Distrito sanitário indÃgena - Conselho Nacional de Saúde
Distrito sanitário indÃgena - Conselho Nacional de Saúde
Distrito sanitário indÃgena - Conselho Nacional de Saúde
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
Saú<strong>de</strong> indígena com<br />
controle social no Brasil<br />
Zilda Arns Neumann*<br />
Na minha experiência <strong>de</strong> conselheira,<br />
<strong>de</strong> médica e <strong>de</strong> administradora sanitária,<br />
tenho a certeza <strong>de</strong> que, para exercer o<br />
controle social, em primeiro lugar, é preciso<br />
saber bem o que está acontecendo com a<br />
saú<strong>de</strong> dos povos indígenas. Conhecer <strong>de</strong><br />
perto a realida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cada <strong>Distrito</strong> Sanitário,<br />
<strong>de</strong> cada povo, <strong>de</strong> cada comunida<strong>de</strong>. Há<br />
perguntas que precisam <strong>de</strong> respostas: <strong>de</strong><br />
que estão morrendo ou ficando<br />
doentes quais os principais sofrimentos<br />
que afligem as famílias<br />
Para fazer este levantamento não<br />
bastam pesquisas esporádicas, mas sim a<br />
existência <strong>de</strong> um sistema <strong>de</strong> informação<br />
simples, <strong>de</strong> base familiar e comunitária,<br />
que sirva <strong>de</strong> instrumento gerencial e <strong>de</strong><br />
estímulo no trabalho <strong>de</strong> todos e,<br />
principalmente, das famílias indígenas.<br />
Afinal, a maioria das doenças e suas<br />
causas, que hoje afetam estas famílias,<br />
são facilmente preveníveis.<br />
Esse diagnóstico po<strong>de</strong> ser iniciado em<br />
conversas locais, com a participação dos<br />
homens, das mulheres (que po<strong>de</strong>m ajudar<br />
muito) e dos jovens também. Eles conhecem<br />
bastante os problemas e participando dos<br />
<strong>de</strong>bates se tornam co-responsáveis, além<br />
<strong>de</strong> representarem o futuro das famílias<br />
indígenas.<br />
Eu gostaria ainda <strong>de</strong> sugerir que os<br />
problemas principais fossem listados por<br />
escrito, começando pelos mais graves, para<br />
serem entregues aos representantes<br />
escolhidos para os respectivos conselhos.<br />
Os conselhos <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, integrados por<br />
representantes indígenas - que ocupam a<br />
meta<strong>de</strong> das vagas - junto com<br />
representantes do governo e das entida<strong>de</strong>s<br />
que trabalham com as populações<br />
indígenas, <strong>de</strong>vem escutar o que os povos<br />
estão sentindo, para <strong>de</strong>pois fazer um plano<br />
<strong>de</strong> ação participativo.<br />
O plano <strong>de</strong> ação, que é feito com a<br />
participação organizada das bases, tem<br />
muito mais probabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> dar certo,<br />
com melhores resultados. Por exemplo,<br />
se a comunida<strong>de</strong> disser que o alcoolismo<br />
é um problema grave, como fazer para<br />
controlar esse mal O conselho <strong>de</strong>ve<br />
empenhar-se para reduzir o alcoolismo.<br />
Isto se faz através <strong>de</strong> ações concretas,<br />
que <strong>de</strong>vem constar no orçamentoprograma.<br />
O controle <strong>de</strong> qualquer doença ou<br />
sofrimento requer sempre o pensamento,<br />
a atitu<strong>de</strong> e a ação <strong>de</strong> como prevenir, como<br />
curar os que já estão sofrendo <strong>de</strong>sse mal.<br />
Além <strong>de</strong> reabilitar as pessoas das<br />
conseqüências e danos provocados por<br />
aquela doença ou aquele sofrimento.<br />
Por isso, a prevenção das doenças é muito<br />
mais barata e dá muito mais resultados. No<br />
plano <strong>de</strong> ação, o conselho sempre <strong>de</strong>ve<br />
constar, com absoluta priorida<strong>de</strong>, as ativida<strong>de</strong>s<br />
para a prevenção das doenças, além das ações<br />
para cura e reabilitação.<br />
A gestação, o parto e a saú<strong>de</strong> nos<br />
primeiros anos <strong>de</strong> vida têm influência<br />
drástica sobre as mortalida<strong>de</strong>s infantil e<br />
materna e sobre a qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida da<br />
população até a ida<strong>de</strong> avançada. Por isso,<br />
é preciso garantir a melhor atenção<br />
possível nestas etapas. Elas <strong>de</strong>vem constar<br />
como priorida<strong>de</strong> no orçamento-programa.<br />
Assim como a saú<strong>de</strong> da gestante, o<br />
parto, o aleitamento materno até dois<br />
anos ou mais, e a vigilância nutricional,<br />
também <strong>de</strong>vem integrar o documento<br />
pontos como a segurança alimentar, a<br />
vacinação contra todas as doenças que<br />
possam ser prevenidas, a educação contra<br />
aci<strong>de</strong>ntes, o saneamento ambiental - boa<br />
qualida<strong>de</strong> da água, <strong>de</strong>stino dos <strong>de</strong>jetos -,<br />
o lazer e outros.<br />
Como se po<strong>de</strong> verificar, o conselho<br />
precisa articular-se com outras áreas, somar<br />
esforços, para garantir melhoria gradual<br />
da qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida <strong>de</strong> todas as famílias<br />
em todas comunida<strong>de</strong>s indígenas. Por<br />
exemplo, o cultivo <strong>de</strong> alimentos <strong>de</strong> forma<br />
auto-sustentável, a educação em saú<strong>de</strong> nas<br />
escolas, a manutenção da higiene e limpeza<br />
nas casas e comunida<strong>de</strong>s, o lazer que inclui<br />
a educação para a saú<strong>de</strong> e outros.<br />
Para fazer um plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, é<br />
preciso saber negociar e somar esforços<br />
para o bem comum. Um exemplo, a<br />
integração entre o Programa Saú<strong>de</strong> da<br />
Família e a Pastoral da Criança. Daí a<br />
riqueza <strong>de</strong> um bom conselho, on<strong>de</strong> existam<br />
pessoas que possam ajudar a <strong>de</strong>senvolver<br />
ações que conduzam a uma melhor<br />
resolutivida<strong>de</strong> dos esforços. Isso também<br />
gera economia <strong>de</strong> recursos e estimula a<br />
participação da comunida<strong>de</strong> no processo.<br />
Com certeza, essa é a melhor maneira <strong>de</strong><br />
fazer com que os lí<strong>de</strong>res comunitários<br />
aju<strong>de</strong>m a estimular cada índio a se<br />
tornar um agente <strong>de</strong> promoção <strong>de</strong> seu<br />
próprio bem-estar.<br />
O segundo passo é verificar como se<br />
po<strong>de</strong> fazer mais gastando menos, não<br />
<strong>de</strong>sperdiçando recursos humanos,<br />
materiais e financeiros. A preocupação<br />
<strong>de</strong>ve ser não ultrapassar o teto do dinheiro<br />
previsto. Em terceiro lugar, através dos<br />
indicadores do sistema <strong>de</strong> informação,<br />
verificar se a saú<strong>de</strong> está melhorando. Neste<br />
ponto, é fundamental saber os <strong>de</strong>sempenhos<br />
dos índices <strong>de</strong> mortalida<strong>de</strong><br />
materno-infantil, <strong>de</strong> <strong>de</strong>snutrição, <strong>de</strong><br />
cobertura vacinal, <strong>de</strong> doenças como<br />
diárreia, tuberculose, malária, <strong>de</strong>ngue,<br />
hanseníase, hepatite, sífilis, AIDS, e outras.<br />
Os povos indígenas e não-indígenas<br />
precisam ter uma atenção especial com<br />
respeito ao acesso, à qualida<strong>de</strong> e à<br />
humanização no atendimento nos postos<br />
<strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. Participar <strong>de</strong> encontros e<br />
seminários que discutem o assunto faz<br />
parte do processo <strong>de</strong> tomada <strong>de</strong><br />
consciência acerca dos direitos e <strong>de</strong>veres<br />
<strong>de</strong> todos nós, inclusive dos índios.<br />
Nestes tempos, em que o país assiste a<br />
implantação <strong>de</strong> um novo mo<strong>de</strong>lo<br />
especialmente direcionado para os povos<br />
das florestas, é fundamental acompanhar<br />
os <strong>de</strong>sdobramentos que vêm pela frente.<br />
Aliás, este será um dos motes da III<br />
Conferência <strong>Nacional</strong> <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong><br />
Indígena, prevista para acontecer no<br />
primeiro semestre <strong>de</strong> 2001, em Luziânia,<br />
interior <strong>de</strong> Goiás.<br />
Será a hora dos lí<strong>de</strong>res das nações e<br />
povos indígenas falarem sobre seus<br />
problemas, apresentarem suas reinvindicações<br />
e comemorarem as conquistas<br />
dos últimos tempos. O êxito <strong>de</strong> todos<br />
nós, brasileiros, será <strong>de</strong>monstrar mais<br />
uma vez a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> convivência<br />
harmônica entre as culturas urbanas e<br />
indígenas, sempre se preocupando em<br />
preservar as tradições que atravessaram<br />
os séculos.<br />
* Coor<strong>de</strong>nadora da Comissão Inter-setorial da<br />
Saú<strong>de</strong> Indígena do <strong>Conselho</strong> <strong>Nacional</strong> <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong>,<br />
Representante titular da CNBB no <strong>Conselho</strong><br />
<strong>Nacional</strong> <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong>, Fundadora e Coor<strong>de</strong>nadora<br />
<strong>Nacional</strong> da Pastoral da Criança e Membro do<br />
<strong>Conselho</strong> do Comunida<strong>de</strong> Solidária<br />
42