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ARTIGO - Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação - Ufma

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<strong>ARTIGO</strong>Amanda P. Pereira; Márcia M. M. Feitosa“MINA LASSAÔ”: a performance ritual <strong>de</strong> dois terreiros <strong>de</strong> mina, em São Luís-MA*"MINA LASSAÔ": ritual performance of two yard of mine in San Luis-MA"MINA LASSAÔ": ritual <strong>de</strong> la ejecución <strong>de</strong> dos “terreiros <strong>de</strong> minas” en San Luis-MAHeriverto Nunes Mendonça JúniorSérgio Figueiredo FerrettiResumo: <strong>Pesquisa</strong> em andamento, com bolsa PIBIC sobre performance no Tambor <strong>de</strong> Mina, com trabalho<strong>de</strong> campo e envolvimento nos festejos que compõe o calendário <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s da Casa Fanti-Ashanti e doIlê Axé Ogum Sogbô em São Luís-MA. O objetivo é <strong>de</strong>senvolver uma análise sobre a performance ritualdo Tambor <strong>de</strong> Mina das casas pesquisadas, tendo como foco os “atores” que fazem parte <strong>de</strong>sse ritual, oespaço on<strong>de</strong> é realizado, as entida<strong>de</strong>s (personagens), a música e a dança e sua relação com os mesmos.O percurso metodológico se <strong>de</strong>u em dois momentos pesquisa bibliográfica e visitas ao campo e duranteas mesmas foram feitos registros fotográficos. Entre os resultados po<strong>de</strong>-se i<strong>de</strong>ntificar as categorias <strong>de</strong>entida<strong>de</strong>s através dos símbolos representados, como constatou-se durante as visitas ao campo.Palavras-chave: Performance. Tambor <strong>de</strong> Mina. Terreiros.Abstract: Search in progress, with PIBIC funds, about performance in the Mine Drum, with field workand involvement in the festivities that make up the calendar of activities of the Casa Fanti-Ashanti andOgun Ile Axe Sogbê in Sao Luis, Brazil. The objective is to <strong>de</strong>velop an analysis of the ritual performanceof the Tambor <strong>de</strong> Mina of the houses surveyed, focusing on the "actors" who are part of this ritual, thespace where it is performed, the entities (characters), music and dance and its relationship with them.The methodological approach was <strong>de</strong>velopped in two ways a bibliographical research and field visits duringwhich photographic records were ma<strong>de</strong>. Among the results we found that we can i<strong>de</strong>ntify the categories ofentities represented through symbols, as it was found during the local visits.Keywords: Performance. Tambor <strong>de</strong> Mina. Yards.Resumen: Investigación en curso, con beca PIBIC sobre la performance en el Tambor <strong>de</strong> Minas, contrabajo <strong>de</strong> campo y participación en las festivida<strong>de</strong>s que conforman el calendario <strong>de</strong> activida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> la CasaFanti-Ashanti y Ogun Ile Axe Sogbo en Sao Luis, Brasil. Nuestro objetivo es <strong>de</strong>sarrollar um análisis <strong>de</strong> larepresentación ritual Tambor <strong>de</strong> Minas en las casas encuestadas, centrándonos en los “actores” que hacenparte <strong>de</strong> este ritual, en el espacio don<strong>de</strong> se lleva a cabo, en las “entida<strong>de</strong>s” (personajes), en la músicay la danza y su relación con ellos. El proceso metodológico utilizado fue en dos tiempos: la investigaciónbibliográfica y las visitas <strong>de</strong> campo, y en ambas etapas fueron registradas fotografías. Entre los resultadospo<strong>de</strong>mos i<strong>de</strong>ntificar las categorías <strong>de</strong> entida<strong>de</strong>s representadas a través <strong>de</strong> símbolos, como se constatódurante las visitas a campo.Palabras clave: Tambor <strong>de</strong> Minas. Terreiros. Performance.1 INTRODUÇÃOEste artigo é fruto <strong>de</strong> algumas observaçõese discussões que resultam <strong>de</strong> dois semestrescomo bolsista <strong>de</strong> iniciação científica PIBIC, compesquisa ainda em andamento sobre a performanceritual no Tambor <strong>de</strong> Mina. A pesquisaestá vinculada ao projeto Religião, culturapopular e i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>, do professor Dr. SérgioFigueiredo Ferretti.A análise pauta-se tanto na averiguação daperformance e do Tambor <strong>de</strong> Mina, na literatu-ra especializada através da pesquisa teórica,como na investigação <strong>de</strong>sta prática religiosaem terreiros. Os terreiros a serem analisadossão a Casa Fanti-Ashanti e o Ilê AxéOgum Sogbô.A escolha do Tambor <strong>de</strong> Mina como objeto<strong>de</strong> pesquisa trouxe a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> análisea partir da performance, permitindo, assim,lançar um olhar interdisciplinar relacionando àAntropologia e às Artes Cênicas, apoiados nos*Trabalho premiado durante o XXII Encontro do SEMIC realizado na UFMA entre os dias 25 a 27 <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 2010.Artigo recebido em fevereiro 2011Aprovado em março 201120 Cad. Pesq., São Luís, v. 18, n. 2, maio/ago. 2011.


"Mina Lassaô"conceitos <strong>de</strong>senvolvidos principalmente pelosautores Richard Schechner, Antônio HerculanoLopes, Victor Tunner e Zeca Ligiéro.Segundo Lopes (2007, p. 7), nos últimosanos, a palavra “performance” passou a termais circulação nas ciências humanas, nãosomente no que tange Às áreas artísticas(teatro, dança etc.) mas também nos trabalhosantropológicos, sendo possível analisar gruposétnicos, religiosos entre outros, a partir dosseus elementos cênicos e performáticos. Nessaperspectiva, Herculano Lopes e Zeca Ligiéro(professores da UNIRIO) propõem estudos queresultaram em artigos e livros que buscam aarticulação entre performance e religião.Sobre o uso da terminologia teatral emgrupos étnicos e religiosos, Lopes (2007, p.8) diz:O uso da terminologia teatral não é gratuita e apontapara uma das principais origens dos estudos <strong>de</strong> performance:uma colaboração entre teatro e a antropologia,em que palavras como ator, drama, gestual,máscara, cenário, figurino e outras po<strong>de</strong>m ser <strong>de</strong>slocadaspara a análise <strong>de</strong> diversos tipos <strong>de</strong> relaçõessociais. Torna-se fácil perceber, então, que um padrerezando uma missa para um grupo <strong>de</strong> fiéis com todosos seus elementos altamente teatralizados constituemuma situação <strong>de</strong> performance e que a análise<strong>de</strong> tais elementos po<strong>de</strong>m nos dizer muitas coisas interessantessobre a religião católica.É importante ressaltar que não será discutidaa noção <strong>de</strong> performance teatral, mas, sim,<strong>de</strong> performance ritual, que segundo Tunner(1974), não libera um significado pré-existenteque esteja adormecido no evento, mas aprópria experiência é constitutiva <strong>de</strong> significados,porque está atualizando experiências <strong>de</strong>eventos passado, os quais, ao serem dramatizados,os ativam e lhes dão vida, colocando aexperiência em circulação.Nas observações <strong>de</strong> campo objetiva-se<strong>de</strong>senvolver uma análise ritual do Tambor <strong>de</strong>Mina em alguns terreiros, tendo como foco“os atores” que fazem parte <strong>de</strong>sse ritual, oespaço on<strong>de</strong> é realizado, as entida<strong>de</strong>s (personagens),a música e a dança e sua relaçãocom os mesmos.2 “OIÁ MINA LASSAÔ” 1Cad. Pesq., São Luís, v. 18, n. 2, maio/ago. 2011.O Tambor <strong>de</strong> Mina, ou simplesmente a“Mina”, manifestação <strong>de</strong> matriz africana,surgiu no Maranhão, em meados do séculoXIX. Seu marco inicial foi a fundação pelasmãos <strong>de</strong> africanas da Casa das Minas (Jejê),consagrada ao vodun “Zomadonu” (<strong>de</strong>sta casanão saiu nenhum outro terreiro com o mesmomo<strong>de</strong>lo ritualístico) e da Casa <strong>de</strong> Nagô consagradaao orixá “Xangô”, ambas ainda em funcionamento.A partir <strong>de</strong> então, outros terreirosforam abertos em São Luís, como o Terreirodo Egito (<strong>de</strong>saparecido) o Terreiro da Turquia,a Casa Fanti-Ashanti, o Terreiro <strong>de</strong> Iemanjá, oIlê Axé Ogum e Sogbô, em meados dos anos80, entre outros.Mundicarmo (1985, p. 37) analisa a matrizafro Tambor <strong>de</strong> Mina como uma religião <strong>de</strong><strong>de</strong>scendência africana <strong>de</strong>senvolvida no Estadodo Maranhão e praticada em locais especializadose específicos para essa finalida<strong>de</strong>, Casas<strong>de</strong> Mina sendo estática e iniciática, a partir daincorporação <strong>de</strong> entida<strong>de</strong>s espirituais (Voduns,Orixás e Caboclos).Uma das características fundamentais, assim comoas <strong>de</strong>mais religiões <strong>de</strong> matrizes africanas praticadasno Brasil, é o transe ou a possessão, que usualmentecostuma ocorrer em rituais on<strong>de</strong> as entida<strong>de</strong>s espirituaishomenageadas e cultuadas são invocadas e“recebidas” pelos Filhos e Filhas <strong>de</strong> santo, Pais e Mães<strong>de</strong> santo. A i<strong>de</strong>ntificação afro no Maranhão tambémé conhecida como “brinquedo <strong>de</strong> Santa Bárbara”, expressãoque se refere aos toques ou festas <strong>de</strong> Tambor<strong>de</strong> Mina (FERRETTI, M., 1985, p. 37).Percebemos que os terreiros do Tambor <strong>de</strong>Mina são <strong>de</strong>tentores <strong>de</strong> uma certa autonomia<strong>de</strong> culto, po<strong>de</strong>ndo realizar diferentes formas ediferentes rituais para as entida<strong>de</strong>s cultuadasnessa religião.2.1 Casa Fanti-AshantiA Casa Fanti-Ashanti, localiza-se no bairrodo Cruzeiro do Anil, na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Luís doMaranhão. Fundada em 1958, é uma casa <strong>de</strong>Mina e Camdomblé, na qual o Tambor <strong>de</strong> Minamantém sua tradição <strong>de</strong>s<strong>de</strong> sua fundação.Nesta casa há também rituais ligados à pajelança,ao catolicismo popular (Festa do DivinoEspírito Santo) e ao folclore, como Boi <strong>de</strong> CorreBeirada e o Tambor <strong>de</strong> Crioula <strong>de</strong> Taboca.O Tambor <strong>de</strong> Mina, nessa Casa, é realizadoem geral durante três noites consecutivas,com duração <strong>de</strong> quatro a sete horas. SegundoMundicarmo Ferretti (2000a), a estrutura dotoque é parte também <strong>de</strong> outros rituais realizadosna Mina da Casa Fanti-Ashanti, tais comoMucambo ou Festa <strong>de</strong> Pagamento (entida<strong>de</strong>sdistribuem presentes aos tocadores e <strong>de</strong>maisauxiliares do culto e moedas entre todos queestão presentes); Bancada ou Arrambam(suspen<strong>de</strong>r as ativida<strong>de</strong>s religiosas do terreirodurante a quaresma); Saída <strong>de</strong> Vodunsi (toquefestivo realizado após o período <strong>de</strong> reclusãopara iniciação).Outros rituais também são realizados naCasa Fanti-Ashanti: Avaninha (reza em línguaafricana realizada após a ladainha); Tambor21


Heriverto N. M. Júnior; Sérgio F. Ferretti<strong>de</strong> Choro (toque sem dança realizado apóso falecimento <strong>de</strong> algum filho da casa); Festa<strong>de</strong> Caboclo (encantados, fidalgos e gentis);Tambor <strong>de</strong> Borá ou Canjerê (toque realizadopara as entida<strong>de</strong>s indígenas).Observamos que o toque <strong>de</strong> Mina da CasaFanti-Ashanti tem uma estrutura semelhante aoda Casa <strong>de</strong> Nagô. Começa com um canto paraLégba (Imbarabô) sem entregar padê (Presente,como existe no candomblé) e sem incorporação,seguido <strong>de</strong> canto para Ogum e paraoutras entida<strong>de</strong>s espirituais africanas, em umaor<strong>de</strong>m pré-estabelecida. No segundo momento,o Tambor vira para mata, passa-se a homenagearas principais entida<strong>de</strong>s caboclas da Casa.Num terceiro momento, volta-se a homenagearas entida<strong>de</strong>s africanas e encerra-se o toquecom um canto para Légba (FERRETI, 2000).Nesse espaço, antes do tambor virar paraa mata, canta-se para o vodun Averequete, equando se volta a homenagear as entida<strong>de</strong>safricanas, canta-se primeiro para Badé Queviosso.Canta-se também no encerramento dotoque para Oxalá (dono da cabeça do fundadordo terreiro, Pai Eucli<strong>de</strong>s) e <strong>de</strong>pois para Légba(FERRETI, 2000a).Em geral, os toques <strong>de</strong> Mina da CasaFanti-Ashanti giram em torno <strong>de</strong>ssa estruturapré-estabelecida, cada vodunsi (nome dado afilhos <strong>de</strong> santos do Tambor <strong>de</strong> Mina) recebesua entida<strong>de</strong> e permanece com ela no salão, <strong>de</strong>forma que em certo altura do toque observaseque o número <strong>de</strong> dançantes já possuídas(em transe) com suas entida<strong>de</strong>s cresce.No Tambor <strong>de</strong> Mina <strong>de</strong>ssa Casa, os dançantesnão trocam <strong>de</strong> vestimentas quandorecebem suas entida<strong>de</strong>s, apenas uma toalhabranca lhes é entregue no salão e esta <strong>de</strong>marcaquem está em transe. A maneira <strong>de</strong> pren<strong>de</strong>ra toalha ao corpo, a forma que o cabelo estápenteado, a cor dos rosários <strong>de</strong> miçangas quetrazem no pescoço e os objetos que po<strong>de</strong>mportar contém em si informações sobre asentida<strong>de</strong>s que estão incorporadas. Como citaSergio Ferreti (1996, p. 52) sobre as toalhasutilizadas pelos voduns na Casa das Minas:Quando o vodun é jovem, a toalha é usada na cinturae quando vodun é velho, é presa abaixo dos braçossobre os seios. A maneira como se pren<strong>de</strong> a toalha nacintura é diferente para com os gêneros. Se o voduné homem, é dobrada e metida na faixa da cintura, ese é mulher é amarrada com um nó. Usam um lençocolorido na cor da saia, preso no ombro se o vodunfor velho, e na cintura se o vodun for jovem. Tambémcostumam usar na mão um pequeno lenço dobrado,para enxugar o suor e um leque ou ventarola <strong>de</strong> papelpara se abanar contra o calor. Se o vodun é homem,usa o cabelo penteado para trás, e se é mulhercobrindo as orelhas.Na Mina realizada na Casa Fanti-Ashanti,ao contrário da Casa das Minas, as toalhassão amarradas <strong>de</strong> forma diferente. Quandouma Filha <strong>de</strong> Santo está incorporada comum vodun ou orixá, a toalha é presa abaixodos braços, sobre os seios, se for um Filho <strong>de</strong>Santo, a toalha é transpassada pelo peito nadiagonal. Já no momento em que o tamborvira para mata, os voduns e orixás que estão“em terra”, incorporados, dão espaço para asentida<strong>de</strong>s caboclas se manifestarem; são recebidoslenços coloridos e cada caboclo tem suaforma específica <strong>de</strong> amarrar, ou na cintura, nopescoço ou na mão.Na Mina maranhense, cada família <strong>de</strong>vodun e encantado possui um rosário (colarfeito com contas <strong>de</strong> miçangas) através doqual são i<strong>de</strong>ntificados. Na Casa Fanti-Ashantie em outros terreiros da capital, os turcos,por exemplo, têm um rosário ver<strong>de</strong>, amareloe vermelho, que é usado no pescoço pelosa<strong>de</strong>ptos que entram em transe com essas entida<strong>de</strong>sdurante os toques. Após a incorporação,o cordão costuma ser utilizado a tira-colo (emdiagonal, do ombro direito à altura da cintura,no outro lado) (FERRETI, 2000).3 ILÊ AXÉ OGUM SOGBÔO “Ilê Axé Ogum e Sogbô” segue o mesmomo<strong>de</strong>lo ritualístico do Terreiro <strong>de</strong> Iemanjá 2on<strong>de</strong> foi iniciado o seu fundador - o BabalorixáAirton Gouveia (Pai Airton) e fica localizadono bairro da Liberda<strong>de</strong>, na Rua Nossa Senhoradas Graças, sendo zelado espiritualmente<strong>de</strong>s<strong>de</strong> sua fundação por esse chefe religioso(LINDOSO, 2007, p. 107 - 109).São realizadas no Ilê Axé Ogum Sogbô festasem homenagem aos santos católicos (SantaBárbara, Nossa Senhora da Conceição, São Jorge,São João e outros) não somente com toque <strong>de</strong>Mina, mas também através <strong>de</strong> ladainhas, rezas,preces e hinos do catolicismo popular, realização<strong>de</strong> festas ligadas ao próprio catolicismo populartais como a queimação <strong>de</strong> palhinhas e a festa doDivino Espírito Santo (festa realizada nesta casano mês <strong>de</strong> setembro).A casa <strong>de</strong>senvolve brinca<strong>de</strong>iras e manifestaçõesfolclóricas para as entida<strong>de</strong>s espirituaiscomo o bumba-meu-boi <strong>de</strong> encantado,oferecido neste terreiro para Dominguinhos <strong>de</strong>Légua e o Tambor <strong>de</strong> Crioula em homenagemaos pretos-velhos 3 (13 <strong>de</strong> maio).No Ilê Axé Ogum Sogbô há também cultoàs entida<strong>de</strong>s africanas (orixás e voduns).Quanto aos voduns, citamos os jêjes daome-22 Cad. Pesq., São Luís, v. 18, n. 2, maio/ago. 2011.


"Mina Lassaô"anos, cultuados também na Casa das Minas(Doçú e Sogbô, sendo a segunda uma dasprincipais entida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Pai Airton) e os Cambindas(Boço Von Dereji, Meméia), e os orixás,sendo o principal <strong>de</strong>sta casa, Ogum – divinda<strong>de</strong>guerreira consi<strong>de</strong>rada chefe do terreiro e oprincipal santo <strong>de</strong> seu zelador.É bastante presente também nesse terreiroo culto aos encantados nobres e gentis,como Barão <strong>de</strong> Guaré (entida<strong>de</strong> gentil <strong>de</strong> PaiAirton, Dom Luís Rei <strong>de</strong> França, Dom Felipe,Dom João, entre outros) além <strong>de</strong> princesase príncipes, como o príncipe Ricardinho, e aprincesa Flora, etc. e as “moças” ou “meninas”como a Menina do Maracujá e Menina da Pontad’Areia.Segundo Lindoso (2007), há nessa Casatambém o culto a outras diversas categorias<strong>de</strong> caboclos divididos por famílias, é o queShapanan (2001, p. 319) categoriza como“encantaria cabocla”, subdivida em várias famíliascomo a família <strong>de</strong> Rei Sebastião (que elechama <strong>de</strong> Família do Lençol), Turquia, Codó,Gama, Juncal, Mata, dos Marinheiros, das Caravelas,Ban<strong>de</strong>ira, Baía, João <strong>de</strong> Lima, presentesnessa Casa <strong>de</strong> Mina 4 .Ainda sobre as entida<strong>de</strong>s cultuadas nesseterreiro, Oliveira (1989, p. 26 - 27) distribui asentida<strong>de</strong>s espirituais do Tambor <strong>de</strong> Mina, <strong>de</strong>acordo com as suas famílias.Povo Jeje: Zomadonu, Toy Doçu, Toy Abidigá, ToyAgongono, Daco-Donu, Toy Akossú Alogué, XapanãSakpatá, Bosukó, Boçalabê, Badé, Nana buluku, ToyJotim, Toy Averequete, Eowá, Toy Polijobi, Toy Lissá,Abê, Toy Loko. Povo Nagô: Ogum Megê, Ogum Otá,Ogum Mariô, Bessein (Oxumaré), Nana Biokô, Xangô,Vó Missa, Toy Averequete, Badé, Oyá Navezuarina,Oxossi (Agüê), Logun Edé, Oxum, Eowá, Xapanã,(Acossú), Boço Jará. Povo Cambinda: Légua BogiBuá, Boço Von Dereji, Boço Meméia, Boço Lada, Arronoviçavá,Boço In<strong>de</strong>ia. Povo Gentil: Dom Lúis, Rei Sebastião,Dom Manoel, Dom José Floriano, Dom PedroAngaço, Dom João Rei das Minas, Dom João Soeira,Rainha Maria Bárbara Soeira, Rainha Rosa, RainhaMadalena, Rainha Dina, Príncipe Orias, Príncipe <strong>de</strong>Oliveira, Príncipe Alteredo, Gelim, Toy Zezinho, JoãoGuerreiro <strong>de</strong> Alexandria, Princesa Flora, Princesa Luiza,Princesa Rosinha, Menina do Caído, Moça Fina <strong>de</strong>Otá, Dona Oruana, Dona Maria Antônia; Os caboclos:família do Rei Ban<strong>de</strong>ira, família <strong>de</strong> Rei da Turquia,Família <strong>de</strong> Codó ou Caxias, Família <strong>de</strong> Caboclo Roxo,Família <strong>de</strong> João <strong>de</strong> Lima (Botos), Família da Baía.Observa-se com essa citação a varieda<strong>de</strong><strong>de</strong> entida<strong>de</strong>s cultuadas nos terreiros <strong>de</strong>Mina, e po<strong>de</strong>mos constatar também durantenossas visitas ao campo, diferentes comportamentos,danças, músicas, e alguns traços<strong>de</strong> personalida<strong>de</strong> que algumas entida<strong>de</strong>spossuem, dando com isso, uma forma <strong>de</strong> interaçãosocial, tanto com quem está participandocomo a<strong>de</strong>pto do ritual, também comCad. Pesq., São Luís, v. 18, n. 2, maio/ago. 2011.quem está somente assistindo.Outra característica do Ilê Axé OgumSogbô citada por Lindoso (2007), e presenciadadurante as visitas ao campo, são as saídas<strong>de</strong> santo (orixás e voduns) “vestidos” ou paramentados(enfeitados), <strong>de</strong> forma especial coma própria re-significação dos ritos <strong>de</strong>sse terreiro<strong>de</strong> Mina, que, segundo relatos <strong>de</strong> partedo “povo <strong>de</strong> santo” do Maranhão, são elementosi<strong>de</strong>ntitários da matriz africana Baiana, oCandomblé. Há também o uso <strong>de</strong> adjá (sinetaritual <strong>de</strong> várias campânulas) para guiar orixáse voduns incorporados nas saídas, brajás,macans, ritos do padê, <strong>de</strong>spacho <strong>de</strong> Exú noinício do toque, etc.O Ilê Axé Ogum Sogbô tem um calendáriofestivo muito extenso <strong>de</strong> toques em homenagensa santos católicos e entida<strong>de</strong>s, ficandocomplicado <strong>de</strong> assistirem-se a todos essesrituais, mas participou-se da gran<strong>de</strong> maioriadas festas realizadas no primeiro semestre <strong>de</strong>2010, nesse terreiro.A seguir analisam-se em alguns tópicosalgumas festas assistidas no primeiro semestre<strong>de</strong> 2010 com ênfase em seus personagens(entida<strong>de</strong>s).3.1 Caboclo da Ban<strong>de</strong>ira: “João da Matafalado”João da Mata, também conhecido comoCaboclo da Ban<strong>de</strong>ira (Rei da Itália) é umaentida<strong>de</strong> que comanda a família <strong>de</strong> ban<strong>de</strong>ira,os ban<strong>de</strong>irantes. João da Mata era recebidopor Jorge Itacy <strong>de</strong> Oliveira e em algumasvezes é recebido também por Pai Airton, maso encantado da família <strong>de</strong> Ban<strong>de</strong>ira, <strong>de</strong> PaiAirton, é Seu “Olho D’água”, membro <strong>de</strong>ssafamília <strong>de</strong> encantados.Dizem que essa linha foi introduzida no Maranhão noantigo Terreiro do Egito. Daí passando para o Terreiro<strong>de</strong> Belém (Apeadouro) como Dona Marcolina,mais on<strong>de</strong> <strong>de</strong>monstrou seu maior po<strong>de</strong>r foi no antigoTerreiro do Engenho Velho do Tirirical, <strong>de</strong> mãe Celestina,hoje extinto. É uma família muito cultuada noMaranhão e hoje em expansão em outros estados.Dominam os rochedos, baías, igarapés, ilhas, terrasfirmes. São mais caçadores e pescadores que guerreiros.(OLIVEIRA, 1989, p. 44).No Terreiro <strong>de</strong> Iemanjá, essa família <strong>de</strong> encantadosé homenageada no dia 8 <strong>de</strong> fevereiro,já no Ilê Axé Ogum Sogbô. Não há toques<strong>de</strong> maneira específica para essa família, sendoque em algumas festas é chamada (manifestada).Percebe-se que as entida<strong>de</strong>s da família <strong>de</strong>ban<strong>de</strong>ira são entida<strong>de</strong>s sérias e também muitoenérgicas, tanto na dança, quanto na forma <strong>de</strong>cantar e se comportar no terreiro.23


Heriverto N. M. Júnior; Sérgio F. FerrettiUm símbolo que chama bastante atençãosão os lenços e as ban<strong>de</strong>iras do Brasil, amarradosna testa e nos braços dos a<strong>de</strong>ptos queestão incorporados com entida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>ssafamília. Os lenços são <strong>de</strong> várias cores, as quepredominam são ver<strong>de</strong>, amarelo e o vermelho.Durante a pesquisa transcreveram-se tambémalguns cânticos relacionados a essa família.Percebe-se que os cânticos da família <strong>de</strong>Ban<strong>de</strong>ira remetem às ondas do mar, à pedra<strong>de</strong> Itacolomy e também, principalmente, aolí<strong>de</strong>r <strong>de</strong>ssa família, Caboclo da Ban<strong>de</strong>ira.3.2 Festa <strong>de</strong> São Lázaro: Toy AcossiA festa <strong>de</strong> São Lázaro acontece no dia 11<strong>de</strong> fevereiro, no Ilê Axé Ogum Sogbô, e é realizadaem homenagem ao vodun Toy Acossi,recebido por uma filha <strong>de</strong> santo do terreiro,chamada Angélica. Esse vodun é consi<strong>de</strong>rado ovodun da terra e o chefe da família <strong>de</strong> Dambirá.Sobre o estado <strong>de</strong> transe com entida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>ssafamília, Oliveira diz que:As criaturas por eles incorporadas, levadas ao estado<strong>de</strong> transe, ficam todas <strong>de</strong>formadas, per<strong>de</strong>ndopor completo a fisionomia, com os membros todoscrispados em convulsões, emitem gritos roucos,babam e se contorcem, tomam água em abundânciae azeite <strong>de</strong>ndê e os possuídos só voltam a si<strong>de</strong>pois <strong>de</strong> fricções <strong>de</strong> azeite <strong>de</strong> <strong>de</strong>ndê e tomar golesdo mesmo e cânticos em dialetos africanos. (OLI-VEIRA, 1989, p. 48).Esse ritual aconteceu durante o dia, começandopor uma ladainha católica e logo <strong>de</strong>poisseguida por um banquete (almoço dos cachorros)e pelo toque <strong>de</strong> Mina.Somente <strong>de</strong>pois da ladainha é que é iniciado o ritualdo almoço dos cachorros no Ilê Axé Ogum Sogbô,on<strong>de</strong> foram colocadas esteiras <strong>de</strong> palha no meio dosalão <strong>de</strong> danças, cobertas por uma gran<strong>de</strong> toalhabranca, uma imagem <strong>de</strong> São Lázaro bem no centro,uma vela branca acesa do lado <strong>de</strong>ssa mesma imagem.Logo após os pratos <strong>de</strong> comida são trazidos aospoucos no número <strong>de</strong> 7 para o almoço dos cachorros.(LINDOSO, 2007, p. 156).Logo após o almoço dos cachorros o salãoé limpo e os filhos <strong>de</strong> santo se sentam no chão,todos vestidos <strong>de</strong> branco.Após o almoço dos cachorros, algumas filhas <strong>de</strong> santoajudadas por um abatazeiro, recolhem os pratos,a toalha, a imagem <strong>de</strong> São Lázaro e limpam o salão<strong>de</strong> danças para o toque <strong>de</strong> mina para Acóssi Sapatá,quando tudo está limpo, os filhos <strong>de</strong> santo, todos vestidos<strong>de</strong> branco, sentam no salão e formam uma gran<strong>de</strong>roda, no meio fica a imagem <strong>de</strong> São Lázaro, umavela branca acesa e um pratinho com quiabos cortadosem ro<strong>de</strong>las pequenas. (LINDOSO, 2007, p. 156).Alguns cânticos em língua africana etambém em português são entoados em homenagema essas entida<strong>de</strong>s espirituais, nomomento em que esses cânticos são realizados,os filhos <strong>de</strong> santo entram em transe comas entida<strong>de</strong>s da família <strong>de</strong> Acossi, inclusive opróprio Acossi, em transe na vodunsi Angélica.Nesse instante, em que os filhos <strong>de</strong> santo entram emtranse com os Acossis, imediatamente se <strong>de</strong>itam nochão, tremendo muito, alguns tem um transe muitoviolento e precisam ser imediatamente contidos porpessoas da casa, que não estavam participando doritual. São cobertos por lençóis brancos e algumasmulheres do terreiro e abatazeiros passam azeite <strong>de</strong><strong>de</strong>ndê em suas mãos, pés e juntas corporais, afim <strong>de</strong>que os filhos (as) não sintam dores, <strong>de</strong>pois que saemdo transe. (LINDOSO, 2007, p. 157).Por último, pai Airton entra em transe comoNochê Sogbô, sua senhora. Dança um pouco,movimentando muito as mãos, como se fosseuma espécie <strong>de</strong> abanador e <strong>de</strong>pois lhe dãoum alguidar cheio <strong>de</strong> pipocas; Nochê Sogbôcomeça a jogar as pipocas sobre os filhos queestão em transe com os Acossis e também naspessoas que estão na assistência.Logo após, os filhos, que estão possuídospelas entida<strong>de</strong>s da família <strong>de</strong> Acossi, voltam parao seu estado normal “puro”, como esse grupoafro-religioso gosta <strong>de</strong> chamar, o tambor continuoutocando e os filhos vão trocar <strong>de</strong> roupas,quando retornam estão vestidos com roupas estampadase coloridas e começam a cantar paraa família Codó, a família chefiada por Légua BogiBua, que no Ilê Axé Ogum Sogbô tem como entida<strong>de</strong>principal, Seu Folha Seca.Percebemos que o “povo <strong>de</strong> Légua”, comoesse grupo afro-religioso também costumachamar, são entida<strong>de</strong>s irreverentes, alegres,que adoram dançar, cantar e conversar com aassistência.Observa-se que as doutrinas (músicas),da família <strong>de</strong> Légua, no Ilê Axé Ogum Sogbôfalam geralmente <strong>de</strong> boi, boiada, vaqueiro etambém do município <strong>de</strong> Codó. Percebe-seisso também na forma <strong>de</strong>ssas entida<strong>de</strong>s dançarem.Dançam como se estivessem correndoatrás <strong>de</strong> um boi para laçá-lo, movimentandomuito os ombros e as pernas.É muito contagiante a performance <strong>de</strong>ssasentida<strong>de</strong>s, que quando em transe em seusfilhos no Ilê Axé Ogum Sogbô, costumam usarchapéu <strong>de</strong> couro, <strong>de</strong> palha e alguns chapéus<strong>de</strong> vaqueiros presentes no bumba-meu-boi. Otoque para São Lázaro foi bastante animadoe esteticamente muito bonito e terminou porvolta das 6hs da tar<strong>de</strong>.3.3 Festa <strong>de</strong> Santo Antônio: Ogum Xorôquêe Ogum <strong>de</strong> LêA festa <strong>de</strong> Santo Antônio no Ilê Axé OgumSogbô acontece no dia 13 <strong>de</strong> junho dia em que24 Cad. Pesq., São Luís, v. 18, n. 2, maio/ago. 2011.


"Mina Lassaô"a Igreja Católica também comemora esse santo.Segundo Lindoso (2007), a festa <strong>de</strong> SantoAntonio nesse terreiro é <strong>de</strong>dicada ao orixá Ogume é organizada pela Mãe e pelo Pai pequeno dacasa Aíla e Leandro. O toque <strong>de</strong> Mina neste diacomeçou por volta das três horas da tar<strong>de</strong> com ocântico entoado pelo Pai <strong>de</strong> Santo Airton Gouveia<strong>de</strong>nominado “Imbarabô”.Durante esse cântico os filhos <strong>de</strong> santoentram lentamente no salão, saudando osabatás (tambores que são utilizados no Tambor<strong>de</strong> Mina). Nesse instante, os filhos da casadançam em forma <strong>de</strong> roda, realizando, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ndodas doutrinas (músicas) que estãosendo cantadas, gestos e coreografias, comoapontar o <strong>de</strong>do da mão direita para o céu eimitar um arco e flexa com as mãos etc.No momento do transe do pai e mãe pequenosda casa, as suas entida<strong>de</strong>s Ogum <strong>de</strong>Lê <strong>de</strong> Mãe Aíla e Ogum Xorôquê <strong>de</strong> Pai Leandrochegam juntas. No momento em que eles entraramem transe, as suas entida<strong>de</strong>s são conduzidaspara fora do salão <strong>de</strong> dança, enquantoisso o ritual ainda continua com varias músicas,danças, e outros filho <strong>de</strong> santo que tambémentram em transe, mas continuam no salão.Mãe Aila e Pai Leandro apareceram nosalão <strong>de</strong> dança com suas vestes rituais trocadas,segundo esse grupo religioso o nomeque se dá para essas vestes é <strong>de</strong> paramento.Eles portavam objetos que remetem à mitologia<strong>de</strong> Ogum, consi<strong>de</strong>rado o Orixá da guerra edo ferro segundo a cultura iorubana. Eles portavamespada, escudo e capacete.Os filhos <strong>de</strong> santo dão espaço no salão paraque os Oguns façam a sua performance e realizemas suas danças rituais; Ogum Xorêquêe Ogum <strong>de</strong> Lê dançam como se estivessemnuma guerra, apontando a espada para frentee para o teto, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>ndo-se com o escudo edando gritos que diziam “Ogum ê Patacuri”.Em um <strong>de</strong>terminado momento, um filhoda casa entra em transe com orixá iorubanoOxossi, orixá da fartura, da caça e do sustento.Ele dança como se estivesse em uma matacorrendo com os <strong>de</strong>dos das mãos apontados efazendo movimentos com as pernas.Logo após as apresentações das dançasrituais <strong>de</strong> Ogum e Oxossi que em seguida foramretirados do salão <strong>de</strong> dança, começam a ser homenageadasas entida<strong>de</strong>s nobres e gentis quenão são entida<strong>de</strong>s africanas. Segundo MundicarmoFerretti (2000a) a presença <strong>de</strong> entida<strong>de</strong>snão africanas no Tambor <strong>de</strong> Mina é explicadapelo próprio contato negro/ africano ou <strong>de</strong> seus<strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes com culturas não africanas.Cad. Pesq., São Luís, v. 18, n. 2, maio/ago. 2011.Os nobres e gentis no Ilê Axé Ogum Sogbôsão comandados por “Barão <strong>de</strong> Guaré” (filho<strong>de</strong> Rei Sebastião) que é recebido por PaiAirton. Percebeu-se que quando os filhos <strong>de</strong>santo <strong>de</strong>sse terreiro entram em transe comalguma entida<strong>de</strong> nobre ou gentil, recebemuma bengala <strong>de</strong> tamanho médio e dançamnum porte <strong>de</strong> supremacia e realeza. I<strong>de</strong>ntificaram-sealguns gentis incorporados em seus“filhos”: Dom Felipe, Dom Henrique, PríncipeRicardino e Rei da Escama Dourada. Algunsoutros que estavam em “terra” não foi possíveli<strong>de</strong>ntificar os nomes. Logo após terem cantadoe incorporado, as entida<strong>de</strong>s nobres e gentiscomeçaram a homenagear e invocar a família<strong>de</strong> Légua esse toque terminou por volta dassete horas da noite.4 CONSIDERAÇÕES FINAISEste artigo é resultante da pesquisa <strong>de</strong>campo feita há dois anos em terreiros <strong>de</strong> “Mina”antes <strong>de</strong> ser bolsista PIBIC com pesquisa e envolvimentonos toques <strong>de</strong> mina realizados naCasa Fanti-Ashanti e no Ilê Axé Ogum Sogbô.O Tambor <strong>de</strong> Mina é uma religião afro-maranhenseque vem sendo muito estudada porantropólogos, historiadores e cientistas sociaiscom o olhar voltado mais para outros aspectosda etnografia, existindo ainda poucos trabalhosfocando seus aspectos cênicos e performáticos.Um fator evi<strong>de</strong>nte da manifestação e expressãoreligiosa do Tambor <strong>de</strong> Mina <strong>de</strong>ssesgrupos estudados é a contextualização com omeio em que está inserido, seja em sua formaoriginal através <strong>de</strong> readaptações a padrões,a seu costume e a sua crença e a prática dosritos realizados <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>stas casas. A pesquisa<strong>de</strong>monstrou que a riqueza performática <strong>de</strong>sseritual tão maranhense segue em conjunto nosaspectos performáticos da música e da dança eda relação com o transe, em que elementos sãore-significados, o corpo ganha outro formatobaseado no que está sendo cantado no rituale nas formas que cada divinda<strong>de</strong> se apresenta.É necessário um olhar mais apurado para aobservação do Tambor <strong>de</strong> Mina, não somente oolhar etnográfico, mas também um olhar artístico,pois a riqueza em elementos teatrais queesta religião tem é <strong>de</strong> uma diversida<strong>de</strong> enorme.No universo do Tambor <strong>de</strong> Mina realizadona Casa Fanti-Ashanti e no Ilê Axé OgumSogbô observam-se aspectos cênicos e performáticosque vão <strong>de</strong>s<strong>de</strong> as imagens representativados santos católicos, no altar, até asconstruções coreográficas e musicais com seus25


Heriverto N. M. Júnior; Sérgio F. Ferrettiusos, significados e funções. Desvendar todaa constituição simbólica religiosa do contexto<strong>de</strong>ste rito nessas casas é algo impossível paraum único estudo, pois seria necessário buscara compreensão <strong>de</strong>sse mundo a partir <strong>de</strong> suasdimensões plásticas, dramáticas, gestuais, lingüísticas,antropológicas, musicais, religiosas,filosóficas etc.NOTAS1. Cântico gravado e transcrito durante nossapesquisa <strong>de</strong> campo no ritual do Ilê Axé Ogum eSogbô, é um cântico <strong>de</strong> abertura.2. O terreiro fundado na segunda meta<strong>de</strong> dos anos50, particularmente no ano <strong>de</strong> 1956, tendo suasprimeiras instalações em um sítio no bairro doCalhau em São Luis do Maranhão, pelo finadoJorge Itaci <strong>de</strong> Oliveira, mais conhecido comoJorge Babalaô ou Jorge da Fé em Deus. Naquelaépoca, meados dos anos 50, esse local era <strong>de</strong>difícil acesso, tanto para o Pai <strong>de</strong> santo, quantopara os (as) seus(suas) primeiros(as) filhos(as)<strong>de</strong> santo e <strong>de</strong>mais pessoas <strong>de</strong>sse grupo afro--religioso, <strong>de</strong>vido não morarem nessa área e teremque se <strong>de</strong>slocar até lá, por conta disso, esseterreiro se mudou para o bairro da Fé em Deus efunciona até hoje neste local (LINDOSO, 2007).3. Segundo Lindoso, é realizado também na casa<strong>de</strong> Iemanjá o ritual da “festa dos pretos-velhos”,no dia 13 <strong>de</strong> maio, uma linha <strong>de</strong> entida<strong>de</strong>s muitopresente na umbanda implementada por PaiJorge <strong>de</strong>ntro do seu terreiro, em face <strong>de</strong> homenagearo seu preto-velho, Pai Joaquim e <strong>de</strong> rememorarquestões atreladas ao próprio negrobrasileiro e a libertação dos escravos, reforçarainda i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s, etc. (LINDOSO, 2007).4. Nesse terreiro, essas famílias <strong>de</strong> caboclos sãocomandadas por entida<strong>de</strong>s espirituais recebidaspor seu lí<strong>de</strong>r, Pai Airton, como a famíliada Turquia que é comandada pelo caboclo JoãoGuará, a família <strong>de</strong> Codó, por Seu Folha Seca,a família da Gama por Miguelzinho da Gama, afamília <strong>de</strong> Ban<strong>de</strong>ira, por Olho d’Água e famíliada Mata por Taquariana, entre outras.REFERÊNCIASBASTIDE, Roger. As religiões africanas noBrasil. São Paulo: Pioneira, 1985.FERRETTI, Mundicarmo. Desceu na guma:o caboclo no Tambor <strong>de</strong> Mina. São Luís:EDUFMA, 2000a.______. Maranhão encantado: encantariamaranhense e outras histórias. São Luís:UEMA Editora, 2000b.______. Mina, uma religião <strong>de</strong> origemafricana. São Luís: SIOGE, 1985.FERRETTI, Sérgio. Querebetã <strong>de</strong> Zomadônu:etnografia da Casa das Minas do Maranhão. 2ed. São Luís: SIOGE, 1996.LIGIERO, Zeca. O conceito <strong>de</strong> “motrizesculturais” aplicado às práticas performáticas<strong>de</strong> origens africanas na diáspora americana.In: CONGRESSO DA ASSOCIAÇÃOBRASILEIRA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO EM ARTES CÊNICAS, 5., 2008,Belo Horizonte. Anais... Belo Horizonte:ABRACE, 2008.LINDOSO, Gerson Carlos Pereira. Pluralismose diversida<strong>de</strong> afro-religiosa em terreiros <strong>de</strong>mina no Maranhão: um estudo etnográficodo mo<strong>de</strong>lo ritual do Ilê Ashé Ogum Sogbô.Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais)– Programa <strong>de</strong> Pós-Graduação em CiênciasSociais, Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral do Maranhão,São LUÍS, 2007.LOPES, Antônio Herculano. Religião eperformance ou as performances das religiõesbrasileiras. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Casa <strong>de</strong> RuiBarbosa, 2007.OLIVEIRA, Jorge Itaci. Orixás e voduns nosterreiros <strong>de</strong> Mina. São Luís: VCR Produções ePublicida<strong>de</strong>, 1989.PAVIS, Patrice. A análise dos espetáculos:teatro mímica, dança, dança – teatro, cinemaTradução <strong>de</strong> Sergio Paiva]. São Paulo:Perspectiva, 2005.SCHECHNER, Richard. O que é performance.O Percevejo: Revista <strong>de</strong> Teatro, Crítica eestética, Rio <strong>de</strong> Janeiro, ano 2, n. 12, p. 25-50, 2003.SHAPANAN, Francelino. Entre caboclos eencantados. In: PRANDI, Reginaldo (Org.).Encantaria brasileira: o livro dos mestres,caboclos e encantados. Rio <strong>de</strong> Janeiro:Pallas, 2001.TURNER, Victor W. O processo ritual: aestrutura e enti-estrutura. Tradução <strong>de</strong> NancyCampi <strong>de</strong> Castro. Petrópolis: Vozes, 1974.26 Cad. Pesq., São Luís, v. 18, n. 2, maio/ago. 2011.

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