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O Uso das Narrativas como Fonte de Conhecimento em Enfermagem

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O <strong>Uso</strong> <strong>das</strong> <strong>Narrativas</strong> <strong>como</strong> <strong>Fonte</strong> <strong>de</strong> <strong>Conhecimento</strong> <strong>em</strong>Enfermag<strong>em</strong>Olga Ordaz. MSc, RN, Doutoranda, Professora Coor<strong>de</strong>nadora, Escola Superior <strong>de</strong> Enfermag<strong>em</strong> <strong>de</strong>LisboaA narrativa t<strong>em</strong> sido utilizada por vários investigadores <strong>como</strong> forma privilegiada <strong>de</strong> acesso àexperiência vivida <strong>em</strong> enfermag<strong>em</strong>. No entanto, num trabalho mais aprofundado sobre este conceito,encontramo-nos com a sua natureza polissémica e as várias dimensões <strong>em</strong> que se mobiliza: <strong>como</strong> forma<strong>de</strong> pensar, <strong>como</strong> método <strong>de</strong> pesquisa e análise <strong>de</strong> dados, <strong>como</strong> processo cognitivo e afectivo. A riquezaque subjaz aos mundos a que permite ace<strong>de</strong>r, transformam-na numa ferramenta particularmente a<strong>de</strong>quadapara o estudo da prática <strong>de</strong> enfermag<strong>em</strong> e dos seus múltiplos quotidianos, recheados <strong>de</strong> pequenas gran<strong>de</strong>sestórias que só a voz dos protagonistas permite <strong>de</strong>socultar. Procuramos evidência científica <strong>de</strong> que essasestórias, partilha<strong>das</strong> <strong>em</strong> narrativas, não só permit<strong>em</strong> o acesso à experiência vivida, <strong>como</strong> são <strong>em</strong> si mesmoprodutoras <strong>de</strong> sentidos e saberes, s<strong>em</strong> os quais nunca po<strong>de</strong>r<strong>em</strong>os compreen<strong>de</strong>r aspectos essenciais danatureza da enfermag<strong>em</strong>, quer <strong>como</strong> disciplina quer <strong>como</strong> profissão. Nesse sentido, o objectivo <strong>de</strong>starevisão sist<strong>em</strong>ática da literatura é o <strong>de</strong> conhecer o estado da arte acerca da reflexão sobre a importância<strong>das</strong> narrativas no processo <strong>de</strong> construção <strong>de</strong> conhecimento <strong>em</strong> enfermag<strong>em</strong>, a partir da experiência vividados enfermeiros. Foram incluídos 9 estudos, publicados entre 2000 e 2010, pesquisados a partir <strong>de</strong>bases <strong>de</strong> dados electrónicas, que part<strong>em</strong> <strong>das</strong> narrativas dos enfermeiros para ace<strong>de</strong>r à sua experiênciavivida <strong>em</strong> contextos <strong>de</strong> cuidar. Os resultados suger<strong>em</strong> que existe uma gran<strong>de</strong> diversida<strong>de</strong> na utilização<strong>das</strong> narrativas e que a sua abordag<strong>em</strong> envolve várias dimensões, sendo comum o propósito <strong>de</strong> <strong>de</strong>socultarsentidos e saberes oriundos da experiência vivida. Na diversida<strong>de</strong> dos achados encontra-se evidênciaque r<strong>em</strong>ete para vários tipos <strong>de</strong> conhecimento <strong>em</strong> enfermag<strong>em</strong>, nomeadamente pessoal, estético e ético.Palavras-chave: enfermeiros; experiência vivida; narrativa; sentidos <strong>em</strong> enfermag<strong>em</strong>; saberes <strong>em</strong>enfermag<strong>em</strong>; conhecimento <strong>em</strong> enfermag<strong>em</strong>The narrative has been used by various researchers, as a form of privileged access to experience innursing. However, when we take a more <strong>de</strong>tailed look at this concept, we find its polys<strong>em</strong>ic nature and thevarious dimensions in which it is mobilized: a way of thinking, a method of researching and of analyzing data,a cognitive and affective process. The wealth that it provi<strong>de</strong>s to the worlds that it allows to access, makes it anespecially suitable tool for the study of nursing practice and its varied day-to-day, filled with great little storiesthat only the voice of the protagonists allows to uncover. We look for scientific evi<strong>de</strong>nce that these stories,shared through narrative, don’t only allow access to lived experience, but in th<strong>em</strong>selves produce meaningand knowledge, without which we can never un<strong>de</strong>rstand the key aspects of the nature of nursing, both asa discipline and as profession. In this sense, the purpose of this syst<strong>em</strong>atic review is to uncover the state ofthe art on the significance of narrative in the construction of nursing knowledge from the lived experience ofnurses. We inclu<strong>de</strong>d nine studies published between 2000 and 2010, retrieved from electronic databases,based on the narratives of nurses in or<strong>de</strong>r to access their lived experience in the context of care. The resultssuggest that there is great diversity in the use of narratives and that this approach involves several dimensions,with the purpose of uncovering common sense and knowledge <strong>de</strong>rived from experience. In the diversity offindings we encounter various types of knowledge about nursing, namely personal, aesthetic and ethic.Keywords: nurses; narratives; lived experience; nursing meanings; nursing knowing; nursingknowledge70Pensar Enfermag<strong>em</strong> Vol. 15 N.º 1 1º S<strong>em</strong>estre <strong>de</strong> 2011


IntroduçãoA activida<strong>de</strong> humana está associada ao encantamento <strong>de</strong> contar estórias. Des<strong>de</strong>a infância, as estórias que ouvimos e contamos situam-nos no mundo <strong>em</strong> que viv<strong>em</strong>os,dão-lhe sentido, valor, e transformam-no à medida que nos transformamos. As estórias dopresente e do passado são uma forma <strong>de</strong> diminuir as distâncias entre lugares e pessoas,dando um sentido colectivo ao que faz<strong>em</strong>os e somos. Estruturamos a experiência e am<strong>em</strong>ória e projectamo-nos no futuro através da narrativa, e o conhecimento que daíresulta é transmitido num processo intersubjectivo, no qual tanto o narrador <strong>como</strong> oinvestigador participam (Skott, 2001). Uma estória fala-nos <strong>de</strong> um t<strong>em</strong>po, <strong>de</strong> um espaçoe <strong>de</strong> uma qualquer experiência. San<strong>de</strong>lowski (1991) <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> que a narrativa se constituiu<strong>como</strong> uma ferramenta <strong>de</strong> acesso privilegiado à experiência humanaO <strong>Uso</strong> <strong>das</strong><strong>Narrativas</strong><strong>como</strong> <strong>Fonte</strong> <strong>de</strong><strong>Conhecimento</strong> <strong>em</strong>Enfermag<strong>em</strong>“Narratives are un<strong>de</strong>rstood as stories that inclu<strong>de</strong> a t<strong>em</strong>poral or<strong>de</strong>ring of events and an effort to makesomething out of those events: to ren<strong>de</strong>r, or to signify, the experiences of persons-in-flux in a personally andculturally coherent, plausible manner” (p.162).Este autor salienta o seu valor heurístico na medida <strong>em</strong> que permite estabelecerrelações frutuosas entre as ciências, a história, a literatura e a nossa vida. Se perdêss<strong>em</strong>osa inteligência narrativa, essa capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> articular presente, passado e futuro,per<strong>de</strong>ríamos a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> projectar.Nas últimas déca<strong>das</strong>, vários autores têm vindo a reconhecer a importância <strong>das</strong>estórias <strong>de</strong> enfermag<strong>em</strong> <strong>como</strong> um meio para a compreensão da prática e <strong>como</strong> processo<strong>de</strong> construção, conservação e difusão do conhecimento <strong>em</strong> enfermag<strong>em</strong> (Boykin eSchoenhofer, 1991). Não há nenhum enfermeiro que não tenha várias estórias paracontar. Elas brotam do turbilhão da sua experiência e <strong>das</strong> suas m<strong>em</strong>órias alimentandoa sua forma <strong>de</strong> ser e estar. São habitualmente estórias intensas que, por uma ou outrarazão, contribuíram para que alguma coisa se modificasse nos protagonistas. Por isso sãorelevantes. Por isso m<strong>em</strong>oráveis.O quotidiano dos enfermeiros é feito <strong>de</strong> encontros. Encontros que têm a exactaparticularida<strong>de</strong> <strong>de</strong> não ser casuais e residir<strong>em</strong> numa intenção expressa <strong>de</strong> contribuirpara o alívio do sofrimento, para a procura do equilíbrio e a busca do b<strong>em</strong>-estar. É porisso um quotidiano feito <strong>de</strong> histórias que se cruzam, se confrontam, se <strong>de</strong>frontam,se completam, se repet<strong>em</strong> e por vezes, se confun<strong>de</strong>m. Gaydos (2005) salienta que ateoria <strong>de</strong> enfermag<strong>em</strong> <strong>de</strong>fendida por Watson fornece uma ferramenta importante paracompreen<strong>de</strong>r a importância <strong>das</strong> narrativas na prática <strong>de</strong> cuidar, pois centra-se no encontroentre o enfermeiro e o paciente cuja intersubjectivida<strong>de</strong> contém as suas histórias <strong>de</strong> vida,que cada um <strong>de</strong>les mobiliza e partilha na forma <strong>de</strong> uma narrativa pessoal e transformadorada experiência “The narrator and the listener co-create meaning in personal narratives”(p.257). A narrativa pessoal é um modo autobiográfico <strong>de</strong> contar estórias que dá forma àexperiência e on<strong>de</strong> o papel da m<strong>em</strong>ória e <strong>das</strong> metáforas na criação <strong>de</strong> significados precisa<strong>de</strong> ser mais explorado (Gaydos, 2005).A procura <strong>de</strong> encontro com o outro é tecida <strong>de</strong> pequenas coisas. Pequenascoisas a que a experiência vai trazendo sentidos que permit<strong>em</strong> ir mais além, primeirointuitivamente e a pouco e pouco com o reconhecimento <strong>de</strong> um saber pericial que se foiadquirindo, do qual é ex<strong>em</strong>plo o trabalho s<strong>em</strong>inal <strong>de</strong> Benner (1995).Pensar Enfermag<strong>em</strong> Vol. 15 N.º 1 1º S<strong>em</strong>estre <strong>de</strong> 201171


out in all spheres of life including the sphere of care” (p.253).Apesar <strong>de</strong> o conhecimento narrativo ser um campo <strong>em</strong> <strong>de</strong>senvolvimento nasciências sociais ele t<strong>em</strong> sido sist<strong>em</strong>aticamente <strong>de</strong>svalorizado, <strong>em</strong> prol do conhecimentopragmático, capaz <strong>de</strong> produzir relações explicativas e conduzir a uma evidência científicaque sustente a prática (Bruner, 1986; 2004). No entanto, numa área tão sensível aoscuidados <strong>de</strong> enfermag<strong>em</strong> <strong>como</strong> a expressão do sofrimento <strong>das</strong> pessoas nas suasmúltiplas formas, e a proximida<strong>de</strong> <strong>de</strong>spojada <strong>de</strong> qu<strong>em</strong> necessita <strong>de</strong> ajuda para satisfazeras necessida<strong>de</strong>s mais básicas, é por <strong>de</strong>mais evi<strong>de</strong>nte a importância do conhecimentonarrativo para a compreensão da natureza e da especificida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sses mesmos cuidados edo trabalho <strong>em</strong>ocional que a eles se associa.O <strong>Uso</strong> <strong>das</strong><strong>Narrativas</strong><strong>como</strong> <strong>Fonte</strong> <strong>de</strong><strong>Conhecimento</strong> <strong>em</strong>Enfermag<strong>em</strong>Numa praxis recheada <strong>de</strong> momentos irrepetíveis, on<strong>de</strong> se expressa subtilmentea arte do encontro que conforta e traz ajuda, dar a palavra ao vivido através danarrativa é seguramente uma fonte inexplorada <strong>de</strong> conhecimento fundamental para o<strong>de</strong>senvolvimento da profissão e da disciplina <strong>de</strong> enfermag<strong>em</strong>.Esta preocupação enquadra-se num projecto <strong>de</strong> investigação on<strong>de</strong> se preten<strong>de</strong>compreen<strong>de</strong>r os sentidos e saberes que <strong>em</strong>erg<strong>em</strong> <strong>das</strong> narrativas sobre a experiência vivida<strong>de</strong> enfermeiros consi<strong>de</strong>rados <strong>como</strong> referência pelos seus pares, num <strong>de</strong>terminado períodohistórico e social particularmente rico na socieda<strong>de</strong> portuguesa e na profissão (anos 60a 80), com o objectivo <strong>de</strong> conhecer o seu contributo para a construção <strong>de</strong> conhecimento<strong>em</strong> enfermag<strong>em</strong>. Para dar corpo a este propósito torna-se imprescindível questionar<strong>em</strong>-seos pressupostos <strong>de</strong> partida que configuram a narrativa <strong>como</strong> uma fonte <strong>de</strong> produção <strong>de</strong>significados e saberes e procurar evidência <strong>em</strong>pírica que os sustente.Esta revisão <strong>de</strong> literatura t<strong>em</strong> pois <strong>como</strong> objectivo conhecer a evidência científicano que se refere ao papel da narrativa sobre a experiência vivida dos enfermeiros noprocesso <strong>de</strong> produção <strong>de</strong> sentidos e na construção do conhecimento <strong>em</strong> enfermag<strong>em</strong> nassuas várias dimensões.Para lhe dar resposta formularam-se as seguintes questões:Qual o conhecimento actual sobre o uso <strong>das</strong> narrativas <strong>como</strong> forma <strong>de</strong> ace<strong>de</strong>r àexperiência vivida dos enfermeiros?Que tipo <strong>de</strong> conhecimentos <strong>em</strong>erge <strong>das</strong> narrativas sobre a experiência vivida nosmúltiplos contextos da prática <strong>de</strong> enfermag<strong>em</strong>?Iniciámos uma longa revisão <strong>de</strong> literatura sobre esta t<strong>em</strong>ática, com as principaispalavras chave, quer <strong>em</strong> bases <strong>de</strong> dados on-line, manuais ou literatura cinzenta everificámos que é muito vasta a produção científica abarcando as mais varia<strong>das</strong> áreas <strong>em</strong>que a complexida<strong>de</strong> do Hom<strong>em</strong> é estudada, da filosofia, à literatura, passando pelas ciênciassociais e do comportamento, pelas ciências da saú<strong>de</strong> e pelas artes. Sobretudo o encontrocom alguns filósofos que se <strong>de</strong>têm na arte da interpretação e da palavra, permitiram-nosperceber o quão vasta e polissémica é a área <strong>em</strong> estudo, e o quão fascinante e íngr<strong>em</strong>e aescalada. Numa segunda fase, no sentido <strong>de</strong> <strong>de</strong>limitar e i<strong>de</strong>ntificar os artigos que melhorrespondiam ás questões formula<strong>das</strong>, realizámos uma revisão sist<strong>em</strong>ática da literatura, cujoprocesso <strong>de</strong> pesquisa e análise <strong>de</strong> dados passamos apresentar.Pensar Enfermag<strong>em</strong> Vol. 15 N.º 1 1º S<strong>em</strong>estre <strong>de</strong> 201173


O <strong>Uso</strong> <strong>das</strong><strong>Narrativas</strong><strong>como</strong> <strong>Fonte</strong> <strong>de</strong><strong>Conhecimento</strong> <strong>em</strong>Enfermag<strong>em</strong>Estratégia <strong>de</strong> pesquisaA pesquisa foi realizada <strong>em</strong> Abril <strong>de</strong> 2010, <strong>em</strong> bases <strong>de</strong> dados electrónicas. Ostermos <strong>de</strong> busca resultaram duma pesquisa prévia, livre, <strong>em</strong> que se tentou apreen<strong>de</strong>r alógica com que as bases estavam organiza<strong>das</strong> b<strong>em</strong> <strong>como</strong> os respectivos <strong>de</strong>scritores, tendoconcluído pelos seguintes termos <strong>de</strong> busca: nursing, nurses, retired nurses, narratives, oralhistory, lived experience, life experience, nursing knowledge, nursing meaning, nursingknowing, operacionalizados através <strong>das</strong> expressões boleanas AND e OR, o que resultou naseguinte expressão <strong>de</strong> pesquisa: (nurs*) and (narrati* or oral history) or (lived experienceor life experience*) and (nurs* knowledg* or nurs* meaning* or nurs* knowing*).Foram consi<strong>de</strong>rados todos os artigos escritos <strong>em</strong> inglês, francês castelhano eportuguês, s<strong>em</strong> outras restrições à partida.Bases <strong>de</strong> dados pesquisa<strong>das</strong>:CINAHL with Full Text (161 resultados)MEDLINE with Full Text (155 resultados)Aca<strong>de</strong>mic Search Complete (64 resultados)Medicalatina (1 resultado)Nursing & Allied Health Source (34 resultados)Psychology and Behavioral Sciences Collection (79 resultados)Database of Abstracts of Reviews of Effects (0 resultados)ERIC (51 resultados)Fuente Académica (3 resultados)Library, Information Science & Technology Abstracts (11 resultados)E-JOURNALS (39 resultados)A pesquisa foi limitada aos campos major subject heading (CINAHL; MEDLINE),Subject Terms (Aca<strong>de</strong>mic Search Complete; Nursing & Allied Health Source), Abstract (Eric),Titulo (E-Journals). Nas restantes bases a pesquisa foi feita <strong>em</strong> <strong>de</strong>fault fields.Dos 598 artigos i<strong>de</strong>ntificados foram retirados os que estavam repetidos e lidos osresumos <strong>de</strong> forma a fazer uma primeira avaliação da sua pertinência face à questão a quenos propus<strong>em</strong>os respon<strong>de</strong>r e aos principais critérios <strong>de</strong> inclusão. Foram assim nesta faseexcluídos todos os artigos cujo t<strong>em</strong>a versava práticas pedagógicas ou a prática reflexiva <strong>em</strong>contexto <strong>de</strong> ensino aprendizag<strong>em</strong>, b<strong>em</strong> <strong>como</strong> narrativas <strong>de</strong> doentes, familiares ou outrosprofissionais. Todos os artigos consi<strong>de</strong>rados relevantes, potencialmente relevantes ou queofereciam dúvi<strong>das</strong>, num total <strong>de</strong> 70 artigos, foram lidos na íntegra com o objectivo <strong>de</strong>verificar o nível <strong>de</strong> cumprimento dos critérios <strong>de</strong> inclusão e exclusão.Critérios <strong>de</strong> Inclusão e <strong>de</strong> Exclusão dos estudosVerificou-se que alguns (17) artigos discutiam a narrativa numa perspectivafilosófica e epist<strong>em</strong>ológica, recorrendo ao pensamento e contributos <strong>de</strong> vários autores quese revelaram <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> interesse para a questão <strong>em</strong> estudo mas que não apresentavamtrabalho <strong>em</strong>pírico. Outros (16) centravam-se sobretudo no uso do método narrativo,<strong>de</strong>talhando procedimentos metodológicos, mas s<strong>em</strong> resultados que permitiss<strong>em</strong> esclarecera<strong>de</strong>quadamente as questões coloca<strong>das</strong>, ou eram reflexões (25) sobre a t<strong>em</strong>ática <strong>das</strong>narrativas com base <strong>em</strong> revisão <strong>de</strong> literatura mas que também não apresentavam trabalho<strong>em</strong>pírico. Dos restantes consi<strong>de</strong>rámos para análise os que foram publicados a partir74Pensar Enfermag<strong>em</strong> Vol. 15 N.º 1 1º S<strong>em</strong>estre <strong>de</strong> 2011


O <strong>Uso</strong> <strong>das</strong>QUADRO 3 - Síntese do Estudo 2<strong>Narrativas</strong><strong>como</strong> <strong>Fonte</strong> <strong>de</strong><strong>Conhecimento</strong> <strong>em</strong>Enfermag<strong>em</strong>Autor/Ano/TítuloObjectivosTipoParticipantesResultadosSharon S. Hudacek; 2008: Dimensions of caring. a qualitative analysis of nurses’ storiesDescrever as dimensões do cuidar e <strong>como</strong> se relacionam entre si. Clarificar a prática da enfermag<strong>em</strong><strong>como</strong> profissão.Descrever as práticas <strong>de</strong> cuidar <strong>das</strong> enfermeiras através da análise <strong>das</strong> suas estórias.Abordag<strong>em</strong> fenomenológica existencial.Na análise <strong>de</strong> dados foi utilizado o método fenomenológico, com os passos <strong>de</strong>scritos por Giorgi (1985)Foi pedido aos enfermeiros que <strong>de</strong>screvess<strong>em</strong> uma situação <strong>de</strong> cuidar que tivesse feito a diferençanas suas vi<strong>das</strong>.A questão estimulava os enfermeiros a reflectir num momento da sua vida profissional que ilustrasseuma prática <strong>de</strong> cuidar significativa.Foram convidados a participar aproximadamente 120.00 enfermeiros que trabalhavam na comunida<strong>de</strong>e que eram m<strong>em</strong>bros da socieda<strong>de</strong> internacional <strong>de</strong> enfermag<strong>em</strong> Sigma Theta Tau International,através <strong>de</strong> mail com informação e procedimentos. Foi ainda publicado um pedido para envio <strong>de</strong>estórias num jornal <strong>de</strong> enfermag<strong>em</strong> <strong>de</strong> circulação internacional. Foram recebi<strong>das</strong> 200 narrativas <strong>de</strong>enfermeiros dos Estado Unidos, Eslováquia, Tóquio¸ Tekrit, Argentina; Austrália e Cuba, que foramcolhi<strong>das</strong> durante um período <strong>de</strong> 12 meses. 25% <strong>das</strong> histórias eram provenientes <strong>de</strong> enfermeiros quecuidaram <strong>de</strong> doentes noutros países.Nas narrativas os enfermeiros revelam o significado pessoal <strong>de</strong> cuidar <strong>como</strong> “primary caregivers”. Osenfermeiros <strong>de</strong>screv<strong>em</strong> o que é a enfermag<strong>em</strong>, as várias dimensões que o cuidar envolve e o que éessencial e único na enfermag<strong>em</strong>. Reportam valores fortes e consistentes que guiam a sua prática eaos quais atribu<strong>em</strong> gran<strong>de</strong> significado pessoal. Emergiram <strong>das</strong> narrativas sete dimensões do cuidar.caring é o centro e o focus da prática <strong>de</strong> enfermag<strong>em</strong>.Compaixão é um achado universal neste estudo. Consubstancia-se numa preocupação <strong>em</strong>pática peloalívio do sofrimento <strong>das</strong> pessoas <strong>em</strong> piores condições.Espiritualida<strong>de</strong> - <strong>de</strong>stacam a importância do acompanhamento <strong>das</strong> necessida<strong>de</strong>s espirituais dosdoentes e a relevância da sua intervenção nesta área.Entrar na comunida<strong>de</strong> – promoção <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e ensino aos pacientes.Promover o conforto – o enfermeiro revela-se com uma test<strong>em</strong>unha privilegiada dos últimosmomentos dos doentes <strong>em</strong> fim <strong>de</strong> vida acompanhando-os nessa vivência única, promovendo oconforto e oferecendo a presença.Intervenção <strong>em</strong> crise – lidar com o inesperado, tomar <strong>de</strong>cisões rápi<strong>das</strong> e fundamenta<strong>das</strong> que salvamvi<strong>das</strong>, usar a intuição e o saber <strong>em</strong> situações complexas que exig<strong>em</strong> um gran<strong>de</strong> controlo <strong>das</strong> <strong>em</strong>oçõese uma gran<strong>de</strong> sensibilida<strong>de</strong>.Ir para além da distância – os enfermeiros salientam o investimento pessoal feito nos doentes e nassuas famílias no sentido <strong>de</strong> os ajudar nas suas dificulda<strong>de</strong>s. Refer<strong>em</strong> <strong>como</strong> prioritário o papel <strong>de</strong>advogado do doente, b<strong>em</strong> com o respeito pela sua individualida<strong>de</strong> e privacida<strong>de</strong>. A proximida<strong>de</strong> <strong>de</strong>certos doentes e o período longo <strong>em</strong> que cuidam <strong>de</strong>les fá-los sentir m<strong>em</strong>bros da família e partilharmomentos especiais.Estas dimensões guiam as práticas <strong>de</strong> enfermag<strong>em</strong> que se constro<strong>em</strong> <strong>de</strong> conhecimento científico,<strong>de</strong>cisão clínica e pensamento crítico. Esta investigação fornece evidência <strong>de</strong> <strong>como</strong> cuidam osenfermeiros e traz<strong>em</strong> insights sobre o lado <strong>em</strong>ocional da profissão. As estórias capturam exactamenteo que as enfermeiros faz<strong>em</strong>, permitindo conhecer melhor o significado do cuidar.QUADRO 4 - Síntese do Estudo 3Autor/Ano/TítuloObjectivosTipoParticipantesKirsti Torjuul; Ingunn Elstad; Venke Sorlie; 2007. Compassion and responsibility in surgical careCompreen<strong>de</strong>r a experiência vivida dos enfermeiros <strong>em</strong> situações eticamente difíceis num contexto <strong>de</strong>cuidados a doentes cirúrgicosEstudo compreensivo com uma abordag<strong>em</strong> fenomenológica e hermenêutica. Solicitou-se àsentrevista<strong>das</strong> que contass<strong>em</strong> uma ou mais situações vivi<strong>das</strong> <strong>em</strong> que tivess<strong>em</strong> sentido dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong>natureza ética. Não se <strong>de</strong>finiu o que se entendia por uma situação eticamente difícil para permitir quefoss<strong>em</strong> as entrevista<strong>das</strong> a <strong>de</strong>terminá-lo. O objectivo era obter narrativas o mais ricas possíveis s<strong>em</strong>interromper o seu curso n<strong>em</strong> a reflexão. Foram encoraja<strong>das</strong> a elaborar sobre as suas estórias, quereferiam pensamentos, sentimentos e acções.Amostra <strong>de</strong> conveniência <strong>de</strong> 10 enfermeiras <strong>de</strong>signa<strong>das</strong> pelos seus chefes que trabalham <strong>em</strong> unida<strong>de</strong>s<strong>de</strong> cirurgia num hospital universitário na Noruega, com larga experiência profissional (21 a 31 anos) e<strong>em</strong> unida<strong>de</strong>s cirúrgicas (6 a 24 anos).Resultados O t<strong>em</strong>a principal <strong>das</strong> narrativas <strong>das</strong> enfermeiras centrou-se na proximida<strong>de</strong> e no facto <strong>de</strong> se sentir<strong>em</strong>tocados pelo sofrimento dos doentes e família, o que estimulou a compaixão, para além da visãoestritamente médica, <strong>das</strong> rotinas e procedimentos. A proximida<strong>de</strong> com os doentes permite aosenfermeiros <strong>como</strong> agentes morais, perceber quais são as suas responsabilida<strong>de</strong>s e <strong>como</strong> respon<strong>de</strong>rlhes.O sofrimento <strong>de</strong>sperta <strong>de</strong> imediato uma resposta da enfermeira para o aliviar, minimiza-lo epreveni-lo se possível. Ter a experiência e estar repetidamente exposto ao sofrimento n<strong>em</strong> setransformou numa rotina n<strong>em</strong> diminuiu o seu sentimento <strong>de</strong> compaixão e capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ser afectado.Os participantes falaram sobre o que apren<strong>de</strong>ram ou receberam por cuidar dos doentes; isto é, aenfrentar o sofrimento dos doentes, a prepará-los para o que po<strong>de</strong>rá acontecer durante o turno; a sercapaz <strong>de</strong> ficar perto, permanecer atento aos doentes, e a manter o ânimo nestes casos. O autor concluipela importância <strong>de</strong> contar estórias para construir a consciência moral, para a qual é necessário sercapaz <strong>de</strong> ter <strong>em</strong> conta as suas acções e as <strong>de</strong> outros significativos. As estórias também serv<strong>em</strong> paratermos consciência do que sentimos, pensamos e somos, pois permit<strong>em</strong>-nos ouvir a nossa própria voz.O reconhecimento mútuo e o suporte que os enfermeiros encontram na equipa através <strong>de</strong>ste processo<strong>de</strong> partilha po<strong>de</strong> ser uma resposta para a razão pela qual consegu<strong>em</strong> lidar com situações eticamentedifíceis e conviver com elas <strong>de</strong> forma satisfatória.76Pensar Enfermag<strong>em</strong> Vol. 15 N.º 1 1º S<strong>em</strong>estre <strong>de</strong> 2011


QUADRO 5 - Síntese do Estudo 4Autor/Ano/TítuloObjectivosTipoParticipantesResultadosOve Hellzén; Kenneth Asplund; 2006. Nurses’ narratives about their resi<strong>de</strong>nts when caring for peoplewith long-term mental illness in municipal group dwellingsClarificar o sentido que está por <strong>de</strong>trás dos factores que influenciam o t<strong>em</strong>po que os enfermeirospassam com os resi<strong>de</strong>ntesEstudo qualitativo que consistiu <strong>em</strong> entrevistas <strong>em</strong> profundida<strong>de</strong> analisa<strong>das</strong> numa perspectivafenomenológica e hermenêutica.Escolheu-se o método com base no pressuposto <strong>de</strong> que as pessoas dão sentido aos eventos através<strong>das</strong> estórias que contam. Foi-lhes pedido que contass<strong>em</strong> estórias sobre assuntos específicos tais<strong>como</strong>, <strong>como</strong> é que imaginavam que era ser resi<strong>de</strong>nte naquele contexto, e <strong>como</strong> era trabalhar ali.14 enfermeiras que prestam cuidados a pessoas com doença mental grave, sobretudo com odiagnóstico <strong>de</strong> esquizofrenia, <strong>em</strong> duas residências municipais para grupos, na Suíça, aleatoriamenteseleccionados por grupos, sete <strong>de</strong> cada residência. To<strong>das</strong> tinham formação específica <strong>em</strong> psiquiatria.As ida<strong>de</strong>s variavam entre 34 e 58 anos.O t<strong>em</strong>po passado com os resi<strong>de</strong>ntes estava estreitamente associado com o sentimento <strong>de</strong> b<strong>em</strong>-estarque as enfermeiras tinham quando estavam com esses doentes.Da análise <strong>das</strong> narrativas <strong>em</strong>ergiram vários estereótipos relativos ao papel dos doentes que serelacionavam claramente com o t<strong>em</strong>po que passavam juntos.O bom resi<strong>de</strong>nte; o resi<strong>de</strong>nte com <strong>de</strong>pendência; o resi<strong>de</strong>nte invisível e o mau resi<strong>de</strong>nte. Nas duasprimeiras situações verificava-se um claro investimento <strong>das</strong> enfermeiras enquanto que nas duasúltimas se constatava uma clara <strong>de</strong>sistência do papel cuidador.Numa segunda análise estrutural foi possível clarificar melhor o sentido que subjazia às suas <strong>de</strong>cisões<strong>de</strong> priorizar cuidados a estas pessoas.As enfermeiras tentavam ajudar todos os resi<strong>de</strong>ntes, no entanto, buscavam reciprocida<strong>de</strong> baseada nasua noção <strong>de</strong> bons cuidados e no seu b<strong>em</strong>-estar. Procuravam por isso com mais frequência os doentesque as reconheciam e gratificavam assim <strong>como</strong> os <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes, on<strong>de</strong> se verificava claramente a eficáciada sua intervenção. Estes resi<strong>de</strong>ntes aumentavam e mantinham a sua auto-estima fazendo-as sentirúteis, consoladoras, parceiras, promovendo a sua autonomia. Pelo contrário os resi<strong>de</strong>ntes agressivos,estimulavam nas enfermeiras sentimentos <strong>de</strong> medo, insegurança e humilhação, enquanto aquelesque tinham dificulda<strong>de</strong>s <strong>em</strong> comunicar e se isolavam evocavam sentimentos <strong>de</strong> culpa e frustraçãodifíceis <strong>de</strong> suportar. O estudo revela que os quatro estereótipos que as enfermeiras i<strong>de</strong>ntificaminfluenciam a sua forma <strong>de</strong> agir. Isso parece estar <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte da forma <strong>como</strong> eles confirmam ou nãopositivamente o seu trabalho. Este estudo forneceu às enfermeiras a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> compreen<strong>de</strong>ro modo <strong>como</strong> o comportamento dos resi<strong>de</strong>ntes influenciava a sua prática e <strong>como</strong> aquela reforçavaa manutenção <strong>de</strong> contra-atitu<strong>de</strong>s que as levavam a <strong>de</strong>sistir dos resi<strong>de</strong>ntes que provavelmente maisnecessida<strong>de</strong> tinham dos seus cuidados.O <strong>Uso</strong> <strong>das</strong><strong>Narrativas</strong><strong>como</strong> <strong>Fonte</strong> <strong>de</strong><strong>Conhecimento</strong> <strong>em</strong>Enfermag<strong>em</strong>QUADRO 6 - Síntese do Estudo 5Autor/Ano/TítuloObjectivosTipoParticipantesResultadosMary Gunther; Sandra P. Thomas; 2006. Nurses’ narratives of unforgettable patient care eventsCompreen<strong>de</strong>r a experiência vivida no quotidiano dos enfermeiros enquanto prestadores <strong>de</strong> cuidadosnos hospitais cont<strong>em</strong>porâneos.Explorar a realida<strong>de</strong> da prática tal <strong>como</strong> é revelada nas próprias palavras dos enfermeiros.Estudo <strong>de</strong>scritivo fenomenológico baseado na perspectiva filosófica <strong>de</strong> Husserl e Merleau-Ponty, cujaquestão <strong>de</strong> partida era: “Fale-me sobre os momentos <strong>em</strong> que presta cuidados <strong>de</strong> enfermag<strong>em</strong> a umpaciente”.Amostra <strong>de</strong> conveniência:- enfermeiros com pelo menos 3 anos <strong>de</strong> experiencia <strong>em</strong> contexto hospitalar e disponíveis para falarcom o investigador.46 enfermeiros, sobretudo (96%) mulheres, <strong>de</strong> vários hospitais (EUA). Provenientes <strong>de</strong> diferentesespecialida<strong>de</strong>s clínicas: médico-cirúrgica; <strong>em</strong>ergência; cuidados intensivos; oncologia; pediatria;obstetrícia-ginecologia.No pano <strong>de</strong> fundo da rotina diária <strong>de</strong> trabalho, sobressaíram quatro t<strong>em</strong>as transversais a todosos contextos clínicos: a marca <strong>de</strong> acontecimentos extraordinários que permaneceram <strong>como</strong>inesquecíveis; a incompreensibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sses acontecimentos; o questionamento sobre o que po<strong>de</strong>riater sido feito <strong>de</strong> diferente; o sentimento <strong>de</strong> estar só na situação a par com o ter experimentadomomentos <strong>de</strong> profunda ligação sobretudo com os doentes. Estas experiências provocaram um estado<strong>de</strong> angústia residual que se manteve latente. Alguns enfermeiros ainda procuram uma explicaçãopara os acontecimentos relatados no sentido <strong>de</strong> minimizar o seu sentimento <strong>de</strong> culpa. Sentiram-seconfrontados com os limites do saber e <strong>das</strong> competências e mergulharam num mundo <strong>de</strong> questõesexistenciais para as quais não têm respostas.Pensar Enfermag<strong>em</strong> Vol. 15 N.º 1 1º S<strong>em</strong>estre <strong>de</strong> 201177


<strong>em</strong> enfermag<strong>em</strong>; dil<strong>em</strong>as éticos no quotidiano <strong>das</strong> enfermeiras; vivência <strong>de</strong> situaçõeslimite.De acordo com a nossa preocupação <strong>de</strong> partida, consi<strong>de</strong>rámos essencial verificara a<strong>de</strong>quação dos métodos <strong>de</strong> pesquisa utilizados às questões enuncia<strong>das</strong>.Utilizamos <strong>como</strong> critério <strong>de</strong> inclusão a metodologia qualitativa, uma vez que ométodo <strong>de</strong>ve ser <strong>de</strong>terminado pelo objecto <strong>de</strong> estudo e a experiência <strong>de</strong> vida <strong>das</strong> pessoasé, <strong>como</strong> já foi dito, uma área nobre para a utilização <strong>de</strong> métodos qualitativos, pois tratase<strong>de</strong> ter acesso ao mundo tal <strong>como</strong> é vivido, sentido, interpretado, agido pelos sereshumanos que são objecto do estudo. Deixámos, propositadamente, <strong>em</strong> aberto o método<strong>em</strong> concreto para po<strong>de</strong>rmos ace<strong>de</strong>r à maior diversida<strong>de</strong> possível.Como já se referiu (Polkinghorne, 2005) a unida<strong>de</strong> <strong>de</strong> análise na investigaçãoqualitativa é a experiência, pelo que os resultados dos vários estudos fornec<strong>em</strong> umenriquecimento na compreensão da experiência <strong>em</strong> si mesma, para além <strong>de</strong> <strong>como</strong> é queos indivíduos se diferenciam uns dos outros.No nosso corpus, seis estudos utilizam uma abordag<strong>em</strong> fenomenológica ehermenêutica (Charalambous et al., 2008), que <strong>de</strong>ntro da investigação qualitativa é uma<strong>das</strong> mais utiliza<strong>das</strong> para estudar a experiência vivida. Um é etnográfico, com recurso àobservação participante, sendo as narrativas produzi<strong>das</strong> <strong>em</strong> contexto <strong>de</strong> interacção entrepares. O estudo <strong>de</strong> Nairn, (2004) recolhe e analisa estórias <strong>de</strong> enfermeiros publica<strong>das</strong> <strong>em</strong>revistas e livros. Por último, referimos o estudo <strong>de</strong> Aranda e Street (2000) que na nossaperspectiva melhor explora o potencial da narrativa nas suas várias dimensões, recorrendonum primeiro momento à abordag<strong>em</strong> fenomenológica, utilizando primeiro entrevistas <strong>em</strong>profundida<strong>de</strong> e <strong>de</strong>pois constituindo um grupo <strong>de</strong> reflexão com alguns dos participantes,convidando-os a reinterpretar os seus próprios discursos.Para estudar a experiência são necessários resultados que <strong>de</strong>riv<strong>em</strong> <strong>de</strong> umaexploração intensiva <strong>de</strong> dados fornecidos, na forma <strong>de</strong> discurso, <strong>de</strong> relato ou documento,por um participante. Os dados tal <strong>como</strong> são produzidos não são idênticos à experiênciaque <strong>de</strong>screv<strong>em</strong>. Além disso, na sua forma oral são um produto <strong>de</strong> interacção entre oparticipante e o investigador (Polkinghorne, 2005). Assim, a utilização a<strong>de</strong>quada e rigorosa<strong>de</strong> um método torna-se essencial para a qualida<strong>de</strong> dos resultados. Todos os estudosjustificaram a sua opção metodológica e <strong>de</strong>screveram os procedimentos utilizados. Ametodologia <strong>de</strong> investigação está articulada e consistente com a fundamentação teóricaapresentada e t<strong>em</strong> <strong>como</strong> pressuposto, também transversal a todos os artigos, que narrare reflectir sobre uma experiência serve para a partilhar, mas também para mudar essaexperiência.Nos estudos sobre a experiência vivida, <strong>em</strong> que a preocupação é sobretudointensiva, face à riqueza e diversida<strong>de</strong> dos achados, é muito importante que osparticipantes sejam capazes <strong>de</strong> reflectir a<strong>de</strong>quadamente sobre a sua experiência e<strong>de</strong>screvê-la verbalmente.A amostra por conveniência envolve a escolha <strong>de</strong> pessoas ou documentos com osquais os investigadores possam <strong>de</strong> facto apren<strong>de</strong>r acerca da experiência, e os indivíduosque po<strong>de</strong>m dar <strong>de</strong>scrições mais relevantes <strong>de</strong> uma experiência são antes <strong>de</strong> tudo aquelesque a viveram. Os participantes <strong>de</strong>stes estudos são exclusivamente enfermeiros, (<strong>em</strong> doiscasos, documentos por eles produzidos), escolhidos mediante <strong>de</strong>terminados critérios,a<strong>de</strong>quados aos objectivos da investigação. São amostras pequenas, entre 4 a 20 pessoas,O <strong>Uso</strong> <strong>das</strong><strong>Narrativas</strong><strong>como</strong> <strong>Fonte</strong> <strong>de</strong><strong>Conhecimento</strong> <strong>em</strong>Enfermag<strong>em</strong>Pensar Enfermag<strong>em</strong> Vol. 15 N.º 1 1º S<strong>em</strong>estre <strong>de</strong> 201181


O <strong>Uso</strong> <strong>das</strong><strong>Narrativas</strong><strong>como</strong> <strong>Fonte</strong> <strong>de</strong><strong>Conhecimento</strong> <strong>em</strong>Enfermag<strong>em</strong>apenas um estudo t<strong>em</strong> 46 participantes. Apesar <strong>de</strong> <strong>em</strong> alguns casos não existir informaçãosobre o género, a maioria dos participantes são enfermeiras. Outro critério importante,frequent<strong>em</strong>ente utilizado, foi a experiência profissional, num registo que faz apelo aoprocesso <strong>de</strong> aquisição <strong>de</strong> perícia, tal <strong>como</strong> é <strong>de</strong>finido por Benner (1995). A razão <strong>de</strong> usarvários participantes é obter diferentes perspectivas sobre uma experiência. Comparandoe confrontando essas perspectivas, os investigadores são capazes <strong>de</strong> salientar os aspectosessenciais que <strong>em</strong>erg<strong>em</strong> <strong>das</strong> fontes e reconhecer variações no modo <strong>como</strong> a experiênciase revela. Neste sentido, vários participantes serv<strong>em</strong> <strong>como</strong> uma espécie <strong>de</strong> triangulaçãoda experiência, isolando e <strong>de</strong>limitando o seu núcleo <strong>de</strong> significado, aprofundando assim oconhecimento que ela produz (Polkinghorne, 2005).Os nove (9) estudos apresentam resultados <strong>de</strong> natureza muito diversa, <strong>em</strong>bora,para além <strong>das</strong> características comuns já referi<strong>das</strong>, seja possível, organizá-los, analisandoos achados <strong>em</strong> várias dimensões.Os estudos <strong>de</strong> Bartaas et al (2009) e Aranda e Street (2000) centram a narrativana experiência <strong>de</strong> interacção dos enfermeiros com doentes <strong>em</strong> situações particularmentedifíceis e procuram aprofundar a compreensão sobre esse encontro. No primeiro trata-seda percepção do enfermeiro sobre as conversas com doentes que se encontram a fazerquimioterapia e no segundo, a narrativa que os enfermeiros faz<strong>em</strong> sobre a sua amiza<strong>de</strong>com doentes com qu<strong>em</strong> tiveram relações <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> proximida<strong>de</strong> e que se encontravam <strong>em</strong>risco ou fim <strong>de</strong> vida. Esta é usada por eles próprios, <strong>em</strong> grupo, para uma reinterpretaçãoda experiência vivida. Em ambos os estudos, torna-se evi<strong>de</strong>nte o trabalho <strong>de</strong> autoconhecimentoatravés <strong>de</strong> uma abertura ao mundo interno <strong>das</strong> <strong>em</strong>oções, e o acesso a umacompreensão estruturada da experiência que nos revela dimensões, que não só r<strong>em</strong>et<strong>em</strong>para concepções <strong>de</strong> cuidar <strong>como</strong> permit<strong>em</strong> dar sentido à vivência, reflectir sobre ela eapren<strong>de</strong>r a lidar com as <strong>em</strong>oções, reforçando o saber pessoal.Três estudos (Hudacek, 2008; Helizén e Asplund, 2006; Gunther e Thomas,2006) procuram compreen<strong>de</strong>r <strong>como</strong> narram os enfermeiros a sua experiência <strong>de</strong> cuidare o que valorizam nela. Através da análise <strong>das</strong> suas estórias sobre uma prática quetivesse feito a diferença, ou sobre a sua prática quotidiana, po<strong>de</strong>-se ace<strong>de</strong>r a todo umuniverso <strong>de</strong> significados, saberes e valores que norteiam a sua intervenção. No estudo<strong>de</strong> Hudacek (2008), <strong>em</strong>erg<strong>em</strong> claramente 7 dimensões <strong>de</strong> cuidar que guiam as suaspráticas e que integram conceitos transversais às teorias <strong>de</strong> enfermag<strong>em</strong>, <strong>como</strong> caring,conforto, compaixão, espiritualida<strong>de</strong>, respeito, intervenção <strong>em</strong> crise. A dimensão ética e anatureza imprevisível e complexa dos cuidados <strong>de</strong> enfermag<strong>em</strong> estão também presentesguiando a <strong>de</strong>cisão clínica e o pensamento crítico. Helizén e Asplund, (2006), exploramuma vertente bastante interessante e que se reporta ao universo representacional dosenfermeiros, ao tentar estabelecer uma relação entre os estereótipos que os enfermeirostinham acerca dos resi<strong>de</strong>ntes e o t<strong>em</strong>po que passavam junto <strong>de</strong>les. Verificou-se, assim,que não só havia diferenças <strong>de</strong> atitu<strong>de</strong> resultantes da avaliação que faziam, <strong>como</strong> secompreen<strong>de</strong>u que essas diferenças radicavam na experiência <strong>em</strong>ocional que o contactodiário com os resi<strong>de</strong>ntes lhes proporcionava, mantendo a proximida<strong>de</strong> com aqueles queos reforçavam positivamente ou eram muito <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes dos seus cuidados e mantendoa distância daqueles que lhes <strong>de</strong>spertavam sentimentos negativos <strong>de</strong> frustração ou raiva.Numa perspectiva dinâmica <strong>de</strong> entendimento da relação enfermeiro-doente, v<strong>em</strong>osaqui espelhados os conceitos <strong>de</strong> transferência e contra-transferência, a cuja presençasó se po<strong>de</strong> ter acesso através da voz <strong>das</strong> enfermeiras. Por fim, Gunther e Thomas (2006)82Pensar Enfermag<strong>em</strong> Vol. 15 N.º 1 1º S<strong>em</strong>estre <strong>de</strong> 2011


fizeram entrevistas <strong>em</strong> profundida<strong>de</strong> a partir da proposta: “fale-me sobre os momentos<strong>em</strong> que presta cuidados <strong>de</strong> enfermag<strong>em</strong> a um paciente”. Curiosamente, apesar do pedidoir no sentido <strong>de</strong> narrar<strong>em</strong> o quotidiano, os enfermeiros relataram sobretudo estóriasdos doentes inesquecíveis, aquelas que pela surpresa, pela incompreensibilida<strong>de</strong> oupelo impacto afectivo, os marcaram profundamente e os acompanham. Os participantesquestionam-se sobre o que po<strong>de</strong>riam ter feito <strong>de</strong> diferente e reflect<strong>em</strong> sobre o queapren<strong>de</strong>ram com esses doentes. Salienta-se, no estudo e na literatura que o suporta,o comprometimento moral dos enfermeiros com as pessoas que cuidaram e o efeito<strong>em</strong>ocionalmente perturbador que esses inci<strong>de</strong>ntes têm na sua vida, <strong>de</strong> tal forma que oautor conclui pela existência <strong>de</strong> um distress residual inerente à prática <strong>de</strong> enfermag<strong>em</strong>.Contar as estórias que mais os afectaram e que nunca os abandonam é uma forma <strong>de</strong> sereconciliar<strong>em</strong> com a realida<strong>de</strong> da morte, a sua finitu<strong>de</strong>, e <strong>de</strong> procurar um fio condutor,um caminho seguro através do labirinto <strong>de</strong> sofrimento <strong>em</strong>ocional e da incerteza que essassituações provocam. Essas estórias permit<strong>em</strong>, assim, criar significados que se actualizamna situação <strong>de</strong> cuidados ajudando os enfermeiros a estar presentes <strong>de</strong> um modo maisautêntico e satisfatório e a lidar<strong>em</strong> melhor com a sua m<strong>em</strong>ória:O <strong>Uso</strong> <strong>das</strong><strong>Narrativas</strong><strong>como</strong> <strong>Fonte</strong> <strong>de</strong><strong>Conhecimento</strong> <strong>em</strong>Enfermag<strong>em</strong>Time, thinking, frequently revisiting, and dwelling with our stories gives us the opportunity to create newmeanings. We are never finished with the past. Just as the past provi<strong>de</strong>s us comfort in the present, thepresent can help to make meaning of the past. The stories that haunt us create a path to meaning. They arethe place in which we need to dwell. (Rashotte, 2005, p.35)Uma dimensão significativamente abordada nos artigos, presente <strong>em</strong> quasetodos mas constituindo-se <strong>como</strong> t<strong>em</strong>a central <strong>em</strong> três (Skott, 2003; Sorlie et al., 2003;Torjuul et al., 2007), é a que reporta as dificulda<strong>de</strong>s e os dil<strong>em</strong>as que surg<strong>em</strong> face ànatureza ética do cuidar <strong>em</strong> enfermag<strong>em</strong>. O propósito comum a estes estudos era o <strong>de</strong>compreen<strong>de</strong>r a experiência vivida <strong>das</strong> enfermeiras <strong>em</strong> situações éticas dil<strong>em</strong>áticas, <strong>em</strong>contextos diferentes: no quotidiano <strong>de</strong> uma unida<strong>de</strong> <strong>de</strong> oncologia (estudo etnográfico),numa unida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cuidados a doentes cirúrgicos e <strong>em</strong> duas unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> internamento<strong>em</strong> pediatria. No caso do primeiro estudo (Skott, 2003), o investigador acompanhoudiariamente os enfermeiros e verificou o seu constante envolvimento <strong>em</strong> questões <strong>de</strong>cuidar <strong>de</strong> natureza ética e o modo <strong>como</strong> essa experiência era partilhada através <strong>de</strong>narrativas, construindo um mundo <strong>de</strong> mediação moral alimentado pela experiência dodia-a-dia que era <strong>de</strong> vital importância para a <strong>de</strong>cisão ética. O autor argumenta que éatravés da articulação entre o diálogo dos acontecimentos, as <strong>em</strong>oções e as experiênciasque nos tornamos agentes morais. Tanto a conversação <strong>como</strong> a narrativa, revelam-se umprocesso criativo vital que não po<strong>de</strong> ser ignorado. Uma conversação ética é um processo<strong>de</strong> diálogo <strong>em</strong> que os interlocutores negoceiam activamente entre si uma dada visão darealida<strong>de</strong>. O estudo da comunicação narrativa no contexto <strong>de</strong> cuidados revela recursos<strong>de</strong> <strong>como</strong> se cria a compreensão interpessoal no jogo entre a linguag<strong>em</strong> e a experiênciapessoal. Há vários níveis envolvidos nesta construção <strong>de</strong> sentido: a pessoa, o ambienteinstitucional e os valores culturais.Os principais conflitos éticos que <strong>em</strong>erg<strong>em</strong> e que são comuns aos três estudosreferidos, são o conflito, proximida<strong>de</strong> versus distância, que se acentua quando se trata<strong>de</strong> doentes <strong>em</strong> risco ou fim <strong>de</strong> vida, conflito entre a sua consciência e a cultura <strong>de</strong> cuidarinstituída, e a incerteza <strong>de</strong> que se agiu <strong>em</strong> benefício do doente. De salientar também <strong>em</strong>todos eles a intensida<strong>de</strong> da narrativa sobre a dor <strong>em</strong>ocional que resulta do encontro <strong>como</strong> sofrimento dos doentes e familiares e o sentimento <strong>de</strong> compaixão e <strong>de</strong> afectação quePensar Enfermag<strong>em</strong> Vol. 15 N.º 1 1º S<strong>em</strong>estre <strong>de</strong> 201183


O <strong>Uso</strong> <strong>das</strong><strong>Narrativas</strong><strong>como</strong> <strong>Fonte</strong> <strong>de</strong><strong>Conhecimento</strong> <strong>em</strong>Enfermag<strong>em</strong>daí resulta. A reflexão ética <strong>em</strong> contextos <strong>de</strong> cuidar é feita <strong>de</strong> forma narrativa. Os conceitoséticos abstractos <strong>de</strong> respeito e responsabilida<strong>de</strong> ganham corpo quando são relacionadoscom situações concretas entre colegas e pacientes e intersubjectivamente partilhadosatravés <strong>de</strong> estórias, criando-se uma reciprocida<strong>de</strong> entre narrativa e ética que é essencial,pelo que uma ‘ética narrativa’ implica uma interacção “We are intersubjective forms ofm<strong>em</strong>ory and action” (Skott, 2003, p.375).Dentro do contexto narrativo é possível compreen<strong>de</strong>r melhor porque pensamos eagimos <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>terminada forma, aprimorando a nossa sensibilida<strong>de</strong> narrativa, dandolhecoerência e unida<strong>de</strong>. (Skott, 2003)Os enfermeiros apresentam-se nestes estudos <strong>como</strong> seres humanos comprometidoscom o alívio do sofrimento e moralmente responsáveis pela vulnerabilida<strong>de</strong> dos quenecessitam dos seus cuidados, reflectindo um nível <strong>de</strong> conhecimento específico docontexto, adquirido pela experiência clínica (Benner, 1995). Cabe à investigação encontrarnovas formas <strong>de</strong> manter e aperfeiçoar esta perícia.Por fim, o estudo <strong>de</strong> Nairm (2004) centra-se nos relatos dos enfermeiros sobresituações limite, <strong>em</strong> contexto <strong>de</strong> <strong>em</strong>ergência, dando voz a um conjunto <strong>de</strong> textospropositadamente recolhidos fora <strong>de</strong> um <strong>de</strong>senho <strong>de</strong> investigação, <strong>em</strong> revistas profissionaise <strong>de</strong> divulgação. O objectivo <strong>de</strong>ste autor é discutir os sentidos sobre a experiência <strong>em</strong>cuidados <strong>de</strong> <strong>em</strong>ergência, <strong>de</strong>socultando um conhecimento que reconhece <strong>como</strong> marginal,<strong>de</strong>svalorizado face ao conhecimento académico, e que são estórias sobre as <strong>em</strong>oções dosenfermeiros. Estórias intensas que falam sobre situações extr<strong>em</strong>as <strong>de</strong> morte e sofrimento,<strong>de</strong> horror, <strong>de</strong> medo, <strong>de</strong> ansieda<strong>de</strong>, e que se constitu<strong>em</strong> <strong>como</strong> um meio particular <strong>de</strong>expressar essa vivência. Tais narrativas, que envolv<strong>em</strong> uma <strong>de</strong>scrição pormenorizada e porvezes brutal <strong>de</strong> acontecimentos, na sua maior parte situações <strong>de</strong> trauma, criam espaçopara a expressão <strong>de</strong> genuínos sentimentos, <strong>de</strong> tal forma que inva<strong>de</strong>m o discurso formal daracionalida<strong>de</strong> técnica que envolve habitualmente a enfermag<strong>em</strong> <strong>de</strong> cuidados intensivos.A distância e a objectivida<strong>de</strong>, implicitamente promovida pelos profissionais, assum<strong>em</strong>-se<strong>como</strong> discurso predominante que apaga outras linguagens que, na opinião do autor, têma mesma legitimida<strong>de</strong>.Este interesse <strong>em</strong> explorar outras formas <strong>de</strong> acesso aos sentidos e aos saberes,que o discurso dominante habitualmente <strong>de</strong>sperdiça, v<strong>em</strong> na linha da abordag<strong>em</strong>pós-mo<strong>de</strong>rnista que se preocupa <strong>em</strong> dar voz a discursos marginais e assim inquietar anormativida<strong>de</strong> do mundo social.Argumenta-se ainda, neste estudo, que as fontes para colher dados <strong>de</strong>v<strong>em</strong> irpara além <strong>das</strong> formalmente produzi<strong>das</strong> <strong>em</strong> contexto <strong>de</strong> pesquisa, utilizando escritospessoais ou estórias que nunca foram produzi<strong>das</strong> para fins <strong>de</strong> investigação. Ou seja, dadosproduzidos no seu setting natural. Estas narrativas têm a sua própria “verda<strong>de</strong>”. Contudo,não po<strong>de</strong>mos <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> acompanhar o autor neste <strong>de</strong>sejo:“i did wish to engage creatively with th<strong>em</strong> as a source of knowledge that may at times have unsettlingthings to say about the current state of health care and aca<strong>de</strong>mic language that dominates our <strong>de</strong>scriptionsof it” (Nairn, 2004, p.65).De notar a preocupação ética referida <strong>em</strong> todos os estudos no sentido <strong>de</strong> respeitaras <strong>de</strong>cisões dos participantes, dando-lhes s<strong>em</strong>pre total liberda<strong>de</strong>, tanto para se expressar<strong>como</strong> para interromper a sua participação.84Pensar Enfermag<strong>em</strong> Vol. 15 N.º 1 1º S<strong>em</strong>estre <strong>de</strong> 2011

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