Retalho ascendente de trapézio: relato de caso - ABCCMF
Retalho ascendente de trapézio: relato de caso - ABCCMF
Retalho ascendente de trapézio: relato de caso - ABCCMF
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
<strong>Retalho</strong> <strong>ascen<strong>de</strong>nte</strong> <strong>de</strong> trapézio: <strong>relato</strong> <strong>de</strong> <strong>caso</strong><br />
RELATO DE CASO<br />
<strong>Retalho</strong> <strong>ascen<strong>de</strong>nte</strong> <strong>de</strong> trapézio: <strong>relato</strong> <strong>de</strong> <strong>caso</strong><br />
Ascen<strong>de</strong>nt trapezius flap: case report<br />
Roberto Junqueira Polizzi 1 , Sérgio Moreira da Costa 2 , José Maria Porcaro Salles 3 , Paulo Roberto da Costa 4 ,<br />
Alexandre <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> Sousa 5 , Jomar Rezen<strong>de</strong> Carvalho 6 , Guilherme <strong>de</strong> Souza Silva 7<br />
RESUMO<br />
Introdução: O retalho <strong>de</strong> músculo trapézio como<br />
<strong>de</strong>scrito por Demergasso e Baek apresentou altas taxas <strong>de</strong><br />
complicação, o que motivou seu abandono. A melhor compreensão<br />
da anatomia vascular da região dorsal possibilitou<br />
a realização <strong>de</strong> um retalho <strong>de</strong> músculo trapézio baseado no<br />
segmento <strong>ascen<strong>de</strong>nte</strong>, que permite a confecção <strong>de</strong> cobertura<br />
cutânea para diversos <strong>de</strong>feitos na região da cabeça e<br />
pescoço, com baixa morbida<strong>de</strong> da área doadora. Relato<br />
do Caso: Nesse artigo, relatamos o <strong>caso</strong> <strong>de</strong> um paciente<br />
do sexo masculino, 66 anos, submetido a transferência <strong>de</strong><br />
um retalho miocutâneo do segmento <strong>ascen<strong>de</strong>nte</strong> do trapézio<br />
para promover a cobertura <strong>de</strong> um <strong>de</strong>feito pós-ablativo<br />
em região craniofacial lateral. Conclusão: Queremos<br />
<strong>de</strong>monstrar a confiabilida<strong>de</strong> e aplicabilida<strong>de</strong> do uso do<br />
retalho <strong>ascen<strong>de</strong>nte</strong> do trapézio para cobertura <strong>de</strong> <strong>de</strong>feitos<br />
complexos em região craniofacial.<br />
Descritores: Procedimentos cirúrgicos reconstrutivos.<br />
<strong>Retalho</strong>s cirúrgicos. Cirurgia plástica/métodos. Neoplasias<br />
<strong>de</strong> cabeça e pescoço/cirurgia. Músculos do pescoço.<br />
abstract<br />
Introduction: The trapezius muscle flap as <strong>de</strong>scribed<br />
by Baek and Demergasso showed high complication rates,<br />
which caused its abandonment. A better un<strong>de</strong>rstanding of<br />
vascular anatomy of the dorsal region enabled the <strong>de</strong>velopment<br />
of a trapezius muscle flap based on the ascending<br />
segment, which allows the production of skin coverage for<br />
various <strong>de</strong>fects in the head and neck with low morbidity of<br />
the donor area. Case Report: In this paper, we report a<br />
case of a male patient, 66 years, who un<strong>de</strong>rwent a transfer<br />
of a flap of the ascending segment of the trapezius to<br />
promote coverage of a <strong>de</strong>fect in post-ablative craniofacial<br />
region. Conclusion: We <strong>de</strong>monstrate the reliability and<br />
applicability of the trapezius flap to cover complex <strong>de</strong>fects<br />
in the craniofacial region.<br />
Key words: Reconstructive surgical procedures. Surgical<br />
flaps. Surgery, plastic/methods. Head and neck neoplasms/<br />
surgery. Neck muscles.<br />
1. Membro Especialista da Socieda<strong>de</strong> Brasileira <strong>de</strong> Cirurgia Plástica<br />
(SBCP), Preceptor do Serviço <strong>de</strong> Cirurgia Plástica do Hospital das Clínicas<br />
da Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Minas Gerais (UFMG), Membro do Serviço <strong>de</strong><br />
Cirurgia <strong>de</strong> Cabeça e Pescoço do Instituto Alfa <strong>de</strong> Gastroenterologia (IAG)<br />
do Hospital das Clínicas da UFMG (HC/UFMG) – Belo Horizonte, MG.<br />
2. Professor da Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Medicina da UFMG, Membro titular fundador<br />
da Associação Brasileira <strong>de</strong> Cirurgia Crânio-Maxilo-Facial (<strong>ABCCMF</strong>),<br />
Membro Titular da SBCP, Coor<strong>de</strong>nador da Clínica <strong>de</strong> Cirurgia Plástica do<br />
Hospital Felício Rocho – Belo Horizonte, MG.<br />
3. Professor da Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Medicina da UFMG, Coor<strong>de</strong>nador do Grupo<br />
<strong>de</strong> Cirurgia <strong>de</strong> Cabeça e Pescoço do IAG do HC/UFMG, Membro da<br />
Socieda<strong>de</strong> Brasileira <strong>de</strong> Cirurgia <strong>de</strong> Cabeça e Pescoço.<br />
4. Membro titular da SBCP, Professor da Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Medicina da UFMG,<br />
Preceptor do Serviço <strong>de</strong> Cirurgia Plástica do Hospital das Clínicas da UFMG.<br />
5. Membro da Socieda<strong>de</strong> Brasileira <strong>de</strong> Cirurgia <strong>de</strong> Cabeça e Pescoço, Preceptor<br />
do Grupo <strong>de</strong> Cirurgia <strong>de</strong> Cabeça e Pescoço do IAG do HC/UFMG.<br />
6. Membro da Socieda<strong>de</strong> Brasileira <strong>de</strong> Cirurgia <strong>de</strong> Cabeça e Pescoço, Preceptor<br />
do Grupo <strong>de</strong> Cirurgia <strong>de</strong> Cabeça e Pescoço do IAG do HC/UFMG.<br />
7. Resi<strong>de</strong>nte do Grupo <strong>de</strong> Cirurgia <strong>de</strong> Cabeça e Pescoço do IAG do HC/<br />
UFMG.<br />
Correspondência: Roberto Junqueira Polizzi<br />
Rua Juvenal Melo Senra, 395/408 – Belve<strong>de</strong>re – Belo Horizonte, MG,<br />
Brasil – CEP 30320-660<br />
E-mail: robertopolizzi@yahoo.com<br />
Rev Bras Cir Craniomaxilofac 2010; 13(4): 259-62<br />
259
Polizzi RJ et al.<br />
INTRODUÇÃO<br />
Atualmente, a reconstrução complexa <strong>de</strong> cabeça e pescoço<br />
secundária à ablação <strong>de</strong> tumores ou traumas craniofaciais é<br />
realizada preferencialmente com a utilização <strong>de</strong> retalhos livres<br />
microvascularizados, uma vez que <strong>de</strong>terminam melhores<br />
resultados funcionais e estéticos 1 . Entretanto, existem situações<br />
que impe<strong>de</strong>m a utilização das opções microcirúrgicas,<br />
como em <strong>caso</strong> <strong>de</strong> perdas sequenciais múltiplas <strong>de</strong> retalhos<br />
livres, pacientes gravemente <strong>de</strong>bilitados e com curta expectativa<br />
<strong>de</strong> vida. Algumas opções <strong>de</strong> retalhos pediculados<br />
fornecem bons resultados, como os retalhos miocutâneos dos<br />
músculos peitoral maior e gran<strong>de</strong> dorsal.<br />
A utilização <strong>de</strong> retalho trapézio, como <strong>de</strong>scrito inicialmente<br />
por Demergasso & Piazza 2 e, posteriormente, por Baek<br />
et al. 3 , apresentou altas taxas <strong>de</strong> complicação nas reconstruções<br />
<strong>de</strong> cabeça e pescoço. Concomitantemente, diversas<br />
controvérsias relativas ao seu suprimento sanguíneo e as<br />
possíveis sequelas funcionais na área doadora <strong>de</strong>terminaram<br />
seu abandono como uma opção inicial.<br />
Entretanto, a melhor compreensão da vascularização<br />
cutânea obtida com o <strong>de</strong>senvolvimento dos retalhos perfurantes<br />
e <strong>de</strong> estudos anatômicos da região do dorso tornou a<br />
utilização <strong>de</strong>ste retalho mais confiável.<br />
O objetivo <strong>de</strong>ste artigo é relatar um <strong>caso</strong> <strong>de</strong> utilização do<br />
retalho miocutâneo da parte <strong>ascen<strong>de</strong>nte</strong> do músculo trapézio.<br />
Anatomia<br />
O músculo trapézio é um músculo superficial <strong>de</strong> formato<br />
triangular que se esten<strong>de</strong> da linha nucal até o processo espinhoso<br />
<strong>de</strong> T12. Fixa-se na escápula, clavícula e acrômio. É<br />
dividido em três segmentos:<br />
• <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>nte ou superior: surge no ligamento nucal e<br />
processos espinhosos das vértebras cervicais até C7 e se<br />
insere no terço lateral da clavícula. Sua irrigação é predominantemente<br />
proveniente <strong>de</strong> ramos da artéria occipital;<br />
• transverso ou médio: surge nos processos espinhosos <strong>de</strong> T1<br />
a T5 e se insere no acrômio. A artéria cervical superficial<br />
(ramo superficial da artéria cervical transversa) é a principal<br />
fonte <strong>de</strong> irrigação arterial. Encontra-se superficialmente aos<br />
músculos romboi<strong>de</strong>s e levantador da escápula. É acompanhado<br />
pelo nervo espinhal acessório.<br />
• <strong>ascen<strong>de</strong>nte</strong> ou inferior: surge nos processos espinhosos <strong>de</strong><br />
T6 a T12 e se insere na espinha da escápula. É irrigado<br />
pela artéria escapular dorsal (ramo profundo da artéria<br />
cervical transversa), a qual se encontra profundamente<br />
aos músculos rombói<strong>de</strong> menor e levantador da escápula.<br />
Participa ativamente da elevação e estabilização do ombro,<br />
seja pela sua ação direta ou indireta na mobilização da articulação<br />
gleno-humeral e da escápula.<br />
O conhecimento anatômico <strong>de</strong> outros músculos também é<br />
fundamental para a correta confecção do retalho <strong>de</strong> trapézio.<br />
Os músculos romboi<strong>de</strong>s maior e menor surgem, respectivamente,<br />
nos processos espinhosos entre T1-T4 e C6-C7 e se<br />
inserem na margem medial da escápula. Atuam na elevação e<br />
retração da escápula. São um importante referencial, uma vez<br />
que a irrigação arterial do segmento <strong>ascen<strong>de</strong>nte</strong> ou inferior do<br />
músculo trapézio atravessa por entre os mesmos para atingir<br />
o músculo trapézio e a pele adjacente.<br />
O músculo levantador da escápula surge dos processos<br />
transversos das vértebras <strong>de</strong> C1 a C4 e se insere no ângulo<br />
superior da escápula. Age na elevação da escápula.<br />
O retalho do segmento <strong>ascen<strong>de</strong>nte</strong> ou inferior do músculo<br />
trapézio baseia-se na irrigação miocutânea local proveniente<br />
<strong>de</strong> ramos da artéria escapular dorsal.<br />
A marcação da ilha cutânea <strong>de</strong>ve ser realizada em posição<br />
ortostática. A marcação concomitante das referências anatômicas<br />
locais (musculatura romboi<strong>de</strong> e escápula) facilita a<br />
correta <strong>de</strong>limitação da ilha <strong>de</strong> pele. Deve-se respeitar o limite<br />
inferior <strong>de</strong> 10 cm do ângulo inferior da escápula. Pelo menos<br />
um terço da ilha cutânea <strong>de</strong>ve sobrepor o músculo trapézio.<br />
O pivot <strong>de</strong> rotação do retalho encontra-se entre os músculos<br />
romboi<strong>de</strong> maior e menor.<br />
RELATO DO CASO<br />
Paciente J.C.A., gênero masculino, leuco<strong>de</strong>rma, 66 anos<br />
<strong>de</strong> ida<strong>de</strong>, compareceu ao ambulatório <strong>de</strong> Cirurgia <strong>de</strong> Cabeça<br />
e Pescoço do Instituto Alfa <strong>de</strong> Gastroenterologia do Hospital<br />
das Clínicas da Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Minas Gerais,<br />
queixando-se <strong>de</strong> múltiplas lesões <strong>de</strong> pele em face e tronco, as<br />
quais apresentaram crescimento progressivo e assintomático.<br />
Ao exame físico, observava-se, além <strong>de</strong> lesões pequenas<br />
em dorso nasal e tronco, uma extensa lesão úlcero-infiltrativa<br />
em pavilhão auricular direito com extensão a pele retroaural,<br />
sem linfoa<strong>de</strong>nopatia regional associada. Foi realizada biopsia<br />
incisional das lesões que diagnosticaram Carcinoma basoespinocelular.<br />
Optou-se, portanto, pela ressecção local com<br />
reconstrução imediata.<br />
Em <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 2009, o paciente foi submetido a<br />
ressecção oncológica e, <strong>de</strong>vido à i<strong>de</strong>ntificação per-operatória<br />
<strong>de</strong> extensa coleção purulenta local retrotumoral, optou-se pela<br />
reconstrução tardia da área cruenta residual. No pós-operatório,<br />
foi realizada antibioticoterapia com ciprofloxacina e<br />
metronidazol e cuidados locais com curativos diários <strong>de</strong> sulfadiazina<br />
<strong>de</strong> prata 1%. No sétimo dia <strong>de</strong> pós-operatório, com<br />
a melhora das condições locais, foi indicada a reconstrução<br />
com retalho miocutâneo <strong>de</strong> músculo trapézio para cobertura<br />
<strong>de</strong> extensa área cruenta (14x11 cm), com exposição óssea em<br />
região craniofacial lateral direita (Figura 1).<br />
O procedimento cirúrgico foi realizado com o paciente<br />
em <strong>de</strong>cúbito lateral esquerdo. Realizou-se previamente a<br />
marcação <strong>de</strong> uma ilha cutânea em região dorsal <strong>de</strong> 14 x 11<br />
cm, com limite inferior da marcação sendo 10 cm do ângulo<br />
inferior da escápula (Figura 2). O pivot <strong>de</strong> rotação do retalho<br />
encontra-se entre os músculos romboi<strong>de</strong> maior e menor. Não<br />
foi realizada previamente a i<strong>de</strong>ntificação <strong>de</strong> vasos perfurantes<br />
para a ilha cutânea com uso <strong>de</strong> doppler vascular.<br />
Iniciou-se o procedimento com incisão circunferencial<br />
na ilha <strong>de</strong> pele com i<strong>de</strong>ntificação da fáscia sobre o músculo<br />
gran<strong>de</strong> dorsal, do vaso perfurante da artéria escapular<br />
dorsal (penetrando na margem superior do retalho cutâneo).<br />
Proce<strong>de</strong>u-se ao <strong>de</strong>scolamento subfascial do retalho em sentido<br />
caudal-cranial, com i<strong>de</strong>ntificação <strong>de</strong> músculo trapézio no terço<br />
proximal da ilha cutânea. Associou-se uma incisão cutânea<br />
longitudinal em direção ao pivot <strong>de</strong> rotação do retalho,<br />
seguida <strong>de</strong> <strong>de</strong>scolamento cutâneo local, visando à exposição<br />
da musculatura dorsal e do ramo para o músculo trapézio da<br />
Rev Bras Cir Craniomaxilofac 2010; 13(4): 259-62<br />
260
<strong>Retalho</strong> <strong>ascen<strong>de</strong>nte</strong> <strong>de</strong> trapézio: <strong>relato</strong> <strong>de</strong> <strong>caso</strong><br />
artéria escapular dorsal. Confeccionou-se o retalho contendo<br />
uma pequena extensão da porção <strong>ascen<strong>de</strong>nte</strong> do músculo<br />
trapézio, contendo o ramo muscular e septocutâneo da artéria<br />
escapular dorsal, até o pivot <strong>de</strong> rotação do mesmo (Figura 3).<br />
Com o intuito <strong>de</strong> transferir o retalho para a área receptora,<br />
foi realizado um túnel subcutâneo na região dorsal supraescapular,<br />
com aproximadamente 6 cm <strong>de</strong> largura.<br />
Após a revitalização da área receptora, o retalho miocutâneo<br />
trapézio foi suturado utilizando-se, concomitantemente,<br />
pontos <strong>de</strong> ancoragem na fáscia temporal profunda e SMAS.<br />
A área doadora foi aproximada parcialmente com um extenso<br />
<strong>de</strong>scolamento cutâneo, e <strong>de</strong>vido à posição dorsocaudal optouse<br />
pela cicatrização por segunda intenção. Drenos <strong>de</strong> sucção<br />
a vácuo foram posicionados da área receptora.<br />
Orientou-se o paciente a evitar <strong>de</strong>cúbito dorsal e lateral<br />
direito durante 10 dias. No pós-operatório, não se evi<strong>de</strong>nciou<br />
sofrimento vascular do retalho, embora tenha sido i<strong>de</strong>ntificada<br />
uma coleção purulenta local com pequena <strong>de</strong>iscência <strong>de</strong> pele<br />
em ponto <strong>de</strong> drenagem, a qual teve resolução a<strong>de</strong>quada com<br />
antibioticoterapia e cuidados locais (Figura 4).<br />
Não houve limitação ao exame clínico, realizado em<br />
acompanhamento pós-operatório, dos movimentos <strong>de</strong> retração<br />
e estabilização da escápula. Manteve-se a elevação do ombro<br />
ipsilateral inalterada.<br />
Figura 2 - Marcação do retalho <strong>ascen<strong>de</strong>nte</strong> <strong>de</strong> trapézio.<br />
Figura 3 - Confecção do retalho.<br />
DISCUSSÃO<br />
O conhecimento das mais variadas opções reconstrutivas<br />
é fundamental para cirurgiões plásticos envolvidos em<br />
reconstruções <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> complexida<strong>de</strong>. Embora a técnica<br />
microcirúrgica ofereça um gran<strong>de</strong> leque <strong>de</strong> opções para resolução<br />
<strong>de</strong> uma sequela ablativa ou traumática, ocasionamente,<br />
<strong>de</strong>paramos-nos com situações que necessitam da utilização<br />
<strong>de</strong> métodos convencionais.<br />
O retalho <strong>de</strong> trapézio, como <strong>de</strong>scrito por Demergasso<br />
& Piazza 2 e Baek et al. 3 , possibilitou, principalmente, a<br />
confecção <strong>de</strong> cobertura cutânea na região da cabeça e pescoço.<br />
Entretanto, a falta <strong>de</strong> conhecimento anatômico vascular da<br />
região conduziu a um número elevado <strong>de</strong> <strong>relato</strong>s <strong>de</strong> insucessos<br />
com a utilização <strong>de</strong>sse retalho.<br />
Figura 1 - Extensa área cruenta craniofacial lateral com<br />
exposição <strong>de</strong> calota craniana.<br />
Figura 4 - Pós-operatório <strong>de</strong> rotação <strong>de</strong> retalho<br />
<strong>ascen<strong>de</strong>nte</strong> <strong>de</strong> trapézio.<br />
Rev Bras Cir Craniomaxilofac 2010; 13(4): 259-62<br />
261
Polizzi RJ et al.<br />
Somente após estudos da vascularização cutânea realizados<br />
por Taylor & Palmer 4 , e <strong>de</strong> estudos anátomo-clínicos<br />
da região dorsal conduzidos por Weiglen et al. 5 , Haas et<br />
al. 6 , e Tan & Tan 7 , é que se po<strong>de</strong> <strong>de</strong>finir a confiabilida<strong>de</strong> do<br />
retalho da parte <strong>ascen<strong>de</strong>nte</strong> do músculo trapézio (enten<strong>de</strong>-se<br />
como confiabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um retalho a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> produzir<br />
uma cobertura estável <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>terminada ferida <strong>de</strong>vido à<br />
facilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> confecção, promover a substituição por tecidos<br />
semelhantes e ter uma fácil reprodutibilida<strong>de</strong>). Compreen<strong>de</strong>use<br />
a importância da artéria escapular dorsal na irrigação da<br />
parte inferior do músculo trapézio e da pele adjacente, bem<br />
como se <strong>de</strong>finiu o seu trajeto usual. Verificou-se que, em 54%<br />
das dissecções anatômicas, a artéria escapular dorsal surgia em<br />
um tronco comum cervicodorsal (juntamente à artéria cervical<br />
superficial) ou em um tronco cervicodorsoescapular (com as<br />
artérias cervical superficial e supraescapular). Em 34% das<br />
vezes, surgia diretamente da artéria subclávia.<br />
Posteriormente, Angrigiani et al. 8 observaram a possibilida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> realização <strong>de</strong> um retalho perfurante da artéria<br />
escapular dorsal com a preservação do músculo trapézio, o<br />
que propiciaria menor morbida<strong>de</strong> na área doadora do retalho.<br />
Esses autores realizaram transferência <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s retalhos<br />
dorsais após expansão prévia. Alguns anos <strong>de</strong>pois, em 2006,<br />
Angrigiani 9 confirmou a possibilida<strong>de</strong>, já apresentada por<br />
Gregor & Davidge-Pitts 10 , <strong>de</strong> transferência associada <strong>de</strong> um<br />
segmento ósseo da margem medial da escápula baseado no<br />
ramo profundo da artéria escapular dorsal, com o objetivo <strong>de</strong><br />
reconstruir um segmento mandibular lateral.<br />
A partir <strong>de</strong>sses <strong>relato</strong>s iniciais, observou-se maior aceitação<br />
e difusão <strong>de</strong> da indicação <strong>de</strong>sse retalho. Ocorreu a<br />
reintegração do retalho <strong>ascen<strong>de</strong>nte</strong> do músculo trapézio no<br />
armamentário do cirurgião reconstrutor.<br />
Esse retalho é indicado principalmente para cobertura<br />
cutânea na região occipital, região lateral da face, região<br />
cervical anterior (até o mento), terço médio facial e região<br />
orbitária. Existem <strong>relato</strong>s da sua utilização para cobertura <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>feitos viscerais na região jugal, base <strong>de</strong> língua, hipofaringe<br />
e esôfago cervical 11 , sendo isso possível pelo incremento<br />
do tamanho do pedículo do retalho e arco <strong>de</strong> rotação ao se<br />
progredir na dissecção através dos músculos romboi<strong>de</strong> menor<br />
e levantador da escápula.<br />
Uma morbida<strong>de</strong> aceitável na área doadora do retalho<br />
ocorre, pois somente a parte inferior do músculo é atingida.<br />
O segmento transverso mantém parcialmente as funções <strong>de</strong><br />
retração e <strong>de</strong>pressão da escápula. Não há prejuízo da elevação<br />
do ombro. O nervo espinhal acessório não é sacrificado nessa<br />
opção <strong>de</strong> retalho, como po<strong>de</strong> ocorrer quando é realizado um<br />
retalho da parte transversa <strong>de</strong>sse músculo.<br />
Uma <strong>de</strong>svantagem <strong>de</strong> sua realização é a escassez <strong>de</strong> vasos<br />
perfurantes e o calibre reduzido dos mesmos, o que dificulta<br />
a realização <strong>de</strong> retalhos perfurantes e a elevação <strong>de</strong> ilhas <strong>de</strong><br />
pele distais.<br />
CONCLUSÃO<br />
O retalho <strong>ascen<strong>de</strong>nte</strong> <strong>de</strong> trapézio é uma boa opção para<br />
reconstruções complexas na região da cabeça e pescoço, principalmente<br />
para pacientes sem condições <strong>de</strong> serem submetidos<br />
a reconstruções microcirúrgicas. Ele permite a confecção <strong>de</strong><br />
coberturas cutâneas e revestimentos viscerais, com baixa<br />
morbida<strong>de</strong> na área doadora e com boa confiabilida<strong>de</strong>.<br />
REFERÊNCIAS<br />
1. Disa JJ, Pusic AL, Hidalgo DH, Cor<strong>de</strong>iro PG. Simplifying microvascular<br />
head and neck reconstruction: a rational approach to donor<br />
site selection. Ann Plast Surg. 2001;47(4):385-9.<br />
2. Demergasso F, Piazza MV. Trapezius myocutaneous flap in reconstructive<br />
surgery for head, and neck cancer: an original technique.<br />
Am J Surg. 1979;138(4):533-6.<br />
3. Baek SM, Biller HF, Krespi YP, Lawson W. The lower trapezius<br />
island myocutaneous flap. Ann Plast Surg. 1980;5(2):108-14.<br />
4. Taylor GI, Palmer JH. The vascular territories (angiosomes) of the<br />
body: experimental study and clinical applications. Br J Plast Surg.<br />
1987;40(2):113-41.<br />
5. Weiglein AH, Haas P, Pierer G. Anatomic basis of the lower trapezius<br />
musculocutaneous flap. Surg Radiol Anat. 1996;18(4):257-61.<br />
6. Haas F, Pierer G, Weiglein A, Moshammer H, Schwarzl F, Scharnagl<br />
E. Der untere M. trapezius-Insellappen: anatomische grundlage und<br />
klinische relevanz. Handchir Mikrochir Plast Chir. 1999;31(1):15-<br />
20.<br />
7. Tan KC, Tan BK. Exten<strong>de</strong>d lower trapezius island myocutaneous<br />
flap: a fasciomyocutaneous flap based on the dorsal scapular artery.<br />
Plast Reconstr Surg. 2000;105(5):1758-63.<br />
8. Angrigiani C, Grilli D, Karanas YL, Longaker MT, Sharma S. The<br />
dorsal scapular island flap: an alternative for head, neck, and chest<br />
reconstruction. Plast Reconstr Surg. 2003;111(1):67-78.<br />
9. Angrigiani C. Dorsal scapular artery perforator flap. In: Blon<strong>de</strong>el PN,<br />
Morris SF, Hallock GG, Neligan PC, eds. Perforator flaps: anatomy,<br />
technique & clinical applications.1 st ed. St. Louis:Quality;2006.<br />
p.461-70.<br />
10. Gregor RT, Davidge-Pitts KJ. Trapezius osteomyocutaneous flap for<br />
mandibular reconstruction. Arch Otolaryngol. 1985;111(3):198-<br />
203.<br />
11. Haas F, Weiglein A. Trapezius flap. In: Wei FC, Mardini S, eds.<br />
Flaps and reconstructive surgery. 1 st ed. Phila<strong>de</strong>lphia: Saun<strong>de</strong>rs<br />
Elsevier;2009. p.249-69.<br />
Trabalho realizado no Hospital das Clínicas da Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Minas Gerais, Belo Horizonte, MG, Brasil.<br />
Artigo recebido: 15/5/2010<br />
Artigo aceito: 11/8/2010<br />
Rev Bras Cir Craniomaxilofac 2010; 13(4): 259-62<br />
262