Revista LiteraLivre 4ª edição (versão 1)
4ª Edição da Revista LiteraLivre, uma revista virtual e ecológica, criada para unir autores que escrevem em Língua Portuguesa em todo o mundo. 4nd Edition of LiteraLivre Magazine, a virtual and ecological magazine, created to bring together authors who write in Portuguese throughout the world. Http://cultissimo.wixsite.com/revistaliteralivre/comoparticipar
4ª Edição da Revista LiteraLivre, uma revista virtual e ecológica, criada para unir autores que escrevem em Língua Portuguesa em todo o mundo. 4nd Edition of LiteraLivre Magazine, a virtual and ecological magazine, created to bring together authors who write in Portuguese throughout the world. Http://cultissimo.wixsite.com/revistaliteralivre/comoparticipar
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<strong>LiteraLivre</strong> nº 2<br />
Kleber Kurowsky<br />
Santa Maria/RS<br />
O Olhar que Roubou o Mundo<br />
Aqui, do outro lado, posso escrever. Não que eu tenha algum tipo de<br />
gosto particular pelas palavras, mas porque não há muito mais que eu possa<br />
fazer além de anotar meus pensamentos na areia cinza e úmida sob meus pés,<br />
e que dá a todo infinito que me cerca um ar pantanoso e doente. Já faz um<br />
tempo que estou aqui, sozinho, mas o ambiente não me é mais familiar por<br />
isso: é tão silencioso, vazio e ameaçador quanto foi nos primeiros dias.<br />
As palavras se desmancham na areia, varridas por um vento que minha<br />
pele ignora, e, pouco a pouco, se tornam inidentificáveis, meros espectros<br />
daquilo que sonhei que fossem, nada diferentes do mundo que me cerca ou<br />
mesmo de mim próprio.<br />
Eu vou continuar a andar, deixar as palavras para trás, em sua ruína<br />
rítmica e constante, até que nada mais reste delas. E se um dia alguém passar<br />
pelo ponto no espaço que agora deixo para trás, não encontrará nada além da<br />
areia que certa vez marcou as solas de meus pés, e que estará, então,<br />
desprovida de qualquer sinal humano.<br />
Mas o mundo já foi diferente, e talvez, em algum lugar, ainda seja;<br />
talvez eu apenas tenha sido deixado para trás. E agora me pergunto o que eu<br />
estaria fazendo caso o mundo não me tivesse sido roubado, arrancado de mim<br />
logo agora que começava a entendê-lo… ou pelo menos era isso que eu<br />
achava.<br />
Naquela época, antes de morrer o mundo, eu a via todo dia, subindo as<br />
escadas do edifício, coberta por roupas que alternavam de corte ou de tecido,<br />
mas nunca de cor: preto, sempre preto. Sua boca, de lábios cobertos por<br />
batom roxo ou cinza, revelavam um mundo que pulsava em sua vermelhidão<br />
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