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A teoria dos atos de fala como um método para os historiadores ...

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REVISTA LITTERIS ISSN 1983 7429 Número 4, Março <strong>de</strong> 2010.A <strong>teoria</strong> <strong>d<strong>os</strong></strong> <strong>at<strong>os</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>fala</strong> <strong>como</strong> <strong>um</strong> método <strong>para</strong> a interpretação <strong>de</strong> text<strong>os</strong>Deise Simões Rodrigues 1 (UFOP)Res<strong>um</strong>oPrimeiramente, o artigo trata-se <strong>de</strong> <strong>um</strong>a exp<strong>os</strong>ição da <strong>teoria</strong> <strong>d<strong>os</strong></strong> <strong>at<strong>os</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>fala</strong>,levantando, principalmente, as categorias <strong>de</strong> análise <strong>de</strong> John Langshaw Austin. Emseguida, preten<strong>de</strong>-se <strong>de</strong>monstrar a partir das consi<strong>de</strong>rações <strong>de</strong> dois <strong>historiadores</strong> docampo <strong>d<strong>os</strong></strong> discurs<strong>os</strong>, Quentin Skinner e John Pocock, a problemática da aplicação da<strong>teoria</strong> no método <strong>de</strong> trabalho daqueles que se <strong>de</strong>dicam à interpretação <strong>de</strong> text<strong>os</strong>.Palavras-Chave: Fil<strong>os</strong>ofia da linguagem; At<strong>os</strong> <strong>de</strong> Fala; Historiadores; Text<strong>os</strong>;Interpretação.AbstractFirstly, the paper treaat about an exhibition of the speech acts theory, getting up,mainly, the John Langshaw Austin analysis categories. Soon afterwards, it intends to<strong>de</strong>monstrate starting from the two historians consi<strong>de</strong>rations of the speeches field,Quentin Skinner and John Pocock, the application problematic of the theory in the workmethod of th<strong>os</strong>e who are <strong>de</strong>voted to the texts interpretation.Keywords: Phil<strong>os</strong>ophy of language; Speechs acts; Historians; Texts; Interpretation.IntroduçãoA <strong>teoria</strong> <strong>d<strong>os</strong></strong> <strong>at<strong>os</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>fala</strong> situa-se <strong>de</strong>ntro da chamada “virada lingüística” <strong>d<strong>os</strong></strong>éculo XX, sua gênese insere-se na tradição britânica da fil<strong>os</strong>ofia analítica inauguradapor G.E.Moore, B.Russell e L.Wittgenstein nas primeiras décadas do século XX, reaçãocontra o empirismo e o i<strong>de</strong>alismo absoluto. Nessa tradição <strong>de</strong> pensamento a questãocentral da investigação do conhecimento discute <strong>como</strong> po<strong>de</strong> <strong>um</strong>a sentença tersignificado (SOUZA FILHO, 1990, p.7). Ao contato com essas mudanças <strong>um</strong>a parcelada historiografia apontava <strong>para</strong> <strong>um</strong> abandono da história do pensamento e das idéiasr<strong>um</strong>o a algo bastante diferente, por isso a expressão história do discurso <strong>como</strong> aterminologia mais apropriada no momento, mesmo não isenta <strong>de</strong> problemas (POCOCK,2003, p.24).1 A autora é mestranda do Programa <strong>de</strong> Pós-Graduação em História da Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> OuroPreto e professora <strong>de</strong> história efetiva da re<strong>de</strong> estadual <strong>de</strong> Minas Gerais.email: <strong>de</strong>iseouropreto@yahoo.com.br


REVISTA LITTERIS ISSN 1983 7429 Número 4, Março <strong>de</strong> 2010.Na história do movimento <strong>de</strong>ssa práxis <strong>de</strong>stacar-se-iam dois grup<strong>os</strong>, <strong>um</strong> centradoem Cambrig<strong>de</strong> na década <strong>de</strong> 1950, no qual as análises lingüísticas são adotadas poralguns filósof<strong>os</strong> que tendiam a apresentar <strong>os</strong> pensament<strong>os</strong> <strong>como</strong> prop<strong>os</strong>ições querequerem <strong>um</strong> número limitado <strong>de</strong> mo<strong>d<strong>os</strong></strong> <strong>de</strong> validação. Outr<strong>os</strong> <strong>de</strong>senvolvem a <strong>teoria</strong> <strong>d<strong>os</strong></strong><strong>at<strong>os</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>fala</strong> ou discurso em Oxford apresentando <strong>os</strong> pensament<strong>os</strong> <strong>como</strong> elocuçõesatuantes sobre aqueles que as ouvem, e até mesmo sobre aqueles que enunciam(POCOCK, 2003, p.24). A abordagem seguinte trata com ênfase maior as p<strong>os</strong>içõesteóricas <strong>de</strong>sse segundo grupo.Aprofundando esses estu<strong>d<strong>os</strong></strong> no campo da linguagem, o filósofo inglês JohnLangshaw Austin refletirá na obra How to do things with words <strong>um</strong> <strong>d<strong>os</strong></strong> problemas maisimportantes da ética: a responsabilida<strong>de</strong> que <strong>de</strong>corre da ação. Trará <strong>de</strong>ssa forma <strong>um</strong>acontribuição ao tratar precisamente <strong>de</strong> <strong>um</strong>a <strong>teoria</strong> sobre a natureza da linguagemenquanto <strong>um</strong>a forma <strong>de</strong> realizar <strong>at<strong>os</strong></strong>: <strong>os</strong> <strong>at<strong>os</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>fala</strong>. O conceito do ato <strong>de</strong> <strong>fala</strong> po<strong>de</strong> sercompreendido <strong>como</strong> a interação comunicativa propriamente dita, tendo <strong>um</strong> carátercontratual ou <strong>de</strong> compromisso entre partes, estabelecendo <strong>um</strong> conjunto <strong>de</strong> regras do usoda linguagem. O problema passará a ser do „campo semântico‟:[...] levando-se em conta quando, <strong>como</strong>, por que e por quem<strong>de</strong>terminadas expressões po<strong>de</strong>m ser usadas e outras não [...] elaborasecaracterísticas básicas das p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> uso, que fornecem <strong>os</strong>element<strong>os</strong> <strong>para</strong> a <strong>de</strong>terminação do significado e conseqüentemente<strong>para</strong> o estabelecimento ou elucidação <strong>d<strong>os</strong></strong> term<strong>os</strong> (SOUZA FILHO,1990, p. 9).Uma análise nessa perspectiva <strong>de</strong>ve consi<strong>de</strong>rar a situação no sentido que faz <strong>os</strong>us<strong>os</strong> da palavra ou da expressão, levando em conta o contexto <strong>de</strong>sse uso e <strong>os</strong> element<strong>os</strong>constitutiv<strong>os</strong>. No ato <strong>de</strong> <strong>fala</strong> há <strong>um</strong> exame do que se <strong>de</strong>ve dizer e quando se <strong>de</strong>ve fazê-lo,sobre quais palavras <strong>de</strong>vem-se usar em <strong>de</strong>terminadas situações. Não se examinasimplesmente palavras ou „significa<strong>d<strong>os</strong></strong>‟, mas, sobretudo a realida<strong>de</strong> sobre a qual<strong>fala</strong>m<strong>os</strong> ao usar estas palavras <strong>para</strong> aguçar n<strong>os</strong>sa percepção <strong>d<strong>os</strong></strong> fenômen<strong>os</strong> (AUSTINApud. SOUZA FILHO, 1990, p.10). O ato <strong>de</strong> <strong>fala</strong> seria <strong>um</strong> raciocínio voluntário quepertence às regras <strong>d<strong>os</strong></strong> jog<strong>os</strong> <strong>de</strong> linguagem.Isso significa que quando se analisa a linguagem é necessário investigar ocontexto social e cultural no qual ela é usada, as práticas sociais, <strong>os</strong> <strong>para</strong>digmas evalores, a „racionalida<strong>de</strong>‟, enfim, element<strong>os</strong> <strong>os</strong> quais a linguagem é indissociável, já que


REVISTA LITTERIS ISSN 1983 7429 Número 4, Março <strong>de</strong> 2010.é colocada sob o ponto <strong>de</strong> vista <strong>de</strong>la em si mesma ser <strong>um</strong>a prática social. Uma„realida<strong>de</strong>‟ é constituída exatamente pela linguagem que adquirim<strong>os</strong> e empregam<strong>os</strong>.Estabelece-se o <strong>para</strong>digma teórico que consi<strong>de</strong>ra a linguagem <strong>como</strong> ação, <strong>como</strong> forma<strong>de</strong> atuação sobre o real, e, portanto <strong>de</strong> constituição do real, e não meramente <strong>de</strong>representação ou correspondência com a realida<strong>de</strong>.A linguagem é entendida essencialmente <strong>como</strong> forma <strong>de</strong> ação e não <strong>de</strong>representação da realida<strong>de</strong>. As condições <strong>de</strong> uso <strong>de</strong>terminam à concepção <strong>de</strong> linguagem<strong>como</strong> <strong>um</strong> complexo que envolve element<strong>os</strong> do contexto, convenções <strong>de</strong> uso e intenções<strong>d<strong>os</strong></strong> <strong>fala</strong>ntes. A investigação da linguagem <strong>de</strong>ve realizar-se com base na <strong>teoria</strong> da ação.Assim, a prop<strong>os</strong>ta metodológica passa por <strong>um</strong>a análise conceitual, interpretando oconceito <strong>como</strong> expressão lingüística e não <strong>como</strong> entida<strong>de</strong> mental ou objeto lógico,elucidando a partir das condições <strong>de</strong> uso da expressão. A análise do ato <strong>de</strong> <strong>fala</strong>concentra no uso da linguagem em <strong>um</strong> <strong>de</strong>terminado contexto, com <strong>um</strong>a <strong>de</strong>terminadafinalida<strong>de</strong> e <strong>de</strong> acordo com certas normas e convenções (SOUZA FILHO, 1990, p.11).Entendida a conceituação da <strong>teoria</strong> <strong>d<strong>os</strong></strong> <strong>at<strong>os</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>fala</strong> <strong>os</strong> <strong>historiadores</strong> dopensamento político e dit<strong>os</strong> da história intelectual têm interesse na aplicação empíricada <strong>teoria</strong> na produção historiográfica <strong>de</strong> forma metodológica, no momento que ohistoriador utiliza fontes textuais, o universo <strong>d<strong>os</strong></strong> discurs<strong>os</strong> e sua aproximação com oespaço <strong>de</strong> experiência. A questão do <strong>para</strong>digma teórico que consi<strong>de</strong>ra a linguagem<strong>como</strong> ação, <strong>como</strong> forma <strong>de</strong> atuação sobre o real, e, portanto <strong>de</strong> constituição do real, enão meramente <strong>de</strong> representação ou correspondência com a realida<strong>de</strong>, oferece <strong>um</strong>método <strong>de</strong> analisar text<strong>os</strong>. Atuar sobre o real soa <strong>como</strong> modificar a realida<strong>de</strong>, fazer algo,mudar, transformar. Na <strong>teoria</strong> <strong>d<strong>os</strong></strong> <strong>at<strong>os</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>fala</strong> a linguagem seria <strong>um</strong> instr<strong>um</strong>ento quecapacita à ação <strong>de</strong> <strong>um</strong> sujeito. Sugere que não é p<strong>os</strong>sível realizar certas coisas sem o uso<strong>de</strong> palavras proferidas a partir <strong>de</strong> regras compreendidas a nível coletivo em <strong>um</strong>acomunida<strong>de</strong>. Assim, a linguagem também é real, tomada <strong>para</strong> realizar <strong>at<strong>os</strong></strong>,indispensável ao homem. A tarefa da interpretação <strong>de</strong> text<strong>os</strong> pelo historiador po<strong>de</strong>consistir, nesse sentido em recuperar esta dinâmica no campo da linguagem através dainterpretação <strong>d<strong>os</strong></strong> <strong>at<strong>os</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>fala</strong> n<strong>os</strong> text<strong>os</strong> que utiliza <strong>como</strong> fontes. Ler text<strong>os</strong>, enfim,significará a p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> recuperar a atuação sobre a realida<strong>de</strong>, dada em <strong>um</strong>específico momento.


REVISTA LITTERIS ISSN 1983 7429 Número 4, Março <strong>de</strong> 2010.O <strong>de</strong>senvolvimento da <strong>teoria</strong> <strong>d<strong>os</strong></strong> <strong>at<strong>os</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>fala</strong> e alg<strong>um</strong>as categorias importantesAo <strong>de</strong>senvolver a <strong>teoria</strong> <strong>d<strong>os</strong></strong> <strong>at<strong>os</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>fala</strong> Austin faz <strong>um</strong>a crítica a qual chama <strong>de</strong>„falácia <strong>de</strong>scritiva‟: pensar <strong>de</strong>clarações sem consi<strong>de</strong>rar as circunstâncias em que foramfeitas, às restrições as quais estava sujeita ou a maneira <strong>como</strong> <strong>de</strong>ve ser recebida. A partir<strong>de</strong> alguns exempl<strong>os</strong> da sua obra <strong>de</strong>ixa claro que proferir sentenças (nas circunstânciasapropriadas, evi<strong>de</strong>ntemente) não é <strong>de</strong>screver o ato que estaria praticando ao dizer o quedisse, nem <strong>de</strong>clarar que o pratica e sim, fazê-lo. Às expressões proferidas Austin<strong>de</strong>nominou „performativas‟ <strong>de</strong>riva do verbo inglês to perform, que significa executar,correlato do substantivo „ação‟, dando a idéia <strong>de</strong> que ao emitir <strong>um</strong> proferimento já se fazalgo e não somente se diz algo (1990, p.23-25). Em inglês perguntar o que <strong>um</strong> ator fez éo mesmo que perguntar o que ele pretendia, o que estava tramando, o que pretendiaobter, em s<strong>um</strong>a, quais eram as estratégias intencionais por trás das suas ações(POCOCK, 2003, p.28). A pergunta sobre o que <strong>um</strong> autor estava fazendo po<strong>de</strong> ter <strong>um</strong>ainfinida<strong>de</strong> <strong>de</strong> resp<strong>os</strong>tas, por isso o emprego do termo pretérito imperfeito contínuo noinglês, pois é p<strong>os</strong>sível que o autor não tenha terminado <strong>de</strong> fazer o que „estava fazendo‟.O „estava fazendo‟ tem <strong>um</strong>a preocupação com o tempo presente, se falássem<strong>os</strong> aocontrário “o que teria feito” a preocupação seria com <strong>um</strong> futuro.O po<strong>de</strong>r da linguagem tem atributo <strong>de</strong> continuida<strong>de</strong> e transformação, modificadaem context<strong>os</strong> específic<strong>os</strong> é capaz <strong>de</strong> sobrevivê-l<strong>os</strong>, assim é transmitida e se impõe acontext<strong>os</strong> subseqüentes. O que o autor está fazendo terá resp<strong>os</strong>tas que ele não po<strong>de</strong>prever nem controlar e revelará context<strong>os</strong> diferentes daquele <strong>de</strong> suas enunciações(POCOCK, 2003, p. 30).Na <strong>teoria</strong> <strong>d<strong>os</strong></strong> performativ<strong>os</strong> ainda existe a distinção entre proferiment<strong>os</strong>constativ<strong>os</strong>: constam<strong>os</strong> algo que po<strong>de</strong> ser falso ou verda<strong>de</strong>iro; e proferiment<strong>os</strong>performativ<strong>os</strong>: pel<strong>os</strong> quais realizam<strong>os</strong> ações (pedir, batizar, prometer, proibir, <strong>de</strong>clarar),não po<strong>de</strong>m ser consi<strong>de</strong>ra<strong>d<strong>os</strong></strong> fals<strong>os</strong> ou verda<strong>de</strong>ir<strong>os</strong>, mas sim felizes ou infelizes. Oexemplo dado por Austin é sobre alguém que batiza sem estar autorizado, ou prometesem querer c<strong>um</strong>prir. São ainda explícit<strong>os</strong> quando trazem verb<strong>os</strong> que enunciam <strong>um</strong>sentido por si só ou implícito e que necessitam <strong>de</strong> circunstâncias p<strong>os</strong>teriores <strong>para</strong> <strong>de</strong>finira ação <strong>como</strong> „volto amanhã‟.Sendo assim, Austin tentará esclarecer estabelecendo element<strong>os</strong> que classificam,i<strong>de</strong>ntificam e testam sua <strong>teoria</strong> indagando se o dizer po<strong>de</strong> realizar o ato. Ele interroga se


REVISTA LITTERIS ISSN 1983 7429 Número 4, Março <strong>de</strong> 2010.há p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>um</strong> casamento ser realizado sem nenh<strong>um</strong>a palavra, conclui que„dizer <strong>de</strong>terminadas palavras é casar‟, ou „casar-se, em alguns cas<strong>os</strong>, é simplesmentedizer alg<strong>um</strong>as palavras‟. Assim, no casamento, ao dizer a palavra „aceito‟ estam<strong>os</strong> n<strong>os</strong>casando e não relatando o fato <strong>de</strong> que estam<strong>os</strong> casando. Assim o ato <strong>de</strong> casar <strong>de</strong>ve ser<strong>de</strong>scrito <strong>como</strong> <strong>um</strong> ato <strong>de</strong> dizer certas palavras, e não a realização <strong>de</strong> <strong>um</strong> ato distinto [...].O filósofo insiste ao testar as palavras sempre perguntando se é p<strong>os</strong>sível fazer aquiloque a <strong>fala</strong> ou que foi dito disse, se não usasse a <strong>fala</strong>. Sabe-se que é p<strong>os</strong>sível correr semdizer que corre, mas é p<strong>os</strong>sível batizar, sem dizer: batizo (1990, p.26-79)Reconsi<strong>de</strong>rando a <strong>teoria</strong> Austin discute o problema da verda<strong>de</strong> daquilo que édito. Mesmo quando dizem<strong>os</strong> algo que não se concretiza, não quer dizer que ao dizerseja falso, o que acontece é <strong>um</strong>a ação malograda ou da doutrina das infelicida<strong>de</strong>s.Po<strong>de</strong>m<strong>os</strong> realizar <strong>um</strong> outro ato, que não coinci<strong>de</strong> com o esperado, porém haverá sempre<strong>um</strong> efeito performativo (1990, p.30). Assim, a preocupação não é em analisar operformativo <strong>como</strong> falso ou verda<strong>de</strong>iro e nem com a pretensão do feito e sim com <strong>os</strong>resulta<strong>d<strong>os</strong></strong> e efeit<strong>os</strong>. Acrescenta: “[...] se ao proferir n<strong>os</strong>s<strong>os</strong> performativ<strong>os</strong> estam<strong>os</strong> <strong>de</strong>modo efetivo e em sentido inequívoco „realizando ações‟, então estes performativ<strong>os</strong>enquanto ações estarão sujeit<strong>os</strong> às mesmas <strong>de</strong>ficiências que afetam as ações em geral”(1990, p.35). Mas fora do julgamento <strong>de</strong> verda<strong>de</strong>iro ou falso, o proferimento está sujeitoàs críticas, pela noção <strong>de</strong> „infelicida<strong>de</strong>s‟. As „infelicida<strong>de</strong>s‟ po<strong>de</strong>m ser entendidas <strong>como</strong>más aplicações (1990, p.44).Percebe-se então que as palavras não são exclusivamente aquilo que se necessita<strong>para</strong> a realização <strong>d<strong>os</strong></strong> <strong>at<strong>os</strong></strong>. Condições são necessárias, <strong>de</strong>ve se ter circunstânciasapropriadas, portanto: “A linha divisória entre „pessoas ina<strong>de</strong>quadas‟ e „circunstânciasina<strong>de</strong>quadas‟ não é necessariamente rígida e inflexível”(AUSTIN, 1990, p.44).Asparticularida<strong>de</strong>s da execução, compreensão, efeito do que se <strong>fala</strong> e suas váriasp<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> interpretações <strong>de</strong> se dizer a mesma coisa em ocasiões extremamentedistintas <strong>de</strong>vem ser recuperadas. Quando se diz vá, por exemplo, tanto po<strong>de</strong> ser <strong>um</strong>conselho <strong>como</strong> também <strong>um</strong>a or<strong>de</strong>m. Ainda há a p<strong>os</strong>sibilida<strong>de</strong> do mal-entendido a quema palavra está sendo dirigida (AUSTIN, 1990, p.45).Austin distingue que tal problema é algo que as próprias ações lingüísticasprimitivas previam: “As formas primitivas ou primárias <strong>d<strong>os</strong></strong> proferiment<strong>os</strong> conservam,neste sentido, a “ambigüida<strong>de</strong>”, ou “equívoco”, ou “caráter vago” da linguagem


REVISTA LITTERIS ISSN 1983 7429 Número 4, Março <strong>de</strong> 2010.primitiva” (1990, p.69). Para tanto existem <strong>os</strong> recurs<strong>os</strong> lingüístic<strong>os</strong> <strong>para</strong> o ato <strong>de</strong>proferir que são: o modo, o tom <strong>de</strong> voz, a cadência, a ênfase. Outr<strong>os</strong> recurs<strong>os</strong> são <strong>os</strong>advérbi<strong>os</strong> e expressões adverbiais - na linguagem escrita, usam-se <strong>para</strong> atenuar ouacrescentar a força – e as partículas conectivas que dão sutileza. Enfim, existem <strong>os</strong>element<strong>os</strong> que acompanham o proferimento – gest<strong>os</strong> e as suas circunstâncias. Apesardisso, o problema persiste quando se verifica <strong>os</strong> propósit<strong>os</strong> e as insinuações (1990, p.72).Está <strong>de</strong>finido <strong>para</strong> Austin que em alguns moment<strong>os</strong> <strong>para</strong> realizarm<strong>os</strong> <strong>um</strong> atoutilizam<strong>os</strong> a <strong>fala</strong>. Mas <strong>de</strong> que maneira a estam<strong>os</strong> usando precisamente nesta ocasião?Porque há inúmeras funções ou maneiras <strong>de</strong> utilizarm<strong>os</strong> a <strong>fala</strong>, e faz <strong>um</strong>a gran<strong>de</strong>diferença <strong>para</strong> o n<strong>os</strong>so ato a maneira e o sentido em que estávam<strong>os</strong> „usando‟ a <strong>fala</strong> nessaocasião?Importantes categorias serão elaboradas por Austin com objetivo <strong>de</strong> esclarecerquando consi<strong>de</strong>ram<strong>os</strong> <strong>os</strong> senti<strong>d<strong>os</strong></strong> em que dizer algo é fazer algo. Distinguem-se: o atolocucionário (e <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>le o fonético, o fático e o rético) que tem <strong>um</strong> significado; o atoilocucionário que tem <strong>um</strong>a certa força ao dizer algo; e o ato perlocucionário queconsiste em se obter cert<strong>os</strong> efeit<strong>os</strong> pelo fato <strong>de</strong> se dizer algo. Definindo, o atolocucionário será proferir <strong>de</strong>terminada sentença com <strong>de</strong>terminado sentido e referência, oque, por sua vez, equivale, gr<strong>os</strong>so modo, a “significado” no sentido tradicional do termo.O ato ilocucionário seriam proferiment<strong>os</strong> que têm certa força, quando realizam<strong>os</strong> <strong>at<strong>os</strong></strong><strong>de</strong> informar, or<strong>de</strong>nar, prevenir, avisar, comprometer-se. E por fim, o ato perlocucionárioproduzim<strong>os</strong> porque dizem<strong>os</strong> algo, tais <strong>como</strong> convencer, persuadir, impedir. O atoilocucionário está relacionado com a produção <strong>de</strong> efeit<strong>os</strong> em cert<strong>os</strong> senti<strong>d<strong>os</strong></strong>. Em geral oefeito equivale a tornar compreensível o significado e a força da locução, a realização<strong>de</strong> <strong>um</strong> ato ilocucionário <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da sua apreensão. A forma <strong>de</strong> análise ganha sustentona <strong>teoria</strong> das forças ilocucionárias ou <strong>como</strong> chamam<strong>os</strong> propriamente a <strong>teoria</strong> <strong>de</strong> <strong>at<strong>os</strong></strong> <strong>de</strong><strong>fala</strong> (1990, p.95-103).Percebe-se que Austin elaborou a <strong>teoria</strong> <strong>d<strong>os</strong></strong> <strong>at<strong>os</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>fala</strong>, <strong>de</strong>senvolvendo a noçãoda linguagem <strong>como</strong> meio <strong>de</strong> interação social, sendo que sua função não é refletir omundo, e sim comunicar. Dando <strong>um</strong> passo além <strong>de</strong> Wittgenstein, sua reflexão não parte<strong>de</strong> frases e sim <strong>de</strong> proferiment<strong>os</strong> (utterances): “<strong>at<strong>os</strong></strong> <strong>de</strong> emissão <strong>de</strong> frases realiza<strong>d<strong>os</strong></strong> por<strong>fala</strong>ntes <strong>para</strong> ouvintes em situações concretas” (COSTA, 2002, p.43). Para além disso, a


REVISTA LITTERIS ISSN 1983 7429 Número 4, Março <strong>de</strong> 2010.<strong>teoria</strong> das forças ilocucionárias ou <strong>d<strong>os</strong></strong> <strong>at<strong>os</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>fala</strong> sustenta melhor a busca da aplicação,substituindo a <strong>teoria</strong> <strong>d<strong>os</strong></strong> performativ<strong>os</strong>.O entendimento da <strong>teoria</strong> <strong>d<strong>os</strong></strong> <strong>at<strong>os</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>fala</strong> <strong>como</strong> método <strong>para</strong> a interpretação <strong>de</strong>text<strong>os</strong>A fil<strong>os</strong>ofia <strong>de</strong> Austin é recuperada em Visions of Politics: regarding method porQuentin Skinner, este conclui que as investigações fil<strong>os</strong>óficas alertam <strong>para</strong> não isolar <strong>os</strong>ignificado das palavras. O enfoque <strong>de</strong>ve estar n<strong>os</strong> us<strong>os</strong> das palavras enquanto jog<strong>os</strong> <strong>de</strong>linguagem e mais especificamente <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> formas particulares <strong>de</strong> vida. Em relação àAustin, Skinner comenta que esse a men<strong>os</strong> <strong>de</strong> <strong>um</strong>a década <strong>de</strong>pois do <strong>de</strong>safio lançadopor Wittgenstein respon<strong>de</strong>u na obra How to do things with words, que trata exatamenteda investigação do uso <strong>de</strong> palavras ao invés <strong>d<strong>os</strong></strong> significa<strong>d<strong>os</strong></strong> <strong>de</strong>las, dizendo, gr<strong>os</strong>somodo, que palavras também são ações. Ainda segundo Skinner aqueles arg<strong>um</strong>ent<strong>os</strong>oferecem <strong>um</strong>a hermenêutica <strong>de</strong> valor excepcional <strong>para</strong> <strong>os</strong> <strong>historiadores</strong> intelectuais eestudantes <strong>de</strong> disciplinas culturais. Seus estu<strong>d<strong>os</strong></strong> sobre significado e <strong>at<strong>os</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>fala</strong> sãofeit<strong>os</strong> a partir <strong>d<strong>os</strong></strong> tópic<strong>os</strong> <strong>de</strong> interpretação <strong>de</strong> text<strong>os</strong>, ou seja, utiliza as <strong>teoria</strong>s <strong>de</strong> açõeslingüísticas e implicações <strong>para</strong> interpretá-l<strong>os</strong>. (2006, p.103).Tentando explorar as implicações o historiador traz o exemplo sobre <strong>um</strong> policiale <strong>um</strong> patinador. Assim analisa as regras <strong>de</strong> intenções e convenções n<strong>os</strong> entendiment<strong>os</strong><strong>d<strong>os</strong></strong> <strong>at<strong>os</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>fala</strong>. Segundo o exemplo, o policial disse a <strong>um</strong> patinador que o gelo estavafino. Devem<strong>os</strong> <strong>para</strong> enten<strong>de</strong>r o que o policial disse, primeiro, compreen<strong>de</strong>r o quesignifica as palavras recuperadas no vocabulário da língua do policial, mas tambémsaber o que o policial estava fazendo ao dizer o que foi dito. O que o policial disse po<strong>de</strong>ter tido <strong>um</strong>a força ilocucionária <strong>de</strong> advertir o patinador. Ao mesmo tempo, logo <strong>de</strong>poispo<strong>de</strong> ter havido <strong>um</strong>a conseqüência do que foi dito (perlocucionário). Por exemplo, po<strong>de</strong>ter amendrontado, irritado ou divertido o patinador <strong>como</strong> conseqüência do que disse.(SKINNER, 2006, p.104)Austin <strong>para</strong> clarear a idéia <strong>d<strong>os</strong></strong> us<strong>os</strong> <strong>de</strong> linguagem na comunicação diria queaqueles que <strong>fala</strong>m são capazes <strong>de</strong> explorar a dimensão da força ilocucionária <strong>de</strong> modo a– <strong>como</strong> o próprio título do livro sugere – fazer coisas com palavras. Há <strong>um</strong>relacionamento entre a dimensão lingüística da força ilocucionária e a capacida<strong>de</strong> <strong>d<strong>os</strong></strong>oradores <strong>de</strong> explorar a dimensão em or<strong>de</strong>m, <strong>de</strong> executar opções <strong>de</strong> <strong>at<strong>os</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>fala</strong> –especialmente <strong>at<strong>os</strong></strong> ilocucionári<strong>os</strong>, <strong>os</strong> quais Austin se interessou <strong>de</strong>masiado em


REVISTA LITTERIS ISSN 1983 7429 Número 4, Março <strong>de</strong> 2010.classificar. Certa força ilocucionária executa <strong>um</strong> ato <strong>de</strong> <strong>um</strong> certo tipo, sugerindo que aconexão da dimensão ilocucionária da linguagem com a performance <strong>de</strong> <strong>at<strong>os</strong></strong>ilocucionári<strong>os</strong> <strong>de</strong>vem ser – <strong>como</strong> to<strong>d<strong>os</strong></strong> <strong>os</strong> <strong>at<strong>os</strong></strong> voluntári<strong>os</strong> – as intenções do agenteinteressado (SKINNER, 2006, p.105).Sendo assim, aquele que profere <strong>de</strong>ve procurar <strong>um</strong>a performance a<strong>de</strong>quadaquando se quer produzir certa força ilocucionária, eleger o ato locucionário somente nãobasta, há que conhecer a sua ilocução. O ato <strong>de</strong> advertir <strong>de</strong>ve ter <strong>um</strong>a performanceparticular <strong>para</strong> advertir, <strong>de</strong>ve-se <strong>fala</strong>r <strong>de</strong> acordo com que se entenda a intenção <strong>de</strong>advertir, portanto <strong>para</strong> enten<strong>de</strong>r que se trata <strong>de</strong> advertir o ato <strong>de</strong>ve ser recuperado emsua ocasião.Quando Austin expõe esse ponto e introduz o conceito <strong>de</strong> ilocução, elepressupõe que alguém executou o ato e <strong>como</strong> ele produziu o performativo <strong>para</strong> serentendido. Consi<strong>de</strong>ra, porém, a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> verificar a apreensão (uptake) admiteque a apreensão <strong>d<strong>os</strong></strong> <strong>at<strong>os</strong></strong> ilocucionári<strong>os</strong> <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> cada convenção lingüística,apresenta as convenções no lugar das intenções <strong>d<strong>os</strong></strong> oradores. Sobre esse tópico <strong>de</strong>Austin, Skinner explica que:Ele ass<strong>um</strong>iu (na veia Wittgenstein) que a captação <strong>de</strong> <strong>at<strong>os</strong></strong>ilocucionári<strong>os</strong> requer a presença <strong>de</strong> tais convenções lingüísticasfortes que ele parecia sugerir <strong>de</strong>pois que tais convenções, em lugar<strong>de</strong> intenções <strong>de</strong> oradores, <strong>de</strong>vem ser <strong>de</strong>finitivas <strong>d<strong>os</strong></strong> <strong>at<strong>os</strong></strong>locucionári<strong>os</strong> (SKINNER, 2006, p.105-106).Não po<strong>de</strong>m<strong>os</strong> jamais negar o fato <strong>de</strong> que quando alguém emite <strong>um</strong> proferimentoperformativo seriamente está sempre fazendo alg<strong>um</strong>a coisa tanto quanto <strong>fala</strong>ndo. Muitas<strong>de</strong> n<strong>os</strong>sas ações exigem inevitavelmente certas locuções verbais <strong>para</strong> seremcompreendidas, há ações que sem dizerm<strong>os</strong> algo não seriam ações, po<strong>de</strong>m<strong>os</strong> citarinúmer<strong>os</strong> us<strong>os</strong> <strong>de</strong> verb<strong>os</strong> que po<strong>de</strong>m explicitar isso: eu estou advertindo você, estouor<strong>de</strong>nando você, etc. Será p<strong>os</strong>sível realizar esses <strong>at<strong>os</strong></strong> sem o uso da linguagem? Skinneralerta ainda que:O problema da interpretação surge em parte porque nós não fazem<strong>os</strong>dificulda<strong>de</strong>s, mesmo n<strong>os</strong> cas<strong>os</strong> <strong>de</strong> to<strong>d<strong>os</strong></strong> <strong>os</strong> dias, ainda men<strong>os</strong> no caso<strong>de</strong> tais <strong>at<strong>os</strong></strong> enormemente complex<strong>os</strong> <strong>de</strong> comunicação <strong>como</strong> essesque normalmente chamam a atenção <strong>de</strong> crític<strong>os</strong> literári<strong>os</strong> e<strong>historiadores</strong> do intelectual (SKINNER, 2006, p.107).


REVISTA LITTERIS ISSN 1983 7429 Número 4, Março <strong>de</strong> 2010.As críticas apontam problemas nessas exp<strong>os</strong>ições entre as intenções <strong>de</strong>oradores e as forças locucionárias. Haveria <strong>um</strong>a falha ao reconhecer que intençõesilocucionárias po<strong>de</strong>m estar presentes na ausência <strong>de</strong> <strong>um</strong> correspon<strong>de</strong>nte atoilocucionário. Mesmo sabendo o ato ilocucionário <strong>para</strong> advertir ao <strong>fala</strong>r ou escrever,po<strong>de</strong>-se falhar com aquele que é advertido. Mas bem antes das críticas dirigidas aSkinner, Austin já <strong>de</strong>ixaria claro que aquele que adverte <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da apreensão <strong>de</strong>sseato <strong>para</strong> que ele se realize (uptake) (SKINNER, 2006, p.107).Não se po<strong>de</strong> realmente dizer que se advertiu alguém sem que essa pessoarealmente entenda que foi advertida, que seja realida<strong>de</strong> e transformação. Em relação aouptake, em alguns cas<strong>os</strong> po<strong>de</strong> ser dispensável, quando o ato significa apenas <strong>um</strong> evento,não há <strong>um</strong> efeito, <strong>um</strong>a conseqüência <strong>de</strong> <strong>um</strong>a performance bem sucedida da ação. Comoao advertir, o sucesso da performance do ato ilocucionário é advertir o fato. Assim, tal<strong>como</strong> c<strong>um</strong>primentar e informar são <strong>at<strong>os</strong></strong> ilocucionári<strong>os</strong> que in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m <strong>de</strong> quem sedirige. São por sis só <strong>at<strong>os</strong></strong>. Os arg<strong>um</strong>ent<strong>os</strong> da crítica são <strong>os</strong> mesm<strong>os</strong> que reforçam aprópria <strong>teoria</strong> <strong>d<strong>os</strong></strong> <strong>at<strong>os</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>fala</strong>, que prevê o problema da apreensão ao <strong>de</strong>stacar quandodizer é fazer:Tudo isso então, não faz sentido nenh<strong>um</strong> <strong>para</strong> sugerir, <strong>como</strong> Austin eGraham amb<strong>os</strong> o fazem, que alguém po<strong>de</strong> ter tido sucesso <strong>fala</strong>ndocom a força ilocucionária planejada <strong>de</strong> <strong>um</strong>a advertência e ainda nãoexecuta o ato ilocucionário correspon<strong>de</strong>nte [...] (SKINNER, 2006,p.108).Res<strong>um</strong>indo, a idéia advertir é simplesmente o fato <strong>de</strong> <strong>fala</strong>r que alguém está emperigo.Os crític<strong>os</strong> arg<strong>um</strong>entam que somente po<strong>de</strong> haver intenções ilocucionárias com<strong>at<strong>os</strong></strong> correspon<strong>de</strong>ntes, assim po<strong>de</strong>-se emitir <strong>um</strong> ato ilocucionário na ausência <strong>de</strong> <strong>um</strong>aintenção, logo Skinner negligenciaria <strong>os</strong> <strong>at<strong>os</strong></strong> ilocucionári<strong>os</strong> não intencionais. Skinnerrespon<strong>de</strong> que não acredita na existência <strong>de</strong>ssa classe. Para ele não é p<strong>os</strong>sível advertiralguém sem intenção, se ele mesmo <strong>de</strong>fine que advertir requer <strong>um</strong>a performance <strong>de</strong>intenções e forças ilocucionárias <strong>para</strong> que aconteça a advertência (2006, p.109).A noção <strong>de</strong> performance agregada ao proferimento não faria sentido sem aintenção. Seria <strong>como</strong> n<strong>um</strong>a peça teatral on<strong>de</strong> <strong>os</strong> atores sabem exatamente o que dizer e<strong>como</strong> dizer <strong>para</strong> produzirem cert<strong>os</strong> efeit<strong>os</strong> no público. Todo ato tem <strong>um</strong>a forçailocucionária, então se ele adverte mesmo com qualquer intenção <strong>de</strong> advertir, mesmo


REVISTA LITTERIS ISSN 1983 7429 Número 4, Março <strong>de</strong> 2010.assim evoca o correspon<strong>de</strong>nte a esse ato ilocucionário. É <strong>como</strong> se advertir só exista <strong>um</strong>aforma <strong>de</strong> fazê-lo, que é dado a priori na própria linguagem <strong>de</strong> quem o faz (SKINNER,2006, p.109). Rebate ainda com o arg<strong>um</strong>ento:Mas a razão usual será que o significado <strong>de</strong> <strong>um</strong> proferimento nelemesmo, junto com o contexto <strong>de</strong> sua ocorrência são tais que o oradornão sente dúvida da capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua audiência <strong>para</strong> assegurar acaptação-apreensão do seu ato ilocucionário pretendido (SKINNER,2006, p.113).Dessa forma as críticas não tocaram no que Skinner consi<strong>de</strong>ra <strong>como</strong> essencialem Austin: a distinção entre <strong>at<strong>os</strong></strong> ilocucionári<strong>os</strong> e forças ilocucinárias: “Os <strong>at<strong>os</strong></strong>ilocucionári<strong>os</strong> que emitim<strong>os</strong> são i<strong>de</strong>ntifica<strong>d<strong>os</strong></strong>, <strong>como</strong> <strong>at<strong>os</strong></strong> voluntári<strong>os</strong>, por n<strong>os</strong>sasintenções; mas as forças ilocucionárias carregadas pel<strong>os</strong> n<strong>os</strong>s<strong>os</strong> proferiment<strong>os</strong>performativ<strong>os</strong> são principalmente <strong>de</strong>terminadas por seus significa<strong>d<strong>os</strong></strong> e contexto”(SKINNER, 2006, p.109). Assim, po<strong>de</strong>-se ter <strong>um</strong>a intenção e ao proferir a forçailocucionária fazer outra coisa. A força ilocucionária é <strong>um</strong> elemento que não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> daintenção.Enfim, retoma-se o problema que <strong>de</strong> fato Skinner preten<strong>de</strong> respon<strong>de</strong>r: o que a<strong>teoria</strong> <strong>d<strong>os</strong></strong> <strong>at<strong>os</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>fala</strong> espera n<strong>os</strong> <strong>fala</strong>r sobra interpretação <strong>de</strong> text<strong>os</strong>? Enfatiza: “A <strong>teoria</strong>não n<strong>os</strong> conta, e nem faz, eu acredito, que as intenções <strong>d<strong>os</strong></strong> oradores e escritoresconstituem <strong>um</strong> só ou mesmo o melhor guia <strong>de</strong> entendimento <strong>d<strong>os</strong></strong> seus text<strong>os</strong> ouproferiment<strong>os</strong>” (SKINNER, 2006, p.110). O historiador está en<strong>d<strong>os</strong></strong>sando claramente olado anti-intencionalista do caso. Em tom <strong>de</strong> ironia, diz parecer irresistível acreditar quetodas as interpretações p<strong>os</strong>síveis <strong>para</strong> <strong>um</strong> texto po<strong>de</strong>m ser justificadas pela intenção doautor, fica ingenuamente fácil compreen<strong>de</strong>r <strong>um</strong> texto assim. É <strong>de</strong>licado buscarcompreen<strong>de</strong>r o significado do texto nas intenções do autor, <strong>de</strong>ve-se lembrar que sualinguagem, a que dispõe <strong>para</strong> proferir algo, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> suas intenções já éestabelecida culturalmente. As intenções não po<strong>de</strong>m i<strong>de</strong>ntificar sozinhas o significado<strong>de</strong> <strong>um</strong> texto (SKINNER, 2006, p.110-114). A linguagem não pertence ao autor.Quanto à prática da <strong>teoria</strong> é necessário à compreensão da noção da forçailocucionária <strong>de</strong> <strong>um</strong> proferimento <strong>para</strong> que haja a compreensão do próprio atoilocucionário. A questão é: “Como este processo <strong>de</strong> apreensão será adquirido na práticaem <strong>um</strong> caso <strong>de</strong> <strong>um</strong> ato ilocucionário complexo em que <strong>os</strong> crític<strong>os</strong> literári<strong>os</strong> e <strong>os</strong><strong>historiadores</strong> intelectuais são caracteristicamente interessa<strong>d<strong>os</strong></strong>? Os filósof<strong>os</strong> da


REVISTA LITTERIS ISSN 1983 7429 Número 4, Março <strong>de</strong> 2010.linguagem não ajudam nesse aspecto a<strong>os</strong> <strong>historiadores</strong>, mas oferecem dois principaisingredientes <strong>para</strong> distinguir <strong>um</strong> conceito <strong>de</strong> apreensão (uptake). O primeiro há que seconsi<strong>de</strong>rar o fato do significado do proferimento nele mesmo, o que parece óbvio,enten<strong>de</strong>r o caráter gramatical do ato e o vocabulário (SKINNER, 2006, p.114). Depois éi<strong>de</strong>ntificar o contexto e ocasião do proferimento-enunciação. To<strong>d<strong>os</strong></strong> <strong>os</strong> proferiment<strong>os</strong>séri<strong>os</strong> são tenciona<strong>d<strong>os</strong></strong> <strong>como</strong> <strong>at<strong>os</strong></strong> <strong>de</strong> comunicação, assim eles acontecem <strong>como</strong> Austinsempre observou através <strong>de</strong> <strong>at<strong>os</strong></strong> convencionalmente <strong>de</strong> caráter reconhecível. Se<strong>de</strong>sejam<strong>os</strong> compreen<strong>de</strong>r proferiment<strong>os</strong>, <strong>de</strong>vem<strong>os</strong> encontrar mei<strong>os</strong> <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificar anatureza precisa <strong>de</strong> intervenção constituída pelo ato do proferimento, enfim, a busca doefeito.Ao historiador cabe a função <strong>de</strong> ler, apren<strong>de</strong>r e reconhecer as linguagensdisponíveis da época e cultura que estuda <strong>para</strong> saber o que o autor do texto quis proporou dizer. O historiador persegue sua primeira meta, lendo extensivamente a literatura daépoca e aguçando sua própria sensibilida<strong>de</strong> e intuição <strong>para</strong> <strong>de</strong>tectar a presença <strong>d<strong>os</strong></strong>divers<strong>os</strong> idiomas. Processo <strong>de</strong> familiarização, lendo e formulando hipóteses <strong>para</strong>estabelecer que tais linguagens po<strong>de</strong>riam ser empregadas <strong>de</strong> tais maneiras. Encontraráno caminho problemas <strong>de</strong> interpretação, tendência i<strong>de</strong>ológica e com o círculohermenêutico (POCOCK, 2003, p.33).O historiador interessa pelas ações <strong>de</strong> outr<strong>os</strong> agentes, não <strong>de</strong>seja ser o autor <strong>de</strong>seu próprio passado tanto quando <strong>de</strong>seja revelar as ações <strong>de</strong> outr<strong>os</strong> autores na história eda história. Deverá estar atento às ocasiões em que <strong>os</strong> própri<strong>os</strong> usuári<strong>os</strong> da linguagemcomentam seu uso criticamente, reflexivamente, por meio <strong>de</strong> linguagens <strong>de</strong> segundaor<strong>de</strong>m, por eles <strong>de</strong>senvolvidas com esse propósito, assim o historiador po<strong>de</strong> controlarsuas hipóteses,Ele procurará, em seguida, observar a parole agindo sobre a langue:sobre as convenções e implicações da linguagem, sobre outr<strong>os</strong> atores<strong>como</strong> usuári<strong>os</strong> da linguagem, sobre atores em quaisquer outr<strong>os</strong>context<strong>os</strong>, <strong>de</strong> cuja existência ele p<strong>os</strong>sa se sentir ´persuadido‟, ep<strong>os</strong>sivelmente sobre esses mesm<strong>os</strong> context<strong>os</strong> (POCOCK, 2003, p.33).Nesse momento o historiador <strong>para</strong> sustentar que a linguagem era <strong>um</strong> recursocultural e não <strong>um</strong> esforço <strong>de</strong> sua interpretação relacionará com o número <strong>de</strong> atores queele pu<strong>de</strong>r m<strong>os</strong>trar terem operado nesse meio expressivo e ao número <strong>de</strong> <strong>at<strong>os</strong></strong> que elepu<strong>de</strong>r m<strong>os</strong>trar que operaram. Provando que divers<strong>os</strong> autores usavam o mesmo idioma,


REVISTA LITTERIS ISSN 1983 7429 Número 4, Março <strong>de</strong> 2010.que é recorrente em outr<strong>os</strong> text<strong>os</strong> e context<strong>os</strong> e que <strong>os</strong> autores tinham consciência doidioma que empregavam e <strong>de</strong>senvolviam linguagens críticas e <strong>de</strong> segunda or<strong>de</strong>m <strong>para</strong>comentar ou regular o emprego <strong>de</strong>sse idioma, tudo isso reforça o seu método (POCOCK,2003, p.33-34).Existe também a noção <strong>de</strong> intervir no contexto, pois “<strong>os</strong> problemas <strong>para</strong> <strong>os</strong> quais<strong>os</strong> escritores se vêem respon<strong>de</strong>ndo po<strong>de</strong>m ter sido levanta<strong>d<strong>os</strong></strong> em período remoto, atémesmo em <strong>um</strong>a cultura completamente diferente”(SKINNER, 2006, p.116). O contextoapropriado <strong>para</strong> enten<strong>de</strong>r o ponto <strong>de</strong> tais proferiment<strong>os</strong> <strong>de</strong> escritores será sempre emtudo que nós alcançam<strong>os</strong> do contexto <strong>para</strong> apreciar a natureza da intervençãoconstituída pel<strong>os</strong> proferiment<strong>os</strong>. Para recobrir esse contexto <strong>de</strong>vem<strong>os</strong> engajar em <strong>um</strong>campo largo tão bem quanto <strong>de</strong>talhar <strong>um</strong>a pesquisa histórica. Para Pocock o historiador:“[...] necessitará <strong>de</strong> mei<strong>os</strong> <strong>para</strong> enten<strong>de</strong>r <strong>como</strong> <strong>um</strong> ato <strong>de</strong> <strong>fala</strong>, enunciação ou autoria,efetuado em <strong>um</strong>a certa linguagem, po<strong>de</strong> atuar sobre ela e introduzir inovaçõesnela ”(2003, p.36).Logo, <strong>de</strong>vem<strong>os</strong> começar pelo significado e <strong>de</strong>pois o assunto do proferimento quen<strong>os</strong> interessa e assim voltar <strong>para</strong> o contexto arg<strong>um</strong>entativo <strong>de</strong> suas ocorrências <strong>para</strong><strong>de</strong>terminar <strong>como</strong> eles se conectam com outr<strong>os</strong> proferiment<strong>os</strong> liga<strong>d<strong>os</strong></strong> ao mesmo assunto.Dada a análise com<strong>para</strong>tiva:Se tiverm<strong>os</strong> sucesso na i<strong>de</strong>ntificação <strong>de</strong>ste contexto com precisã<strong>os</strong>uficiente, nós po<strong>de</strong>m<strong>os</strong> esperar ler em voz alta o que eraeventualmente que o orador ou escritor em quem nós estam<strong>os</strong>interessa<strong>d<strong>os</strong></strong> estava fazendodizendo o que ele ou ela disseram(SKINNER, 2006, p.116).Em Skinner e n<strong>os</strong> objetiv<strong>os</strong> do historiador <strong>de</strong>sse tipo passam a preocupação comas intenções do autor ao elaborar seu texto. Crític<strong>os</strong> questionam se é p<strong>os</strong>sível resgatar asintenções do autor a partir da análise <strong>de</strong> seus text<strong>os</strong> sem cair em <strong>um</strong>a prisão do círculohermenêutico, algo que suce<strong>de</strong> ao não se ter nenh<strong>um</strong> indício fora do texto <strong>para</strong> alcançaras intenções. Porém há recurs<strong>os</strong>, <strong>como</strong> correspondências privadas que po<strong>de</strong>m servir <strong>de</strong>auxílio.Quanto mais provas o historiador pu<strong>de</strong>r mobilizar na construção <strong>de</strong>suas hipóteses acerca das intenções do autor, que po<strong>de</strong>rão então seraplicadas ao texto ou testadas em confronto com o mesmo, maiores


REVISTA LITTERIS ISSN 1983 7429 Número 4, Março <strong>de</strong> 2010.serão as suas chances <strong>de</strong> escapar do círculo hermenêutico (POCOCK,2003, p.27).O <strong>de</strong>safio é constituir <strong>um</strong>a categoria entre text<strong>os</strong> e context<strong>os</strong>. Michel Foucault eRoland Barthes anunciaram a morte do autor, segundo eles autores po<strong>de</strong>m antecipar <strong>os</strong>context<strong>os</strong> <strong>de</strong> <strong>um</strong> autor estudado. Sendo assim, <strong>de</strong>ve-se sair <strong>de</strong> <strong>um</strong>a preocupação <strong>de</strong> autorindividualmente e sim percebê-lo <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> <strong>um</strong> grupo e <strong>d<strong>os</strong></strong> discurs<strong>os</strong> <strong>de</strong> seu própriomomento. Pocock arg<strong>um</strong>enta que a linguagem que <strong>um</strong> autor emprega já está em uso,assim é transmitida e se impõe a context<strong>os</strong> subseqüentes (2003, p.29). Skinner acharadical acreditar nisso <strong>como</strong> <strong>um</strong>a verda<strong>de</strong> incontestável, é certo das limitações <strong>de</strong> n<strong>os</strong>sacomunicação, mas enten<strong>de</strong> a linguagem também <strong>como</strong> <strong>um</strong> recurso. Não se po<strong>de</strong>dispensar a categoria do autor se <strong>os</strong> moment<strong>os</strong> são <strong>um</strong>a convenção <strong>de</strong>safiada ou <strong>um</strong>lugar com<strong>um</strong> (2006, p.117).O tipo <strong>de</strong> historiador que estuda o que Pocock chama <strong>de</strong> linguagens <strong>de</strong> <strong>de</strong>batelega, em segundo plano, as relações entre contribuições individuais <strong>para</strong> tais linguagense o campo <strong>de</strong> discurso <strong>como</strong> <strong>um</strong> inteiro. Enfim, verifica-se a contribuição <strong>de</strong> <strong>um</strong>discurso pré-existente <strong>para</strong> enten<strong>de</strong>r o que o autor estava fazendo. Skinner replica: “Nósestam<strong>os</strong> <strong>fala</strong>ndo sobre text<strong>os</strong>, e a performativida<strong>de</strong> no qual eu estou interessado <strong>de</strong> fatoé tratada <strong>como</strong> <strong>um</strong>a proprieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> text<strong>os</strong> em si mesmo” (2006, p.118). Devem<strong>os</strong>limitar n<strong>os</strong>sa arg<strong>um</strong>entação sobre a <strong>de</strong>fensabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> tais afirmações, e procurar tip<strong>os</strong><strong>de</strong> pesquisas históricas que habilitem enriquecer e refinar isto. Através <strong>de</strong>sta imp<strong>os</strong>içãolimitam<strong>os</strong> n<strong>os</strong>so estudo inteiramente <strong>para</strong> text<strong>os</strong>, suas características e „behaviours’, eesquecem<strong>os</strong> <strong>os</strong> autores juntamente (SKINNER, 2006, p.118).O estudo que Foucault caracteriza por regimes <strong>de</strong> discurs<strong>os</strong> ou puramentearqueologia do proferimento <strong>para</strong> Skinner é consi<strong>de</strong>rar que <strong>os</strong> text<strong>os</strong> têm autores e essestêm intenções ao escrevê-l<strong>os</strong>, recuperar isso é <strong>um</strong>a maneira <strong>de</strong> respon<strong>de</strong>r o caminho daarqueologia. Isso quer dizer consi<strong>de</strong>rar que o texto está fazendo alg<strong>um</strong>a coisa e que oautor é que faz isso. Se existe <strong>um</strong> ato, existe <strong>um</strong> autor. A intencionalida<strong>de</strong> po<strong>de</strong>contribuir mais tar<strong>de</strong> <strong>para</strong> a compreensão da coerência das crenças <strong>d<strong>os</strong></strong> autores. Devemsebuscar recobrir <strong>um</strong>a re<strong>de</strong> <strong>de</strong> atitu<strong>de</strong>s que justificam a intenção (2006, p.118-119).Skinner se refere a<strong>os</strong> text<strong>os</strong> <strong>como</strong> <strong>at<strong>os</strong></strong>, então o processo <strong>de</strong> entendimento <strong>de</strong>lesn<strong>os</strong> requer, <strong>como</strong> no caso <strong>d<strong>os</strong></strong> <strong>at<strong>os</strong></strong> voluntári<strong>os</strong>, recobrir as intenções incorporadas neles.Processo que a antiquada hermenêutica n<strong>os</strong> levou a acreditar. Skinner arg<strong>um</strong>enta sobre


REVISTA LITTERIS ISSN 1983 7429 Número 4, Março <strong>de</strong> 2010.o óbvio alguns proferiment<strong>os</strong> foram tira<strong>d<strong>os</strong></strong> <strong>de</strong> context<strong>os</strong> em que foram proferi<strong>d<strong>os</strong></strong>, nestecaso é pouco provável criar hipóteses sobre o entendimento <strong>de</strong>sses proferiment<strong>os</strong>.Um exemplo <strong>de</strong> boa aplicação do método <strong>de</strong> Skinner é <strong>um</strong>a referência da obraPassage to India, romance <strong>de</strong> E.M.Forster, este encerra com as palavras “Weybridge,1924”. Ao escrever isto, Forster informava que escrevera enquanto morava em <strong>um</strong>subúrbio <strong>de</strong> Londres e também as condições que escreveu, assim <strong>como</strong> seguia <strong>um</strong>aconvenção com<strong>um</strong> na época. Mas o que ele estava fazendo ao usar essa convenção?Assinar romances naquele período foi <strong>um</strong>a forma do autor chamar atenção <strong>para</strong> sua vidaromanticamente nôma<strong>de</strong>. Como por exemplo, o romance <strong>de</strong> James Joyce Ulysses queassinou Trieste-Zurich-Paris, dois an<strong>os</strong> antes <strong>de</strong> publicá-lo. As datas e locais assina<strong>d<strong>os</strong></strong>tinham o objetivo <strong>de</strong> m<strong>os</strong>trar o árduo trabalho literário, Forster quando assinavasomente <strong>um</strong> local e <strong>um</strong>a data, fez <strong>um</strong>a crítica a essa convenção da lamúria e agonia <strong>de</strong>escrever, satirizando <strong>um</strong>a convenção inteira <strong>de</strong> assinatura do trabalho ficcional,indicando <strong>um</strong>a p<strong>os</strong>tura que apenas ainda estava dando seus primeir<strong>os</strong> sinais <strong>de</strong> origem.Com essa interpretação Skinner conclui que não é p<strong>os</strong>sível recobrir a intenção ao men<strong>os</strong>que conheçam<strong>os</strong> com certeza <strong>os</strong> gêner<strong>os</strong> <strong>de</strong> text<strong>os</strong>. Essa dimensão está presente no caso<strong>de</strong> todo proferimento sério, se em verso ou em pr<strong>os</strong>a, se em fil<strong>os</strong>ofia ou em literatura.Os text<strong>os</strong> contêm <strong>um</strong>a complexida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>at<strong>os</strong></strong>, <strong>um</strong>a frase em <strong>um</strong> texto po<strong>de</strong> haver mais<strong>at<strong>os</strong></strong> que palavras (SKINNER, 2006, p.120-124).Pocock percebe que as críticas vão mais além. Julga-se a questão da langue eparole, do contexto lingüístico e <strong>at<strong>os</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>fala</strong>. Assim, coloca:Mas a objeção com a qual estam<strong>os</strong> lidando é mais radical. Elaquestiona não apenas que as intenções p<strong>os</strong>sam existir antes <strong>de</strong> serarticuladas em <strong>um</strong> texto, <strong>como</strong> também que se p<strong>os</strong>sa dizer que elasexistem in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da linguagem em que o texto seráconstruído. O autor habita <strong>um</strong> mundo historicamente <strong>de</strong>terminado,que é apreensível somente por mei<strong>os</strong> disponíveis graças a <strong>um</strong>a série<strong>de</strong> linguagens historicamente constituídas. Os mo<strong>d<strong>os</strong></strong> <strong>de</strong> discursodisponíveis dão-lhe as intenções que ele po<strong>de</strong> ter, ao proporcionarlhe<strong>os</strong> únic<strong>os</strong> mei<strong>os</strong> <strong>de</strong> que po<strong>de</strong>rá dispor <strong>para</strong> efetuá-las (POCOCK,2003, p.27-28).Dessa forma, o método <strong>de</strong> Skinner impele na direção tanto do resgate dalinguagem do autor quanto do resgate <strong>de</strong> suas intenções, bem <strong>como</strong> a tratá-lo <strong>como</strong>hesitante <strong>de</strong> <strong>um</strong> universo <strong>de</strong> langues que confere sentido às paroles que ele emite nessaslinguagens. Subten<strong>de</strong>-se, que o texto do autor é <strong>um</strong> artefato cultural dotado <strong>de</strong> certa


REVISTA LITTERIS ISSN 1983 7429 Número 4, Março <strong>de</strong> 2010.finalida<strong>de</strong>, o historiador po<strong>de</strong> aplicar a <strong>teoria</strong> <strong>d<strong>os</strong></strong> <strong>at<strong>os</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>fala</strong> <strong>para</strong> avaliar seus lances,performances, inovações sobre a linguagem, ao fazê-lo ele adquire <strong>um</strong> métodoexpressivo <strong>para</strong> interpretação <strong>de</strong> text<strong>os</strong>, ass<strong>um</strong>indo <strong>os</strong> problemas que essa escolhaimplicará.Referências BibliográficasAUSTIN, John Langshaw. Quando dizer é fazer. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990.COSTA, Cláudio Ferreira. “Wittgenstein: linguagem <strong>como</strong> figuração e <strong>como</strong>instr<strong>um</strong>ento”. In: ____. Fil<strong>os</strong>ofia da linguagem. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Jorge Zahar, 2002,p.24-43._______. “Austin e Habermas: linguagem <strong>como</strong> meio <strong>de</strong> interação social”. In: ____.Fil<strong>os</strong>ofia da linguagem. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2002, p.43-58.SOUZA FILHO, Danilo Marcon<strong>de</strong>s <strong>de</strong>. “A fil<strong>os</strong>ofia da linguagem <strong>de</strong> J.L.Austin”. In:AUSTIN, John Langshaw. Quando dizer é fazer. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990,p.7-14.POCOCK, John. “O Estado da Arte”. In ____. Linguagens do I<strong>de</strong>ário Político. SãoPaulo: Edusp, 2003, p.23-62.SKINNER, Quentin. “Interpretation and the un<strong>de</strong>rstand of speech acts”. In: ____.Visions of Politics: regarding method. Cambrig<strong>de</strong>: Cambrig<strong>de</strong> University Press, 2006,p.103-107.

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