wechsler: é uma escala de avaliação da inteligência<br />
para pré-escolar e escolar, a testagem é<br />
aplicada por psicólogas, a mais conhecida é a<br />
WISC-IV (Wechsler Inteligence Scale for Children).<br />
Os prematuros de muito baixo peso na idade<br />
escolar, apresentam diferença média de 10 pontos<br />
no quociente intelectual (QI), a dificuldade<br />
para matemática é a mais freqüente, seguida pela<br />
leitura e linguagem. As deficiências cognitivas são<br />
maiores nos prematuros extremos (idade<br />
gestacional inferior a 28 semanas ou peso de<br />
nascimento abaixo de 750 gramas). Os transtornos<br />
de aprendizagem são diagnosticados quando<br />
os escores estão dois desvios padrão abaixo<br />
da média (-2 SD) em testes padronizados de<br />
matemática, leitura e escrita. Emprega-se como<br />
referência a idade cronológica.<br />
Problemas comportamentais e psiquiátricos<br />
podem aparecer na idade escolar, como TDAH-<br />
Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade<br />
e THB-transtorno Bipolar do Humor.<br />
A avaliação inclui critérios formais para o diagnóstico,<br />
baseados em questionário específico,<br />
preenchido pela família e a escola. Problemas<br />
como depressão e ansiedade são mais freqüentes<br />
nas crianças nascidas prematuras quando<br />
comparadas com a população geral.<br />
Os PMBP apresentam problemas visuais, como<br />
estrabismo e defeitos de refração e distúrbios na<br />
coordenação motora fina que podem interferir<br />
no desempenho escolar e em geral, coexistem.<br />
Medidas adotadas no CTI Neonatal<br />
que resultam em desenvolvimento mais<br />
favorável no seguimento<br />
Nutrição parenteral precoce: Adequada nutrição<br />
é crítica para o desenvolvimento cere-<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Seguimento do prematuro após a alta<br />
bral. O peso seco do cérebro humano é predominantemente<br />
lipídico e 25% da substância<br />
branca é formada pelos ácidos aracdônico<br />
e doco-hexanóico, essenciais para o crescimento,<br />
função e integridade do cérebro. A deficiência<br />
de ácidos graxos essenciais durante o<br />
desenvolvimento inicial do cérebro associa-se<br />
com hipomielinização e retardo motor e<br />
cognitivo. Anormalidades no neuro-desenvolvimento<br />
podem ser mais acentuadas na presença<br />
de deficiência de micro-nutrientes, como<br />
o zinco e oligo-elementos. A intolerância para<br />
alimentação enteral complica a evolução do<br />
pré-termo, senão introduzirmos nutrição<br />
parenteral precoce, com adequada oferta de<br />
aminoácidos.<br />
Nutrição enteral plena: deve ser estabelecida<br />
tão logo exista tolerância para a alimentação<br />
enteral; e quando o recém-nascido atinge oferta<br />
de 100ml/kg/dia, deve-se suplementar leite<br />
materno com fortificantes do leite humano<br />
disponíveis comercialmente, a fim de obter<br />
maior oferta de cálcio, fósforo e proteínas.<br />
Favorecendo o crescimento e a rápida recuperação<br />
de um déficit prévio, decorrente da<br />
prematuridade, há melhor desenvolvimento<br />
após a alta hospitalar.<br />
Avaliação da audição: a realização de emissões<br />
oto-acústicas, conhecida como Teste da<br />
Orelhinha, e a intervenção auditiva precoce<br />
quando necessário, pode melhorar o atraso no<br />
desenvolvimento. A testagem deve ser realizada<br />
antes da alta hospitalar, repetindo se houver<br />
alteração; pelo risco de falso-positivo.<br />
O SNC do prematuro tem plasticidade, ou seja,<br />
mesmo havendo áreas lesadas, outras áreas do<br />
cérebro poderão assumir as funções daquelas<br />
que não estão atuando; desde que se inicie a<br />
tempo um trabalho de INTERVENÇÃO PRECOCE.<br />
Intervenção precoce: pode ser iniciada com<br />
orientação à família. O pediatra deve auxiliar<br />
os pais dos recém-nascidos a compreender todos<br />
os aspectos de desenvolvimento que a<br />
prematuridade envolve, para que estes não cometam<br />
o freqüente erro de comparar seu filho<br />
com outra criança nascida ao termo. Os pais<br />
devem ser ajudados para que consigam concentrar-se<br />
nas aptidões que o seu filho está<br />
sendo capaz de desenvolver e não “naquilo<br />
que ele poderia ter sido capaz”; desta forma<br />
toda a energia e expectativas dos pais ou criadores<br />
será canalizada para reforçar o crescimento<br />
e desenvolvimento potenciais da criança.<br />
Estimulação precoce: pode ser desenvolvida<br />
pelo profissional capacitado, pela família ou a<br />
escola. É freqüente a necessidade de suporte<br />
pedagógico para avaliação das capacidades<br />
cognitivas do prematuro e orientação precoce.<br />
O ambiente social propício, familiar e extra-familiar,<br />
oferecem os melhores resultados para a<br />
criança atingir seu desenvolvimento potencial.<br />
Viabilizar a estimulação adequada da criança à<br />
sua etapa evolutiva, auxiliar na estruturação<br />
emocional, física e social; são desafios para o<br />
pediatra. No entanto, o pediatra deve ser capaz<br />
de reconhecer o momento ótimo para a<br />
estimulação porque a estimulação muito precoce<br />
pode gerar tensões na criança e na família<br />
e a estimulação tardia, por sua vez, resulta em<br />
recuperação parcial das etapas atrasadas. O momento<br />
crítico para intervir é aquele em que a<br />
criança está mais vulnerável e deve ser continuamente<br />
acompanhada.<br />
Com o objetivo de melhorar a qualidade de vida<br />
dos prematuros, o futuro são anormalidades<br />
menores do desenvolvimento e redução das<br />
taxas de paralisia cerebral. A preocupação atual<br />
deve ser desenvolvimento otimizado e sobrevida<br />
com qualidade.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 159
Seguimento do prematuro após a alta<br />
160<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Transmissão vertical do HIV<br />
Dados Epidemiológicos<br />
Atuais<br />
AROLDO PROHMANN DE CARVALHO<br />
Introdução<br />
Os dados epidemiológicos relacionados à transmissão<br />
vertical do HIV (TVHIV) englobam dois<br />
aspectos:<br />
–A proporção de casos comprovados de Aids<br />
em crianças menores de 13 anos de idade<br />
notificados que tiveram como mecanismo de<br />
aquisição do vírus a transmissão perinatal;<br />
–A taxa de infecção pelo HIV entre as crianças<br />
nascidas de mães infectadas pelo vírus.<br />
O primeiro aspecto é reflexo direto do segundo<br />
e a taxa de infecção envolve diversos fatores<br />
que podem potencialmente proteger a criança<br />
(fatores preventivos) e outros que aumentariam<br />
o risco da transmissão do vírus.<br />
Diversos avanços têm sido obtidos no conhecimento<br />
da patogênese da transmissão vertical<br />
do HIV.<br />
A exemplo de outras enfermidades infecciosas,<br />
a probabilidade da transmissão do HIV depende<br />
da infectividade do caso index, da maneira<br />
de disseminação e da susceptibilidade do indivíduo<br />
exposto. Para a TVHIV a infectividade é<br />
determinada pela carga viral materna, fator<br />
de risco fortemente associado com a infecção<br />
perinatal e o potencial para a transmissão do<br />
vírus na fase intra-uterina, no momento do<br />
parto e no pós-parto. A susceptibilidade, entretanto,<br />
pode ser determinada por fatores<br />
genéticos e/ou resistência adquirida.<br />
A maioria das crianças que estão vivendo com<br />
o HIV adquiriu a infecção por meio da transmissão<br />
da mãe para o filho, a qual pode ocorrer<br />
durante a gestação, no momento do parto<br />
ou na amamentação.<br />
Na ausência de qualquer intervenção o risco da<br />
transmissão vertical varia de 15% a 30% em<br />
crianças não amamentadas. A amamentação por<br />
mulheres infectadas acarretaria uma chance<br />
adicional de transmissão de 5% a 20%, levando<br />
a um risco total de 20% a 45%.<br />
Diversas intervenções podem levar a uma redução<br />
desta taxa para menos de 2% incluindo profilaxia<br />
antiretroviral administrada para a gestante<br />
no transcurso da gravidez e no parto, e,<br />
para o recém-nascido e lactente, nas primeiras<br />
semanas de vida, medidas obstétricas incluindo<br />
cesariana eletiva (antes do início do trabalho<br />
de parto e ruptura das membranas) e a nãoamamentação.<br />
O sucesso dessas intervenções<br />
tem modificado o cenário da infecção pelo HIV<br />
em pediatria, fazendo com que novas infecções<br />
se tornem cada vez mais raras, particularmente<br />
em países com elevada qualidade de vida.<br />
A OMS tem preconizado a utilização de esquemas<br />
de profilaxia antiretroviral simplificada para<br />
países em desenvolvimento, porém mais ampliados<br />
como: utilização de zidovudina (AZT)<br />
iniciando com 28 semanas de gestação (ou tão<br />
logo possível após este período); AZT intraparto<br />
e lamivudina (3TC) mais uma simples dose de<br />
nevirapina (NVP); no pós-parto AZT e 3TC por<br />
sete dias para as mulheres e NVP e AZT por<br />
uma semana para os recém-nascidos. A implantação<br />
generalizada deste regime poderá reduzir<br />
dramaticamente o número de novas infecções<br />
pelo HIV em lactentes e crianças pequenas e<br />
resultar em baixos níveis de resistência viral.<br />
Identificação das gestantes<br />
infectadas pelo HIV<br />
Recomenda-se rotineiramente a identificação<br />
de todas as gestantes infectadas pelo HIV, so-<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 161
Transmissão vertical do HIV<br />
licitando, mediante aconselhamento prévio, o<br />
teste sorológico o mais precocemente possível,<br />
repetindo-se o exame, em caso de resultado<br />
não-reagente, no terceiro trimestre de gestação.<br />
Para as gestantes que chegam à maternidade<br />
em trabalho de parto, não testadas durante<br />
a gravidez ou cujo exame não esteja documentado,<br />
deve-se realizar um teste rápido<br />
de detecção de anticorpos o mais rapidamente<br />
possível antes do parto. Se isto não tiver sido<br />
viável, deve-se realizá-lo mesmo após o parto.<br />
Os componentes do parto e para o recém-nascido<br />
da profilaxia antiretroviral para a transmissão<br />
vertical do HIV poderão ser adotados<br />
com estas medidas.<br />
Situação epidemiológica da<br />
epidemia da Aids em menores<br />
de 13 anos de idade no Brasil<br />
Até junho de 2006 haviam sido notificados ao<br />
Ministério da Saúde do Brasil 433.067 casos de<br />
Aids, 67,2% do sexo masculino (290.917 casos) e<br />
32,8% do sexo feminino (142.138 casos), sendo<br />
que a razão entre os sexos vem se reduzindo<br />
sistematicamente, chegando a 1,5 homens por<br />
mulher em 2005.<br />
Quanto à categoria de exposição, observa-se a<br />
manutenção da redução proporcional dos casos<br />
devido à transmissão vertical em menores de<br />
13 anos de idade (Gráfico 1). Além disso, observa-se<br />
uma redução progressiva do percentual<br />
de crianças notificadas por transmissão vertical<br />
em menores de 1 ano de idade.<br />
O número total de casos notificados até junho<br />
de 2006 em menores de 13 anos de idade é de<br />
16.071, 13.038 (81,1%) por transmissão<br />
perinatal.<br />
Como nos últimos anos a quase totalidade das<br />
crianças que se infecta pelo HIV é contaminada<br />
por transmissão vertical, o conhecimento da<br />
prevalência da infecção entre as mulheres em<br />
idade fértil e nas parturientes e a garantia de<br />
uma assistência pré-natal de qualidade são fundamentais<br />
para o controle efetivo e permanente<br />
da epidemia na população pediátrica.<br />
162<br />
Taxa de prevalência<br />
do HIV em parturientes<br />
No estudo sentinela realizado em 2004 com<br />
19.842 parturientes em 189 maternidades distribuídas<br />
em 152 municípios brasileiros, a taxa<br />
de prevalência de infecção pelo HIV foi de 0,41%<br />
(IC 95% 0,29-0,53%). Na Região Norte foi observada<br />
uma prevalência de 0,152%, na Região<br />
Nordeste de 0,225%, na Região Centro-Oeste de<br />
0,425%, na Região Sul de 0,510%, e na Região<br />
Sudeste de 0,537%. Com isso estima-se anualmente<br />
para o Brasil cerca de 12.635 gestantes/<br />
parturientes portadoras do HIV e de crianças<br />
expostas ao vírus.<br />
A cobertura estimada no país de sorologia para<br />
o HIV na gestação em todas as etapas antes do<br />
parto, no estudo mencionado, foi de 63%, observando-se<br />
desigualdades regionais, sendo que<br />
no Norte a cobertura foi de 35%, no Nordeste<br />
de 31%, enquanto que no Centro-Oeste, Sul e<br />
Sudeste foi superior a 75%.<br />
A prevalência da infecção por meio da realização<br />
de teste rápido foi verificada em uma ampla<br />
série em Belo Horizonte, onde foram testadas<br />
em 2004 e 2005, após o segundo trimestre<br />
de gestação, 15.223 gestantes não testadas previamente.<br />
A prevalência da infecção neste grupo<br />
foi de 0,19% (95% IC: 0,13-0,28), inferior à<br />
observada na Região Sudeste e no país como<br />
um todo.<br />
Fatores que interferem na taxa<br />
de transmissão vertical do HIV<br />
Inúmeros fatores estão envolvidos na patogênese<br />
da transmissão perinatal do HIV, muitos deles<br />
certamente ainda não completamente esclarecidos.<br />
Entre os fatores mais freqüentemente<br />
relacionados citam-se:<br />
a) Virais: carga viral, genótipo e fenótipo do HIV;<br />
b) Maternos: estado clínico e imunológico, presença<br />
de doenças sexualmente transmissíveis<br />
e outras co-infecções, estado nutricional, utilização<br />
ou não de antiretrivirais e tempo de<br />
uso na gestação;<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Transmissão vertical do HIV<br />
c) Comportamentais: utilização de drogas ilícitas,<br />
prática sexual desprotegida;<br />
d) Obstétricos: duração da ruptura das membranas<br />
amnióticas, via de parto, presença de<br />
hemorragia intraparto;<br />
e) Relacionados ao recém-nascido: prematuridade,<br />
baixo peso ao nascer;<br />
f) Aleitamento materno.<br />
O momento de maior risco da transmissão do<br />
vírus da mãe para seu bebê é durante o trabalho<br />
de parto, responsável por cerca de 65% dos<br />
casos de transmissão vertical.<br />
Vasconcelos e Merchan-Hamann (2006) estudando<br />
771 gestantes em 17 maternidades públicas<br />
de quatro capitais brasileiras demonstraram que<br />
o fator de risco que mais contribuiu para a transmissão<br />
vertical do HIV foi a não-utilização do<br />
AZT endovenoso no momento do parto (OR =<br />
3,7; IC 95% = 1,14-11,74; valor de p = 0,02),<br />
seguido do diagnóstico tardio na gravidez ou<br />
no parto, aleitamento materno, bebês nascidos<br />
de cesárea não planejada ou parto vaginal,<br />
bebês que não receberam AZT e bebês cujas<br />
mães não receberam terapêutica antiretroviral<br />
durante a gestação.<br />
Situação atual da taxa de<br />
transmissão vertical do HIV<br />
As taxas de transmissão vertical do HIV variam<br />
bastante de acordo com o local, o tipo de população<br />
estudada e as medidas profiláticas<br />
adotadas.<br />
Não se pode deixar de mencionar o grande<br />
estudo multicêntrico brasileiro realizado pela<br />
Sociedade Brasileira de Pediatria sob coordenação<br />
da Dra. Regina Célia de Menezes Succi, que<br />
avaliou a taxa de transmissão vertical em mais<br />
de 60 Serviços, nos anos de 2000 a 2004, no<br />
qual foram analisadas 5.808 crianças expostas<br />
verticalmente ao HIV. Nesse estudo a taxa de<br />
transmissão vertical foi de 8,6% em 2000, reduzindo<br />
para 6,8% em 2004. Observou-se uma<br />
variação significativa nas diversas regiões do<br />
país, com maiores taxas demonstradas na região<br />
norte (11,8%), 7,3% no nordeste, 6,9% no<br />
sudeste, 5,4% no sul e 5,1% na região centrooeste.<br />
A não-utilização de profilaxia com<br />
antiretrovirais para as mães e para os bebês foi<br />
associada com taxas mais elevadas (20,2%), sendo<br />
que o uso profilático de monoterapia com<br />
zidovudina durante a gestação e parto determi-<br />
Gráfico 1: Número total de casos de Aids em indivíduos menores de 13 anos de idade e por<br />
transmissão perinatal segundo o ano de diagnóstico. Brasil 1985-2006 (1)<br />
FONTE: MS/SVS/PN-DST/AIDS<br />
Nota: (1) Casos notificados ao SINAN até 30/06/2006.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 163
Transmissão vertical do HIV<br />
nou que as taxas se reduzissem para 4,8% e<br />
naquelas que utilizaram esquema terapêutico<br />
potente a taxa foi de 1,4%.<br />
A tabela 1 resume alguns estudos realizados<br />
onde foram obtidas as taxas de transmissão<br />
vertical do HIV.<br />
Tabela 1 - Resumo de alguns estudos realizados em diversos locais relacionados à taxa de<br />
transmissão vertical do HIV.<br />
Autores Local Período Número Profilaxia ARV* Taxa (%)<br />
Almeida C et al. XVI Portugal 1999 1.450 Sem intervenção; 1999 = 6,2<br />
International AIDS Conference; a Com intervenção. 2005 = 0,4<br />
2006 13-18 Aug; Toronto, 2005<br />
Ontario, Canada: CDC 0534.<br />
Martinez Peralta LA et al. XVI Argentina 1987 1.371 Sem intervenção; Sem = 28,2<br />
International AIDS Conference; a Com intervenção: Com = 4,7<br />
2006 13-18 Aug; Toronto, 2005 – 076† completo ou não; 2004 = 1,8<br />
Ontario, Canada: CDC 0581.<br />
– TARV‡ potente ou não;<br />
– Cesariana ou não.<br />
Neves MC et al. 25th Annual Portugal 2003 215 Sem intervenção; 2003 = 4,9<br />
Meeting of the European a Com intervenção: 2004 = 3,6<br />
Society for Paediatric Infectious 2005 – 076 completo ou não; 2005 = 0,46<br />
Diseases; 2007 May 2-4; Porto,<br />
– TARV potente ou não;<br />
Portugal: Abstract no. 75.<br />
Cesariana ou não.<br />
Sagay AS et al. XVI International Nigéria 2002 197 Sem intervenção; Global = 9,6<br />
AIDS Conference. TUPE 0345. Com intervenção: Parto vaginal = 12,3<br />
Toronto. 13-18 Aug. 2006. – NVP no parto; Cesárea eletiva = 3,1<br />
– AZT§ + 3TC!! + NVP; Mães com<br />
– NVP dose única para monoterapia com<br />
o recém-nascido; NVP = 9,7<br />
– Oferecida cesariana. Mães com TARV<br />
potente = 3,3<br />
Succi RCM et al. XIV Congresso Brasil 2000 5.808 Sem intervenção; 2000 = 8,6<br />
Brasileiro de Infectologia (60 a Com intervenção: 2004 = 6,8<br />
Pediátrica; 2005 abril; Foz do Serviços 2004 – 076 completo ou não; Sem AZT = 20,2<br />
Iguaçu, Paraná, Brasil: AO 27. de – TARV potente ou não Com AZT = 4,8<br />
referência) – Cesariana ou não TARV potente = 1,4<br />
Taha ET et al. Pediatrics Malawi 2000 1.964 Dose única NVP 9,5<br />
2005;115:e167-e172. a ou NVP + AZT<br />
2003<br />
Vasconcelos AL & Brasil 1997 771 Sem intervenção; Global = 5,6<br />
Merchan-Hamann. (17 a Com intervenção: 1997 = 14,3<br />
XVI International AIDS Materni- 2003 – 076 completo ou não; 2003 = 3,7<br />
Conference; 2006 13-18 Aug; dades) – TARV potente ou não; Parto vaginal = 8,3<br />
Toronto, Ontario, Canada: Cesariana ou não. Cesárea não<br />
CDC 0563. planejada = 7,0<br />
Cesárea eletiva = 2,6<br />
Legenda: * Antiretroviral; † protocolo 076; ‡ terapêutica antiretrovial; § zidovudina; !! lamivudina; nevirapina.<br />
164<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Transmissão vertical do HIV<br />
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03. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância<br />
em Saúde. Programa Nacional de DST/AIDS. Guia de<br />
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S, Vignoles M, Salomón HE et al. XVI International<br />
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pediatric HIV infection. Oct 2006. 126 p.<br />
08. Neves MC, Brito MJ, Marques LE, Rocha MG. 25th<br />
Annual Meeting of the European Society for Paediatric<br />
Infectious Diseases; 2007 May 2-4; Porto, Portugal:<br />
Abstract nº 75.<br />
09. Romanelli R, Kakehasi F, Ferreira F, Diniz L, Tavares<br />
MC, Aguiar R et al. XVI International AIDS Conference.<br />
MOPE 0438. Toronto. 13-18 Aug. 2006.<br />
10. Sagay AS, Pam SD, Musa J, Adekwu O, Imade G,<br />
Omoregie R et al. XVI International AIDS Conference.<br />
TUPE 0345. Toronto. 13-18 Aug. 2006.<br />
11. Succi RCM, Grupo de Estudo da SBP para avaliar a<br />
transmissão vertical do HIV. Transmissão vertical<br />
do HIV no Brasil em 2003-2004. Resultado preliminar<br />
de um estudo colaborativo multicêntrico.<br />
Apresentado no XIV Congresso Brasileiro de<br />
Infectologia Pediátrica. AO 27. Foz do Iguaçu, abril<br />
de 2005.<br />
12. Taha ET, Nour S, Kumwenda NI, Broadhead RL, Fiscus<br />
SA, Kafulafula G et al. Gender differences in perinatal<br />
HIV acquisicion among African infants. Pediatrics<br />
2005;115:e167-e172.<br />
13. Vasconcelos AL & Merchan-Hamann E. XVI<br />
International AIDS Conference; 2006 13-18 Aug; Toronto,<br />
Ontario, Canada: CDC 0563.<br />
14. World Health Organization. Antiretroviral drugs for<br />
treating pregnant women and preventing HIV<br />
infection in infants: towards universal access:<br />
recommendations for a public health approach. WHO<br />
Press 2006. 92 p.<br />
Protocolos de Diagnóstico<br />
e Tratamento<br />
ROSANA CAMPOS DA FONSECA<br />
Diagnóstico laboratorial da<br />
infecção pelo HIV em crianças<br />
A metodologia de escolha para o diagnóstico<br />
laboratorial do HIV na criança varia de acordo<br />
com a idade da investigação.<br />
Idade inferior a 18 meses<br />
A investigação de crianças com menos de 18<br />
meses deverá ser preferentemente feita por<br />
metodologia de quantificação do DNA ou RNA<br />
viral, uma vez que poderá ainda haver anti-corpos<br />
anti-HIV da transferência passiva placentária,<br />
ficando a criança anti-HIV reagente até esta idade,<br />
sem isto significar infecção pelo HIV.<br />
Dois resultados PCR RNA ou DNA detectáveis firmarão<br />
o diagnóstico da infecção pelo HIV na<br />
criança.<br />
Portanto, um resultado detectável deve ser imediatamente<br />
repetido.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 165
Transmissão vertical do HIV<br />
A criança não infectada terá dois resultados<br />
indetectáveis, sendo o primeiro após 14 dias de<br />
vida, momento após o qual a infecção perinatal<br />
já está estabelecida.<br />
Pelo menos um segundo exame indetectável em<br />
idade superior a 4 meses deverá ser feito, de<br />
modo a definir o status de infecção.<br />
Teste de detecção de anti-corpos anti-HIV negativo<br />
após 12 meses de idade podem ser encontrados<br />
em crianças não infectadas nesta idade e<br />
falam favoravelmente a exclusão da infecção.<br />
Devemos lembrar que este protocolo aplica-se<br />
a crianças que não sofreram novas exposições<br />
ao vírus através do aleitamento materno.<br />
Idade maior ou igual a 18 meses<br />
O diagnóstico de crianças com idade igual ou<br />
superior a 18 meses expostos verticalmente ao<br />
HIV pode ser feito através da pesquisa de anticorpos<br />
anti-HIV.<br />
Resultados reagentes deverão ser repetidos imediatamente<br />
e necessitam um teste confirmatório<br />
(imunofluorescência ou W-Blot) de modo a confirmar<br />
o status de infectado.<br />
Uma amostra negativa para anti-corpos anti-<br />
HIV nesta idade, exclui a infecção, não necessitando<br />
repetição.<br />
Lembrar que nova exposição ao HIV significa<br />
reiniciar a investigação, sendo possível, na fase<br />
de janela imunológica o diagnóstico por RNA/<br />
DNA viral.<br />
O acompanhamento clínico das crianças não<br />
infectadas deverá ser feito até após os 12 meses,<br />
preferentemente até os 24 meses, sendo<br />
necessário a documentação de um teste anti-<br />
HIV negativo após os 12 meses de vida.<br />
Classificação da infecção pelo<br />
HIV em crianças e adolescentes<br />
menores de 13 anos<br />
Utiliza-se parâmetros clínicos e imunológicos propostos<br />
pelo CDC em 1994 para esta classificação<br />
e estes visam auxiliar na decisão terapêutica.<br />
Parâmetros imunológicos<br />
1 - AUSENTE<br />
2 - MODERADA<br />
3 - GRAVE<br />
Categorias imunológicas<br />
AUSENTE (1)<br />
1500 ou >25%<br />
1 a 5 anos : CD4 > ou igual a 1000 ou 25%<br />
6 a 12 anos: CD4 maior ou igual a 500 ou 25%<br />
MODERADA (2)<br />
Transmissão vertical do HIV<br />
B - Sinais e/ou sintomas<br />
moderados<br />
– Anemia ( 10% do peso anterior; ou<br />
b) queda de dois ou mais percentis nas tabelas<br />
de peso para a idade; ou<br />
c) peso abaixo do percentil 5, em duas medidas<br />
sucessivas; e<br />
d) diarréia crônica (duração maior que<br />
30 dias); ou<br />
e) febre por 30 dias ou mais, documentada.<br />
• Leucoencefalopatia multifocal progressiva;<br />
• Sarcoma de Kaposi; e<br />
• Linfoma primário do cérebro ou outros<br />
linfomas.<br />
Tratamento da infecção<br />
pelo HIV em crianças<br />
O tratamento antiretroviral potente em crianças<br />
reduziu a morbidade e a mortalidade pelo<br />
HIV, melhorando a qualidade a sobrevida das<br />
crianças infectadas.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 167
Transmissão vertical do HIV<br />
Embora isto torne a infecção tratável e melhore<br />
à longo prazo o prognóstico pediátrico, nosso<br />
grande objetivo inicial deverá ser intervir reduzindo<br />
dramaticamente a transmissão vertical,<br />
o que pode ser possível a níveis tão baixos<br />
quanto menos de 1%.<br />
Para tal necessitaremos conduzir a gestação<br />
com tratamento ARV potente, cargas virais<br />
indetectáveis e podermos atender o trabalhode-parto<br />
e parto com algumas normas como o<br />
uso da Zidovudina EV e xarope e um tempo<br />
reduzido de ruptura de membranas. A via de<br />
nascimento deverá ser escolhida de acordo com<br />
a carga viral materna, o grande marcador da<br />
transmissão vertical.<br />
No entanto, se toda esta assistência falhar, mostrando<br />
a ineficiência de nossas ações de prénatal<br />
e maternidade, então deveremos rapidamente<br />
poder identificar as crianças infectadas,<br />
de modo a conduzi-las sem adoecerem, pois<br />
estima-se que cerca de 20% dos bebês, na ausência<br />
de tratamento terá progressão rápida<br />
para AIDS.<br />
Parâmetros para início<br />
da terapia ARV<br />
A decisão do início da terapia deve ser feita<br />
baseada em parâmetros imunológicos,<br />
virológicos e na sintomatologia clínica, sempre<br />
levando em conta a idade da criança.<br />
CD4 e Carga Viral não são bons preditores de<br />
risco para a progressão da doença no primeiro<br />
ano de vida.<br />
Para menores de 36 meses risco de progressão<br />
superior a 10% ocorre em níveis mais altos de<br />
CD4,1.000.000 de cópias para menores de 12<br />
meses e 250.000 cópias entre 1 e 12 anos.<br />
11 meses ou menos:<br />
Categoria B ou C ou CD4
Transmissão vertical do HIV<br />
Considerar na INTOLERÂNCIA o caráter transitório<br />
de alguns sintomas.<br />
Na TOXICIDADE de grau 2 monitorar mais freqüente;<br />
grau 3 suspender ou reduzir até normalização,<br />
grau 4 considerar troca.<br />
Considerar como FALHA TERAPÊUTICA:<br />
– deterioração neurológica.<br />
– evento clínico indicativo de progressão (com<br />
exceção da reconstituição imune).<br />
–falha no crescimento e no desenvolvimento<br />
NPM.<br />
– mudança de categoria imunológica.<br />
– redução de mais de 20 a 25% de CD4 em<br />
2 tomadas e na ausência de infecções intercorrentes.<br />
– redução de 5% ou mais quando CD4 inferior<br />
a 15%.<br />
– resposta virológica inadequada depois de<br />
3 a 6 meses de tratamento ARV (menos de<br />
1 log).<br />
–retorno persistente a detecção, depois de<br />
indetecção.<br />
Cuidados durante<br />
o Acompanhamento<br />
de Crianças Nascidas<br />
de Mães Infectadas<br />
pelo HIV e Orientação<br />
dos Familiares<br />
SÔNIA MARIA DE FARIA<br />
Os cuidados com as crianças que sofrem exposição<br />
perinatal ao HIV devem ser iniciados ao<br />
nascimento. Recomenda-se uma série de cuidados<br />
a serem instituídos no período neonatal<br />
visando impedir a transmissão vertical do HIV.<br />
Incluem-se nestes cuidados a lavagem do recém-nascido<br />
com água e sabão (imediatamente<br />
após o parto), a aspiração delicada (se necessário)<br />
das vias aéreas do recém-nascido, evitando-se<br />
traumatismos em mucosas, a introdução<br />
de quimioprofilaxia com zidovudina<br />
(AZT) e a contra-indicação ao aleitamento<br />
materno.<br />
A solução oral de AZT é indicada para todas as<br />
crianças nascidas de mães infectadas pelo HIV,<br />
mesmo que suas mães não tenham recebido<br />
anti-retrovirais durante a gestação e/ou parto.<br />
A quimioprofilaxia com AZT deverá ser administrada<br />
nas primeiras horas de vida (preferencialmente<br />
nas duas primeiras horas), não<br />
havendo estudos que comprovem o seu benefício<br />
quando instituída após 48 horas do nascimento.<br />
A administração de AZT deverá ser<br />
mantida durante as seis primeiras semanas de<br />
vida na dose de 2mg/Kg via oral de 6/6 horas,<br />
sendo importante lembrar a apresentação da<br />
solução oral de AZT (10mg/ml). Devido à possibilidade<br />
de ocorrência de anemia no recémnascido<br />
em uso de zidovudina, recomenda-se<br />
a realização de hemograma completo da<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 169
Transmissão vertical do HIV<br />
criança no início do tratamento e após 6 e<br />
12 semanas.<br />
O aleitamento materno constitui-se, no caso<br />
de mães infectadas pelo HIV, um risco adicional<br />
à transmissão vertical, sendo, portanto,<br />
contra-indicado. Estas mães devem ser preparadas<br />
durante a gestação para a não<br />
amamentação, preparo este que deve ser estendido<br />
à equipe de saúde que atende à<br />
puérpera para que a mesma não se sinta discriminada<br />
por não amamentar. Se, o leite<br />
materno é contra-indicado, conseqüentemente,<br />
deverá ser assegurado à criança o fornecimento<br />
contínuo de fórmula infantil no mínimo<br />
por 12 meses.<br />
Desde o momento que se documentou cientificamente<br />
o risco de transmissão do HIV através<br />
do leite materno, os serviços especializados<br />
no atendimento à criança exposta perinatal ao<br />
HIV têm trabalhado junto aos órgãos públicos<br />
pertinentes no sentido de sensibilizá-los a<br />
fornecer às famílias destas crianças fórmula<br />
infantil durante o primeiro ano de vida. Os<br />
frutos deste trabalho (contínuo) vêm sendo<br />
colhidos ao longo dos anos, de maneira que,<br />
atualmente, a maioria das secretarias municipais<br />
de saúde tem atendido a esta solicitação,<br />
fornecendo, muitas vezes, não só a fórmula<br />
láctea, mas também uma cesta básica com outros<br />
alimentos a partir do sexto mês de vida<br />
da criança. Como a carência sócio-econômica<br />
é um fator freqüente nas famílias acometidas<br />
pela infecção pelo HIV, esta medida é de extrema<br />
importância no sentido de garantir adequada<br />
oferta nutricional a estas crianças. Ressalte-se<br />
que, a infecção pelo HIV, é uma das raras contraindicações<br />
ao aleitamento materno.<br />
É importante destacar que as crianças nascidas<br />
de mães infectadas pelo HIV também<br />
podem ter maior risco de exposição a outros<br />
agentes infecciosos durante o período<br />
intra-uterino e perinatal. Entre estes incluem-se:<br />
Treponema pallidum, vírus das Hepatites<br />
B e C, vírus HTLV-1, vírus do Herpes<br />
Simples, Citomegalovírus, Toxoplasma Gondii e<br />
Mycobacterium tuberculosis. Nesse sentido, a<br />
indicação de métodos diagnósticos específicos<br />
para tais agentes deve ser analisada em conjunto<br />
com os dados de história epidemiológica<br />
que envolvem o núcleo familiar, sobretudo<br />
aqueles referentes à mãe biológica.<br />
Ao ter alta da maternidade, o recém-nascido<br />
já deve ter consulta agendada em serviço<br />
de referência em HIV/Aids. As crianças que, no<br />
decorrer do tempo se revelarem infectadas<br />
deverão permanecer em atendimento nessas<br />
unidades, ao passo que as não infectadas<br />
poderão ser encaminhadas para acompanhamento<br />
em unidades básicas de saúde. Recomenda-se<br />
que, mesmo as crianças não<br />
infectadas realizem acompanhamento periódico<br />
até o final da adolescência em virtude de<br />
terem sido expostas não só ao HIV, mas também,<br />
durante o período intra-uterino, às<br />
drogas anti-retrovirais. Essa preocupação reside<br />
no fato de não se conhecer as possíveis<br />
repercussões da exposição a tais medicamentos<br />
a médio e longo prazo.<br />
A profilaxia para infecções oportunistas deve<br />
ser feita rotineiramente a partir do primeiro<br />
mês de vida. A pneumonia por P. jiroveci (anteriormente<br />
denominado Pneumocyistis carinii)<br />
é a mais freqüente infecção oportunista em<br />
crianças infectadas pelo HIV, sendo a faixa de<br />
maior risco aquela compreendida no primeiro<br />
ano de vida, quando o diagnóstico definitivo<br />
de infecção pelo HIV, na maioria das crianças<br />
expostas, ainda não pode ser feito. Sendo assim,<br />
todas as crianças expostas devem receber<br />
profilaxia com Sufametoxazol-Trimetoprima<br />
(SMX-TMP) a partir de seis semanas de idade<br />
até completar um ano, exceto se a infecção<br />
pelo HIV puder ser afastada durante esse período.<br />
Esta profilaxia é mantida depois de um<br />
ano de idade, somente para as crianças<br />
infectadas, quando será orientada pela contagem<br />
de células TCD4+.<br />
Além da profilaxia de infecções oportunistas, é<br />
necessário prevenir as infecções passíveis de<br />
prevenção através de vacinas. A vacinação da<br />
criança exposta perinatal ao HIV deve iniciar<br />
ao nascimento, seguindo as recomendações do<br />
Ministério da Saúde (2006), que se encontram<br />
no calendário abaixo:<br />
170<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Transmissão vertical do HIV<br />
Calendário vacinal da criança<br />
infectada/exposta pelo HIV (1) (2)<br />
Idade<br />
(em meses)<br />
Vacina (nº da dose)<br />
0 (RN) Hep B, BCG ID<br />
1 Hep B<br />
2 DTP ou DTPa (5), Hib (6), VIP ou VOP (7), Pnc7 (8), Rtv (9), MenC conj. (10)<br />
4 DTP ou DTPa (5), Hib (6), VIP ou VOP (7), Pnc7 (8), Rtv (9), MenC conj. (10)<br />
6 Hep B, DTP ou DTPa (5), Hib (6), VIP ou VOP (7), Pnc7 (8), MenC conj. (10), Infl (11)<br />
7 Infl (11)<br />
12 Hep B, Pnc7 (8), SRC (12), VZ (13), Hep A (14)<br />
15 DTP ou DTPa (5), Hib (6), VIP ou VOP (7), VZ (13)<br />
18 Hep A (14)<br />
24 Pn23 (8)<br />
4 - 6 anos DTP ou DTPa (5), VIP ou VOP (7), SRC (12), Pn23 (8)<br />
14 - 16 anos DT ou dTpa (15)<br />
Vacina contra febre amarela (16): indicada a partir dos 9 meses de acordo com a situação<br />
epidemiológica local e condição imunológica do paciente, conforme orientação dos Centros de<br />
Referência para Imunobiológicos Especiais (CRIE) do Ministério da Saúde.<br />
Legenda: HepB = Hepatite B; Hib = Haemophilus influenzae tipo b; DTP = difteria, tétano e pertussis (tríplice);<br />
DTPa = tríplice acelular; VIP = vacina inativada contra pólio (SALK); VOP = vacina oral contra pólio; Pnc7 =<br />
vacina contra pneumococo conjugada 7-valente; Rtv = vacina oral contra rotavírus, Men C conj = vacina contra<br />
o meningococo C conjugada; Infl = vacina contra influenza; Hep A = hepatite A; SRC = vacina contra sarampo,<br />
rubéola e caxumba; VZ = vacina contra varicela; Pn23 = vacina polissacarídica contra pneumococo 23-valente.<br />
Observações:<br />
1. Esse calendário deve ser adaptado às circunstâncias<br />
operacionais ou epidemiológicas, sempre<br />
que necessário. As vacinas especiais, contidas<br />
neste calendário, estão disponíveis nos<br />
Centros de Referência para Imunobiológicos<br />
Especiais (CRIE).<br />
2. Esse calendário se aplica em sua totalidade<br />
às crianças comprovadamente infectadas pelo<br />
HIV. As crianças expostas verticalmente devem<br />
receber as vacinas indicadas até 18 meses<br />
de idade, seguindo após com o calendário<br />
básico de vacinas do PNI.<br />
3. Vacina contra hepatite B: iniciar ao nascimento,<br />
preferencialmente nas primeiras 12 horas<br />
de vida. Em caso de criança comprovadamente<br />
infectada pelo HIV, aplicar uma quarta<br />
dose de 6 a 12 meses após a terceira e para a<br />
criança com evidência clínica ou laboratorial<br />
de imunodeficiência recomenda-se a utilização<br />
do dobro da dose de rotina.<br />
4. BCG ID: deve ser administrada ao nascimento<br />
para crianças assintomáticas. Para aquelas<br />
que chegam aos serviços de saúde ainda<br />
não vacinadas, só deve ser indicada para as<br />
assintomáticas e sem imunodepressão.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 171
Transmissão vertical do HIV<br />
5. Caso disponível, prefere-se vacinar com DTPa<br />
pela menor reatogenicidade.<br />
6. Vacina contra Hib: está indicada uma quarta<br />
dose a partir de 12 meses de idade. As<br />
crianças maiores de 12 meses e menores<br />
de 19 anos, nunca vacinadas, devem receber<br />
duas doses da vacina, com intervalo<br />
de 2 meses.<br />
7. Vacina contra poliomielite: deve-se dar preferência<br />
para vacina inativada (VIP), tanto<br />
para a criança infectada pelo HIV como<br />
também para a criança que convive com<br />
pessoas imunodeficientes.<br />
8. Vacina contra pneumococo: as crianças não<br />
vacinadas ou com esquema incompleto com<br />
idade entre 12 e 60 meses deverão receber<br />
duas doses da vacina Pnc7, com oito semanas<br />
de intervalo. Após os dois anos de idade,<br />
mesmo aquelas vacinadas com Pnc7<br />
deverão receber 2 doses da vacina Pn23 com<br />
intervalo de 5 anos entre as doses.<br />
9. Vacina oral contra rotavírus: as crianças expostas<br />
verticalmente ao HIV e as infectadas<br />
assintomáticas e sem imunodepressão podem<br />
receber a vacina.<br />
10. Vacina conjugada contra o meningococo C:<br />
pode ser aplicada durante o primeiro ano<br />
de vida, a partir de 2 meses, em duas doses<br />
com intervalo de 8 semanas, com uma dose<br />
de reforço aos 12 meses. Após esta idade, as<br />
crianças não vacinadas anteriormente devem<br />
receber uma única dose da vacina.<br />
11. Vacina contra influenza: deve ser aplicada<br />
a partir de 6 meses de idade e repetida<br />
anualmente, levando-se em conta a<br />
sazonalidade da infecção.<br />
12. Vacina tríplice viral (SCR): não deve ser aplicada<br />
nas crianças com sintomatologia clínica<br />
grave (categoria clínica C) ou imunodepressão<br />
grave (categoria imunológica 3).<br />
13. Vacina contra varicela: deve ser aplicada em<br />
crianças nas categorias N1 e A1. Recomendase<br />
uma segunda dose, com um intervalo<br />
mínimo de um mês e máximo de três meses.<br />
14. Vacina contra Hepatite A: indicada a partir<br />
de 12 meses de idade, em duas doses com<br />
intervalo entre 6 e 12 meses.<br />
15. Como alternativa à vacina dT pode ser administrada<br />
a vacina dTpa (tríplice acelular<br />
tipo adulto) 10 anos após o último reforço<br />
da DTP ou dT.<br />
Em todas as consultas aos serviços de saúde<br />
por parte de crianças expostas e infectadas pelo<br />
HIV o cumprimento deste calendário deve<br />
ser averiguado e sempre que necessário<br />
e possível, o mesmo deve ser atualizado.<br />
Nas consultas a anamnese deve ser detalhada<br />
e minuciosa, com perguntas acerca das condições<br />
habituais de vida da criança, alimentação,<br />
sono, comportamento e intercorrências<br />
infecciosas recentes ou pregressas. Devem<br />
também ser explorados sinais e sintomas<br />
sugestivos de toxicidade mitocondrial, que<br />
podem ser variáveis e inespecíficos, quando<br />
leves ou moderados, porém quando mais<br />
graves, pode-se identificar a presença de manifestações<br />
neurológicas, incluindo encefalopatias,<br />
convulsões e retardo do desenvolvimento;<br />
sintomas cardíacos devido à miocardiopatia,<br />
disfunção de ventrículo esquerdo e gastrintestinais<br />
atribuíveis à hepatite, a qual pode ser<br />
assintomática ou oligossintomática, além de<br />
outras síndromes clínicas como miopatia,<br />
retinopatia, pancreatite e acidose láctica. Frente<br />
à presença de dados de história e/ou alterações<br />
ao exame físico, ou de achados laboratoriais<br />
ou de imagem, sugestivos da presença<br />
de toxicidade mitocondrial, poderá ser necessário<br />
acompanhamento conjunto com outros<br />
especialistas como neuropediatra ou cardiologista<br />
pediatra.<br />
O acompanhamento clínico das crianças nascidas<br />
de mães infectadas pelo HIV deve ser mensal<br />
nos primeiros seis meses de vida e, no mínimo,<br />
trimestral a partir do segundo semestre.<br />
Em todas as consultas deve-se registrar o peso,<br />
a estatura e os perímetros, em especial o perímetro<br />
cefálico (até os 4 anos de idade). A avaliação<br />
sistemática do crescimento é extremamente<br />
importante, visto que as crianças infectadas<br />
podem, já nos primeiros meses de vida, apresentar<br />
dificuldade de ganhar peso. A orientação<br />
alimentar deve ser feita regularmente levandose<br />
em conta as recomendações nutricionais específicas<br />
para cada faixa etária.<br />
172<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Transmissão vertical do HIV<br />
Além da avaliação do crescimento, no exame<br />
físico da criança exposta ou infectada pelo HIV<br />
deve-se incluir rotineiramente a verificação dos<br />
sinais vitais (pressão arterial, freqüências cardíaca<br />
e respiratória). Deve-se também pesquisar<br />
lesões de pele (descrever), a presença ou não de<br />
gânglios (descrição das cadeias envolvidas, tamanho,<br />
aspecto e consistência) ou outras alterações<br />
específicas. A avaliação do desenvolvimento<br />
neuropsicomotor (DNPM) deve também<br />
sempre ser realizada, considerando-se as diferentes<br />
etapas do desenvolvimento variáveis com<br />
a idade (utilizar o roteiro da Caderneta de Saúde<br />
da criança do Ministério da Saúde). Lembrar<br />
que o atraso no DNPM pode ser uma manifestação<br />
precoce de infecção pelo HIV.<br />
As crianças com comprovada infecção pelo HIV<br />
devem manter seguimento clínico em unidades<br />
de referência com periodicidade de consultas,<br />
em média, trimestral. Além da consulta clínica,<br />
com a mesma periodicidade, devem ser<br />
monitorados exames laboratoriais de carga viral<br />
e contagem de células TCD4+, que aliados à<br />
clínica definirão o início da terapêutica com<br />
medicamentos anti-retrovirais. Nas crianças em<br />
tratamento o monitoramento laboratorial periódico<br />
deve incluir avaliação hematológica, função<br />
hepática, pancreática e renal, glicemia,<br />
lipidograma e análise do sedimento urinário.<br />
Antes de iniciar qualquer esquema anti-retroviral<br />
é necessário assegurar-se da adesão ao tratamento,<br />
pois, quando a adesão não é adequada<br />
surgem vírus resistentes, aumenta carga viral e<br />
a doença tende a progredir mais rapidamente.<br />
Diversos fatores interferem na adesão ao<br />
tratamento, como: o fato da criança depender<br />
de outros para tomar medicamentos; o entendimento<br />
e motivação do seu cuidador para o<br />
tratamento e a formulação da medicação,<br />
sobretudo no que diz respeito ao gosto. O<br />
tratamento não deve ser iniciado até que os<br />
objetivos e a necessidade de adesão sejam entendidos<br />
e aceitos pela família. Neste processo<br />
é muito importante a participação de equipe<br />
multiprofissional, avaliando os aspectos<br />
psicossociais familiares, de forma que, possa-se<br />
adequar o regime terapêutico ao estilo de vida<br />
da criança e da família. Em todas as consultas<br />
devem ser ouvidas atentamente as observações<br />
da criança e de seu cuidador a respeito da<br />
adesão aos medicamentos.<br />
Nas crianças infectadas pelo HIV a revelação do<br />
diagnóstico é um aspecto fundamental da assistência,<br />
devendo ser tratado como processo<br />
gradual e progressivo. Revelar o diagnóstico à<br />
criança é uma decisão difícil e complexa. O momento<br />
exato e a melhor forma de fazê-lo será<br />
sempre o resultado de uma série de fatores e<br />
considerações. Em geral, é uma tarefa que cabe<br />
aos pais/cuidadores da criança, entretanto, o<br />
profissional de saúde pode, e deve, participar<br />
dessa decisão, oferecendo-lhes tempo e oportunidade<br />
de discutir a questão, esclarecendo dúvidas<br />
e apontando os benefícios de compartilhar<br />
a informação, para que possam se sentir<br />
mais preparados e poderem preparar também<br />
a criança.<br />
Existem alguns princípios básicos norteadores<br />
da revelação do diagnóstico: a) a verdade é<br />
geralmente menos ameaçadora para a criança<br />
do que o medo do desconhecido; b) as informações<br />
precisam ser dadas de forma clara e<br />
objetiva, acompanhando o nível de desenvolvimento<br />
emocional e cognitivo da criança; c) a<br />
revelação é um processo contínuo, não um<br />
evento único e isolado e é reconhecido que<br />
este processo se inicia com as primeiras perguntas<br />
que a criança faz sobre sua condição e<br />
as primeiras explicações dadas por seus pais/<br />
cuidadores. Quando a criança começa a fazer<br />
perguntas, geralmente sobre a razão de tantas<br />
visitas a hospitais, consultas e medicações, já<br />
se encontra em condições de saber sobre seu<br />
diagnóstico e, se seus pais/cuidadores não estiverem<br />
próximos e preparados para respondêlas,<br />
elas poderão buscar as informações de<br />
outras formas e com outras pessoas, cujas respostas,<br />
nem sempre, serão as mais adequadas<br />
à situação.<br />
A confidencialidade da condição de infectado<br />
pelo HIV deve ser assegurada em todas as esferas<br />
da convivência da criança. Dessa forma, a<br />
revelação do diagnóstico no contexto da escola<br />
deve se dar apenas quando houver benefício<br />
para a criança. A adoção universal das normas-<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 173
Transmissão vertical do HIV<br />
padrão de biossegurança garante a proteção dos<br />
contactantes.<br />
Algumas considerações sobre as crianças<br />
infectadas por via vertical que chegam, cada<br />
vez com maior freqüência, à adolescência, fazem-se<br />
necessárias. Os adolescentes precisam<br />
conhecer a sua condição de infectados pelo HIV<br />
e ser totalmente informados sobre os diferentes<br />
aspectos e implicações da infecção, a fim de<br />
cumprir adequadamente as orientações médicas.<br />
Além disso, necessitam serem informados<br />
acerca dos aspectos de sua sexualidade e o risco<br />
de transmissão sexual aos seus parceiros.<br />
A adesão do adolescente à terapia anti-retroviral<br />
pode sofrer a influência de algumas peculiaridades<br />
observadas nessa faixa etária, tais como:<br />
a negação e o medo da sua condição de<br />
infectado pelo HIV, a desinformação, o comprometimento<br />
da auto-estima, o questionamento<br />
sobre a resolutividade do sistema de saúde, a<br />
eficácia da terapêutica e as dificuldades em<br />
obter apoio familiar e social. Estratégias para<br />
reforçar a adesão devem ser buscadas junto à<br />
família e à equipe de saúde. O apoio da família<br />
afeta de maneira positiva a auto-estima, a<br />
autoconfiança e auto-imagem do adolescente<br />
infectado pelo HIV e traz benefícios ao tratamento,<br />
fortalecendo o indivíduo e o preparando<br />
para dar continuidade a sua vida.<br />
Os avanços obtidos no tratamento anti-retroviral<br />
mudaram a concepção da infecção pelo HIV e<br />
Aids nos últimos anos. Até recentemente, o indivíduo<br />
que recebia diagnóstico de infecção pelo<br />
HIV associava-o à redução na sua expectativa<br />
de vida. Hoje, infelizmente ainda não podemos<br />
falar em cura, mas podemos falar em Aids como<br />
uma enfermidade crônica tratável. As crianças<br />
infectadas pelo HIV por via vertical estão chegando<br />
à idade adulta e, em geral, apresentamse<br />
clinicamente bem. Considerando os avanços<br />
no tratamento e a experiência acumulada ao<br />
longo dos anos no manejo clínico de crianças<br />
infectadas pelo HIV, nós, profissionais de saúde,<br />
tentamos transmitir esta concepção atual da<br />
doença à família que convive com HIV/Aids.<br />
Desta forma, procuramos manter acesa, no<br />
paciente e em seus familiares, a chama da esperança<br />
de que, quem sabe, num futuro próximo,<br />
a cura para esta enfermidade esteja ao<br />
alcance de todos. As pesquisas com este objetivo<br />
ocorrem em ritmo acelerado.<br />
Se, por um lado muito se progrediu em relação<br />
à prevenção e tratamento da infecção pelo HIV,<br />
pouco progresso se obteve em relação ao preconceito<br />
e à discriminação aos quais estão sujeitos<br />
os indivíduos infectados. A luta para modificar<br />
o conceito da infecção e da doença na sociedade<br />
é árdua e contínua. A divulgação de informações<br />
acerca de formas de contágio deve ser<br />
constante, pois a sociedade freqüentemente ainda<br />
comete o erro de confundir “evitar o vírus<br />
com evitar o portador do vírus”, como se pessoa<br />
e vírus fossem a mesma coisa, fundidos em um<br />
só estado de existência e identidade. Não podemos<br />
permitir que o preconceito e a discriminação<br />
falem mais alto que o amor, a amizade e o<br />
respeito entre os seres humanos.<br />
<strong>Referências</strong> <strong>Bibliográficas</strong><br />
01. Bonança P. Família e HIV-AIDS, derrubando a discriminação.<br />
Disponível em www.ocaixote.com.br. Acesso<br />
em 25/mar/2007.<br />
02. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância<br />
em Saúde. Programa Nacional de DST/AIDS. Guia de<br />
tratamento clínico da infecção pelo HIV em crianças.<br />
Série Manuais nº 18, 3ª ed. Brasília, 2006.<br />
03. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância<br />
em Saúde. Programa Nacional de DST/AIDS. Manual<br />
de rotinas para assistência de adolescentes vivendo<br />
com HIV/Aids. Série Manuais nº 69. Brasília, 2006.<br />
04. Carvalho AP, Succi RCM. Aids. In: Lopez FA, Campos Jr<br />
D, eds. Tratado de Pediatria - Sociedade Brasileira de<br />
Pediatria. Barueri, SP: Manole 2007. p.1.101-1.114.<br />
05. Mattos J, Mendonça M, Rubini N. A revelação do diagnóstico<br />
de HIV/Aids para crianças e adolescentes. Prática<br />
Hospitalar: Ano V, nº 30, Nov-Dez/2003.<br />
174<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Interrupção da gravidez de fetos<br />
anencefálicos: aspectos bioéticos<br />
O Anencéfalo<br />
como Doente em<br />
Estado Terminal<br />
JUSSARA DE AZAMBUJA LOCH<br />
A anencefalia é uma malformação congênita caracterizada<br />
pela ausência total ou parcial do<br />
encéfalo e da calota craniana por falha no fechamento<br />
do tubo neural, que acontece entre a<br />
terceira e quarta semanas da vida embrionária.<br />
É a forma mais grave dos chamados defeitos de<br />
fechamento do tubo neural, que incluem também<br />
as meningomieloceles e as encefaloceles.<br />
A incidência da malformação situa-se ao redor<br />
de um caso para cada 1.000 a 1.600 nascidos<br />
vivos 1 . Sua origem é multifatorial, com aspectos<br />
genéticos, nutricionais e ambientais contribuindo<br />
com intensidade variável para sua apresentação.<br />
Sabe-se que a idade materna (gestantes<br />
muito jovens ou com idade avançada), e o<br />
número de gestações anteriores se relacionam<br />
com aumento da incidência da anencefalia,<br />
assim como o tabagismo, o alcoolismo e condições<br />
clínicas como o diabetes. A exposição da<br />
mãe, nos primeiros dias da gestação, a irradiações<br />
ou a produtos químicos como solventes,<br />
por exemplo, podem aumentar os riscos para a<br />
malformação. Sugere-se, no entanto, que a<br />
maior causa para o defeito seja de caráter<br />
nutricional materno: a deficiência de ácido<br />
fólico. Desta forma, pode ser prevenida pela<br />
ingestão diária de 5 mg de ácido fólico três<br />
meses antes e depois da concepção.<br />
Esta malformação é de fácil diagnóstico através<br />
da ultra-sonografia a partir da 12ª semana de<br />
gestação, no entanto, pela gravidade do prognóstico<br />
fetal, a confirmação diagnóstica deve ser<br />
feita com um segundo exame de imagem e a<br />
dosagem de alfafetoproteína, que se encontra<br />
elevada no líquido amniótico.<br />
Na anencefalia, pela ausência parcial ou total<br />
do córtex cerebral, há uma incompatibilidade<br />
com a vida extra-uterina. Como existem estruturas<br />
da ponte, funções neurovegetativas como<br />
o funcionamento do coração e a respiração<br />
estão presentes ao nascimento, mas estas funções<br />
não conseguem manter-se por muito tempo<br />
ocasionando a morte em horas, dias ou<br />
semanas. Dois terços são natimortos e mais de<br />
95% dos casos vão a óbito antes da primeira<br />
semana de vida 2 .<br />
As questões de ordem psicológica, social e moral<br />
que ocorrem nos casos de mal-formação fetal<br />
são bastante conhecidas. A partir da confirmação<br />
do diagnóstico de que o feto apresenta<br />
problemas, acontecem diversas manifestações<br />
psíquicas que variam de intensidade de acordo<br />
com a estrutura de personalidade de cada casal.<br />
O “sonho” passa a ser um “pesadelo”, pois<br />
a gestante confronta o filho imaginário-perfeito<br />
com o feto real-imperfeito que virá. Sentimentos<br />
de menos-valia irrompem por parte da mãe,<br />
do pai ou de ambos. O fantasma do filho desejado<br />
cola-se à realidade, incutindo o luto.<br />
As reações se tornam ainda mais complexas<br />
quando a gestação não foi planejada. O desejo<br />
consciente e/ou inconsciente de “livrar-se” da<br />
criança também está presente, mobilizando a<br />
culpa 2 . Quando o diagnóstico é de pequenas<br />
malformações, existindo maneiras de reverter o<br />
quadro com tratamentos pertinentes, as questões<br />
emocionais se amenizam. Apesar das desilusões,<br />
a esperança, o amor incondicional e a<br />
aceitação podem tornar a realidade mais suportável.<br />
No entanto, nos casos graves, como<br />
aqueles de incompatibilidade com a vida, o<br />
momento da notícia desperta confusão mental<br />
e angústia, que necessitarão de muito apoio e<br />
reflexão para que o casal decida que atitude<br />
tomar em relação àquela gestação.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 175
Interrupção da gravidez de fetos anencefálicos: aspectos bioéticos<br />
Desta forma o médico – seja ele obstetra ou<br />
pediatra – vê-se defrontado com uma situação<br />
muito dolorosa para a família: a antecipação<br />
do luto em um momento que deveria ser de<br />
grande alegria e realização.<br />
Tanto a posição do médico, quanto da família,<br />
vai fundamentar-se em seus valores pessoais e<br />
poderíamos dizer que a questão filosófica central,<br />
no caso da anencefalia, é se este feto/recém-nascido<br />
é uma pessoa. O conceito de pessoa<br />
é definido de forma diferente por médicos,<br />
filósofos, eticistas e teólogos podendo levar em<br />
conta argumentos biológicos, psicológicos ou<br />
morais 3 . No entanto há um certo consenso de<br />
que o recém-nascido com anencefalia merece<br />
ser respeitado em sua dignidade, sendo portanto<br />
tratado de forma adequada tanto do ponto<br />
de vista médico como do ponto de vista moral.<br />
Uma das propostas terapêuticas é a interrupção<br />
prematura da gestação. O argumento utilizado<br />
para defender esta posição é que o benefício<br />
desse procedimento seria o de diminuir o sofrimento<br />
materno em relação ao trauma psicológico<br />
de carregar no ventre, até o final da gestação,<br />
um bebê grosseiramente mal-formado e<br />
sem chances de sobrevivência, levando em consideração<br />
que o vínculo mãe-bebê, que se acentua<br />
durante o período gestacional, aumentaria<br />
o sofrimento de ser mãe de um bebê inviável.<br />
Parece que uma intervenção agressiva sobre a<br />
vida do feto, sem trabalhar as questões envolvidas<br />
e sem tempo para amadurecer a decisão<br />
tem trazido problemas de ajustamento posteriores<br />
para as famílias. Em alguns casos, no entanto,<br />
torna-se necessário proceder desta forma<br />
para garantir a saúde psicológica da mãe 2 . Esta<br />
interrupção da gestação não é prevista pelo<br />
ordenamento jurídico brasileiro e necessita ser<br />
autorizada por um juiz. Desde uma perspectiva<br />
bioética, estes casos devem ser muito bem<br />
avaliados, para chegar-se à conclusão de que<br />
é o melhor caminho a seguir. O pedido deve<br />
partir da gestante ou do casal e a equipe de<br />
saúde deve propor acompanhamento psicológico/psiquiátrico<br />
bem como uma abordagem<br />
multidisciplinar da mãe/casal com o intuito de<br />
trabalhar estas questões antes da tomada de<br />
decisão.<br />
176<br />
Quando a conclusão é a favor da interrupção<br />
da gestação, esta decisão visa respeitar a autonomia<br />
da gestante. Conforme Muñoz e Fortes 4 ,<br />
respeitar a autonomia é reconhecer que ao indivíduo<br />
cabe possuir certos pontos de vista e<br />
que é ele quem deve deliberar e tomar decisões<br />
segundo seu próprio plano de vida e ação,<br />
embasado em crenças, aspirações e valores próprios,<br />
mesmo quando divirjam daqueles dominantes<br />
na sociedade ou daqueles aceitos pelos<br />
profissionais da saúde. O respeito à autonomia<br />
requer que se tolerem as crenças e as escolhas<br />
das pessoas desde que não constituam ameaça<br />
a outras pessoas ou à coletividade.<br />
Há casais que, após um aprofundamento do<br />
problema, decidem por levar a gestação até o<br />
termo, sentindo-se mais satisfeitos consigo mesmo<br />
e com maiores chances de enfrentar o luto<br />
posterior por terem um sentimento de “dever<br />
cumprido” enquanto pais 2 .<br />
Nos casos em que a gestação é levada a termo,<br />
o recém-nascido com anencefalia é um paciente<br />
para o qual a ciência da medicina não tem<br />
solução e pode ser incluído na categoria de<br />
paciente terminal. Por definição, pacientes<br />
terminais são aqueles cujas condições são<br />
irreversíveis, independentemente de serem tratados<br />
ou não e que apresentam alta probabilidade<br />
de morrer num período relativamente<br />
curto de tempo 5 .<br />
Que condutas devem então ser tomadas frente<br />
a esta situação? Há consenso de que estes pacientes<br />
devem receber medidas de conforto<br />
como todo paciente terminal, porém não estão<br />
indicadas medidas extraordinárias de manutenção<br />
da vida, como manobras de ressuscitação<br />
em sala de parto ou como suporte ventilatório<br />
ou cardiovascular, no berçário. É necessário discutir<br />
estas alternativas com a família, para que<br />
tenham conhecimento dos procedimentos que<br />
são técnica e eticamente adequados no caso e<br />
não se evolua para uma obstinação terapêutica<br />
que só prolonga o desfecho inevitável, constituindo-se<br />
em ação que contrapõe-se ao princípio<br />
de não-maleficência.<br />
Em relação aos pais, o reconhecimento do bebê<br />
mal-formado é um momento muito difícil para<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Interrupção da gravidez de fetos anencefálicos: aspectos bioéticos<br />
eles, porém várias experiências têm demonstrado<br />
que naqueles casos conduzidos desde o<br />
diagnóstico, com abordagem multidisciplinar,<br />
incluindo acompanhamento psicológico do<br />
casal, há benefícios salutares no reconhecimento<br />
da realidade de seu bebê, inclusive dandolhe<br />
nome e tendo a possibilidade de carregá-lo<br />
ao colo antes do desfecho fatal 2,6,7 . O sofrimento<br />
quando enfrentado, mais do que suprimido,<br />
pode ser uma parte essencial da aceitação da<br />
morte do bebê, auxiliando no processo de resolução<br />
desta perda.<br />
Estes casais necessitam serem acompanhados<br />
também após o desfecho para garantir-se que a<br />
família está se readaptando e seguindo o curso<br />
esperado para a resolução do luto.<br />
Concluindo, é necessário que família e bebê<br />
sejam tratados com todo o respeito que merecem<br />
e é dever dos profissionais envolvidos<br />
terem para com eles, atitudes de acolhimento<br />
e escuta, bem como estar disponíveis para<br />
discutir as dúvidas e auxiliá-los na tomada de<br />
decisão.<br />
<strong>Referências</strong> <strong>Bibliográficas</strong><br />
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Congênitas (ECLAMC). Disponível em http://<br />
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anencephalic baby. Disponível em http://www.asfhelp.com/<br />
asf/management_of_a_pregnancy. Acesso em 23 jun 2007.<br />
Doação de Órgãos<br />
de Recém-Nascido<br />
Anencefálico<br />
SILVIA REIS DOS SANTOS<br />
O transplante de órgãos em crianças tem sido<br />
uma terapêutica de sucesso ao longo das últimas<br />
décadas. Este sucesso é limitado pelo número<br />
insuficiente de doadores e apresenta desafios<br />
ainda maiores nos casos das crianças<br />
pequenas, em função das restrições físicas<br />
de tamanho e da não adequação dos órgãos.<br />
O primeiro transplante de órgãos de recém-nascido<br />
com anencefalia foi relatado em 1967 nos<br />
Estados Unidos e outros se seguiram, principalmente<br />
na década de 1980. A partir daí, os governos,<br />
a comunidade científica, as entidades<br />
profissionais e a própria sociedade civil iniciam<br />
discussão acerca da condição de doador do recém-nascido<br />
como anencefalia. As principais<br />
questões desta polêmica são:<br />
Uma vez que a imensa maioria dos<br />
recém-nascidos com anencefalia tem uma<br />
evolução inexorável para o óbito em curto<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 177
Interrupção da gravidez de fetos anencefálicos: aspectos bioéticos<br />
espaço de tempo, podem ser considerados<br />
potenciais doadores de órgãos logo após o<br />
nascimento (ou confirmação diagnóstica),<br />
beneficiando crianças com sérias doenças<br />
cardíacas, hepáticas e renais?<br />
Os critérios médicos e éticos para doação<br />
de órgãos e transplante devem ser aplicados<br />
igualmente aos recém-nascidos com<br />
anencefalia?<br />
Esta seria uma solução parcial para a<br />
contínua necessidade de transplantes, principalmente<br />
em crianças pequenas?<br />
Introdução<br />
A anencefalia é uma malformação congênita que<br />
ocorre devido a uma falha no fechamento da<br />
porção anterior do tubo neural na fase inicial<br />
do desenvolvimento embrionário, por volta da<br />
quarta semana de gestação. Caracteriza-se pela<br />
ausência de parte do encéfalo, ossos do crânio<br />
e couro cabeludo. Observa-se na porção superior<br />
da calota craniana um tecido fibroso hemorrágico,<br />
coberto por uma fina membrana contínua<br />
com a pele, estando praticamente ausentes<br />
os hemisférios cerebrais, o trato piramidal, o<br />
cerebelo e as meninges. Outras malformações<br />
podem estar presentes 1 .<br />
Diversos mecanismos são descritos na gênese<br />
da anencefalia e dos outros defeitos de fechamento<br />
do tubo neural, mas sua etiologia é<br />
ainda desconhecida. A maioria dos casos é atribuída<br />
à interação entre vários genes e fatores<br />
ambientais, o que é denominado de herança<br />
multifatorial. O ácido fólico é o fator de risco<br />
mais importante identificado, mas o exato<br />
mecanismo envolvido na embriogênese do tubo<br />
neural é ainda desconhecido 2 .<br />
A prevalência da anencefalia varia consideravelmente<br />
nas diversas regiões geográficas. Estudo<br />
da Organização Mundial da Saúde (OMS)<br />
realizado na década de 1990 revela os maiores<br />
índices no México (15,32/10.000 nascidos vivos),<br />
no Chile (9,05), no Paraguai (8,69) e no Brasil<br />
(8,62) 3 . Mais recentemente os resultados do<br />
Estudo Latino-Americano Colaborativo de<br />
Malformações Congênitas (ECLAMC) em 11 maternidades<br />
brasileiras mostram prevalências<br />
ainda mais altas do que as relatadas pela OMS 4 .<br />
Com o objetivo de reduzir a incidência da<br />
anencefalia e dos outros defeitos de fechamento<br />
do tubo neural, diversos países vêm preconizando,<br />
com sucesso, a adição de ácido fólico<br />
em alimentos consumidos em grande escala pela<br />
população. Em 2005 a Agência Nacional de<br />
Vigilância Sanitária (ANVISA) aprova o regulamento<br />
técnico para a fortificação das farinhas<br />
de trigo e das farinhas de milho com ferro e<br />
ácido fólico 5 .<br />
As manifestações clínicas apresentadas pelo<br />
recém-nascido com anencefalia dependem<br />
do grau de desenvolvimento do encéfalo remanescente:<br />
ele chora e movimenta extremidades;<br />
suga e deglute; reage aos estímulos gustativos<br />
com expressões faciais; responde a estímulos<br />
auditivos, vestibulares e dolorosos e apresenta<br />
quase todos os reflexos primitivos do recém<br />
nascido. A sobrevida, da mesma forma, depende<br />
das condições do tronco encefálico, além da<br />
qualidade dos cuidados paliativos: cerca de 50%<br />
nascem vivos; após o nascimento apenas 8%<br />
sobrevivem mais de uma semana e 1% vive entre<br />
1 a 3 meses. Há relato de três casos com maior<br />
sobrevida: 7 meses, 10 meses e 14 meses e um<br />
bebê (Baby K), submetido a terapêuticas intensivas,<br />
manteve condições vitais por 2,5 anos 6 .<br />
O recém-nascido com<br />
anencefalia doador de<br />
órgãos para transplante?<br />
Critérios de morte encefálica<br />
em crianças:<br />
O critério utilizado para se determinar a morte<br />
de um ser humano foi, por muitos séculos, a<br />
parada cárdio-respiratória. No final dos anos<br />
1950, com o avanço tecnológico, as melhorias<br />
no suporte clínico em UTI possibilitaram a<br />
manutenção das principais funções vitais por<br />
tempo indeterminado, mesmo diante da morte<br />
do encéfalo. Nos anos 1960, o advento dos<br />
primeiros transplantes de órgãos humanos<br />
provoca a necessidade de uma mudança nos<br />
parâmetros para a morte, na medida em que o<br />
178<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Interrupção da gravidez de fetos anencefálicos: aspectos bioéticos<br />
critério de parada cárdio-respiratória não permitia<br />
a utilização de órgãos comprometidos com<br />
a falência circulatória. Em 1968, em “Comunicação<br />
Especial” ao Journal of the American<br />
Medical Association, um Comitê da Harvard<br />
Medical School propõe o coma irreversível como<br />
critério de morte encefálica 7 . Em 1981, ainda<br />
nos Estados Unidos, os critérios para morte<br />
encefálica são ampliados para abranger crianças<br />
com 5 ou mais anos de idade e em 1987 são<br />
incluídos os neonatos de termo com 7 ou mais<br />
dias de vida 8,9 .<br />
No Brasil, em 1988, o Congresso Nacional emite<br />
parecer determinando que o Conselho Federal<br />
de Medicina (CFM) é o órgão capacitado e responsável<br />
para decisões relacionadas à área<br />
médica e em 1990 o CFM reconhece que a morte<br />
encefálica tem equivalência à morte clínica.<br />
A Lei 9.434 é promulgada em 1997 e dispõe<br />
sobre a remoção de órgãos, tecidos e partes do<br />
corpo humano para fins de transplante e tratamento.<br />
Determina também que compete ao CFM<br />
a formulação do critério de morte a ser aplicado.<br />
Neste mesmo ano, o CFM apresenta a Resolução<br />
1.480, adotando critérios diagnósticos<br />
de morte encefálica no Brasil, para adultos e<br />
crianças a partir dos 7 dias de vida. Não existem<br />
ainda hoje critérios estabelecidos em relação<br />
aos prematuros e aos recém-nascidos de<br />
termo nos primeiros 7 dias de vida, em função<br />
das dificuldades de avaliação, tanto clínica como<br />
dos exames subsidiários, nesta faixa etária.<br />
A situação especial dos recém-nascidos<br />
com anencefalia:<br />
A criança com anencefalia tem o tronco encefálico<br />
parcialmente funcionante e apresenta,<br />
pelo menos inicialmente, respiração espontânea<br />
e outros reflexos integrados no tronco<br />
encefálico 1 . Sendo assim, não preenche os critérios<br />
vigentes de morte encefálica.<br />
A maioria destas crianças apresenta episódios<br />
repetidos de apnéia e bradicardia por disfunção<br />
endócrina, hipotensão arterial, hipopnéia ou<br />
infecção antes de atingir os 7 dias de vida,<br />
quando desaparecem as funções do tronco<br />
encefálico. Desta forma, as funções cardiovasculares<br />
e respiratórias deterioram gradualmente<br />
antes do evento terminal, com conseqüente<br />
hipóxia e lesão isquêmica tecidual (o que compromete<br />
a viabilidade dos órgãos ou tecidos a<br />
serem doados). Mesmo o uso de procedimentos<br />
de manutenção da vida não aumenta a<br />
chance de que a doação seja bem sucedida,<br />
uma vez que a falência de múltiplos órgãos se<br />
instala à medida que a função do tronco cerebral<br />
deteriora 10 .<br />
A Resolução do CFM 1.480 de 1997 sobre morte<br />
encefálica não aborda o anencéfalo de modo<br />
específico. No entanto, em resposta a consulta,<br />
no Parecer nº. 8.905 de 1998, o Conselho Regional<br />
de Medicina de São Paulo apóia a doação<br />
de órgãos de recém-nascido com anencefalia.<br />
Da mesma forma, em resposta a consulta no<br />
Parecer nº. 115 de 2002, o Conselho Regional<br />
de Medicina do Rio de Janeiro entende que<br />
permitir a doação dos órgãos do anencéfalo,<br />
satisfazendo a vontade dos pais, vem ao encontro<br />
do espírito da Lei dos Transplantes.<br />
Em 2004, através da Resolução nº. 1.752, o CFM<br />
considera os anencéfalos natimortos cerebrais e<br />
entende que os critérios de morte encefálica são<br />
inaplicáveis e desnecessários; autoriza a doação<br />
de órgãos e tecidos de anencéfalo logo após o<br />
nascimento, mediante autorização formal prévia<br />
dos pais (obtido em período mínimo de 15 dias<br />
antes da data provável do nascimento).<br />
Este posicionamento do CFM suscita polêmica<br />
ética e jurídica. Alguns pesquisadores apóiam<br />
esta posição e defendem que o conceito de<br />
morte cerebral pode ser adotado para a<br />
anencefalia, uma vez que a morte neurológica<br />
é a impossibilidade de consciência 11,12 . Outros<br />
estudiosos entendem que todos os que fazem<br />
parte do gênero humano são pessoas e que<br />
respeito ao neonato anencéfalo perpassa pelo<br />
respeito à sua vida, independentemente da sua<br />
suposta qualidade 13,14 .<br />
Em 2007, o Ministro da Saúde do Brasil vai de<br />
encontro à posição assumida pelo CFM e encerra<br />
a polêmica através dos termos da Portaria nº<br />
487, que dispõe sobre a remoção de órgãos<br />
e/ou tecidos de neonato anencéfalo para fins<br />
de transplante ou tratamento:<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 179
Interrupção da gravidez de fetos anencefálicos: aspectos bioéticos<br />
Considerando que o respeito à dignidade<br />
da pessoa humana, prevista no inciso III do<br />
art. 3º da Constituição Federal, implica que<br />
toda pessoa humana, indistintamente, deve<br />
ser tratada como um fim em si mesma;<br />
Considerando que a personalidade civil da<br />
pessoa começa do nascimento com vida, nos<br />
termos do disposto no art. 2º do Código Civil;<br />
Considerando que a Portaria nº. 3.407/GM,<br />
de 5 agosto de 1998, que aprova o Regulamento<br />
Técnico referente às atividades<br />
de transplante e à Coordenação Nacional<br />
de Transplantes;<br />
Considerando a Lei nº. 9.434, de 4 de fevereiro<br />
de 1997, que dispõe sobre a remoção<br />
de órgãos, tecidos e partes do corpo humano<br />
para fins de transplante e tratamento; e<br />
Considerando o consenso adotado no Seminário<br />
para Discussão sobre Anencefalia e<br />
Doação de Órgãos, realizado pela Secretaria<br />
de Atenção à Saúde, do Ministério da<br />
Saúde - SAS/MS, em 24 de maio de 2006,<br />
composto pelo Coordenador-Geral do<br />
Sistema Nacional de Transplantes, representantes<br />
da Academia Brasileira<br />
de Neurologia, da Sociedade Brasileira<br />
de Pediatria, do Conselho Federal de<br />
Medicina, da Ordem dos Advogados do<br />
Brasil, da Procuradoria Regional da República,<br />
da Associação Brasileira de Transplante<br />
de Órgãos, da Consultoria Jurídica do Ministério<br />
da Saúde, resolve:<br />
Art. 1º. A retirada de órgãos e/ou tecidos de<br />
neonato anencéfalo para fins de transplante ou<br />
tratamento deverá ser precedida de diagnóstico<br />
de parada cardíaca irreversível.<br />
Art. 2º. O descumprimento desta Portaria constitui<br />
infração nos termos dos arts. 14, 16 e 17<br />
da Lei nº. 9.434, de 4 de fevereiro de 1997.<br />
Parágrafo único. Os infratores estão sujeitos às<br />
penalidades dos artigos citados no caput, bem<br />
como às demais sanções cabíveis. 3<br />
Conclusão<br />
O texto da Portaria MS/GM nº. 487 de 2 de março<br />
de 2007 estabelece, então, que no Brasil o recém-nascido<br />
com anencefalia deve ser tratado<br />
como uma pessoa humana que nasce com vida<br />
e que somente depois de parada cardíaca<br />
irreversível poderá considerado doador de órgãos<br />
ou tecidos para transplante. Neste contexto, fica<br />
evidente que o eixo básico na ética da doação<br />
de órgãos é a não maleficência, além do respeito<br />
à autonomia e à autodeterminação dos<br />
pacientes ou de seus representantes legais.<br />
A abordagem deste tema mostra que as questões<br />
da bioética abrangem nuances legais,<br />
morais, éticas, religiosas e sociais em relação à<br />
vida e à saúde de cada um dos componentes da<br />
sociedade. Não se trata somente de moldar o<br />
que é lícito ou não à luz da evolução da ciência<br />
e da tecnologia, mas também de discutir<br />
novas perspectivas e novas experiências de vida,<br />
e reavaliar os valores tradicionalmente atribuídos<br />
à vida, à morte, à saúde e à liberdade. Para<br />
tanto, a Bioética é campo de ação e de interação<br />
de profissionais e estudiosos oriundos das mais<br />
diversificadas áreas do conhecimento humano.<br />
Uma vez que a base do debate bioético é a<br />
relação médico-paciente, estes novos desafios<br />
da prática médica requerem cada vez mais uma<br />
sólida formação técnica e humanística.<br />
<strong>Referências</strong> <strong>Bibliográficas</strong><br />
01. Shewmon DA. Anencephaly: selected medical aspects.<br />
Hastings Cent Rep 1988; 18(5):11-9.<br />
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05 de junho 2007].<br />
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Am J Med Genet A 2003; 123(2):123-8.<br />
05. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. RDC n. o 344,<br />
de 13 de dezembro de 2002. Aprova o regulamento<br />
técnico para a fortificação das farinhas de trigo e das<br />
farinhas de milho com ferro e ácido fólico. Disponível<br />
em: http://www.anvisa.gov.br/legis/resol/2002/<br />
344_02rdc.htm. [Acesso em 06 de junho 2007].<br />
180<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Interrupção da gravidez de fetos anencefálicos: aspectos bioéticos<br />
06. Canadian Pædiatric Society. Use of anencephalic<br />
newborns as organ donors. Pædiatr Child Health 2005;<br />
10(6):335-7.<br />
07. Ad Hoc Committee of the Harvard Medical School to<br />
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irreversible coma. JAMA 1968; 205(6):337-40.<br />
08. President’s Commission for the Study of Ethical<br />
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Research. Guidelines for the determination of death.<br />
JAMA 1981; 246(19):2184-6.<br />
09. Task Force for the Determination of Brain Death in<br />
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death in children. Arch Neurol 1987; 44(6):587-8.<br />
10. Peabody JL, Emery JR, Aswal S. Experience with<br />
anencephalic infants as prospective organ donors.<br />
N Engl J Med 1989; 321(6):344-50.<br />
11. Tavares MMB. A antecipação do parto em caso de<br />
anencefalia e o transplante de órgãos e tecidos dos<br />
anencéfalos. Disponível em: www.mp.rn.gov.br/caops/<br />
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em 06 de junho 2007].<br />
12. Penna MLF. Anencefalia e morte cerebral (neurológica).<br />
Physis: Rev Saúde Coletiva 2005; 15(1):95-106.<br />
13. Oliveira AAS. Anencefalia e transplante de órgãos.<br />
Rev Bras Bioética 2005; 1:61-74.<br />
14. Costa SIF. Anencefalia e transplante. Rev Assoc Med<br />
Bras 2004; 50(1):10-10.<br />
O Direito de<br />
Interrupção da<br />
Gravidez à Luz<br />
do Conceito de<br />
Vida Humana<br />
NELSON GRISARD<br />
Introdução<br />
O tema – o direito de interrupção da gravidez<br />
à luz do conceito de vida humana - encerra<br />
dois aspectos de relevância em ética, como parte<br />
da filosofia (o conceito de vida humana) e na<br />
prática clínica (interrupção da gravidez). É pois<br />
um tema de bioética clínica.<br />
Ao pediatra, como médico da família e após a<br />
preconização da consulta pediátrica pré-natal,<br />
cabe muitas vezes participar do dilema da interrupção<br />
de gravidez de feto anencefálico,<br />
sendo instado a opinar a respeito, orientando<br />
ou até mesmo “decidindo” pela família, que se<br />
expressa dizendo: “Doutor, o senhor é o nosso<br />
médico, conhece a nossa família...o senhor<br />
resolve o que devemos fazer...”.<br />
Então, ante tamanha responsabilidade, impõe-se<br />
ao pediatra atualizar-se em bioética e discutir<br />
sobre dilema, decisão, autonomia, beneficência,<br />
responsabilidade civil, penal e ética.<br />
Imagine-se, somente por exemplo, a trajetória<br />
de um adolescente nascido num pequeno município<br />
de interior de determinada região sócio-econômica,<br />
com rígida orientação moral,<br />
familiar e religiosa, estudando medicina na<br />
capital de seu estado e muitas vezes morando<br />
sem familiares, fazendo sua especialização<br />
pediátrica num grande e moderno centro<br />
médico do país, longe de sua região e seus<br />
costumes e que venha a exercer a pediatria<br />
numa comunidade de uma outra região sócioeconomicamente<br />
melhor equipada e diferente<br />
da sua de origem, composta por etnia(s), costumes<br />
e confissão(ões) religiosa(s) diferentes<br />
daqueles de sua origem. Certamente, muitos<br />
conceitos terão que ser aprendidos e outros<br />
revistos. Neste sentido, citarei alguns tópicos<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 181
Interrupção da gravidez de fetos anencefálicos: aspectos bioéticos<br />
de natureza técnica, como os hábitos e condições<br />
de vida das pessoas do lugar onde exerce<br />
a pediatria, seus hábitos alimentares, a<br />
nosologia prevalente e sua ecologia, o modo<br />
do relacionamento médico-paciente, etc. Já<br />
no campo ético se destacam os conflitos entre<br />
modernidade e tradição, os costumes, as crenças<br />
e crendices, a religiosidade dos vários credos.<br />
Neste ponto, as questões relacionadas aos<br />
temas “quando a vida começa” e “o direito a<br />
interromper a gravidez” sobressaem. E lá está<br />
o pediatra – amigo e conselheiro da família -<br />
a ter que aconselhar, opinar e, quando não,<br />
até decidir!<br />
Interrupção da gravidez<br />
Aborto natural, criminoso, terapêutico e social<br />
(afetivo, piedoso) são expressões que merecem<br />
ser revisadas aqui:<br />
I - O aborto é a interrupção prematura de uma<br />
gravidez por um processo mórbido ou natural,<br />
quando o feto é prematuramente expelido sem<br />
vida ou com vida de difícil ou impossível manutenção.<br />
É o aborto natural ou espontâneo.<br />
II - Aborto criminoso é a descontinuação dolosa<br />
(por deliberada violação criminosa da lei) de<br />
uma gravidez, com ou sem expulsão do feto, da<br />
qual resulta a morte do nascituro.<br />
III - Aborto social é revestido de um caráter<br />
afetivo ou piedoso e está presente nos casos de<br />
gravidez resultante de estupro, crime que consiste<br />
no constrangimento das relações sexuais<br />
por meio de violência e sem a vontade ou consentimento<br />
da vítima.<br />
IV - Aborto terapêutico ou preventivo é a interrupção<br />
médica da gravidez (expressão preferida<br />
por este autor) com o objetivo de tratar ou<br />
prevenir danos à saúde materna.<br />
Os avanços da semiologia armada em medicina<br />
fetal, especialmente a ultra-sonografia morfológica<br />
associada aos estudos genéticos, de<br />
biologia molecular e bioquímicos de liquido<br />
amniótico permitem, com grande segurança<br />
diagnóstica, indicar a interrupção médica<br />
da gravidez, que não deveria, a meu ver, ser<br />
chamada de aborto.<br />
A interrupção da gravidez no Brasil encontra<br />
amparo legal no Código Penal Brasileiro (Decreto-Lei<br />
N o . 2.848 de 07/12/1940) cujo artigo 128<br />
diz textualmente:<br />
“Não se pune o aborto praticado por médico:<br />
Aborto necessário<br />
“I - Se não há outra maneira de salvar a vida da<br />
gestante.<br />
Aborto no caso de gravidez resultante de estupro<br />
II - Se a gravidez resulta de estupro e o aborto<br />
é precedido de consentimento da gestante ou,<br />
quando incapaz, de seu representante legal”.<br />
Sobre o aborto, reza ainda o Código Penal:<br />
Aborto provocado pela gestante ou com seu<br />
consentimento<br />
Art. 124 - Provocar aborto em si mesma ou<br />
consentir que outrem lho provoque.<br />
Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos.<br />
Aborto provocado por terceiro<br />
Art. 125 - Provocar aborto, sem o consentimento<br />
da gestante.<br />
Pena - reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos.<br />
Art. 126 - Provocar aborto com o consentimento<br />
da gestante.<br />
Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.<br />
Parágrafo único - Aplica-se a pena do artigo<br />
anterior, se a gestante não é maior de 14<br />
(quatorze) anos, ou é alienada ou débil mental,<br />
ou se o consentimento é obtido mediante fraude,<br />
grave ameaça ou violência.<br />
Forma qualificada<br />
Art. 127 - As penas cominadas nos dois artigos<br />
anteriores são aumentadas de um terço, se, em<br />
conseqüência do aborto ou dos meios empregados<br />
para provocá-lo, a gestante sofre lesão<br />
corporal de natureza grave; e são duplicadas,<br />
se, por qualquer dessas causas, lhe sobrevém a<br />
morte.<br />
Art. 128 - Não se pune o aborto praticado por<br />
médico.<br />
Aborto necessário<br />
I - se não há outro meio de salvar a vida da<br />
gestante.<br />
182<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Interrupção da gravidez de fetos anencefálicos: aspectos bioéticos<br />
Aborto no caso de gravidez resultante de estupro<br />
II - se a gravidez resulta de estupro e o aborto<br />
é precedido de consentimento da gestante ou,<br />
quando incapaz, de seu representante legal.<br />
CAPÍTULO II: DAS LESÕES CORPORAIS<br />
Lesão corporal<br />
Art. 129 - Ofender a integridade corporal ou a<br />
saúde de outrem.<br />
Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano.<br />
Lesão corporal de natureza grave<br />
§ 2º - Se resulta:<br />
V – aborto.<br />
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos.<br />
O conceito de vida humana –<br />
o início da vida...<br />
A discussão do aborto e da interrupção médica<br />
da gravidez inicia por um ponto controverso do<br />
desenvolvimento humano: quando começa a<br />
vida? e quando começa a pessoa? ou quando a<br />
vida tem real interesse?<br />
Cada sociedade tem respostas distintas a esta<br />
questão:<br />
“Cada ovo fertilizado é um ser humano merecendo<br />
nossa proteção e a vida”, segundo os<br />
termos da Declaração dos Direitos do Homem<br />
das Nações Unidas.<br />
“O conjunto de células que compõem um embrião<br />
não está morto, mas não é uma personalidade<br />
humana” (União Batista).<br />
“Um embrião humano é uma proto-vida humana<br />
e é tecido humano excepcionalmente privilegiado.<br />
Quando o feto se torna viável poderíamos<br />
classificá-lo como um ser humano nascente, e<br />
ao nascimento, como uma pessoa nascente”.<br />
(Igreja da Sociedade das Crianças Inglesas).<br />
“...Ao nascimento, uma criança é indubitavelmente<br />
humana, mas é, ele ou ela, já verdadeiramente<br />
uma pessoa?” (Board dos Bispos da<br />
Igreja de Gales).<br />
“Na Suíça, nós consideramos o momento<br />
da implantação do ovo no útero como o<br />
começo de uma nova vida humana” (Ettore<br />
Rossi).<br />
“Zimma é o estado legal que qualifica uma<br />
pessoa com seus direitos e deveres. Ele é incompleto<br />
no caso do feto pois este tem somente<br />
direitos e não tem deveres. De acordo com o<br />
Islã o feto está em estado de “zimma incompleto”<br />
(In: Concepción, 1989).<br />
“O nascimento é o começo de uma pessoa e a<br />
morte é o fim de uma pessoa” (Xun Zi, famoso<br />
confucionista).<br />
“Tudo o que pode ser dito com segurança sobre<br />
o óvulo fertilizado é que se trata de tecido<br />
humano vivo. A vida não começa na fertilização,<br />
pois o óvulo e o espermatozóide são também<br />
vivos. A vida é um continuum e portanto o<br />
que nós precisamos não é um conceito de quando<br />
a vida se inicia, mas de quando a vida começa<br />
a ter significado moral”. (Prof. Dr. Marcos<br />
de Almeida).<br />
Observe-se que gametas mortos não geram vida!<br />
A Igreja Católica pontifica que o começo da vida<br />
se inicia na fertilização do óvulo pelo espermatozóide,<br />
constituindo uma célula de 46 cromossomos,<br />
23 maternos e 23 paternos, e havendo<br />
trocas de nutrientes entre mãe e feto.<br />
Um dos pontos mais controversos é o da caracterização<br />
do início da vida de uma pessoa.<br />
A rigor, a vida humana não começa a cada reprodução,<br />
ela continua, pois o fenômeno vital<br />
se mantém, não é nem extinto nem restabelecido,<br />
prossegue.<br />
A vida de um novo indivíduo é que tem início.<br />
O estabelecimento de critérios biológicos – início<br />
da vida de um ser humano, ou filosóficos –<br />
início da vida de uma pessoa, ou ainda, legais,<br />
é uma discussão difícil, mas por isso mesmo<br />
desafiadora (JR Goldim).<br />
De forma sucinta há quatro correntes quanto<br />
ao início da vida humana: a) as que defendem<br />
que o início da vida começa com a fertilização;<br />
b) as que defendem que o início da vida<br />
começa com a implantação do embrião no<br />
útero; c) as que defendem que o início da vida<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 183
Interrupção da gravidez de fetos anencefálicos: aspectos bioéticos<br />
começa com o início da atividade cerebral e<br />
d) as que defendem que o início da vida<br />
começa com o nascimento com vida do embrião<br />
(segundo Pontes Regis, AH de, advogado<br />
e biólogo).<br />
A interrupção da gravidez em fetos anencefálicos<br />
antevê uma dupla lesão afetiva: a anenecefalia<br />
em si e a expectativa de vir a ter que decidir<br />
pela interrupção da gravidez de uma mãe<br />
gestando um filho que não vai viver por falta<br />
de cérebro, e não por doença, mesmo se curável?<br />
É necessário, além da atenção médica, o apoio<br />
familiar, social e psicológico.<br />
O direito<br />
Se o feto tem direitos de pessoa humana, quais<br />
serão seus deveres e de que tipo? É um estado<br />
incompleto! Teria o feto o dever de não causar<br />
mal ao organismo que lhe acolhe e permite<br />
crescer e desenvolver-se adquirindo funções para<br />
sua autonomia biológica?<br />
A preocupação com os fetos anencefálicos chegou<br />
ao Supremo Tribunal Federal – STF que,<br />
em 1 de Julho de 2004, adotou a decisão com<br />
efeito vinculante que todas as gestantes cujo<br />
feto é anencefálico, ou seja, sem cérebro ou<br />
parte dele, têm o direito de interromper a gravidez<br />
(32) , tendo a Ordem dos Advogados do Brasil<br />
(OAB) e o Conselho de Defesa dos Direitos da<br />
Pessoa Humana (CDDPH) concordado com o<br />
entendimento do Ministro Relator Marco Aurélio.<br />
Entretanto, o parecer do Procurador-Geral<br />
da República, Dr. Cláudio Fonteles, foi pelo<br />
indeferimento do pleito.<br />
In verbis, trecho do voto do Ministro<br />
Relator Marco Aurélio:<br />
(...) “Diante de uma deformação<br />
irreversível do feto, há de se lançar mão<br />
dos avanços médicos tecnológicos, postos<br />
à disposição da humanidade não para<br />
simples inserção, no dia-a-dia, de sentimentos<br />
mórbidos, mas, justamente, para<br />
fazê-los cessar. No caso da anencefalia, a<br />
ciência médica atua com margem de<br />
certeza igual a 100%. Dados merecedores<br />
da maior confiança evidenciam que fetos<br />
anencefálicos morrem no período intrauterino<br />
em mais de 50% dos casos. Quando<br />
se chega ao final da gestação, a<br />
sobrevida é diminuta, não ultrapassando<br />
período que possa ser tido como razoável,<br />
sendo nenhuma a chance de afastarem-se,<br />
na sobrevida, os efeitos da deficiência.<br />
Então, manter-se a gestação<br />
resulta em impor à mulher, à respectiva<br />
família, danos à integridade moral e<br />
psicológica, além dos riscos físicos reconhecidos<br />
no âmbito da medicina. Como<br />
registrado na inicial, a gestante convive<br />
diuturnamente com a triste realidade e a<br />
lembrança ininterrupta do feto, dentro de<br />
si, que nunca poderá se tornar um ser<br />
vivo. Se assim é – e ninguém ousa<br />
contestar, trata-se de situação concreta<br />
que foge à glosa própria ao aborto – que<br />
conflita com a dignidade humana, a<br />
legalidade, a liberdade e a autonomia<br />
de vontade”(...).<br />
Se é verdade que a proteção à vida humana em<br />
toda a sua extensão é o bem máximo protegido<br />
pela Carta Magna brasileira (ressalta-se que o<br />
Brasil ratificou a Convenção de San José da Costa<br />
Rica, que a vida humana foi tutelada pelo<br />
ordenamento positivo de maneira plena, a partir<br />
da fecundação) não seria um paradoxo o<br />
ordenamento jurídico não permitir o aborto de<br />
um feto anencefálico (o qual tem uma expectativa<br />
de vida ínfima) e permitir o aborto no caso<br />
de estupro mesmo com o feto em perfeitas<br />
condições de desenvolvimento? (comentário de<br />
Pontes Regis, AH de, advogado e biólogo).<br />
Todas essas questões tem que ser levadas a uma<br />
discussão profunda pela sociedade para que não<br />
se abra perigosos precedentes, como bem a<br />
história da humanidade tem ensinado (Pontes<br />
Regis, AH de, advogado e biólogo).<br />
Para Sgreccia, o fundamento da bioética é a<br />
dignidade da pessoa humana que se alcança<br />
por ações de beneficência, no respeito à autonomia,<br />
na aplicação da justiça distributiva dos<br />
bens e serviços e na não-maleficência. (Sgreccia,<br />
E. in Bioética, CFM, 2004; vol. 12 nº 1 p. 82).<br />
184<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Interrupção da gravidez de fetos anencefálicos: aspectos bioéticos<br />
Comentário final<br />
A bioética, a medicina e o direito procuram<br />
ainda um ponto de equilíbrio para esta questão<br />
– a interrupção da gravidez, havendo já algum<br />
consenso.<br />
A autorização judicial para interrupção da<br />
gravidez, propalada como decisão judicial, não<br />
me parece adequada. A meu ver a decisão pela<br />
interrupção da gravidez é da autonomia da<br />
mãe (se solteira e só) ou dos pais (casados<br />
ou não). O juiz descriminaliza a opção/decisão<br />
da mãe ou dos pais, excluindo-a de antijuridicidade.<br />
Igualmente, os mesmos efeitos<br />
jurídicos devem proteger o serviço assistencial<br />
médico e os profissionais que executam com<br />
segurança, zelo e ética a, por vezes, dolorosa a<br />
decisão familiar.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 185
Interrupção da gravidez de fetos anencefálicos: aspectos bioéticos<br />
186<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Neonatologia: como conduzir<br />
A Consulta<br />
Pediátrica Pré-Natal<br />
ANTONIO CARLOS DE ALMEIDA MELO<br />
O cuidado do pediatra com a saúde infantil deve<br />
começar antes do nascimento. A consulta<br />
pediátrica no pré-natal representa uma oportunidade<br />
de qualificação do atendimento à<br />
“família grávida”, estabelecendo uma aliança<br />
que tem como objetivo principal a redução da<br />
morbimortalidade, através da cooperação<br />
recíproca entre a família e o pediatra para<br />
um melhor cuidado da criança.<br />
Temas importantes<br />
• Iniciar uma relação positiva com a família,<br />
estabelecendo vínculo de confiança;<br />
• Estimular o diálogo, ouvir suas expectativas e<br />
preocupações em relação à criança (medo de<br />
doenças genéticas, experiências prévias, estrutura<br />
econômica da família, composição do<br />
núcleo familiar);<br />
•O papel de mãe e pai (fantasias e realidade,<br />
conceitos essenciais do cuidar, divisão e<br />
compartilhamento das tarefas, responsabilidades,<br />
“direitos e deveres” dos pais e dos<br />
filhos);<br />
• Colher dados sobre a gestação atual e anteriores:<br />
ganho ponderal, alterações de níveis<br />
pressóricos, doenças prévias e atuais, medicações,<br />
ultra-sonografia e demais exames complementares;<br />
• Estímulo e promoção do Aleitamento Materno<br />
(vantagens, técnicas, cuidados com as mamas,<br />
dificuldades e dúvidas sobre amamentação);<br />
•Efeito da chegada da criança na família (expectativa<br />
em relação ao estilo de vida futuro,<br />
reação dos irmãos, relacionamento do casal);<br />
• Antecipação de problemas e identificação de<br />
situações de risco (baixa escolaridade, pobreza,<br />
pouco apoio familiar, pais adolescentes,<br />
mãe solteira, risco de violência doméstica ou<br />
maus tratos, uso de drogas, história de anomalias<br />
genéticas). Se julgar necessário, encaminhar<br />
para atendimento especializado;<br />
• História familiar detalhada;<br />
• História social: idade dos pais, escolaridade,<br />
vida profissional, licença maternidade, retorno<br />
ao trabalho, apoio familiar;<br />
• Informar sobre os cuidados durante e logo<br />
após o nascimento (o contato físico como estímulo<br />
do apego);<br />
•Posição segura para dormir, horários de sono<br />
e vigília;<br />
• Sugestões para que a mãe não fique cansada<br />
demais com suas tarefas;<br />
• Esclarecimento das principais dúvidas dos pais<br />
em relação ao bebê que vai nascer;<br />
•Segurança doméstica e no transporte: prevenindo<br />
acidentes;<br />
•Vacinação;<br />
•Crescimento e desenvolvimento;<br />
•Rede de apoio ampliada;<br />
• Hábitos familiares de vida saudável (drogas<br />
lícitas ou não, alimentação, ambiente...).<br />
Vantagens<br />
• Impacto sobre a decisão de amamentar, com<br />
aumento da prevalência e da duração da amamentação;<br />
• Impacto sobre os cuidados de saúde da criança;<br />
• Melhor relação entre a família e o pediatra;<br />
• Ajuda a diminuir a ansiedade da família, principalmente<br />
nas gestações de risco.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 187
Neonatologia: como conduzir<br />
Atenção<br />
• Cuidado para não fornecer informações em<br />
excesso, tente ouvir mais, aproveitando as dúvidas<br />
e perguntas dos pais para inserir temas<br />
relevantes;<br />
•É difícil decidir qual o melhor momento para<br />
abordar assuntos que podem trazer dor e sofrimento,<br />
mesmo que inevitáveis. Ser o portador<br />
de más notícias é sempre muito difícil.<br />
Procure ser cuidadoso, avaliando a necessidade<br />
e a oportunidade antes de propor a discussão<br />
de temas potencialmente dolorosos. Lembre-se<br />
porém que os pais têm o direito de<br />
receber todas as informações sobre seu filho e<br />
participar das decisões a serem tomadas.<br />
<strong>Referências</strong> <strong>Bibliográficas</strong><br />
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em formação. Artes Médicas, Porto Alegre, 1988.<br />
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Mosby Inc., Philadelphia, 2006.<br />
Transporte Neonatal<br />
VALÉRIA MARIA BEZERRA SILVA<br />
Muitos países da Europa (Inglaterra, Alemanha,<br />
Holanda Suíça e Bélgica) conseguiram diminuir<br />
a mortalidade perinatal através da regionalização<br />
dos cuidados perinetais, identificando e<br />
transferindo mulheres com complicações iminentes,<br />
ou com risco de parto prematuro (transferência<br />
in utero). Um estudo realizado em 1999<br />
na Noruega demonstrou que a taxa de mortalidade<br />
de RNs de muito baixo peso transferidos<br />
no pós-parto foi significativamente mais alta<br />
(54%) do que a taxa de mortalidade daqueles<br />
transportados in utero (22%).<br />
Idealmente o transporte Neonatal é uma parte<br />
integrante do sistema regionalizado de assistência<br />
perinatal. A era moderna do transporte<br />
neonatal começou com o artigo de Sydney Segal<br />
em 1966: “Transferência de um recém-nascido<br />
pré-termo ou de alto risco para um hospital de<br />
referência”. Nele o autor descreve os princípios<br />
básicos do sistema de transferência neonatal,<br />
tais como, organização, comunicação, pessoal,<br />
equipamentos e meios de transporte aéreos e<br />
terrestres. A partir daí muitas mudanças aconteceram<br />
nos países desenvolvidos, surgindo a<br />
“Medicina de Transporte”, como parte do sistema<br />
de saúde. Em 1990 a Academia Americana<br />
de Pediatria criou a “Seção de Medicina do Transporte”<br />
(SOTM), que tem o objetivo de promover<br />
o desenvolvimento de tecnologias e pesquisas<br />
nesta área, direcionando o conhecimento. Este<br />
departamento tem publicado informações e<br />
sugerido padronizações tais como os “Guidelines<br />
for Air and Ground Transport of Neonatal and<br />
Pediatric Patients “(1993 e 1999). Um programa<br />
efetivo promove a identificação precoce de recém-nascidos<br />
de risco, consulta, comunicação e<br />
transferência. A transferência neonatal deve<br />
seguir uma cadeia de cuidados desde o momento<br />
do reconhecimento da gravidade da<br />
doença no hospital de origem, o processo de<br />
188<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Neonatologia: como conduzir<br />
estabilização e solicitação de ambulância, até a<br />
chegada final no hospital de referência.<br />
Desenvolvendo e aplicando um protocolo de<br />
transferência, o sistema permite uma adequada<br />
comunicação entre os profissionais de saúde<br />
que estão transferindo e recebendo a criança.<br />
Neste caso, quanto mais precisas e completas<br />
forem as informações de transferência, melhor<br />
para o desenvolvimento do caso. O protocolo<br />
deve também assegurar o adequado consentimento<br />
informado dos pais ou responsáveis, com<br />
todos os esclarecimentos acerca dos riscos e<br />
benefícios esperados.<br />
A escolha do meio de transporte vai depender<br />
das condições existentes em cada local, mas é<br />
consenso que o uso da ambulância deve ser<br />
restrito a percursos que possam ser cobertos<br />
em tempo inferior a 2 horas, em geral distantes<br />
no máximo 150 km. Não há necessidade de<br />
velocidades excessivas, se o paciente estiver<br />
estabilizado: a velocidade de 60 km/h oferece<br />
menos riscos, e deve ser suficiente. No Rio de<br />
Janeiro as ambulâncias especializadas em UTI<br />
Neonatal do Corpo de Bombeiros, ligado à<br />
Secretaria de Saúde do Estado e Defesa civil,<br />
vêm prestando um excelente serviço há 3 anos,<br />
com um número crescente de atendimentos.<br />
O sucesso do programa motivou a criação do<br />
“Manual de Transporte Neonatal”, para servir<br />
de referência para outras regiões que queiram<br />
implantar este serviço. Acima de 150 km o transporte<br />
aéreo está recomendado, dando preferência<br />
ao transporte através de aeronaves para<br />
longas distâncias pois é rápido, com baixa vibração,<br />
porém apresentam o inconveniente de<br />
necessitar da ajuda de ambulâncias ou de helicópteros<br />
para o transporte do paciente entre o<br />
hospital e o aeroporto. Já os helicópteros são<br />
bons para o transporte urbano, ou locais de<br />
pouca acessibilidade, porém possuem um nível<br />
elevado de ruído e vibração.<br />
Receber o recém-nascido estável e mantê-lo<br />
assim, durante o transporte é um desafio que<br />
só pode ser vencido com habilidades técnicas e<br />
treinamento contínuo das equipes. A equipe<br />
ideal é aquela formada por pelo menos 2 pessoas<br />
treinadas em suporte avançado de vida em<br />
Neonatologia. Nos EUA já existe uma forte recomendação<br />
para se treinar médicos e enfermeiras<br />
especificamente para este fim, tornando o<br />
processo de transporte menos arriscado (seria<br />
melhor mais seguro???).<br />
Todo o equipamento necessário para a adequada<br />
oxigenação, ventilação e monitorização<br />
do recém-nascido, incluindo a entubação e ventilação<br />
mecânica, além do material necessário<br />
para o acesso venoso central e periférico, medicamentos,<br />
soluções expansoras e vasopressoras,<br />
devem estar previamente organizados e<br />
separados para o evento da transferência. Para<br />
o aquecimento ideal, o Departamento de<br />
Neonatologia da SBP recomenda incubadoras<br />
com paredes duplas, baterias e fonte de luz;<br />
na falta destas o aquecimento poderá ser obtido<br />
através do uso de filme de PVC ou de<br />
bolsas de água quente, envoltas em lençóis,<br />
para evitar queimaduras.<br />
O pequeno paciente deverá ser estabilizado<br />
antes do transporte, e o protocolo de monitorização<br />
deve ter início logo ao ser recebido pela<br />
equipe de transporte.Este protocolo deve prever<br />
uma reavaliação de todos sinais vitais, incluindo<br />
o ABCD do Suporte Avançado de vida<br />
em Pediatria, proposto nas diretrizes do<br />
American Heart Association.(PALS). Os dados<br />
laboratoriais, de glicemia, gasometria, raio-x e<br />
outros, de preferência devem ser realizados e<br />
analisados antes do transporte. A equipe deverá<br />
estar habilitada a reconhecer e tratar imediatamente<br />
as condições ameaçadoras da vida,<br />
tais como a insuficiência respiratória, o choque,<br />
a falência cardio-pulmonar, e a Parada Cardio-<br />
Pulmonar. Apesar da monitorização com<br />
oxímetro, monitor cardíaco, e capnógrafo ser<br />
importante, não substituem a constante avaliação<br />
clínica. Condições especiais vão demandar<br />
outras precauções, tais como: defeito de fechamento<br />
abdominal, cardiopatias congênitas ducto<br />
dependentes, hérnia diafragmáticas, obstrução<br />
intestinal, defeitos do tubo neural, atresias e<br />
fístulas esofageanas, convulsões, pneumotórax.<br />
Vários escores de gravidade têm sido utilizados<br />
para avaliar os cuidados de suporte fornecidos<br />
aos recém-nascidos durante o trans-<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 189
Neonatologia: como conduzir<br />
porte, no momento da admissão em centros<br />
de referências nos países desenvolvidos. Estes<br />
escores têm apresentado um poder preditivo<br />
de morte e utilizam a temperatura pós-transferência,<br />
além da glicose sangüínea, pressão<br />
arterial sistólica, PH sangüíneo, e PAO2.<br />
Em um estudo realizado em Pernambuco<br />
por Silveira S. em 2001, os recém-nascidos<br />
transferidos de outros hospitais para o IMIP<br />
que apresentaram hipotermia moderada tiveram<br />
um risco 3 vezes maior de morte do<br />
que aqueles com hipotermia leve ou sem<br />
hipotermia.<br />
O sucesso do transporte de recém-nascidos<br />
exige esforços organizativos de todo o sistema<br />
de saúde, para dar prioridade àqueles que<br />
realmente o necessitam, assegurando-lhes os<br />
cuidados necessários. Não devemos nos esquecer<br />
ainda, que o melhor transporte é aquele<br />
realizado ainda dentro do útero materno.<br />
<strong>Referências</strong> <strong>Bibliográficas</strong><br />
01. American Heart Association. Transporte Secundário: intrahospitalar<br />
e inter-hospitalar. In: SAVP Manual para Provedores.<br />
AHA. Rio de Janeiro, 2003, Cap. 9, p. 240-249.<br />
02. Buser-Gills M, Whitfield JM. Transport Neonatal. In:<br />
Closkey K, Orr R. Pediatric Transport Medicine. St.<br />
Louis: Mosby, 1995. Cap. 32, p. 404-445.<br />
03. Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Rio de Janeiro.<br />
Notícias do CEDEC. 2007. www.cbmerj.rj.gov.br.<br />
04. Silveira S. Hipotermia na admissão: Fator de risco para<br />
mortalidade em recém-nascidos transferidos para o<br />
Instituto Materno Infantil de Pernambuco. 100 p. Dissertação<br />
(Mestrado em Saúde Materno Infantil) - IMIP,<br />
Recife, 2001.<br />
05. Sociedade Brasileira de Pediatria. Departamento de<br />
Neonatologia. Infraestrutura para Atendimento Integral<br />
ao Recém-Nascido. 2004. In: www.sbp.com.br.<br />
06. Task Force on Interhospital Transport. American<br />
Academy of Pediatrics. Transport Medicine. In: Guidelines<br />
for air and ground transport on Neonatal and Pediatric<br />
patients, ed. 2. Elk Grove Village. AAP. 1999.<br />
Infecção Fúngica<br />
GIOVANA CARLA TRILHA<br />
Introdução<br />
O importante avanço na tecnologia médica<br />
aumentou muito a sobrevida de recém-nascidos<br />
de muito baixo peso, por meio de uma<br />
assistência agressiva e invasiva. Com isso, os fungos<br />
emergiram como importantes patógenos<br />
relacionados à sepse tardia em UTI neonatal.<br />
Além de freqüente, é potencialmente muito<br />
grave, com altas taxas de mortalidade e risco de<br />
seqüelas.<br />
Agentes etiológicos<br />
A Candida é o fungo mais importante no período<br />
neonatal.<br />
– Candida albicans é responsável pela maioria<br />
das infecções fúngicas em RN.<br />
– Cândida parapsilosis: cada vez mais freqüente.<br />
– Outras: Cândida tropicalis, krusei, lusitaniae,<br />
guillermondii.<br />
Transmissão<br />
– Vertical: durante a gestação ou nascimento.<br />
Geralmente propicia apenas colonização ou<br />
candidíase muco-cutânea. Infecção de origem<br />
materna é rara.<br />
– Hospitalar: contaminação através das mãos<br />
dos profissionais de saúde associada à coloni-<br />
190<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria
Neonatologia: como conduzir<br />
zação do RN. Lavagem inadequada das mãos,<br />
favorece a transmissão horizontal.<br />
Fatores de risco<br />
– Antibioticoterapia múltipla, especialmente<br />
Cefalosporinas de terceira geração, Carbapenêmicos,<br />
Vancomicina.<br />
– Catéter intra-vascular.<br />
– Lipídeo endovenoso.<br />
– Solução hipertônica de glicose.<br />
– Prematuridade e muito baixo peso ao nascimento.<br />
– Cânula endo-traqueal.<br />
– Corticosteróides<br />
– Bloqueadores H2.<br />
– Jejum prolongado.<br />
Manifestações clínicas<br />
– Geralmente na segunda ou terceira semana<br />
de vida.<br />
– Início insidioso e inespecífico.<br />
Principais sinais e sintomas<br />
– Instabilidade térmica.<br />
– Hipotensão.<br />
– Deterioração respiratória e apnéias.<br />
– Distensão abdominal e intolerância alimentar.<br />
– Sangue oculto nas fezes.<br />
– Hiperglicemia.<br />
Diagnóstico<br />
1. Hemocultura positiva. É o padrão ouro para<br />
diagnóstico.<br />
2. Duas uroculturas positivas, coletadas por<br />
punção supra-púbica (PSP).<br />
3. Exame à fresco da urina, coletada por PSP,<br />
com presença de hifas associada a fatores de<br />
risco + quadro clínico sugestivo.<br />
A investigação deve incluir:<br />
1. Hemograma:<br />
– Mais freqüente: plaquetopenia.<br />
– Leucocitose e desvio para a esquerda.<br />
– Leucopenia é rara.<br />
– Pode ser normal no início do quadro.<br />
– Repetir 1x/semana.<br />
2. Proteína C Reativa:<br />
– Geralmente aumentada.<br />
– Tempo para normalizar: mais de 7 dias.<br />
– Pode ser normal no início.<br />
– Repetir a cada 48-72h.<br />
3. Punção Lombar:<br />
– Sempre!!<br />
– Se plaqueta menor que 50.000, contra-indicado.<br />
Fazer PL, assim que possível.<br />
– Pode ter celularidade e bioquímica normal<br />
com cultura positiva.<br />
– LCR normal não exclui comprometimento do<br />
SNC.<br />
– Se LCR alterado, repetir 1x/semana até normalizar.<br />
4. Urina:<br />
– Exame a fresco.<br />
– Urocultura:<br />
• Punção supra-púbica<br />
• Repetir 1x/semana mesmo que normal, até<br />
hemocultura negativa.<br />
5. Exame Oftalmológico.<br />
6. US transfontanelar: 1x/semana.<br />
7. US rins e vias urinárias:<br />
–Fazer 1x/semana se candidúria.<br />
– Alterações podem ocorrer 1 a 6 semanas após<br />
a detecção da candidúria.<br />
8. Ecocardiograma:<br />
– Identificar endocardite ou massas fúngicas<br />
intra-cardíacas, principalmente se fungemia<br />
persistente.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 191
Neonatologia: como conduzir<br />
9. Raio-X Tórax:<br />
– Infiltrado pneumônico específico.<br />
10. US e/ou TAC:<br />
–Para detectar microabscessos em tecidos profundos,<br />
principalmente se hemocultura persistentemente<br />
positiva<br />
11. Raio-X de Ossos:<br />
– Na suspeita de osteomielite ou artrite.<br />
➢ Repetir hemocultura a cada 48h até negativar.<br />
Após negativar, não há necessidade de repetir,<br />
se o RN estiver tendo boa evolução.<br />
Tratamento<br />
– Cuidados Gerais.<br />
– Estabilização respiratória e hemodinâmica.<br />
– Remover catéter vascular imediatamente após<br />
o diagnóstico!!<br />
1. Anfotericina B:<br />
– Primeira escolha.<br />
– Dose: 1mg/Kg/dia EV 24/24hs.<br />
– Tempo de Infusão: 4 a 6hs.<br />
– Diluição: em soro glicosado, na concentração<br />
máxima de 0,1mg/ml.<br />
– Principais efeitos adversos: nefrotoxicidade,<br />
depressão medular, hepatotoxicidade. Febre,<br />
tremores, rasch, hipotensão, náuseas, vômitos<br />
se infusão rápida. Arritmias se dose excessiva.<br />
– Monitorizar 1x/semana: uréia,creatinina, K, Na,<br />
Mg, Hemograma, TGO,TGP.<br />
– Evitar uso concomitante de outras drogas<br />
nefrotóxicas e diuréticos.<br />
2. Preparações Lipídicas de Anfotericina B:<br />
Apresenta atividade anti-fúngica semelhante a<br />
Anfotericina B, com a vantagem de menor<br />
toxicidade e melhor tolerância, porém, o custo<br />
é elevado.<br />
Indicações:<br />
– Disfunção renal com Anfotericina B.<br />
192<br />
– Insuficiência renal de qualquer causa.<br />
– Falha do tratamento convencional.<br />
– Considerar uso em RN com extremo baixo<br />
peso (< 1000g), pelo alto risco de disfunção<br />
renal.<br />
Dose: 5mg/Kg/dia EV 24/24h.<br />
Velocidade de infusão: 2,5ml/h em 2h.<br />
Diluição: SG5%.<br />
Monitorizar 1x/sem: TGO, TGP, uréia, creatinina,<br />
hemograma.<br />
3. Fluconazol:<br />
Espectro mais restrito. Baixa toxicidade e fácil<br />
administração. É uma boa alternativa para pacientes<br />
com impossibilidade de usar Anfotericina<br />
B. Boa penetração no SNC.<br />
Ataque: 12mg/Kg EV em 30 min.<br />
Manutenção: 6mg/Kg/dose EV em 30 min.<br />
< ou = 29s 30-36s 37-40s > ou = 45s<br />
7d: 24/24h<br />
Inicialmente EV, com a melhora, pode passar para<br />
VO, pois a absorção enteral é rápida e satisfatória.<br />
Monitorizar 1x/semana: TGO,TGP, uréia, creatinina,<br />
hemograma.<br />
4. Flucitosina:<br />
Dose: 100 a 150mg/Kg/dia VO 6/6hs.<br />
Sempre associada a Anfotericina B.<br />
Indicações:<br />
– Acometimento do SNC.<br />
– Endocardite.<br />
– Fungemias persistentes.<br />
Desvantagens: limitado uso em prematuros por<br />
ser VO. Não disponível no Brasil atualmente.<br />
Risco de nefrotoxicidade.<br />
Monitorizar 1x/semana: Uréia, creatinina,TGO,<br />
TGP, hemograma.<br />
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Neonatologia: como conduzir<br />
5. Equinocandinas:<br />
– Indicação: Falha do tratamento convencional<br />
+ deterioração clínica progressiva.<br />
– Dados farmacocinéticos em neonatos ainda<br />
não estão disponíveis e o custo é elevado.<br />
– Dose: 1mg/Kg/dia ou 50mg/m 2 sc (mais recomendado).<br />
– Diluição: 1 frasco 50mg + 10ml AD (= 5mg/ml).<br />
– Tempo de infusão: 1h.<br />
– Monitorizar 1x/sem: TGO, TGP, uréia, creatinina,<br />
hemograma.<br />
Tempo de tratamento<br />
Manter por 14 dias após TODAS culturas negativas<br />
e evidência de resolução clínica e laboratorial.<br />
– Candidíase Disseminada:<br />
• Dose total acumulada de 25 a 30mg/Kg.<br />
– Fungemia relacionada ao catéter: (hemocultura<br />
negativa rapidamente após retirada do catéter<br />
e sem acometimento de órgãos e sistemas).<br />
• Dose total acumulada: 10 a 20mg/Kg.<br />
– Meningite:<br />
• Manter por pelo menos 4 semanas após<br />
cultura negativa, resolução clínica e radiológica.<br />
• Considerar associação de Fluconazol ou<br />
Flucitosina.<br />
• Considerar uso Anfotericina B intra-tecal<br />
(Inicia com 0,01 mg com aumento gradual<br />
até 0,1mg a cada 2 ou 3 dias).<br />
– Endoftalmite:<br />
• Mínimo de 6 semanas, até estabilização ou<br />
resolução.<br />
– Acometimento renal (fungus ball) ou Vegetação<br />
intra-cardíaca:<br />
• Mínimo 4 semanas após negativar hemo e<br />
uroculturas.<br />
– Osteomielite e artrite:<br />
• Anfotericina B por 2 a 3 semanas, seguidas<br />
de Fluconazol por 6 a 12 meses, com acompanhamento<br />
de ortopedista.<br />
Fluconazol Profilático<br />
– Apesar de mostrar eficácia na redução da<br />
mortalidade e na incidência de infecção<br />
fúngica, é controverso seu uso como rotina,<br />
pelo risco de induzir resistência anti-fúngica.<br />
– Indicação: RN < 1000g com catéter central,<br />
cânula endo-traqueal, antibioticoterapia múltipla,<br />
nutrição parenteral.<br />
– Dose: 3mg/Kg EV nas primeiras 6 semanas<br />
de vida.<br />
72/72h 2 semanas.<br />
48/48h 2 semanas.<br />
24/24h 2 semanas.<br />
<strong>Referências</strong> <strong>Bibliográficas</strong><br />
01. Bendel CM. Nosocomial neonatal candidiasis. Pediatr<br />
Infect Dis J 2005; 24:831-2.<br />
02. Benjamin DK, Stoll BJ, Fanaroff AA, McDonald AS et<br />
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weight infants: Risk factors, mortality rates, and<br />
neurodevelopmental outcomes at 18 to 22 months.<br />
Pediatrics 2006; 117:84-92.<br />
03. Feja KN, Wu F, Roberts K et al. Risk factors for<br />
candidemia in critically ill infants: a matched casecontrol<br />
study. J Pediatr 2005; 147(2):156-61.<br />
04. Kaufman D, Boyle R, Hazen KC et al. Fluconazole<br />
prophylaxis against fungal colonization and infection<br />
in preterm infants. N Engl J Med 2001; 345:1660-<br />
1666.<br />
05. Moreira MEL. Controvérsias a respeito da sepse<br />
fúngica no pré-termo extremo: profilaxia e esquemas<br />
terapêuticos. J Pediatr (Rio J) 2005; 81(1<br />
Supl):S52-S58.<br />
64º Curso <strong>Nestlé</strong> de Atualização em Pediatria 193
Neonatologia: como conduzir<br />
194<br />
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