Dança de salão: repercussões nas atividades de vida ... - IESC/UFRJ
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<strong>Dança</strong> <strong>de</strong> <strong>salão</strong>: <strong>repercussões</strong> <strong>nas</strong> ati<strong>vida</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> <strong>vida</strong> diária<br />
Ballroom dancing: repercussions to daily activities of el<strong>de</strong>rly people<br />
Marcel Lima Cunha , Fátima Luna Pinheiro Landim , Maria <strong>de</strong> Fátima Cavalcante<br />
Lima , Luiza Jane Eyre <strong>de</strong> Souza Vieira , Rafael Barreto <strong>de</strong> Mesquita ,<br />
Patrícia Moreira Collares <br />
Resumo<br />
Trata-se <strong>de</strong> estudo <strong>de</strong>scritivo objetivando: evi<strong>de</strong>nciar os motivos que levam pessoas da<br />
terceira ida<strong>de</strong> a praticar a dança <strong>de</strong> <strong>salão</strong>; conhecer, a partir dos discursos <strong>de</strong> pessoas<br />
da terceira ida<strong>de</strong>, os efeitos da prática da dança <strong>de</strong> <strong>salão</strong> <strong>nas</strong> ati<strong>vida</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> <strong>vida</strong><br />
diária. Foi realizado numa escola <strong>de</strong> dança <strong>de</strong> <strong>salão</strong> conceituada em Fortaleza-CE,<br />
que trabalha com a terceira ida<strong>de</strong>. Participaram da pesquisa treze (3) mulheres<br />
com ida<strong>de</strong> mínima <strong>de</strong> 60 anos, praticantes da dança <strong>de</strong> <strong>salão</strong>. Para coleta <strong>de</strong> dados<br />
utilizou-se a entrevista estruturada focalizada gravada, durante o período <strong>de</strong> 05/05 a<br />
05/06 <strong>de</strong> 2004. Constatou-se que a dança <strong>de</strong> <strong>salão</strong> é uma ati<strong>vida</strong><strong>de</strong> física prazerosa e<br />
motivante, que auxilia pessoas a melhorar sua qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>vida</strong> e seu <strong>de</strong>sempenho <strong>nas</strong><br />
AVD’s, dando-lhes autonomia e prevenindo doenças causadas pela inati<strong>vida</strong><strong>de</strong> física.<br />
Os resultados sugerem que os indivíduos praticantes da dança <strong>de</strong> <strong>salão</strong> melhoraram<br />
os aspectos físicos, psíquicos e sociais, o que possibilita concluir que a prática da<br />
dança <strong>de</strong> <strong>salão</strong> tem preservado e melhorado as capacida<strong>de</strong>s funcionais, a auto-estima<br />
e a socialização das pessoas da terceira ida<strong>de</strong>, que é fundamental para a realização<br />
eficiente das tarefas vivenciais, facilitando o cotidiano <strong>de</strong>ssas pessoas, que buscam<br />
permanentemente a emancipação.<br />
Palavras-chave<br />
Saú<strong>de</strong> do idoso, ati<strong>vida</strong><strong>de</strong>s cotidia<strong>nas</strong>, ati<strong>vida</strong><strong>de</strong>s físicas, dança<br />
Abstract<br />
This article refers to a <strong>de</strong>scriptive study that aimed at: to investigate the reasons that<br />
make el<strong>de</strong>rly people practice ballroom dancing; to know from those people’s speech<br />
the effects of the practice of the ballroom dancing in the daily activities of el<strong>de</strong>rly<br />
people. It took place at an well appraised school of ballroom dancing in the city of<br />
Fortaleza, which works with people in advanced age. Thirteen women with minimum<br />
age of 60, who practice ballroom dancing participated regularly in the research. A<br />
structured, focalized and recor<strong>de</strong>d interview was used to collect the data, during<br />
the period from 05/05 to 05/06 of 2004. It was verified that ballroom dancing is a<br />
Graduado em Educação Física pela Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Fortalea – UNIFOR Fortalea Ceará.<br />
Doutora em Enfermagem. Professora do Mestrado <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> Coletiva e do Curso <strong>de</strong> Enfermagem da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
Fortalea – UNIFOR. End:. Rua César Fontenele nº. 390 a Parquelândia. – CEP: 60455-650 – E-mail: lunalandim@<br />
yahoo.com.br<br />
Mestre em Enfermagem. Professora do Curso <strong>de</strong> Enfermagem da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Fortalea – UNIFOR.<br />
Doutora em Enfermagem. Professora do Mestrado <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> Coletiva e do Curso <strong>de</strong> Enfermagem da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
Fortalea – UNIFOR.<br />
Graduandodo Curso <strong>de</strong> Fisioterapia da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Fortalea – UNIFOR.<br />
Mestranda em Saú<strong>de</strong> Coletiva da UNIFOR.<br />
C a d. Saú<strong>de</strong> Colet., Rio <strong>de</strong> Janeiro, 16 (3): 559 - 568, 2008 – 559
M a r c e l L i m a C u n h a , F á t i m a L u n a P i n h e i r o L a n d i m , M a r i a d e F á t i m a C a v a l c a n t e L i m a , L u i z a<br />
J a n e E y r e d e S o u z a V i e i r a , R a f a e l B a r r e t o d e M e s q u i ta , P at r í c i a M o r e i r a C o l l a r e s<br />
pleasant and exciting physical activity, that aids people to improve their quality of life<br />
and their performance in daily activities, giving them autonomy, preventing diseases<br />
caused by se<strong>de</strong>ntarism. It was conclu<strong>de</strong>d that individuals who practise ballroom dancing<br />
have had improved their physical, psychic and social aspects; what makes possible to<br />
infer that the practice of the ballroom dancing has been preserving and improving<br />
the functional capacities, the self-esteem and the socialization of aged people, which<br />
is fundamental for the efficient accomplishment of the everyday tasks of those, who<br />
permanently look for emancipation.<br />
Key words<br />
The senior’s health, el<strong>de</strong>rly life daily activities, ballroom dancing<br />
1. Introdução<br />
O tema do cuidado com o corpo, com respostas no estado <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> geral<br />
dos grupos populacionais, vem merecendo atenção <strong>de</strong> importantes órgãos in<br />
ternacionais (Organização Mundial <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong>, Organização Panamericana <strong>de</strong><br />
Saú<strong>de</strong>), nacionais (Ministérios da Saú<strong>de</strong>) e da socieda<strong>de</strong> civil. A Saú<strong>de</strong> Coletiva,<br />
bem como diversas outras discipli<strong>nas</strong> da área da saú<strong>de</strong>, vem somando produções<br />
nesse campo (Carvalho & Freitas, 2006).<br />
Entretanto, consi<strong>de</strong>rando a literatura científica nacional, constata-se a escassez<br />
<strong>de</strong> trabalhos que abor<strong>de</strong>m os significados atribuídos pelos idosos a qualquer uma<br />
das inúmeras modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> práticas com potencial revitalizador <strong>de</strong> sua saú<strong>de</strong><br />
e qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>vida</strong> diária. Até o momento, o que se verifica são estudos que<br />
visam a mensurar ati<strong>vida</strong><strong>de</strong>s físicas realizadas no sentido <strong>de</strong> melhorar o condi<br />
cionamento, tomando por base a população <strong>de</strong> adultos, sem distinção <strong>de</strong> ida<strong>de</strong><br />
(Carvalho & Freitas, 2006). Justificando a opção dos pesquisadores, Siqueira et<br />
al. (2008) apontam particularida<strong>de</strong>s inerentes aos idosos que dificultam esse tipo<br />
<strong>de</strong> mensuração, tendo em foco grupos etários mais elevados. Esse artigo propõe<br />
uma discussão sobre a dança <strong>de</strong> <strong>salão</strong> como uma das modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> promoção<br />
<strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, favorecendo as ati<strong>vida</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> <strong>vida</strong> diária <strong>de</strong> pessoas na terceira ida<strong>de</strong>.<br />
A pesquisa realizada teve por objetivos: evi<strong>de</strong>nciar motivações para a procura<br />
voluntária <strong>de</strong> pessoas da terceira ida<strong>de</strong> para a prática da dança <strong>de</strong> <strong>salão</strong>; e co<br />
nhecer, a partir dos discursos <strong>de</strong>ssas pessoas, os significados e benefícios trazidos<br />
para o <strong>de</strong>senvolvimento das ati<strong>vida</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> <strong>vida</strong> diária.<br />
Durante o envelhecimento do ser humano, alterações <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m fisiológica,<br />
psicológica e social influenciam seu comportamento <strong>de</strong>vido à diminuição <strong>de</strong> sua<br />
capacida<strong>de</strong> funcional própria da ida<strong>de</strong> avançada e executar cada vez menos<br />
tarefas ou ati<strong>vida</strong><strong>de</strong>s, até que se instala a inati<strong>vida</strong><strong>de</strong> física.<br />
Conhecida como retrogênese, essa fase caracteriza-se pela diminuição da<br />
capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> concentração do idoso, redução da mobilida<strong>de</strong> articular, retardo<br />
nos reflexos, diminuição progressiva da visão, tato menos apurado. Ao abordar<br />
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D a n ç a d e s a l ã o : r e p e r c u s s õ e s n a s at i v i d a d e s d e v i d a d i á r i a<br />
o tema D’Alencar et al. (2006), Berleze (2002) e Matsudo (2000) dão ênfase aos<br />
efeitos psicossociais do fenômeno: baixa estima, solidão, apatia, insegurança e<br />
perda da motivação pelas ati<strong>vida</strong><strong>de</strong>s da <strong>vida</strong> diária (AVD’s).<br />
Visando a encontrar atenuantes para o quadro, alguns estudiosos vêm <strong>de</strong>dican<br />
do a essa população programas <strong>de</strong> ati<strong>vida</strong><strong>de</strong>s físicas que auxiliam na manutenção<br />
das AVD’s (Berleze, 2002; Matsudo, 2000; Katch & McArdle, 996). Defen<strong>de</strong>m<br />
os benefícios <strong>de</strong> uma <strong>vida</strong> mais ativa no sentido da manutenção da capacida<strong>de</strong><br />
funcional e da autonomia física durante o envelhecimento. Na realida<strong>de</strong> da pessoa<br />
idosa, mais do que ati<strong>vida</strong><strong>de</strong>s com implicações nos sistemas cardiorrespiratório<br />
e muscular, faz-se necessário uma prática regular que responda por uma boa<br />
manutenção da capacida<strong>de</strong> funcional como um todo.<br />
Embora não seja hábito mais comum em nossa socieda<strong>de</strong>, <strong>de</strong>ntro da população<br />
idosa, Freitas et al. (2007) atestam um aumento em nossos dias – embora ainda<br />
não proporcionalmente suficiente, quando consi<strong>de</strong>rada a marcha <strong>de</strong>mográfica – da<br />
busca pela prática <strong>de</strong> exercícios físicos. Esse fato é mais característico quando se<br />
observam os idosos inseridos em programas oficiais <strong>de</strong> promoção da saú<strong>de</strong>.<br />
No cotidiano da re<strong>de</strong> básica <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, observam-se mudanças incentivadas<br />
pelo Ministério da Saú<strong>de</strong> quanto à inserção da prática <strong>de</strong> ati<strong>vida</strong><strong>de</strong> física na rotina<br />
do idoso tendo como exemplo a Aca<strong>de</strong>mia da Cida<strong>de</strong>, no Recife (PE), apontando<br />
a utilida<strong>de</strong> no combate ao se<strong>de</strong>ntarismo na população (Siqueira et al., 2008).<br />
De acordo com Freitas et al. (2007), o idoso vem <strong>de</strong>sfrutando <strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong>s<br />
<strong>de</strong> participação em diversos programas/projetos <strong>de</strong> âmbito público, <strong>de</strong> valorização<br />
e <strong>de</strong> convívio social, voltados à promoção <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. A escolha <strong>de</strong> forma <strong>de</strong>mo<br />
crática dos exercícios físicos para uma população acarreta em motivo suficiente<br />
para sair do se<strong>de</strong>ntarismo, buscando um estilo <strong>de</strong> <strong>vida</strong> para o bem-estar com<br />
qualida<strong>de</strong> positiva a cada ganho com o exercício físico.<br />
De fato, em qualquer faixa etária po<strong>de</strong>-se fazer uso da ati<strong>vida</strong><strong>de</strong> física com<br />
o intuito <strong>de</strong> melhorar o condicionamento geral e promover saú<strong>de</strong>. Entretanto,<br />
nos idosos essa necessida<strong>de</strong> é preeminente; inclusive pelo fato <strong>de</strong> induzir várias<br />
adaptações fisiológicas como: aumento da massa muscular; melhor controle da<br />
glicemia; redução do peso corporal e melhor perfil lipídico; melhor controle da<br />
pressão arterial em repouso; melhora da função pulmonar; melhora do equilíbrio<br />
e da marcha, repercutindo em uma diminuição do risco <strong>de</strong> quedas e fraturas<br />
(Mazo et al., 200; Okuma, 998).<br />
Guiando-se por essa compreensão, ressalvem-se estudos que evi<strong>de</strong>nciam a<br />
dança como ati<strong>vida</strong><strong>de</strong> física que tem muito a contribuir com benefícios para as<br />
pessoas idosas. Para além das adaptações fisiológicas, <strong>de</strong>staquem-se benefícios<br />
como: conhecimento do corpo, prevenção dos eventos <strong>de</strong> isolamento e <strong>de</strong>pressão,<br />
ampliação das oportunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> interagir e socializar-se (Guimarães et al., 2003;<br />
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M a r c e l L i m a C u n h a , F á t i m a L u n a P i n h e i r o L a n d i m , M a r i a d e F á t i m a C a v a l c a n t e L i m a , L u i z a<br />
J a n e E y r e d e S o u z a V i e i r a , R a f a e l B a r r e t o d e M e s q u i ta , P at r í c i a M o r e i r a C o l l a r e s<br />
Severo et al., 2000; Laban, 990; Garaudy, 980); maior colaboração e coopera<br />
ção; contato com pessoas <strong>de</strong> interesses semelhantes, <strong>de</strong>senvolvimento e estímulo<br />
da capacida<strong>de</strong> criativa, melhora da auto-estima e da auto-imagem, diminuição<br />
do estresse <strong>nas</strong> ati<strong>vida</strong><strong>de</strong>s do dia-a-dia, aumento da capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> expressão e<br />
comunicação e resgate cultural (Severo et al., 2000).<br />
Autores escrevem ainda que, por contribuir com a criati<strong>vida</strong><strong>de</strong>/expressi<strong>vida</strong><strong>de</strong> e<br />
possuir uma riqueza <strong>de</strong> gestos e movimentos, a dança é uma ati<strong>vida</strong><strong>de</strong> física muito<br />
bem aceita pelos idosos; além <strong>de</strong> fazer aflorar recordações “dos tempos <strong>de</strong> jovem”<br />
(Brikman, 989; Garaudy, 980). Existe também a vantagem <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r ser praticada<br />
<strong>de</strong> forma espontânea ou coreografada e em diversificados lugares como: clubes,<br />
igrejas, domicílios, centros <strong>de</strong> eventos; em uma relação formal ou informal.<br />
2. Método<br />
Estudo <strong>de</strong>scritivo (Marconi & Lakatos, 200) <strong>de</strong>senvolvido em uma escola<br />
<strong>de</strong> dança <strong>de</strong> <strong>salão</strong> situada em um bairro nobre da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Fortaleza, Ceará,<br />
Brasil. Trata-se <strong>de</strong> escola muito bem conceituada na cida<strong>de</strong>, que há vinte anos<br />
vem realizando ati<strong>vida</strong><strong>de</strong>s voltadas para o público da terceira ida<strong>de</strong>.<br />
Apesar <strong>de</strong> não haver restrição alguma ao acesso dos idosos do sexo masculino<br />
<strong>nas</strong> aca<strong>de</strong>mias, ainda é pequena a parcela <strong>de</strong> homens que faz dança <strong>de</strong> <strong>salão</strong>.<br />
Por esse motivo, optou-se por trabalhar com informantes do sexo feminino, com<br />
maior representati<strong>vida</strong><strong>de</strong> na escola.<br />
Participaram da pesquisa 3 mulheres, 09 <strong>de</strong>las na faixa etária <strong>de</strong> 60 a 70<br />
anos e 04 com pouco mais <strong>de</strong> 70, que praticavam a dança <strong>de</strong> <strong>salão</strong> regular<br />
mente. Para o estabelecimento da ida<strong>de</strong> mínima <strong>de</strong> participação levou-se em<br />
consi<strong>de</strong>ração o disposto pela Organização Mundial <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> (OMS) acerca<br />
da <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> idoso: consi<strong>de</strong>ra-se idoso todo indivíduo com 65 anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>, ou mais,<br />
que resi<strong>de</strong> nos países <strong>de</strong>senvolvidos e com 60 anos, ou mais, os resi<strong>de</strong>ntes em países em<br />
<strong>de</strong>senvolvimento.<br />
Todas eram <strong>de</strong> cor parda e provenientes da classe média da socieda<strong>de</strong> forta<br />
lezense. Ape<strong>nas</strong> duas ainda possuíam esposos, seus parceiros <strong>de</strong> dança. Praticavam<br />
a religião católica, suas rendas provinham <strong>de</strong> pensões e/ou aposentadorias, e a<br />
inserção na comunida<strong>de</strong>, quando era o caso, se dava por meio <strong>de</strong> serviços volun<br />
tários em Organizações Não-Governamentais. A técnica utilizada para coletar os<br />
dados foi entrevista semi-estruturada. Todas as entrevistas foram gravadas com<br />
consentimento das informantes.<br />
Depois <strong>de</strong> transcritas na íntegra, várias leituras foram realizadas <strong>nas</strong> entrevistas<br />
para i<strong>de</strong>ntificar temas recorrentes, convergência e divergências <strong>de</strong> falas, chegando,<br />
por fim, aos temas <strong>de</strong> análises (Marconi & Lakatos, 200).<br />
Os <strong>de</strong>poimentos tomados em recortes, bem como as <strong>de</strong>scrições da realida<strong>de</strong><br />
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D a n ç a d e s a l ã o : r e p e r c u s s õ e s n a s at i v i d a d e s d e v i d a d i á r i a<br />
captada, constituíram material <strong>de</strong> análise e foram seguidos <strong>de</strong> interpretações<br />
subsidiadas por material bibliográfico atual e pertinente.<br />
A proposta foi submetida à análise do Comitê <strong>de</strong> Ética da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
Fortaleza – UNIFOR, tendo sido aprovada sua aplicação na íntegra, sob o parecer<br />
<strong>de</strong> número 262/2004, com o registro no comitê <strong>de</strong> número 04-203. A anuência<br />
<strong>de</strong> participação da pessoa informante foi registrada em Termo <strong>de</strong> Consentimento<br />
Pós-esclarecido, conforme disposto na Resolução 96/96 do Conselho Nacional<br />
<strong>de</strong> Saú<strong>de</strong>/Ministério da Saú<strong>de</strong> (Brasil, 996).<br />
3. Resultados e discussões<br />
Ao se buscar conhecer as motivações <strong>de</strong> um grupo <strong>de</strong> mulheres que elegeram<br />
voluntariamente a dança <strong>de</strong> <strong>salão</strong> como ati<strong>vida</strong><strong>de</strong> a ser praticada diariamente,<br />
<strong>de</strong>stacaram-se as seguintes respostas, por número <strong>de</strong> vezes que elas apareceram:<br />
“Para melhorar as relações social e afetiva” (09 vezes); “Para melhoria <strong>nas</strong> ati<strong>vida</strong><strong>de</strong>s diárias”<br />
(09 vezes); “Para <strong>de</strong>ixar o se<strong>de</strong>ntarismo” (08 vezes); “Para melhorar a saú<strong>de</strong>” (07<br />
vezes); “Para melhorar o condicionamento físico” (07 vezes); “Porque eu gosto <strong>de</strong> dançar”<br />
(05 vezes).<br />
Nas palavras <strong>de</strong> Severo et al. (2000), traduz-se a dança em um modo <strong>de</strong><br />
viver saudável que transforma o cotidiano das idosas <strong>de</strong> maneira integral. Alguns<br />
<strong>de</strong>poimentos corroboram essa assertiva:<br />
“Eu andava muito parada, muito se<strong>de</strong>ntária. Quando comecei a dançar, fez muita<br />
diferença (...) com a dança me sinto muito disposta”; “A dança é uma terapia<br />
para o corpo e para a alma, aumenta a resistência física, melhora a coor<strong>de</strong>nação<br />
motora. (...) acho que é muito importante o equilíbrio. Tudo isso melhora com a<br />
dança”; “Acho que melhora a parte física (...). A função respiratória melhorou<br />
bastante, meu colesterol baixou”.<br />
Ainda apoiando-se nos <strong>de</strong>poimentos po<strong>de</strong>-se dizer que o estilo <strong>de</strong> <strong>vida</strong> ativo é<br />
uma “atitu<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>vida</strong>”, e não um privilégio da pouca ida<strong>de</strong>. Nesse sentido, rompemse<br />
as barreiras do medo e do preconceito e, substituindo, têm-se as forças curativas<br />
da parceria e da cumplicida<strong>de</strong>. Essas trazem conquistas significativas no que diz<br />
respeito aos progressos físicos num grupo <strong>de</strong> idosos, embora, conforme esclarecem<br />
D’Alencar et al. (2006), possam parecer lentos e pouco perceptíveis.<br />
Defen<strong>de</strong>-se a superação, portanto, das barreiras impostas por convenções mais<br />
preconceituosas acerca daquilo que seja “compatível”, em termos <strong>de</strong> atitu<strong>de</strong>, com<br />
a ida<strong>de</strong> cronológica (Okuma, 998). De fato, um movimento a favor da promoção<br />
<strong>de</strong> pessoas da terceira ida<strong>de</strong> passa pela mudança <strong>de</strong> atitu<strong>de</strong> <strong>de</strong>stas e da socieda<strong>de</strong><br />
em geral diante do que se convencionou como “velhice”. Essa é, <strong>de</strong> acordo com<br />
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J a n e E y r e d e S o u z a V i e i r a , R a f a e l B a r r e t o d e M e s q u i ta , P at r í c i a M o r e i r a C o l l a r e s<br />
Guimarães et al. (2003) e Severo et al. (2000), condição prepon<strong>de</strong>rante na saú<strong>de</strong> e<br />
bem-estar <strong>de</strong>sse segmento populacional.<br />
Sabe-se que o envelhecimento fisiológico varia <strong>de</strong> acordo com o modo que o<br />
indivíduo conduz toda a sua <strong>vida</strong> __ seus hábitos e seus vícios. A esse respeito, em<br />
vez <strong>de</strong> se consi<strong>de</strong>rar o <strong>de</strong>clínio funcional efetivamente ocorrido nos idosos, talvez<br />
fosse necessário consi<strong>de</strong>rar um mo<strong>de</strong>lo mais complexo, no qual existe um ciclo<br />
vicioso em que as pessoas vão reduzindo a ati<strong>vida</strong><strong>de</strong> física. Por outro lado, consi<br />
<strong>de</strong>ra-se que realizar um exercício físico não é só querer, ou mesmo po<strong>de</strong>r, há que<br />
se ter boa vonta<strong>de</strong> para persistir hora após hora, por dias intermináveis, em uma<br />
prática que assegure condicionamento físico constante e bom funcionamento do<br />
corpo. A particularida<strong>de</strong> <strong>de</strong> a prática da dança <strong>de</strong> <strong>salão</strong> se sobressair em relação<br />
às <strong>de</strong>mais está, pois, no gosto por realizá-la. Nesse aspecto merecem <strong>de</strong>staque,<br />
além dos resultados físicos, os efeitos bioquímicos associados à experimentação do<br />
que seja “prazeroso”. Uma informante atesta: “Porque é um exercício prazeroso, não fica<br />
cansativo nem monótono”.<br />
O sucesso <strong>de</strong> uma ati<strong>vida</strong><strong>de</strong> física está em se po<strong>de</strong>r associá-la ao lazer e ao<br />
prazer. Focando as AVD’s, mudanças consi<strong>de</strong>ráveis foram sugeridas como tendo<br />
relação com o acontecimento da dança <strong>de</strong> <strong>salão</strong> na <strong>vida</strong> das entrevistadas. É o<br />
que se constata lendo as falas a seguir: “Tinha dor <strong>nas</strong> per<strong>nas</strong> que me impedia <strong>de</strong> realizar<br />
tarefas como varrer a casa, lavar uma louça permanecendo muito tempo em pé ao lado da pia<br />
(...). Tudo passou”; “Cansava com facilida<strong>de</strong>. Não podia subir uma escada que já cansava, as<br />
per<strong>nas</strong> pesavam...”; “A coluna tá novinha. Voltei até a brincar com os netos. Antes a coluna não<br />
<strong>de</strong>ixava, era dura e tudo doía”.<br />
O significado da dança para o idoso, por tratar-se <strong>de</strong> ati<strong>vida</strong><strong>de</strong> que leva o<br />
indivíduo a expressar-se por meio do corpo, extrapola para o campo mais subjetivo,<br />
promovendo prazer e auto-estima.<br />
A esse respeito Severo et al. (2000) escrevem que as danças possuem um ele<br />
mento social que a prática única <strong>de</strong> ginástica não possui, elas ampliam as chances<br />
<strong>de</strong> promover o encontro e favorecem os laços afetivos. A colaboração para com<br />
o sucesso do outro, durante uma dança, leva ao surgimento <strong>de</strong> um sentimento <strong>de</strong><br />
utilida<strong>de</strong> com <strong>repercussões</strong> positivas na estima pessoal.<br />
Dentre as 3 entrevistadas, oito associaram a dança <strong>de</strong> <strong>salão</strong> à melhoria <strong>de</strong><br />
seu estado psicológico. Constou-se serem mulheres que sofriam <strong>de</strong> severas crises<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>pressão, e que encontraram na dança um “sentido para seguir vivendo”. É<br />
exemplo <strong>de</strong> fala que sintetiza o sentimento experimentado: “Eu me sentia sem utilida<strong>de</strong>...<br />
No fim da linha!”.<br />
Parece ser uma tendência <strong>de</strong> a pessoa idosa ir buscar no grau <strong>de</strong> <strong>vida</strong> ativa que<br />
caracterizou sua juventu<strong>de</strong> um parâmetro para avaliar o significado e a impotência<br />
<strong>de</strong> sua existência na atualida<strong>de</strong>. Ao agir assim, entregam-se mais facilmente ao<br />
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D a n ç a d e s a l ã o : r e p e r c u s s õ e s n a s at i v i d a d e s d e v i d a d i á r i a<br />
<strong>de</strong>clínio fisiológico e psicológico peculiar, muito ligado a um estilo <strong>de</strong> <strong>vida</strong> se<strong>de</strong>n<br />
tário (Kuwano & Silveira, 2002).<br />
Entretanto, na companhia das colegas <strong>de</strong> turma, assim como na dos seus<br />
parceiros <strong>de</strong> dança, essas mulheres encontram cumplicida<strong>de</strong> e companheirismo.<br />
Também parecem ter (re)encontrado prazer em sair <strong>de</strong> casa, conhecer e falar<br />
com outras pessoas. “Tenho mais vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> sair, encontrar outras pessoas...”, afirma uma<br />
das entrevistadas. “Eu fiz uma aca<strong>de</strong>mia só pra apren<strong>de</strong>r a dançar. Agora a gente vai é pras<br />
festas”, é o pronunciamento <strong>de</strong> outra.<br />
Na medida em que o indivíduo na terceira ida<strong>de</strong> (re)apren<strong>de</strong> a lidar com o seu<br />
corpo, aceitando as transformações que vão acontecendo e reconhecendo potenciais<br />
em sua nova condição (Berleze, 2002; Matsudo, 2000; Katch & McArdle, 996),<br />
tudo o mais em seu comportamento diante dos <strong>de</strong>safios da <strong>vida</strong> diária parece<br />
po<strong>de</strong>r ser re<strong>de</strong>senhado.<br />
Estados psicossociais são, inclusive, afetados positivamente, trazendo confiança<br />
e satisfação por terem os idosos os anos que têm. D’Alencar et al. (2006) teste<br />
munharam o processo <strong>de</strong> transformação vivenciado por um grupo <strong>de</strong> idosos. De<br />
acordo com os autores, eles saíram da restrição <strong>de</strong> seus lares e foram libertando-se<br />
da vergonha e dos preconceitos através da biodança.<br />
A utilização da música e da dança <strong>de</strong>sperta, assim, um vínculo/aceitação com<br />
o próprio corpo, fazendo aflorar suas experiências <strong>de</strong> <strong>vida</strong> por meio do lúdico<br />
e, com isso, promovendo o prazer, a criati<strong>vida</strong><strong>de</strong>, a integração, a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
inovação e fornecendo novas motivações para a <strong>vida</strong> social: “A dança me ajudou muito<br />
a ter auto-estima. Sou mais alegre, comunicativa...”.<br />
Para as informantes <strong>de</strong>sse estudo o universo da música e da dança faz, ainda,<br />
aflorar sentimentos <strong>de</strong> “se gostar”, <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r “vibrar”, “fazer movimentos”, ser<br />
“mais alegre”, “mais leve”, “melhorar o astral”. As falas evi<strong>de</strong>nciam este fato:<br />
“<strong>Dança</strong>r é se gostar, gostar das outras pessoas, é vibrar, é fazer movimentos... A dança me<br />
tornou outra pessoa, mais alegre, mais ativa e mais dinâmica”; “A dança me <strong>de</strong>ixa mais leve,<br />
o astral melhora, eu me sinto mais elevada [...]. Posso estár meio sem graça, mas quando venho<br />
pra dança, já saio <strong>de</strong> outra maneira”.<br />
Constatou-se que a dança po<strong>de</strong> entrar, ainda, na <strong>vida</strong> dos idosos como forma<br />
<strong>de</strong> permiti-los traduzir sentimentos, ansieda<strong>de</strong>s, necessida<strong>de</strong>s, interesses que atra<br />
vessam toda uma existência sem serem explicitados. E que, <strong>de</strong>ste modo, assume<br />
função amortecedora <strong>de</strong> estresse, quando é entendida como algo prazeroso <strong>de</strong> se<br />
fazer: “Eu adoro dançar!”.<br />
I<strong>de</strong>ntificou-se <strong>de</strong>claração explícita <strong>de</strong> amor feita por informante ao ato <strong>de</strong><br />
dançar: “Toda a <strong>vida</strong> eu fui apaixonada por música, por dança, por tudo que envolve a música”.<br />
Isso insinua ser a dança uma fonte <strong>de</strong> prazer, muito antes <strong>de</strong> ser encarada como<br />
ati<strong>vida</strong><strong>de</strong> física. Por vezes, a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> realizar um <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> algum modo<br />
cerceado: “Isto é só a realização <strong>de</strong> um sonho antigo...”, <strong>de</strong>clara uma entrevistada.<br />
C a d. Saú<strong>de</strong> Colet., Rio <strong>de</strong> Janeiro, 16 (3): 559 - 568, 2008 – 565
M a r c e l L i m a C u n h a , F á t i m a L u n a P i n h e i r o L a n d i m , M a r i a d e F á t i m a C a v a l c a n t e L i m a , L u i z a<br />
J a n e E y r e d e S o u z a V i e i r a , R a f a e l B a r r e t o d e M e s q u i ta , P at r í c i a M o r e i r a C o l l a r e s<br />
4. Consi<strong>de</strong>rações finais<br />
Nesse estudo evi<strong>de</strong>nciou-se que a dança <strong>de</strong> <strong>salão</strong> promove modificações no<br />
comportamento e estado físico, fisiológico e emocional das pessoas pesquisadas.<br />
Po<strong>de</strong>-se afirmar, pois, que a dança, conduzida como ati<strong>vida</strong><strong>de</strong> física prazerosa e<br />
motivante, vem auxiliando essas pessoas a melhorar seu <strong>de</strong>sempenho <strong>nas</strong> AVD’s,<br />
dando-lhe autonomia e prevenindo, conseqüentemente, doenças causadas pela<br />
inati<strong>vida</strong><strong>de</strong> física.<br />
Para além disto, os dados permitem inferir uma abertura <strong>de</strong> perspectivas<br />
para uma <strong>vida</strong> mais feliz e prazerosa, quando a experiência com a dança serve<br />
como amortecedor do estresse, ajudando a administrar preconceitos relativos ao<br />
ser envelhecido.<br />
Movimentar-se auxiliado pela dança po<strong>de</strong> conduzir a pessoa idosa a um<br />
<strong>de</strong>spertar interior, repercutindo em autoconhecimento necessário a uma atitu<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> confiança diante da <strong>vida</strong>; condição que também respon<strong>de</strong> pela (re)socialização,<br />
na medida em que se ampliam as re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> relacionamento social.<br />
Diante dos <strong>de</strong>poimentos, constata-se na dança uma estratégia em potencial<br />
para utilização dos profissionais da saú<strong>de</strong>, em especial os da saú<strong>de</strong> coletiva,<br />
que atuam no cuidado humano com vistas à promoção <strong>de</strong> atitu<strong>de</strong>s positivas<br />
diante da <strong>vida</strong>.<br />
R e f e r ê n c i a s B i b l i o g r á f i c a s<br />
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Recebido em: 2/08/2007<br />
Reapresentado em: 27/0/2008<br />
Aprovado em: 06//2008<br />
C a d. Saú<strong>de</strong> Colet., Rio <strong>de</strong> Janeiro, 16 (3): 559 - 568, 2008 – 567