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Jornal de Leiria 29 de Novembro de 2012 7DemografiaA importânciadas pessoasMaria João Valente Rosa,professora universitária, nasceuem Lisboa em 1961. Diz que semprese preocupou com “tudo o quemexe” à sua volta, ou seja com aspessoas. A demografia conquistou--a precisamente por ser umaciência que relaciona pessoas enúmeros e estuda o que move ocomporta-mento das pessoas(fecundidade, nupcialidade,migrações, etc). E porque temmuita dificuldade em pensar semestar sustentada em factos enúmeros. Licenciada e doutoradaem Sociologia, pela UniversidadeNova de Lisboa, é directora daPordata (Base de dados de Portugalcontemporâneo) e é autora devários estudos publicados sobre apopulação portuguesa.Desempenhou funções dedirigente em organismos públicosdos Ministérios da Educação e daCiência, Tecnologia e EnsinoSuperior. Integrou o ConselhoSuperior de Estatística e asseguroua representação nacional em váriasinstâncias europeias einternacionais.soas a terem hipótese de chegar aidades mais avançadas e, por suavez, a morrerem cada vez menos atéaos 65 anos. A Europa é já consideradoo continente grisalho, resultadoda melhoria das condições desaúde e dos avanços técnico-científicos.Mas quem é que não gosta deviver mais tempo? E quem é que nãogosta de decidir sobre o próprio númerode filhos que quer ter? Gostamosdisto tudo e se as causas quemotivaram o envelhecimento sãoelas próprias, por si, positivas, entãoonde está o problema? O problemaapenas reside no facto de as sociedadesnão se terem adaptado ao cursodos factos. Porque uma coisa écerta: não vamos deixar de envelhecere, no futuro, seremos aindamais envelhecidos que hoje. Os cenáriosdemográficos são muito certos,mesmo admitindo um aumentodos índices de fecundidade. Porisso, a forma de nos distinguirmosnão deve ser pela idade mas pela viado conhecimento. E o conhecimentonão tem idades nem fronteiras.A primeira impressão quefazemos do outro é se é novo ou velho,encaixando as pessoas em diversosatributos, através de filtrosem relação à idade ou à nacionalidade.Só muito depois é que conseguimosperceber um pouco do valorque aquela pessoa tem. São preconceitosprejudiciais em relação àspessoas de idade mais avançada,que a sociedade se está a dar ao luxode desperdiçar, com consequênciasterríveis para todos, já que setrata de um capital humano extremamenteimportante. Deveríamoscomeçar a olhar para o indivíduo porsi, independentemente da idade,se é ou não estrangeiro e se é homemou mulher.Defende então que o trabalho atempo parcial é a solução para adultose idosos?É, porque os pressupostos se alteraramtodos. Este modelo é terrívelporque estudamos, estudamos, estudamosaté determinada idade,depois trabalhamos, trabalhamos,trabalhamos e não temos tempopara mais nada. Depois é a fase dodescanso, descanso, descanso. Avida partida assim não faz sentido.Em vez da concentração excessivanas idades activas de trabalho, deveapostar-se num modelo em quecada uma das idades (activas e avançadas)possa combinar as váriascomponentes: trabalho e reforma atempo parcial e formação permanentepara se ir actualizando. Este éo ciclo de vida que o envelhecimentoda população nos está a exigir.O envelhecimento demográficonão é mais que um provocador àsnossas cabeça, como que a dizer: oenvelhecimento está aqui e por issoa sociedade tem de mudar, a bem oua mal. O que fizemos até agora foi resistirà mudança e continuar a funcionarcomo há décadas. Aí é queestá o mal. Por isso é tempo de emPortugal e não só (não somos originaisa esse propósito) se começar afuncionar de forma inteligente, quenão é por certo a que herdamosdos nossos ascendentes. A sociedadeestá em mudança e não é no imobilismoque encontraremos a melhorforma de responder a essasmudanças.A quem cabe fazer essas mudanças?O cidadão é crucial em processos demudança mas os sinais tambémtêm de ser dados pelas instituiçõespúblicas que nos governam e pelasempresas. E não é para fazerem jeitoou caridade, mas por perceberemque há um potencial importanteque podem aproveitar nos mais velhos.O envelhecimento demográficonão pode ser combatido e porisso não vale a pena perdemos maistempo com isso. Os dados estão aí eestá tudo muito claro a esse propósito.Por isso, vamos concentrar--nos no que é importante, debater epensar, implicando-nos todos nesteprocesso de mudança. Hoje nãohá ninguém que não fale do envelhecimentoda população mas podíamoster lançado esta discussãomais cedo. Até porque o envelhecimentonão é um problema mas umamais-valia.Como caracteriza os idosos do futuro?Serão muito diferentes dos de hoje.A minha geração é mais instruída ecom maior qualificação que a dosmeus ascendentes. E, porventura,mais exigente também e com trajectóriasde vida, mesmo familiares,mais complexas, menos lineares,muitas vezes com vários casamentos,vários divórcios, filhos de váriasfrentes. Os idosos actuais não estavamà espera de viver tanto tempoe por isso chegam aos 65 e 70 anos,sentindo que ainda estão com muitascapacidades. Só que como nãoestavam à espera, não prepararamnovas carreiras ou actividades.EducaçãoO abandonoescolar emPotugalé gravíssimo❚ É professora do ensino superior.Também acha que se pode fazermais com menos?Não entro em questões concretasde política nacional. A única coisade que posso falar é da educaçãocomo um todo. E, mais umavez, há um problema estruturalem Portugal que é um claro e terríveldéfice de qualificação. Temosmais de 70 por cento dos trabalhadorespor conta própria, nomáximo, com o que o 9.º ano deescolaridade, quando na Europacerca de 80 por cento têm mais do9º ano de escolaridade. Isto contrariao discurso de que somosum país de doutores e engenheirose com excesso de licenciados. Émentira. O nosso problema é outro.Temos um défice claro dequalificação e sabendo que a sociedadeem curso é a do conhecimento,não só precisamos de qualficadoscá dentro como chamálospara cá. Não comento afirmaçõesde governantes mas parecemeque andamos todos muito enganados.Fizemos alguns progressosem termos de abandonoescolar precoce (alunos que nãocompletam o secundário), já queo valor mais recente em Portugalé de 23% e, no início dos anos 90,era de 50%. Porém, somos ainda o3º país da União Europeia (Maltae Espanha estão à frente) onde oabandono escolar é mais elevado.Isto é gravíssimo.O que pensa da debandada para areforma de profissionais da FunçãoPública?Acho esta debandada, por exemplode médicos e professores, umpéssimo exemplo. Na minha perspectivaé grave que ninguém reaja.Debandar só porque se temdeterminada idade, pensando queao sairem estão a libertar postos detrabalho para os mais novos, é totalmentefalso. Isto não é um princípiode vasos comunicantes. Nãohá estudos sobre isso, mas pensoque a reforma não faz bem à saúde.Se fosse dada oportunidade aessas pessoas de contribuirem positivamentepara uma série de objectivos,elas prescindiriam deuma parte da sua reforma para terum trabalho a tempo parcial. Emrelação aos anos 60, tivemos umbónus de mais 15 anos de esperançade vida. A agravar a situação,a idade média, quer da SegurançaSocial, quer da Caixa Geralde Aposentações, segundo dadosrecentes disponíveis na Pordata, émesmo inferior aos 65 anos. Assim,não há sistema que aguenteeste contrato.