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Baba Pecê realiza ações i<strong>de</strong>alizadas por seus ancestrais e executa projetosque não pu<strong>de</strong>ram ser concluídos anteriormente. Dentre eles, <strong>de</strong>staca-se oresgate das gravações realizadas por Pierre Verger, em 1958, durante a gestão<strong>de</strong> sua avó, Ìyá Simplícia <strong>de</strong> Ògún. Baba Pecê se empenhou no resgatedas gravações e autorizou a publicação.Assim, a <strong>Casa</strong> <strong>de</strong> Òsùmàrè, em parceria com a Fundação Pierre Verger, compatrocínio da Petrobras e do Ministério da Cultura, publicou um livro, <strong>de</strong> autoria<strong>de</strong> Ângela Elisabeth Lühning e Silvanilton Encarnação da Mata, BabaPece, relatando a trajetória das gravações e um pouco da história da <strong>Casa</strong> <strong>de</strong>Òsùmàrè. O livro, <strong>Casa</strong> <strong>de</strong> Oxumare: os cânticos que encantaram PierreVerger foi publicado pela Editora Vento Leste, em 2011, com anexo <strong>de</strong>dois compact disks com as gravações históricas, tornando-se um dos maisimportantes registros até hoje feitos da musicalida<strong>de</strong> do candomblé.A importância histórica e cultural <strong>de</strong>stas gravações po<strong>de</strong> se comprovada emum parecer dado pelo etnomusicólogo Xavier Vatin, doutor em antropologia.As gravações musicais realizadas por Pierre Verger, em 1958 com o povo <strong>de</strong>santo do Terreiro da <strong>Casa</strong> <strong>de</strong> Òsùmàrè constituem um documento preciosopara os estudos sobre as religiões afro-brasileiras e para o próprio povo <strong>de</strong>santo. Além da qualida<strong>de</strong> sonora, excelente para a época e o contexto, valeressaltar, preliminarmente, a maestria da execução musical dos intérpretes:solista masculino, coro feminino e percussionistas. Dentro <strong>de</strong> um conjunto<strong>de</strong> centenas <strong>de</strong> terreiros existentes à época na Cida<strong>de</strong> do Salvador, a escolhada <strong>Casa</strong> <strong>de</strong> Òsùmàrè para a realização <strong>de</strong>ssas gravações se <strong>de</strong>ve, sem sombra<strong>de</strong> dúvida, ao prestígio histórico <strong>de</strong>ste Terreiro e <strong>de</strong> seus membros, especialmenteno que diz respeito às suas práticas musicais. A título <strong>de</strong> exemplo,o Ilé Àse Òsùmàrè é, hoje, uma das raríssimas casas <strong>de</strong> candomblé - senãoa última - on<strong>de</strong> po<strong>de</strong> ser ouvido o ritmo adarrum tão bem tocado, “toque <strong>de</strong>fundamento”, originário da nação Jeje, cujas funções rituais são extremamenteimportantes para a manutenção da tradição litúrgica afro-baiana. Doponto <strong>de</strong> vista etnomusicológico, a audição do documento sonoro permiteevi<strong>de</strong>nciar a pregnância <strong>de</strong> técnicas e práticas musicais características daÁfrica Subsaariana, tais como: o canto responsorial e antifonal, o caráterheterofônico do coro feminino (com efeitos recorrentes <strong>de</strong> “overlapping” etrechos pontuais <strong>de</strong> plurivocalida<strong>de</strong>), a presença <strong>de</strong> uma polirritmia <strong>de</strong>correntedo conjunto percussivo, a importância <strong>de</strong> um time-line constante marcadopelo sino metálico (gã ou agogô), servindo <strong>de</strong> base métrica para todasas cantigas. Do ponto <strong>de</strong> vista linguístico, vale ressaltar a predominância <strong>de</strong>uma base lexical yorùbá, com alguns elementos <strong>de</strong> origem fon. A estruturasintática remete também à família linguística Níger-Congo, em especial aosubgrupo Oeste-Benue Congo. Do ponto <strong>de</strong> vista histórico, as gravações<strong>de</strong> Verger com o povo <strong>de</strong> santo da <strong>Casa</strong> <strong>de</strong> Oxumaré trazem elementos extremamentevaliosos para apreciar a evolução musical (escalas melódicas,técnicas vocais, estruturas rítmicas) e linguística dos repertórios <strong>de</strong> cantigase toques do Candomblé baiano <strong>de</strong> matriz “Jeje-nagô”. A qualida<strong>de</strong> extraordináriado solista, o famoso Alagbe Paizinho, do coro feminino e dos percussionistas,faz <strong>de</strong>sse documento sonoro um testemunho único da músicado Candomblé.Em 9 <strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 2014, a Ministra <strong>de</strong> Estado da Cultura, ExcelentíssimaSenhora Marta Suplicy, homologou o tombamento do Ilé Osùmàrè ArákàAsè Ogodó como Patrimônio Material e Imaterial Brasileiro, um reconhecimento<strong>de</strong> suas importantes contribuições para i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> cultural do País.No fim <strong>de</strong>ste mês entre os dias 25 a 1 <strong>de</strong> agosto, Bàbá Pêce recebeu os maisaltos sacerdotes da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Oyo, na <strong>Casa</strong> <strong>de</strong> Òsùmàrè on<strong>de</strong> se hospedarampor cerca uma semana. Nesta oportunida<strong>de</strong> Sua Majesta<strong>de</strong> Real o Alàáfín<strong>de</strong> Oyo, reconheceu a preservação da religiosida<strong>de</strong> Yorùbá na <strong>Casa</strong> <strong>de</strong>Osùmàrè. Na troca <strong>de</strong> presentes entre as duas autorida<strong>de</strong>s, Vossa Majesta<strong>de</strong>presenteou Bàbá com importantes instrumentos litúrgicos e recebeu <strong>de</strong> BàbáPêcê o Asè <strong>de</strong> Osùmàrè para garantir a proteção <strong>de</strong> Oyo.Com 20 anos <strong>de</strong> gestão, Baba Pecê preserva com <strong>de</strong>dicação as tradições efundamentos da <strong>Casa</strong> <strong>de</strong> Òsùmàrè, respeitando a atualida<strong>de</strong> e mantendo vivaa história <strong>de</strong> uma comunida<strong>de</strong> religiosa que é um símbolo <strong>de</strong> resistência dacultura negra em nosso país.O estimável doutor em antropologia Professor Or<strong>de</strong>p Serra – <strong>de</strong>fensor docandomblé baiano e responsável por conduzir os terreiros a serem reconhecidoscomo patrimônio cultural brasileiro – aten<strong>de</strong>ndo ao pedido <strong>de</strong> BabaPecê, está conduzindo a <strong>Casa</strong> <strong>de</strong> Òsùmàrè a ser registrada nos livros <strong>de</strong> tombohistórico e etnográfico do Instituto do Patrimônio Histórico e ArtísticoNacional.62 63