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Contributo Epistemológico para a Compreensão do Insucesso Escolar

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ESCOLARCONTRIBUTO EPISTEMOLÓGICO PARA A COMPREENSÃO DO INSUCESSOActualmente o insucesso escolar tem si<strong>do</strong> alvo de inúmeros estu<strong>do</strong>s, reflexões epreocupações quer por parte <strong>do</strong>s governantes quer de to<strong>do</strong>s os outros agentes sociais.Pais, professores e alunos encontram-se no centro das discussões. O que se entende porinsucesso escolar? Quais os indica<strong>do</strong>res que permitem identificar o insucesso escolar? Aquem imputar a responsabilidade <strong>do</strong> insucesso escolar?A resposta a estas questões, pressupõe numa primeira etapa a compreensão <strong>do</strong>fenómeno, ou seja, o que é insucesso escolar.1. ETIMOLOGIA DO CONCEITO DE INSUCESSO ESCOLARA análise epistemológica da palavra insucesso vem <strong>do</strong> latim insucessu(m), quesignifica “Malogro; mau êxito; falta de sucesso que se desejava”(Fontinha, s.d) ou ainda“mau resulta<strong>do</strong>, mau êxito, falta de êxito, desastre, fracasso”(Costa e Melo, 1989).O vocábulo insucesso é frequentemente confronta<strong>do</strong> com o termo sucesso, queadvém <strong>do</strong> latim sucessu(m), o qual assume, entre outros, os significa<strong>do</strong>s de “ bom êxito,conclusão”(Fontinha, s.d) ou “ chegada, resulta<strong>do</strong>, triunfo”(Macha<strong>do</strong>, 1977).Não podemos pois, deixar de constatar, que os termos sucesso e insucesso detêmsignifica<strong>do</strong>s que se opõem aos conceitos de bom e mau que lhes estão subjacentes.Deste mo<strong>do</strong>, na pesquisa <strong>do</strong>s termos bom e mau no Dicionário de LínguaPortuguesa, encontramos “bom: (…) que tem bondade; virtuoso; nobre; seguro (…)” e“mau: (…) que não tem bons instintos; que exprime maldade; malva<strong>do</strong>; perverso (…)”.Na sequência <strong>do</strong> exposto, se em termos estritos efectuarmos uma correlaçãoentre os termos bom/sucesso e mau/insucesso, verificamos que os sinónimos evocamsempre atributos pessoais, positivos ou negativos. 1Esta opinião é partilhada por Silva no seu estu<strong>do</strong> conjunto, onde na pesquisa <strong>do</strong>termo fracasso constata que o mesmo se refere a desastre, perda, mau êxito, malogro;enquanto sucesso se refere a bom êxito e resulta<strong>do</strong> feliz. Segun<strong>do</strong> os autores, estas1 Sobre esta temática, veja-se Maria Teresa Pires de Medeiros, <strong>Insucesso</strong> <strong>Escolar</strong> e a Clínica <strong>do</strong>Desenvolvimento…pp. 60-61.1


definições conduzem à depreensão de que é o aluno quem na sua trajectória escolar,obtém sucesso ou fracassa, razão pela qual os termos sucesso e fracasso se referemtradicionalmente, ao resulta<strong>do</strong> positivo ou negativo obti<strong>do</strong> pelos alunos e que seexpressa pela aprovação ou reprovação no final <strong>do</strong> ano lectivo (cit in Abramowicz et al,1997: 28). Ou seja, o termo insucesso escolar “parece aludir a um deficit pessoal queestá muito longe de ser a causa principal da maior parte <strong>do</strong> chama<strong>do</strong> fracasso escolar”(Rovira in Hernández Gil et al., 2004: 83).A inexistência de unidade semântica na definição de insucesso escolar, levouBenavente a reunir <strong>para</strong> esta designação vários termos, nomeadamente: reprovações,atrasos, repetência, aban<strong>do</strong>no, desperdício, desadaptação, desinteresse, desmotivação,alienação e fracasso. Salientou também a utilização das expressões: mauaproveitamento, e mau rendimento escolar (1990: 15-16).Acrescenta ainda que na definição de insucesso escolar, o vocabulário utiliza<strong>do</strong>é muitas vezes de natureza moral, visto que se apresenta como um mal e assume,simultaneamente, uma conotação dramática mediante as expressões “vítimas <strong>do</strong>insucesso” ou “problema angustiante” que é necessário, prevenir, detectar, combater,eliminar (ibidem).Todas estas terminologias vêm confirmar a existência de um problema actualque necessita de ser combati<strong>do</strong>, mas que oficialmente, é apenas avalia<strong>do</strong> pelo critériopedagógico dito “objectivo”, ou seja, os resulta<strong>do</strong>s escolares.A este propósito, Formosinho considera que embora se possam atribuir váriossignifica<strong>do</strong>s ao insucesso escolar, este é entendi<strong>do</strong> como o sucesso <strong>do</strong> aluno certifica<strong>do</strong>pela escola (1991: 178), proposição que sugere que o insucesso é veicula<strong>do</strong> pela nãocertificação escolar.Na sequência <strong>do</strong> exposto, concluímos que a explicação <strong>do</strong> conceito de insucessoescolar se caracteriza pela ausência de uniformidade conceptual, situação que pressupõeanalisar a explanação que alguns autores efectuam relativamente a este conceito assimcomo à sua génese.2. GÉNESEO conceito de insucesso escolar é recente na História da Educação da SociedadeOcidental e surge associa<strong>do</strong> à implementação da obrigatoriedade escolar, decorrente dasexigências da Sociedade Industrial. A sua noção conceptual remete-se aos meandros da2


ede política e económica <strong>do</strong> século XX, onde a organização das escolas com currículosestrutura<strong>do</strong>s pressupõe, por inerência, metas de aprendizagem. Ou seja, a escola aoveicular a transmissão <strong>do</strong> saber instituí<strong>do</strong>, propõe a aquisição desse saber, através demetas e limites que demarcam as fronteiras reais entre sucesso e insucesso escolar, peloque, quan<strong>do</strong> um aluno “fica <strong>para</strong> trás, já está em insucesso [visto] que não atingiualguma coisa que é suposto ser atingida por to<strong>do</strong>s os alunos” (Benavente, s.d.).Ou seja, a repetência, constituiu a solução interna que o sistema escolarencontrou <strong>para</strong> lidar com o problema da não aprendizagem ou da má qualidade dessaaprendizagem (Torres cit in Marchesi et al., 2004: 34). Neste contexto, “cada criança éconsiderada boa ou má aluna em função <strong>do</strong>s resulta<strong>do</strong>s obti<strong>do</strong>s e <strong>do</strong>s progressosefectua<strong>do</strong>s no cumprimento <strong>do</strong>s programas de ensino” (Benavente, 1976: 9).No nosso país tal como nos restantes, o conceito de insucesso escolar assumiu,ao longo <strong>do</strong>s tempos, diferentes acepções em conformidade com as conjunturaspolítico-económicas subjacentes.Foi com base na legislação que criou a obrigatoriedade escolar no EnsinoPrimário que o insucesso escolar, considera<strong>do</strong> como reprovação se generalizou a toda apopulação escolar, embora tal não consistisse motivo de preocupação.Contu<strong>do</strong>, a recolha sistemática da informação estatística, assim como o seuposterior tratamento e compreensão foram aspectos que pelos eleva<strong>do</strong>s valores queapresentavam começaram gradualmente a suscitar preocupações numa sociedade que serevelou intolerante ao insucesso escolar, pelos efeitos que produz, a nível pessoal, sociale económico.Encontramos assim legitimada a explicação <strong>para</strong> o facto deste fenómeno tersuscita<strong>do</strong> o interesse e a preocupação <strong>do</strong>s diferentes intervenientes sociais.3. CONCEPTUALIZAÇÃOEm conformidade com as ilações anteriores, podemos concluir que a definiçãode insucesso escolar se afigura bastante complexa. Além deste conceito encerrar umamultiplicidade de entendimentos, também o seu estu<strong>do</strong> apresenta uma enormepolissemia, notória nas diferentes áreas disciplinares que encetam a sua compreensão edefinição.3


Oficialmente, a definição de insucesso escolar, advém <strong>do</strong> regime anual depassagem/reprovação <strong>do</strong>s alunos, inerente à estrutura de avaliação característica <strong>do</strong>actual sistema de ensino.Em alguns países, a utilização <strong>do</strong> termo insucesso escolar é aplicada comprecaução, porquanto se considera que poderá produzir efeitos contraproducentes, emvirtude de promover a diminuição da reputação das escolas, o moral <strong>do</strong>s professores oua auto-estima <strong>do</strong>s alunos (Kovacz in Marchesi et al., 2004: 43-47). A título de exemplo,temos o caso da França, onde a classificação de escolas conten<strong>do</strong> alunos em risco deinsucesso escolar, originou a criação de escolas inseridas numa “zona de educaçãoprioritária” (ZEP), numa tentativa de debelação deste fenómeno. No entanto, estadesignação levou muitos Encarrega<strong>do</strong>s de Educação a solicitarem a mudança <strong>do</strong>s seuseducan<strong>do</strong>s <strong>para</strong> estabelecimentos de ensino não integra<strong>do</strong>s nas zonas que contemplamos grupos considera<strong>do</strong>s de risco.Inversamente, na Inglaterra, o uso <strong>do</strong> termo insucesso escolar é considera<strong>do</strong>positivo e até necessário.Contu<strong>do</strong>, a tendência mais generalizada num número crescente de países,nomeadamente a Dinamarca, a Finlândia e a Itália, é a de substituir o termo fracassoescolar pelo termo êxito escolar devi<strong>do</strong> ao senti<strong>do</strong> negativo que tem subjacente.A polissemia semântica é justificável pela incoerência que assume,apresentan<strong>do</strong>-se em consonância com o quadro de referências conceptuais, asexpectativas e o propósito de quem aborda o insucesso escolar. Não é pois, por acasoque os governos, investiga<strong>do</strong>res, professores, pais e alunos diferem na etiologia face aovalor que lhe atribuem.Um estu<strong>do</strong> da OCDE insiste no facto de que, independentemente das diferençasno uso <strong>do</strong> termo, assim como da sua definição, o baixo rendimento escolar dever serconsidera<strong>do</strong> um processo mais <strong>do</strong> que como um resulta<strong>do</strong> final atribuível a variáveisinstitucionais, sociais e individuais.Deste mo<strong>do</strong>, distingue três momentos-chave nesse processo. O primeiro, duranteo ciclo de educação obrigatória, apresenta-se quan<strong>do</strong> o rendimento <strong>do</strong> aluno ésistematicamente inferior ao da média, ou quan<strong>do</strong> este tem de repetir um ano escolar. Osegun<strong>do</strong> manifesta-se através <strong>do</strong> aban<strong>do</strong>no escolar <strong>do</strong> aluno antes de terminar aeducação obrigatória, enquanto que o terceiro se reflecte numa difícil integraçãoprofissional <strong>do</strong>s jovens que não possuem os conhecimentos e habilidades básicas quedeveriam ter adquiri<strong>do</strong> na escola (cit in Kovacz, 2004: 43-47).4


Cortesão e Torres (1990: 35-38) sustentam ainda, que <strong>para</strong> além da repetência eaban<strong>do</strong>no escolares, indica<strong>do</strong>res, através <strong>do</strong>s quais, tradicionalmente se define oinsucesso escolar, existem outros aspectos revela<strong>do</strong>res <strong>do</strong> mal-estar <strong>do</strong>s alunos nainstituição escolar, tais como a agressividade, o desinteresse, a violência e adelinquência. Por seu turno, a incapacidade de mobilização <strong>do</strong>s conhecimentosadquiri<strong>do</strong>s, após o término da escolaridade, é também um indica<strong>do</strong>r de que a educaçãonão se cumpriu.Também a este propósito Avanzini (s.d.: 24) considera que o número <strong>do</strong>s alunosabrangi<strong>do</strong>s pelo insucesso escolar não se pode atribuir exclusivamente ao própriomomento da escolaridade pois <strong>para</strong> além <strong>do</strong> perío<strong>do</strong> escolar muitos conhecimentos sãoprecários porquanto não se conservam.Por outro la<strong>do</strong>, o bom aluno, símbolo <strong>do</strong> êxito, poderá não o ser na realidade, seos seus interesses culturais se tiverem centra<strong>do</strong> exclusivamente e por imposição, nosconhecimentos académicos, secundarizan<strong>do</strong> todas as outras vertentes existenciais. Destemo<strong>do</strong>, a despeito da aparência de sucesso, “semelhante aluno representa obviamente uminsucesso”( idem, 25-26).É na confluência da repetência e aban<strong>do</strong>no escolares que Pires se posiciona faceao insucesso escolar, quan<strong>do</strong> afirma que o insucesso assume o seu expoente máximoatravés <strong>do</strong> aban<strong>do</strong>no escolar. Para esta investiga<strong>do</strong>ra, um aluno que reprove um ano nãoengrossa as fileiras <strong>do</strong> insucesso mas sim aquele “que repete sucessivamente váriosanos sem uma progressão e que acaba por aban<strong>do</strong>nar” (idem, s.d.:1)Para Pinto (1995:29), o insucesso escolar é um fenómeno visível através <strong>do</strong>atraso que um aluno tem relativamente à idade pertinente. Este conceito – idadepertinente – é a relação entre um ano/nível escolar e a idade que têm os alunos, a 31 deDezembro desse ano lectivo, que ten<strong>do</strong> ingressa<strong>do</strong> no 1º ciclo com 7 anos, nuncatenham si<strong>do</strong> reprova<strong>do</strong>s.Por seu turno, Fernandes (1991:187-188) considera que apesar de a designaçãode insucesso escolar se reportar às elevadas percentagens de reprovações escolaresverificadas no final <strong>do</strong>s anos lectivos, também existe insucesso escolar nas situações emque a socialização ou a personalidade não foram devidamente desenvolvi<strong>do</strong>s.Para Marchesi e Pérez, o termo insucesso escolar é mais discutível, porquantoencerra várias ideias; em primeiro lugar, a ideia de que o aluno «fracassa<strong>do</strong>» nãoprogrediu praticamente nada, nem no âmbito <strong>do</strong>s seus conhecimentos escolares nem aonível pessoal e social, o que não corresponde em absoluto à realidade. Em segun<strong>do</strong>5


lugar, porque o termo «fracassa<strong>do</strong>» oferece uma imagem negativa <strong>do</strong> aluno ao mesmotempo que centra neste toda a responsabilidade <strong>do</strong> insucesso escolar, esquecen<strong>do</strong> aresponsabilidade “de outros agentes e instituições como as condições sociais, a família,o sistema educativo ou a própria escola” (2004:17). A problemática decorrente destaterminologia suscitou a sua substituição por expressões como “alunos com baixorendimento escolar” ou “alunos que aban<strong>do</strong>nam o sistema educacional sem a pre<strong>para</strong>çãosuficiente”. Contu<strong>do</strong>, uma vez que o termo insucesso escolar, é mais sintético, difundiuserapidamente e a sua substituição parece inviável (ibidem).Também Rovira (in Hernández Gil et al., 2004: 82) refere que a expressãoinsucesso escolar além de traduzir um qualificativo demasia<strong>do</strong> simplista éexcessivamente negativa. Assim, considera o conceito de insucesso escolar “demasia<strong>do</strong>concludente, [visto que] não deixa espaço <strong>para</strong> nuances”(ibidem), ou seja, fala-se defracasso escolar de uma forma global de onde se depreende que o aluno fracassa<strong>do</strong> o éna sua totalidade. Deste mo<strong>do</strong>, tece alguns comentários, <strong>do</strong>s quais é pertinente reter que:i) nem to<strong>do</strong>s os insucessos são iguais, pois ninguém fracassa de to<strong>do</strong> e em tu<strong>do</strong>;ii) um insucesso pode encerrar esforços muito valiosos;iii) um insucesso nem sempre se reveste de um significa<strong>do</strong> catastrófico, quer aonível pessoal quer ao nível social.Para o autor, são estas ilações, que justificam a necessidade de criticar asimplicidade, concludência e negatividade <strong>do</strong> conceito.Segun<strong>do</strong> Bondal (2003:7), a preocupação com a definição de insucesso escolarsurge aliada à tentativa de explicação <strong>do</strong> fenómeno, a qual é efectuada de formagrosseira, uma vez que se confundem os sintomas com as causas. A título de exemplo,salienta a relação que se estabelece entre a incorporação de imigrantes nas escolas e obaixo rendimento académico, ou o alargamento <strong>do</strong> ensino obrigatório e a automáticaqueda da qualidade <strong>do</strong> ensino. A dificuldade interpretativa manifestada por estesautores, encontra-se assim patente na dualidade de critérios que cada um apresenta nadefinição <strong>do</strong> conceito de insucesso escolar assim como nos indica<strong>do</strong>res selecciona<strong>do</strong>s<strong>para</strong> a sua qualificação.4. Os Indica<strong>do</strong>res <strong>do</strong> <strong>Insucesso</strong> <strong>Escolar</strong>Ao observarmos os da<strong>do</strong>s sobre o insucesso escolar divulga<strong>do</strong>s pela Eurydice (inPEPT 2000, 1995: 46-49), constatamos que não é utiliza<strong>do</strong> apenas um indica<strong>do</strong>r <strong>para</strong>6


este fenómeno, mas vários indica<strong>do</strong>res, tais como os exames, as reprovações, osaban<strong>do</strong>nos da escolaridade e os atrasos.Na Dinamarca a retenção não se pratica ao longo <strong>do</strong>s nove anos deescolaridade, pelo que a expressão insucesso escolar significa o desequilíbrio existenteentre as capacidades e aptidões <strong>do</strong>s alunos face ao benefício que estes retiram <strong>do</strong> ensino.Assim, o aban<strong>do</strong>no <strong>do</strong> sistema escolar no final da escolaridade obrigatória é neste casosinónimo de insucesso escolar.No País de Gales e na Irlanda <strong>do</strong> Norte o conceito de insucesso escolar nãoexiste, utilizan<strong>do</strong>-se o termo under-achieving, enquanto na Irlanda a expressãoutilizada é no achievers ou lower achievers, que em ambas as situações significa aincapacidade que o aluno manifesta no desenvolvimento das suas competênciasindividuais.A inexistência deste conceito também se verifica na Escócia, onde é substituí<strong>do</strong>por dificuldades de aprendizagem causadas quer por planos de estu<strong>do</strong> ou meto<strong>do</strong>logiasde ensino inadequadas, quer por um handicap mental, físico, emocional ou social porparte <strong>do</strong>s alunos. Contu<strong>do</strong>, o insucesso escolar quantifica<strong>do</strong> através <strong>do</strong> número dealunos que se mantém no sistema escolar após a idade de conclusão da escolaridadeobrigatória.Assim, nos países onde não se pratica a retenção, o insucesso <strong>do</strong>s alunos édefini<strong>do</strong> por um défice de desenvolvimento pessoal ou pela ausência de progressosindividuais.Os restantes países da União Europeia mantinham nesta data, sistemas de ensinocom exames que pressupunham uma avaliação selectiva. O insucesso escolar é aquidefini<strong>do</strong> em termos de retenção, de saídas <strong>do</strong> sistema sem diploma ou de aban<strong>do</strong>noescolar (idem.49).Na Alemanha, embora o insucesso não se encontre claramente defini<strong>do</strong>, a suaestimativa é efectuada através das taxas de retenção e de aban<strong>do</strong>no escolar. É também apartir destas duas taxas que o insucesso escolar é contabiliza<strong>do</strong> em Itália, embora nestepaís o termo dispersione scolastica seja defini<strong>do</strong> como a incapacidade <strong>do</strong> aluno adquiriros conhecimentos básicos.O sistema francês entende o insucesso escolar em termos de saídas <strong>do</strong> sistemaeducativo sem qualquer qualificação, e a sua quantificação tem como base asdificuldades de aprendizagem que impedem os alunos de, numa determinada idade,atingirem as competências e conhecimentos exigi<strong>do</strong>s. Aqui, o indica<strong>do</strong>r utiliza<strong>do</strong> <strong>para</strong>7


medir o insucesso escolar é, tal como na Bélgica, a taxa de retenção. Neste último país oinsucesso escolar é também defini<strong>do</strong> em termos de objectivos cognitivos não atingi<strong>do</strong>s.A dificuldade em atingir os objectivos defini<strong>do</strong>s <strong>para</strong> o ensino básico éigualmente utilizada em Espanha <strong>para</strong> definir insucesso escolar. Na Grécia oinsucesso, tal como o entendemos no nosso país, está associa<strong>do</strong> ao nível dedesenvolvimento <strong>do</strong>s alunos, estima<strong>do</strong> através de diferentes modalidades de avaliaçãoque têm por referência as metas e objectivos curriculares defini<strong>do</strong>s. Neste caso, oinsucesso escolar exprime-se em taxas de analfabetismo e de aban<strong>do</strong>no.Em Portugal, o conceito não se distancia das definições apresentadas pelosoutros países da União Europeia, visto que se entende o insucesso escolar “como aincapacidade que o aluno revela de atingir os objectivos globais defini<strong>do</strong>s <strong>para</strong> cadaciclo de estu<strong>do</strong>s”(idem: 47). Esses objectivos são defini<strong>do</strong>s através de um processo deavaliação, que no ensino básico “consiste na verificação <strong>do</strong> grau de cumprimento <strong>do</strong>sobjectivos gerais defini<strong>do</strong>s a nível nacional <strong>para</strong> cada um <strong>do</strong>s ciclos de escolaridade e<strong>do</strong>s objectivos específicos de cada disciplina ou área disciplinar (…)”. 2 No queconcerne aos indica<strong>do</strong>res utiliza<strong>do</strong>s salientam-se, além das taxas de retenção, as deaban<strong>do</strong>no e de insucesso nos exames.Uma vez que o insucesso escolar aparece defini<strong>do</strong> por estes indica<strong>do</strong>res, parecenoslegítimo equacionar, se eles serão, de facto, os únicos utilizáveis <strong>para</strong> avaliar aquestão. Ou seja, tal como equacionam Cortesão e Torres (1990: 34), se por decretofosse determina<strong>do</strong> que to<strong>do</strong>s os alunos passassem de ano, isto é, se administrativamentefosse decidida a passagem <strong>para</strong> to<strong>do</strong>s os alunos, seria possível concluir que o anoescolar tinha si<strong>do</strong> um êxito? Concluiríamos que to<strong>do</strong>s os objectivos de aprendizagemtinham si<strong>do</strong> atingi<strong>do</strong>s e que não tinha havi<strong>do</strong> insucesso escolar?Em termos globais europeus, as discrepâncias face às descrições apresentadaspelos diferentes Esta<strong>do</strong>s tornam evidente a relatividade <strong>do</strong> conceito, que varia emfunção <strong>do</strong> sistema educativo implementa<strong>do</strong>, das tradições educativas, das exigênciascurriculares e das modalidades de avaliação. Deste mo<strong>do</strong>, falar de insucesso escolarsignifica valorizar aspectos que condicionam negativa ou positivamente o fenómeno,em conformidade com determina<strong>do</strong> contexto educativo.2 Roteiro <strong>do</strong> Ano <strong>Escolar</strong> 1995-1996, Organização e Gestão <strong>do</strong>s Estabelecimentos de Ensino,Ministério da Educação, p. 85.8


Assim, o insucesso escolar poderá ser analisa<strong>do</strong> não apenas como um indica<strong>do</strong>rdas funções e funcionamento <strong>do</strong> sistema de ensino (Benavente, 1990), mas tambémcomo um efeito <strong>do</strong>s Sistemas (Roazzi e Almeida, 1988).Contu<strong>do</strong>, convém reter que, qualquer que seja a definição e o indica<strong>do</strong>r que seseleccione, as altas taxas de insucesso escolar têm impactos graves nos alunos e nasociedade (Marchezi et al.2004:18). Além da repetência, variável facilmentequantificável, Benavente salienta que mesmo após a conclusão da escolaridadeobrigatória, a não prossecução <strong>do</strong>s estu<strong>do</strong>s também constitui uma forma de insucesso,visto que “um aluno acaba por não retirar <strong>do</strong> sistema de ensino tu<strong>do</strong> o que ele podeoferecer e que (…) teria capacidade <strong>para</strong> obter” (1976: 10). Ou seja, o conceito deinsucesso escolar não pode limitar-se aos indica<strong>do</strong>res objectiváveis.5. INSUCESSO ESCOLAR -FENÓMENO MULTIFACETADOUma vez que se nos afigura impossível encontrar uma definição consensual <strong>para</strong>o insucesso escolar, depreendemos que este fenómeno é tão diversifica<strong>do</strong> que não opermite. Assim, optámos por descrever as suas múltiplas e distintas análises, no senti<strong>do</strong>em que cada qual contribui <strong>para</strong> um ângulo de visão deste conceito consoante o enfoqueque faz dele.Chansou e Mannoni (1970) apontam a existência de <strong>do</strong>is tipos de insucessoescolar que devem ser dissocia<strong>do</strong>s: o insucesso parcial ou selectivo, referente apenas auma ou mais disciplinas, mas sempre circunscrito a uma parte <strong>do</strong> currículo, e oinsucesso generaliza<strong>do</strong>, referente à maioria ou a todas as disciplinas necessárias <strong>para</strong> aprogressão de ano.Para Pires (1988) o insucesso escolar é também equaciona<strong>do</strong> segun<strong>do</strong> duasperspectivas distintas: o visível, porquanto se trata de um insucesso escolar produzi<strong>do</strong>em termos quantitativos através de reprovações, repetências e aban<strong>do</strong>nos e o invisível,expresso em termos qualitativos, como as frustrações individuais, a formaçãoinadequada e o alheamento face à pre<strong>para</strong>ção <strong>para</strong> a participação democrática.No entender de Fernandes (1991:187-188), a educação escolar tem comofinalidades instruir, estimular e socializar os educan<strong>do</strong>s, ou seja, visa a aquisição dedetermina<strong>do</strong>s conhecimentos, onde se incluem o desenvolvimento da personalidade e ainteriorização de determinadas condutas e valores. Se algum destes objectivos, que9


constituem as dimensões da educação, não é atingi<strong>do</strong> pode dizer-se que há insucesso naeducação escolar.Em síntese, o insucesso escolar surge quan<strong>do</strong> algum ou alguns <strong>do</strong>s objectivos daeducação escolar não são alcança<strong>do</strong>s. Deste mo<strong>do</strong>, a percentagem de reprovações é, porsi só insuficiente <strong>para</strong> caracterizar o insucesso escolar, pois apenas nos indica que houveinsucesso em relação à instrução, mas não nos permite concluir se este insucessotambém se verifica nas outras dimensões educativas (idem: 188).Embora o significa<strong>do</strong> mais habitual de insucesso escolar seja o que se refere aum baixo rendimento académico ou ao aban<strong>do</strong>no prematuro <strong>do</strong>s estu<strong>do</strong>s, essa acepçãonão é de mo<strong>do</strong> algum a única, pois podemos encontrar situações de insucesso escolarnos alunos:i) que não se conseguem adaptar às normas das escolas;ii) que não conseguem manter o seu comportamento dentro <strong>do</strong>s limites que acomunidade escolar estabelece (onde se enquadram aqueles que são violentos, rui<strong>do</strong>sos,mal-educa<strong>do</strong>s ou conversa<strong>do</strong>res);iii) que são pouco trabalha<strong>do</strong>res. 3Podemos também falar de insucesso na própria instituição escolar quan<strong>do</strong>:i) o aproveitamento <strong>do</strong>s alunos é baixo;ii) a adaptação social <strong>do</strong>s alunos é deficiente;iii) se destrói a auto-estima <strong>do</strong>s alunos.De acor<strong>do</strong> com os itens supra menciona<strong>do</strong>s, o insucesso escolar assume “trêsdimensões que se criam e se reforçam mutuamente”(idem, 2004: 83).Uma dicotomia face ao insucesso é também enunciada por Chiland ( inMedeiros, 1993: 65-66) ao referir como duas realidades distintas, o insucesso escolarconstante desde o início e o insucesso pontual, visto que enquanto o primeiro resulta deuma desorganização da personalidade, o segun<strong>do</strong> representa apenas uma ruptura nacontinuidade. Considera que o insucesso escolar é uma variável determinada em funçãode outras, entre as quais a própria definição de insucesso escolar, o nível de expectativasde um Sistema de Ensino, o grau de proficiência mínimo em função <strong>do</strong>s conteú<strong>do</strong>sprogramáticos, <strong>do</strong>s objectivos e <strong>do</strong> sistema de avaliação veicula<strong>do</strong>. Deste mo<strong>do</strong>,idênticas taxas de reprovação poderão significar índices diferencia<strong>do</strong>s.3 Sobre esta temática, baseámo-nos em José Maria Puig Rovira, “Educação em Valores eFracasso <strong>Escolar</strong>”…p. 83.10


Chiland acrescenta que o sistema clássico de classificação fabrica o insucessovisto que não contempla os progressos <strong>do</strong>s indivíduos, mas apenas a classificação final.Neste senti<strong>do</strong>, também Avanzini considera que os insucessos não são to<strong>do</strong>s iguais, pois“há insucessos parciais, globais e de gravidade vária” (s.d.:19).Face a esta problemática, podemos inferir que o insucesso escolar visível temconsequências imediatas que se exprimem institucionalmente, sobretu<strong>do</strong> em fenómenosde repetência e de aban<strong>do</strong>no precoce <strong>do</strong> sistema educativo, embora seja ainda deconsiderar o insucesso escolar vela<strong>do</strong> (Cortesão e Torres, 1990: 68), geralmente deconsequências não imediatas e que se manifesta por sintomas extra-instucionais. Estessintomas vela<strong>do</strong>s e não quantifica<strong>do</strong>s, mas também sintomáticos de insucesso escolar,traduzem-se em alguns comportamentos que podemos destacar:i) o aluno não gosta da escola;ii) o aluno não se integra;iii) o aluno recusa a relação pedagógica;iv) o aluno é agressivo e destrui<strong>do</strong>r;v) o aluno aliena-se <strong>do</strong> meio escolar;Qualquer um <strong>do</strong>s aspectos referencia<strong>do</strong>s nas alíneas anteriores (adapta<strong>do</strong> deCortesão e Torres, 1990: 68-70) poderá eventualmente ser consequência <strong>do</strong>s aspectosque a seguir enunciamos:i) o aluno não aprendeu a construir a sua própria aprendizagem e a conhecer assuas necessidades de formação;ii) o aluno pensa que a sua formação é inútil, sem relação com os seus projectos;iii) o aluno não encontra na escola a formação que pretende;iv) o aluno pensa que a sua formação está acabada;v) o emprego/profissão que pretende, não se coadunam com os conhecimentosque a escola transmite.Embora o conceito de insucesso escolar traduza o não atingir de metas no final<strong>do</strong>s ciclos, dentro <strong>do</strong>s limites temporais estabeleci<strong>do</strong>s, fenómeno que na prática sereflecte nos valores das taxas de reprovação/retenção, repetência e aban<strong>do</strong>no escolar,existe um outro tipo de insucesso, não quantificável, mas mais nefasto. Este refere-se àdesadequação entre os conteú<strong>do</strong>s transmiti<strong>do</strong>s na escola, as aspirações <strong>do</strong>s alunos e anão conjugação destes factores com as necessidades <strong>do</strong> sistema social e <strong>do</strong>s seussubsistemas de emprego/trabalho (Martins e Paixão, s.d.).11


Para estes autores, o insucesso não quantificável pode ser “ilustra<strong>do</strong>” através deum conjunto de questões, que têm como ponto de partida saber se os alunos que chegamao fim de uma etapa escolar estão pre<strong>para</strong><strong>do</strong>s <strong>para</strong> uma série de situações, tais como:i) ingressar nos níveis imediatos de ensino;ii) desempenhar funções no mun<strong>do</strong> <strong>do</strong> trabalho (no caso da conclusão <strong>do</strong> 9º anode escolaridade);iii) aprender por si a aprender;iv) compreender os fenómenos culturais, políticos e ideológicos <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> e,mais especificamente, <strong>do</strong> país onde vivem.Outro tipo de questões serão aquelas onde podemos equacionar se existeadequação entre as aspirações <strong>do</strong>s alunos e:i) os conteú<strong>do</strong>s transmiti<strong>do</strong>s na escola;ii) as metas socialmente propostas/ “impostas”;iii) o tipo de saídas e as características <strong>do</strong>s empregos.Podemos então falar de <strong>do</strong>is tipos de insucesso escolar: um, em que há umaredução <strong>do</strong> conceito à quantificação de um da<strong>do</strong> fenómeno observável e de algumaforma determina<strong>do</strong> pela escola; outro mais complexo e de difícil quantificação, que seprende com o não atingir das metas individuais e sociais, de acor<strong>do</strong> com as aspirações<strong>do</strong>s alunos e as necessidades <strong>do</strong>s sistemas envolventes.Este segun<strong>do</strong> tipo de insucesso parece-nos o mais preocupante, visto que a suanão quantificação impossibilita-nos a avaliação das reais proporções que atinge, emborasó possa ser equaciona<strong>do</strong> por referência ao insucesso escolar quantificável.Por seu turno, as classificações atribuídas aos alunos, referenciam cada umdeles ao contexto global da turma. e, neste senti<strong>do</strong>, é também considera<strong>do</strong> sem sucessoo aluno “cujas notas são geralmente inferiores à média e que se situa na cauda daclasse”(Avanzini, s.d.:19). Verifica-se assim a ausência de objectividade dasclassificações, na medida em que estas “não reflectem exclusivamente o valor objectivo<strong>do</strong> trabalho, mas também a subjectividade de quem o analisa […]”(idem:20).Para Ferraro insucesso escolar e exclusão são conceitos que representam <strong>do</strong>isolhares sobre as mesmas situações, visto que incluem quer os que não têm acesso àescola, quer “aqueles que, ainda dentro <strong>do</strong> sistema de ensino, [são] objecto de exclusãono próprio processo de ensino através da reprovação e repetência e estão sen<strong>do</strong> assimpre<strong>para</strong><strong>do</strong>s <strong>para</strong> posterior exclusão <strong>do</strong> processo” (in Marchesi et al., 2004: 48-49). Nestecontexto, refere a existência de uma dupla forma de exclusão escolar – a exclusão da12


escola e a exclusão na escola. Enquanto a primeira se reporta à não frequência daescola, a segunda, a exclusão na escola, apresenta dimensões mais graves, pois resultada acção <strong>do</strong>s mecanismos de reprovação e repetência (idem:63).6. INSUCESSO ESCOLAR – A QUEM IMPUTAR A RESPONSABILIDADE?Habitualmente o insucesso é imputa<strong>do</strong> aos alunos, fican<strong>do</strong> por norma os factoresque o provocam, fora <strong>do</strong> seu controle e da sua responsabilidade. Neste contexto,devemos equacionar quem fracassa na realidade: fracassam os indivíduos, ou fracassa asociedade, a escola e as políticas educativas?Torna-se pois, difícil, delimitar as responsabilidades de fenómenos como oinsucesso escolar, porque estamos diante de um problema complexo se produz deacor<strong>do</strong> com uma causalidade complexa (Morin in Rovira, 2004: 84).Ou seja, o insucesso escolar é o resulta<strong>do</strong> de um conjunto de factores que actuamde mo<strong>do</strong> coordena<strong>do</strong>, já que nenhum deles isoladamente o conseguiria provocar(ibidem). No insucesso escolar estão implica<strong>do</strong>s factores sociais e culturais que actuamjuntos (Palácios in Hernández Gil, et al., 2004:76). Assim, a conjunção decaracterísticas individuais, nomeadamente ao nível de experiências educativas, aconstituição de um choque entre a cultura escolar e a familiar, bem como as influênciasde outros factores sociais e culturais mais amplos conspirararam <strong>para</strong> tornar altamenteprovável a experiência <strong>do</strong> insucesso. Contu<strong>do</strong>, a experiência <strong>do</strong> insucesso escolar nãopressupõe a coexistência de to<strong>do</strong>s estes factores.Para Morin (in Rovira, 2004: 84) são as situações sociais, familiares e escolaresque actuam entrelaçan<strong>do</strong>-se e provocan<strong>do</strong> o insucesso escolar. Uma vez que o insucessoe o êxito escolares, são produto da interacção entre as estruturas familiares, motivadaspor contextos económicos, sociais, culturais, e ainda por formas de vida escolarpresentes num determina<strong>do</strong> perío<strong>do</strong> de tempo, isto significa que uma política de lutacontra o insucesso escolar não se pode constituir através da implantação de dispositivosisola<strong>do</strong>s.Também Lahire (2004: 74) se interroga acerca da responsabilidade <strong>do</strong> insucessoescolar relativamente à sua origem: a escola, as famílias, o Esta<strong>do</strong>, ou o sistemaeconómico.Para Benavente (s.d.:1) a questão <strong>do</strong> insucesso escolar pressupõe a coexistênciade inúmeros factores que incluem as políticas educativas, as questões de aprendizagem,13


os conteú<strong>do</strong>s e mesmo a relação pedagógica que se estabelece. Contu<strong>do</strong>, a ênfase residenas contradições 4 que os alunos são incapazes de resolver, nomeadamente:i) entre a escola e a realidade em que vivem;ii) entre as aprendizagens exigidas pela escola e as que fazem na família e nomeio social;iii) entre as aspirações, normas e valores da família e as exigidas pela escola;Segun<strong>do</strong> Cortesão e Torres (1990: 24) é fácil dizer que os alunos não estudam,que vêm mal pre<strong>para</strong><strong>do</strong>s ou que não se interessam. Por seu turno, uma vez que ninguémassume a culpa, o discurso mais comum é o <strong>do</strong> professor universitário que culpa o <strong>do</strong>secundário, enquanto que este culpa os <strong>do</strong>s níveis anteriores. Assim, os professores <strong>do</strong>primeiro ciclo culpam os programas, as novas meto<strong>do</strong>logias, a falta de inteligência <strong>do</strong>salunos, ou atribuem a culpa aos pais que definem como “pouco cultos” (ibidem).Medeiros (1993: 59) corrobora esta proposição acrescentan<strong>do</strong> que <strong>para</strong> osprofessores o insucesso escolar advêm da falta de bases, de motivações, de capacidades<strong>do</strong>s alunos ou <strong>do</strong> disfuncionamento das estruturas educativas, familiares e sociais,enquanto que <strong>para</strong> os pais e público em geral, a responsabilidade <strong>do</strong> insucesso recai nosprofessores, aos quais são aponta<strong>do</strong>s aspectos que se prendem essencialmente com asfaltas, a desmotivação ou ainda a sua deficiente formação.Situan<strong>do</strong>-se numa perspectiva reprodutiva, Iturra (s.d.:1) considera que oinsucesso escolar é um facto deriva<strong>do</strong> de um processo histórico, onde um conhecimentopassa a ser <strong>do</strong>minante num determina<strong>do</strong> grupo social. 5Posição similar tem Benavente, <strong>para</strong> quem o insucesso escolar não é um defeito<strong>do</strong> funcionamento <strong>do</strong> sistema escolar, mas um objectivo conti<strong>do</strong> na instituição escolar,visto que “ a escola está (…) ao serviço das classes médias e superiores e funcionacomo objecto de legitimação <strong>do</strong>s privilégios sociais” (1976:71).Face a estas proposições consideramos que todas as instâncias decorrentes dascircunstâncias sociais, económicas e políticas, têm a sua quota-parte deresponsabilidade, pois o problema <strong>do</strong> insucesso escolar possui múltiplas causas erepercussões, pelo que, qualquer análise que reduza o problema a um único factorcasual é, sem dúvida, uma análise limitada.4 Sobre esta temática, baseámo-nos nos itens assinala<strong>do</strong>s por Ana Benavente, A Escola naSociedade de Classes…p.46.5 Raul Iturra, Revista “Ágora” nº2, p.1, s.d.14


Em conclusão, consideramos que o insucesso escolar constitui uma realidadecomplexa, multideterminada e multifacetada, porquanto encerra aspectos qualitativosmuito diversos e ainda os invisíveis que se equi<strong>para</strong>m a sucesso. Deste mo<strong>do</strong>, oinsucesso escolar é um fenómeno cuja compartimentação apenas poderá ser efectuada,numa perspectiva de facilitismo <strong>para</strong> efeitos de análise, visto que nenhum elementopode ser considera<strong>do</strong> isoladamente.BibliografiaAVANZINI, Guy. (s.d.). O <strong>Insucesso</strong> <strong>Escolar</strong>, Lisboa : Editorial Pórtico.BENAVENTE, Ana. (1976). A Escola na Sociedade de Classes, Lisboa : Livros Horizonte.BENAVENTE, Ana. (1990). <strong>Insucesso</strong> <strong>Escolar</strong> no Contexto Português- Abordagens,Concepções e Políticas nº1, Lisboa: Cadernos de Pesquisa e de Intervenção, pp.1-40. .CHANSOU, M. (1970).“ L’ Échec Scolaire” in Pédagogie, nºs 2-3, Paris, pp. 144-149.CORTESÃO, Luísa ; TORRES, Maria Arminda. (1990) Avaliação Pedagógica I <strong>Insucesso</strong><strong>Escolar</strong>, 4ª ed., Col. Ser Professor, Porto: Porto Editora.COSTA, J.A. ; MELO, A. S. (1989). Dicionário de Língua Portuguesa, 6ª ed., Porto:Porto Editora.FERNANDES, António Sousa, (1991). “O <strong>Insucesso</strong> <strong>Escolar</strong>” in A Construção Social da Educação<strong>Escolar</strong>, Col. Biblioteca Básica de Educação e Ensino, / Clube <strong>do</strong> Professor, Rio Tinto: EdiçõesASA, pp. 187-232.FERRARO, Alceu Ravanello (2004). “<strong>Escolar</strong>ização no Brasil na Ótica da Exclusão” in ÁlvaroMarchesi ; Carlos Hernandéz Gil, et al., Fracasso <strong>Escolar</strong> - Uma Perspectiva Multicultural,, Porto Alegre, Brasil,: Artmed Editora, pp.48-65.FONTINHA, R. (s.d.) Novo Dicionário Etimológico de Língua Portuguesa, Porto:Domingos Barreira.FORMOSINHO, João, (1991). “A Igualdade em Educação” in A Construção Social da Educação<strong>Escolar</strong>” Col. Biblioteca Básica de Educação e Ensino, / Clube <strong>do</strong> Professor, Rio Tinto,:Edições ASA, pp. 169-186.LAHIRE, Bernard, (2004). “As Origens da Desigualdade <strong>Escolar</strong>” in Álvaro Marchesi ; CarlosHernandez Gil, et al., Fracasso <strong>Escolar</strong>-Uma Perspectiva Multicultural, Artmed Editora,Porto Alegre, Brasil,: Artmed Editora, pp. 67-75.MACHADO, J. P. (1977). Dicionário Etimológico de Língua Portuguesa, 3ª edição, , Lisboa: LivrosHorizonte.MANNONI, P. (1979). “ Signification Psychologique de L’Échec Scolaire » in Troubles Scolaires etVie Afective Chez L’ A<strong>do</strong>lescent, Paris: Editions E.S.F.15


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