Dom Casmurro e Capitu, a obra literária virou minissérie
Dom Casmurro e Capitu, a obra literária virou minissérie
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<strong>Dom</strong> <strong>Casmurro</strong> e <strong>Capitu</strong>, a <strong>obra</strong> literária <strong>virou</strong> minissérie<br />
Introdução<br />
Danyelle Marques Freire SILVA 1<br />
Em entrevista para a tese de mestrado de Hélio de Freitas Guimarães (1995), Manual<br />
Carlos, renomado autor que começou a trabalhar em televisão no começo dos anos 50 fala da<br />
dificuldade de transpor a <strong>obra</strong> literaria de Machado de Assis para a televisão “Eu acho um pouco<br />
irresponsável fazer Machado de Assis. É um dos maiores escritores do mundo. Em qualquer<br />
literatura o Machado seria um grande escritor. E, no entanto, o que o cinema fez do Machado de<br />
Assis?<br />
Guimarães retruca: Fez Memória Póstuma.<br />
E vem a esposta em sábias palavras de Manuel Carlos: (1967) Nada<br />
assim que representasse um acontecimento, você fazendo o maior escritor<br />
brasileiro. Quando os americanos fazem um Hemingway, fazem um<br />
Steinbeck, fazem Scott Fitzgerald, é sempre um grande filme. Machado não é<br />
empolgante. Machado é um gênio, Machado é para ser lido. Eu sugeri à<br />
Globo [...] fazer dez, vinte contos de Machado de Assis, um entrando pelo<br />
outro. Aí da para fazer coisas ótimas. Mas pegar <strong>Dom</strong> <strong>Casmurro</strong>, Quincas<br />
Borba, Esaú e Jacó... (GUIMARÃES, 1995)<br />
Desta maneira, fica claro o respeito que as obas de Machado de Assis sempre teve pelo<br />
mais renomados autores brasileiro. As <strong>obra</strong>s de Machado de Assis são divididas em duas fases:<br />
A primeira fase (fase romântica) os personagens de suas <strong>obra</strong>s apresentam características<br />
românticas, notoriamente o amor e os relacionamentos amorosos são os principais temas de<br />
seus livros. Pode-se destacar desta fase as seguintes <strong>obra</strong>s: Ressurreição (1872), seu<br />
primeiro livro, A Mão e a Luva (1874), Helena (1876) e Iaiá Garcia (1878).<br />
A Segunda Fase (fase realista), é considerado o melhor de sua carreira, os destaca<br />
melhor as questões psicológicas dos personagens deixando transparecer as características do<br />
realismo literário. Machado de Assis faz uma análise profunda e realista do ser humano,<br />
destacand suas vontades, necessidades, defeitos e qualidades. Nesta fase suas principais <strong>obra</strong>s<br />
são: Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881), Quincas Borba (1892), <strong>Dom</strong><br />
<strong>Casmurro</strong> (1900) O livro <strong>Dom</strong> <strong>Casmurro</strong>, foi impresso em 1899, em Paris; a divulgação da<br />
<strong>obra</strong> no Rio de Janeira aconteceu em 1990. A história contada no livro se da entre a metade e o<br />
final do século XIX, e se passa no Rio de Janeiro. O autor começa o livro referindo-se a esse<br />
período: aconteceu numa tarde de novembro de 1857, e tinham então os dois personagens<br />
principais 15 e 14 anos.
A história é contada em primeira pessoa, por um dos personagens principais, Bentinho,<br />
o <strong>Dom</strong> <strong>Casmurro</strong>, que dá título ao livro. O narrador conta sua história, a história do seu amor por<br />
Capitolina (<strong>Capitu</strong>), desde a adolescência e o desenrolar de suas vidas. A personagem principal<br />
da <strong>obra</strong> <strong>Capitu</strong>, ficando Bentinho (o narrador) como um protagonista secundário ao lado dos<br />
vários outros personagens secundários e do antagonista Escobar.<br />
De acordo com estudo crítico de Afrânio Coutinho (1967) A escolha do narrador é<br />
evidentemente intencional. O autor pretende relatar uma história que sucedeu ao narrador-personagem, a<br />
qual é por ele melhor conhecida. Bentinho é o ponto de vista do qual o leitor vê os acontecimentos, isto é,<br />
a história é apresentada na maneira por que Bentinho a experimentou, interpreta e expõe. Não vemos<br />
nem ouvimos <strong>Capitu</strong>, seu ponto de vista não é referido. (COUTINHO. p.26)<br />
<strong>Dom</strong> <strong>Casmurro</strong> não se trata de uma mera reprodução dos costumes de uma época.<br />
Além de trazer as contradições do mundo social do século XIX, o texto vai além, abordando<br />
pontos como a passagem do tempo, a consciência do termino das coisas, o amor, a amizade, a<br />
dúvida da traição e também o cruel, tudo isso sem abrir mão da ironia e da comicidade<br />
Machadiana.<br />
<strong>Capitu</strong> e a crítica<br />
A minissperie <strong>Capitu</strong> foi exibida pela Rede Globo de 9 a 13 de dezembro de 2008,<br />
dirigida por Luiz Fernando Carvalho. Foi feita, em homenagem ao centenário de morte de<br />
Machado de Assis, autor do romance no qual a série se baseia, <strong>Dom</strong> <strong>Casmurro</strong>. De acordo<br />
com informações disponiveis no site da Rede Globo, <strong>Capitu</strong> é a segunda produção do Projeto<br />
Quadrante, sendo a primeira, A Pedra do Reino, realizado pelo mesmo diretor Luiz Fernando<br />
Carvalho com o intuito de levar a literatura brasileira para a televisão.<br />
A minissérie <strong>Capitu</strong> reafirma a dúvida presente em <strong>Dom</strong> <strong>Casmurro</strong> como parte do<br />
processo cultural da modernidade. Em seu tempo, Machado surgiu como um avanço, com uma<br />
nova proposta estética e intelectual, de extrema modernidade em relação à época e à própria<br />
literatura que se produzia no país e no mundo. O escritor ergueu um texto com modernidade<br />
formal, sem abrir mão de uma sensível reflexão sobre as facetas da alma humana.<br />
Com uma linguagem moderna e atemporal, a série conta a história do amor intenso<br />
entre Bentinho e <strong>Capitu</strong>, da dúvida de Bento Santiago ter sido traído e o que essa dúvida<br />
provoca em termos de imaginação.<br />
A minissérie foi alvo de muitas críticas. Diogo Mainardi (2008), colunista da Revista Veja,<br />
disse a respeito: A série <strong>Capitu</strong> tem um aspecto circense. É Machado de Assis encenado por
Orlando Orfei. É Bentinho imitando Arrelia no picadeiro de Fausto Silva: "Como vai, como vai, vai, vai? Eu<br />
vou bem, muito bem, bem, bem". Luiz Fernando<br />
Carvalho usa uma linguagem grotesca, afetada, espalhafatosa, cheia de<br />
contorcionismos e de malabarismos. Machado de Assis é o oposto. No livro<br />
<strong>Dom</strong> <strong>Casmurro</strong>, o relato de Bentinho é espantosamente seco e<br />
desencantado. Ele narra sua história apenas para combater o tédio: sem<br />
drama, sem sentimentalismo, sem teatralidade. Quando Bentinho descobre<br />
que o filho bastardo de <strong>Capitu</strong> com Escobar morreu de febre tifóide, ele<br />
comenta simplesmente: "Apesar de tudo, jantei bem e fui ao teatro".<br />
Esta crítica, publicada em 13 de dezembro de 2008 causou muita polêmica. No site de<br />
relacionamentos “Orkut”, na comunidade dedicada a Machado de Assis, encontramos um tópico<br />
intitulado “Crítica de Diogo Mainard” onde cerca de 200 pessoas vão a favor ou contra o<br />
colunista. Já em um blogue onde a critica de Mainard também foi publicada uma usuária diz:<br />
Mainardi não entendeu lhufas da proposta de LFC. O narrador da série não foi o Bentinho machadiano,<br />
muito menos o Bentinho de Diogo Mainardi (ainda bem!). O narrador de “<strong>Capitu</strong>” foi o Bentinho de Luiz<br />
Fernando Carvalho, um <strong>Casmurro</strong> de olhar enamorado e nostálgico, que se martiriza pelo resto da vida<br />
por causa de uma paixão fracassada. Bia Abramo apontou isso notavelmente na sua crítica para a Folha<br />
de São Paulo (”Como o próprio Bentinho de 15 anos, Luiz Fernando Carvalho está apaixonado por<br />
<strong>Capitu</strong>. A grande ousadia do diretor nesta versão de “<strong>Dom</strong> <strong>Casmurro</strong>” não é a trilha sonora, ou a mistura<br />
de linguagens, ou a cenografia pop, mas, sim, a de se colocar como mais um narrador, tão caprichoso e<br />
interessado como qualquer outro narrador de Machado de Assis. Ele cria uma espécie de Carvalho<br />
Bentinho, que se transmuta em Carvalho-Bento Santiago, acelerando ainda mais a instabilidade da<br />
narrativa machadiana”). Sinceramente, se prevalecesse a intenção de Diogo Mainardi, que se apropria<br />
até de Machado de Assis para fazer panfletagem antiesquerdista, nós desgraçadamente teríamos<br />
assistido à versão da prima Justina para o romance. Uma versão neo-con e aborrecida. (Ives Röpke<br />
Says. 15/12/2008)<br />
Já o tópico “O que acharam da microssérie <strong>Capitu</strong>, podemos encontrar opiniões bem<br />
formuladas a respeito do trabalho de Luiz Fernando Carvalho, como veremos a seguir: Achei um<br />
lixo, um desrespeito. Pura decepção. Personagens caricatos, coreografados, teatralizados, com cara e<br />
gestual e palhaços. Um Bentinho com bigode pintado e de trejeitos cômicos. Isso sem falar numa banda<br />
de rock safada tocando ao fundo... Meu Deus, o que fizeram! Tentaram dar um ar modernoso e só<br />
estragaram tudo...Eu esperava ver um retrato fiel da época, a Rua Matacavalos, vestimentas, o<br />
desabrochar da relação entre Bento e Capitolina... e eles apresentam aquilo: Abre cortinas, fecha<br />
cortinas, aquele amarelão que cansa o visual, uma <strong>Capitu</strong> com uma tatto gigantesca no braço, coisa<br />
impensável para uma menina daquele tempo. E o rock? Volto mais uma vez a falar dele, pois foi talvez<br />
uma das coisas que mais me chocou, além da caracterização totalmente infeliz que deram aos<br />
personagens. Enfim, quem não conhece Machado e nunca leu <strong>Dom</strong> <strong>Casmurro</strong> vai ficar com aquela idéia
deturpada na cabeça: Machado de Assis? Aquele cara que escreve peças de teatro com palhaços<br />
coreografados e fundo amarelão que dá dor de cabeça? Triste...”(Thiago 10/12/98)<br />
Conclusão<br />
Logo a baixo podemos encontrar comentários favoráveis a produção:<br />
A produção foi felicíssima na escolha do elenco e dos figurinos, que<br />
permitem que se tenha a dimensão exata da profundidade dos<br />
personagens... as cores mais fortes, como o azul, AMARELO, roxo,<br />
vermelho, negro e branco... deixam perceber tanto no cenário, quanto no<br />
figurino as personalidades do envolvidos na trama... sim trama... pois <strong>Capitu</strong><br />
é uma estória de amor e ódio...ciúme e decepção...intrigas, dúvidas,<br />
suspeitas...nada de crítica aos costumes da época (...) Essa é a intenção do<br />
autor, personagens caricatos, over mesmo, para mostrar sua profundidade e<br />
do texto... pois o TEXTO de Machado é o mai importante... a imagem<br />
completa o conjunto (S.César 10/12/2008)<br />
A adaptação de <strong>obra</strong>s literárias para o sistema audiovisual tem se mostrado como uma<br />
maneira de recriar a arte, de exibir novas projetos adaptados de textos já conhecidos e<br />
consagrados pela crítica e pelo leitores. Esse processo de transposição da arte literária tem<br />
mostrado muito usado pela mídia atual, na elaboração de <strong>obra</strong>s audiovisuais. A mudança de<br />
suporte provoca inúmeras mudanças, tanto na <strong>obra</strong> literária quanto em sua recepção, o que traz<br />
à tona a questão da fidelidade da adaptação. Alguns críticos e estudiosos garantem que a<br />
mudança de suporte não desqualifica o texto original, pelo fato de seus elementos poder de<br />
alguma maneira ser transpassados para a narrativa imagética, outros ressaltam a autonomia e a<br />
liberdade da adaptação em relação ao original. Hoje, o diretor tem mais liberdade para adequar<br />
um texto literário sem se preocupar com a questão da fidelidade. O que vale é um uso atraente<br />
das peculiareidades de cada linguagem, pois há uma maior consciência da impossibilidade de<br />
ser totalmente fiel ao original.<br />
A adaptação dessa <strong>obra</strong> para o minissérie, realizada por Luiz Fernando Carvalho em<br />
2008, buscou ser fiel ao texto original, tentando manter o mesmo ritmo da narrativa e preservar<br />
as principais características do livro de Machado de Assis. Mas, talvez a modernidade<br />
empregada causou revolta para alguns amantes da literatura de Machado de Assis. Desse<br />
modo, a representação extremamente crítica e irônica que Machado de Assis faz da sociedade<br />
de seu tempo perde, no filme, muito de sua força. No lugar dela, apenas os cenários os figurinos<br />
com características circense, as personagens encarnadas por atores não conhecidos com<br />
vestimenta e maquiagem fortes e irreverentes.<br />
Referencias bibliograficas:
ASSIS, Machado de. <strong>Dom</strong> <strong>Casmurro</strong>. Biografia de M. Cavalcanti Proença. Introdução de<br />
Afrânio Coutinho. Rio de Janeiro, Tecnoprint Gráfica, Edições de Ouro, 1967.<br />
GUIMARÃES, Hélio. O romance do século XIX na televisão: observações sobre a adaptação de<br />
Os Maias. In: PELLEGRINI, Tânia et. al. Literatura, cinema e televisão. São Paulo: Editora<br />
SENAC e Instituto Itaú Cultural, 2003. p. 91-114.<br />
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PELLEGRINI, Tânia et. al. Literatura, cinema e televisão. São Paulo: Editora SENAC e<br />
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PELLEGRINI, Tânia. Narrativa verbal e narrativa visual: possíveis aproximações. In:<br />
PELLEGRINI, Tânia et. al. Literatura, cinema e televisão. São Paulo: Editora SENAC e<br />
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STAM, Roberto. Bakhtin: da teoria literária à cultura de massa. São Paulo: Editora<br />
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PELLEGRINI, Tânia et. al. Literatura, cinema e televisão. São Paulo: Editora SENAC e<br />
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http://www.orkut.com.br/Main#CommMsgs?cmm=27157&tid=5277933113663390883 – Acesso<br />
em 21 de agosto de 2009<br />
http://www.orkut.com.br/Main#CommMsgs?cmm=27157&tid=5279291474312786711 – Acesso<br />
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http://capitu.globo.com/ - Acesso em 15 de agosto de 2009.